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Hermenêutica Como arte da interpretação a hermenêutica pode ser relacionada com os métodos interpretativos teológicos, filológicos, ou jurídicos, na medida em que se está diante das possibilidades de sentido de um texto, ou seja, do controle dos significados do que se lê. Nesse exato momento o leitor está realizando a primeira tarefa da hermenêutica: atribuir um significado para um texto. Daí a menção dos grandes manuais à etimologia da palavra hermenêutica como proveniente do grego hermeneuien e hermeneia, bem como do latim interpretare como inter penetrare SCHLEIERMACHER Conhecido como o “pai” da hermenêutica moderna ele pretendeu destruir o que chamava de “hermenêutica tradicional” e construir uma Hermenêutica Universal retirando o caráter autoritário da hermenêutica ao afirmar que a regra geral do processo de compreensão é a incompreensão. Em outras palavras: eu parto sempre do princípio de que não entendo inteiramente o que me dizem, portanto, preciso sempre interpretar o que me foi dito. A interpretação teológica buscava o contrário disto quando argumentava ser o texto da bíblia claro, portanto, prescindindo de interpretação. SCHLEIERMACHER Interpretação Gramatical: consiste na averiguação de que a interpretação teológica, filológica e jurídica, partem da interpretação de textos, logo o elo de ligação entre elas é a interpretação gramatical. Interpretação Psicológica: consiste na averiguação de que toda a experiência de vida do homem faz parte da construção de sua obra, portanto, para compreender o livro “O Príncipe” eu deveria antes de mais nada conhecer quem foi Nicolau Maquiavel, entender os motivos que o levaram a escrever o livro do jeito como escreveu. SCHLEIERMACHER Circularidade Hermenêutica: a primeira vez que o termo “aparece” na história da hermenêutica moderna é na obra de Shcleiermacher, quando o mesmo afirma existir uma relação dialógica entre a “parte” e o “todo”. Argumenta ele que todo conhecimento da “parte” é a tentativa de apreensão do “todo”, mas sempre insuficiente/incompleto, assim como toda apreensão do “todo” somente é possível pelo acesso de uma “parte”. Portanto, uma verdadeira circularidade. DILTHEY A participação de Dilthey na afirmação de uma filosofia hermenêutica diz respeito à necessidade de se proceder um grande resgate da obra de Schleiermacher que havia sido esquecida ao longo dos tempos. Dilthey procura, a partir do psicologismo de Schleiermacher afirmar a existência de um método para concepção das ciências do espírito/humanas. Ele busca a dogmatização, o método, a depuração das ciências do espírito/humanas. DILTHEY Erleibnis/Experiência: Toda de descrição de algo é a experimentação do mundo a partir da visão particular de um “ser”. A compreensão parte da experiência. Ausdruck/Expressão: Toda explicação de algo é a expressão de uma experiência. Eu experimentei a chuva e a descrevi como ela se apresentou a mim. Quem experimentou/observou igual fenômeno me compreenderá, ainda que expresse suas experiências de modo diverso. Verstehen/Compreensão: Apesar de não ter vivido a Revolução Francesa, eu a compreendo pela reunião de expressões provenientes das experiências diretas e indiretas com o evento. Sustenta Dilthey que há uma conexão em nível espiritual do intérprete com o objeto. Portanto, uma conexão do jurista com o espírito da Constituição. Heidegger O filósofo é responsável por clarificar a cisão entre metafísica e ontologia na modernidade. Dentre outras coisas, Heidegger é um dos grandes nomes da hermenêutica contemporânea por ter acusado a chamada “quebra do fio da tradição”. Sustenta que a história da ontologia é construída por meio de diversas reinterpretações dos textos antigos. Logo, o sentido mais original não nos é acessível. A possibilidade de conhecer o mundo se dá pela hermenêutica da faticidade, sempre tendo como pressuposto básico que as coisas são fenômenos temporais. Heidegger Quebra do fio da tradição: o texto de Platão, ou de Aristóteles, escrito em grego foi traduzido para o latim. Guardado por séculos pela Igreja Católica foi publicado durante a Revolução Iluminista e retraduzido para o Francês, Alemão, Inglês, Italiano, etc. Logo após, para o Português, Espanhol, Japonês, Chinês, etc. A constatação de Heidegger é simplesmente de que a História da Ontologia se tornou um verdadeiro “telefone sem fio”, não sendo possível retroceder ao sentido mais original do texto de Platão ou Aristóteles. Heidegger Fenomenologia: Pela constatação anterior, Heidegger propõe a desconstrução da história para que se possa remontar o sentido mais original da coisa. Desse modo, ao analisar a tensão existente entre o “ente” (interpretado como sujeito) e o “ser” (interpretado como uma 'existência': tudo o que 'é'), Heidegger é capaz de perceber que: o sentido do “ser” é universal, indescritível e evidente por si mesmo; a única lente capaz de tornar o “ser” visível é o tempo; as coisas são apenas modos de existir, portanto, fenômenos. Heidegger Hermenêutica da Faticidade: Interpretar algo é meramente descrever o seu acontecer no tempo, pois este “ser” é um “ser com”, “estar aí”, algo que está revestido de mundanidade, portanto a melhor resposta para o sentido do “ser” em Heidegger é a famosa resposta quase