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Terapia Nutricional do Paciente Renal Crônico e Agudo Autor: Cristina Martins. Nutricionista - UFPR, Curitiba-PR; Doutora em Ciências Médicas: Nefrologia - UFRGS, Porto Alegre/RS; Mestre em Nutrição Clínica - New York University, EUA; Dietista Registrada (RD) - American Dietetic Association, EUA; Especialista em Nutrição Renal - American Dietetic Association, EUA; Especialista em Suporte Nutricional Enteral e Parenteral, SBNPE; Especialista em Nutrição Clínica - UFPR, Curitiba/PR; Coordenadora do Setor de Nutrição - Clínica de Doenças Renais e Fundação Pró-Renal; Curitiba/PR; Diretora Geral do Instituto Cristina Martins, Curitiba/PR. Copyright© 2009 by Instituto Cristina Martins Produção Gráfica: Simone Luriko Saeki Todos os direitos reservados. É permitida uma (01) cópia impressa deste material exclusivamente para o aluno matriculado nos cursos online, desenvolvidos pelo Instituto Cristina Martins. Instituto Cristina Martins e-mail: instituto@institutocristinamartins.com.br Home Page: www.institutocristinamartins.com.br 3 OBJETIVOS DE APRENDIZADO Após a leitura deste capítulo, você deverá estar apto a: Explicar as recomendações de energia, carboidratos, proteínas, lipídios, vitaminas e minerais para pacientes com ? doença renal crônica na fase não dialítica, na hemodiálise e na diálise peritoneal. Identificar as recomendações dos principais nutrientes para o período pós-transplante renal imediato e tardio. ? Reconhecer as recomendações de macro e micronutrientes na injúria renal aguda. ? Identificar a necessidade de suplementação vitamínica para pacientes com doença renal crônica e aguda. ? Explicar as recomendações hídricas para cada fase da doença renal crônica e aguda. ? Compreender os princípios da terapia nutricional para pacientes renais crônicos e agudos. ? Citar as indicações da terapia nutricional oral, via sonda e parenteral para pacientes renais crônicos e agudos. ? Compreender a necessidade da relação interpessoal para a aderência às orientações nutricionais via oral do ? paciente renal. Identificar as opções de suplementos nutricionais orais indicados para pacientes renais. ? Reconhecer os benefícios do uso de suplementos nutricionais orais para pacientes em diálise. ? Identificar a possibilidade de uso da nutrição parenteral intradialítica para pacientes em hemodiálise. ? Reconhecer a possibilidade da nutrição parenteral intraperitoneal para pacientes em diálise peritoneal. ? Terapia Nutricional do Paciente Renal Crônico e Agudo Cristina Martins 4 PROBLEMATIZAÇÃO ESTUDO DE CASO S.N.S., sexo masculino, 58 anos de idade, viúvo e sem filhos. Há 9 anos, em exame de rotina, foi diagnosticada a DRC. Há 2 anos iniciou a CAPD. Ao ficar viúvo, há 6 meses, o paciente optou pela HD: 3 vezes/semana, 4h/sessão. FAV sem intercorrência. Relata anorexia, queixa-se de “não sentir o gosto da comida”, perda de peso contínua, sem uso de suplementos nutricionais. Pressão arterial atual média=160/100mmHg. Medicamentos prescritos: eritropoietina (2.000U EV, 2 vezes/semana), carbonato de cálcio às refeições, furosemida, verapamil, ferro EV (200mg, 1 vez/semana), suplemento vitaminíco renal (1 comprimido/dia). Estatura do último mês=165cm, peso seco atual=58kg, ganho de peso interdialítico médio=0,5-0,7kg. PRU da última sessão de HD=59%. Em processo de triagem para o tx renal. Testes laboratoriais atuais em HD: Laboratoriais Resultado Pré Sessão Laboratoriais Resultado Pré Sessão Uréia (mg/dL) 230 Cálcio (mg/dL) 9,2 Creatinina (mg/dL) 11,4 Fósforo (mg/dL) 6,3 Hematócrito (%) 27 PTH (pg/mL) 315 Hemoglobina (mg/dL) 8,3 Albumina (g/dL) 3,5 Leucócitos (células/mm3) e linfócitos (%) 4.000 e 31 Colesterol total (mg/dL) 113 Ferro sérico (mcg/dL) 80 Triglicerídeos (mg/dL) 144 Capacidade de ligação do ferro (mcg/dL) 170 Proteína C reativa (mg/L) 5,1 Ferritina (mcg/dL) 80 Kt/V 1,1 Saturação da transferrina (%) 17 PNAn (g/kg/dia) 0,6 Os seguintes diagnósticos nutricionais foram identificados como prioridade: Diagnóstico 1: Ingestão insuficiente de energia e proteína, relacionada à anorexia, ? que pode estar sendo causada pela uremia, anemia, isolamento social, falta de apoio familiar, hipogeusia/ageusia, restrição financeira, problemas dentários e artrite, conforme evidenciado por perda de peso, fraqueza, PRU e Kt/V abaixo do ideal, R24h com