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O Ordenamento Jurídico à luz da Constituição brasileira. O que é ordenamento jurídico? O Direito objetivo/positivo, como conjunto de normas jurídicas constitui no seu todo um sistema global que se denomina ordenamento jurídico. De fato, o Direito se apresenta concretamente, em qualquer país, sobre a estrutura de um ordenamento: as normas jurídicas não existem isoladas, não atuam de forma solitária, porém se correlacionam e se implicam, formando um todo uniforme e harmônico. Os autores apresentam diversas definições no que respeita a definição do ordenamento jurídico. Embora não tenha sido o primeiro a abordar o Direito pela perspectiva mais ampla do ordenamento jurídico, Norberto Bobbio foi um dos autores de maior destaque no campo. Em sua célebre obra “Teoria do Ordenamento Jurídico” o teórico escreve: […] na realidade, as normas jurídicas nunca existem isoladamente, mas sempre em um contexto de normas com relações particulares entre si (e estas relações serão em grande parte objeto de nossa análise). Esse contexto de normas costuma ser chamado de “ordenamento”. E será bom observarmos, desde já, que a palavra “direito”, entre seus vários sentidos, tem também o de “ordenamento jurídico”, por exemplo, nas expressões “Direito romano”, “Direito canônico”, “Direito italiano” [“Direito brasileiro”], etc. Para Bobbio, o Direito encontra sua definição adequada quando se localiza no ordenamento. Deve-se, então, considerar o modo pelo qual uma determinada norma se torna eficaz a partir de uma complexa organização que determina a natureza e a entidade das sanções, as pessoas que devam exercê-las e a sua execução. Assim, abordar o que é uma ordem jurídica seria analisar essa organização. O conceito de ordenamento jurídico, desse modo, seria o contexto de produção normativa. E englobaria, portanto, não apenas as regras jurídicas por si, mas também as técnicas de produção e de integração das normas jurídicas de diferentes áreas do Direito. Paulo Nader, leciona que o ordenamento jurídico compreende, o sistema de legalidade do Estado, formado pela totalidade das normas vigentes, que se localizam em diversas fontes. Conforme Miguel Reale é o sistema de normas jurídicas in acto, compreendendo as fontes de direito e todos os seus conteúdos e projeções: é, pois, os sistemas das normas em sua concreta realização, abrangendo tanto as regras explícitas como as elaboradas para suprir as lacunas do sistema, bem como as que cobrem os claros deixados ao poder discricionário dos indivíduos (normas negociais). Aspecto relevante sobre o ordenamento jurídico é a questão da plenitude. Assim, o ordenamento jurídico não pode deixar a descoberto, sem dar solução, qualquer litígio ou conflito capaz de abalar o equilíbrio, a ordem e a segurança da sociedade. Por isso, ele contém, a possibilidade de solução para todas as questões que surgirem na vida de relação social, suprindo as lacunas deixadas pelas fontes do direito. É o princípio da plenitude do ordenamento jurídico. Se ele não fosse sem lacunas e auto-suficiente, não poderia cumprir precisamente sua missão. Os elementos do ordenamento jurídico brasileiro estão estruturados na forma de atenderem à obediência aos ditames da Constituição Federal. Todo o nosso direito positivo para ter validade deriva-se dos princípios constitucionais. Estando na República Federativa do Brasil, os Estados, via de consequência, têm poderes para se organizar e reger-se pelas constituições e leis que venham adotar. A autonomia dos Estados é condicionada, isto é, tem poderes explícitos e implícitos que não lhe são vedados pela Constituição Federal. Os Municípios também tem autonomia condicionada. A legislação municipal deve seguir os ditames da Constituição Estadual e por consequência da Constituição Federal. Em outras palavras, o que não for de competência da União ou do Estado, será do Município. Não existe uma hierarquia, cada um vai agir de acordo com a sua competência. Normas, regras e princípios. Conceitos e distinções O professor Canotilho (2000, p. 1123), fornece-nos a explicitação da ideia de que o sistema jurídico deve ser visto como um sistema normativo aberto de regras e princípios: (1) é um sistema jurídico porque é um sistema dinâmico de normas; (2) é um sistema aberto porque tem uma estrutura dialógica traduzida na disponibilidade e capacidade de aprendizagem das normas constitucionais para captarem a mudança da realidade e estarem abertas às concepções cambiantes da verdade e da justiça; (3) é um sistema normativo, porque a estruturação