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MONOGRAFIA FINALIZADA

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UNIVERSIDADE PARANAENSE – UNIPAR CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO
MARIANA HELLEN ANDERSON
ALBERGUE PARA PESSOAS DESABRIGADAS
CASCAVEL - PR NOVEMBRO/2019
MARIANA HELLEN ANDERSON
ALBERGUE PARA PESSOAS DESABRIGADAS
Monografia apresentada à Universidade Paranaense – UNIPAR/ Unidade de Cascavel, como requisito parcial para elaboração do projeto de conclusão do curso de Arquitetura e Urbanismo, sob orientação da professora Msc. Lissandra Guimarães Gil.
CASCAVEL - PR NOVEMBRO/2019
Dedico esse trabalho os meus pais, Lucineia
Pereira da Silva e Elias Anteres Anderson, e aos meus irmãos, Elias Junior e Pedro Anderson.
 (
DEDICATÓRIA
)
A Deus, por ter me dado saúde e força para chegar até aqui.
A minha avó Luíza Terezinha Anderson, que hoje não está mais presente, mas ainda vive em minha memória.
Aos meus professores, pela dedicação, amor e paciência para me ensinar durante esses
anos.
A esta Universidade, seu corpo docente e direção que oportunizaram diversas
experiências e incentivos para ir sempre além.
Aos meus amigos, que são meu ponto de equilíbrio e nunca me deixaram desanimar. Ana Alves, Marina Domingues, Tanielle Alberti, Wellington Carvalho, Geovana Ayumi e Cyntia Segatelli.
A minha orientadora Lissandra Gil, pela paciência e dedicação em corrigir meu trabalho durante várias madrugadas, e que me ensinou que conhecimento nunca é pouco.
Aos meus queridos amigos, Bruna Gazzonni e Maurício Rezende, que se dedicaram a me mostrar como é o mercado da arquitetura em outra perspectiva além da universidade.
 (
AGRADECIMENTOS
)
“Em todas as almas, como em todas as casas. Além da fachada, há um interior escondido.”
(Raul Brandão)
 (
EPÍGRAFE
)
O presente trabalho avalia as razões pelas quais algumas pessoas encontram-se em situação de rua em quase todo território brasileiro e especialmente na cidade de Cascavel, expondo, dessa forma, a realidade em que vivem. O estudo pautou-se na revisão bibliográfica de: Dissertações de mestrado e teses de doutorado; livros; artigos; Censo; fontes midiáticas de redes de telecomunicação e visitas nas casas de acolhimento da cidade que promoveu o livre diálogo opinativo sobre a qualidade de vida em que vivem os moradores de rua e as condições arquitetônicas nas quais as casas de apoio se apresentam. O estudo de obras correlatas e de referência, juntamente com as visitas in loco, foi de suma importância para subsidiar conhecimento suficiente e propor alternativas que incentivem as pessoas que estão em situação de rua a buscar uma vida digna, promovendo a inclusão social a partir das necessidades físicas e psicológicas do ser humano em geral e considerando a influência que a arquitetura pode exercer sobre eles, já que demonstram de maneira clara e objetiva a exclusão social. Com este estudo foi possível entender de forma efetiva como essas pessoas sentem-se em relação a sociedade e como a arquitetura influencia na inclusão social, para assim, traçar diretrizes projetuais de uma arquitetura especialmente para esse grupo populacional e não oferecer somente abrigo físico, mas também psicológico.
Palavras-chave: Moradores de Rua, Exclusão social, Albergue.
 (
RESUMO
)
The present study evaluates the reasons why some people are in homeless situation in almost all Brazilian territory and especially in the city of Cascavel, thus exposing the reality in which they live. The study was based on the bibliographic review of: Master's and PhD theses; books; articles; Census; media sources of telecommunication networks and visits in the host houses of the city that promoted the free opinion dialogue about the quality of life in which the homeless live and the architectural conditions in which the suportive houses appear. The study of related and reference works, together with on-site visits, was of paramount importance in order to subsidize sufficient knowledge and propose alternatives that encourage homeless people to seek a dignified life, promoting social inclusion from the physical and psychological needs of the human being in general and considering the influence that architecture can exert on them, since they clearly and objectively demonstrate their social exclusion. From this study, it was possible to understand in an effective way how these people feel about society and how architecture influences social inclusion, in order to draw the design guidelines of an architecture especially developed for this population group and offer not only physical, but also psychological shelter.
Key-words: Homeless people, Social exclusion, Lodge.
 (
ABSTRACT
)
Figura 1 - População de ruas em municípios brasileiros.	25
Figura 2 - Implantação Oficina Borace/ Bud Clark Commons / The Bridge	37
Figura 3 - Parede de cobogó do complexo Oficina Boracea	38
Figura 4 - Pátio interno do complexo Oficina Boracea	38
Figura 5 - Fachada de concreto do complexo Oficina Boracea	38
Figura 6 - Setorização do edifício Bud Clark Commons.	40
Figura 7 - Fachada do edifício Bud Clark Commons.	41
Figura 8 - Térreo com paredes de cortinas de vidro do Bud Clark Commons.	42
Figura 9 - Conexão visual com o meio externo do Bud Clark Commons.	42
Figura 10 - Translucidez da fachada de vidro do edifício The Bridge	43
Figura 11 - Dormitório com iluminação natural do edifício The Bridge	43
Figura 12 - Setorização edifício The Bridge	44
Figura 13 - Estrutura Ligth Steel Frame/ Fechamento OSB/ Fechamento Metálico.	46
Figura 14 - Circulação vertical Casa três Gerações	50
Figura 15 - Fachadas Norte e Sul.	51
Figura 16 - Elementos do estilo industrial sofisticado.	52
Figura 17 - Divisórias em Oriented Strand Board (OSB).	52
Figura 18 - Escadaria com elementos metálicos e detalhes em amarelo.	53
Figura 19 - Jardim Great Ganny’s cercado	56
Figura 20 - Passeio sensorial.	57
Figura 21 - Pirâmide de Pfister	61
Figura 22 - Casa Giraldi – Luis Barragán	63
Figura 23 - Corredor da Casa Gilardi - Luiz Barragán.	64
Figura 24 - Pátio da escola Prestwood.	64
Figura 25 - Fachada da Fundação Esther Koplowitz para Pacientes com Paralisia Cerebral. 65
Figura 26 - Fagus Werk.	66
Figura 27 - Relação visual entre moderno e contemporâneo.	71
Figura 28 - Categoria de complexidade de atendimento das casas de acolhimento.	74
Figura 29 - Centro Pop Cascavel.	77
Figura 30 - Migração entre rua e espaço de acolhimento do Centro Pop.	78
Figura 31 - Albergue Noturno André Luiz	79
Figura 32 - Migração entre rua e espaço de acolhimento do Albergue Noturno.	79
Figura 33 - Casa Pop Cascavel.	80
Figura 34 - Partido arquitetônico e simbologia	84
Figura 35 - Localização do lote em Cascavel.	86
Figura 36 - Equipamentos comunitários e infraestrutura	87
Figura 37 - Hierarquia de vias e acesso a pontos de ônibus	88
Figura 38 - Estudo de isolação e ventilação.	89
Figura 39 - Topografia	90
Figura 40 - Foto do lote com vista da Rua Maranhão.	90
Figura 41 - Fluxograma.	93
Figura 42 - Plano massa volumétrico.	94
Figura 43 - Nível alterado.	94
Figura 44 - Evolução da volumetria	96
 (
LISTA DE FIGURAS
)
Quadro 1 - Programa de necessidades.	29
Quadro 2 - Linguagem Arquitetônica	35
Quadro 3 - Etapas executivas Refúgio São Chico.	47
Quadro 4 - Características ervas terapêuticas.	54
Quadro 5 - Plantas para jardim sensorial.	55
Quadro 6 - Cores associadas a elementos dentro da cultura Alemã	61
Quadro 7 - Ramificações da Arquitetura moderna	69
Quadro 8 - Relação entre arquitetura moderna e contemporânea	71
Quadro 9 - Quadro comparativo entre as unidades de acolhimento de Cascavel.	75
Quadro 10 - Programa de necessidades.	91
 (
LISTA DE QUADROS
)
Gráfico 1 - Cores mais apreciadas.	59
Gráfico 2 - Cores menos apreciadas	59
 (
LISTA DE GRÁFICOS
)
	Cad Único
	Cadastro Único Para Programas Sociais.
	CNAE
	Classificação Nacional de Atividades Econômicas.
	EMBRATUR
	Instituto Brasileiro de Turismo.
	IBGE
	Instituto Brasileiro de Geografia e estatísticas.
	IPEA
	Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.
LEED
	Leadership in Energy and Environmental Design.
	LOAS
	Lei Orgânica da Assistência Social.
	LSF
	Light Steel Frame.
	MDS
	Ministério do Desenvolvimento Social.
	PSE
	Proteção Social Especial.
	SEBRAE
	Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
	SMADS
	Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento
	Social.
	
	SUAS
	Sistema Único de Assistência Social.
	UNESCO
	Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e
	Cultura.
	