ingestão aproximada de 1.182kcal e 38g de proteína/dia, ganho de peso interdialítico abaixo do desejável, PNAn=0,6g/kg, albumina sérica=3,5g/dL. Diagnóstico 2: Necesssidades aumentadas de nutrientes, relacionada à perdas de ? aminoácidos, vitaminas e glicose no procedimento dialítico e presença de uremia e inflamação, conforme evidenciado por procedimento hemodialítico 3 vezes/semana; proteína C reativa=5,1mg/dL Qual é a prescrição da dieta de S.N.S., em relação à energia, proteínas, sódio, potássio e 1. fósforo? S.N.S. necessita de um plano de ação individualizado. Quais seriam as opções de intervenção 2. direcionadas para cada diagnóstico nutricional do paciente? Qual seria a conduta em relação ao produto cálcio/fósforo de S.N.S.?3. Se ainda estivesse em diálise peritoneal, qual seria a prescrição em relação à energia, 4. proteínas, carboidratos, sódio, potássio e fósforo de S.N.S.? Em caso de S.N.S. receber o transplante renal, qual será a prescrição dietética a longo prazo 5. de energia, proteínas, lipídios e sódio? 5 Terapia Nutricional do Paciente Renal Crônico e Agudo INTRODUÇÃO A terapia nutricional (TN), desde que bem planejada, implementada de forma individualizada, com acompanhamento frequente e boa adesão do paciente, possibilita a manutenção ou o restabelecimento do estado nutricional e da qualidade de vida (1, 2). Na fase não dialítica da doença renal crônica (DRC), os objetivos da TN, além de prevenir a desnutrição, são: reduzir a toxicidade urêmica, minimizar os sintomas, evitar distúrbios hidroeletrolíticos, mineral, ácido básico e hormonal, e retardar a progressão da doença. Em diálise crônica, os objetivos são: recuperar e/ou manter o estado nutricional, minimizar o catabolismo protéico decorrente do processo dialítico, assegurar a ingestão protéica recomendada, manter o equilíbrio ácido- básico, hidroeletrolítico, de minerais e de vitaminas, minimizar os efeitos metabólicos da absorção contínua de glicose do dialisato e melhorar o prognóstico. Para o paciente transplantado, o principal objetivo da TN é o controle do peso corporal e dos problemas associados. Já na injúria renal aguda (IRA), os objetivos são: tratar a doença de base, manter o estado nutricional e metabólico, manter o equilíbrio hidroeletrolítico, ácido básico e mineral, apoiar as funções renais e de outros sistemas orgânicos, prevenir dano adicional e auxiliar na recuperação dos rins, se possível. Uma vez que vários estudos relatam associação entre a piora de indicadores nutricionais corporais com a diminuição da ingestão de energia e de nutrientes, acredita-se que a TN, independente da via de acesso, seja um dos aspectos mais importantes para pacientes com doenças renais. Apesar de sua reconhecida importância, os estudos que avaliaram a eficiência da TN sobre o tratamento da desnutrição apresentam amostras pequenas, tempo curto de acompanhamento e resultados pouco conclusivos sobre o impacto na melhora do prognóstico. RECOMENDAÇÕES DE NUTRIENTES DOENÇA RENAL CRÔNICA NÃO DIALÍTICA Energia Apesar dos estudos metabólicos demonstrarem que 30kcal/kg/dia é o mínimo a ser fornecido para a manutenção dos parâmetros nutricionais, há algumas evidências que sugerem que a necessidade de energia pode ser menor (3), particularmente nos pacientes idosos ou com estilo de vida sedentário. Um estudo com uso da calorimetria indireta mostrou que pacientes em DRC não dialítica apresentaram gasto energético significativamente mais baixo que aquelesem diálise (4). Pacientes diabéticos nessa fase, entretanto, apresentaram gasto energético mais elevado do que os não diabéticos na mesma condição (5). Na maioria dos estudos, o balanço nitrogenado neutro ou positivo é observado com o aporte de aproximadamente 35kcal/kg/dia. Para pacientes obesos, podem ser recomendadas quantidades mais baixas de quilocalorias. Por outro lado, aqueles hipercatabólicos ou fisicamente muito ativos podem necessitar de aporte energético maior. Ajustes devem ser feitos na presença da desnutrição ou em risco nutricional, principalmente para aqueles que apresentam doenças crônicas graves associadas, como diabetes mellitus de difícil controle, insuficiência cardíaca congestiva crônica, doença pulmonar obstrutiva crônica, processos inflamatórios e/ou infecciosos crônicos e outros. Também, conforme a DRC progride, a ingestão calórica tende a