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Universidade Estadual de Campinas Instituto de Estudos da Linguagem HL081: Estudos gramaticais: sintaxe HL125: Teoria Gramatical I Departamento de Linguística Profa. Dra. Charlotte Galves PED: Paulo Ângelo ___________________________________________________________________________ A noção de constituência 1. Conceito de constituência em sintaxe gerativa Constituinte: unidade sintática constituída hierarquicamente, também chamada sintagma. 1.1 Noção de Sintagma (Phrase) A sentença é formada por constituintes hierarquicamente organizados. Os constituintes da sentença podem estar imediatamente ligados ao verbo ou não. “Um sintagma é uma unidade sintática, constituída hierarquicamente, embora se apresente aos olhos como uma sequência de letras ou aos ouvidos como uma sequência de sons” (MIOTO et al., 2013, p.47). "O sintagma é um constituinte menor que uma oração, e composto de uma ou mais palavras" (PERINI, 2006, p. 94). "O caráter intuitivo da divisão em constituintes é muito importante para a análise, e se relaciona com o fato de que cada um deles tem um significado coeso" (PERINI, 2006, p.95). "A noção de sintagma é básica em todas as teorias linguísticas. Na gramática tradicional, ela é usada mas não explicitada, de maneira que soa como uma novidade para quem começa a estudar linguística" (PERINI, 2006, p.100). 1.1.1 Testes clássicos de constituência "Os sintagmas têm coesão semântica e formal. Semântica porque nos dão a impressão de alguma coisa que 'faz sentido', e essa impressão pode ser explicitada com certa clareza. E formal porque, em geral, podem ocorrer em determinadas posições sintáticas bem definidas, com função específica" (PERINI, 2006, p.100). (i) teste de pronominalização: substituir todo o constituinte por um pronome - A Juliana tomou um café com leite na cantina do IEL. [Ela] tomou um café com leite na cantina do IEL. A Juliana tomou [ele] na cantina do IEL A Juliana tomou um café com leite [lá]. (ii) teste da topicalização: mover o constituinte para a esquerda - A Juliana tomou um café com leite na cantina do IEL. [um café com leite] que a Juliana tomou na cantina do IEL. [na cantina do IEL] que a Juliana tomou um café com leite. (iii) teste da clivagem: É...que - A Juliana tomou um café com leite na cantina do IEL. Foi [a Juliana] que tomou um café com leite na cantina do IEL. Foi [um café com leite] que a Juliana tomou na cantina do IEL. Foi [na cantina do IEL] que a Juliana tomou um café com leite. * Foi [do IEL] que a Juliana tomou um café com leite na cantina. * Foi [na cantina] que a Juliana tomou um café com leite do IEL. (iv) teste da interrogação: somente um constituinte completo pode ser questionado; isto é: a resposta ou a pergunta deve conter todo o constituinte, sem separá-lo. - A Juliana tomou um café com leite na cantina do IEL. - A Fernanda comprou o livro do Chomsky na livraria da Unicamp. Quem tomou um café com leite na cantina do IEL? [a Juliana] O que a Juliana tomou na cantina do IEL? [um café com leite] Onde a Juliana tomou um café com leite? [na cantina do IEL] Outros exemplos: a) Eu conheci uma atriz da Inglaterra. Para checar a constituência, pode-se aplicar os testes da pronominalização, da topicalização, da clivagem e da interrogação. Vamos checar se “a atriz” é um constituinte independente de “da Inglaterra”. 1 - Aplicação do teste de pronominalização: substituindo “a atriz” por um pronome, temos: “Eu conheci ela da Inglaterra”, que é uma sentença agramatical. Outra tentativa: substituir toda a sequência “a atriz da Inglaterra” por um pronome. Resultado: “Eu conheci ela”. A frase é boa. Segundo o teste da pronominalização, “a atriz” não é um constituinte independente de “da Inglaterra”. Então, “a atriz da Inglaterra” é um constituinte. 2 - Aplicação do teste da topicalização: é possível topicalizar toda a sequência “a atriz da Inglaterra”, gerando a frase “A atriz da Inglaterra, eu conheci”. Mas não é possível topicalizar apenas “a atriz”, deixando “da Inglaterra” na posição original. A frase “A atriz, eu conheci ___ da Inglaterra”. (Obs.: o traço rasteiro serve apenas para mostrar que essa posição está vazia.). Esse teste confirma que “a atriz” não é um constituinte independente de “da Inglaterra”. Então, “a atriz da Inglaterra” é um constituinte. 3 - Aplicação do teste da clivagem: é possível clivar a sequência “a atriz da Inglaterra”, mas não soa tão bem a clivagem de apenas “a atriz”. A frase “Foi a atriz da Inglaterra que eu conheci” é boa. Já “Foi a atriz que eu conheci da Inglaterra” é ruim. Isso confirma que “a atriz” não é um constituinte independente de “da Inglaterra”; “a atriz da Inglaterra” é um constituinte sintático. 4 - Aplicação do teste da interrogação: é possível transformar a frase em uma pergunta recaindo sobre toda a sequência “a atriz da Inglaterra”. A frase “Quem eu conheci?” (ou “Quem você conheceu?”), feita sobre a frase original, tem como resposta “A atriz da Inglaterra” e não apenas “a atriz”, confirmando que a sequência inteira é um constituinte. b) Eu conheci uma atriz na Inglaterra. Para verificar a constituência, temos os mesmos quatro testes anteriores. Mas veremos que os resultados são opostos. 1 - Aplicação do teste de pronominalização: aplicar a pronominalização apenas a “a atriz” dá um bom resultado. A frase “Eu conheci ela na Inglaterra” é boa, o que mostra que “a atriz” forma um constituinte independente de “na Inglaterra”. 2 - Aplicação do teste de topicalização: é possível topicalizar a sequência “a atriz”, como na frase “A atriz, eu conheci na Inglaterra”, o que confirma que “a atriz” forma um constituinte independente de “na Inglaterra”. 3 - Aplicação do teste de clivagem: é possível clivar a sequência “a atriz”, como em “Foi a atriz que eu conheci na Inglaterra”, confirmando que “a atriz” forma um constituinte independente de “na Inglaterra”. 4 - Aplicação do teste da interrogação: à pergunta “Quem você conheceu na Inglaterra?”, cabe a resposta “a atriz”, confirmando que “a atriz” forma um constituinte independente de “na Inglaterra”. Note que o resultado permanece o mesmo se a pergunta for só “Quem você conheceu?”. Reconhecendo constituintes com um sentido, ambíguos e não interpretáveis: (a) forma = 1 sentido → → → → → João tomou café. (b) forma = sentido1, sentido2 etc. → → Joãoj disse que elej/k vai para Portugal. (c) forma = *sentido → → → → → *Elek disse que Joãok vai para Portugal. Frases ambíguas (i) Os meninos comeram as maçãs verdes. (a) NP[Os meninos] comeram NP[as maçãs verdes] (e não as vermelhas) (b) NP[Os meninos] comeram NP[as maçãs] AdjP[verdes] (e não maduras) (ii) A Maria comprou a calça rasgada. (a) NP[A Maria] comprou NP[a calça rasgada] (a Maria é estilosa e usa calças rasgadas no joelho) (b) NP[A Maria] comprou NP[a calça] AdjP[rasgada] (a calça está descosturada) (Material elaborado por Shirley Guedes)