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Projetos em Educação Física Escolar I Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof. Me. Pedro Xavier Russo Bonetto Revisão Textual: Prof. Esp. Claudio Pereira do Nascimento Principais Métodos de Pesquisas Qualitativas em Educação Física Escolar • Introdução; • Pesquisas Etnográficas: Características e Potencialidades; • Pesquisa-Ação: Características e Potencialidades; • Principais Referenciais de Análise Utilizados em Pesquisas na Área da Educação Física Escolar. • Aprofundar a refl exão sobre estratégias metodológicas e analíticas das pesquisas, visando contemplar a complexidade dos problemas envolvidos no campo da Educação Física escolar. OBJETIVO DE APRENDIZADO Principais Métodos de Pesquisas Qualitativas em Educação Física Escolar Orientações de estudo Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua formação acadêmica e atuação profissional, siga algumas recomendações básicas: Assim: Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e horário fixos como seu “momento do estudo”; Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo; No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam- bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados; Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus- são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de aprendizagem. Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Determine um horário fixo para estudar. Aproveite as indicações de Material Complementar. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma Não se esqueça de se alimentar e de se manter hidratado. Aproveite as Conserve seu material e local de estudos sempre organizados. Procure manter contato com seus colegas e tutores para trocar ideias! Isso amplia a aprendizagem. Seja original! Nunca plagie trabalhos. UNIDADE Principais Métodos de Pesquisas Qualitativas em Educação Física Escolar Introdução Aqui chegamos à segunda parte da disciplina. Nas unidades anteriores vimos sobre os paradigmas científicos moderno e emergente, vimos sobre as potencia- lidades dessa perspectiva pós-moderna que destaca a importância do perfil quali- tativo, das conclusões parciais, provisórias e contextuais. Também descrevemos o processo de elaboração de um problema de pesquisa, as ferramentas de coleta (ou dispositivos de produção) de dados e, por fim, dos referencias de análise. Pesquisa Cientí�ca Per�l Qualitativo Per�l Quantitativo Números e Estatísticas Referencial Teórico de Análise Conclusões Provisórias Pesquisa Cientí�ca Dispositivos de Produção de Dados Figura 1 - Esquema comparativo entre os perfis qualitativo e quantitativo Como vimos, o planejamento das pesquisas chega ao que chamamos de “dese- nhos de pesquisas”. Trata-se de elementos metodológicos selecionados e combina- dos pelo pesquisador que fundamentarão a pesquisa. Tentamos demonstrar que os métodos de produção de dados ou as ferramentas de coleta de dados, tais como entrevistas, observações, diário de bordo, coleta de documentos, questionários, entre outras, carecem de um complemento interpreta- tivo, ou seja, uma base teórica, um corpo de saberes, conceitos e formas de pensar que possam orientar e sobrepor os dados às suas potencialidades, estamos falando do referencial teórico. Como demonstramos na unidade 2, campos teóricos advindos das Ciências Humanas possuem forte relação com os métodos de pesquisa qualitativa. Por sua vez, dentro das Ciências Humanas existe uma gama enorme e quase infinita de campos teóricos. Vimos também que no campo da Educação Física temos uma tradição clara de analisar os dados produzidos a partir de referenciais teóricos advindos das ciências 8 9 biológicas, mas o paradigma emergente tem nos mostrado que cada vez mais a Educação Física escolar tem incorporado as discussões do campo da educação, da filosofia, da sociologia, da antropologia, entre outras. Essas aproximações não só são possíveis como são importantes para a compreensão da complexidade envolvi- da em todas as áreas de intervenção. Sobre os