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Autor: Prof. Ricardo Felipe Di Carlo Colaboradores: Prof. Vinícius Albuquerque Prof. Gabriel Lohner Gróf República Nova e República Liberal Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Professor conteudista: Ricardo Felipe Di Carlo Possui bacharelado e licenciatura em História pela Universidade de São Paulo – USP (2007). Concluiu o mestrado em 2011 pelo programa de História Econômica na USP. Em 2013, começou a escrever para a Universidade Paulista – UNIP, o que tem sido uma grande honra e prazer para sua atividade profissional, já que propicia a oportunidade de dialogar com aqueles que são amantes da história e já perceberam, de algum modo, a satisfação enorme que ensinar propicia. Atualmente, grava aulas para a EaD da UNIP, acompanha os fóruns de discussão, resenha importantes obras relacionadas à temática do desenvolvimento da educação a distância, avalia os níveis de aprendizado dos alunos e cresce no espírito criativo da UNIP. Compreende que a tecnologia pode ser uma ferramenta de boa valia para a aproximação do aluno e do saber se usada corretamente e se bem supervisionada. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) D545r Di Carlo, Ricardo Felipe. República Nova e República Liberal. / Ricardo Felipe di Carlo. – São Paulo: Editora Sol, 2016. 192 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XXII, n. 2-045/16, ISSN 1517-9230. 1. República nova. 2. República liberal. 3. Redemocratização. I. Título CDU 981 A-XIX Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Prof. Dr. Yugo Okida Vice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcelo Souza Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dra. Divane Alves da Silva (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Dra. Valéria de Carvalho (UNIP) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Marcilia Brito Lucas Ricardi Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Sumário República Nova e República Liberal APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................7 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................9 Unidade I 1 A REPÚBLICA VELHA E A REVOLUÇÃO DE 1930 ................................................................................. 11 1.1 Significados da Revolução de 1930 .............................................................................................. 21 2 A FORMAÇÃO DO POPULISMO .................................................................................................................. 24 2.1 Industrialização tardia ........................................................................................................................ 24 2.2 O populismo ........................................................................................................................................... 28 2.3 A biografia de Getúlio Dorneles Vargas ...................................................................................... 30 2.4 Governo Provisório de Getúlio Vargas – 1930-1934 ............................................................. 32 Unidade II 3 GOVERNO CONSTITUCIONAL DE GETÚLIO VARGAS – 1934-1937 .............................................. 65 4 A ESTRUTURAÇÃO DO ESTADO NOVO .................................................................................................... 84 4.1 O Brasil e a Segunda Guerra Mundial ........................................................................................101 Unidade III 5 REDEMOCRATIZAÇÃO ..................................................................................................................................119 6 GOVERNO DUTRA E GOVERNO VARGAS .............................................................................................125 6.1 Governo Dutra – 1946-1951 .........................................................................................................125 6.2 Governo Vargas – 1951-1954 .......................................................................................................137 Unidade IV 7 A CRISE SUCESSÓRIA E OS GOVERNOS DE JK E JÂNIO QUADROS ...........................................151 7.1 Crise sucessória – 1954-1956 .......................................................................................................151 7.2 Governo JK – 1956-1961 ................................................................................................................152 7.3 Governo Jânio Quadros – 1961 ....................................................................................................160 8 CRISE INSTITUCIONAL .................................................................................................................................165 8.1 Jango – 1961-1964 ...........................................................................................................................168 7 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 APRESENTAÇÃO Desenvolver um material específico de nossa história é tarefa, sem dúvida, bastante instigante. Aqui tratamos de um momento extremamente importante da formação do Brasil. Trata-se, para muitos, da primeira experiência democrática com a introdução do voto secreto e universal, na década de 1930. Ao mesmo tempo, o discurso de modernização ecoava em diversas partes do país ao longo de todo o processo da Revolução de 1930, ainda que ela estivesse inserida, diretamente, nas disputas entre as oligarquias no Brasil de então. Outra perspectiva extremamente importante foi a discussão acerca do projeto de desenvolvimento para o país. De um lado, tendo como maior símbolo Getúlio Vargas, estavam os defensores da modernização associada à industrialização, em defesa da intervenção direta do Estado, ou seja, a criação de indústrias de base pelo Estado garantidor e potencializador das riquezas nacionais. De outro lado, tendo como maior símbolo Juscelino Kubitschek, os entreguistas entendiam que a industrialização deveria estar associada, diretamente, à participação do capital privado, nacional ou estrangeiro, facilitando uma explosão do setor econômico. Essas visões, por muito tempo, perduraram em nosso país e até hoje, mesmo em uma economia global, trazem marcas evidentes. A partir da Era Vargas, a população urbana entra no jogo político. A concessão de direitos trabalhistas perpetuou a imagem de Getúlio como “pai dos trabalhadores do Brasil” – feito muito rememorado e comemorado por muitos homense mulheres que enfrentam a labuta e, por vezes, conseguem desfrutar dessas benesses. No entanto, é inegável que outra marca desse período foi o populismo. A política marcada pela manipulação das massas produzida por um líder carismático e demagogo, com aparência conciliatória, foi criada no Brasil por Vargas e marcou os anos de 1930 a 1964. Com efeito, muitos historiadores chegam a denominar esse momento de República Populista. Em maior ou menor grau, todos os presidentes do período em questão tiveram características dessa típica política da América Latina. O fato é que o populismo se perpetuou no Brasil. Criou um mito em torno de Vargas, o mais importante político da nossa história, tanto que seu governo é denominado de Era Vargas (feito extremamente raro para um governante, pode ser comparado à Era de Augusto ou à Era Napoleônica, salvo as devidas limitações de amplitude mundial). E, nesse sentido, Vargas passou das relações políticas do Estado ao paternalismo, cristalizando a típica visão de que o governo ajuda os cidadãos – e de que o inverso é o governo ruim, que não ajuda – ou seja, perde-se de vista a questão de que o Estado existe para garantir os serviços que os cidadãos pagam através de seus impostos, sendo nada mais do que um prestador de serviços, ainda que, em pontos mais polêmicos, seja capaz de distribuir renda e criar condições para o desenvolvimento econômico. Para aquele que quer se tornar um educador, é fundamental conhecer sua própria história. Entender como se estabeleceu a garantia dos direitos trabalhistas, a construção do modelo industrial do país ou mesmo as nítidas marcas do populismo. Tais assuntos são centrais para entender a história do Brasil liberal. 