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História Econômica I Linhagens do Estado Absolutista - Perry Anderson Prefácio Propósito do trabalho: estudo comparado da natureza e do desenvolvimento do Estado Absolutista na Europa. Estudos Marxistas anteriores apresentavam uma dicotomia: afastaram-se da realidade de tal modo que se desconectaram inteiramente dela ou analisavam casos específicos sem aprimorarem ou desenvolverem uma teoria global. Esse estudo busca unir essas duas esferas de pesquisas analisando tanto o particular como o geral. Particularidades: 1. Maior ancestralidade atribuída ao feudalismo; 2. Esforço para fornecer um tratamento igual tanto à Europa ocidental como à Oriental; 3. Transpõe a limitação cronológica ou espacial tradicional para observar seu objeto de estudo (Absolutismo) em toda sua existência. Última palavra: a luta entre classes resolve-se no nível político e, portanto, a história a partir de cima é tão essencial como a história a partir de baixo. Primeira Parte: Europa Ocidental O Estado Absolutista do Ocidente Origem: curso do século XVI, numa ruptura decisiva com a soberania piramidal e parcelada das formações sociais medievais, com seus sistemas de popriedade e vassalagem. Erro comum: classificação do absolutismo como um mecanismo de equilíbrio político entre a nobreza e a burguesia (designação errônea de que o Absolutismo é um tipo de Estado Burguês). O Estado Absolutista nunca foi isso e sim, a carapaça política de uma nobreza atemorizada. O fim da servidão não significou o fim das relações feudais no campo, mas implicou na necessidade de deslocar a coerção político-legal da unidade celular para um cúpula centralizada e militarizada: o Estado. Dessa forma, a classe dominante permaneceu a mesma. Entretanto, há mudanças evidentes e importantes tais como o enfraquecimento das relações de vassalagem, o que significou perda de direitos políticos enquanto a propriedade tornava-se cada vez mais privada, implicando em ganhos econômicos. Ademais, o Estado Absolutista apresentava uma característica inovadora, isto é, a capacidade de disciplinar membros da nobreza. Simultaneamente, havia a necessidade de se adaptar a um segundo antagonista: a burguesia mercantil, que se desenvolveu internamente nas cidades medievais. A vitalidade econômica das cidades no Ocidente impediu a segunda servidão. Foi precisamente na época de avanços técnicos mercantis que ocorreu a restauração da autoridade em diversos países europeus. Assim, o Estado foi determinado pelo reagrupamento feudal contra o campesinado e secundariamente pela ascensão da burguesia. "A ordem política permaneceu feudal, ao passo que a sociedade tornava-se cada vez mais burguesa." Essas forças duais resultaram na restauração do direito romano: 1. (Politicamente) Favorecia e fornecia fundamentos para a centralização da autoridade. 1 2. (Economicamente) Propícia à expansão do livre capital na cidade e no campo, pois a grande marca era a concepção de propriedade privada absoluta e incondicional. "No processo sobre determinado do revivescimento romano, coube à pressão política do Estado dinástico primazia: as demandas de 'clareza' monárquica predominaram sobre as de 'certeza' mercanti." (Weber) Em suma, o resultado da modernização jurídica foi o reforçamento da dominação da classe feudal, expressa nas inovações institucionais que apresentam arcaísmo sob uma superficial modernidade. 1. Exército: ainda formado principalmente por mercenários, visava à guerra constante como modo de expansão da extração de excedentes. "Um príncipe não deve, portanto, ter outro pensamento ou objetivo senão a guerra, nem adquirir perícia em outra coisa que não seja a guerra, a sua organização e disciplina; porque a guerra é a única arte própria dos governantes.” (Maquiavel) 2. Burocracia: comércio de cargos públicos em uma espécie de caricatura monetarizada da investidura de um feudo. 3. Tributação: o Estado Absolutista também tributava acima de tudo os pobres (camponeses). “renda feudal centralizada em oposição às obrigações senhoriais que constituíam a renda feudal local" (Porshnev) 4. Comércio: Mercantilismo. "O mercantilismo requeria, indubitavelmente, a supressão de barreiras particularistas no interior da monarquia nacional e empenhava-se em criar um mercado interno unificado para a produção de mercadorias. Com o objetivo de aumentar o poder do Estado diante dos outros Estados, encorajava a exportação de mercadorias, ao mesmo tempo que proibia exportações de ouro e prata e de moeda, na crença de que existia uma quantidade fixa de comércio e riqueza no mundo. Na famosa frase de Hecksher: 'O Estado era o sujeito e o objeto da política econômica mercantilista.'." Deve-se ressaltar o belicismo do mercantilismo que enfatiza a necessidade e rentabilidade da guerra. 5. Diplomacia: calcada no fator homogeneizador, isto é, a fé cristã. "A diplomacia foi, com efeito, a indelével marca de nascença do Estado renascentista: com o seu surgimento, nasceu na Europa um sistema política internacional, no qual havia uma perpétua 'sondagem dos pontos fracos do meio ambiente de um Estado ou dos perigos provenientes de outros Estados'." No entanto, não deve confundir tal característica com o nacionalismo, sentimento anacrônico e inexistente para a época. Ademais, a legitimidade de um monarca advinha de sua dinastia e não do território, logo o supremo estratagema era o casamento, caminho longo de conquista muitas vezes encurtado pela guerra. Conclusão: "Com efeito, o paradoxo aparente do absolutismo na Europa Ocidental era que ele representava fundamentalmente um aparelho para a proteção da propriedade e dos privilégios aristocráticos, embora, ao mesmo tempo, os meios através dos quais tal proteção era promovida pudessem simultaneamente assegurar os interesses básicos das classes mercantis e manufatureiras emergentes." 2
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