referenciais, apresentamos o esquema que demonstra que ele se dá a partir de uma área de pesquisa abrangente, como uma disciplina ou campo de co- nhecimento, mas precisa ser descrito a partir de recortes menores, geralmente por teorias específicas de determinados pensadores/autores. A partir daí, dependendo do tamanho da pesquisa, pode-se delimitar apenas alguns conceitos, obras ou mo- mentos específicos da produção científica destes autores. Teoria Crítica Teoria da Ação Comunicativa (Jürgen Habermas) - Ação Comunicativa - A importância dos intercâmbios comunicativos; Criar uma alternativa racional à razão meramente instrumental Consideração das opiniões das pessoas envolvidas em uma determinada decisão. Figura 2 - Exemplo de um referencial analítico e seus recortes Vejamos aqui um exemplo de pesquisa e de utilização de um referencial teórico: O CURRÍCULO DE EDUCAÇÃO FÍSICA E O POSICIONAMENTO DOS SUJEITOS Marcos Garcia Neira Resumo Sendo as práticas corporais textos da cultura, sua presença no currículo incita os alunos a assumirem posições de sujeito. Visando a compreender os processos de signifi cação desenvolvidos pelos alunos, foram realizadas observações das aulas mi- nistradas para uma turma do 9º ano do Ensino Fundamental de uma escola pública ao longo de um semestre, além de entrevistas semiestruturadas com os discentes na tentativa de obter informações acerca de como lidaram com os conhecimentos vei- culados. O material produzido, após confronto com os referenciais dos Estudos Culturais, evidencia que as aulas contribuíram para a modifi cação das representa- ções dos participantes sobre o objeto de estudo, proporcionando o reconhecimento das identidades dos envolvidos nas práticas corporais tematizadas bem como a uma compreensão mais ampla dos seus signifi cados. Palavras-chave: Educação Física; Cultura; Identidade. Fonte: https://goo.gl/Xwyq81 9 UNIDADE Principais Métodos de Pesquisas Qualitativas em Educação Física Escolar Aqui vemos que o autor utilizou como referencial o campo dos Estudos Cul- turais, para tanto se baseou em autores e conceitos específicos deste referencial. A coerência argumentativa é construída a partir da utilização e construção textual baseada no pensamento de autores e conceitos que constituem este campo. Mas não há caminhos predeterminados, não há protocolos de análise, o que existe é uma utilização coerente e bem estruturada a partir de um campo teórico. Mais a diante no texto o autor demonstra quais perspectivas conceituais fez com que ele escolhesse esse determinado campo teórico. É aqui que ele justifica a es- colha e se coloca em condição de concordância com o que é defendido no referencial utilizado. Por exemplo: Os Estudos Culturais fornecem subsídios para afirmar o caráter político do currículo da Educação Física. Incitam uma investigação mais rigoro- sa que busque desvelar como se dão os processos de identificação/dife- renciação travados no seu interior. Para os Estudos Culturais, revelar os mecanismos pelos quais se constroem determinadas representações é o primeiro passo para reescrever os processosdiscursivos e alcançar a for- mação de outras identidades. (NEILSON; TREICHLER; GROSSBERG, 2008; citados por NEIRA, 2016) No artigo, é possível perceber também que o autor apresenta diversos conceitos, abordados por muitos autores do campo dos Estudos Culturais. Reparem que é um movimento de recorte do campo teórico, junto com outro movimento de continui- dade no que se refere ao pensamento dos autores selecionados, desde que tenham relação com este problema de pesquisa específico. Por conta destes recortes possíveis e diferentes utilizações dentro de um referen- cial teórico ou da combinação de diferentes referenciais na mesma pesquisa, afir- mamos também que isso produz um número infinito de referências teóricas utiliza- das. Diferentes pesquisadores, usando os mesmos referenciais, também produzirão conhecimentos diferentes, isso porque a pesquisa qualitativa é argumentativa, contextual e não busca exatidão, apenas coerência. Importante! Diferente