8 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Nosso esforço, nesse sentido, é de tentar compreender as teias de relações, cada vez mais complexas, que se estabeleceram ou se desestruturaram ao longo das diferentes ideologias de um período de enorme agitação social e política no mundo, ou mesmo da maior catástrofe da economia capitalista. A unidade I traz à tona a expectativa pela modernização do país com o estabelecimento da Revolução de 1930. O movimento, que conseguiu aglutinar em torno de si diversos grupos, foi o norte das relações políticas que foram formadas a partir dali e, inclusive, por meio da publicação de manifestos em busca de reais e amplas mudanças estruturantes no país. Em especial destaque, a figura de Getúlio Vargas promoveu no Brasil a participação das massas no processo político e a criação do populismo. Amante do poder, Getúlio garantiu em torno de si as principais decisões políticas, no contexto do fim da força econômica do café paulista com a Crise de 1929. Não é à toa, portanto, que São Paulo partiu para um movimento revolucionário em 1932 – ainda que com discurso de defesa da constituinte, era evidente que ambicionavam o retorno do estado à participação política. De qualquer forma, a ideologia da defesa de um regime democrático gerou o Governo Constitucional de Vargas analisado na unidade II. A polarização ideológica mundial, entre os defensores da democracia e os simpatizantes do nazi-fascismo, rapidamente ecoou no país. A Ação Integralista Brasileira (AIB) e a Aliança Nacional Libertadora (ANL) passaram a ter grande relevância na política nacional. Mais uma vez discutiam-se os caminhos pelos quais o país obteria o desenvolvimento econômico e o progresso social. No entanto, a ação dos comunistas deu o motivo que Vargas mais precisava para instaurar uma ditadura, em defesa da ordem – o Estado Novo. Aqui se estabeleceu uma grande ideologia nacionalista, unitarista e de forte viés econômico industrial – com seu projeto intervencionista e estatizante. Foi, inclusive, por essa economia industrial que o Brasil entrou na 2ª Guerra Mundial e acabou por escancarar a incoerência de Getúlio. Afinal, como uma ditadura lutava pela liberdade no mundo? Na unidade III, então, é ponderada a progressiva conquista da redemocratização, aspiração central em todo Ocidente, sob a égide da influência dos Estados Unidos. O mundo do pós-guerra revelou o continuísmo de um conflito mundial. Duas superpotências, Estados Unidos e União Soviética, disputavam áreas de domínio e controle de seus sistemas: capitalismo de um lado, socialismo de outro. Esse contexto foi extremamente importante e influenciou os rumos do Brasil, e de toda a América Latina, no período em questão. O governo Dutra reestabeleceu a democracia. Trouxe consigo, inclusive, o liberalismo econômico e o sonho de um Brasil capaz de conviver bem com as importações por já ter uma economia sólida. Era só sonho. Em pouco tempo, as reservas obtidas nas exportações para os aliados logo se foram. O discurso de Vargas tornou a ter força, e o nacionalismo intervencionista e estatizante ganhou seus maiores contornos, principalmente, com a criação da Petrobrás em 1953. Outros projetos ainda foram estabelecidos, mas a oposição conservadora conseguiu desestruturar o “pai dos trabalhadores do Brasil”. Seu suicídio foi a última cartada do seu triunfante populismo. A unidade IV, por fim, revela o Brasil com resquícios evidentes do populismo varguista, ou de oposição, ou de defesa. O desenvolvimento econômico foi festejado no governo JK. A construção de Brasília, em 1960, era o grande símbolo da modernidade que agora estava em completa evidência pelo país. No entanto, o presidente só se preocupou com o crescimento econômico, sob a égide industrial, sem se atentar aos meios necessários para isso. Logo, o país se viu imerso em uma crescente inflação, dívida externa e déficit orçamentário. A campanha para arrumar a casa, varrendo a corrupção, foi o 9 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 que fez Jânio Quadros suceder a JK. Da mesma forma, sua inaptidão para lidar com as diferentes forças políticas do país, o fez renunciar em apenas sete meses. A partir de então, o país viveu grande tensão e não mais até 1964. Os militares recusam a entrada do vice Jango no poder. Acusam o vice-presidente de comunismo e de perigo à segurança nacional. A solução foi o Parlamentarismo, que vigorou até 1963. Um plebiscito deu os poderes presidenciais completos a Jango. Como herdeiro político do populismo varguista, tentou uma última cartada: suas reformas de base. Era a estruturação de medidas nacionalistas em prol dos trabalhadores. O radicalismo ganhou enorme força. Com isso, no contexto do auge da Guerra Fria, com o exemplo cubano pairando nas mentes e corações, garantia, segundo os militares, de que a liberdade democrática estava ameaçada. E, assim, em 31 de março de 1964, desfecharam um golpe na democracia, em nome da democracia, por mais estranho que isso possa parecer até hoje, mais de 50 anos depois do golpe. INTRODUÇÃO O Brasil é um país de imensidão. As realidades são variadas e fruto de diversos processos históricos que vivemos. Algumas temáticas, em torno dessas construções, trazem feridas que ainda sangram. Há algumas raízes que se perpetuaram e que permanecem impregnadas nas mentes e corações de boa parte dos brasileiros, e isso passa de geração a geração ganhando contornos de tristeza e amargura, ou, para outros, esperança de que o que ainda não se pode ter hoje é possível se alcançar no futuro. Ao historiador cabe descortinar as teias que formaram nossa história. Mais do que isso, como educadores, devemos fazer nossos alunos pensarem acerca daquilo que foi vivido, daquilo que vivemos e o que queremos viver. Claro que esse não é um processo simples, mas quanto mais o exercício é feito, mais instigante ele se torna. Ao mesmo tempo, não se deve doutrinar o aluno baseando-nos em nossas convicções. Muito pelo contrário. É precisofazê-lo obter todas as ferramentas para pensar a partir de si mesmo. Ser capaz de fazer conexões, críticas e defesas por si e não ser massa de manobra ideológica de outros. A República Liberal é um período de enormes emoções e que escancara tensões que até a atualidade são bastante evidentes na política do país, como a relação populista dos políticos para com a população e a perpetuação da visão do Estado como alguém que lança benesses para seus súditos, quase como uma monarquia. No viés econômico, ainda nos deparamos com acalorados debates acerca da perpetuação ou não da intervenção do Estado na economia, da manutenção ou privatização das grandes empresas estatais criadas por Getúlio Vargas, do nosso “atraso” econômico pela ausência de uma prioridade industrial, do desejo de uma educação técnica para formar trabalhadores ou de uma escola como problematizadora das construções sociais do país. Essas são só algumas temáticas que você, caro aluno, verá por aqui. Procuramos, ao máximo, trazer elementos para fortalecer sua formação. O livro é dedicado a futuros historiadores e professores de História. Significa, assim, que traz à tona diversos documentos que são extremamente importantes para se produzir história. Trabalhar com os documentos é o que forma o exercício de ser e saber do historiador. Ser capaz, como dizia o mestre Marc Bloch, de fazer sua crítica externa e interna (tanto de sua produção como de seu conteúdo) precisa sempre ser a base do ofício. Portanto, procure ao máximo aproveitar os textos cuidadosamente selecionados que poderão ser uma fonte de pesquisa para o resto de sua vida. 10 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Ao mesmo tempo, o material traz também uma ampla análise historiográfica com as produções mais recentes acerca dos temas. Claro que isso não esgota todo o estudo, pois muito mais poderia ser dito, mencionado ou criticado. Mas o percurso histórico foi feito a partir da análise da compreensão da formação democrática no país e, com ele, da imbricada relação com o populismo, até sua derrocada na década de 1960. O pedido final a você, caro aluno, é que, como um verdadeiro detetive do passado, examine tudo que será visto. Atente-se às imagens, aos textos e a suas construções. Reflita sobre o contexto histórico de cada um dos momentos estabelecidos. Fortaleça suas informações com as sugestões elencadas e procure, ao máximo, investir em sua formação. Vale muito a pena aproveitar esse tempo de estudos. Que a leitura possa instigá-lo a ser um promotor de cidadãos capazes de pensar sobre o nosso país e também ser agente de um desenvolvimento cada vez mais justo e igualitário. Boa jornada! 11 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 REPÚBLICA NOVA E REPÚBLICA LIBERAL Unidade I 1 A REPÚBLICA VELHA E A REVOLUÇÃO DE 1930 O Brasil republicano nasceu de um grande sonho: a modernização – já em curso com a riqueza do café, com a instalação das ferrovias e telégrafos, com o início das atividades industriais e urbanas de Mauá, com a vinda de imigrantes europeus etc. Assim, o discurso oficial completava seu dualismo com a perspectiva de uma Monarquia símbolo de um Brasil retrógrado. Os primeiros anos da República ficaram conhecidos pelo autoritarismo defendido tanto por Deodoro da Fonseca como por Floriano Peixoto. Esses militares acabaram por representar um processo de transição, com especial destaque para a Constituição de 1891, que garantia a formação de uma República Federativa Presidencialista com voto aberto e direto para homens com mais de 21 anos e alfabetizados. A partir da eleição de Prudente de Morais, em 1894, o primeiro presidente civil de nossa história, a historiografia caracteriza esse período como a República Oligárquica – determinada por níveis de controle de poder, na esfera municipal, estadual e federal, em que pequenos grupos acabaram por controlar toda a estrutura política do país. No domínio federal, São Paulo e Minas Gerais, mais ricos e populosos, em função da economia cafeeira (a grande fonte de riqueza no período), unem-se para dominar a política nacional. Para garantir essa força, estabeleceram, no governo de Campos Sales (1898-1902), a política dos governadores, caracterizada pelo apoio total ao governo federal em troca de autonomia para os estados. Com isso, eliminava-se a oposição e formavam-se oligarquias estaduais. Na esfera local, por fim, os coronéis dominavam, em virtude da força dos laços de dependência econômica e social, o que eram chamados de “currais eleitorais”. Ou seja, áreas onde o poder local dos grandes latifundiários, somados à titulação militar, exercia forte poder de coerção sobre aqueles que iriam exercer o direito ao voto. Nem sempre a coerção se dava pelo uso da força: havia ainda a possibilidade de apadrinhar a população local e por meio de uma “troca de favores” (como a manutenção do emprego e da casa), o voto estava garantido. Formava-se, com isso, o famoso “voto de cabresto”, o sufrágio guiado pelo coronel. Há de se destacar que as fraudes eram comuns e poderiam ser auxiliares importantes para impedir qualquer desvio nas estruturas oligárquicas. O “voto fantasma” era a inclusão de eleitores mortos nas listas de participantes para adicionar votos; o “voto bico de pena”, por sua vez, era a inserção de nomes inventados. Tudo para maximizar a eleição dos candidatos da estrutura política vigente. Não existia justiça eleitoral para promover qualquer tipo de investigação sobre essas ilegalidades. Portanto, não é à toa que se perpetuou uma força política tão significativa e impositiva por mais de trinta anos na nossa história. 