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Texto1_Método Científico_CAP I_Livro

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Acerca do Método CientíficoI
 
Professor Doutor Ronaldo Mota 
 
 
Origens da Ciência e contribuições da Grécia Antiga 
 
Sociedades primitivas 
Acredita-se que os primeiros hominídeos tenham surgido na Terra há quatro milhões 
de anos. Por sua vez, a nossa espécie, o homo sapiens, há cerca de duzentos mil 
anos (figura 1a.). As sociedades primitivas organizavam-se de tal maneira a garantir 
o consumo necessário e suficiente à sobrevivência do grupo (figura 1b). A vida era 
regulada também pelo rito mágico, associado às primeiras interpretações do homem 
para os fenômenos naturais. 
a) b) c) 
Figura1: a) Representação do Homo Sapiens http://www.culturamix.com/cultura/curiosidades/a-
especie-homo-sapiens b) Representação da sociedade primitiva 
http://www.historia.templodeapolo.net c) Fragmento de ferramenta de osso usada para polimento de 
peles e couros por Neandertais tem apenas alguns centímetros de comprimento 
http://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2013/08/estudo-ve-indicios-mais-antigos-de-utensilios-
de-ossos-dos-neandertais.html   
 
 
2 
 
SAIBA MAIS: O misticismo e a organização social das tarefas entre os membros desses 
agrupamentos marcaram as primeiras evoluções desses grupos sociais ao longo dos 
primeiros milênios do aparecimento de nossa espécie na face do planeta. Os primeiros 
agrupamentos sociais praticavam uma economia marcada pela sobrevivência simples e o 
homem dessa época, temeroso das manifestações do mundo natural, caracterizava-se por 
enxergar os fenômenos naturais com espanto e os atribuía a seres mitológicos envoltos em 
indecifráveis mistérios (DE MEIS, 1967). 
O desenvolvimento de técnicas e a melhor utilização de utensílios marcaram esse 
processo evolutivo (figura 1c), transformando as sociedades de economia de 
subsistência em direção ao surgimento dos primeiros agrupamentos diferenciados, 
nos quais a produção ultrapassava as necessidades imediatas do grupo, ou seja, 
geravam, pela primeira vez, excedentes além de suas capacidades naturais de 
consumo (ANDERY, 1999). 
A Grécia Antiga 
A Grécia Antiga é o lugar, ao menos sob a ética do desenvolvimento do mundo 
ocidental, onde os historiadores melhor localizam a ocorrência de sociedades 
organizadas em função dos excedentes produzidos (figura 2). O desenvolvimento da 
produção mercantil associado ao escravismo, auxiliados pela melhor utilização de 
técnicas e utensílios para subjugar outros agrupamentos, são aspectos fundamentais 
para compreender aquela civilização no período que vai do século XII século ao II 
a.C. (KOYRE, 1922). 
 
Figura 2: Representação da Sociedade da Grécia Antiga 
 http://www.historiadomundo.com.br/grega/governo-grego.htm 
 
 
 
3 
 
Na esteira de tal dinâmica ocorrida na Grécia Antiga têm origem os primeiros 
momentos em que tentativas racionais de interpretação dos fenômenos naturais são 
estabelecidas. Ou seja, surgem os primeiros pensamentos que dispensavam 
interpretações mediadas necessariamente pelo divino e pelo sobrenatural (figura 3). 
             a)                        b)             
FIGURA 3: Desenhos de deuses da Grécia Antiga. a) Dioniso e sátiros. Interior de um vaso com 
figuras vermelhas, 480 a.C. b) Hércules e Atena. Cerâmica grega antiga, 480–470 a.C. 
http://amanecemetropolis.net/el-aprendiz-del-drama/ 
SAIBA MAIS: Substitui-se uma relação de espanto com a natureza por uma tentativa 
embrionária de explicar racionalmente o mundo à sua volta, em contraposição às 
interpretações míticas de seus predecessores (MOTA, 1997). 
A diferença essencial é que, ao contrário da narrativa baseada no mito e na crença, 
essa nova postura permite ser questionada, criticada e analisada. O conflito, 
portanto, entre o conhecimento mítico e racional marcam um momento crucial do 
processo de evolução do homem. 
SAIBA MAIS: Evoluções similares também ocorreram no mundo oriental, sem nenhum, ou 
muito pouco, contato com esses agrupamentos. Posteriormente, intercâmbios serão 
estabelecidos, mas cujas contribuições, ao menos por enquanto, não foram tão relevantes 
na história inicial do surgimento do pensamento racional no mundo ocidental. 
Nesse período da Grécia Antiga, marcado pelo surgimento do pensamento racional 
baseado no método, o qual era centrado na observação e na lógica, em oposição às 
abordagens míticas, podemos destacar os seguintes períodos distintos de sua 
história: período homérico (séculos XII-VIII a.C.) e helenístico (séculos III-II a.C.), 
conforme abordaremos, a seguir, com suas características próprias. 
 
4 
 
 
O período homérico 
As bases da civilização grega desenvolveram-se no período homérico, entre os 
séculos XII e VIII a.C., na região continental do Peloponeso e nas ilhas do Mar Egeu 
(figura 4). As suas origens, no entanto, remontam ao século XX a.C. na civilização 
micênica, centralizada na figura do rei, estruturada na servidão coletiva e com 
economia baseada na agricultura, artesanato e na utilização do bronze. Nesse 
período, desenvolveu-se a escrita, ainda que puramente para controle palaciano. 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 3: Mapa da Grécia Antiga http://lorraynneaudrey90.xpg.uol.com.br/geografia.html 
Em torno de 1200 a.C. a invasão dos Dórios pôs fim à civilização micênica, introduziu 
o uso do ferro, o que implicou no aprimoramento das armas de guerra, e substituiu a 
realeza pela aristocracia. As decisões que eram exclusivamente palacianas foram 
para as praças públicas (ágoras), compartilhadas por todos os cidadãos, o que não 
queria dizer escravos. 
Com os Dórios, as forças produtivas tiveram um significativo avanço, com aumento 
na produção de cereais, óleo, vinha, horticultura, pastoreio e artesanato (tecelagem, 
fiação, trabalhos em metal, cerâmica etc.). Da mesma forma, iniciaram-se as cidades 
(polis) com uma diversidade social mais complexa envolvendo, além da aristocracia e 
dos escravos, os artesãos, trabalhadores liberais, pequenos proprietários e militares. 
 
5 
 
No século IX a.C. reaparece a escrita, desaparecida desde a civilização micênica, 
agora com nova função, muito mais pública do que aquela dos tempos da realeza. 
SAIBA MAIS: As obras de Homero (Ilíada e Odisseia) constituem, sem dúvida, o que de 
mais importante foi escrito nesse período. Ilíada versa sobre o período de lutas (guerra de 
Troia) e acerca de heróis de guerra. Por sua vez, a Odisseia refere-se a um período de paz, 
retratando relações familiares e a vida doméstica. 
Na obra de Homero, a relação homem-deuses é um tema recorrente, valorizando o homem à 
medida que humaniza os deuses, os quais tinham formas e sentimentos humanos. Na 
mesma proporção que o homem aproxima-se dos deuses, e vice-versa, nessas obras 
permite-se a busca da compreensão dos fenômenos do Universo de uma forma mais 
humana e menos divinizada, portanto, gradativamente mais racional e menos mágica. 
 
O período arcaico 
O próximo período (arcaico, nos séculos VII e VI a.C.) caracteriza-se pelo 
estabelecimento definitivo das cidades-estados, um aprimoramento das polis do 
período anterior. As polis (figura 5) compreendiam as cidades e suas redondezas 
mais próximas, sendo unidades econômicas, políticas e culturais independentes entre 
si. Nesse período intensifica-se o comércio, surgem as moedas utilizadas nas trocas 
de mercadorias e que representavam os símbolos das polis respectivas. Ocorre 
também um aumento da utilização do trabalho escravo, permitindo aos cidadãos da 
aristocracia liberação quase total dos trabalhos manuais. 
 
Figura 5: Polis Grega http://www.mundoeducacao.com/historiageral/grecia-antiga.htm 
 
6 
 
 
O período arcaico se por um lado aprofunda o conceito de democracia, por outro 
distancia ainda mais os cidadãos dos não cidadãos, definindo um incremento da 
prática da cidadania nas decisões, desde que garantida a exclusão de setores não 
participantes. 
Nesse período, fruto da liberação dos trabalhosmanuais e da capacidade crescente 
do pensamento abstrato, alguns pensadores marcam o período com a produção de 
concepções complexas e profundas. Os mais importantes são Tales, Anaximandro, 
Anaxímenes (escola de Mileto), Pitágoras, Parmênides, Heráclito e Demócrito 
(BORNHEIM 1967). 
SAIBA MAIS: Tales (625-548 a.C.) introduziu a matemática na Grécia com conhecimentos 
possivelmente adquiridos, em parte, de desenvolvimentos anteriores dos egípcios. Destaque-
se também o papel de Anaximandro (610-547 a.C.) na elaboração pioneira de um mapa do 
mundo. Esses pensadores estavam rompendo com a abordagem mítica e estabelecendo as 
bases do pensamento racional. Além disso, a natureza e os fenômenos naturais eram os 
temas centrais de suas investigações. 
SAIBA MAIS: Pitágoras (580-497 a.C.), contribuiu com a noção de número, a visão de 
harmonia por intermédio da música, e a concepção da alma. Na matemática, sua grande 
contribuição foi o teorema de Pitágoras. Heráclito (540-470 a.C.) atribuía ao fogo um papel 
primordial, aquele que tudo transforma e para o qual tudo é transformado. A ideia da 
constante transformação (as coisas quentes esfriam e as coisas frias esquentam) e da 
tensão entre opostos marcam a essência de seus pensamentos. 
SAIBA MAIS: É marcante o papel de Demócrito (460-370 a.C.), discípulo de Leucipo, que 
elaborou acerca do universo composto por um número infinito de partículas indivisíveis 
(átomos), constituintes básicos de tudo. Fora dos átomos, somente o vazio. Tais 
pensamentos tinham por característica central reconhecer a natureza como única fonte de 
problemas e também de respostas, dispensando, dessa forma, a abordagem mítica. 
 