dos dispositivos de produção de dados, a escolha e utilização do referencial analítico é algo bastante pessoal, geralmente se dá pela proximidade que o pesquisador ou a pesquisadora possuem de determinado campo teórico. Importante! Por isso também seria impossível descrever aqui como utilizar um referencial teórico analítico específico. O que fizemos na unidade anterior e que repetimos no exemplo acima citado ajuda quem está iniciando no ato de pesquisar, que é ler, observar e analisar como os pesquisadores mais experientes estão conduzindo suas pesquisas. Esse foi o nosso intuito ao destacar os artigos e solicitar as leituras e análises de seus problemas de pesquisa, dispositivos de produção de dados e refe- renciais utilizados. 10 11 Importante! O que realmente ajuda quem está iniciando no ato de pesquisar, é observar como os pesquisadores mais experientes estão analisando suas pesquisas. Importante! Continuaremos fazendo esse trabalho aqui com destaque a dois métodos de pesquisa muito consagrados no âmbito da educação e da Educação Física escolar. Estamos falando das pesquisas etnográficas e da pesquisa-ação. Pesquisas Etnográficas: Características e Potencialidades “Etnografia é o estudo descritivo (graphos) da cultura (ethnos) de um grupo”. (MOLINA NETO, 2005, p.183) Como adiantamos na unidade 2, a etnografia é um modo de investigação den- so, que enfatiza o contato direto e prolongado do pesquisador com o local e o gru- po que são alvo da pesquisa. A etnografia é um dos métodos mais clássicos e importantes das pesquisas com o referencial das Ciências Humanas, inclusive nas pesquisas de Educação Física sobre grupos culturais e suas práticas corporais. Ela é oriunda do campo antropo- lógico, mas hoje é influenciada por diversos outros campos teóricos, tais como a pós-modernidade, os Estudos Culturais, o pós-colonialismo, entre outras. Importante! A prática da etnografi a tem sua origem na Antropologia de fi ns do século XIX, quando alguns pesquisadores - dentre eles destacaram-se Bronislaw Malinowski e Franz Boas - decidem ir a campo e passar longos períodos de tempo junto aos nativos, realizando uma observação mais constante e minuciosa dos hábitos das tribos da época Você Sabia? O intuito é observar, reunir elementos e informações, se aproximando e vivendo com o grupo, buscando compreender aspectos relacionados às formas de vida, os modos de negociação, socialização, aprendizado, resistência, elaboração de artefa- tos culturais, rituais, entre outras. Na etnografia, o processo da produção de conhecimento se dá, no campo, onde a postura do pesquisador deve ser bastante clara, ele se insere no grupo, entra no jogo, faz parte e se implica no processo e, no que se refere às perguntas e hipóteses, mesmo que se parta inicialmente de algum ponto norteador, no trabalho etnográfico, tem-se a clareza de que tais questões poderão ser alteradas como consequência dos contatos que vão sendo estabelecidos e estreitados com os sujeitos (FONSECA, 1999). 11 UNIDADE Principais Métodos de Pesquisas Qualitativas em Educação Física Escolar Tânia Braga (2001) afirma que os elementos diferenciadores entre a etnografia e outras formas de pesquisa qualitativa é a longa permanência dos pesquisadores em campo. Importante! O trabalho de campo prolongado é um dos pontos fundamentais ao se avaliar uma etnografia. Importante! Quanto às técnicas de coleta de dados utilizadas, o interesse se volta tanto para os diferentes procedimentos instrumentais de coleta quanto para as análises e adequações destas duas, desde os períodos iniciais em campo, considerando que observar, registrar, gravar, entrevistar sejam formas das quais os etnógrafos lançam mão para construir suas investigações. Não é apenas isso que caracteriza e define a etnografia (BRAGA, 2001). O método etnográfico geralmente se combina com diferentes métodos, mas impreterivelmente se dá por meio da observação, na elaboração de um registro em forma de um diário de bordo, que se trata de um material descritivo rico sobre o local e grupo cultural