jargão na linha argumentativa do advogado: depende. gadamer Gadamer: Responsável por concluir o giro ontológico operado por Heidegger, Gadamer será responsável pela tentativa de explicação da compreensão ela mesma, ou melhor dizendo, ele apontará a estrutura da compreensão. Para Gadamer o método interpretativo advogado por Dilthey aprisiona a hermenêutica num quadrante puramente científico, excluindo, desse modo, os juízos estéticos, do gosto, do senso comum, a interpretação da obra de arte, dentre outras coisas. Por isso, a relação sujeito-objeto é resgatada e insere-se um dado que tinha sido tergiversado na obra de Heidegger: a pré-compreensão gadamer Crítica ao Método: Para Gadamer a interpretação não é apenas uma técnica ou uma ciência interpretativa. Ela é também uma arte, uma sutileza que admite, ainda que timidamente, que tudo o que havia sido construído como verdade pode estar completamente e fundamentalmente errado. Portanto, interpretar é, antes de mais nada, auto-conhecimento gadamer Pré-compreensão/Pré-conceito: Na estrutura da compreensão apontada por Gadamer existe o Sujeito que analisa o Objeto, considera-se que o Sujeito é um ser mundano que, portanto, nunca será isento das suas experiências de vida. Essa carga de experiências é denominada de pré-conceitos/pré-compreensões, que nada mais são do que juízos de valores que se formam antes do conhecimento de todos os fatores determinantes da coisa ela mesma. Não há interpretação neutra, mas a identificação dos pré-conceitos puros e impuros podem nos levar para interpretações arbitrárias ou discricionárias. Neste ponto ele é muito utilizado pelos Juristas. gadamer Tradição: Trata-se de um conceito que permeia toda a obra de Gadamer, ela existe como algo dentro de mim que vincula o meu inconsciente como por exemplo a utilização da língua portuguesa no Brasil, os coloquialismos regionais como a exclamação “égua!” do paraense. Em diversos níveis ela está presente no ato da interpretação. CONVENCIONALISMO E ESSENCIALISMO Convencionalismo: o sentido das coisas reside nas convenções linguísticas que fazemos. Podemos convencionar um sentido do que é família para fins de proteção dos Direitos Humanos admitindo o direito a não ter família. Ou seja, a perspectiva convencionalista tende a um relativismo. Essencialismo: o sentido das coisas possuí uma essência (sua natureza), independentemente das convenções sobre elas. Mesmo que exista uma convenção particular ou coletiva de que a compensação antecipada do cheque pré-datado seja moral, ou, correta, o essencialismo buscaria dentro de um pressuposto fundamental (da natureza) do direito, qual seja: Justiça. Portanto, ao argumentar sobre o justo como essência do direito fugiria (preliminarmente) de umasuposição relativista e tenderia a uma perspectiva universalista AMBIGUIDADE, VAGUEZA E POROSIDADE Para Adeodato (2012) o problema da imprecisão da linguagem pode ser descrito a partir de níveis de comunicação, pois a linguagem necessita de indicadores (descrevem classes de objetos) e predicadores (descrevem as denominações específicas da coisa). Logo, a imprecisão pode se dar por um problema de indicadores (falo “aquela árvore” quando quis dizer “aquela mangueira”), ou por problemas de predicadores (delimitação de nomes próprios ou expressões próprias, ex. Mick Jagger, quem? Qual? O pai de Jade, irmão de Chris) (pág. 490-2). Ambiguidade, vagueza e porosidade Ambiguidade: refere-se a dúvidas sobre significado do termo linguístico, ou seja, é um problema de conotação, intenção, conteúdo, significado (ou 'sentido'). Ex. Manga, da camisa ou da fruta. (ADEODATO, 2012, pág. 492). Vagueza: é um problema de denotação, referência, extensão, descrição, ou seja, do alcance da expressão, que classe de objetos se aplica a ela. Ex. Um transexual com aparência inteiramente feminina pode ser vítima de estupro? (ADEODATO, 2012, pág. 492). – OBSERVAR QUE A LEGISLAÇÃO PENAL MUDOU. Porosidade: diz respeito às modificações em seu uso cotidiano, as quais se dão no decorrer do tempo, modificando suas próprias ambiguidade e vagueza. É a história da palavra. Ex. Rapariga (antes era sinônimo de mulher e hoje é sinônimo de prostituta) (ADEODATO, 2012, pág. 492). CONTROLE DE SIGNIFICADOS O art. 5º/CRFB preceitua ser a vida um direito revestido da característica de “Inviolabilidade” e, a primeira vista, isto impede que uma pessoa ceife a vida de outra. Poderíamos afirmar, então, que ser a vida inviolável me confere não somente uma proibição para cometimento de homicídios, mas a garantia (permissão) para permanecer vivo? A resposta é sim, mas ela não é tão relevante quanto o quadro que se desenhou ao se propor este exercício simples de interpretação de uma palavra usada pela CRFB: “inviolável”. Poderíamos argumentar ainda mais, o que é vida para fins dessa inviolabilidade? Já é considerado vivo o zigoto fecundado nos momentos posteriores ao coito? Se sim, o que dizer da “pílula do dia seguinte”? Veja, essas questões são todas provenientes das imprecisões linguísticas do direito enquanto conjunto de regras (ou, normas) que se expressam como ato comunicacional. Tudo o que foi exposto até aqui teve o propósito de comprovar a seguinte tese: o único modo de o direito controlar os significados/conceitos jurídicos é através da hermenêutica.