diminuir (6). Nesses casos, o foco principal é o aumento da oferta de energia. E pode ser indicada a suplementação calórica, para garantir o estado nutricional adequado. Proteínas Algumas questões são discutidas quanto à ingestão protéica mais adequada para pacientes com DRC não dialítica, em termos de segurança nutricional, preservação da função renal e adesão. Primeiro: qual é a melhor quantidade a ser prescrita? Segundo: existe diferença na qualidade da proteína ingerida? E o fracionamento, é um ponto importante? Estudos de balanço nitrogenado e de medidas do turnover protéico demonstram que pacientes com DRC na fase não dialítica, em condições clínicas estáveis e que são submetidos à dieta com menor quantidade de proteína, são capazes de ativar mecanismos adaptativos. Esses possibilitam a manutenção das reservas protéicas corporais, desde que a oferta de energia seja suficiente. 1. QUANTIDADE DE PROTEÍNA. Há muito se tem conhecimento que a dieta pobre em proteínas pode melhorar os sintomas urêmicos, prevenir ou tratar várias complicações da DRC, como a osteodistrofia renal, a hipertensão arterial, os distúrbios eletrolíticos e a acidose metabólica. A melhora dos sintomas 6 ocorre porque a dieta hipoprotéica também restringe a ingestão de fosfato, sódio e ácidos, responsáveis pelas complicações citadas. Porém, várias investigações levantam a possibilidade de que as dietas pobres em proteínas retardem a progressão da DRC. Estudos em pacientes com DRC sugerem que a ingestão protéica pode ser reduzida com segurança para 0,6g/kg/dia, ou mesmo para 0,3g/kg/dia se suplementada com uma mistura de aminoácidos essenciais ou cetoácidos (7, 8). Para evitar o balanço nitrogenado negativo, é necessário aporte energético adequado. E as proteínas ingeridas devem ser, pelo menos, 50% de alto valor biológico (9). Portanto, em relação à quantidade de protéica recomendada, três alternativas são, habitualmente, utilizadas: Dieta hipoprotéica convencional (alimentos ? mistos): com 0,6g/kg de peso atual por dia de proteína para manter o balanço nitrogenado. Para assegurar o bom aporte de aminoácidos essenciais, 2/3 dessa proteína ingerida deve ser de alto valor biológico, como ovos, carne, leite e soja. No passado, se acreditava que as dietas poderiam ser mais hipoprotéicas, e que o nitrogênio proveniente da degradação da uréia poderia ser reutilizado na síntese de aminoácidos. Sabe-se, hoje, que o nitrogênio proveniente da uréia não contribui significativamente para a síntese protéica na uremia. Dieta muito hipoprotéica, com 0,3g/kg/dia ? de proteína predominantemente vegetal e suplementada com uma mistura de aminoácidos essenciais. Essa dieta pode corrigir sintomas urêmicos, manter o estado nutricional e o balanço nitrogenado positivo por longos períodos. Porém, acredita-se que ela não esteja totalmente adequada para as necessidades dos pacientes com DRC. Isso porque alguns aminoácidos se tornam condicionalmente essenciais na uremia. Por exemplo, a tirosina, que não é um aminoácido essencial, tem a sua síntese a partir da fenilalanina. Na uremia, a produção dela fica alterada, sugerindo a necessidade de suplementação. O mesmo se aplica à histidina. Em caso de uremia, a sua deficiência acarreta balanço nitrogenado negativo, além de mal-estar e rash cutâneo. Da mesma forma, a serina, que é sintetizada basicamente no rim, deve ser suplementada, pois encontra-se em níveis baixos em condições de uremia. Dieta muito hipoprotéica, com 0,3g/kg/dia ? de proteína predominantemente vegetal e suplementada com uma mistura de cetoácidos. Assim como os aminoácidos essenciais, os cetoácidos, que são análogos sem o nitrogênio, estão disponíveis no mercado (ex.: Ketosteril®, Fresenius Kabi). Embora com ausência de estudos controlados, de longo prazo e com número significativo de pessoas estudadas, investigações comprovam a eficácia dessa dieta na redução dos sintomas urêmicos, na manutenção adequada dos parâmetros nutricionais e do balanço nitrogenado, no controle da pressão arterial, da acidose metabólica, da sensibilidade à insulina e do metabolismo mineral ósseo (10). A melhora da acidose metabólica, que gera menos íons H+, pode diminuir o catabolismo protéico e equilibrar o balanço nitrogenado. Esse tipo de dieta é mais indicado para pacientes com taxa de filtração glomerular <25mL/min. Porém, não existem