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Disciplina: Perícia Forense - Medicina Legal Aula 8: Sexologia Forense I – psicossexualidade e crimes sexuais Apresentação Prezado aluno, esta aula de Sexologia Forense I vai traçar os elementos conceituais de comportamento sexual normal e o comportamento sexual diverso com vistas à psicossexualidade. Possibilitaremos o reconhecimento dos desvios sexuais à luz da psicologia e psiquiatria, além da linha entre o desvio e o crime. Finalizaremos a aula elencando os crimes previstos no Direito Penal, a capitulação e as qualificadoras, assim como os exames que apontam a violência sexual. Objetivos Conceituar sexologia, psicossexualidade e crime sexual; Diferenciar os tipos de parafilia; Apontar a identidade sexual e os conceitos em himeneologia. Psicossexualidade Os conceitos de sexualidade variam de acordo com a sociedade e a época. É uma experiência em qualquer canto do mundo e representa a expressão subjetiva e pessoal do indivíduo. Os séculos XVIII e XIX foram marcados pela busca de um conceito de normalidade sexual. Observam-se dois extremos: sendo o conceito rígido, qualquer desvio é considerado perversão. Sendo o conceito mais flexível, novas identidades sexuais são descobertas. Símbolo de gêneros masculino e feminino. Fonte: Pixabay A psicossexualidade se ocupa do estudo do comportamento sexual à luz da psicologia. A Organização Mundial de Saúde (OMS) definia sexualidade como sendo: [...] uma energia que nos motiva a procurar amor, contato, ternura e intimidade; que se integra no modo como nos sentimos, movemos, tocamos e somos tocados; é ser sensual e ao mesmo tempo sexual; [...] influencia pensamentos, sentimentos, ações e interações e, por isso, influencia também a nossa saúde física e mental. Após revisão em 2002, a OMS propôs nova definição para sexualidade: A sexualidade é um aspecto central do ser humano ao longo da vida e inclui o sexo, gênero, identidades e papéis, orientação sexual, erotismo, prazer, intimidade e reprodução. A sexualidade é experienciada e expressa através de pensamentos, fantasias, desejos, crenças, atitudes, valores, comportamentos, práticas, papéis e relações. Embora a sexualidade possa incluir todas essas dimensões, nem sempre elas são todas experienciadas ou expressas. A sexualidade é influenciada pela interação de fatores biológicos, psicológicos, sociais, econômicos, políticos, culturais, éticos, legais, históricos, religiosos e espirituais. [...] os significados que atribuímos aos nossos corpos e às suas possibilidades sexuais tornam-se, de fato, uma parte vital da nossa formação pessoal, sejam quais forem as explicações sociais. Instinto sexual Instinto sexual é a manifestação dos impulsos internos como padrões congênitos isentos de qualquer aprendizagem, que afloram através de pulsos de comportamentos espontâneos (pulsões). A manifestação é um reflexo da libido, exteriorizando um desejo. Portanto, a libido reflete padrões internos que podem sofrer modificações quantitativas ou qualitativas do instinto sexual. Tais modificações caracterizam os desvios sexuais. Jovens estimulando zonas erógenas entre si. Fonte: Pixabay Comportamento sexual normal Casal jovem se abraçando. Fonte: Shutterstock Conceitua-se comportamento sexual normal aquele caracterizado por afetividade, egossintonia, cópula e sem prejuízo para terceiros. Fases da resposta sexual As fases da resposta sexual são: apetitiva, relacional, excitatória e orgástica. Gráfico das fases de resposta sexual. As duas primeiras são psíquicas. Entre as fases excitatória e orgástica, há um intervalo de tempo denominado latência orgástica ou plateau que precede o pico de orgasmo (gráfico 8.1). Disfunções sexuais, variações do instinto sexual e parafilias O instinto sexual pode exteriorizar-se numa condição diversa do padrão comportamental. A diversidade pode refletir alterações quantitativas ou qualitativas que venham a caracterizar disfunções orgânicas ou psicogênica, ou parafilias. A American Psychiatric Association (APA) classifica as disfunções sexuais como: 1 Transtorno de desejo sexual hipoativo Redução do interesse pela atividade sexual. 