 
 
7 
 
O período clássico 
No próximo período (clássico, nos séculos V e VI a.C.), uma cidade-estado 
diferencia-se das demais de forma significativa (figura 6). Na polis de Atenas a 
democracia grega consolida-se na sua plenitude, na mesma medida em que se 
consolida o desprezo pelo trabalho manual e a maturidade dos pensamentos de seus 
filósofos. 
 
Figura 6: Representações da Polis de Athenas 
Além dos escravos e da aristocracia, há um grande contingente de estrangeiros 
obrigando um refinamento do conceito de cidadão e de cidadania. Aumenta o fluxo 
de troca de produtos na economia, exportando vinho, azeite e cerâmica e 
importando alimentos, matérias-primas e escravos. Atenas vivia também da cobrança 
pela proteção militar de cidades próximas. 
Esse período, apogeu econômico e político de Atenas, foi também um período de 
muitas guerras (contra Esparta, entre outras), de grandes conflitos internos e com 
existência de partidos políticos antagônicos. 
A preocupação com a produção e a transmissão dos conhecimentos fez surgir 
homens cujo papel era prover aos filhos dos cidadãos com posses uma educação 
refinada e adequada ao sucesso na vida pública e privada. São os sofistas, 
profissionais pagos para, por meio da filosofia, prover a educação necessária ao 
cumprimento de seus objetivos propostos. A medida do potencial de sucesso de um 
homem era, segundo os sofistas, a sua capacidade de convencer outros por meio tão 
somente da força de seus argumentos. 
 
8 
 
O período clássico é muito rico de importantes pensadores, mas certamente três 
filósofos marcam esse período de uma forma singular. São eles, em ordem 
cronológica, Sócrates, Platão e Aristóteles. 
 
SAIBA MAIS: Sócrates (469-399 a.C.), embora educado pelos sofistas, por eles 
desenvolveu uma grande aversão. Sua discordância incluía a defesa de valores de virtudes 
permanentes contra o relativismo, assim como seu pavor pelas convenções de 
comportamento e modos de vestir defendidos pelos sofistas. Nada tendo escrito, até mesmo 
porque acreditava que o autoconhecimento deveria ser fruto do diálogo permanente e sem 
ocupar as mãos, o que dele sabemos é por meio de seus discípulos. Era central no seu 
pensamento a necessidade do homem primeiro reconhecer a sua própria ignorância, para, 
por meio do diálogo e da ironia, descobrir em sua alma o conhecimento. Assim, a sabedoria 
estava na descoberta do conhecimento pelo homem em si mesmo. Segundo Sócrates, o bem 
e a virtude eram conceitos e valores universais, imutáveis e permanentes. 
SAIBA MAIS: Platão (426-348 a.C.) foi o mais importante discípulo direto de Sócrates. 
Diferentemente de seu mestre, ele era o membro legítimo da aristocracia ateniense e deixou 
uma vasta obra escrita. Estabeleceu, via literatura, o diálogo como método bem 
sistematizado. Fundou a Academia que pretendia ser uma escola, aberta exclusivamente aos 
cidadãos, para treinar os futuros governantes. Seus pensamentos baseavam-se na crença 
que os homens eram dotados de corpo mortal e alma imortal, da qual provinha todo o 
conhecimento. A alma era prisioneira do corpo, sendo que após a morte reencarnava em 
outro corpo. Assim, o conhecimento, embora contido na alma imortal, exigia um esforço 
metódico para ser adquirido. A alma, onde reside a verdade, não tem necessidade do corpo 
para sensações externas para conhecer, sendo a matemática o saber por excelência. Suas 
obras, como O Timeu (PLATÃO, 1971) e A República (PLATÃO, 1965), marcaram 
profundamente toda a história posterior do pensamento até os nossos dias. 
 
Figura 7: Sócrates 
Figura 8: Platão 
 
Figura 9: Aristóteles
 
9 
 
SAIBA MAIS: Aristóteles (384-322 a.C.) não foi contemporâneo de Sócrates, ainda que 
influenciado por ele, nasceu quando Platão já tinha 42 anos e estudou na Academia 
convivendo com ele por um período (Aristóteles tinha 36 anos na morte de Platão). 
Aristóteles, ao contrário de Sócrates e Platão, não é de Atenas, ele era originário do norte da 
Grécia, região sob domínio macedônico, onde seu pai era médico de Felipe II, imperador da 
Macedônia. Inicialmente, assumiu as teorias de Platão para depois rejeitá-las, fundando sua 
própria escola denominada Liceu. 
Diferentemente de Platão, para Aristóteles corpo e alma compõem uma unidade 
indissociável (ARISTÓTELES, 1973). A alma era a forma que dava a vida, enquanto o 
corpo era a matéria que precisava dessa forma para tornar-se ato. Assim, o corpo 
não é mais a prisão da alma. Aristóteles classificava os seres pela complexidade de 
sua alma, sendo que nessa hierarquia do cosmos a Terra e suas criaturas eram 
inferiores ao mundo supralunar, caracterizando-se por moverem em linha reta, 
compunham-se de quatro elementos (água, ar, terra e fogo) e corrompiam-se. Por 
sua vez, no mundo supralunar, os movimentos eram perfeitos (esféricos) e eternos, 
dispensando explicações e motivos. Mesmo assim, tratava-se de uma explicação 
racional (não divinizada) do Universo, permitindo estabelecer um método para o 
conhecimento 
Para Aristóteles, o método compreendia quatro níveis distintos: a sensação, o mais 
elementar, a memória, tratava da conservação das sensações e era a base para o 
conhecimento científico, a experiência, que permitia estabelecer a relação entre os 
fenômenos singulares, e, por fim, o mais importante, o conhecimento dos universais, 
que tratava com as causas das coisas e era entendido como conhecimento 
propriamente qualificado. Dessa maneira, para construir afirmações universais é 
preciso descobrir as qualidades essenciais das coisas, seus atributos, para tanto o 
uso dos sentidos, a observação dos fenômenos singulares e o uso do raciocínio 
indutivo, permitindo fazer asserções universais. Ao invés da indução, passagem dos 
individuais para os universais, poderia ser feito uso da dedução (silogismo), ou seja, 
o raciocínio demonstrativo, que Aristóteles entendia como sendo de fato a via mais 
importante para o conhecimento. 
. 
 
10 
 
 
O fim do período clássico marca a oposição Aristóteles-Platão em termos da visão do 
homem enquanto animal racional e mortal contraposto a alma imortal presa no corpo 
mortal. Ocorre também a queda de Atenas, invadida pelos macedônicos, patríciosde 
Aristóteles, que saem vitoriosos e unificam a Grécia, preparando o próximo período 
denominado helenístico. Nesse novo império a vasta obra de Aristóteles, que incluía 
astronomia, física, biologia, botânica, política e, particularmente, sua especial 
preocupação com o método serão referências básicas que influenciarão além dos 
limites do próprio império. 
 
O período helenístico 
No período helenístico (séculos III e II a.C.) o império macedônico centraliza-se no 
Monarca, primeiro Felipe II e depois seu filho Alexandre. Descaracteriza-se a polis 
grega, cujas disputas internas tinham sido um dos motivos da queda de Atenas, 
gerando espaço para a unificação grega necessária para enfrentar os persas. O 
império expande-se muito durante Alexandre, porém, com sua morte, a disputa 
entre seus generais divide o império em três reinos em luta. O general Ptolomeu 
controlava Egito, Arábia e Palestina, o general Antígono garantia o controle de Grécia 
e Macedônia, e o general Seleuco tinha o controle da Síria, Mesopotâmia e Ásia 
Menor. 
Como é possível observar, da dimensão geográfica do Império Grego deu-se origem, 
nesse período, a uma significativa fusão da cultura grega com o conhecimento 
oriental. Em particular, o Museu de Alexandria transformou-se no mais importante 
centro de pesquisa daquela época. Os reis egípcios participaram ativamente desse 
empreendimento, mesmo porque eles consideravam os avanços no conhecimento 
científico, na medicina e na literatura como parte do tesouro real. Assim, pela 
primeira vez na história do homem, foi criada uma instituição de caráter científico 
organizada e financiada pelo Estado (lembremos que a Academia de Platão e o Liceu 
de Aristóteles eram de cunho privado). O Museu tinha uma ênfase em investigação 
 
11 
 
da natureza e contava com laboratórios de pesquisa, jardim botânico, zoológico, 
salas de dissecação, observatório astronômico e uma grande biblioteca. 
 