 (
LISTA DE ABREVIATURAS
)
 (
SUMÁRIO
)
INTRODUÇÃO	14
TEMA	15
PROBLEMA	15
HIPÓTESE	17
OBJETIVOS	18
Objetivos gerais	18
Objetivos específicos	18
JUSTIFICATIVA	19
METODOLOGIA DE PESQUISA	21
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA	23
PANORAMA HISTÓRICO DOS ALBERGUES	23
CARACTERIZAÇÃO DOS MORADORES DE RUAS NO BRASIL	24
OBRAS CORRELATAS	27
Síntese dos Programas de Necessidades	33
Síntese das Linguagens Arquitetônicas	37
SOLUÇÃO ESTRUTURAL / INTERIORES E PAISAGÍSTICAS	45
Obra Refúgio São Chico como referência estrutural	45
Casa três Gerações / BETA office for arquiteture and the city como referência para interiores	50
Jardim sensorial Great Granny’s	53
INFLUÊNCIA DAS CORES NA ARQUITETURA	57
2.5.2 Experiência empírica de Eva Heller	58
2.5.2 Aplicação da cor na Arquitetura	63
ARQUITETURA MODERNA PARA CONTEMPORÂNEA	65
POLÍTICAS PÚBLICAS PARA INCLUSÃO	72
CASAS DE ACOLHIMENTO DE CASCAVEL	73
Síntese Centro Pop	77
Síntese Albergue noturno André Luiz	78
2.7.3. Síntese Casa Pop	80
2.7.4 Perfil do usuário em Cascavel	82
PROPOSTA	83
Memorial Justificativo	83
Partido Arquitetônico e simbologia	84
Análise do Terreno	85
Análise de equipamentos comunitários	86
Análise de insolação e ventilação	88
Estudo topográfico	89
Programa de Necessidades	90
Fluxograma	93
Plano massa	93
4.0 Evolução volumétrica.	94
CONSIDERAÇÕES FINAIS	97
REFERÊNCIAS	99
1. INTRODUÇÃO
A desigualdade social é visualizada por meio das diferenças financeiras decorrentes da má distribuição de renda entre a população. No entanto, essa desigualdade ultrapassa o ponto de vista da pobreza e abrange também as diferenças culturais, raciais, étnicas, religiosas, físicas e psíquicas. Em vista disso, tudo que não é visto pela população de forma natural, gera desconforto e descaso, resultando na exclusão social, em que um problema individual torna-se coletivo. A constante luta contra a apatia presente na população em aceitar as diferenças é vista por poucos grupos que tentam reverter esse fato, sento eles universidades ou grupos que trabalham pelo bem estar social e coletivo. Esse desconhecimento por parte de todos faz com que a exclusão social permaneça sendo uma das maiores falhas da humanidade.
Hoje, o conhecimento nacional sobre esse fato vem ganhando maiores proporções devido à relevância para a Constituição Federal, uma vez que ela garante a todos os brasileiros e aos estrangeiros residentes no país, sem qualquer distinção, o direito à igualdade (art. 5º, CF/88), sendo que a República Federativa do Brasil, constituída em Estado Democrático de Direito tem como um de seus fundamentos a dignidade da vida humana (art. 1º, CF/88).
No entanto, ainda é possível notar o descaso em que vivem os moradores de rua. Os desabrigados são exemplo da desigualdade seguida da exclusão social, em que, sem moradia, eles perdem a identidade, podendo alcançar o extremo da violência física e psicológica, desde o uso de drogas à prostituição, e ainda são vistos como um empecilho ao crescimento da cidade.
Dessa maneira, a proposta do Albergue para pessoas em situação de rua, apresentou-se como uma alternativa de abrigar, recuperar e oportunizar a essas pessoas a educação, estimulando a prática da inclusão social. Por isso, este trabalho teve como intuito fazer uma análise sobre a desigualdade social e seu alcance, exemplificando como a arquitetura contribui para recuperação da dignidade e bem estar dessas pessoas e da sociedade.
Assim, num primeiro momento, esta pesquisa, buscou analisar os fatos que levam uma pessoa a ficar em situação de rua e identificou os principais motivos que influenciam um cidadão a tomar tal decisão. Num segundo momento, buscou-se correlacionar projetos de destaque, referentes à temática abordada, para identificar as melhores formas de aplicação de materialidade e funcionalidade referente ao projeto arquitetônico. Também, buscou-se analisar a influência das cores nos sentidos psicológicos e a aplicação delas na arquitetura, bem como compreender a aplicação do paisagismo sensorial como meio alternativo de bem
 (
14
)
estar. Além disso, identificou-se os problemas encontrados nas casas de acolhimento de Cascavel, bem como as características arquitetônicas, e quais os fatores que influenciam no processo de abrigagem.
Por fim, contendo informações suficientes, concluiu-se quais são os meios necessários para construir uma arquitetura adequada para abrigar essas pessoas, moradoras de rua, e recuperá-las.
1.1 TEMA
A intenção deste trabalho é a compreensão da população em situação de rua, observando o modo como esses indivíduos se apropriam dos espaços da cidade e verificar as condições precárias às quais esse grupo está submetido. Assim, procurou-se fazer uma análise das apropriações das casas de apoio de Cascavel, para propor um Albergue digno de acolhimento e restabelecimento social para população em situação de rua.
Segundo o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) (2016), os albergues na modalidade de albergue assistencial buscam apenas o amparo às pessoas que vivem em situação de rua, e devem ser constituídos sob a forma jurídica, não visando lucro e nem estando atrelados ao turismo. Pois, a assistência social é direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais e é realizada mediante um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e social, para garantir o atendimento às necessidades básicas, mínimos sociais ao provimento de condições para atender às contingências sociais e à universalização dos direitos sociais.
1.2 PROBLEMA
Ao falar em habitação, o pensamento tradicional do ser humano direciona-se para a casa, um lar, família, aconchego, proteção ou privacidade. Contudo, para o morador de rua, há um outro ponto de vista. Para ele, habitar significa proteção, um lugar que possa se proteger de dias chuvosos, quentes ou frios. No entanto, nem sempre é possível encontrar um bom espaço para se recolher, pois a visão negativa que a sociedade tem desses indivíduos acaba por reprimi-los e exilá-los desses pequenos pontos considerados como proteção (RIC MAIS, 2018).
Sendo assim, a situação de desabrigados em Cascavel encontra-se em necessidade de alerta. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (2018), em
cidades com mais de 100 mil habitantes, a enumeração de pessoas em situação de rua torna-se responsabilidade dos próprios municípios, que, por muitas vezes, não realizam essa tarefa de forma eficaz, tornando a contagem desse público imprecisa. Com isso, Cascavel não se exime das cidades que necessitam aprimorar a obtenção de dados referentes a pessoas desabrigadas, pois contém cerca de 324.476 habitantes. Essa realidade social é vista diariamente ao transitar a noite pelo centro, em alguns locais, e observar pessoas usando calçadas, pequenas coberturas de lojas, postos de combustíveis, praças e até mesmo monumentos ou marcos da cidade como abrigo transitório. Cenário que revela as consequências geradas pela exclusão social. Segundo o Jornal Paraná TV 2ª Edição (2018), em Cascavel, cerca de 120 pessoas encontravam-se em situação de desabrigo. No entanto, em uma entrevista a uma das casas de apoio da cidade constatou-se 1.423 hospedagens de desabrigados durante o ano de 2018. Em vista disso, nota-se a forma orgânica que essa realidade se dá em Cascavel e que o número de pessoas desabrigadas não permanece constante, podendo aumentar ou diminuir.
Além do fato de muitas pessoas não possuírem um lugar adequado para se abrigar, ao ficar nas ruas, encontram-se totalmente vulneráveis
a doenças, crimes de tráfico de drogas, agressões, e até mesmo homicídio entre os próprios usuários desses locais, que disputam espaços para se abrigar ou para pedir esmola. Além disso, ter um lugar para passar a noite parece quase irrisório, pois observou-se que, um dos problemas, analisados nesta pesquisa, foi o desinteresse que alguns moradores de rua expressaram ao se referir a uma casa de apoio, principalmente daqueles que apresentaram algum tipo de vício. Notou-se que a compreensão por parte de alguns moradores de rua sobre um lugar para se proteger significa ser direcionado instantaneamente para centros de tratamento contra álcool e droga, fator esse que desfavorece o acolhimento dessas pessoas. Ademais, percebeu-se que as exterioridades das casas de acolhimento da cidade, não cativam de forma geral os moradores de rua.
Em visitas a três casas de apoio da cidade, apesar de quase todas apresentarem bom estado de conservação e higiene, observou-se a carência de espaços destinados para cunho educativo, como salas de aula, sala de múltiplo uso ou espaços para atividades de lazer que promovam o relaxamento dos usuários. Geralmente disponibilizam uma pequena sala onde são realizadas palestras promovidas por assistentes sociais. Portanto, o centro de acolhida tem a necessidade de encaminhar o abrigado para outros lugares onde ele possa realizar tarefas durante a manhã e tarde. Esse fato, muitas vezes dá ao acolhido a opção de ficar nas ruas ao longo do dia sem realizar qualquer operação, resultando numa rotina de migração entre
centros de acolhida e ruas. Além disso, notou-se a necessidade de layout1 confortável para as pessoas que trabalham e auxiliam nesse processo, como cozinhas amplas e lavanderias que atendam a demanda, visto que esses ambientes mostram-se pequenos e desfavoráveis para fluidez das tarefas diárias. Contudo, a forma de acolhimento e reintegração social ofertados pelos centros de acolhida mostraram-se fragilizados, pois não atendem de forma plena as necessidades de uma pessoa para o restabelecimento social. Observou-se que a falta de espaços direcionados à educação dentro da própria instituição pode atrasar o desempenho do acolhido.
1.3 HIPÓTESE
Julgou-se que quanto maiores as cidades, maiores são os níveis de desigualdade social, e, consequentemente, o número de pessoas em situação de rua, o que revela a estrutura incongruente do setor público. Essa ideia pode ser compreendida e percebida claramente com a análise desses cenários quando percorridos. Atualmente, o Brasil passa por problemas políticos, sociais e econômicos. Diante disso, o brasileiro se vê em um cenário preocupante, onde não há certeza sobre o dia seguinte, nem se conseguirá arcar com as obrigações para com a família e a sociedade.
Supôs-se que, nesse contexto, economicamente, o sistema capitalista comanda o modo de viver. É notável que a visão da sociedade seja, então, baseada na obtenção de renda, na qual as classes sociais tornam-se divisoras de status2. A economia é determinada para garantir educação, entretenimento, saúde e moradia, e assim, o consumo é visto como uma lei que dita o direito à cidadania. Em consequência, aquele indivíduo que não se enquadra nesse padrão social criado pelo capitalismo, não é considerado um cidadão por completo, pois não possui de forma íntegra as vantagens do bem estar social (ALMEIDA, 2011).
Imaginou-se que, nos dias atuais, existe maior exigência de mão de obra qualificada e experiência em determinados cargos, fato que pode dificultar a inserção de pessoas no mercado de trabalho, e, consequentemente, aqueles que ficam desempregados e sem qualquer tipo de auxílio, em algum momento se encontrarão endividados a ponto de não manter mais o próprio lar (ALMEIDA, 2011).