observado. A professora Tânia Braga afirma que embora a produção de documentos descri- tivo-analíticos de particularidades de uma cultura seja finalidade da etnografia, seu sentido também não se esgota em um dado produto. POR EXEMPLO: No item registro da etnografi a, no qual é enfatizada a elaboração do diário de campo, há procedimentos concomitantes durante a coleta de dados, encaminhamentos, alterações, dúvidas, redirecionamentos, o etnógrafo, ao escrever e ler seu diário de campo. Na triangulação metodológica clássica etnográfica, observação/entrevista/aná- lise documental, Braga (2001) destaca a importância de se coletar e dar valor à documentação escrita e iconográfica, inclusive os escritos autobiográficos, que po- dem fornecer importantes elementos sobre uma determinada composição cultural, de determinados períodos, em diferentes realidades, de como foram/são construídas. Nesta direção, uma etnografia, ou “descrição densa”, busca contemplar quatro características (GEERTZ, 1989; citado por DAOLIO e OLIVEIRA, 2007): 1. a etnografi a é interpretativa; 2. o que ela interpreta é o fl uxo do discurso social; 3. a interpretação envolvida consiste em tentar salvar o “dito” num tal discur- so da sua possibilidade de extinguir-se e fi xá-lo em formas pesquisáveis e; 4. ela é microscópica. 12 13 Por fim, segundo Fonseca (1999), as análises advindas da etnografia devem ser tratadas como hipóteses a serem “exploradas/discutidas” ao lado de outras, servindo para oferecer uma alternativa, abrindo o leque de interpretações possíveis, mas não para fechar o assunto ou criar novas fórmulas dogmáticas. Ou seja, em uma etnogra- fia, não se tem o objetivo de esgotar o assunto, pois os dados fornecem percepções que nos permitem apenas um olhar parcial sobre determinado grupo cultural. Para saber mais, explore o artigo disponível em: https://goo.gl/1j7CY7 Ex pl or Pesquisa-Ação: Características e Potencialidades David Tripp (2005), grande especialista deste método, afirma sobre o seu con- texto histórico que é pouco provável que algum dia venhamos a saber quando ou onde teve origem esse método, simplesmente porque as pessoas sempre investiga- ram a própria prática com a finalidade de melhorá-la. De modo geral, constitui-se, como o próprio nome sugere, um método de pes- quisa bastante ativo, pois envolve não apenas a observação, coleta de informações, análise de documentos e elaboração de registros. Um ciclo no qual se aprimora a prática pela oscilação sistemática entre agir no campo da prática e investigar a respeito dela. Planeja-se, implementa-se, descre- ve-se e avalia-se uma mudança para a melhora de sua prática, aprendendo mais, no correr do processo, tanto a respeito da prática quanto da própria investigação. Ciclo da Pesquisa-Ação Ação Investigação AGIR para implantar a melhora planejada PLANEJAR uma melhora da prática Melhorar e DESCREVER os efeitosda ação AVALIAR os resultados da ação Figura 3 – Ciclo da pesquisa-ação Nesta perspectiva, a pesquisa-ação educacional é principalmente uma estratégia para o desenvolvimento de professores e pesquisadores de modo que eles possam utilizar suas pesquisas para aprimorar seu ensino e, em decorrência, o aprendizado de seus alunos. 13 UNIDADE Principais Métodos de Pesquisas Qualitativas em Educação Física Escolar O pesquisador, neste método, está diretamente e propositalmente ligado ao ob- jeto de estudo, que justamente, por isso, busca intervir, contribuir, alterá-lo junto com os sujeitos investigados. EXEMPLO DE INTERVENÇÃO DE UMA PESQUISA-AÇÃO: O presente estudo foi desenvolvido junto às turmas do Ciclo Inicial do Ensino Fundamental que no total abrangeu cerca de 223 alunos, de 6 e 11 anos de idade, matriculados em uma escola pública municipal situada na região periférica da cidade de Osasco (SP) e que atende prioritariamente a uma comunidade socioeconomicamente desfavorecida e caracterizada pela grande incidência de filhos de mi- grantes nortistas e nordestinos. Leia o artigo na íntegra, disponível em: https://goo.gl/GTzN2R Ex pl or A solução de