 
 
 
 
 
 
Em outubro de 2002, o Egito reinaugurou a Biblioteca de Alexandria. Para tentar 
compensar os 500 mil rolos de pergaminho queimados no século IV, o novo imóvel 
tem um arquivo que inclui 10 bilhões de páginas da internet, compilados desde 1996 
(consultas disponíveis no site www.bibalex.gov.eg). 
Foi no Museu que Euclides, na primeira metade do século III a.C., apresentou uma 
síntese de todo o conhecimento matemático produzido pelo homem até então. 
Igualmente, Arquimedes determinou o número π, dando início ao cálculo 
infinitesimal, além de propor os fundamentos da mecânica (movimento uniforme e 
circular) e as bases da hidrostática (conceito de empuxo). 
A astronomia também teve um grande impulso, em particular a proposição 
sistematizada do sistema geocêntrico, proposto por Ptolomeu. Antes dele, também 
no Museu, Aristarco de Samos havia proposto originalmente o sistema heliocêntrico, 
 
Figura 10: Biblioteca de Alexandria 
http://www.fisica‐interessante.com/aula‐
historia‐e‐epistemologia‐da‐ciencia‐5‐historia‐
da‐epistemologia‐3.html 
 
 
 
Figura 11: movimento na Biblioteca de 
Alexandria 
http://caosnosistema.com/wp‐
content/uploads/2013/06/biblioteca‐din‐
Alexandria‐acervo.jpg 
 
 
12 
 
pouco compreendido por contrariar a visão aristotélica adotada como base do 
pensamento. 
Depois de seu apogeu, o Museu entra em decadência com a perda do financiamento 
do Estado, tendo, no entanto, papel fundamental na história posterior, muito 
especialmente na segunda parte da Idade Média, a partir do século XI, quando 
Aristóteles e todo o conhecimento acumulado é repassado de volta para a Europa, 
seja aquele produzido na Grécia Antiga assim como aquele ali produzido e 
hibridizado com técnicas e pensamentos orientais. 
 
SAIBA MAIS: No ano de 305 a.C Ptolomeu I Sóter foi proclamado faraó e se tornou um líder 
que acolhia os sábios do mundo inteiro de braços abertos. Demétrio de Falero, líder de 
Atenas, foi obrigado a se exilar na cidade de Ptolomeu I devido às guerras. Os dois 
compartilhavam dos mesmos ideais e se tornaram grandes amigos. Com isso, decidiram 
colocar em prática um projeto cuja intenção era reunir e classificar todos os tipos de 
conhecimento registrados em rolos de papiro ao redor do mundo, fazendo de Alexandria a 
capital do conhecimento. 
Iniciou-se, então, a construção do magnífico Templo das Musas [museu] com dezenas de 
salas de investigação e leitura, zoológicos, diversas hortas e jardins, laboratórios para 
dissecações, observatório astronômico e a imponente Biblioteca de Alexandria. 
Sabendo que para tornar Alexandria o centro do conhecimento mundial, precisava reunir os 
intelectuais, o faraó começou a oferecer moradia, dinheiro e alimentação para que 
estudassem no museu em troca da dedicação integral à busca pelo conhecimento. O sucesso 
foi tanto que tiveram que ampliar e o Templo de Serápis foi erguido. 
Em 391 d.C., o patriarca Teófilo I destruiu a Biblioteca sob as ordens do Imperador 
Teodósio, que havia unido Roma ao Cristianismo e passou a perseguir os pagãos e outras 
religiões. 
Infelizmente o medo dos governantes e sacerdotes frente ao conhecimento que vinha sendo 
desenvolvido destruiu o que, segundo Carl Sagan, foi, em seus tempos, a glória e o cérebro 
da mais importante cidade do planeta, o primeiro instituto de investigação da história do 
mundo 
 
13 
 
 
 
 
Pensamentos da Idade Média e da Renascença e o surgimento 
do Método Científico 
 
Final do Império Romano e início da Idade Média 
O Império Romano (séculos l a.C. a século V d.C.) que seguiu-se à queda do Império 
Grego e Macedônico teve muitas contribuições no campo da retórica, de estruturas 
urbanizadas, aquedutos e técnicas de guerra, mas que não foram tão fundamentais 
na compreensão histórica e no desenvolvimento do tema específico que estamos 
tratando. Na verdade, o uso do latim pelos romanos constituiu-se em um elemento a 
 
Figura 12: Museu de Alexandria 
http://caosnosistema.com/wp‐content/uploads/2013/06/biblioteca‐alexandria.jpg 
 
 
 
14 
 
mais para dificultar a utilização plena do conhecimento produzido em grego até 
então. 
Assim, abordaremos o período Medieval, no qual, ao seu final, se estabelecerão as 
bases do início da ciência moderna, a partir da redescoberta de antigos pensadores 
da Grécia Antiga via, simbolicamente, aquele conhecimento guardado no Museu de 
Alexandria. 
O final do Império Romano (séculos IV e V) está associado à aceleração da 
destruição do modo de produção escravista, o qual tornara-se dispendioso, gerando 
o empobrecimento dos pequenos proprietários. Além disso, revoltas contra os altos 
impostos, invasões dos bárbaros do norte, que somados aos interesses de grandes 
proprietários em busca de maior autonomia, levaram ao fim de Roma e dos demais 
centros urbanos da época. 
As novas relações a partir dos séculos V e VI são centradas na figura do senhor 
feudal (grande latifundiário) e nos servos da gleba (arrendatários, pequenos 
agricultores, mas não escravos). A prestação de serviços (jovens camponeses no 
corpo de guarda do senhor feudal e a prática do maritagium para as jovens) e 
pequenos excedentes agrícolas eram as formas de pagamento usuais dos servos ao 
senhor em troca pela proteção dentro dos limites da gleba. A vida no feudo 
caracterizava-se pela autossuficiência, produção agrícola e criação de animais de 
pequena monta e pequena indústria caseira (MONTEIRO, 1986). 
Após a queda do Império Romano no século V, a Igreja de Roma é o centro da 
cristandade ocidental e divide com os senhores feudais o controle de boa parte da 
Europa. A Igreja terá do século V até o século XII um quase monopólio do saber, 
inclusive da leitura e da escrita, exercida via o controle do sistema educacional. 
 
Alta e Baixa Idade Média 
O período da Idade Média está compreendido entre os séculos V ao XV. Adota-se 
como marco referencial para o início da Idade Média o período que se segue à 
divisãodo Império Romano (oriente e ocidente) em 395 e como final a tomada de 
 
15 
 
Constantinopla pelos turcos otomanos em 1453. Não se pode enxergar a Idade 
Média como um período homogêneo, dado que conviveram civilizações com 
organizações políticas e sociais muito diferentes, mesmo assim esse período tem 
características bastante marcantes. 
Entre seu início (século V) até os séculos XI e XII é correto afirmar ter sido um 
período em que quase nada aconteceu na dinâmica da história como um todo na 
Europa, sendo denominada de Alta ldade Média. Claramente houve exceções em 
centros mais dinâmicos pontuais, como Granada, na Espanha. Em geral, nada 
acontecia e era muito comum alguém viver sem ter circulado além de poucos 
quilômetros do lugar em que nasceu. Gerações se passaram sem que transformações 
sociais e econômicas significativas ocorressem. Tal visão, no entanto, deixa de ser 
verdadeira na Baixa Idade Média (séculos XI ao XV), em que, ao contrário da fase 
anterior, um período de acentuada dinâmica ocorreu (GIORDANI, I983). 
Os séculos XI e XII são marcados por incremento da interação dos povoados com 
mercadores árabes do Mediterrâneo. Resultante dessas interações, um conjunto de 
inovações técnicas foram incorporadas gradativamente à produção agrícola e 
artesanal. Podemos destacar as técnicas agrícolas adotadas nas margens dos rios 
Nilo, assim como nos rios Tigre e Eufrates. A adoção de curvas de nível, plantação 
em rodízio, correções do solo, utilização de quedas da água, utilização da charrua e 
do cavalo em substituição ao arado puxado por boi ou gente, a correta encilhagem 
do cavalo, permitindo uma tração muito maior (preso no corpo e não na cabeça, 
como anteriormente). Além disso, a utilização da força hidráulica, a moagem de 
grãos por moinhos de vento, o crescimento da atividade têxtil via o aperfeiçoamento 
do tear, ajudados pelo transporte de mercadorias via o aperfeiçoamento náutico 
(leme de popa e mastro na proa), a utilização da bússola, a fundição do ferro, a 
introdução do papel, o surgimento posterior da imprensa, o conhecimento da pólvora 
e do canhão, tudo isso foram elementos fundamentais que geraram a chamada 
revolução verde na Europa (MOTA, 1991). Ou seja, uma explosão, um crescimento 
sem precedentes da produção agrícola, gerando uma quantidade muito acima da 
capacidade local de consumo, fazendo com que o intercâmbio de produtos 
constituísse um novo fenômeno que alteraria as relações sociais e econômicas de 
 
16 
 
toda uma região, espalhando-se a partir da Península Ibérica em direção ao centro 
da Europa (FRANCO, 1986). 
 
 
 
 
 
 
 
Além disso, fruto dessas novidades e geração inédita de riquezas, entre os séculos XI 
e XIII, surgem grandes empreendimentos em toda a Europa, tais como construções 
das grandes catedrais e o surgimento das primeiras universidades. 
 