Dessa forma, imaginou-se que um dos fatores que define a condição do morador de
1 A forma como algo está organizado num determinado espaço.
2 Posição vantajosa que alguém ocupa na sociedade; consideração, prestígio ou renome.
rua é a questão econômica. Pois, nota-se que problemas financeiros são agravantes para que outros obstáculos surjam, dificuldades em manter estabilidade familiar, falência, depressão, dependência química (álcool e drogas) e migração (ALMEIDA, 2011).
Julgou-se também que a falta de uma moradia fixa e de incentivo para voltar ao meio social faz o indivíduo se deslocar de uma região para a outra dentro da própria cidade levando uma vida de nômade e de desapego a bens materiais. Muitas vezes essa rotina torna-se conveniente para não arcar com cobranças e compromissos que a sociedade estabelece.
Junto desses problemas, supôs-se que as edificações que acolhem esse público desabrigado em Cascavel não suportam, em questão de diagramação de espaço, todas as pessoas que necessitam de um local para se abrigar temporariamente devido à falta de planejamento arquitetônico especialmente para esse fim.
1.4 OBJETIVOS
1.4.1 Objetivos gerais
Propor um projeto arquitetônico de um edifício para acolher e abrigar moradores de rua, migrantes e emigrantes temporariamente visando a sobrevivência, restabelecimento e reintegração social dos mesmos.
1.4.2 Objetivos específicos
· Investigou-se o surgimento dos primeiros albergues;
· Investigou-se a situação de moradores de ruas no Brasil;
· Analisou-se a situação arquitetônica de três casas de acolhimento de Cascavel;
· Verificou-se as necessidades físicas e psicológicas de pessoas sem habitação, presentes nas casas de acolhimento de Cascavel;
· Analisou-se obras referências de prestígio;
· Investigou-se a relevância da psicologia das cores na arquitetura para incentivar a interatividade e o dinamismo dentro da edificação;
· Investigou-se elementos de jardim sensorial;
· Investigou-se elementos da Arquitetura Contemporânea;
· Promoveu-se a integração do edifício ao meio urbano e com o paisagismo;
· Possibilitou-se ambientes de alfabetização e capacitação curricular;
· Possibilitou-se ambientes de reintegração social;
· Possibilitou-se o incentivo a reconstrução de uma vida digna e de qualidade ao cidadão.
1.5 JUSTIFICATIVA
Morar nas ruas é uma realidade presente no mundo todo e não é um fenômeno atual, estando presente ao longo de toda história da humanidade. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA, 2017), no ano de 2015, o Brasil deparou-se com 101.854 brasileiros em situação de rua, destes, 40,1% foram localizados em municípios com mais de 900 mil habitantes, 77,02% em municípios com aproximadamente 100 mil pessoas, e 6,63% em regiões com menos de 10 mil habitantes. No entanto, especialistas em políticas públicas e gestão governamental salientam que, em municípios com mais de 100 mil habitantes, é preciso catalogar de forma mais precisa e abrangente a quantidade de pessoas sem moradia, para serem incorporados ao Censo de 2020 e ao Cadastro Único para Programas Sociais (Cad Único) com o fim de facilitar o acesso à programas sociais e a realização do estudo de perfil dessa população, pois apenas 47,1% dos moradores de ruas encontrados pelo estudo estavam cadastrados nesses programas em 2015.
Isso posto, nota-se que a quantidade de pessoas em situação de rua não cadastradas nesses programas sociais no Brasil ultrapassa 50%, e que o agravamento social se dá pela ausência de políticas hábeis que garantam a esses cidadãos não cadastrados planos de auxílio e condições mínimas de sobrevivência.
Uma pesquisa realizada pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, 2009) avaliou o perfil dos brasileiros moradores de ruas. Essa pesquisa mostrou que a maior parte dos cidadãos em situação de miséria são homens entre 22 e 44 anos, com problemas de alcoolismo, drogas, desavenças familiares ou pessoas que abandonaram a cidade de origem em busca de novas oportunidades de trabalho. Esses dados revelaram ainda que, a cada 05 pessoas, 04 delas conseguem fazer apenas uma refeição por dia com dinheiro arrecadado por meio de esmolas. Ainda, cita-se casos em que essas pessoas são impedidas de entrar em lojas,
shoppings e transportes coletivos. Logo, essa exclusão social juntamente ao instinto de sobrevivência pode direcionar o indivíduo ao mundo da marginalidade.
Em visita a três casas de apoio de Cascavel, foi possível verificar o perfil de algumas
pessoas que passaram pela casa em busca de acolhimento nos anos anteriores a 2019. Estas, apresentaram diferentes motivos que as levaram ao desabrigo. Assim como nas informações do Censo, constatou-se o vício em drogas, desavenças familiares e principalmente o desemprego, resultado de falência da empresa e a não qualificação curricular para as exigências do mercado. Também, essas casas de acolhimento hospedam qualquer cidadão sem distinção de classe social ou étnica. Nelas já se hospedaram: pintores; auxiliares de produção; empregadas domésticas; também grande quantidade de haitianos que vieram em busca de emprego e não conseguiram; pessoas de diversos estados brasileiros; baianos que viajam para vender seus produtos; índios; mochileiros e empresários.
Independente dos diversos motivos que levam um cidadão a essa realidade, cabe aos profissionais do meio social contribuírem para que essas pessoas recuperem a dignidade. Isso se torna uma responsabilidade e um dever social para com o próximo. Isso posto, a arquitetura surge como um meio de contribuir no planejamento de espaços que supram as necessidades daqueles que a utilizam, como um meio de levar conforto e promover convívio social e de ensino. A arquitetura propõe cada espaço com uso específico, visto que as edificações utilizadas como abrigos na cidade são improvisadas e inadequadas, e resultam no atendimento desfavorável.
Com base nas análises de três centros de acolhida de moradores de ruas da cidade, elaborou-se um programa de necessidades que engloba: sala de aula; sala de informática; salas de terapia ou espaço para terapias ao ar livre; sala de atendimento psicológico individual; guarda volume; sala de atendimento e encaminhamento médico; espaços para entretenimento e lazer; sala para oficina de artesanato; biblioteca; bazar; pequeno canil; sala para guardar carrinhos de coleta de reciclável; bicicletário; instalações sanitárias; vestiários; jardim sensorial; lavabo social; recepção; sala administrativa; secretaria; coordenação; estacionamento; refeitório comum; cozinha; despensa; depósito de material de limpeza; lavanderia; rouparia; dormitórios e uma capela ecumênica, pois, observou-se que grande parte desse público cultiva a fé.
Assim, uma forma de prevenir que pessoas vivam nas ruas à mercê de doenças, intempéries e que não sejam colaboradoras do aumento da marginalidade, é por meio da criação de um espaço que proporcione métodos para a reintegração social por meio da educação, que promova a alfabetização e outras atividades educativas com intuito de facilitar o acesso ao mercado de trabalho; o lazer, como tecnologia capaz de contribuir para o aperfeiçoamento da qualidade de vida; as terapias alternativas, como uma forma de tratamento psíquico econômico, por meio do uso da meditação e relaxamento mental; e a hospedagem
para abrigar e proteger.
Além do mais, uma das técnicas psicológicas para atração indireta desses usuários para a edificação será o uso da psicologia das cores presente na arquitetura, pois elas possuem grandes influências sobre as pessoas. Segundo Heller (2000), o conhecimento sobre cores é mais amplo que o conhecimento em sensações e sentimentos, pois cada cor pode produzir muitos efeitos, frequentemente contraditórios. Cada cor atua de modo diferente dependendo da ocasião, o vermelho pode ter efeito erótico ou gerar agressividade, bem como o amarelo pode ter um efeito caloroso ou irritante (HELLER, 2000).
Dessa forma, a edificação seguirá a mesma linha de pensamento, onde as cores representarão papel fundamental para estimular desenvolvimento mental, atrair e estimular os abrigados para dentro dos espaços educacionais, interativos e de lazer por meio da transmissão das diferentes sensações ocasionadas por elas. Pretende-se não oferecer nenhum ambiente totalmente com cores quentes para não causar irritações devido a todas as agressões físicas e psicológicas que já viveram.
Por fim, para que o albergue não se torne ineficaz e gere acúmulo de pessoas, visto que algumas pessoas em situação de rua utilizam os pontos de acolhimento da cidade apenas para pernoite, a hospedagem torna-se essencial com permanência máxima de seis meses ou menos, conforme necessidades do hóspede e seguindo os parâmetros da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS) (2006). Assim, somente aqueles que já se encontram instalados poderão desfrutar das atividades oferecidas, incluindo refeição, banho e roupas limpas.
Dessa forma, a casa acolhedora não se torna apenas um lugar para dormir e sim um lugar para aqueles que de fato necessitam se restabelecer.
1.6 METODOLOGIA DE PESQUISA
Este estudo tem caráter exploratório com embasamento em revisão bibliográfica de livros; artigos; dissertações; teses; censos; bem como fontes midiáticas disponíveis em redes de telecomunicação da cidade de Cascavel – PR, para compreender o surgimento dos albergues; características e necessidades da população em situação de rua no Brasil e em Cascavel.
No entanto, para melhor compreensão do público cascavelense, realizou-se diálogos para obter opiniões que mensuraram as carências dos indivíduos abordados. Também, foram compreendidos os profissionais e auxiliares das casas de apoio para detectar os problemas
arquitetônicos nas edificações que afetam de forma negativa o desempenho do serviço prestado, tais como ambientes internos que impossibilitam a segurança, conforto e aprendizado do hóspede temporário. Além disso, foi indispensável a compreensão de projetos arquitetônicos que obtiveram êxito com o sistema de acolhimento, disponíveis na plataforma digital Archdaily.
Os problemas encontrados na arquitetura e nas carências dos moradores de ruas de Cascavel nortearam a elaboração do programa de necessidades, bem como a elaboração do projeto arquitetônico, que tomou como base diversas análises das obras correlatas e de referências. Com isso, essas informações serviram de alicerce para criação do layout e volumetria que atende, e principalmente, auxilia a reinserção do indivíduo no meio social.
Também, realizou-se estudo de viabilidade de lote para aplicar à edificação. Nessa etapa, levou-se em consideração a topografia do lote, sendo ela com pouco desnível para não dificultar os possíveis acessos, e a inserção de luz e ventilação natural, para favorecer elementos sustentáveis da edificação.
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 PANORAMA HISTÓRICO DOS ALBERGUES