12 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Unidade I Figura 1 – A charge apresentada retrata o clientelismo político, que se estruturava em torno do voto aberto, garantido pela Constituição de 1891. Na prática, ficava evidente que o eleitorado se tornava “refém” das determinações do coronel e de suas alianças políticas. A intimidação e o castigo corporal eram práticas bastante comuns De qualquer forma, houve certa oposição (mesmo com toda essa estrutura), já que, por vezes, estabelecia-se a divergência de candidatos e ideias, mas nada que causasse uma ruptura permanente no status quo. Ao todo, foram três eleições competitivas na história da República Velha, nomeadamente, a vitória de Hermes da Fonseca sobre Rui Barbosa, em 1° de março de 1910; o triunfo de Epitácio Pessoa também sobre Rui Barbosa, em 13 de abril de 1919; por fim, o surpreendente resultado vitorioso de Júlio Prestes sobre Getúlio Vargas em 1° de março de 1930. Na economia, a riqueza do café era a linha mestre definidora das relações sociais e, por extensão, como vimos, de uma política oligárquica. Estruturas foram montadas para manter sua força, mesmo com as oscilações do mercado internacional frente a um produto primário não fundamental. Podemos citar como exemplo o Convênio de Taubaté de 1906, em que São Paulo, Minas Gerais e o Rio de Janeiro se uniram a fim de promover a intervenção do Estado no mercado cafeeiro para valorizar seu preço, o que logo foi adotado no nível federal, ou ainda o método da socialização das perdas, mecanismo em que era usada a desvalorização cambial para garantir que o café, com seu mercado de exportações, tivesse o mesmo valor de renda para seus produtores, mesmo quando havia declínio no seu preço. Nesse breve apanhado da República, ainda merece destaque certo potencial industrial que surgiu acompanhado pelo desenvolvimento das cidades e que sempre foi mantido por uma forte política de controle trabalhista determinada pela repressão. Uma frase famosa do período,atribuída ao presidente Washington Luís (1926-30), resume bem essa ideia: “a questão social é um caso de polícia”. No entanto, em carta para Evaristo de Moraes Filho, teria dito: “Eu jamais disse, ou escrevi, e jamais poderia ter dito, que a questão social era uma questão de polícia, frase que o mais bisonho político, mesmo em nossa terra, não ousaria empregar” (MANGANO, 1995, p. 50). 13 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 REPÚBLICA NOVA E REPÚBLICA LIBERAL Saiba mais Apesar da frase “a questão social é um caso de polícia” ser tradicionalmente atribuída ao presidente Washington Luís (1926-30), há análises recentes que revisitam o tema. Consulte o texto: MAGANO, O. B. Washington Luís e a questão social. Revista da Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, v. 90, p. 49-65, 1995. Disponível em: <www.revistas.usp.br/rfdusp/article/download/67288/69898>. Acesso em: 20 jan. 2016. De qualquer forma, a crise de 1929, a maior crise da história do capitalismo, fez os paulistas perderem imensamente sua força. Os Estados Unidos, até então, eram responsáveis pela compra de cerca de 70% do principal produto brasileiro, e imediatamente deixaram de lado essas aquisições, já que uma avalanche passou a ser sentida: falências, desemprego, fome e miséria. O café, produto secundário para a vida, ficava longe dos paladares americanos a partir desse momento. Figura 2 – A foto demonstra a força econômica do café, sobretudo, paulista. A paisagem das grandes fazendas de café garantia o predomínio também político de São Paulo e Minas Gerais no país oligárquico da Primeira República Soma-se, ainda, o crescente descontentamento de setores do exército contra as oligarquias (com um movimento denominado tenentismo), que já havia demonstrado sua força com a Coluna Prestes (1924-27) quando, sob o comando de Miguel Costa e tendo Luís Carlos Prestes como Chefe-Maior, percorreu mais de 24 mil km pelo interior do país para reunir adeptos contra o governo opressor das elites cafeeiras. 14 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Unidade I O roteiro da Coluna Prestes Expansão da coluna no território brasileiro – de São Luís Gonzaga (RS) até Serra Nova (MG) – dezembro de 1924 a abril de 1926 Recuo da coluna até seu refúgio na Bolívia – de Serra Nova (MG) até San Matias (BOL) – abril de 1926 a fevereiro de 1927 Figura 3 Frente aos problemas econômicos e ao aumento da oposição, Washington Luís procurou, em sua sucessão, garantir a força de São Paulo, com a indicação de outro paulista para sua sucessão – Júlio Prestes. A justificativa, apesar de não ser completamente clara na historiografia, se dava, provavelmente, por entender que ele era o único capaz de continuar seu programa de saneamento financeiro. Tal programa era voltado para ações de equilíbrio monetário e cambial, inclusive criando, em 1926, a Caixa de Estabilização para emitir moeda apenas com garantias de lastro por empréstimos externos ou entradas de ouro e para atender às necessidades referentes à evidente crise do café. No entanto, Minas Gerais, na figura de seu governador, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, não aceitou tal decisão. Mais do que isso, passou a organizar uma oposição firme contra os paulistas. Era o fim do acordo da Política do Café com Leite. 15 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 REPÚBLICA NOVA E REPÚBLICA LIBERAL Para conseguir a participação vital do Rio Grande do Sul, terceiro maior colégio eleitoral do país naquela época, a negociação foi ampla – e logrou sucesso quando foi oferecida a presidência da República para os gaúchos, o que, inclusive, garantiu um acordo entre o Partido Republicano e o Partido Libertador no estado. Surgia assim a liderança de Getúlio Dorneles Vargas, então governador do estado. Para vice-presidente a chapa trouxe João Pessoa, sobrinho do ex-presidente Epitácio Pessoa e governador da Paraíba. A figura de Epitácio Pessoa é bastante significativa, já que ele se recusou a apoiar Júlio Prestes antes de se juntar ao grupo de oposição. Desta base, era criada a Aliança Liberal. Figura 4 – Cartaz da campanha de Júlio Prestes. Evidencia-se, na imagem, que a perspectiva paulista era associar seu desenvolvimento econômico ao restante do país. Os prédios, aviões, luzes, tudo era a simbologia da modernidade, da civilização, como o próprio texto em questão estampava: “é a força do nosso idealismo, que conquista para a civilização a terra barbara e projecta no firmamento os audaciosos perfis das cidades modernas” Figura 5 – Cartaz da campanha da Aliança Liberal contra Júlio Prestes. Destaca-se na imagem a figura imponente de Getúlio Vargas e sua perspectiva de estudo do país, representada pelo mapa a sua frente e pelas propostas a serem estabelecidas a partir de sua experiência no Rio Grande do Sul. Os dizeres do cartaz referem-se à pacificação do país, com a anistia dos tenentistas, a garantia do voto consciente e livre e reformas políticas para garantir o “livre exercício da soberania nacional” 16 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Unidade I A Aliança Liberal contou com a participação de políticos das velhas oligarquias, como Borges de Medeiros, Epitácio Pessoa, Artur Bernardes e Venceslau Brás, além de nomes de jovens na política, como Virgílio de Melo Franco, José Américo, Osvaldo Aranha, Batista Luzardo, Maurício Cardoso, João Neves, Flores da Cunha, Francisco Campos ou ainda de tenentes e membros dos grupos urbanos. Há de se destacar que também computou a adesão do Partido Democrático (PD), que, apesar de paulista, era uma cisão do PRP, partido tradicional dos cafeicultores de São Paulo, e sonhava com novos rumos para o país. O programa do PD diferenciava-se das relações tradicionais paulistas, como analisa Fausto (2004, p. 318): O PD se diferenciava do PRP pelo seu liberalismo, que o partido no poder repudiara na prática, e pela maior juventude relativa de seus integrantes. Ele despertou entusiasmo em uma parcela ponderável da classe média que não era contemplada pelos favores do “perrepismo” e aspirava a ampliar oportunidades na sociedade e na administração pública. Em fins de 1926, o PD reuniu 50 mil nomes em listas de apoio publicadas nos jornais. Apesar das fraudes, elegeu três deputados federais nas eleições de fevereiro de 1927 – um êxito que não se repetiu na eleição estadual de 1928. Nessa ocasião, foram eleitos dois deputados, um resultado aquém das expectativas do partido. Com isso, o programa, redigido por Lindolfo Collor, se mostrou bastante amplo, visando garantir, o máximo possível, a união dos mais diversos setores contra os paulistas. Proclamava a necessidade da moralização política com a criação do voto secreto, justiça eleitoral e independência do Poder Judiciário. Além disso, garantiria a anistia daqueles que participaram dos movimentos relacionados ao tenentismo. Na economia, defendia a diversificação de produtos, inclusive o incentivo industrial. Preconizava, dentro do interesse de aumentar o número de seus entusiastas, o estabelecimento de direitos trabalhistas relacionados à proteção do trabalho, à aposentadoria, às férias e à regulamentação da proteção ao trabalho infantil e feminino. Em 20 de setembro, em convenção no Rio de Janeiro, homologou-se a chapa Vargas e Pessoa para novos rumos da política nacional. E, assim, a campanha foi ganhando força: Apesar das reticências de Getúlio, que, por algum tempo, procurou um acordo com Washington Luís, a campanha ganhou ímpeto. As caravanas liberais, formadaspelos elementos mais jovens, percorreram as principais cidades do Nordeste. Getúlio foi recebido com entusiasmo nos comícios realizados no Rio e em São Paulo. Anos mais tarde, um membro do PD – Paulo Nogueira Filho – relembraria um fato significativo com relação ao comício de São Paulo: a presença da massa proletária. Em suas palavras, ela viera do bairro do Brás, e se fundira com a burguesia, invadindo como casa sua o centro da cidade para aplaudir Getúlio (FAUSTO, 2004, p. 320). O processo político até março de 1930 foi repleto de conchavos, de trocas políticas, de vários prognósticos e de variações de ânimos, até chegar às eleições. E, nesse período, a crise econômica 17 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 REPÚBLICA NOVA E REPÚBLICA LIBERAL mundial rapidamente se propaga no Brasil devido à economia cafeeira. Os produtores demandam uma ação de defesa imediata por Washington Luís. No entanto, o presidente, fiel ao seu programa de controle econômico, recusa. Ainda que sem ocorrer uma cisão entre cafeicultores e governo, os ânimos estavam, cada vez mais, aflorados. Finalmente, o dia 1° de março chegou, como narra Neto (2012, p. 411): [...] os brasileiros foram às urnas. Além do presidente da República, iriam eleger os novos representantes da Câmara Federal e um terço do Senado. Era um sábado de Carnaval. No Rio de Janeiro, os bailes de máscaras e o desfile de carros alegóricos, bem como o tradicional banho de mar à fantasia em Copacabana e defronte do Posto Seis, mobilizaram muito mais gente do que a eleição. Segundo uma anedota da época, uma velha e decrépita senhora, a fraude eleitoral, foi uma das foliãs mais animadas. Naquele ano, saiu às ruas mascarada, fantasiada de democracia. Em uma população com 33,5 milhões de habitantes, sendo 5,7% de eleitores, Júlio Prestes venceu com 1.091.709 votos (57,7% dos votos), contra 742.794 para Getúlio. Até que a Aliança Liberal conseguiu ganhar força em alguns lugares. Em especial destaque, como seria evidente, no Rio Grande do Sul, angariou 295 mil votos contra apenas mil ao opositor. No entanto, da mesma maneira, em uma proporção maior, em São Paulo, Júlio Prestes teve 320 mil votos contra 30 mil para Vargas. Minas Gerais não favoreceu também a aliança opositora contra os paulistas: foram 280 mil votos para Getúlio e 77 mil para o candidato paulista. A diferença maior apareceu nos estados do Norte e Nordeste: na Bahia, por exemplo, Júlio Prestes conseguiu uma diferença de 141 mil contra 11 mil votos. Os ânimos ficaram acirrados. Em um telegrama para Oswaldo Aranha, no dia 11 de março de 1930, Getúlio mostrava sua indignação com Minas Gerais: Rio Grande cumpriu galhardamente seu dever até a eleição. Não temos mais compromissos, nem devemos assumi-los. Não podemos continuar papel quixotesco, lutando por interesses alheios em prejuízo dos nossos. Fracasso na votação mineira constitui remate final. Várias outras falhas vinham continuadamente desmentindo promessas e afirmações de Antônio Carlos (NETO, 2012, p. 414). A partir dali, os políticos tradicionais, acostumados a perdas e vitórias na República Oligárquica, passaram a negociar acordos para se alinharem com os paulistas, como Borges de Medeiros. Parecia que a cisão fora temporária e que os laços de interesses mais uma vez poderiam unir o país. No entanto, por sua vez, os novos políticos não concordaram com o resultado das urnas e podiam ir “até as últimas consequências”. Passaram a conspirar com os tenentes, pois sabiam que estes tinham força militar e histórico de possibilidade de luta. Assim, a Revolução de 1930 foi um projeto ligado aos interesses de grupos regionais completamente desligados do café, como o Rio Grande do Sul e a Paraíba, em torno de políticos não habituados a 18 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Unidade I defender os tradicionais conchavos oligárquicos. E contou com o apoio dos jovens militares, os tenentes, ainda que as forças armadas não se demonstrassem homogêneas na decisão do embate com os paulistas. O projeto político era completado pela gigantesca crise de 1929, que estamparia os dias mais difíceis para os cafeicultores de São Paulo. O processo revolucionário surgiu a partir dos próximos movimentos políticos e sociais que se sucederam no país. O Congresso reabriu em 3 de maio de 1930. Era ele o responsável por reconhecer as candidaturas vitoriosas e empossar os eleitos. Como de praxe, no período oligárquico, opositores da vitória paulista poderiam sofrer vingança. E sofreram. Utilizando a “degola” política – mecanismo de criar algum tipo de impedimento para o cumprimento de mandato – representantes de Minas Gerais e da Paraíba foram bloqueados de participar da política. O Partido Mineiro (PRM) perdeu 14 deputados dos 37 eleitos. Lembrete O sistema de “degola” política nada mais era do que mais um mecanismo garantidor das oligarquias na República Velha. Tinha como objetivo central reter os opositores que, mesmo em um processo eleitoral tão fraudulento, eventualmente, conseguissem se eleger. Argumentava-se dos mais variados e controversos motivos para o impedimento de tal candidato. O importante era manter a maioria favorável ao status quo. Ainda naquele mês, surgiu o famoso Manifesto de Maio, pelo qual Luís Carlos Prestes, criticava tanto o governo estabelecido como a Aliança Liberal e qualquer possibilidade de revolução real com a insurreição que se organizava. Isso porque ambos não estavam relacionados aos reais problemas do país e nem representariam, diretamente, os anseios populares e as necessárias transformações de que o país necessitava. Segundo as palavras de Prestes: O Brasil vive sufocado pelo latifúndio, pelo regime feudal da propriedade agrária, onde se já não há propriamente o braço escravo, o que persiste é um regime de semiescravidão e semisservidão. O governo dos coronéis, chefes políticos, donos de terras, só pode ser o que aí temos: opressão política e exploração impositiva. Toda a ação governamental, política e administrativa gira em torno dos interesses dos senhores que não medem recursos na defesa de seus privilégios. De tal regime decorrem quase todos os nossos males. Querer remediá-los pelo voto secreto ou pelo ensino obrigatório é ingenuidade de quem não quer ver a realidade nacional (CINTRA, 2014, p. 52). A transformação real só poderia ser produzida por um movimento amplamente popular: Uma simples mudança de homens, um voto secreto, promessas de liberdade eleitoral, de honestidade administrativa, de respeito à Constituição e moeda estável e outras panaceias, nada resolvem, nem podem de maneira alguma 19 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 REPÚBLICA NOVA E REPÚBLICA LIBERAL interessar à grande maioria da nossa população, sem o apoio da qual qualquer revolução que se faça terá o caráter de uma simples luta entre as oligarquias dominantes (CINTRA, 2014, p. 52-53). A repercussão das palavras de Luís Carlos Prestes foi imediata. Exilado, tomava contato com as ideias comunistas e, por isso, entendia que um movimento de oligarquias contra oligarquias jamais promoveria um governo voltado ao povo. Com a perda da possibilidade de utilizar o grande homem do tenentismo para a insurreição que agora se organizava, também não parecia ser fácil reunir a liderança do candidato à presidência. Afinal, Getúlio já afirmara que se não vencesse as eleições, terminava seus compromissos com a Aliança Liberal e procurava alinhar-se com Washington Luís. No entanto, tudo se modificou em 26 de julho. O candidato a vice-presidente, João Pessoa, foi assassinado noRecife por João Dantas – um tradicional opositor na política. Como explica Fausto (2004, p. 323) “o crime combinava razões privadas e públicas, mas, na época, só se deu destaque às últimas, pois as primeiras arranhariam a figura de João Pessoa como mártir da revolução”. A questão pessoal estava relacionada às disputas políticas na Paraíba que acabaram ganhando feições particulares. A perseguição do governo estadual a João Dantas acabou fazendo com que seus documentos pessoais fossem confiscados de um antigo escritório e logo trazidos a público e denunciavam relações com o governo federal. João Dantas rapidamente foi convertido a espião no estado. Mais do que isso, foram achadas suas cartas de amor com a professora Anaíde Beiriz, sendo ambos solteiros – a honra de ambos foi diretamente atacada a partir daí. A vingança, então, foi o assassinato do governador do estado, João Pessoa. De qualquer modo, a repercussão do ato foi imediata tanto para a camada popular – que participou em peso do enterro – como para o aumento da participação nos meios militares – inclusive, com a entrada no comando militar de Góis Monteiro. Garantir, contudo, a ação dentro da política tradicional do país, exatamente em oposição aos dizeres de Luís Carlos Prestes, também ganhou envergadura. Era o que ficou expresso na famosa frase atribuída a Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, o governador de Minas Gerais e preterido na indicação da presidência: “façamos a Revolução antes que o povo a faça”. Getúlio Vargas, por sua vez, mudara suas posições, em um texto já deixado por volta de setembro, lançava um grande manifesto publicado no início do movimento: Entreguei ao povo a decisão da contenda, e este, cansado de sofrer, rebela-se contra os seus opositores. Não poderei deixar de acompanhá-lo, correndo todos os riscos em que a vida será o menor dos bens que lhes posso oferecer. [...] 