 
 
 
 
Figura 13: Técnicas agrícolas 
http://schafergabriel.blogspot.com.br/2015/02/o‐
feudalismo.html 
 
 
Figura 14: Catedral de Notre Dame, Paris, França. Início da construção:  1163 
 
17 
 
 
 
 
 
Transição do feudalismo para o capitalismo 
A decadência do regime feudal, movida pelo crescimento do comércio, a necessidade 
de maior controle das rotas comerciais e o ambiente urbano atraente, gerando um 
abandono de servos em direção às cidades, acabam por resultar nas condições 
apropriadas para o florescimento das monarquias absolutas europeias. A partir do 
século XV, novas rotas no Atlântico substituem gradativamente as tradicionais do 
Mediterrâneo. Simultaneamente, Inglaterra, França, Holanda, Espanha e Portugal 
conquistam colônias e cada vez adentram mais o Mediterrâneo (BERNAL, 1976). 
Até o século XIII, a Igreja detém a única forma centralizada e hierarquizada do saber 
via o monopólio dos ensinamentos, em geral visando exclusivamente a formação de 
seus próprios religiosos. Assim, essa instituição constitui, na prática, o único poder 
que ultrapassa os limites dos feudos e utiliza muito bem o monopólio do saber, da 
leitura e da escrita em um controle educacional rígido e centralizado. 
Figura 15: Universidades de Paris (França), de Oxford (Inglaterra) e de Cambridge (Inglaterra) 
http://www.brasilescola.com/historia/universidades‐na‐idade‐media.htm 
http://www.telegraph.co.uk/education/universityeducation/8674265/Trinity‐College‐Cambridge‐A‐
talent‐for‐nurturing‐the‐life‐of‐the‐mind.html 
 
18 
 
A partir do século XIII, fruto do crescimento dos entrepostos comerciais e 
florescimento de uma nova classe, os burgueses, que detêm recursos e podem ter 
iniciativas, esboçam os primeiros centros universitários da Europa, inicialmente na 
Península Ibérica. Essas primeiras Instituições de Ensino, não dispondo de mestres 
de suas próprias regiões e recém egressas de um período medieval limitador, 
procuram junto aos mercadores sábios do oriente que pudessem constituir-se nos 
primeiros professores. Embora tenham vindo de diversas regiões, há uma 
concentração de sábios que são remanescentes de Alexandria, que haviam 
preservado os ensinamentos da Grécia Antiga e mesclado esses conhecimentos com 
contribuições de todo o oriente. Eles conheciam, e bem, Aristóteles, que havia sido 
traduzido do grego para o árabe. Por ser um conhecimento completo, enciclopédico 
e de fácil ensinamento, constituiu a primeira tarefa desses sábios concluir a tradução 
integral de Aristóteles para o latim e ensiná-lo nessas Instituições emergentes. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
De fato, Platão já era bem conhecido da Igreja via Santo Agostinho (SANTO 
AGOSTINHO, 1973), tendo influenciado fortemente os círculos internos da Igreja na 
Alta Idade Média (séculos V ao X). Da mesma forma, a Igreja interessa-se por 
Aristóteles e, via São Tomás de Aquino (SÃO TOMÁS DE AQUINO, 1973), por ele é 
influenciada na Baixa Idade Média (séculos XI ao XV). 
 
Figura 16: Um Burgo típico e uma ilustração de comércio medieval 
http://idademedia2012.tumblr.com/ 
http://www.historiadigital.org/curiosidades/10‐curiosidades‐sobre‐as‐cidades‐medievais/ 
 
19 
 
O final da Idade Média é um período de profundas contradições. A peste negra do 
verão de 1347 contribuiu para a afirmação do poder da Igreja, via autoridade papal, 
sendo que coube à Igreja a tarefa de coordenar os trabalhos de restauração da 
ordem nas cidades que haviam se desintegrado política e economicamente. 
Até o final da Idade Média, a Terra é inquestionavelmente o centro do Universo em 
torno das visões do mundo hierarquizado de Aristóteles (século IV a.C.) e do 
astrônomo egípcio Cláudio Ptolomeu (século II d.C.). Acreditava-se e ensinava-se 
que Deus criara o céu em movimento circular perfeito e eterno. Por sua vez, o nosso 
mundo era imperfeito, dado que, formado de água, ar, fogo e terra, deteriorava e 
morria. Assim, o mundo era constituído de oito grandes esferas, sendo que o Sol 
ocupava a primeira, depois a Lua, após os cinco planetas conhecidos (Marte, 
Mercúrio, Júpiter, Vênus e Saturno) e, por fim, na última esfera, todas as estrelas. 
Após o período medieval há um grande vazio intelectual. As bases consolidadas da 
escolástica, centrada no pensamento enciclopédico de Aristóteles, pode ser 
questionada, porém, nada há similar que possa substitui-lo no seu conjunto. Assim, 
esse período caracteriza-se pela magia, feitiçaria e alquimia. Tudo pode ser aceito, 
mas nada era consolidado, tudo parecia aceitável e condenável simultaneamente, 
carecendo de solidez os pensamentos propostos (MOTA, 1997). 
Por outro lado, o homem agora é a preocupação principal, ao passo que até então o 
essencial havia sido discutir a relação homem-Deus. Isso abre espaço para tornar-se 
cada vez mais relevante a relação homem-natureza. Destaque-se, nesse período, a 
importância das ideias de Francis Bacon (1561-1626) que, a partir da oposição ao 
teocentrismo, via o antropocentrismo, e da oposição à fé pela razão propõe a ciência 
prática emcontraposição à ciência contemplativa praticada até então. De acordo 
com Bacon, a descoberta de fatos verdadeiros depende principalmente de 
observações experimentais guiadas pelo método indutivo e não de raciocínios 
matemáticos (BACON, 1973). Suas análises eram baseadas no exame de fatos, tipo 
presença e ausência. A maior falha do seu pensamento reside exatamente na pouca 
importância que ele conferia à hipótese e o menosprezo exagerado à formulação 
matemática. 
 
20 
 
No campo religioso, essa fase de transição entre o feudalismo e o capitalismo 
caracteriza-se pela ocorrência da Reforma Protestante, de alguma forma associada 
aos obstáculos da Igreja Católica às práticas capitalistas burguesas e também 
relacionado com a vontade dos Reis de não dividir o poder centralizado com o Papa 
(WEBBER, 1930). Conforme cresce a Reforma, a Igreja lança a contrarreforma, onde 
particularmente a Companhia de Jesus tem, entre outras missões (inquisição, por 
exemplo), o papel de empreender uma ação pedagógica em oposição à escolaridade 
protestante. 
 
A Renascença 
A Renascença tem seu eixo principal na Itália, tendo sido a primeira região a 
recuperar-se dos acontecimentos da Peste Negra. Além disso, a Itália era o centro do 
trânsito crescente entre a Europa e o Oriente Médio. Por ali passavam 
necessariamente as especiarias, os perfumes e as sedas. Ocorre nesse período um 
significativo refinamento de sistemas administrativos, práticas bancárias e 
conhecimentos financeiros em geral. Florença em torno do século XV já detém um 
efervescente sistema bancário associado ao comércio internacional. A matemática 
(geometria, trigonometria e álgebra), usada na construção, na navegação, na 
cartografia e no levantamento topográfico, se desenvolve fortemente. Por exemplo, 
o cosmólogo italiano Paolo Toscanelli (1397-1482) fornece a Colombo o mapa que o 
guiou na primeira viagem à América. 
 
21 
 
O clima do final da Idade Média, o florescimento das artes na Renascença, a 
redescoberta da literatura clássica grega, as grandes navegações, o surgimento de 
Instituições de Ensino com alguma independência da Igreja, a Reforma Protestante, 
tudo isso são elementos que propiciam uma nova concepção acerca da maneira pela 
qual uma teoria deve estar ligada aos fatos observados que ela se propõe a explicar 
(KOIRÉ, 1984). 
Rigorosamente, submeter ao controle experimental enquanto critério de verdade tem 
como precursor o filósofo inglês Roger Bacon que, no século XIII, defendia a ideia da 
verificação e falseamento a partir da verificação experimental (BACON, 1973). Ele ia 
além disso, propondo que o experimento era também fonte de novas e importantes 
verdades, as quais não poderiam ser descobertas de outra maneira, ou seja, por 
pensamentos puramente abstratos (de acordo com Roger Bacon: o experimento não 
é só para verificar ele também é fonte de conhecimento original). 
 
Heliocentrismo versus geocentrismo 
Um dos marcos da transição entre o pensamento medieval e o surgimento da ciência 
moderna diz respeito à discussão do heliocentrismo em oposição ao geocentrismo. 
Em 1463, a lgreja, a pedido de agricultores e navegantes, encomenda a um de seus 
agregados e protegidos, o astrônomo Johann Müller, estudos visando a correção do 
 
Figura 17: Paolo Toscanelli e uma reconstrução hipotética do mapa que guiou Colombo 
http://www.arcetri.astro.it/~ranfagni/CD/CD_TESTI/TOSCNLLI.HTM 
 