Os primeiros albergues foram criados pelo professor alemão Richard Schirrmann como um meio alternativo de hospedagem de baixo custo e por curto período de tempo, exclusivo para jovens, oferecendo padrão mínimo de conforto e uma boa noite de sono. Essa era uma forma de incentivar os jovens a viajar para estudar e conhecer a cultura dos lugares sem ter que arcar com custos elevados de hospedagem (GIARETTA, 2003).
Essa ideia de abrigar indivíduos surgiu em 26 de agosto de 1909, quando Schirrmann deparou-se com uma grande tempestade. Como ele costumava ministrar aulas ao ar livre, precisou usar a Escola Brol Valley, na Alemanha, como abrigo temporário. Ao passar da noite, enquanto seus alunos descansavam, pensou numa possibilidade de alojar os estudantes durante as férias. Assim, ao retornar para a escola de Nette (Alemanha), onde lecionava, implantou o primeiro Albergue da Juventude e começou a escrever periódicos alemães sobre espaços de alojamento coletivo caracterizados pela simplicidade, funcionalismo, custo de hospedagem baixa e preservação da paisagem natural, recebendo simpatizantes (GIATERRA, 2003).
Em 1932, o movimento alberguista tornou-se internacional devido à expansão e entrada em diversos países. Logo, em 1935, o primeiro Albergue da Juventude em Altena foi nomeado pelo deputado de Hitler, Rudolf Hess, como Albergue do mundo. Nesse
período, o alberguismo foi utilizado como tributo ao partido e para a promoção da política do nazismo, de maneira que, durante a Segunda Guerra Mundial, grande parte dos albergues foram utilizados como abrigo de emergência, pois em 1946, a maior parte das cidades em que os albergues se encontravam estava em ruínas (GIATERRA, 2003).
No entanto, o termo Albergue difundiu-se ao longo da história, uma vez que a necessidade de se abrigar cresceu juntamente com o aumento populacional, tornando-se turístico ou social. De acordo com o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa (2010), a palavra albergue é um substantivo que deriva do vocábulo da língua gótica haribaírgo, e possui diversos significados como hospedaria, lugar em que se recolhe alguém por caridade, abrigo, asilo, refúgio ou resguardo. Em termos de função, o Instituto Brasileiro de Turismo (EMBRATUR, 2009), considera os albergues como meio de hospedagem peculiar de turismo social, integrado ao movimento Alberguista nacional e internacional, que objetiva proporcionar acomodações comunitárias de curta duração e baixo custo com garantia de
padrões mínimos de higiene, conforto e segurança.
2.2 CARACTERIZAÇÃO DOS MORADORES DE RUAS NO BRASIL.
Em agosto de 2007 até março de 2008, o Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) realizou uma pesquisa Nacional sobre a População em situação de rua com o intuito de quantificar e permitir caracterização socioeconômica de moradores de ruas para orientar a elaboração de políticas públicas voltadas para tais. No entanto, essa população não foi incluída nos Censos demográficos brasileiros, porque prepondera no Censo a coleta de dados na base familiar. Sem moradia, o grupo ficou invisível ao estado, fato que dificultou a elaboração de políticas de auxílio, uma vez que as políticas regem de dados quantitativos. Assim, a pesquisa pautou-se em coletar dados em campo. O levantamento abordou pessoas com mais de 18 anos que estavam sem moradia em 71 municípios de 23 capitais no Brasil, sendo 48 das cidades contendo mais de 300 mil habitantes. Identificou-se 31.922 moradores de rua vivendo nos mais diferentes lugares dentro de espaço urbano (VALENCIO, 2010). Não foram inclusas nessa pesquisa: São Paulo, Belo Horizonte, Recife e Porto Alegre, pois já haviam realizado pesquisas semelhantes em anos anteriores. Como mostra a Figura 1.
A pesquisa apontou o perfil dessa população, sendo que 82% dos abordados são homens; 79,6% destes fazem apenas uma refeição durante o dia; 29% são dependentes químicos; 30% desempregados; 29% com rompimento familiar e 69,3% em dívidas com o município. Destes, 45,8%, quase metade dos entrevistados, sempre viveram no município em que foram abordados e possuem parentes na região, entretanto, 38% não possuem qualquer contato com a família e 14,5% têm o contato esporádico com a família. Devido à falta de pesquisas anteriores de abrangência nacional, ainda que os números restritos apareçam, é notável uma trajetória sócio-histórica desamparada e esquecida (VALENCIO, 2010).
Figura 1 - População de ruas em municípios brasileiros.
Fonte: Valencio, 2010. Org. Anderson, M. H., 2019.
Além disso, 59% da população entrevistada afirmou realizar uma atividade, como a coleta de material reciclável, sendo esta a mais enfatizada, também, a construção civil e o trabalho doméstico. Ou seja, as pessoas que vivem em situação de rua já tiveram uma vida igual a qualquer outro cidadão, possuindo o seu emprego num mercado formal. Porém, por um momento, foram vítimas de uma atividade mal remunerada, sem possuir os meios econômicos necessários para manter-se estável, de forma que hoje vivem em situação de extrema pobreza e exclusão social e são vistos através de janelas de preconceitos radicadas pela sociedade durante quase toda a narrativa da humanidade (FRANGELLA, 2004).
Um morador de rua é um indivíduo cujas relações humanas foram interrompidas. É um ser humano que perdeu as referências familiares, afetivas e de cidadania, e, na maioria das vezes, o único pertence é o próprio corpo; em outros casos, são acompanhados por um animal de estimação. Portanto, essa população é negligenciada e ignorada por não fazer parte de um mercado de consumo formal (FRANGELLA, 2004).
Isso pode ser visto no documentário A margem da Imagem3 (2004), realizado e dirigido por Evaldo Mocarzel, em que se obteve algumas conclusões sobre o perfil dos moradores de rua da cidade de São Paulo. O documentário mostrou que eles se encontravam plenamente lúcidos e conscientes da própria situação, porém infelizes, e ao mesmo tempo apreciadores da liberdade. O material ainda relata quais os motivos que os levaram a viver nas ruas, como brigas em família, desemprego e como o álcool e o uso de entorpecentes ajudam- nos a suportar a rotina. Ao serem questionados sobre os albergues, muitos se posicionaram contrários a essa situação. Com isso, a equipe então visitou alguns albergues e instituições presentes no centro da cidade e deparou-se com condições precárias de acolhimento, como ambientes obscuros, silenciosos e repletos de regras, onde os alojados aparentavam espectros fantasmagóricos, sem o menor conforto e dignidade. No entanto, o posicionamento dos entrevistados tornou-se favorável ao se referir a melhores condições de restabelecimento, pois sentem-se inferiorizados e envergonhados da própria situação (A MARGEM DA IMAGEM, 2004).
Segundo Frangella (2004), os moradores de rua possuem relação direta com o espaço urbano, é nele que vivem, habitam, trabalham e dormem. São nesses espaços comunitários que criam laços entre si, que interagem, buscam uma forma de sobreviver, brigam e muitas vezes, falecem. Eles são uma parcela social diferenciada no espaço urbano, que, em função da sua trajetória de inúmeros rompimentos dentro do espaço econômico e social, passam a morar
3 Filme documentário sobre a rotina, vida e a cultura dos moradores de rua de São Paulo.
em cantos inimagináveis ao planejamento urbanístico e à sociedade civil, como: as ruas, as praças, as calçadas, os espaços vazios embaixo de viadutos e lotes desapropriados.
Configurando diversos personagens do cenário das ruas desde a formação do mundo urbano ocidental, essa parcela da população vive diariamente em contraposição às estratégias econômicas e políticas que doutrinam as cidades contemporâneas, e cada vez mais vem sendo aumentada. Em 2015, a última pesquisa até o momento realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA, 2017) estimou que o Brasil deparava-se com 101.854 brasileiros em situação de rua. Considerando esse fato, notou-se que desde os dados da pesquisa do MDS em 2008 até os dados do IPEA em 2015, a população desabrigada foi acrescida em 219,07%, ou seja, cerca de 69,932 pessoa passaram a estar desabrigadas nos últimos 7 anos no país. Um contingente superior a 101.854 pessoas vivendo em situação de rua constitui um processo extremamente preocupante de desincorporação e desfiliação social em um futuro próximo.
2.3 OBRAS CORRELATAS
Visando elaborar um programa de necessidades eficaz para a arquitetura, selecionou- se três edifícios construídos com o propósito de auxiliar e abrigar essa população. O 1º é o Complexo de Acolhida Oficina Boracea, em São Paulo, inaugurado em 2003 e integrado ao programa social Acolher – Reconstruindo Vidas. O complexo é voltado para qualificação da população em situação de rua e a busca pela autonomia durante 24 horas por dia com auxílio de diversas secretarias municipais e Organizações Não-Governamentais (ONGs). A edificação está situada na região da Barra Funda, abrigando espaços de dormitório, convívio social, restaurantes e espaços articulados para oficinas e atividades de reintegração social (GUARDA, 2014). O 2º. é o Bud Clak Commons, em Portlads que estabelece um padrão para os serviços públicos, promovendo interação entre abrigo e centro de recursos para comunidade. Está localizado na entrada de Portland,
próximo a fronteira com o distrito de Pearl. Esse abrigo alcança um grande equilíbrio entre os requisitos programáticos, a abordagem de design4 e práticas de construção sustentável, plano pensado durante 10 anos para erradicação da população em situação de rua. Seu objetivo é fornecer um conjunto de serviços, como recursos de aprendizagem, saúde e habitação para auxiliar a transição de uma vida instável para um arranjo de vida mais permanente. E, a arquitetura da obra apresenta papel importante nesse fator por meio da função e forma (ARCHDAILY, 2011).
4 Produção de objetos ligados a forma e a função.
O 3º e último é o edifício The Bridge Homeless Assistance Center, localizado no Texas. Ele é considerado modelo mundial de construção para design de centros de pessoas sem moradia, pois ganhou o prêmio de Melhor Entrada Arquitetônica do concurso Internacional de Homelessness Rebranding e obteve a premiação de Liderança em Energia e Design Ambiental (LEED), também recebeu outros prêmios de design nacional e internacional, incluindo o Prêmio Nacional de Habitação 2009, Prêmio Secretário AIA / Habitação e Desenvolvimento Urbano (HUD), Prêmio Nacional de Excelência em Design 2009 e o Prêmio de Arquitetura Americana do Chicago Athenaeum (ARCHDAILY, 2011).
Para análise dessas obras, considerou-se entre elas a relação de três aspectos relevantes para identificação das características positivas, que nortearam a criação do programa de necessidades do projeto arquitetônico, sendo eles: As funções dos abrigos, a capacidade de público e a área do lote. A linguagem arquitetônica foi analisada posteriormente, conforme o Quadro 1, para averiguar as características referentes a materialidade, sustentabilidade e diagramação dos volumes no lote que auxiliaram na escolha de elementos construtivos. Dessa forma, os quadros 1 e 2 possibilitam identificar as características arquitetônicas desse tipo de edificação.
Quadro 1 - Programa de necessidades.
	Programa De Necessidades
	Referências para O Projeto
	