20 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Unidade I Não foi à toa que o nosso estado realizou o milagre da união sagrada. É preciso que cada um de seus filhos seja um soldado da grande causa. Rio Grande, de pé, pelo Brasil (NETO, 2012, p. 468). Enfim, em 3 de outubro de 1930, a revolução eclodiu, liderada militarmente por Gois Monteiro e, do lado civil, por Getúlio Vargas. Foram três focos de levante: incialmente, em Minas Gerais e São Paulo, e, logo no dia seguinte, no Nordeste. Rapidamente, as instalações do governo federal foram sendo dominadas e diversos grupos aderiam ao movimento – até mesmo com a formação de greves. Em menos de uma semana, o movimento já controlava Alagoas, Ceará, Paraíba, Pará, Pernambuco, Maranhão, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e Paraná. Na Bahia e em Santa Catarina (Florianópolis, para ser mais exato) ainda havia alguma resistência. Com o controle do Sul, a aguardada atuação era a invasão sobre São Paulo. A ação seria estabelecida a partir de Itararé. Para lá partiu Getúlio Vargas e, ao longo da jornada, contava com uma entusiasmada população que, cada vez mais, apoiava o sonho revolucionário. A batalha de Itararé, no entanto, nunca ocorreu. No dia 24 do mesmo mês, os militares no Rio de Janeiro já haviam deposto o presidente, que aceitou sair do poder, mesmo após tentar certa resistência, e formado uma junta provisória de governo. Os 3 mil homens que acompanhavam Getúlio Vargas, de trem, prosseguiram sua viagem para o Rio de Janeiro. Em 3 de novembro de 1930, assumiu o poder, em um traje tipicamente gaúcho, após amarrar seu cavalo no obelisco da Avenida Rio Branco. Estava acabada qualquer possibilidade de posse do candidato vitorioso daquele ano – Júlio Prestes pediu asilo na embaixada britânica. Figura 6 – O paulista Júlio Prestes, que, apesar de eleito em 1930, não chegou a assumir Neto (2012) lembra que o dia da posse do novo presidente foi o mesmo de 39 anos antes, quando Deodoro da Fonseca decidiu fechar o Congresso para garantir a ele poderes absolutos. Da mesma forma, Getúlio dissolvia o Congresso e suspendia a Constituição. No entanto, sabia que a Revolução de 1930 estava repleta de apoio popular e militar, capaz de contagiar o sonho por uma mudança profunda a partir de então, como a poesia do jornal de época demonstrava: 21 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 REPÚBLICA NOVA E REPÚBLICA LIBERAL Mal despontara o Sol republicano Quando, após um político zunzum, A melodia se deu: findava o ano Mil oitocentos e noventa e um No Senado e na Câmara, o Deodoro, Aos pais da Pátria interditava o ingresso, E em ácidos de enxofre, azoto e cloro, Num momento dissolve-se o Congresso Mas, em breve, o defunto ressuscita, Volta a bandeira dos politicantes, Os tempos mudam, mas é a mesma escrita, E tudo volta a ser o que era antes. Não seja o caso tal reproduzido Morto, bem morto, não reviva o bruto, Pois o Congresso agora dissolvido Será sempre um Congresso dissoluto (NETO, 2012, p. 521-522). 1.1 Significados da Revolução de 1930 A Revolução de 1930, durante muito tempo, foi espaço de amplo debate historiográfico no país. Afinal, foi esse o momento de muitos sonhos de mudanças, e, acima de tudo, para alguns, de novas estruturas socioeconômicas para o país. Promovendo um grande balanço a respeito do tema, Fausto (1986) demonstra que foi feita uma associação do movimento com a relação econômica do país: ou seja, para alguns autores, houve a mudança da estrutura econômica, sendo que os grandes latifundiários se tornaram parte da burguesia industrial e também que as análises se inclinaram para a importância da atuação do tenentismo como um fenômeno militar com ação política voltada para as classes médias. Desconstruindo esses modelos, o autor demonstra que a incipiente burguesia do país oscilava entre as propostas revolucionárias e a neutralidade, já que estava bastante relacionada aos interesses dos latifundiários e também do imperialismo internacional. É pertinente notar que no dia 30 de julho de 1930, a burguesia lançou um manifesto de apoio formal à candidatura de Júlio Prestes, inclusive em busca de uma coesão para o grupo todo seguir essa determinação, que dizia: “para os industriais, a vitória da chapa nacional de Júlio Prestes-Vital Soares representa a integral execução do programa financeiro do atual Governo da República” (FAUSTO, 1986, p. 29-30). Esse era um movimento bastante evidente em São Paulo – já principal palco industrial do país. Há de se destacar que nem o Partido Democrático (PD), como vimos, cisão do partido tradicional paulista (PRP), representava os interesses industriais – em vários momentos, indicavam que tinham como plataforma a manutenção dos negócios agrícolas. Assim, [...] na realidade, o Partido Democrático não expressa o impulso de “áreas modernizantes”, supostamente identificadas com a indústria, mas uma 22 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Unidade I aliança das classes médias de São Paulo com elementos descontentes do setor agrário (FAUSTO, 1986, p. 38). Também a própria ideologia da Aliança Liberal não simpatizava com uma clara visão voltada à industrialização, pois não havia propostas claras como o protecionismo alfandegário, incentivos fiscais ou mesmo investimento estatal na indústria de base. Portanto, A Revolução de 1930, seja sob a forma direta de intervenção da fração de classe, seja sob a forma mediada de uma “revolução do alto”, não foi um movimento que tenha conduzido a burguesia industrial à dominação política (FAUSTO, 1986, p. 50). Quanto ao tenentismo, estabelecia-se como um movimento difuso, em torno de uma ampla gama de perspectivas nada claras. Havia um ideal de salvaçãonacional em busca da moralização política – com a introdução do voto secreto, mas, ao mesmo tempo, após o ataque inicial às tradicionais oligarquias, agora o conteúdo se atinha à centralização administrativa, tendo como necessidade básica o aumento da força do Poder Executivo. O tenentismo pode ser também classificado como um movimento elitista, compreendido a partir do afastamento de populares de suas ações, apesar de se declarar vagamente nacionalista, envolto, basicamente, na defesa da pátria amada contra qualquer entrega de interesses. Afinal, foi justamente isso uma das grandes acusações aos governos anteriores a Washington Luís (ou seja, Epitácio Pessoa e Artur Bernardes). Claro, que poderiam ocorrer conexões entre determinados interesses tenentistas com os da classe média e da burguesia, por exemplo, o voto secreto ou mesmo a garantia de direitos individuais. No entanto, os acontecimentos da década de 1930 demonstraram que também houve grande radicalização política que resultou nos movimentos da AIB e ANL. Pode-se perceber que parte dos tenentes que participam do poder a partir da década de 1930 acabou por estabelecer um programa incipiente de reformas que contribuíam para o desenvolvimento socioeconômico das classes médias e até para a ascensão burguesa. A explicação de Fausto (1986, p. 101) acerca do movimento o associa diretamente ao quadro maior, latino-americano, em torno da crise de 1929: Dentro do quadro mais amplo de toda a América Latina, a ocorrência de 11 movimentos revolucionários, predominantemente militares, em apenas dois anos [Argentina (09/1930); Brasil, (10/1930); Chile (06/1932); Equador (08 e 10/1931 e 08/1932); Peru (08/1930 e 02 e 03/1931); Bolívia (06/1930); República Dominicana (02/1930); Guatemala (12/1930)], é bastante significativa. Não se pode reduzir estes movimentos a uma identidade que em nada elucidaria episódios de sentido diverso, como a Revolução de 1930, no Brasil, e o golpe do general José Uriburu, na Argentina. Porém, em sua base está o desajuste provocado nos países dependentes pela crise mundial 23 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 REPÚBLICA NOVA E REPÚBLICA LIBERAL que atinge os preços dos produtos de exportação e impõe um novo arranjo interno, nas condições específicas de cada país. Ao mesmo tempo, no entanto, a participação das classes