22 
 
calendário egípcio (365 e ¼ dias), adotado desde Júlio César no sec. I d.C. A 
encomenda do Papa Sisto IV não é atendida satisfatoriamente, mas Müller publica o 
Epitome em 1496, sendo uma das primeiras obras a contrapor-se a Ptolomeu, em 
particular à sua obra Almagesto, ao defender que a Terra não era imóvel, imutável e 
centro do Universo. 
A tarefa não cumprida por Müller é posteriormente repassada a Nicolau Copérnico 
(1473-1543), também agregado da Igreja. Em 1514, Copérnico comunica ao Papa 
Clemente VII que o problema da Páscoa (cada vez a Páscoa parecia acontecer antes) 
não teria solução antes que as relações entre Terra, Sol e Lua fossem mais bem 
estabelecidas. Em 1530, Copérnico adota o heliocentrismo e, em 1543, na sua obra 
As Revoluções, afirma categoricamente: a Terra é esférica e seis planetas giram em 
torno do Sol em órbitas perfeitas. 
O mais importante de tudo é que Copérnico, com essas hipóteses, resolveu o 
calendário, substituindo o calendário Juliano pelo Gregoriano com 365 dias, 5 horas, 
48 minutos e 46 segundos. Ou seja, 11 minutos e 14 segundos mais longo do que o 
anterior. No mesmo ano de publicação de sua obra Copérnico morre, evitando 
constrangimentos a ele e à Igreja que adota o calendário proposto, mesmo negando 
as hipóteses (ao menos publicamente) que lhe deram origem e respaldo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 18: Nicolau Copérnico e a teoria heliocêntrica 
http://www.infoescola.com/biografias/nicolau‐copernico/ 
http://www.astromia.com/fotohistoria/heliocentrico.htm 
 
23 
 
 
A chamada revolução copernicana foi fundamental, tendo sido onde, pela primeira 
vez, foi elaborado de forma mais sistemática a ideia de que o sistema solar pode ser 
visto e estudado como uma estrutura independente das demais estrelas. Mesmo 
assim, contemporaneamente, logo em seguida à sua morte, suas ideias foram 
condenadas pela Igreja por estarem em conflito com a Bíblia e por não explicarem os 
fortes ventos da rotação da Terra. Mesmo líderes religiosos como Calvino e Lutero 
também o condenaram. Assim, permaneceu a Terra no centro do Universo no 
decorrer do Renascimento. 
Se Copérnico foi motivado pelo calendário, o dinamarquês Tycho Brahe (1546-1601) 
tinha, como principal propósito, medidas precisas dos movimentos dos corpos 
celestes. Ele foi motivado pela demanda crescente dos navegadores por mapas 
celestes, bússolas e relógios mais exatos. Tycho descobriu o surgimento de novas 
estrelas, o que provaria que a imutabilidade do céu, apregoada por Aristóteles, era 
um equívoco. O rei da Dinamarca (Frederico II), em 1576, concedeu a Ilha de Vem 
(próxima a Copenhagem) para Tycho montar um observatório. Ainda que a 
observação fosse a olho nu, lembre-se de que o telescópio ainda não fora inventado, 
Tycho obteve pleno sucesso no mapeamento de estrelas e dos movimentos dos 
planetas. Curioso observar que Tycho Brahe foi, durante toda sua vida, geocêntrico. 
Seu trabalho, no entanto, teve aplicações imediatas para navegadores, agricultores e 
fabricantes de relógios. 
O principal continuador da obra de Brahe foi Johannes Kepler (1571-1630), nascido 
na Alemanha, que, em que pese sua infância pobre e difícil, foi eternizado como o 
responsável pela descoberta das leis de movimento planetário. Em 1600, um ano 
antes da morte de Tycho Brahe, Kepler foi trabalhar com ele, de quem recebeu todos 
os rigorosos registros dos movimentos dos corpos celestes. 
Fazendo uso desses dados, entre 1609 e 1618, Kepler anuncia as leis do Movimento 
Planetário: 
1. Todos os planetas giram ao redor do Sol em órbitas elípticas; 
 
24 
 
2. Uma linha radial que ligue qualquer planeta ao Sol varre áreas iguais em 
tempos iguais; 
3. O quadrado do período da revolução de um planeta é proporcional ao cubo de 
sua distância média em relação ao Sol. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O grande mérito de Kepler está justamente em pensar em termos de forças físicas e 
não em governo divino ou coisa semelhante. Dessa forma, Kepler une a astronomia 
com a física. Mesmo assim, Kepler morre como um saudosista do Universo perfeito e 
geométrico (órbitas perfeitas e circulares) de Aristóteles que ele mesmo ajudou a 
desmontar. 
 
Galileu e a completeza do Método Científico 
As contribuições de Kepler foram fundamentais para que Galileu (1564-1642) desse 
prosseguimento à sua obra. O telescópio aperfeiçoado de Galileu foi um dos 
instrumentos responsáveis que permitiram que esse pesquisador de Pisa revelasse o 
céu deuma maneira que ninguém houvera feito antes. 
Galileu, aos 17 anos, começou estudar medicina em Pisa, abandonou o curso por 
problemas financeiros, seguiu para Florença, retornando aos 25 anos para pleitear 
 
Figura 19: Kepler e o Movimento planetário 
https://esquadraodoconhecimento.files.wordpress.com/2013/03/kepler.png 
 
25 
 
uma cátedra na Universidade de Pisa. Para tanto, apresentou um tratado sobre 
centro de gravidade nos sólidos. 
Galileu opôs-se a Aristóteles, entre outros temas, afirmando que dois corpos de 
massa diferentes caem em tempos iguais se desprezada a resistência do ar. Tal 
afirmação estava em contradição profunda com os ensinamentos básicos de 
Aristóteles e, por extensão, com a Igreja. Supostamente Galileu teria utilizado a 
Torre de Pisa para essa demonstração. Se de fato tal experimento ocorreu é menos 
relevante do que a afirmação da necessidade do experimento enquanto critério de 
verdade. 
Se os gregos estabeleceram o pensamento racional e o primeiro método baseado na 
observação e na lógica, Galileu representa simbolicamente uma nova revolução: a 
afirmação do método científico enquanto observação, lógica e experimentação 
(BANFI, 1983). 
No verão de 1592, Galileu renunciou à sua cátedra em Pisa e foi para Pádua à 
procura de espaços mais abertos às suas novas e revolucionárias ideias. Disputou 
uma cátedra também pretendida por Giordano Bruno (1548-1600), o qual viria a ser 
morto, queimado vivo, em 1600, por determinação do Papa Clemente VIII. Bruno, 
após ter sido ordenado padre em Nápoles, dirige-se para ensinar em Paris e Londres, 
caracterizando-se pelo combate permanente às ideias de Aristóteles, em particular 
acerca da Terra não ser o centro do Universo, afirmando ser o Universo infinito e que 
as estrelas não se encontravam fixas em uma esfera cristalina. Giordano influenciou 
bastante Galileu e marcou sua vida como mártir da liberdade de expressão. 
Galileu viveu 18 anos em Pádua, onde deu continuidade aos trabalhos de Kepler, 
organizou e sintetizou o ramo da mecânica na física, escreveu a obra O Ensaidor 
(GALILEU, 1973), que trata especialmente do método científico, escreveu sobre a 
teoria das marés e aperfeiçoou o telescópio, o que permitiu o estudo das manchas 
solares e a compreensão da superfície montanhosa da Lua. 
Em 1610, Galileu observou quatro satélites em torno de Júpiter, semelhantes à Lua 
na Terra e identificou a Via Láctea como composta de estrelas e não de substância 
nebulosa. Lembremo-nos de que foi exatamente por motivos similares que Giordano 
 
26 
 
Bruno houvera sido condenado à morte alguns anos antes. Galileu, da mesma forma 
que Giordano, afirmou ser papel da Bíblia preocupar-se com a moral e não com a 
ciência. Galileu acreditava que a Bíblia não poderia ser interpretada ao pé da letra e 
prestava-se a diferentes interpretações. 
Inicialmente, até 1614, Galileu não teve maiores problemas com a Igreja. No 
entanto, em 1615 ele foi convocado a comparecer junto à Igreja e desafiado a 
demonstrar a conciliação da Bíblia com os pensamentos de Copérnico, ou então a 
renunciar explicitamente às suas ideias. Galileu justificou que os postulados de 
Copérnico eram, para ele, uma simples suposição matemática. 
Em 1616, o Cardeal Belarmino decretou que o sistema copernicano era falho e 
errôneo e proibiu as obras de Copérnico, o que não havia ocorrido até então, e 
afirmou que Deus fixou a Terra em seus alicerces para jamais ser movida. 
Em 1624, o novo Papa, Urbano VIII, amigo de Galileu, autorizou Galileu a escrever 
Os Sistemas do Mundo. Em 1632, Galileu publica Diálogo Sobre os Dois Máximos 
Sistemas do Mundo (GALILEU, 1973). Ainda que bem recebido na comunidade 
acadêmica, causa irritação na lgreja, especialmente em Urbano VIII, principalmente 
por não ter Galileu respeitado o decreto de 1616. 
 
