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11 DO CONTRATO PRELIMINAR ■ 11.1. CONCEITO Muitas vezes, malgrado o consenso alcançado, não se mostra conveniente aos contraentes contratar de forma definitiva, seja porque o pagamento será feito de modo parcelado e em elevado número de prestações, seja pela necessidade de se aguardar a liberação de um financiamento, seja, ainda, por algum outro motivo de natureza particular ou mesmo de mera conveniência. Nesse caso, podem os interessados celebrar um contrato provisório, preparatório, no qual prometem complementar o ajuste, celebrando o definitivo. Essa avença constitui o contrato preliminar, que tem sempre por objeto a efetivação de um contrato definitivo. Contrato preliminar ou pactum de contrahendo (como era denominado no direito romano), ou, ainda, contrato-promessa, é aquele que tem por objeto a celebração de um contrato definitivo. Tem, portanto, um único objeto. Não visam os contraentes, ao celebrar um contrato preliminar, modificar efetivamente sua situação, mas apenas criar a obrigação de um futuro contrahere. Podem eles achar conveniente protelar a produção dos efeitos e a assunção das obrigações definitivas, mas “fechando”, ao mesmo tempo, o negócio. ■ 11.2. REQUISITOS DE VALIDADE Os requisitos para a validade do contrato preliminar são os mesmos exigidos para o contrato definitivo. Senão, vejamos: ■ Requisito objetivo — é preciso que o objeto do contrato seja lícito, possível, determinado ou determinável (CC, art. 104, II). Como o objeto do contrato preliminar é a celebração do contrato definitivo, constituindo este a prestação consubstanciada naquele, não pode o contrato principal atentar contra a ordem pública e os bons costumes, nem ofender disposição legal ou ser fisicamente impossível. ■ Requisito subjetivo — é necessário que, além da capacidade genérica para a vida civil (CC, art. 104, I), os contraentes tenham aptidão para validamente alienar, sob pena de restar inviabilizada a execução específica da obrigação de fazer. Se casado, necessitará o contraente da outorga uxória para celebrar o contrato preliminar. ■ Requisito formal — é disciplinado no art. 462 do novo Código Civil, que não exige que o contrato preliminar seja pactuado com os mesmos requisitos formais exigidos para o contrato definitivo a ser celebrado558. A promessa de compra e venda, ou compromisso de compra e venda, é exemplo do contrato preliminar mais comum. Entende Orlando Gomes que se deve utilizar as expressões compromisso de compra e venda e promessa irrevogável de venda para os negócios irretratáveis e irrevogáveis, a fim de evitar a confusão reinante na doutrina com repercussão na jurisprudência, reservando a expressão contrato preliminar para os que admitem arrependimento559. O Código Civil de 2002 não faz, todavia, essa distinção, proclamando, no art. 463, que, “concluído o contrato preliminar”, com observância dos requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado “e desde que dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer das partes terá o direito de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que o efetive”. ■ 11.3. A DISCIPLINA DO CONTRATO PRELIMINAR NO CÓDIGO CIVIL DE 2002 O Código Civil de 2002 dedicou uma seção ao contrato preliminar (arts. 462 a 466), exigindo que contenha todos os requisitos do contrato definitivo, salvo quanto à forma, e seja levado ao registro competente. Dispõe, com efeito, o art. 462 do mencionado diploma: “O contrato preliminar, exceto quanto à forma, deve conter todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado.” A inexigência de forma para a sua validade, bem como para a produção normal de suas consequências jurídicas, é corolário natural do princípio consensualista, predominante entre nós. O dispositivo supratranscrito coloca uma pá de cal na discussão a respeito do requisito formal do contrato preliminar, não exigindo que seja celebrado com observância da mesma forma exigida para o contrato definitivo a ser celebrado. Mesmo que o contrato definitivo deva ser celebrado por escritura pública, o preliminar pode ser lavrado em instrumento particular. Prescreve ainda o art. 463 do Código Civil: “Concluído o contrato preliminar, com observância do disposto no artigo antecedente, e desde que dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer das partes terá o direito de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que o efetive. Parágrafo único. O contrato preliminar deverá ser levado ao registro competente.” Cumprida a promessa de compra e venda com o pagamento integral do preço, pode o compromissário comprador, sendo o pré-contrato irretratável e irrevogável por não conter cláusula de arrependimento, exigir a celebração do contrato definitivo e, se necessário, valer-se da execução específica. Embora o dispositivo em questão use, no parágrafo único, o verbo “deverá”, não parece que o registro do instrumento no cartório competente seja requisito necessário para a aquisição do direito real. A melhor interpretação é a que considera imprescindível o registro, nele exigido, para que o contrato preliminar tenha efeitos em relação a terceiros. Entre as próprias partes, porém, o contrato preliminar pode ser executado mesmo sem o registro prévio, como corretamente assinalam Caio Mário e Sílvio Venosa. Quando este for exigido, deverá ser feito no Registro de Imóveis onde os bens imóveis estiverem localizados e no Registro de Títulos e Documentos, no caso de bens móveis560. Assiste razão a Ruy Rosado de Aguiar quando considera exagerada a exigência do parágrafo único do mencionado art. 463 do Código Civil, nestes termos: “Sabemos que as pessoas, quanto mais simples, menos atenção dão à forma e à exigência