das expectativas referentes a valores, programas, funções e pessoas, é feita através de normas; (4) é um sistema de regras e de princípios, pois as normas do sistema tanto podem revelar-se sob a forma de princípios como sob a sua forma de regras. Por sua vez, Dworkin (1982, p. 90) mostra que, nos chamados casos-limites ou hard cases, quando os juristas debatem e decidem em termos de direitos e obrigações jurídicas, eles utilizam standards que não funcionam como regras, mas, trabalham com princípios, política e outros gêneros de standards. Princípios (principles) são, segundo este autor, exigências de justiça, de equidade ou de qualquer outra dimensão da moral, e que junto com as regras compõem o sistema jurídico. Assim, ao afirmar que os juristas empregam, em determinados casos, princípios e não regras o autor reconhece serem duas espécies de distintas do gênero norma, habitando o sistema jurídico, cuja diferença, trataremos de esboçar adiante. O prof. Luiz Flávio Gomes, a partir do pressuposto pelo qual o Direito se expressa por meio de normas, assim se manifesta: As normas se exprimem por meio de regras ou princípios. As regras disciplinam uma determinada situação; quando ocorre essa situação, a norma tem incidência; quando não ocorre, não tem incidência. Para as regras vale a lógica do tudo ou nada (Dworkin). Quando duas regras colidem, fala-se em "conflito"; ao caso concreto uma só será aplicável (uma afasta a aplicação da outra). O conflito entre regras deve ser resolvido pelos meios clássicos de interpretação: a lei especial derroga a lei geral, a lei posterior afasta a anterior etc.. Princípios são as diretrizes gerais de um ordenamento jurídico (ou de parte dele). Seu espectro de incidência é muito mais amplo que o das regras. Entre eles pode haver "colisão", não conflito. Quando colidem, não se excluem. Como "mandados de otimização" que são (Alexy), sempre podem ter incidência em casos concretos (às vezes, concomitantemente dois ou mais deles). A diferença marcante entre as regras e os princípios, portanto, reside no seguinte: a regra cuida de casos concretos. Exemplo: o inquérito policial destina-se a apurar a infração penal e sua autoria. CPP, art. 4º. Os princípios norteiam uma multiplicidade de situações. O princípio da presunção de inocência, por exemplo, cuida da forma de tratamento do acusado bem como de uma série de regras probatórias (o ônus da prova cabe a quem faz a alegação, a responsabilidade do acusado só pode ser comprovada constitucional, legal e judicialmente etc.). Os princípios desempenham funções estratégicas, a saber: fundamentadora, interpretativa e supletiva ou integradora: por força da função fundamentadora dos princípios, que outras normas jurídicas neles encontram o seu fundamento de validade. No momento da decisão o juiz pode valer-se da interpretação extensiva, da aplicação analógica bem como do suplemento dos princípios gerais de direito. A Hierarquia normativa O primeiro doutrinador a lecionar que o sistema jurídico era composto por normas superiores e inferiores interligadas e estruturadas entre si foi Merkel. Porém, a estrutura hierárquica das normas jurídicas ganhou ênfase através de Hans Kelsen. As normas não estão todas num mesmo plano de análise. Existem normas superiores e inferiores. As inferiores são subordinadasàs normas superiores, e este escalonamento garante unidade ao sistema. "Já nas páginas precedentes por várias vezes se fez notar a particularidade que possui o Direito de regular a sua própria criação. Isso pode operar-se de forma a que uma norma apenas determina o processo por que outra norma é produzida. Mas também é possível que seja determinado ainda - em certa medida - o conteúdo da norma a produzir. Como, dado o caráter dinâmico do Direito, uma norma somente é válida porque e na medida em que foi produzida por uma outra norma representa o fundamento imediato de validade daquela. A relação entre a norma que regula a produção de uma e outra a norma assim regularmente produzida pode ser figurada pela imagem da supra-infra-ordenação. A norma que regula a produção é a norma superior, a norma produzida segundo as determinações daquela norma é a inferior. A ordem jurídica não é um sistema de normas jurídicas ordenadas no mesmo plano, situadas umas ao lado das outras, mas é uma construção escalonada de diferentes camadas ou níveis de normas jurídicas". (KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução João Batista Machado. 6ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998, ps. 246 e 247.) Com base nisto é possível afirmar que as normas de diferente hierarquia possuem características distintas, notadamente quanto a sua criação. Uma norma de uma determinada hierarquia somente pode ser editada ou revogada inovando a ordem jurídica por outra norma quando a segunda for editada pelo mesmo órgão e seguir o mesmo procedimento fixado pela Constituição, ou ainda, quando editada e instituída por órgão superior. Pirâmide de Kelsen No sistema jurídico existe a chamada hierarquia de normas. Sendo que na lição de Celso Ribeiro Bastos, "as normas de direito encontram sempre seu fundamento em outras normas jurídicas". Assim as normas inferiores encontram seu fundamento de validade em outras normas de escalão superior. Desde a norma mais simples até à própria Constituição ocorre o fenômeno da "pirâmide jurídica". Representa-se esta estrutura hierárquica de um ordenamento através de uma pirâmide. O vértice é ocupado pela norma fundamental e a base pelos atos executivos. Nesta pirâmide, as normas tiram os seus fundamentos de validade nas regras que se encontram em escala superior da hierarquia normativa. Deste modo, para sabermos se uma norma é valida, basta que verifiquemos a sua concordância com as regras que se encontram acima no ordenamento. Portanto, podemos então transcrever um trecho da obra de Hans Kelsen: Todas as normas cuja validade pode ser reconduzida a uma e mesma norma fundamental formam um sistema de normas, uma ordem normativa. A norma fundamental é a fonte comum da validade de todas as normas pertencentes a uma e mesma ordem normativa, o seu fundamento de validade comum. O fato de uma norma pertencer a uma determinada ordem normativa baseia-se em que o seu último fundamento de validade é a norma fundamental desta ordem. É a norma fundamental que constitui a unidade de uma pluralidade de normas enquanto representa o fundamento da validade de todas as normas pertencentes a essa ordem normativa. (KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. [tradução João Baptista Machado]. 6ª. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998). Deste modo é que devemos zelar pela unidade de nosso ordenamento jurídico, procurando excluir de seu âmbito de eficácia toda a norma que vá de encontro à nossa Constituição Federal. Podemos situar as normas do ordenamento jurídico em diferentes graus de hierarquia. Eis uma das mais citadas concepções de hierarquia das normas do ordenamento jurídico brasileiro: 1 . Normas constitucionais: ocupam o grau mais elevado da hierarquia das normas jurídicas. Todas as demais devem subordinar- se às normas presentes na Constituição Federal, isto é, não podem contrariar os preceitos constitucionais. Quando contrariam, costuma- se dizer que a norma inferior é inconstitucional. 2. Normas complementares: são as leis que complementam o texto constitucional. A lei complementar deve estar devidamente prevista na Constituição. Isso quer dizer que a Constituição declara, expressamente, que tal ou qual matéria será regulada por lei complementar. 3. Normas ordinárias: são as normas elaboradas pelo Poder Legislativo em sua função típica de legislar. Exemplo: Código Civil, Código Penal, Código Tributário etc. 4. Normas regulamentares: são os regulamentos estabelecidos pelas autoridades administrativas em desenvolvimento da lei. Exemplo: decretos e portarias. 5. Normas individuais: são as normas que representam a aplicação concreta das demais normas do Direito à conduta social das pessoas. Exemplo: sentenças, contratos etc. antinomias; conflito entre normas. critério para as antinomias: hierarquia > especialidade = cronológico Norma de hierarquia superior tem prioridade sobre uma norma de hierarquia inferior. Norma recente tem prioridade sobre uma norma mais antiga. Especialidade, uma norma mais específica tem prioridade sobre uma norma mais ampla. Bibliografia sugerida 1. BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 6. ed. Brasilia: Editora Universidade de Brasilia, 1995. 2. BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 6. ed. Brasilia: Editora Universidade de Brasilia, 1995, p. 19. 3. FERRAJOLI, Luigi. A democracia através dos direitos: o constitucionalismo garantista como modelo teórico e como projeto político. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 47. 4. DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. São Paulo: Martins Fontes, 2001. 5. MORESO, José Juan. Conflictos entre princípios constitucionales. In: SANCHEZ, Miguel Carbonell (coord.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2003. p. 99- 122.
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