problemas, por exemplo, começa com a identificação do proble- ma, o planejamento de uma solução, sua implementação, seu monitoramento e a avaliação de sua eficácia. É como um estudo de caso, um autoestudo, menos preocupado com os aspectos teóricos e mais focado na prática de alguma experiência. O registro se assemelha a um relato de uma prática compartilhada, cheio de descrições e ações toma- das em conjunto entre pesquisador-sujeitos. Tripp (2005) cita algumas características deste método: • a pesquisa-ação começa com um reconhecimento; • a pesquisa-ação produz um ciclo interativo; • investigação-ação é utilizada em cada fase; • a reflexão é essencial para o processo de pesquisa-ação; • a pesquisa-ação tende a ser participativa. Para saber mais, acesse o artigo disponível em: https://goo.gl/oNfpH1 Ex pl or Principais Referenciais de Análise Utilizados em Pesquisas na Área da Educação Física Escolar É importante destacarmos que o campo da Educação Física escolar é um campo re- lativamente novo, que está se transformando continuamente. É fácil lembrarmos quan- do o referencial epistemológico da área e de quase a totalidade das pesquisas e análises se referendavam na área das ciências biológicas, dentre elas: anatomia, biomecânica, aprendizagem motora, desenvolvimento motor, fisiologia, entre outras. Mais recente- mente, sobretudo, a partir da década de 1980, a Educação Física passou a ser analisada e influenciada por alguns campos teóricos advindos das ciências humanas. 14 15 Destaca-se aqui o trabalho desenvolvido pelos professores Jocimar Daólio que inicia no âmbito nacional um debate importante da Educação Física e a área da Antropologia a partir de alguns conceitos (como o de cultura) de Marcel Mauss e Clinford Geertz; Mauro Betti que publica uma importante obra denominada de “Educação Física e sociedade” (1991); Micheli Ortega Escobar, Valter Bracht, Elizabeth Varjal, Celi Taffarel, Cármen Lucia Soares e Lino Castellani Filho, o chamado Coletivo de Autores, que em 1992, a partir do livro Metodologia do En- sino de Educação Física, aproximam a Educação Física escolar da teoria crítica da educação, a partir da chamada Pedagogia Histórico-crítica de Dermeval Saviani; Elenor Kunz, que produziu a importante obra “Transformação didático-pedagógica do esporte” fundamentada na teoria da ação comunicativa de Jürgen Habermas; e mais recentemente Kátia Rúbio e Yara de Carvalho que organizam uma importante obra sobre a Educação Física e as ciências humanas (2001). Da década de 1980 até hoje, a produção acadêmica sobre Educação Física e as ciências humanas expandiu-se muito. Tanto em relação ao número de pesquisa- dores e pesquisadoras que estão se influenciando e produzindo materiais a partir desta intersecção, quanto em relação à quantidade de campos teóricos utilizados. Temos desde a teoria crítica tradicional do materialismo histórico dialético até cam- pos teóricos mais contemporâneos como o pós-estruturalismo e a teoria queer. Grosseiramente falando, o pós-estruturalismo é um aglomerado de produções fi losófi cas que, baseados na centralidade da linguagem, dos discursos e enunciados, combate teoriza- ções científi cas e fi losófi cas que se fundam em visões realistas, neutras e naturalizadas de mundo. Para o pós-estruturalismo, a linguagem constitui o mundo real, organiza o pensa- mento, mas cobra o preço de limitá-lo ao que já é dado culturalmente. Ex pl or Como dissemos, é comum que as áreas de intervenção pedagógica, como a Educação Física, façam uso da produção teórica desenvolvida por tais campos, advindos especificamente da Filosofia, Linguística, Antropologia, Sociologia, Psico- logia, entre outras, tal como a área da Educação tem feito há tempos. Aqui destacaremos alguns exemplos de referenciais analíticos bastante utilizados nas pesquisas em Educação Física: • Materialismo Histórico Dialético (Teoria Crítica Marxista); • Teoria Crítica (Escola de Frankfurt); • Teoria da Ação Comunicativa (Jürgen Habermas); • Teorias Psicológicas/psicanálise (Freud, Lacan, Winnicott, entre