de regularizar seus títulos. A experiência revela que os contratos de promessa de compra e venda de imóveis normalmente não são registrados. Não há nenhum óbice em atribuir-lhe eficácia entre as partes, possível mesmo a ação de adjudicação, se o imóvel continua registrado em nome do promitente vendedor. O Código de Processo Civil de 1973 (art. 639 — substituído pelo art. 466-B) não exige o registro do contrato para o comprador ter o direito de obter do Juiz uma sentença que produza o mesmo efeito do contrato a ser firmado. Ademais, em se tratando de bens imóveis, a jurisprudência atribui ao promissário comprador a ação de embargos de terceiro, mesmo que o documento não esteja registrado; para os móveis, exclui o primitivo proprietário, promitente vendedor, da responsabilidade civil pelos danos causados com o veículo pelo promissário comprador”561. Já Orlando Gomes562 dizia que o caráter real do compromisso de compra e venda decorre de sua irretratabilidade, e não do registro no cartório de imóveis. Levando-o a registro, impede-se que o bem seja alienado a terceiro. Ou seja: o registro só é necessário para a sua validade contra terceiros, produzindo efeitos, no entanto, sem ele entre as partes. Daí a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, cristalizada na referida Súmula 239 e em julgados que proclamam: “A pretensão de adjudicação compulsória é de caráter pessoal, restrita assim aos contraentes, não podendo prejudicar os direitos de terceiros que entrementes hajam adquirido o imóvel e obtido o devido registro, em seu nome, no ofício imobiliário”563. Ou, ainda: “É admissível a execução específica do art. 639 (transformado no art. 466-B) do Código de Processo Civil de 1973, ainda que se trate de contrato preliminar não inscrito no registro de imóveis”564. Nesse sentido, o Enunciado 30 aprovado na I Jornada de Direito Civil realizada pelo Conselho da Justiça Federal: “A disposição do parágrafo único do art. 463do novo Código Civil deve ser interpretada como fator de eficácia perante terceiros”. Desse modo, mesmo não registrado, o contrato preliminar gera obrigação de fazer para as partes. Compete, pois, ao adquirente precaver-se contra expedientes ilícitos de venda sucessiva do mesmo bem, registrando o compromisso no ofício imobiliário. Todavia, mesmo sem o registro, poderá pleitear a adjudicação compulsória do imóvel registrado em nome do promitente vendedor. Esgotado o prazo assinado ao promitente vendedor para que efetive a promessa feita no contrato preliminar, “poderá o juiz, a pedido do interessado, suprir a vontade da parte inadimplente, conferindo caráter definitivo ao contrato preliminar, salvo se a isto se opuser a natureza da obrigação” (CC, art. 464). Bem andou o novel legislador ao conferir, no citado art. 464 do Código de 2002, primazia ao princípio da execução específica da obrigação de fazer contida no contrato preliminar, seguindo a evolução já delineada pelo estatuto processual civil. Somente quando não houver interesse do credor ou a isso se opuser a natureza da obrigação é que se valerá o contraente pontual das perdas e danos (CC, art. 465) 565. O Superior Tribunal de Justiça permite a propositura de ação de adjudicação compulsória mesmo não estando registrado o compromisso de compra e venda irretratável e irrevogável. Proclama, com efeito, a Súmula 239 desse Sodalício: “O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis”566. Quanto aos imóveis loteados, dispõe o art. 26 da Lei n. 6.766/79 que o negócio pode ser celebrado por instrumento particular ou público. No tocante aos não loteados, tem sido admitida, também, a forma particular. A autorização do cônjuge é indispensável, por consistir em alienação de bem imóvel sujeita à adjudicação compulsória. Proclama ainda a Súmula 413 do Supremo Tribunal Federal que “o compromisso de compra e venda de imóveis, ainda que não loteados, dá direito à execução compulsória, quando reunidos os requisitos legais”. ■ 11.4. RESUMO DO CONTRATO PRELIMINAR Conceito ■ Contrato preliminar ou pactum de contrahendo é aquele que tem por objeto a celebração de um contrato definitivo. Tem, portanto, um único objeto. Requisitos de validade São os mesmos exigidos para o contrato definitivo, exceto quanto à forma (CC, art. 462). ■ Requisito objetivo: o objeto do contrato deve ser lícito, possível, determinado ou determinável (art. 104, II); não deve atentar contra a ordem pública e os bons costumes, nem ofender disposição legal ou ser fisicamente impossível. ■ Requisito subjetivo: é necessário que, além da capacidade genérica para a vida civil (art. 104, I), os contraentes tenham aptidão para validamente alienar. É necessária a outorga uxória se os contraentes forem casados. ■ Requisito formal: o art. 462 do CC não exige que o contrato preliminar seja pactuado com os mesmos requisitos formais exigidos para o contrato definitivo a ser celebrado. Disciplina no CC/2002 ■ Cumprida a promessa de compra e venda com o pagamento integral do preço, pode o compromissário comprador, sendo o pré-contrato irretratável e irrevogável por não conter cláusula de arrependimento, exigir a celebração do contrato definitivo e, se necessário, valer-se da execução específica (CC, arts. 463 e 464). ■ Dispõe o parágrafo único do art. 463 do CC que “o contrato preliminar deverá ser levado ao registro competente”. A esse respeito, proclama o Enunciado 30 aprovado na I Jornada de Direito Civil realizada pelo Conselho da Justiça Federal: “A disposição do parágrafo único do art. 463 do novo Código Civil deve ser interpretada como fator de eficácia perante terceiros”. Assim, mesmo não registrado, gera obrigação de fazer para as partes.
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