ABRIGO 1 - Oficina Boracea - Funcionamento 24 horas por dia.
	Setores
	Funções
	Capacidade de Público
	Área
	
	
	
Atendimento de Catadores
	· Estacionamento;
· Guarda de carroças;
· Canil;
· Sala de atendimento veterinário a animais de estimação;
· Salão para coleta seletiva de materiais recicláveis com orientação sobre o manuseio do material reciclável e da sua comercialização;
· Disponibilização de uniformes;
· Cozinha,
· Copa,
· Banheiros masculino e feminino.
	
Estacionamento 100 vagas.
	
90 Mil m² de lote e 17 Mil m² construídos
	
· Guarda de carroças;
· Salão para separação de materiais recicláveis;
· Banheiros adaptados;
· Área de convívio;
· Curso de formação em costura, horta e jardinagem, Abrigo familiar e Curso de artesanato com sala para exposição das obras.
	
	
Abrigo Especial para Idosos
	· Dormitório masculino;
· Dormitório feminino;
· Elevadores;
· Banheiros masculino e feminino;
· Banheiros adaptados;
· Área para convívio; Sala de assistência à saúde que concedem informações quanto ao encaminhamento de aposentadorias/reintegração familiar;
· Oficina de alfabetização.
	
50 Leitos para abrigo.
	
	
	
	
Projeto de Formação Profissional e Incentivo à Economia Solidária
	· Cursos de formação em: Costura;
· Construção civil;
· Horta;
· Jardinagem;
· Cooperativismo.
	
560 pessoas por ano
	
	
 (
29
)
	
	
Projeto do Centro de Assistência Social Lar Ditoso
	
· Abrigo individual;
· Abrigo familiar.
	
340 Leitos temporários com expansão para 676 no inverno.
	
	
	
	
Restaurante-Escola
	· Cozinha;
· Refeitório;
· Banheiros;
· Despensa com capacidade para 17.000KG de alimentos.
	
2.000 pessoas
	
	
	
	
Centro de Convívio
	· Oficinas de Artes:
· Música;
· Alfabetização;
· Recreação;
· Salas de cinema;
· Área de debates e assembleias;
· Área de exposição com trabalhos dos albergados; Área de gincanas;
· Área de eventos.
	
200 pessoas.
	
	
	
	
Centro de Alfabetização de Adultos
	· Recepção na qual é realizado o 1º contato com a pessoa em situação de rua para preencher o cadastro dos desabrigados;
· Sala de alfabetização;
· Sala de leitura.
	
60 alunos
	
	
	
	
Telecentro
	· Cursos de informática; Salas de internet para hospedes e usuários da comunidade;
· Área de treinamento dos monitores de todo complexo.
	
	
	
	
	
ABRIGO 2 - Bud. Clark Commons - Funcionamento de 24 horas por dia.
	
	· Área de doações;
	
	
9.850 m² de área construída
	
	
	
	· Recepção;
	
	
	
	
	
	· Área comunitária;
	
	
	
	
	
	· Sala de exercícios;
	
	
	
	
	
	· Escritórios;
	
	
	
	
	
	· Cozinha;
	
	
	
	
	
	· Pátio privado;
	
	
	
	
	Abrigo
	· Dormitório masculino e feminino;
· Banheiros;
	
	
	
	
	
	· Depósitos;
	
	
	
	
	
	· Apartamento para moradia acessível;
	
	
	
	
	
	· Unidade comum acessível;
	
	
	
	
	
	· Administração;
	
	
	
	
	
	· Sala de aconselhamento;
	
	
	
	
	
	· Sala comunitária;
	
	
	
	
	
	· Varandas individuais.
	90 Leitos temporários e 130 apartamentos para moradia permanente.
	
	· Área de doações;
· Varandas individuais.
	
	
	· Pátio público;
· Recepção;
	
	
	
	
	
	· Área comum;
	
	
	
	
	
	· Sala multe uso;
	
	
	
	
	
	· Cozinha; Barbearia;
	
	
	
	
	
	· Sala de computação;
	
	
	
	
	
	· Canil Biblioteca;
	
	
	
	
	
	· Lavanderia;
	
	
	
	
	Centro
	· Lavanderia;
	
	
	
	
	
	· Vestiários;
	
	
	
	
	
	· Escritórios;
	
	
	
	
	
	· Sala de Artes;
	
	
	
	
	
	· Varanda-Jardim;
	
	
	
	
	
	· Administração;
	
	
	
	
	
	· Hall;
	
	
	
	
	
	· Sala de reunião;
	
	
	
	
	
	· Sala de Descanso;
	
	
	
	
	ABRIGO 3 – The Bridge - Funcionamento de 24 Horas por dia.
	
Edifício de Orientação
	· Recepção, Área comum;
· Setor de apoio a saúde física e mental;
· Setor de higienização;
· Consultórios médicos;
· Escritórios de advocacia e aconselhamento;
· Lavanderia;
· Setor para crianças; Biblioteca;
· Setor de treinamento;
· Abrigo de animais.
	
Capacidade para 6.000 pessoas
	
75.000 m² de área total
	
· Biblioteca;
· Pátio de convívio ao ar livre;
· Restaurante aberto, dormitórios individuais.
	
	Pátio Principal
	· Pátio de convívio ao ar livre;
· Jardim secreto.
	
	
	
	
	
Restaurante
	· Cozinha;
· Restaurante para abrigados;
· Restaurante aberto.
	
	
	
	
	
Dormitórios
	· Dormitório masculino individual;
· Dormitório feminino individual;
· Área de convívio; Banheiros.
	
	
	
Fonte: Guarda, 2014; Archdaily, 2011; Org. Anderson, M. H., 2019.
2.3.1 Síntese dos Programas de Necessidades
Por meio do Quadro 1, observou-se que a característica comum entre os três abrigos, além de acolher e proteger, é auxiliar na reintegração social e não somente oferecer pernoite. Embora muitas das funções sejam iguais nos três centros por questões de necessidades, como áreas administrativas e íntimas, é possível visualizar características e identidades únicas, como a Área de Guarda de Carroças e orientação para comercialização de materiais recicláveis do Abrigo 1, a Área de doações e acessibilidade em todo prédio no Abrigo 2, e no Abrigo 3 destaca-se o restaurante aberto ao público e dormitórios individuais que dão ao abrigado maior privacidade.
Percebe-se que as três obras foram projetadas especialmente para esse público. Apesar do Abrigo 1 ter sido uma reforma e ampliação, ainda assim, destaca-se pela quantidade de setores de serviços prestados, seguido do Bud Clark Commons e consequentemente do The Bridge.
O Abrigo 1 foi pensado para atender diferentes públicos, como, por exemplo, os catadores de materiais recicláveis que, ao frequentarem o abrigo, recebem a higienização, a reforma da carroça e uniformes para trabalhar com dignidade. Também há idosos que sofreram abandono pelos familiares, imigrantes que precisam de hospedagem por alguns dias e até famílias inteiras. Ademais, além de abrigar, o projeto também propõe uma reintegração entre os hóspedes e a comunidade por meio de atividades abertas ao público, bem como as aulas de informática, aulas de artesanato, curso de plantio em horta e um restaurante aberto ao público. Dessa forma, a reintegração torna-se mais simples e eficaz
(GUARDA, 2014).
O Abrigo 2 recebe grande procura devido aos andares superiores, oferecidos como apartamentos de moradias acessíveis. Essa alternativa torna-se eficiente, confortável e fácil de manter. Essas unidades contemplam: banheiros, duchas, cozinha, pátio externo privado e acesso privado. Porém, para desfrutar desse apartamento, é necessário preencher uma ficha de cadastramento e aguardar o chamado para receber o lar. Os hóspedes e as pessoas que usufruem dos espaços comunitários da oficina entram no prédio por meio do pátio público, onde há armários, bicicletários e na recepção são realizados os cadastramentos e a hospedagem, assim são direcionados para uma série de recursos, bem como: higienização pessoal, aconselhamento e posteriormente são disponibilizados outros setores do prédio (ARCHDAILY, 2011).
Por fim, quanto ao Abrigo 3, seu programa de necessidades apresenta poucas
 (
33
)
diferenças dos demais, mesmo assim, é referência pertinente devido à qualidade, bom desempenho dos serviços prestados e à integridade da arquitetura oferecida ao público (ARCHDAILY, 2011). Percebe-se por meio do Quadro 1 que a quantidade de serviços concedidos é proporcional à área disponível no lote quando a edificação não é verticalizada. No entanto, a dimensão dessa área não justifica a qualidade do serviço prestado. Nota-se esse fato ao relacionar a variedade de programas de cada edificação com o reconhecimento do público e as premiações recebidas pelo seu desempenho. A partir disso, conclui-se que qualquer espaço pode ser construído a partir de um bom planejamento arquitetônico.
Quadro 2 - Linguagem Arquitetônica.
	Linguagem Arquitetônica
	Inspirações Para O Projeto
	
ABRIGO 1 – Oficina Boracea
	Estruturação
	Tipo
	
	
	
Iluminação e ventilação
	· Aberturas basculantes favorecendo a ventilação natural;
· Telhas em policarbonato incolor;
· Cores neutras;
· Ventilação natural;
	
· Telhas em policarbonato incolor onde não houver laje ou forro;
	
	
Estrutura
	· Ventilação natural;
· Mista: Metal pesado Predominante;
· Alvenaria e divisórias em Dry Wall;
· Estruturara aparente.
	
	
	Sustentabilidade
	· Iluminação natural usada em todos os edifícios.
	
	
	
Disposição no lote.
	· Edifícios que formam um pátio central utilizando uma quadra completa;
· Predominância do sentido horizontal;
· Ambientes comuns no térreo.
	
	
	
ABRIGO 2 – Bud Clak Commons
	
	· Grandes aberturas favorecendo a ventilação natural;
	
	
	Iluminação e
	· Paredes cortina de vidro transparentes nos dois primeiros andares;
	
	
	ventilação
	· Cores neutras;
	
	
	
	· Ventilação natural.
	