outros); • Hermenêutica Filosófica (Clássica, Contemporânea, Hans-George Gadamer, entre outros); • Sociologia Contemporânea (Boaventura de Sousa Santos, Zygmunt Bauman); • Teoria Pós-crítica da área da Educação (Tomaz Tadeu da Silva, Alfredo Veiga-Neto, Marlucy Paraíso, Ana Canen, Vera Candau, Sandra Mara Corazza, entre outras); • Estudos feministas (Simone de Beauvoir, Alice Walker, Bell Hooks, entre outras); 15 UNIDADE Principais Métodos de Pesquisas Qualitativas em Educação Física Escolar • Estudos étnicos-raciais, negros e de minorias (Diversos autores); • Estudos Pós-coloniais (Homi Bhabha, Franz Fanon, entre outros); • Estudos antropológicos (Clássicos, contemporâneos etc.); • Estudos Culturais (Stuart Hall, Raymond Williams, Carolina Escosteguy, entre outros); • Pós-estruturalismo (Michel Foucault, Jacques Derrida, Julia Kristeva, Gilles Deleuze, entre outros); • Análise de Conteúdo (Laurence Bardin); • E muitos outros. Exemplos de pesquisas qualitativas na área da Educação Física escolar Exemplo 1: O TRABALHO DOCENTE NA PERSPECTIVA DE PROFESSORES DE EDUCAÇÃO FÍSICA: ANÁLISE DE ALGUNS FATORES CONDICIONANTES E SUAS RESTRIÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Luiz Gustavo Bonatto Rufino Resumo O estudo analisa alguns elementos condicionantes e restrições ao trabalho do- cente relacionados ao desenvolvimento da prática pedagógica na Educação Física, a partir das compreensões de cinco professores participantes de um processo de formação continuada. Optou-se pela pesquisa qualitativa, tendo como técni- ca de coleta de dados a realização de 16 grupos focais, gravados, transcritos e analisados a partir da análise de conteúdo. Os resultados indicaram que as dificuldades relacionadas ao plano de carreira e condições de infraestrutura inci- dem diretamente na prática profissional. Além disso, a elaboração de currículos institucionais tem gerado novos dilemas aos professores, sobretudo relacionados ao protagonismo frente aos processos decisórios durante as ações profissionais. Conclui-se que é necessário repensar o trabalho docente tendo em vista a profis- sionalização do ensino. Para isso, deve-se olhar para a formação de professores de dentro para fora, valorizando o estatuto profissional da docência e a relação proveniente dessa interação com o trabalho. RUFINO, Luiz Gustavo Bonatto. Movimento, Porto Alegre, v. 23, n. 4., p. 1257-1270, out./dez. de 2017. Fonte: https://goo.gl/yNrHbr 16 17 Exemplo 2: O CURRÍCULO CULTURAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA EM AÇÃO: EFEITOS NAS REPRESENTAÇÕES CULTURAIS DOS ESTUDANTES SOBRE AS PRÁTICAS CORPORAIS E SEUS REPRESENTANTES Marcos Ribeiro das Neves A presente investigação procura identificar os efeitos do currículocultural nos sujeitos da educação, através da análise das significações elaboradas sobre as práticas corporais tematizadas, bem como sobre seus representan- tes. Enquanto projeto formativo, o currículo cultural pretende influenciar na constituição de identidades solidárias e a favor das diferenças. Afinal, na luta por uma sociedade menos desigual, o currículo se configura como um artefato cultural importante, pois nele se forjam os cidadãos e cidadãs. É por meio dele, também, que determinados saberes são validados enquanto outros ficam à margem. Na perspectiva cultural da Educação Física, o currí- culo visa a construir uma proposta onde os distintos patrimônios culturais corporais sejam reconhecidos através da tematização das práticas corporais que coexistem no cenário social, bem como a valorização dos significados produzidos por seus representantes. Para a realização da pesquisa, foi de- senvolvida uma etnografia e uma autoetnografia de aulas de Educação Física culturalmente orientadas em escolas públicas da capital paulista. O material produzido foi submetido à análise cultural e confrontado com a teorização pós-crítica. De um modo geral, os resultados permitem afirmar que o currículo cultural em ação exerce uma influência nas signifi- cações proferidas pelos estudantes acerca das práticas corporais tematizadas