2 Transtornos de orgasmo Ausência ou delonga do pico orgástico. 3 Transtornos sexuais dolorosos Dispareunia e vaginismo 4 Disfunção sexual sem outra especificação. Algumas das variações do instinto sexual: 01 Satiríase: disfunção da fase apetitiva caracterizada por avidez mórbida do instinto sexual no homem. 02 Ninfomania: correspondente da satiríase na mulher. 03 Erotomania: excitação sexual psíquica fantasiosa com pessoa real ou ilusória, sem contato físico. 04 Ejaculação precoce: disfunção sexual ejaculatória em que o homem precocemente atinge o orgasmo. 05 Frigidez: condição em que a mulher não sente desejo sexual. 06 Dispareunia: disfunção sexual dolorosa ou da sensibilidade em que o coito é dificultado ou impedido pela dor durante o ato sexual. 07 Vaginismo: o períneo apresenta contração involuntária com maior intensidade no terço inferior da vagina, dificultando ou impedindo o coito. Casal jovem trocando carícias. Fonte: Shutterstock 08 Uranismo: homossexualismo masculino caracterizado pelo desejo predominante de relacionamento afetivo. 09 Pederastia: coito anal no homossexualismo masculino. 10 Safismo: atividade bucovaginal no homossexualismo feminino. 11 Transexualismo: obsessão por buscar o corpo físico do sexo oposto. 12 Fetichismo: libido voltada para objetos ou regiões do corpo. 13 Trampling: tipo de fetichismo caracterizado pelo prazer em ser pisoteado por um ou mais parceiros. 14 Transexualismo: obsessão por buscar o corpo físico do sexo oposto. 15 Apotemnofilia: transtorno mais comum no homem, em geral bissexual e fetichista, o qual busca prazer com portadores de amputações e outras deformações. 16 Safismo: atividade bucovaginal no homossexualismo feminino. Saiba mais Para saber mais acesse a leitura: Variações do instinto sexual <galeria/aula8/docs/doc1.pdf> . Consta no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V), pela American Psychiatric Association, a designação de gênero como sendo a designação de nascimento. Ele ainda aponta as seguintes peculiaridades: características somáticas ou comportamentais não típicas (atípicas com o gênero); episódios de identidade social diferente da categoria biológica (identidade de gênero); forma transitória ou persistente de se identificar com gênero diverso ao do nascimento (transgênero); o que busca ou já se encontra em fase de transição social para a mudança de gênero (transexual) ou transição somática (cirurgia de redesignação sexual); e a disforia de gênero, que se trata de uma denominação geral para o sofrimento que decorre da inconformidade entre o gênero experimentado ou expresso e o gênero de nascimento. Sexologia criminal Um dos objetivos da sexologia criminal é descrever os crimes contra a dignidade sexual ou a liberdade sexual. O art. 213 do CP trata do crime de estupro (do latim stuprum = desonra), qualificado como crime hediondo e com previsão de reclusão de 6 (seis) a 10 (dez) anos. Estupro é “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso”. A reclusão passa a ser de 8 (oito) a 12 (doze) anos (art. 213, §1o, CP) se a vítima for menor de 18 ou maior de 14 anos ou se a conduta resultar em lesão grave. Em caso de morte, a reclusão será de 12 (doze) a 30 (trinta) anos (art. 213, §2o, CP). Cena de crime. Fonte: Pixabay Sendo a vítima menor de 14 anos, aplica-se o art. 217-A do CP, que trata dos crimes sexuais contra vulnerável. Considera-se vulnerável, além da faixa etária inferior a 14, o enfermo ou deficiente mental, incapaz de consentir, ou aquele incapaz de oferecer resistência ao ato. A pena de reclusão é mais severa: vai de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. Em caso de lesão corporal de natureza grave, varia de 10 (dez) a 20 (vinte) anos (§3o); nocaso de morte, a pena é de reclusão de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos (§4o). Conjunção carnal Conjunção carnal é a introdução parcial ou