	
	
	· Mista: Alvenaria predominante;
	
	
	Estrutura
	· Metal pesado
	
	
	
	· Divisórias em Dry Wall.
	· Ventilação natural;
· Acessibilidade em todo prédio;
	
	
	· Acessibilidade em todo o prédio;
· Ventilação cruzada;
	
	
	
	· Sistema de água aquecida a energia solar;
	· Materiais de origem
	
	Sustentabilidade
	· Telhado verde;
	local.
	
	
	· Equipamentos de encanamento de baixo fluxo;
	
	
	
	· Sistema de reciclagem de água cinza;
	
	
	
	· Materiais de origem local e colhidos ou produzidos de forma sustentável.
	
	
	
	· 1 edifício verticalizado em 8 pavimento, no entanto predomina o sentido horizontal ocupando
	
	
	Disposição no lote.
	meia quadra;
	
	
	
	· ambientes comuns no térreo.
	
 (
35
)
	
ABRIGO 3 – The Bridge
	
Iluminação e ventilação
	· Grandes aberturas basculantes;
· Paredes cortina de vidro transparentes e opacos;
· Cores claras e em tons pastéis;
· Sistema de ventilação por dutos.
	
· Grandes aberturas basculantes;
· Paredes cortina de vidro;
· Metal pesado predominante;
· Dry Wall;
· Estrutura aparente;
· Sistema de reciclagem de água.
	
	
Estrutura
	· Mista: Metal pesado predominante;
· Alvenaria; Divisórias em Dry Wall;
· Estrutura aparente;
	
	
	
Sustentabilidade
	· Sala de jantar com teto verde;
· Sistema de reciclagem de água cinza;
· Iluminação natural usada em todos os edifícios,
	
	
	
Disposição no lote.
	· 5 edifícios que formam um pátio central utilizando uma quadra completa;
· Predominância do sentido horizontal;
· Ambientes comuns no térreo.
	
Fonte: Guarda, 2014; Archdaily, 2011; Org. Anderson, M. H., 2019.
2.3.2 Síntese das Linguagens Arquitetônicas
Observou-se que os prédios optaram por um conceito horizontalizado, como mostra a Figura 2, e que aproveitam todo o térreo com uma volumetria de até 3 pavimentos, sendo que apenas o Edifício Bud Clark Commons verticalizou-se em 8 pavimentos, devido ao pequeno lote e a demanda do programa de necessidades.
Figura 2 - Implantação Oficina Borace/ Bud Clark Commons / The Bridge.
Fonte: Earth, 2019; Org. Anderson, M. H., 2019.
A espacialização do Abrigo 1 estabelece uma conexão dos espaços internos com o exterior por meio de pátios abertos e de convivência. No entanto, os usos mais comunitários como o restaurante, cinemas e as oficinas estão centralizadas junto com a praça, enquanto o restante do programa acontece no perímetro, com os acessos pelo interior (GUARDA, 2014).
O Abrigo 1 é beneficiado com grandes aberturas em fitas alinhadas com as vigas. Assim como em outros blocos do complexo, há paredes de cobogós5 que favorecem a ventilação e a não formação de ilhas de calor em seu interior. A materialidade é marcada pelo uso de alvenaria expressada fortemente na fachada e de metais utilizados principalmente em tesouras e pilares. As Figuras 3, 4 e 5 evidenciam essas características e a estrutura dos blocos que relembram galpões e indústrias, atributos marcantes que remetem ao próprio nome do complexo, Oficina Boracea (LOEBCAPOTE, 2003).
5 Parece de tijolos vazados que criam barreira apenas física obstruindo parcialmente a visibilidade e transpasse de ventilação.
 (
37
)
Figura 3 - Parede de cobogó do complexo Oficina Boracea.
Fonte: Loebcapote, 2003.
Figura 4 - Pátio interno do complexo Oficina Boracea.
Fonte: Loebcapote, 2003.
Figura 5 - Fachada de concreto do complexo Oficina Boracea.
Fonte: Loebcapote, 2003.
Há poucas informações sobre onde se localizam os setores dentro da área projetada, o que dificulta a compreensão de como os ambientes são interligados. Contudo, encontra-se informação dos serviços oferecidos e qual órgão é responsável pelo atendimento. Assim sendo, neste projeto, o entendimento da espacialidade e função provém das fotos disponibilizadas no site6 do escritório responsável pelo projeto arquitetônico, Loebcapote.
Apesar do que é oferecido no espaço, o edifício não priorizou áreas de maior concentração de moradores de rua. Assim, o projeto sofreu críticas da população da cidade, nas quais enfatizava-se que o complexo, na área em que foi implantado, aparentava ser uma espécie de isolamento dessa população, que poderia criar uma espécie de gueto. Além disso, mesmo sendo um dos maiores edifícios de acolhimento do Brasil, com o passar dos anos, alguns setores foram extintos ao longo das gestões, ou relocados devido à falta de auxílio financeiro para manter-se. Em 2016, a prefeitura trocou a gestão pública partilhada entre cinco ONGs pela gestão privada de apenas uma entidade. Assim, foi licitado o Instituto Cireneu, para minimizar custos e facilitar a administração. Dessa forma, as funções resumiram-se em três, o Telecentro (inclusão digital), a lavanderia e o restaurante. Além disso, os portões que ficavam abertos 24 horas por dia com acesso e saída livre passaram a ficar fechados, evidenciando o aspecto de abandono (STEFANEL, 2017).
Por conseguinte, muitos moradores de ruas formam filas do lado externo do complexo esperando uma vaga para o acolhimento, principalmente em épocas frias (GUARDA,2014).
O abrigo 2 necessitou ser revitalizado devido ao pouco espaço para edificar. No entanto, esse fato não se tornou um empecilho para desenvolver uma arquitetura de qualidade. O edifício dividiu-se em 3 setores importantes, sendo eles: Shelter, como setor principal; Day center, como setor intermediário e Housings, como setor final. Nota-se por meio da Figura 6 que os dois primeiros setores possuem integração com alguma
área paisagística que beneficia a qualidade de vida, tanto dos abrigados quanto dos inquilinos que podem utilizar o pátio público.
6 Local na Internet identificado por um nome de domínio.
40
Figura 6 - Setorização do edifício Bud Clark Commons.
Fonte: Archdaily, 2011; Org. Anderson, M. H., 2019.
Apesar do edifício não contemplar praças ou grandes jardins como os demais, sua relação do meio interno com o externo ocorre por meio das fachadas transparentes nos pavimentos de caráter público e pelas grandes aberturas do chão ao teto no nível térreo que remetem ao prolongamento da fachada como pode ser observado nas Figuras 7 e 8, respectivamente. A abundância de vidros permite a entrada de luz favorecendo a economia de energia pelo uso da luz natural evidenciando características da Arquitetura Contemporânea, como mostra a Figura 9. A fachada superior é de tijolos de cor clara e escura e com janelas padronizadas. Dessa forma, a padronização de esquadrias distingue as unidades sociais dos andares superiores, mas também faz uma declaração estética arrojada na porta de entrada para o centro de Portland. Os apartamentos são inseridos no lado sul do edifício, onde o acesso é restrito aos inquilinos ou seus convidados (ARCHDAILY, 2011).
A materialidade do Abrigo 2 compõe-se de alvenaria, metal e vidro.
Figura 7 - Fachada do edifício Bud Clark Commons.
Fonte: Archdaily, 2011.
 (
41
)
Figura 8 - Térreo com paredes de cortinas de vidro do Bud Clark Commons.
Fonte: Archdaily, 2011.
Figura 9 - Conexão visual com o meio externo do Bud Clark Commons.
Fonte: Archdaily, 2011.
Entende-se que os elementos fundamentais para o grande sucesso dessa edificação foram a acessibilidade, luz natural, circulação de ar abundante e materiais duráveis, sendo sustentável e funcional. O edifício também possui sistema de água quente movido a energia solar, iluminação eficiente em termos energéticos e telhados verdes reduzindo emissores de gases de efeito estufa, equipamentos de encanamento para reciclagem de água cinza e encanamentos específicos para redução do consumo da água, sendo esses materiais de origem local, fator importante para a sustentabilidade. A obra conta com uma certificação Liderança em Energia e Design Ambiental (LEED) pelo Green Building Council dos Estados Unidos (ARCHDAILY, 2011).
Por fim, o Abrigo 3 é o mais emblemático quando se refere à sustentabilidade e espacialização, pois dispõe de blocos com pé direito alto e pela translucidez e visibilidade
proporcionada pelas grandes esquadrias e a fachada principal, a qual é marcada por vidros coloridos que expressam o estímulo e o dinamismo do espaço, observados na figura 10 e 11.
Figura 10 - Translucidez da fachada de vidro do edifício The Bridge.
Fonte: Archdaily, 2011.
Figura 11 - Dormitório com iluminação natural do edifício The Bridge.
Fonte: Archdaily, 2011.
Quanto à implantação no lote, esta relembra a de uma universidade, interligando os blocos por meio do pátio central e passarelas. Dessa forma, cada setor está individualizado, e todos distribuídos em cinco edifícios, como mostra a Figura 12, desempenhando um papel específico que proporciona a funcionalidade (ARCHDAILY, 2011).
Figura 12 - Setorização edifício The Bridge.
Fonte: Archdaily, 2011; Org. Anderson, M. H., 2019.
O projeto arquitetônico buscou desenvolver uma linguagem inovadora em relação a visões e abordagens para enfrentar a falta de moradia, demonstrando alternativas diferenciadas e viáveis para a maneira como as pessoas em situação de rua são tratadas. O projeto foi realizado pela Overland Partners Architects, com sede em San Antonio, em parceria com Camargo Copeland Architects, LLP. Finalizado em maio de 2008, o projeto destacou-se pela preocupação com possíveis tragédias ambientais na cidade, assim disponibilizou espaço para mais de 6.000 pessoas. Além de engajar a comunidade do entorno, o complexo incorpora um prédio para prestação de serviços de três andares, sendo eles: um prédio de boas-vindas; um de armazenamento e um pavilhão ao ar livre com refeitório, sendo o ponto focal para o pátio interno do campus. Esse espaço proporciona a integração social entre os desabrigados, assistentes sociais e comunidade local. Uma de suas fortes características é a sustentabilidade, como a sala de jantar com teto verde, sistema de reciclagem de água cinza e iluminação natural usada em todos os edifícios. Sua materialidade consiste basicamente de tijolos, metal e vidro, também enfatizando seu estilo contemporâneo.
Contudo, entende-se que o Centro de Assistência a Desabrigados The Bridge é o modelo mais apropriado para edificações de acolhimento quando considerado todo o conjunto da obra: design, materialidade, função forma e sustentabilidade. Contudo, nota-se que a função e a forma são elementos essenciais para que o desempenho dos setores dentro da edificação sejam servidos com qualidade e fluidez (ARQUDALY, 2011).
2.4 SOLUÇÃO ESTRUTURAL / INTERIORES E PAISAGÍSTICAS
As obras visualizadas proporcionam ideias relevantes e construtivas referentes a estruturação e sua materialidade, uma vez que a proposta do albergue visa utilizar métodos de construção limpa, flexível e de curto período de execução. Para interiores, buscou-se influências de equilíbrio visual para ambientação, como: revestimentos; cores e mobiliários. E, para o paisagismo, a maneira adequada de harmonizar um espaço com vegetações nativas que influenciam positivamente na percepção e vida do ser humano.
2.4.1 Obra Refúgio São Chico como referência estrutural
Dentro do contexto do avanço da construção civil e das demandas de habitação no país, a utilização de sistemas industrializados como Light Steel Framing (LSF) surge como estratégia para suprir o desenvolvimento do setor e o constante crescimento da carência habitacional, uma vez que representa maior rapidez de execução com perdas mínimas; menor emprego de mão-de-obra e, consequentemente, aumento de produtividade e especialização, bem como redução considerável no próprio peso comparado a materiais convencionais e a melhoria dos acabamentos finais. Sendo esta uma construção seca, é um método que aos poucos vem sendo adotado no Brasil como uma alternativa construtiva mais ágil. No entanto, ainda nota-se o receio em utilizar o Steel Framing, pois quando se bate nas paredes com certa intensidade, ela emite um som oco que, erroneamente, faz-se alusão à fragilidade. Contudo, vale enfatizar que a ausência de tijolos não compromete a durabilidade nem o conforto térmico e acústico, pois as placas utilizadas nesse método são especialmente fabricadas para oferecer isolamento superior a uma obra convencional e atender as normas internacionais de desempenho (METALICA, 2008).
A cidade de São Francisco de Paula, a 100 km de Porto Alegre (RS), ganhou um refúgio erigido no steel frame com 82 m², como mostra a Figura 13. A edificação foi
construída em 17 semanas, incluindo os 28 dias de cura da base de concreto, e exibe armação do tipo Light steel frame, divisórias em drywall 7, painéis de gesso em Oriented Strand Board 8(OSB) e fechamento externo em chapas metálicas. Além de ágil, o sistema é leve (METALICA, 2008).
Figura 13 - Estrutura Light Steel Frame/ Fechamento OSB/ Fechamento Metálico.
Fonte: Metalica, 2008; Org. Anderson, M. H., 2019.
O Light Steel Frame é o mais utilizado entre os métodos de construção seca no Brasil, pois engloba uma armação de aço galvanizado recoberta por uma combinação de painéis que podem ser cimentícios, de OSB, gesso acartonado e outros materiais similares, podendo variar de um ambiente para o outro. Deve-se compreender que o LSF difere-se do drywall, pois as suas paredes têm capacidade estrutural, e não apenas de vedação. Os perfis fabricados são dispostos a cada 40 ou 60 cm sobre uma laje radier9 formando um esqueleto unido por parafusos. Em seguida, adiciona-se as camadas de fechamento por entre as quais passam encanamentos, fiações e um recheio de isolamento térmico e acústico, podendo ser lã de vidro, lã de rocha, isopor
entre outras. O isolamento pode ser controlado com o aumento da camada de placas intermediárias e a quantidade de lã do miolo (METALICA, 2008).
Após a finalização do projeto executivo, as etapas executivas dividiram-se em 9 semanas conforme explicitado no Quadro 3.
7 Parede divisória feita de uma estrutura metálica ou de madeira com chapas de gesso acartonado para isolamento nas laterais.
8 Painel estrutural de tiras de madeira orientadas perpendicularmente em diversas camadas.
9 Fundação rasa que se assemelha a uma placa ou laje de concreto armado que abrange toda a área da construção e recebe carga oriunda dos pilares e a distribui por toda sua área plana.
Quadro 3 - Etapas executivas Refúgio São Chico.
	Etapas executivas
	Refúgio São Chico
	Etapas
	Trabalho
	Fotos
	