Figura 20: Galileu Galilei e seu livro Diálogo Sobre os Dois 
Máximos Sistemas do Mundo 
http://www.ccvalg.pt/astronomia/historia/galileu_galilei/galil
eu_galilei.gif 
http://en.wikipedia.org/wiki/Dialogue_Concerning_the_Two_
Chief_World_Systems#/media/File:Galileos_Dialogue_Title_Pa
ge.png 
 
27 
 
 
 
Finalmente, em 1633, aos 70 anos de idade, Galileu foi uma vez mais colocado entre 
a fogueira e a negação de suas convicções. Galileu renega tudo o que fez, 
sentenciando, porém, ao final, em voz baixa, que mesmo assim ela (a Terra) se 
move (e pur, si muove). 
Galileu morre em 1642 e somente em 1757 a Igreja retirou sua obra da lista de 
proibidos. Em 1992, 359 anos mais tarde, o Papa João Paulo II reconheceu 
oficialmente que os teólogos que condenaram Galileu não souberam reconhecer a 
distinção formal entre a Bíblia e sua interpretação. Isso os levou a traspor 
indevidamente para a fé uma questão pertinente à investigação científica. 
Newton e a Ciência Moderna 
A vida e contribuições de Isaac Newton 
No ano em que morreu Galileu, 1642, nasceu na Inglaterra Isaac Newton. Nascido 
prematuro, tendo seu pai falecido três meses antes, aos três anos foi abandonado 
pela mãe e criado pela avó. Quando completou dez anos, sua mãe retornou após a 
morte do Pastor que ela havia acompanhado e com quem teve outros filhos. 
Em que pese todo esse conjunto de dificuldades, Newton formou-se aos 23 anos em 
Cambridge, Inglaterra, em um período marcado por uma forte incidência da peste 
bubônica, que levou ao fechamento da Universidade de Cambridge. 
Newton retornou à sua terra natal e por lá permaneceu 18 meses, os quais foram 
muito profícuos e criativos, gerando a formulação de teorias que revolucionariam 
 
28 
 
toda a ciência moderna. Nesse intervalo de tempo, Newton elaborou as leis do 
movimento: 
1. Um corpo em repouso continuará em repouso, a menos que uma força atue 
sobre ele e um corpo em movimento retilíneo uniforme, continuará a mover-
se em linha reta com velocidade constante a menos que uma força atue sobre 
ele; 
2. A aceleração (taxa de variação da quantidade de movimento) é diretamente 
proporcional à força; 
3. A cada ação corresponde uma reação igual e oposta. 
A partir dessa formulação, em termos de leis gerais do movimento, inicia-se 
plenamente a ciência mecânica ou, em outras palavras, a física clássica, ou, em 
termos mais gerais ainda, a ciência moderna. 
A grande revolução estava justamente em encontrar leis matemáticas simples e 
precisas, a partir das quais tornava-se possível trabalhar minuciosamente com as 
medidas observadas experimentalmente. 
Newton afirmou que ele só pôde completar sua obra, indo muito além e enxergando 
bem longe, porque apoiara-se em ombros gigantes. Referia-se a vários, mas 
particularmente a Galileu e a Kepler, com justiça. 
Curiosamente, embora toda essa formulação estivesse acabada após os 18 meses de 
retorno à casa da avó, mesmo tendo retornado a Cambridge posteriormente, Newton 
não publica de imediato seus achados. Somente 17 anos depois, em 1684, ao 
mostrar seus resultados e análises para Edmond Halley, um grande astrônomo da 
época, foi tão grande a insistência, que Newton concordou com a publicação, a qual 
foi paga por Halley. Foi Halley, com crédito para tanto, quem escreveu o prefácio 
daquela que é considerada a mais influente obra escrita por um único indivíduo em 
toda a história da humanidade (BRODY e BRODY, 2000). 
O Principia (NEWTON, 1979), na verdade, é constituído de três livros: 
1. Mecânica; 
2. Movimento dos corpos em meios com resistência (ar ou água); 
 
29 
 
3. Estrutura e funcionamento do sistema solar, inclusive o tratamento das marés 
e cometas. 
 
 
 
Embora essa obra tenha despertado enorme interesse da comunidade científica da 
época, Newton perde parcialmente seu interesse pela ciência, elege-se para o 
Parlamento cinco anos após sua publicação, tendo também ocupado os cargos de 
Supervisor e Diretor da Casa da Moeda. De 1703 até sua morte, Newton foi 
Presidente da Royal Society de Londres. 
Em 1704, Newton publicaÓptica (NEWTON, 1979), um tratado sobre reflexões e 
cores da luz, elementos sobre os quais houvera trabalhado e escrito em 1675, cerca 
de trinta anos antes. Newton escreveu também sobre química, alquimia e religião, 
mas foi com o Principia, especialmente, complementado pelo Óptica, que ele 
registraria eternamente seu nome como um dos maiores cientistas de todos os 
tempos. 
 
Consolidação do Método Científico 
Os gregos têm o mérito da introdução do método, enquanto observação e lógica. 
Galileu, simbolicamente, representa a introdução da experimentação completando o 
método científico como tal. Por sua vez, Newton representa o amadurecimento e a 
constatação de que todo o conhecimento científico sobre o mundo deve ser 
construído por intermédio da utilização do método científico. Tudo pode ser 
racionalizado, medido e calculado. Newton estabeleceu a possibilidade de chegar às 
Figura 21: Isaac Newton e o Principia 
http://www.brighthub.com/science/space/articles/49929.aspx#imgn_0 
http://en.wikipedia.org/wiki/Isaac_Newton#/media/File:NewtonsPrincipia.j
pg 
 
30 
 
leis sobre a natureza com ênfase no poder da razão. Gradativamente, a partir de 
então, o racionalismo passa a ser, cada vez mais, considerado uma característica 
diferencial do ser humano. A razão é vista como mecanismo, meio de obtenção do 
conhecimento e guia das ações humanas. 
Em síntese, o método científico é definido como o método pelo qual cientistas 
pretendem construir uma representação precisa – ou seja, confiável, consistente e 
não arbitrária – do mundo à sua volta. Em geral, podemos afirmar ter o método 
científico quatro etapas fundamentais: 
1. Observação e descrição de um fenômeno ou grupo de fenômenos; 
2. Formulação de uma hipótese para explicar os fenômenos. Muitas vezes tais 
hipóteses assumem a forma de um mecanismo causal ou relação matemática; 
3. A hipótese é utilizada para prever a existência de outros fenômenos, ou então 
para predizer, quantitativamente, a ocorrência de novas observações 
possíveis; 
4. Realização de testes experimentais acerca das previsões por vários 
experimentalistas independentes e confirmação dos pressupostos adotados. 
Caso os experimentos confirmem as hipóteses e as previsões decorrentes, 
pode-se construir uma lei ou teoria científica. 
Cabe destacar, brevemente, que as palavras hipótese, modelo, teoria e lei, usadas 
arbitrariamente acima, apresentam conotações diferentes com relação ao estágio de 
aceitação do conhecimento acerca de um grupo de fenômenos. 
Uma hipótese é uma afirmação limitada acerca de causa e efeito em situações 
específicas. A palavra modelo é reservada para situações nas quais é sabido que a 
hipótese tem, pelo menos, uma validade limitada. Uma teoria científica ou lei 
representa uma hipótese, ou grupo de hipóteses relacionadas, as quais têm sido 
confirmadas por testes experimentais confiáveis e independentes (DA COSTA, 1997). 
Interessante também observar que não é a ciência nossa única forma de entender e 
representar o mundo. Há uma variada gama de conhecimentos que, embora sendo 
conhecimentos, não fazem parte daquilo que denominamos conhecimento científico. 
Incluem-se nessa categoria os conhecimentos religiosos e populares. Para ser 
 
31 
 
conhecimento científico há que ser proveniente do uso, assim como estar submetido 
ao teste, do método científico. Dessa forma, não basta ser verdade, para ser 
conhecimento científico há que ser verdadeiro e demonstrável à luz do método 
científico (MOTA, 2000). 
A título de explicação do discutido acima, imagine alguém que firmemente crê em 
vidas em outros planetas. Trata-se de crença pessoal que pode ser verdadeira, dado 
que é possível que tais seres existam. Assim, embora respeitável enquanto fé, no 
entanto, não é ciência. Não por não ser verdadeiro, dado que igualmente não pode a 
ciência provar a impossibilidade de vidas extraterrestres, mas sim por não haver 
provas que atendam aos pressupostos do método científico. 
 
Os séculos XVIII e XIX e as relações entre ciência, tecnologia e produção 
Consolidada a ciência moderna com Newton, foi exatamente a visão de que não 
bastaria entender o mundo, era preciso modificá-lo, que implicaria nas grandes 
transformações que marcaram os séculos XVIII e XIX. Em particular, a máquina a 
vapor, descoberta por James Watt em 1784, representou um tremendo impulso na 
área da produção (ANDERY, 1999). 
A partir de então, ciência e produção interferem-se mutuamente. A ciência modifica, 
altera, submete a natureza à sua volta a serviço do homem. 
No século XIX, a ciência organiza-se formalmente, deixando suas práticas 
basicamente amadoras, sendo que especialmente na Inglaterra, na França e na 
Alemanha ela volta-se naturalmente para os interesses da produção. 
Esse período tem como característica a ênfase no poder da razão. O racionalismo 
passa a ser entendido como uma marca natural do ser humano, e a razão, mais do 
que um mecanismo de obtenção do conhecimento, era vista como um guia das 
ações humanas. 
A possibilidade de se chegar a leis sobre a natureza gera o pressuposto de que há 
regularidades e uniformidades nos fenômenos – quer físicos ou sociais – já que todos 
 
32 
 
passam a ser considerados fenômenos naturais. Em suma, em princípio, acreditava-
se que tudo pudesse ser observado, medido e calculado. 
No decorrer do século XIX, há um grande desenvolvimento capitalista, podendo ser 
entendido como dividido em dois grandes momentos. Primeiro até 1848, período em 
que ocorreu uma expansão centrada principalmente nos países industrializados. 
Nesse período, crescem as forças produtivas e a classe operária cresce tanto em 
número como em nível de pobreza. Na mesma proporção aumenta sua consciência 
política, enquanto classe, dando origem à proposta do socialismo. 
Em 1848, há uma enorme efervescência na Europa, um período revolucionário, 
levando os capitalistas a prepararem mudanças e implementarem um novo momento 
do desenvolvimento capitalista (BERNAL, 1976). A unificação da Alemanha e da Itália 
em meados da segunda metade do século XIX contribui com a implantação de 
políticas nacionalistas e liberais. 
Marx, participante ativo da esquerda Hegeliana, em 1841 defendeu sua tese de 
doutorado acerca da filosofia de Demócrito e Epícuro (MARX, s/d). Posteriormente, 
ele trabalhou acerca da concepção materialista do homem e da história em 
contraposição à visão idealista de Hegel. Uma vasta produção posterior, incluindo os 
Manuscritos Econômico-Filosóficos (1844) (MARX, 1984), Miséria da Filosofia (1847) 
(MARX, s/d), Ideologia Alemã (1848) (MARX e ENGELS, 1980), Manifesto Comunista 
(1848) (MARX, 1985), O Dezoito Brumário (MARX, 1985), O Capital I (1867), II 
(1885) e III (1894) (MARX, 1983), marcarão profundamente a virada do século IXI 
para o XX. 
A importância de Marx, do ponto de vista do método, está justamente na tentativa 
de elaboração de um sistema explicativo baseado em bases metodológicas, 
consubstanciadas no materialismo histórico e no materialismo dialético. A visão de 
Marx está centrada na concepção de que as transformações na sociedade se dão via 
contradições e antagonismos, estando o desenvolvimento associado à superação 
permanente desses conflitos, sendo que os elementos de transformação não estão 
fora da sociedade, mas sim efetivados por meio do próprio homem enquanto agente 
social. 
 