médias não quer dizer que a ruptura da ordem foi diretamente, e tão somente, direcionada para suas prioridades. Ou seja: O movimento de 1930 não pode ser entendido sem a intervenção das classes médias, mas não é uma revolução destas classes, nem no sentido de que elas sejam o setor dominante no curso da revolução, nem de que sejam seus principais beneficiários. Não se nega com isto que certos traços da orientação do governo Vargas, especialmente o maior intervencionismo do Estado, tenham permitido a ampliação de oportunidades para as classes médias e a formação de novos segmentos no seu interior (FAUSTO, 1986, p. 84). Portanto, analisar a Revolução de 1930 requer mais do que as linhas tradicionais que a historiografia já trilhou. A crise econômica acabou por permitir que as dissidências regionais, que já existiam, mas que não conseguiam voz e união para um movimento firme e efetivo, conseguissem, finalmente, demonstrar força. Como brilhantemente sintetizou, mais adiante, em seus estudos: Os vitoriosos de 1930 compunham um quadro heterogêneo, tanto do ponto de vista social como político. Eles tinham-se unido contra um mesmo adversário, com perspectivas diversas: os velhos oligarcas, representantes típicos da classe dominante de cada região do país, desejavam apenas maior atendimento à sua área e maior soma pessoal de poder, com um mínimo de transformações; os quadros civis mais jovens inclinavam-se a reformular o sistema político e se associaram transitoriamente com os tenentes, formando o grupo dos chamados “tenentes civis”; o movimento tenentista – visto como uma ameaça pelas altas patentes das forças armadas – defendia a centralização do poder e a introdução de algumas reformas sociais; o Partido Democrático – porta-voz da classe média tradicional – pretendia o controle do governo do estado de São Paulo e a efetiva adoção dos princípios do Estado liberal, que aparentemente asseguraria seu predomínio (FAUSTO, 2004, p. 326). Corrobora com essa interpretação a necessidade de avaliarmos a Revolução de 1930 em torno das várias forças políticas regionais e de suas dissidências com o fim da política dos governadores e dos acordos do Café com Leite. Skidmore (2010, p. 44-45) analisou: No fim das contas, muitos dissidentes da elite política estavam ansiosos para usar o golpe em seu próprio benefício. Sua dissensão tinha, em muitos casos, surgido de rivalidades políticas rotineiras nos estados e entre os estados. Líderes de clãs de oposição na política estadual, por exemplo, ficaram felizes por ganhar poder localmente por meio de um golpe militar no Rio de Janeiro. Em âmbito nacional, os controladores de máquinas 24 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Unidade I políticas em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul, líderes da Aliança Liberal, ficaram furiosos com Washington Luís por tentar colocar outro paulista, Júlio Prestes, no palácio presidencial. Eles apoiaram a “revolução” não por desejarem mudanças sociais e econômicas básicas, mas como justificativa por terem recorrido à revolta armada contra os “da situação”, que tinham ignorado seus interesses nas negociações para escolher um candidato do “governo” em 1929. Esses políticos frustrados, tanto nos estados grandes como nos menores, dariam a indispensável continuidade entre a República Velha e os sucessivos estágios da Era Vargas. Exemplo de aplicação Perceba, após o balanço historiográfico do tema Revolução de 1930, que é possível problematizar o porquê do termo do movimento ter se mantido na história e na memória como “revolução”. Procure pesquisar os diferentes significados dessa temática tão comum em história e levante quais são os pontos de defesa dessa designação e quais são os contrários. 2 A FORMAÇÃO DO POPULISMO 2.1 Industrialização tardia Para compreender as relações políticas do Brasil a partir da desintegração da República Oligárquica, tendo como marco a Revolução de 1930 e seus sonhos, é necessário inserir o contexto socioeconômico e perceber o movimento maior, sentido em toda a América Latina, em maior ou menor intensidade, com reflexos evidentes no mundo contemporâneo. Figura 7 – Uma das marcas mais comuns do desenvolvimento econômico na América Latina foi a exclusão social. O processo abrupto não criou condições de melhoria na qualidade de vida para todos. Na foto em destaque, perceba um cenário bastante comum de várias cidades do nosso continente 25 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 REPÚBLICA NOVA E REPÚBLICA LIBERAL O mundo capitalista foi reconfigurado a partir das inúmeras transformações que a Revolução Industrial promoveu, nos idos da segunda metade do século XVIII, tendo como palco inicial a Inglaterra. Na prática, a introdução da máquina no processo produtivo alcançou um exponencial crescimento da produção e, consequentemente, trouxe novas relações de trabalho – formadoras do proletariado, crescimento do meio urbano, busca constante por mercado consumidor e uma inovadora maneira de se viver –, com a transformação do tempo, até então voltado aos ciclos da natureza e suas limitações, para a constância da capacidade produtiva das máquinas. Este foi um processo que só cresceu e modificou as relações mundiais em maior ou menor proporção.Na América Latina, não foi diferente. Aqui, diversas contradições emanaram. A tradição colonial da dependência ao setor primário-exportador, sobretudo relacionado ao latifúndio de bases escravistas ou de manutenção de uma mão de obra bastante explorada, pouco foi alterada ao longo do século XIX. No Brasil, particularmente, o impulso surgiu dos sonhos desenvolvidos por Irineu Evangelista de Sousa (1813-1889), o Barão de Mauá. O país passou a contar com inovações urbanas e até mesmo uma metalúrgica. No entanto, mesmo após ter se tornado o homem mais rico do país, chegando a ter uma fortuna acumulada maior do que a de todo o Estado brasileiro, suas ações não conseguiram atingir um status revolucionário. Muito pelo contrário: o surto industrial durou pouco e não foi apoiado pelo Império. Aqui havia um embate entre, de um lado, o modernismo e, de outro, a famosa vocação natural, agrícola exportadora, em grande pujança com o café – e bastante relacionada às tradições das elites do país desde o período colonial. Há de se destacar que esse exemplo se encaixa nos países vizinhos, em maior ou menor intensidade. Dentro de um quadro mais geral, havia uma Divisão Internacional do Trabalho (DIT), em que caberia aos países da Europa o desenvolvimento dos produtos industriais e aos países da América Latina a produção de alimentos e matéria-prima. Não é à toa, assim, que a região em questão nunca tenha passado por uma revolução industrial – quando utilizamos esse termo, precisamos ter em mente uma relação abrupta de transformações capazes de, rapidamente, alterar o modelo econômico e estrutural do país e com imediatos reflexos nas relações socioeconômicas. O que se viu na América Latina foi uma industrialização tardia a partir de meados do século XIX. Desde as últimas décadas do século XIX e, principalmente, no início do século XX, as indústrias tiveram significativo crescimento, inicialmente, com a participação do capital excedente das atividades primárias ou mesmo do investimento dos grandes centros mundiais como a Inglaterra, a França, a Alemanha ou os Estados Unidos. De qualquer forma, predominava a importação de produtos industriais, mantendo uma visão de livre-cambismo, ou seja, ausência de tarifas alfandegárias protecionistas para assegurar que as indústrias nacionais pudessem crescer e competir com as internacionais. Esse foi um fator muito atrelado à preponderância do capitalismo inglês desde o processo da gênese dos Estados Nacionais na América Latina. No século XX, as crises internacionais – Primeira Guerra Mundial (1914-18), Crise de 1929 e Segunda Guerra Mundial (1939-45) – abriram novos caminhos para o crescimento industrial. Havia a necessidade de substituir as importações, já que os países produtores europeus estavam com problemas – nas Guerras Mundiais, essas nações passaram a concentrar seus esforços produtivos na indústria bélica e nos suprimentos voltados ao confronto armado. 