	Etapa 1:
20 dias
	Executou-se a base para receber as estruturas da casa em steel frame/ iniciou-se os trabalhos de execução da laje em concreto armado. Executou-se as fundações em pedra e blocos de concreto para sustentação da laje.
	
	
	
Etapa 2: 1 Semana
	Realizou-se a execução da estrutura em steel frame num galpão em Porto Alegre (RS). Iniciou-se a montagem dos módulos (paredes e tesouras) da casa. Uma caixa em OSB serve como base para facilitar o trabalho de encaixe e fixação dos perfis. Depois de montados, os módulos estão
prontos para receber o revestimento em chapas de OSB.
	
	
	
Etapa 3: 1 Semana
	Iniciou-se a colocação das placas estruturais em OSB. Conforme as recomendações técnicas, as placas medindo 2,44 x 1,22m foram fixadas obedecendo um espaço de dilatação e travadas por meio de contraventamento necessário entre as placas.
Quanto aos módulos maiores, levando em consideração o peso da estrutura, o OSB foi fixado no local, a fim de facilitar o transporte.
	
	
	
Etapa 4: 1 Semana
	Iniciou-se os preparativos para montagem das paredes no local. Os módulos receberam fita de banda acústica (Neopreme) na soleira inferior para evitar o contato direto da estrutura com a laje, compensar as imperfeições do concreto, e ajudar no estancamento das paredes. Logo após, os módulos foram colocados sob a laje e fixados à pólvora por pinos e unidos por parafusos autobrocantes que dão rigidez e resistência à estrutura observando sempre o alinhamento e nivelamento do conjunto. Por fim, chumbadores e cantoneiras em aço complementam a ancoragem das
paredes.
	
	
	
Etapa 5: 1 Semana
	Iniciou-se a montagem das vigas de bordo e colocação das tesouras. Medindo 15m de comprimento por 0,55m de altura, as vigas foram fixadas sobre as paredes de uma lateral à outra, unindo o corpo principal da casa com a suíte. Essa viga, além da função estrutural, configura a platibanda que posteriormente ocultará a cobertura. Após, fixou-se às tesouras em intervalos de 1,20m seguindo a modulação do projeto. Por fim, completou-se a colocação dos painéis de OSB sugerindo uma ideia
aproximada da volumetria final da casa.
	
	
	
Etapa 6: 1 Semana
	Iniciou-se a colocação da membrana impermeabilizante e início da execução das instalações elétricas e a proteção da estrutura com a fixação do Tyvek (produto que assegura a estanqueidade da estrutura, além de permitir a passagem do vapor gerado internamente para fora da casa evitando a umidade nas paredes internas) Com a face externa protegida pelo Tyvek, a estrutura está pronta para receber os revestimentos e acabamentos finais. Em paralelo, iniciou-se a execução das instalações hidráulicas e a passagem dos eletrodutos. As tubulações em polipropileno para condução da água quente e fria foram executadas em sua maioria sob a laje, no balanço da casa, facilitando o trabalho. Já os pontos de luz receberam caixas de passagem e
eletrodutos conectando-se ao quadro de distribuição.
	
	
	
Etapa 7: 1 Semana
	Iniciou-se a colocação da telha de cobertura, calhas e rufos junto com a membrana impermeabilizante que complementa a vedação da casa. Finalizou-se as instalações hidráulicas e a passagem dos eletrodutos e quadro de distribuição. Ao mesmo tempo, iniciaram-se os serviços de carpintaria com a colocação dos marcos das esquadrias e revestimento em lambri
nas paredes externas.
	
	
	
Etapa 8: 1 Semana
	Iniciou-se a instalação da telha ondulada. O volume que envolve a área de estar, cozinha e serviços destacados pelo balanço e pela altura diferenciada, foi revestido com lambris de pinus auto clavado, complementando o serviço iniciado na semana anterior. Iniciou-se a instalação da telha ondulada no volume que abriga os dormitórios e banhos. Com a conclusão desses serviços e a instalação das esquadrias, a casa estará totalmente vedada e pronta para
receber os acabamentos internos.
	
	
	
Etapa 9: 1 Semana
	Na última etapa concluiu-se a colocação da telha ondulada e a montagem da estrutura metálica para apoio do deck. Com a fixação da telha ondulada nas paredes externas o trabalho da funilaria foi dedicado aos acabamentos. Para arremate da telha ondulada junto à cobertura instalou-se em todo perímetro um capeamento em chapa Galvalume dobrada. Fixou-se cantoneiras no encontro do revestimento em telha ondulada para melhor vedação. Em paralelo, a equipe de metalurgia executou a montagem da estrutura metálica para apoio do deck em pinus auto clavado. Vigas em aço projetadas em balanço medindo 9m x 2,9m foram ancoradas junto a estrutura
de concreto aramado.
	