e os sujeitos que delas participam. Contrariando as expectativas iniciais que centravam o processo nas atividades de ampliação mediante o contato com outras representações, o processo de ressignificação acontece desde o mape- amento, perpassa as vivências e se fortalece, de maneira especial, naquelas atividades de aprofundamento em que são desenvolvidas situações didáticas voltadas para a desconstrução de representações pejorativas. Também se concluiu que os professores exercem um papel fundamental nesse processo ao se mostrarem abertos às representações dos estudantes, sem imposição de significados e garantindo-lhes o espaço para livre expressão. NEVES, Marcos Ribeiro das. O currículo cultural de Educação Física em ação: efeitos nas representações culturais dos estudantes sobre as práticas corporais e seus repre- sentantes. 2018. 198 f. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Educação, Universida- de de São Paulo, São Paulo. 2018. Fonte: https://goo.gl/s1u7PN 17 UNIDADE Principais Métodos de Pesquisas Qualitativas em Educação Física Escolar Exemplo 3 O CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO FÍSICA EM AÇÃO: ANÁLISE DO PROCESSO DE SIGNIFICAÇÃO DAS PRÁTICAS CORPORAIS POR PARTE DOS SUJEITOS Letícia Araújo Marcos Garcia Neira Resumo O currículo não é um instrumento neutro, pois carrega em si a intencionalidade da constituição dos sujeitos em conformidade com um determinado projeto social. O objetivo da presente pesquisa foi analisar o processo de significação das mani- festações corporais privilegiadas no currículo da educação física e identificar que posições de sujeito assumem diante dessas manifestações. Para tanto, utilizou da análise qualitativa, com observação participante de aulas de Educação Física e entrevista semiestruturada com alunos. O material recolhido foi confron- tado com a construção teórica de Charles Taylor. Conclui-se que os processos de significação das manifestações corporais passam por elementos fundamentais como a abertura ao diálogo sobre o fenômeno cultural estudado e os discursos que emergem durante o trabalho realizado em sala de aula, o reconhecimento das iden- tidades presentes na comunidade e a fusão de horizontes entre os sujeitos do cur- rículo, e que as posições de sujeito assumidas diante dessas manifestações devem estar atreladas a esses elementos para que os sujeitos a assumam com propriedade. ARAUJO, L.; NEIRA, M. G. O currículo da Educação Física em ação: análise do processo de significação das práticas corporais por parte dos sujeitos. Iniciação, v. 4, p. 1-17, 2014. Fonte: https://goo.gl/YKNg3n 18 19 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros Etnografia da prática escolar ANDRÉ MEDA. Etnografia da prática escolar. Campinas: Papirus, 1995. Educação Física e sociedade BETTI, M. Educação Física e sociedade. São Paulo, Movimento, 1991. O saber local: novos ensaios em antropologia interpretativa GEERTZ C. O saber local: novos ensaios em antropologia interpretativa. Petrópolis: Vozes, 1997. Educação física e ciências humanas CARVALHO Y. M. RUBIO, K. (org.) Educação física e ciências humanas. São Paulo: Hucitec, 2001. 19 UNIDADE Principais Métodos de Pesquisas Qualitativas em Educação Física Escolar Referências BRAGA, T. M. F. G. Origens e questões da etnografia educacional no Brasil: um balanço de teses e dissertações (1981-1998). 2001. 308 f. Tese (Doutorado em Educação). Faculdade de Educação. Universidade de São Paulo, 2001. DAOLIO, J. OLIVEIRA, R. C. de. Pesquisa Etnográfica em Educação Física: uma (re)leitura possível. Revista brasileira Ciência e Movimento. 15(1): 137-143, 2007. FONSECA C. Quando cada caso NÃO é um caso: pesquisa etnográfica e educa- ção. In: Revista Brasileira de Educação; n.10: p.58-78, 1999. MOLINA NETO V. Etnografia (verbete). In: GONZÁLEZ FJ, FENSTERSEIFER PE (organizadores). Dicionário crítico de educação física. Ijuí: Unijuí. p.183-185; 2005. TRIPP, D. Educação e Pesquisa. São Paulo, v. 31, n. 3, p. 443-466, set./dez. 2005 20
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