26 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Unidade I Há de se destacar que a demanda já estabelecida do mercado interno abria condições garantidas de vendas e, ao mesmo tempo, o contexto internacional facilitava o trato da comercialização de matérias-primas, alimentos e minérios, gerando rendas para que a indústria crescesse. A Segunda Guerra Mundial, particularmente, trouxe ainda mais um elemento a se considerar: os Estados Unidos se voltaram para a América Latina como parceiros, fornecedores de capital e de tecnologia, facilitando a concretização de projetos industriais até então inimagináveis na periferia do continente. Já na Crise de 1929, a desarticulação do sistema capitalista mundial fez com que os países da América Latina não tivessem divisas para adquirir produtos internacionais. Com isso, o Estado passou a promover investimentos nos setores de base para procurar alcançar o avanço industrial local e garantir o abastecimento do país. Também houve certo papel de destaque à migração de capitais dos países que sofriam diretamente com as seguidas falências resultantes da quebra do sistema financeiro no centro nevrálgico do capitalismo. Os palcos centrais do processo de desenvolvimento de industrialização tardia foram Argentina, Brasil, México e, depois, Chile. Na década de 1920, esses países chegaram a ter 60% dos 100 milhões de habitantes da América Latina. No entanto, a produção industrial, nesses momentos, jamais chegou a ter um impacto profundo de mudanças na estrutura econômica – claro que passou a ter certa relevância, mas muito inferior aos grandes centros econômicos do capitalismo mundial. De qualquer forma, é evidente que, a partir dali, a população urbana passou a ser um grupo em franca expansão, fortalecendo o desenvolvimento de demandas políticas – o que criou fenômenos políticos bastante semelhantes ao longo do século XX. A população ainda vivia em sua maioria no campo, mas algumas grandes cidades já firmavam sua presença, ostentando os símbolos da modernidade com altos edifícios, carros, bondes, telefone e iluminação elétrica nas ruas. Buenos Aires, onde o metrô fora inaugurado em 1913, possuía por volta de 2 milhões de habitantes em 1930; a Cidade do México, que passara por uma ampla reforma urbana no começo do século, passava de 1 milhão de pessoas em 1930; do mesmo modo, o Rio de Janeiro, também reformado, tinha mais de 1 milhão em 1920. Mas outras cidades menores já despontavam como futuras metrópoles, tais como Santiago do Chile, Montevidéu, Bogotá, Lima e a brasileira São Paulo (PELLEGRINO; PRADO, 2014, p. 116). A população urbana era ou proveniente do campo, em busca de melhores condições – já que a área rural era dominada por elites opressoras – ou oriunda de outros países, principalmente na Argentina e no Brasil, já que muitos imigrantes europeus que chegaram a esses países não foram para as áreas de produção agrícola. O processo foi bastante conflituoso. Havia a chegada, cada vez maior, de belíssimos empreendimentos, como a instalação de novos sistemas de transporte, de iluminação pública, ou mesmo o crescimento das relações financeiras e, consequentemente, do setor de serviços. Assim, formavam-se as relações da classe média. 27 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 REPÚBLICA NOVA E REPÚBLICA LIBERAL Figura 8 – A cena de uma concentração urbana e com diversas lojas em seu entorno passou a ser cada vez mais comum na América Latina do século XX No entanto, a modernidade foi um processo caro para boa parte da população. As vias de acesso ao centro foram se tornando dispendiosas e, portanto, não permitiam a todos viverem ali. Muitos, com isso, acabaram por se instalar na periferia das cidades, construindo suas próprias moradias desordenadamente. Foi, assim, uma urbanização sem planejamento ou infraestrutura. Figura 9 – A ilustração do crescimento rápido da periferia das cidades demonstra regiões, muitas vezes, sem acesso à infraestrutura urbana relacionada ao saneamento básico e aos serviços essenciais como energia elétrica e água encanada Na prática, a indústria do Brasil, até os anos 1930, estava limitada à esfera de bens de consumo têxteis e alimentícios. Outro setor importante, a indústria de base ou pesada – aquela que dá suporte para a industrialização, como as siderúrgicas, metalúrgicas, hidroelétricas etc. – praticamente inexistia. Havia pouco capital e, portanto, pouco desenvolvimento; logo, era difícil encontrar concentrações industriais. 28 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Unidade I Quadro 1 – Tipos de indústria e valor de produção no Brasil (1920) Tipo de indústria Valor da produção em % Alimentação40,2 Têxteis 27,6 Vestuário e toucador 8,2 Produtos químicos e análogos 7,9 Outros grupos 16,1 Total 100 Fonte: Fausto (1986, p. 20). Com o crescimento industrial houve o aumento da população urbana, que passou a exigir, cada vez mais, melhorias sociais. Afinal, o sistema de trabalho nas fábricas era extenuante. As jornadas eram de 12-14 horas, sem qualquer descanso ou folga remunerada, os ambientes eram insalubres, os abusos eram constantes e não havia qualquer previdência para aposentadoria ou acidente de trabalho, como também proteção ao trabalho feminino e infantil. Com isso, a luta pelos benefícios trabalhistas formou-se no país, sobretudo, no século XX, sob a liderança dos imigrantes italianos e espanhóis, de inspiração anarquista – principalmente da vertente anarcossindicalista. O maior movimento de luta foi a famosa Greve de 1917, que começou em São Paulo e irradiou para o interior paulista e para outras capitais. A repressão, no entanto, foi violentíssima. Os líderes foram deportados, as associações e jornais fechados e para atenuar as demandas, apenas aumentos salariais foram concedidos. Portanto, em torno da ascensão política de Getúlio Vargas, sob os auspícios da esperança de um novo país iniciado com a Revolução de 1930, acreditava-se que as demandas dos trabalhadores seriam atendidas e que as relações sociais seriam mais bem estabelecidas. 2.2 O populismo Não é à toa que Getúlio Vargas inaugura no país uma política populista. A questão central desse modo de governo, típico da América Latina nesse processo de industrialização tardia, é caracterizado a partir de um Estado forte, tendo como elemento central um líder carismático e demagogo, que, com aparência conciliatória, manipula as massas urbanas, para se perpetuar no poder. Acaba, assim, por aglutinar os interesses mais variados, em torno de um momento histórico com o sonho do crescimento industrial, de reformas transformadoras e beneficiadoras do povo, além de angariar o nacionalismo econômico – em torno, num primeiro momento, de interesses de parte dos militares. Há de se destacar ainda que tal prática vem acompanhada sempre de um jogo “de cima para baixo”, garantindo o apaziguamento das tensões sociais, com a paz social, a harmonia, o bem-estar. Os mais importantes líderes foram Getúlio Vargas no Brasil, de 1930-45 e 1951-54, Lázaro Cárdenas no México, de 1934-40, Juan Domingos Perón na Argentina, de 1946-51, ou ainda, em proporções menores, Velasco Ibarra no Equador, em vários momentos entre 1934-1972, e Vitor Paz Estenssoro na Bolívia, em 1952. 29 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 REPÚBLICA NOVA E REPÚBLICA LIBERAL Claro que perpetuar uma visão conceitual da política na América Latina pode diminuir a visão de que há especificidades nos processos e variações de acordo com cada político, cada momento histórico e cada processo que se viu ao longo do tempo. Apesar disso, por outro lado, é uma temática bastante pertinente e duradoura. É interessante notar que nos anos iniciais dessa forma de fazer política, o termo “político” era visto com bastante simpatia. Ou seja, o político, assim caracterizado, era um representante direto do povo, dos interesses dos mais sofridos e daqueles que precisam que o Estado atue em seu favor. Nesse sentido, completa-se uma característica importante: o paternalismo intrínseco ao populismo. No entanto, com o passar do tempo, sobretudo em torno de seus opositores, o termo passou a ter conotação negativa relacionada àqueles que enganam o povo com promessas que, na prática, jamais serão cumpridas. Figura 10 – No Brasil, o populismo foi uma política bastante atrelada ao crescimento dos grandes centros urbanos como o Rio de Janeiro, capital do país de 1763-1960 É importante, nesse sentido, a crítica produzida por Gomes (2013, p. 34-35): Não sem razão, por ganhar tal abrangência, essa interpretação acabou por perder sua precisão conceitual, transformando-se em um adjetivo – da política e dos políticos – sempre com conotação negativa, pejorativa, acusatória. A inconsistência teórica e histórica da utilização de uma categoria como essa reside na adoção de uma perspectiva simplista de construção de um modelo para pensar relações sociais de dominação, em que um dos termos é praticamente anulado, deixando de ser um sujeito histórico atuante. Dessa forma, não se percebe que, no interior mesmo das relações entre os dominantes, bem como entre os dominados, existem hierarquias de poder. Alinhamentos automáticos entre os dominados contra os dominantes, e vice-versa, devem ser afastados, e uma dinâmica política de alianças e oposições muito mais complexa e sofisticada se coloca para a análise historiográfica. Tal análise, sem excluir o conflito aberto (sob várias formas), passa a atentar para ações que têm marcas mais sutis, envolvendo negociações e produzindo alinhamentos aparentemente inusitados. Essa 30 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Unidade I abordagem, contudo, não deve ser entendida (como às vezes o é) como uma tentativa de eliminar ou minimizar as tensões e oposições sempre existentes nas relações de dominação. Ao contrário, ela é uma tentativa de sofisticar o tratamento dessas relações, ampliando seu escopo, até para evidenciar que, em certas circunstâncias, pode haver convergência de interesses entre dominantes e dominados, pode haver pacto e negociação políticos. O poder, nessa perspectiva teórica, não é um monopólio do dominante, existindo também no espaço dos dominados, o que não elimina a situação de desigualdade, muitas vezes radical, entre eles. No caso do Brasil, um dos maiores legados dessa política de Getúlio Vargas foi promover a visão de uma relação intrínseca do Estado com o Presidente da República – que se perpetua no imaginário de muitos cidadãos do país. Isso pode ser visto pela rápida atribuição da relação de benefícios ou malefícios do país ao que ocupa o cargo máximo do Executivo, mas deixa de lado a preocupação com as medidas, diretrizes e fiscalizações do Legislativo ou mesmo com as decisões tomadas pelo Judiciário. Observação Alguns analistas contemporâneos compreendem que o populismo foi uma prática contínua em nosso país a partir de então, inclusive em outros níveis políticos além do Executivo. Exemplo de aplicação Procure pesquisar quais são as análises promovidas a respeito do populismo, examinando os jornais de maior circulação de nosso país. Investigue quais sãos os políticos assim denominados tanto na República Liberal (1946-1964) como na Ditadura Militar (1964-1985) ou mesmo na Nova República (a partir de 1985). 