Fonte: Metalica, 2008; Org. Anderson, M. H. , 2019.
Quando comparados, os tradicionais sistemas de construções em alvenaria são meios que podem ser considerados de baixa produtividade, uma vez que são orgânicos e completamente dependentes de dias sem chuvas ou qualquer intempérie que influencie de forma negativa a execução, e por necessitarem de um grande contingente de trabalhadores. Contudo, acredita-se que utilizar somente da alvenaria convencional como tecnologia, o déficit habitacional poderá não ser suprido devido a demora de execução desse método. Assim, a utilização do sistema Light Steel Framing para a execução de casas de acolhimentos e moradias de interesse social mostra-se uma alternativa viável por ser um sistema industrializado e racionalizado, aumentando a produtividade e diminuindo o desperdício de tempo e materiais, como visto no Quadro 3. A utilização desse sistema permite realizar execuções em larga escala, o que é fundamental para atingir metas de construção de espaços planejadas pelos órgãos governamentais. Além disso, um fator muito importante é o baixo nível de resíduos gerado pela obra resultando em menor impacto ambiental, diferente de uma obra em alvenaria que observa-se vestígios de tijolos, concretos, britas, formas de madeira,
entre outros (SANTIAGO; RODRIGRES; OLIVEITA, 2010).
Por fim, sistemas industrializados permitem um controle maior de qualidade por possuírem etapas bem sistematizadas, e, assim, garante-se maior durabilidade da edificação, bem como condições agradáveis para os trabalhadores exercerem o serviço. A fim dessa comprensão, é importante destacar que, o LSF não deve ser entendido como fator limitante de criação, pois a infinidade de combinações e arranjos conseguidos por meio dele, permite uma grande flexibilidade, nas mais variadas linguagens arquitetônicas (METALICA, 2008).
2.4.2 Casa três Gerações / BETA office for arquiteture and the city como referência para interiores
A Casa três Gerações foi projetada com o cuidado de abrigar as gerações de uma família, composta por dois núcleos familiares para viverem juntos, sendo eles os avós e os netos. O projeto de interiores foi conceituado em mudanças nas demandas espaciais ao longo do tempo. Dessa forma, apenas a estrutura nas laterais são de blocos de concreto, assim o layout torna-se livre para qualquer mudança (ARQUDALY, 2019). A Circulação vertical ocupa o centro do edifício, destacando-se pela sua estética arrojada e a forma de um elemento estrutural. Como mostra a Figura 14.
Figura 14 - Circulação vertical Casa três Gerações.
Fonte: Archdaily, 2019.
O casal de idosos ocupa o apartamento superior com vistas
generosas da paisagem urbana. Tal andar não apresenta desníveis, tornando-o muito adequado para os idosos. O apartamento inferior tem um escritório e uma relação direta com o jardim, tornando-o ideal para uma família desfrutar desse espaço com crianças pequenas. A Figura 15 mostra que o
projeto também se preocupou em obstruir efeitos sonoros e facilitar circulação de ar. Assim, a fachada norte é parcialmente fechada para reduzir a perda térmica e reduzir a exposição ao som ao longo da rua movimentada. Para o sul, o edifício se abre completamente, maximizando o ganho solar passivo e a conexão com o exterior.
Figura 15 - Fachadas Norte e Sul.
Fonte: Archdaily, 2019.
A materialidade ambiental remete ao estilo industrial sofisticado, como mostra a Figura 16, os blocos de concreto aparentes nas paredes, cimento queimado presente na laje, nas vigas e em demais elementos da casa, os metais utilizados na fachada sul juntamente com o corrimão da escadaria evidenciam esse ideal e dispensam a utilização de revestimentos e acabamentos que podem encarecer um projeto arquitetônico. Técnicas interessantes para serem aplicadas em uma obra pública.
Figura 16 - Elementos do estilo industrial sofisticado.
Fonte: Archdaily, 2019.
No entanto, as cores opacas não deixaram a casa fria e minimalista, como pode ser observado no mobiliário da cozinha, nas divisórias em madeira, conforme a Figura 17. A cor amarela da escada compensou essa frieza espacial e entraram em perfeita harmonia com a materialização estrutural da edificação, resultando num espaço confortável e ao mesmo tempo estimulante, como mostra a Figura 18.
Figura 17 - Divisórias em Oriented Strand Board (OSB).
Fonte: Archdaily, 2019.
Figura 18 - Escadaria com elementos metálicos e detalhes em amarelo.
Fonte: Archdaily, 2019.
A partir dessa ideia, compreende-se que um ambiente flexível para layout é um fator importante para uma casa de acolhimento, uma vez que os ambientes tenham a necessidade de se adequar com o decorrer do tempo devido ao evidente aumento populacional de uma cidade e, possivelmente, ao aumento de desabrigados. O arranjo entre tons frios neutros e estimulantes mostra-se ideal para aplicar em um projeto que haverá áreas de atenção, áreas de produção e áreas de criatividade.
2.4.3 Jardim sensorial Great Granny’s
O jardim é um espaço de prazer e lazer para maioria dos indivíduos. Os jardins não devem ser feitos apenas para compensar os vazios dentro da cidade, nem simplesmente só para inserir a natureza no espaço urbano. Esses devem ser compartilhados por todos e por quaisquer usuários, incluindo os portadores de deficiência em geral, ou seja, deficientes visuais, auditivos, físicos e idosos (CHIMENTTI, 2019).
Para ofertar um paisagismo acessível a qualquer cidadão, utiliza-se o jardim sensorial, cujo recurso garante o livre acesso a todos que queiram tocar ou cuidar das espécies com mais facilidade. Esse estilo de jardim possui influência oriental, ou seja, é por meio do tato que as texturas são percebidas; do olfato, que identifica o aroma característico de cada espécie; da audição, que reconhece o som das folhas que colidem entre si revelando a altura da copa e as águas que deslizam em um córrego; o paladar, que identifica os sabores dos temperos, chás e
frutas ou a visão, que reconhece todos esses elementos em conjunto (CHIMENTTI, 2019).
As ervas aromáticas são indicadas para consumo e para terapias alternativas. Elas entram por meio das células sensitivas que cobrem as passagens nasais, e vão diretamente ao cérebro. Assim, tais ervas afetam as emoções atuando no sistema límbico que controla as principais funções do corpo, algumas delas que mais se destacam pela fácil obtenção de sua espécies são o Alecrim, Hortelã, Manjerição e a Salsa. Além disso, essas espécies são perfeitamente adaptáveis ao plantio em jardineiras, pequenos canteiros ou vasos (CHIMENTTI, 2019) conforme mostra o Quadro 4.
Quadro 4 - Características ervas terapêuticas.
	Ervas Sensoriais
	Nome Científico
	Nome popular
	Benefícios
	Foto
	
Rosmarinus officinalis
	
Alecrim
	Erva proveniente da região mediterrânea, foi apreciada pelas virtudes aromáticas e medicinais que minimizam as dores do
reumatismo.
	
	
Mentha avensis
	
Hortelã
	Existem muitas variedades de hortelã, cada uma com características próprias. A essência aromática tem efeito terapêutico, e o chá das folhas é digestivo e
descongestionante nasal.
	
	
Ocimun minimum
	
Manjericão
	Erva natural da Ásia tropical, da África e de algumas ilhas do Pacífico. Serve como repelente de insetos em hortas e jardins. O chá relaxa e alivia dores de cabeça de origem nervosa. Também utilizado pelos terapeutas holísticos na aromaterapia, para tratar
vários outros sintomas.
	
	
Petroselinum sativum
	
Salsa
	A salsa pode ter as folhas e o talo aproveitado na mesma proporção, pois apresentam o mesmo aroma e sabor. Contém aroma
terapêutico para cistite e seu chá é diurético.
	
Fonte: Chimentti, 2019; Org. Anderson, M. H., 2019.
Contudo, para criação de jardim sensorial, evita-se espécies que possuem espinhos, tais como as roseiras, bromélias e algumas espécies de suculentas. Também deve-se evitar plantas munidas de substâncias tóxicas, como espinho de cristo e comigo-ninguém-pode
(CHIMENTTI, 2019). O Quadro 5 expõe algumas plantas que são indicadas para criação de jardins sensoriais no Brasil.
Quadro 5 - Plantas para jardim sensorial.
	Plantas sensoriais
	Plantas
	Nome popular
	Nome científico
	Plantas de tempero
	Cebolinha Orégano
	Allium sativum L., Allium cepa
	
	Orégano
	Origanum vulgare
	
Plantas medicinais
	Basilicão
	Ocimum basilicum var. basilicum
	
	Boldo-de-arvorezinha
	Coleus sp.
	
	Cavalinha
	Equisetum hyemale L.
	
	Chambá
	Justicia pectoralis Jacq.
	
	Falso-boldo
	Coleus ambonicus
	
	Gengibre
	Zingiber officinalis L.
	
	Gerânio-medicinal
	Pelargonium odorantissimum
	
	Guaco
	Mikania glomerata Spreng.
	
	Maranta
	Maranta arundinaceae L.
	
	Patchuli
	Pogostemum heyneanus Benth.
	
Plantas de perfume
	Bogarí
	Jasminum sambac
	
	Cravo
	Dianthus cariophyllus
	
	Jasmim-estrela
	Trachelospermum jasminoides Lindl.
	
	Madressilva
	Lonicera hildebrantiana
	
	Mini-gardênia
	Gardenia radicans florepleno
	
Plantas de texturas variadas
	Calancoe
	Kalanchoe	laxiflora,	Kalanchoe orgyalis
	
	Espada-de-são-jorge
	Sansevieria zeylanica laurentii
	
	Espadinha-anã
	Sansevieria hahnii
	
	Gasteria / língua-de-boi
	Gasteria verrucosa
	
	Jacaré
	Kalanchoe gastonis-bonnieri
	
	Lança-de-são-jorge
	Sansevieria cylindrica
	
	Roel (Rhoeo spathacea
	Discolor
	
Plantas aquáticas
	Agua-pé ou jacinto-d'água
	Eichornia crassipes
	
	Flores-vermelhas
	Ludwigia sedioides
	
	Ninféa ou nenufar
	Nymphae sp.
	
	Pinheirinho-d'água
	Miriophyllum brasiliense
	
	Santa-luzia ou alface-d'água
	Pistia stratiotes
Fonte: Chimentti, 2019; Org. Anderson, M. H., 2019.
Segundo Borgen, L e Guldahl, AS Biodivers Concerv (2011), o jardim Great Ganny’s, em Olso - Noruega, é um modelo de jardim sensorial desde 2008. O projeto foi criado pelo Jardim Botânico de Olso devido à necessidade de incentivar a população sobre preservação de espécies ornamentais com risco de extinção, uma vez que o crescimento urbano influenciou a minimização do cultivo quando as edificações novas eram construídas sobre jardins antigos que abrigavam inúmeras espécies raras. O Jardim Great Ganny’s fornece informações sobre a
história de cada planta e o trabalho realizado no jardim, que é de resgatar essas espécies ornamentais e antigas que eram cultivadas e tratadas de forma especial e introduzi-las na horticultura atual para encorajar seu uso nas horas atuais. Dessa forma, as vegetações ornamentais do Great Ganny’s contemplam uma variedade de formas, cores e aromas que estimulam vários sentidos, bem como as tradicionais vegetações, que também podem promover emoções agradáveis. As espécies estão dispostas em um layout orgânico e assimétrico que deixam o ambiente com estética mais natural, sem que pareça ter sofrido

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