total do pênis na vagina. No caso de mulher sem história de conjunção carnal, o hímen estará íntegro. O hímen é a membrana que separa a cavidade vaginal do exterior. Ao se romper, deixa uma cicatriz se o fato for antigo e com sinais inflamatórios se o fato for recente. Deve ser diferenciado do entalhe, que é uma descontinuidade anatômica da orla do himenal presente em algumas mulheres. A tabela 8.1 apresenta algumas diferenças de entalhe e rotura himenal. Peculiaridade Entalhe Rotura Profundidade Avançam a pique Completa ou incompleta Bordas Regular Irregular Angulação Curva, ângulo aberto Em “V”, ângulos agudos Simetria Simetria ao acaso Assimetria em geral Granulação Ausente Presente (na recente) Supuração Ausente Presente (na recente) Sangramento Ausente Presente (na recente) Cicatrização Ausente Presente (na recente) Fonte: (FRANKLIN) Atentado violento ao pudor O ato libidinoso violento que diverge da conjunção carnal é chamado de atentado violento ao pudor (AVP). O crime de AVP foi revogado pela Lei 12.015/200914, porém foi absorvido materialmente pelo crime de estupro e atualmente integra o art. 213 do Código Penal. Um exemplo de ato libidinoso diverso da conjunção carnal é o coito anal, que pode esgarçar o tecido (rágade) e deixar marcas de equimoses. As rágades devem ser diferenciadas das fissuras. A rágade pode ser lesão única ou múltipla, com apresentação aguda e sem localização preferencial. As fissuras são em geral únicas, com evolução crônica e geralmente localizadas na linha média posterior (Tabela 8.2). Peculiaridade Fissuras Rágades Causa Desconhecida Traumática Evolução Crônica Aguda Número Em geral, única Várias Localização comum Linha média posterior na posição de 12 h Sem localização específica Forma Ulceração ovoide Fendas longitudinais Extremidade inferior Plicoma sentinela Sem peculiaridades Extremidade superior Papila hipertrófica Sem peculiaridades Tonicidade Hipertonia Hipotonia Sangramento Crônico, escasso Agudo Complicações Abscesso Nenhuma Fonte: adaptada de (VANRELL, 2008) Perícia no crime de estupro A perícia nos crimes de violência sexual se resume na busca de vestígios que caracterizem a violência real. As lesões, quando presentes, são descritas minuciosamente, se apontando sua localização. Na área genital ou anal, pode-se utilizar de um goniômetro ou de um mostrador de relógio para localizar a lesão. Dos exames, a pesquisa de espermatozoide na cavidade vaginal e no ânus sempre se impõe. É possível a análise de fosfatase ácida prostática e de PSA. Por vezes, o que se tem são manchas sugestivas de sêmen. Os sinais de orientação se fundamentam nas propriedades físicas do sêmen: cor (recente é branco-amarelado e escuro se a mancha for antiga); odor (característica sui generis de substâncias ricas em derivados fosfatados); e consistência (logo após a sua emissão, coagula; no tecido, dá uma consistência tipo “pano gomado”). Os sinais de probabilidade estão representados por provas cristalográficas (Florence, Baecchi e Barbério), exame pela lâmpada de Wood e dosagem da fosfatase ácida. Os sinais de certeza são: soro antiesperma, dosagem de PSA, coloração de Christmas Tree para espermatozoide (hematoxilina-eosina) e prova de Corin-Stockis (microscopia de espermatozoide). Identidade sexual A identidade sexual tem as seguintes peculiaridades conceituais: 01 Sexo biológico (sexo genético) É definido pela citogenética em que se aponta o cromossomo sexual (sexo cromossômico) e pela presença ou ausência de corpúsculo de Barr (sexo cromatínico). 02 Sexo gonadal A presença de testículos ou ovários caracteriza o sexo gonadal. 03 Sexo morfológico Diz respeito à aparência masculina ou feminina. 04 Sexo psicológico É o sentimento que o indivíduo tem de si próprio. 05 Sexo jurídico É o que consta no registro. 