2.3 A biografia de Getúlio Dorneles Vargas Getúlio Dorneles Vargas nasceu em 1882, em São Borja (RS), em uma família de estancieiros bastante associada à tradição militar e à política local. Seu pai foi um bravo combatente na Guerra do Paraguai e depois se envolveu nas lutas contra os federalistas, compondo o quadro do Partido Republicano Rio-grandense (PRR) na República Oligárquica. Getúlio teve um período de investimento na carreira militar, mas logo percebeu que a política o atraía muito mais. Em 1907, formou-se, pela Faculdade de Direito de Porto Alegre, como bacharel em Direito. Não muito tempo depois, ao longo da década de 1920, foi eleito para seguidos cargos políticos: deputado estadual, deputado federal e líder do grupo gaúcho. Em 1926, progrediu na carreira federal ao tornar-se ministro da Fazenda do governo de Washington Luís, até 1927, quando pôde aprender características da formação de gabinete e do plano de saneamento financeiro – ainda que tenha saído 31 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr amaç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 REPÚBLICA NOVA E REPÚBLICA LIBERAL do cargo a tempo de não cair sobre si a impopularidade que logo se veria. A seguir, voltou ao seu estado, pois se tornou presidente do Rio Grande do Sul (1927-1930), cargo que ocuparia até se candidatar à presidência na chapa da Aliança Liberal contra Júlio Prestes, intervalo em que se mostrou um astuto político de conciliação entre as facções políticas intempestivas que ali se mantinham. Figura 11 – Getúlio Vargas (1882-1954), o presidente que mais tempo ficou no poder no Brasil, transformou a política nacional, e teve sua ascensão marcada pela força militar demonstrada na Revolução de 1930 Sua figura política foi fundamental e a mais importante para o Brasil do século XX. Ao longo de seu domínio da política, se mostrou multifacetado, capaz de garantir apoio de diversos grupos, criar projetos variados, perspicaz nas relações internacionais, ardil nos discursos, preocupado com os inimigos. Acima de tudo, para muitos, um grande amante do poder – um ditador. Para outros, no entanto, um promotor de um projeto econômico nacional com visão de estadista que, se completado, levaria o país ao desenvolvimento capitalista. Não menos importante, o grande garantidor dos direitos trabalhistas, daí sua alcunha mais famosa, “pai dos trabalhadores do Brasil”. A ligação direta e constante de Vargas aos trabalhadores urbanos, no entanto, não deixou de lado seu tom conciliatório, para alguns, às vezes, até esquecido, mas cientes de que havia projetos de desenvolvimento de apoio ao grupo de elite. Com isso, ficou conhecido como “pai dos pobres” e, ao mesmo tempo, “mãe dos ricos”. Inegavelmente, seu governo acabou sendo associado à modernidade e ao fim de um Brasil dominado pelo modelo tradicional colonial, o latifúndio exportador. Ainda que não perdesse de vista o setor agrário em vários momentos, e nem sua reconfiguração de forças, promovia o discurso progressista bastante atrelado à industrialização e à consequente urbanização. Moldou um sistema de Estado que ainda se discute bastante no Brasil contemporâneo, ou seja, a intervenção do estado na economia para garantir o desenvolvimento econômico, ou mesmo as relações sociais daí estabelecidas. Se metamorfoseando de tudo que já havia vivido e observado em sua terra natal, agora estava estabelecido como um “homem do novo” que conquistaria amores daqueles de quem tomara o poder, ou mesmo dos que, por certo período, foram opositores. Portanto, deixou, com o passar do tempo, de ser um típico gaúcho, como se apresentou na posse após a Revolução de 1930, para se tornar um brasileiro e, diga-se de passagem, ferrenho defensor da unidade nacional dali em diante. 32 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Unidade I Saiba mais Um dos instrumentos mais utilizados atualmente para relembrar a vida de grandes estadistas são os memoriais, espaços que trazem memórias históricas e pessoais, onde há a possibilidade de se promover discussões e de se perceber as tensões pessoais, as reponsabilidades da função, e, sobretudo, os traços pessoais de cada um deles. Nesse sentido, não deixe de visitar o Memorial Getúlio Vargas. Seu endereço eletrônico é: <http://www0.rio.rj.gov.br/memorialgetuliovargas/>. Procure analisar o amplo acervo e tecer as relações estabelecidas aqui com o material disponibilizado no memorial. Outra fonte importante de memória é o Centro de Pesquisa e Documentação Histórica Contemporânea do Brasil (CPDOC), gerido pela Faculdade Getúlio Vargas (FGV). O CPDOC possui um enorme centro de imagens e de documentos oficiais capazes de complementar, em grande medida, as discussões aqui estabelecidas e de demonstrar ao historiador em formação o quanto as fontes primárias são interessantes para nós. Seu site oficial é: <http://cpdoc.fgv.br/>. 2.4 Governo Provisório de Getúlio Vargas – 1930-1934 A primeira necessidade de Getúlio Vargas era reestruturar a dinâmica do Estado para contemplar os diversos interesses que a Revolução de 1930 propagou. E isso envolvia, diretamente, acabar com todas as instituições relacionadas ao passado oligárquico. Formava-se uma relação básica e bastante comum de que a Revolução veio para acabar com o velho, em busca da modernização, ou seja, do novo. Logo de início, na posse de Getúlio Vargas, no dia 3 de novembro de 1930, lhe foram dados amplos poderes – garantidos pela imposição da Lei Orgânica –, o que foi justificada pelo imperativo de mudanças de todas as estruturas do país, que envolvia a reestruturação econômica, a otimização do aparelho burocrático, o incentivo à diversificação agrícola e às novas áreas da economia, a anistia dos tenentes e a moralização do país (principalmente no que se refere às evidentes eleições fraudulentas permitidas até então). 33 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 REPÚBLICA NOVA E REPÚBLICA LIBERAL Com isso, a anistia, para todos os movimentos ocorridos até então, foi concedida em 8 de novembro. Já no dia 11 do mesmo mês, o ministro da Justiça, Oswaldo Aranha, amigo próximo do presidente, lia o Decreto nº 19.398, que estabelecia, em seus pontos principais: Art. 1º O Governo Provisório exercerá discricionariamente, em toda sua plenitude, as funções e atribuições, não só do Poder Executivo, como também do Poder Legislativo, até que, eleita a Assembleia Constituinte, estabeleça esta a reorganização constitucional do país; Parágrafo único. Todas as nomeações e demissões de funcionários ou de quaisquer cargos públicos, quer sejam efetivos, interianos ou em comissão, competem exclusivamente ao Chefe do Governo Provisório. Art. 2º É confirmada, para todos os efeitos, a dissolução do Congresso Nacional das atuais Assembleias Legislativas dos Estados (quaisquer que sejam as suas denominações), Câmaras ou assembleias municipais e quaisquer outros órgãos legislativos ou deliberativas, existentes nos Estados, nos municípios, no Distrito Federal ou Território do Acre, e dissolvidos os que ainda o não tenham sido de fato. [...] Art. 4º Continuam em vigor as Constituições Federal e Estaduais, as demais leis e decretos federais, assim como as posturas e deliberações e outros atos municipais, todos; porém, inclusive as próprias constituições, sujeitas às modificações e restrições estabelecidas por esta lei ou por decreto dos atos ulteriores do Governo Provisório ou de seus delegados, na esfera de atribuições de cada um. Art. 5º Ficam suspensas as garantias constitucionais e excluída a apreciação judicial dos atos do atos do Governo Provisório ou dos interventores federais, praticados na conformidade da presente lei ou de suas modificações ulteriores. [...] Art. 11. O Governo Provisório nomeará um interventor federal para cada Estado, salvo para aqueles já organizados; em os quais ficarão os respectivos presidentes investidos dos Poderes aqui mencionados. § 1º O interventor terá, em cada Estado, os proventos, vantagens e prerrogativas, que a legislação anterior do mesmo Estado confira ao seu presidente ou governador, cabendo-lhe exercer, em toda plenitude, não só o Poder Executivo como também o Poder Legislativo. 34 Re vi sã o: M ar ci lia - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 8/ 02 /1 6 Unidade I [...] Rio de Janeiro, 11 de novembro de 1930, 109º da Independência e 42º da República. GETÚLIO VARGAS. Oswaldo Aranha. José Maria Whitaker. Paulo do Moraes Barros. Afranio de Mello Franco. José Fernandes Leite de Castro. José Isaias de Noronha (BRASIL, 1930a). Figura 12 – Oswaldo Aranha anuncia, em 11 de novembro de 1930, a dissolução do Congresso
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