33 
 
Tais pensamentos de Marx partem da abordagem que as ideias são decorrentes da 
interação do homem com a natureza, de um homem que faz parte da natureza e que 
recria constantemente suas concepções da natureza, a partir de sua interação com 
ela. Para Marx não é a consciência dos homens que determina seu ser, mas o 
contrário, é o seu ser social que determina sua consciência. Interessante observar 
aqui que a concepção materialista de Marx carrega em sua base uma visão da 
natureza e da relação do homem com essa natureza.Do ponto de vista do método, de acordo com Marx, é da produção e da base 
econômica que se parte para explicar a própria sociedade. Trata-se de, no limite, 
tentar descobrir nos fenômenos leis que originam e conduzem às transformações. 
Marx alerta, no entanto, que não é possível, no campo social, pensar-se em leis 
abstratas, imutáveis, atemporais e a-históricas. Trata-se, segundo ele, de descobrir 
as leis que, sob condições históricas específicas, são as determinantes de um 
fenômeno que tem existência em condições dadas, e não uma existência que 
independe da história. 
Considerando que Marx estava atrás da descoberta das relações e conexões, 
envolvendo a totalidade dos fenômenos, compreendidos a partir da realidade 
concreta, sua obra representa tanto um marco do pensar ou agir político como, 
também, a questão do método nas ciências. 
O conhecimento científico adquire, de forma acentuada a partir de Marx, o caráter de 
ferramenta a serviço da compreensão do mundo visando sua transformação. No caso 
específico de sua visão política, a serviço de uma classe, os trabalhadores, e em 
conflito com os detentores dos meios de produção. 
 
Fim do século XIX e começo do século XX 
A ciência na virada do século XIX para o século XX explicita sua não neutralidade. O 
caráter do conhecimento científico, enquanto comprometido com a transformação 
concreta do mundo, geraria a certeza de que o século seguinte só não seria mais 
como houvera sido até então. 
 
34 
 
O clima dominante na Europa no começo do século XX é o positivismo lógico, 
baseado em que algo só é verdadeiro se for possível demonstrá-lo lógica e 
empiricamente. Assim, matemática e ciência são consideradas fontes supremas de 
verdade. 
Charles Sanders Pierce, filósofo americano, considerado o fundador da filosofia do 
pragmatismo, afirma no começo do século XX que a verdade absoluta é, por 
definição, tudo aquilo que os cientistas afirmarem ser verdadeiro quando chegarem 
ao final de seu trabalho (WIENER, 1966). 
 
Os grandes filósofos da ciência do século XX 
 
Papel da ciência e da tecnologia na sociedade contemporânea 
Ciência e tecnologia, particularmente no século XX, constituíram elementos centrais 
do mundo e são fundamentais para procurar entender aqueles tempos (MOTA, 
2001). Curiosamente, em que pese sua relevância, jamais o conhecimento, no 
sentido amplo da palavra, esteve tão distante entre aqueles que o praticam e o 
desenvolvem nas suas fronteiras e a população em geral. 
Assim, o cidadão comum do século XX, embora tão próximo dos impactos de novas 
descobertas científicas, em geral, sabe muito pouco sobre os dilemas da ciência 
atual, como ela é produzida e, particularmente, acerca do método científico e seus 
questionamentos. 
Tais dilemas tornaram muito claro que entender a história da ciência, a questão da 
metodologia científica e a educação científica e tecnológica constituem ingredientes 
absolutamente fundamentais para que as sociedades contemporâneas possam 
adequadamente analisar seus problemas, escolher as soluções e enfrentar seus 
destinos de forma esclarecida. 
Uma geração de filósofos tratou desse tema de forma muito profunda, tentando 
estabelecer como os cientistas do século XX e, também os atuais, lidam com suas 
 
35 
 
próprias hipóteses e, fazendo uso de suas metodologias, constroem suas teorias. Em 
particular, examinaremos esses tratamentos à luz de três dos mais importantes 
filósofos da ciência que marcaram profundamente o pensamento do século XX: Karl 
Popper, Thomas Kuhn e Paul Feyerabend. 
Para entender os dilemas que cercam a adoção do método científico no século XX e 
nos dias de hoje é preciso conferir especial atenção aos reflexos de poder e de 
prestígio que a ciência adquiriu ao final do século XIX. Como ressaltado 
anteriormente, o positivismo lógico era a filosofia dominante na virada entre os 
séculos XIX e XX, definindo como verdadeiro tudo aquilo, e somente aquilo, que 
pudesse ser demonstrado logicamente e empiricamente. 
Karl Popper e a refutabilidade 
No decorrer do século XX há um movimento de pensadores contestando essa atitude 
perante a ciência. Destacam-se os esforços de Karl Popper (POPPER, 1934; ibid, 
1945; ibid, 1963) em distinguir entre ciência verdadeira e pseudociência. Popper, 
diferentemente dos positivistas lógicos, negava a afirmação de que os cientistas 
pudessem provar uma teoria por indução, por testes empíricos, ou via observações 
sucessivas. 
Popper estabelece, a partir de seu critério de refutabilidade, uma distinção entre 
ciência verdadeira testável, via modos empíricos de conhecimento, e ciência irônica, 
ou seja, ciência que não é experimental e que, portanto, não pode ser testada, 
consequentemente não sendo ciência no sentido estrito da palavra. 
Mesmo no contexto das ciências testáveis, ele argumenta que as observações nunca 
são capazes de provar totalmente uma teoria. Só podemos, de fato, provar sua 
inverdade ou refutá-la. A partir do princípio da refutação, Popper estabelece o 
chamado racionalismo crítico baseado no conflito conjectura e refutação. 
Em que pese Popper afirmar que a ciência não deveria reduzir-se a um método, 
inegavelmente o programa por ele proposto de refutabilidade acabou por constituir-
se no método que influenciou, de forma muito marcante, por um razoável período, 
os pensadores da filosofia da ciência no século passado. De alguma forma, a partir 
 
36 
 
de seu antidogmatismo, uma vez aplicado à ciência, acabou tornando-se uma 
espécie de dogmatismo. 
 
Thomas Kuhn e os paradigmas 
Thomas Kuhn (KUHN, 2000), entre outros, apresenta um conjunto de divergências 
significativas acerca da visão de Popper. Segundo ele, a refutação não é mais 
possível do que a verificação, dado que cada processo implica na existência de 
padrões absolutos de evidências, que transcendem os paradigmas individuais. 
Assim, um novo paradigma pode ser superior (melhor) do que o anterior para 
resolver um conjunto de enigmas propostos. O fato de a nova ciência produzir mais 
explicações e aplicações práticas do que a outra não permite simplesmente qualificar 
a velha ciência como falha. 
A partir do ponto de vista de Kuhn, qualquer método científico deverá ser avaliado 
não absolutamente, mas sim a partir daquilo que se possa fazer com ele. Nesse 
contexto, e somente nele, pode-se aplicar os conceitos de falso e verdadeiro, desde 
que necessariamente no interior de um paradigma bem estabelecido. 
Kuhn afirma que, em geral, os cientistas trabalham no contexto de uma ciência 
normal, ou seja, preenchem detalhes, resolvem charadas, que reforçam o paradigma 
dominante. Assim funciona até que haja uma ruptura, gerada a partir de perguntas 
não respondidas nos limites do paradigma anterior, que demanda modificações 
profundas em direção à construção de um novo paradigma. A adoção de novos 
conceitos, diferentes enfoques e originais teorias serão decorrentes da 
implementação do eventual paradigma revolucionário. 
Popper e Kuhn divergem a respeito da natureza essencial da ciência e a gênese das 
revoluções científicas. Popper crê que se uma refutação for bastante convincente 
está definida a necessidade de uma revolução. Por outro lado, segundo Kuhn, a 
maior parte do tempo, os cientistas dedicam-se ao exercício da ciência normal. 
Consequentemente, uma revolução científica é um fenômeno singular, muito raro e 
ocasional. 
 