06 Sexo endócrino A predominância da testosterona no sexo masculino e estrógeno e progesterona no feminino. Casamento (himenologia) O estudo médico-legal do casamento visa a traçar critérios para impedimento matrimonial (ausência de requisitos para o casamento) e capacidade matrimonial, além de fundamentar anulação ou anulabilidade do casamento. Os impedimentos matrimoniais podem ser: dirimentes públicos (absolutos), dirimentes privados (relativos) e impedimentos impedientes (proibitivos). As dirimentes levam à anulação do casamento. Dirimentes públicos Classificam-se como: a) Relacionados com parentesco: o parentesco é uma relação de vínculo entre pessoas descendentes do mesmo tronco ancestral. Seriam: a.1 – impedimento por consanguinidade: os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil (critério eugênico e moral); entre o adotante e o adotado, pois a adoção imita a família consanguínea. a.2 – impedimento por afinidade: os afins em linha reta; cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo vínculo da afinidade. §1o O parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou companheiro. §2o Na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou da união estável. a.3 – impedimento de adoção: os afins em linha reta; o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem foi o do adotante; os irmãos unilaterais e bilaterais, além de demais colaterais até 3o grau; o adotado com o filho do adotante. a.4 – impedimento de vínculo: impedimento de crime: o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa contra o seu consorte. Dirimentes privados Os impedimentos dirimentes privados são: a coação, a incapacidade de consentir, o rapto, a ausência de consentimento do pai, tutor ou curador, quando exigido, e a idade. Segue aqui o tipo particular da ação com base nos critérios de anulabilidade: Impedimentos impedientes Os impedimentos impedientes ou proibitivos incidem na celebração com vistas à proteção do interesse de terceiro. Pelas causas suspensivas não devem casar a viúva ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado, até dez meses depois do começo da viuvez, ou da dissolução da sociedade conjugal, evitando-se assim o turbacio sanguinis no que diz respeito à dúvida sobre a paternidade. Quanto às impotências, podemos destacar a impotência masculina: coeundi (instrumental - ausência de pênis, volume exíguo ou excessivo, cicatrizes, malformações, elefantíase, hérnias, entre outros – e funcional – fisiológica, impúbere; senil; patológica – psíquica, somática) e a impotência masculina generandi (azoospermia patológica e fisiológica – idade). Na impotência feminina, temos também a impotência coeundi – física e funcional (vaginismo, perversões) - e a impotência feminina concipiendi: esterilidade (fisiológica – idade; lactação; patológica). Atividade 1. Parafilia caracterizada pela atração sexual por bonecas: a) Zoofilia b) Dolismo c) Pigmalionismo d) Riparofilia e) Talofilia 2. Características do instinto sexual, exceto: a) Impulso interno. b) Padrão congênito. c) Comportamento espontâneo. d) São pulsões. e) Depende de uma aprendizagem. 3. Qual o crime de violência sexual com menor de 14 anos? a) Estupro de vulnerável b) Estupro c) Atentado violento ao pudor d) Importunação ofensiva ao pudor e) Corrupção de menores Referências _______. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais – DSM-V. 5. ed. American Psychiatric Association. Artmed, s/d. BASSON, R. et al. Report of the international consensus development conference on female sexual dysfunction: definitions and classifications. n. 163. v. 3. 2000. p. 888- 893. FRANKLIN, R. Medicina legal aplicada. Rio de Janeiro: Rúbio. Em lançamento. VANRELL J. P. Sexologia forense. 2. ed. São Paulo: Mizuno, 2008. WEEKS, J. The body and sexuality. In: Social and cultural forms of modernity. Cambridge: Polity Press, 1992. Próximos PassosReconhecer as lesões próprias das asfixias; Diferenciar as formas de asfixias; Estabelecer o diagnóstico diferencial com asfixia clínica. Explore mais Para aprimorar seu conhecimento acesse a leitura Sexologia forense <https://www.grancursospresencial.com.br/novo/upload/SEXOLOGIA_FOR ENSE_20111007145323.pdf> .
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