37 
 
 
Paul Feyerabend e o Contra o Método 
Um enfoque diferente de Popper e também de Kuhn é apresentado por Paul 
Feyerabend, em especial na sua obra intitulada: Conta o método (FEYERABEND, 
1975). Nela, o filósofo afirma que não há, de fato, lógica na ciência. Segundo ele, os 
cientistas criam e adotam teorias científicas por razões de natureza subjetivas, e 
muitas vezes irracionais. 
Do ponto de vista de Feyerabend, o racionalismo crítico de Popper não era tão 
distante do positivismo que o precederae que ele tanto condenara. Da mesma 
forma, ainda que mais tolerante com relação a Kuhn, Feyerabend acreditava que 
raramente a ciência era tão normal quanto Kuhn supunha. Em resumo, ele defendia 
ardentemente a ideia de que não havia método científico no sentido estrito. O que 
havia eram ideias que funcionavam dentro de certas circunstâncias. Na ocorrência de 
novas situações, há que se adotar novas tentativas, afirmava Feyerabend. 
Reduzir a ciência a uma metodologia particular, seja a teoria da refutabilidade de 
Popper ou o modelo de ciência normal de Kuhn, seria o mesmo que destruí-la. A 
ciência pode ser considerada superior às demais formas de conhecimento somente à 
medida que permite que todos que com ela trabalham possam estar em contato com 
o maior número possível de modos de pensar diferentes e, a partir desse 
pressuposto, escolher livremente entre eles. 
Feyerabend findou conhecido como o filósofo da anticiência por defender que toda 
descrição da realidade seria necessariamente inadequada. No entanto, a leitura 
atenta de sua obra mostra essencialmente uma preocupação, antes de mais nada 
um alerta, acerca das dificuldades em todos os empreendimentos humanos que 
vissem reduzir a diversidade natural inerente à realidade. Nesse sentido, ele era um 
cético da crença de que os cientistas pudessem um dia abarcar a realidade em uma 
teoria única no mundo, a partir da qual um método científico completo seria bem 
estabelecido. 
 
 
38 
 
Autoinfluências e tipos de falseacionismos 
Fruto de todas essas discussões que marcaram o século e esses três filósofos, eles 
se autoinfluenciaram e foram mudando e incorporando novos elementos aos seus 
respectivos pensamentos. Em particular, Popper, no processo do amadurecimento de 
suas teorias, podemos destacar pelo menos três fases bastante distintas nas suas 
concepções de falseacionismo: dogmático, metodológico e sofisticado (LAKATOS e 
MUSGRAVE, 1965). 
 O falseacionismo dogmático é influenciado, ainda que oposto, pelas visões dos 
justificacionistas clássicos, os quais só admitiam como teorias científicas as teorias 
provadas. Os justificacionistas neoclássicos, por sua vez, estenderam esse critério às 
teorias prováveis. Os falseacionistas dogmáticos só aceitavam teorias que fossem 
refutáveis. Dentro dos marcos do falseacionismo dogmático, também conhecido 
como naturismo, admite-se a falibilidade de todas as teorias científicas, uma vez que 
em falhando, abandonam-se as mesmas imediatamente. Da mesma forma, 
executam-se sumariamente todas as proposições que não possam ser falseadas. 
Obviamente, tratava-se de um critério demasiadamente rígido entre o caráter 
científico e não científico do conhecimento. 
O falseacionismo metodológico apresenta de novidade a adoção do 
convencionalismo, onde permite-se que o valor da verdade nem sempre pode ser 
provado por fatos. Em alguns casos, pode-se decidir por consenso. O falseacionista 
metodológico separa a rejeição da refutação, que o falseacionista dogmático havia 
fundido. O falseacionista metodológico indica a necessidade urgente de substituir 
uma hipótese falseada por uma melhor. Esse critério metodológico é muito mais 
liberal do que o dogmático anterior. Por exemplo, as teorias probabilísticas merecem 
a qualificação de científicas, porque embora não sendo falseáveis, podem, no 
entanto, ser mostradas inconsistentes. 
Por fim, Popper, na sua fase mais recente, adotou o falseacionismo metodológico 
sofisticado, o qual difere dos anteriores tanto nas regras de aceitação como nas 
regras de falseamento (eliminação). Dentro do falseacionismo sofisticado uma teoria 
 
39 
 
será aceitável se tiver um excesso corroborado de conteúdo empírico em relação à 
sua predecessora (ou rival), isto é, se levar a descoberta de fatos novos. 
Enquanto nos marcos do falseacionismo dogmático, uma teoria pode ser falseada se 
uma observação conflitar com ela, dentro dos pressupostos do falseacionismo 
sofisticado uma teoria científica T só será falseada se outra teoria T’ tiver sido 
proposta com as seguintes características: 
1. T’ apresenta um excesso de conteúdo empírico com relação a T; 
2. T’ explica com êxito tudo o que explica também T e todo o conteúdo não 
refutado de T está incluído no conteúdo de T’; 
3. Parte do conteúdo excessivo de T’ é corroborado. 
Além disso, nessa última fase, Popper passou a trabalhar com a aceitação de 
hipóteses auxiliares (ad hoc). De acordo com Popper, salvar uma teoria com a ajuda 
de hipóteses auxiliares que satisfazem a certas condições bem definidas pode 
representar um progresso científico. Observando que, neste caso, qualquer teoria 
científica precisaria ser avaliada juntamente com suas hipóteses auxiliares. Assim, 
examinamos uma série de teorias e não mais teorias isoladas. Dessa forma, o 
falseacionista sofisticado transfere o problema de avaliar teorias para avaliação de 
séries de teorias. Somente uma série de teorias poderia ser científica ou não 
científica, e não mais uma teoria isolada. Aplicar o termo científico a uma única 
teoria poderia incorrer em um erro de categoria. 
Fundamentalmente, a grande modificação no falseacionismo sofisticado, com relação 
às versões anteriores de falseacionismo, é a concepção de que não há falseamento 
de uma teoria antes da emergência de uma teoria melhor. A proliferação de teorias é 
muito mais importante nesse contexto do que para as visões anteriores. Ou seja, 
como exemplificado por Lakatos, a teoria de Einstein não é melhor do que a de 
Newton porque esta foi refutada e a de Einstein não. De fato, rigorosamente existem 
anomalias conhecidas na teoria Einsteiniana. O motivo central para a teoria de 
Einstein ser considerada progresso, quando comparada com a de Newton, reside no 
simples fato que ela explica com êxito tudo que a teoria anterior explicava e decifra 
 
40 
 
também algumas anomalias que a anterior não poderia entender (por exemplo, a luz 
não se propaga em linha reta quando próxima a corpos com grandes massas). 
 
Programas de pesquisa científica 
Na verdade, essa discussão, que tem como protagonistas no final do século passado 
Popper, Kuhn e Feyerabend, não impediu que a ciência crescesse em ritmos sem 
precedentes na segunda metade do século XX. Parte disso decorreu do uso 
apropriado de métodos científicos que, embora não unificados, atenderam a um 
conjunto de receitas bem evidentes, ainda que não necessariamente discutidos de 
forma explícita. Como veremos, essa prática assenta-se justamente nos debates que 
envolveram os protagonistas citados (HORGAN, 1999). 
Em primeiro lugar, há bem estabelecido que um programa de pesquisa científica 
deve atender intrinsecamente a regras metodológicas claras. Podemos formulá-las 
como o método analítico negativo: a descrição dos caminhos que devem ser 
evitados, e o método analítico positivo: a descrição dos caminhos que devem ser 
trilhados (LAKATOS e MUSGRAVE, 1965). 
O que caracteriza um programa de pesquisa científica é o seu núcleo. Ao redor do 
núcleo temos as chamadas hipóteses auxiliares, as quais formam um cinturão de 
proteção com o intuito de suportar o impacto dos testes (método analítico negativo). 
Essas hipóteses podem tanto ser reajustadas ou mesmo completamente substituídas, 
desde que o núcleo seja apropriadamente preservado. 
Por outro lado, o método analítico positivo consiste em um conjunto parcial 
articulado de sugestões ou palpites sobre como mudar e desenvolver as variantes 
refutáveis do projeto de pesquisa e sobre como modificar e sofisticar o cinturão de 
proteção refutável. 
Baseado no que vimos antes, na concepção de Kuhn, as anomalias e incoerências 
sempre abundam na ciência, mas em períodos normais o paradigma dominante 
assegura um padrão de crescimento, pelo menos até que de fato se instaure uma 
crise. 
 
41 
 
Da mesma forma, as eventuais refutações de Popper não eliminam tão rapidamente 
um projetode pesquisa. De fato, a crítica destrutiva, puramente negativa, como a 
refutação ou a demonstração de uma inconsistência, não eliminam um projeto. 
Mesmo mostrando a degeneração de um projeto, somente a crítica construtiva pode, 
com a ajuda de projetos de pesquisas rivais, cumprir a missão de não só falsear o 
primeiro, mas estabelecer de forma “definitiva” o segundo. 
Assim, a partir da apropriação de conceitos fundamentais de Popper e Kuhn, 
somados aos alertas de Feyerabend por mais tolerância e menos pretensão de 
rigidez desnecessária, viramos o século, e o milênio, com a produção de 
conhecimentos científicos em um ritmo sem precedentes comparados com períodos 
anteriores da humanidade. 
Tal constatação torna ainda mais importante que a ciência seja popularizada sem ser 
vulgarizada, o que obtém-se pelo incremento substancial da educação científica da 
população. Por fim, não pode haver educação e divulgação científica sem que o 
método científico seja discutido, conhecido e, acima de tudo, utilizado como 
instrumento de análise da realidade que nos cerca e de nós mesmos, enquanto 
investigadores da própria natureza. 
 
 
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