estudos comparativos e de longo prazo entre as modalidades de dieta. Os maiores limitantes das dietas muito pobres em proteína são a dificuldade de aderência a longo prazo, pois o indivíduo deve seguir dieta vegetariana controlada, e o custo elevado dos suplementos de aminoácidos essenciais ou cetoácidos. No caso de ingestão protéica maior, os suplementos são simplesmente oxidados e perdem qualquer finalidade. Um estudo histórico, o Modification Diet of Renal Disease (MDRD), objetivou avaliar a influência das dietas hipoprotéicas na progressão da DRC. O estudo teve caráter multicêntrico e randomizado. Os critérios levados em consideração foram dois níveis de pressão arterial média: 107mmHg (140/90mmHg) e 92mmHg (125/75mmHg). Os diabéticos foram excluídos do estudo, e foram utilizadas drogas antihipertensivas, inclusive inibidores da enzima conversora (11). O grupo A, com 585 pacientes e taxa de filtração glomerular entre 25-55mL/minuto, seguiu uma dieta hipoprotéica convencional (0,58g/kg/dia) ou uma usual, contendo 1,3g/kg/dia de proteína. No grupo B, foram incluídos 255 pacientes com taxa de filtração glomerular entre 13-24mL/minuto. Nesse grupo, os pacientes foram aleatoriamente colocados em dieta hipoprotéica convencional (0,58g/kg/dia) ou muito hipoprotéica 7 Terapia Nutricional do Paciente Renal Crônico e Agudo (0,28g/kg/dia), suplementada com cetoácidos. Os pacientes foram acompanhados, em média, por 2,2 anos. A cada quatro meses foram determinadas a taxa de filtração glomerular por 125I-iotalamato e a ingestão protéica. Os resultados mostraram aderência razoavelmente boa à dieta. O grupo A teve ingestão de 1,1±0,19 versus 0,73±0,15g de proteína recomendada/kg de peso corporal por dia. O grupo B ingeriu 0,69±0,12 versus 0,46±0,15g de proteína recomendada/kg/dia (média±DP aos dois anos de acompanhamento). A análise dos resultados mostrou que o declínio da função renal não variou entre os grupos, considerando dieta e pressão arterial. Os autores concluíram que, no grupo com DRC moderada (grupo A), houve declínio mais lento da função renal após o quarto mês de início da dieta hipoprotéica. No grupo com DRC avançada (grupo B), não houve diferença das duas dietas sobre o declínio da função renal. Porém, não houve grupo-controle. A interpretação dos dados desse estudo tem sido discutidas (12). Apesar disso, algumas conclusões podem ser tiradas do MDRD: Houve retardo significativo da progressão quando ? a pressão arterial foirigorosamente controlada em pacientes com proteinúria >1g/dia. A função renal de negros deteriorou-se mais ? rapidamente. No grupo B (DRC avançada), a ingestão protéica ? variou muito, sendo que alguns pacientes ingeriram quantidades similares aqueles do grupo A. Numa análise secundária do estudo MDRD, foram feitas correlações entre a quantidade de proteína de fato ingerida e a taxa de declínio da função renal (13, 14). O resultado revelou que a redução da ingestão protéica de 0,2g/kg/dia, ou mais, foi associada com o declínio mais lento da taxa de filtração glomerular (1,15mL/minuto, que significou 29% de diminuição média da taxa de filtração glomerular no grupo B, ou 4mL/minuto/ ano). Então, um paciente com declínio da taxa de filtração glomerular 29% mais lento, prolongaria em 41% o tempo para entrar em diálise. Portanto, haveria benefício da dieta hipoprotéica em pacientes com DRC avançada (<25mL/minuto de taxa de filtração glomerular). Mas não com a modalidade que usou a suplementação de cetoácidos. Infelizmente, com o estudo MDRD, não ficaram totalmente esclarecidos os benefícios da dieta hipoprotéica em torno de 0,6-0,7g/kg/dia. Mas parece não haver dúvidas que ela possa retardar a diálise por vários anos. E isso depende, principalmente, de grande esforço do paciente para a aderência a longo prazo. Também para avaliar o benefício do controle protéico na progressão da DRC, uma meta-análise utilizou apenas pesquisas randomizadas, controladas e com acompanhamento superior a um ano (15). O ponto final era a morte ou a insuficiência renal terminal. A análise incluiu 1.413 pacientes com DRC não-diabética e 108 com DRC diabética insulino-dependente. Em pacientes não-diabéticos e submetidos à dieta hipoprotéica (0,4- 0,6g/kg/dia de proteína prescrita), houve redução de 33% no risco de morte ou de insuficiência renal terminal. Nos pacientes diabéticos, a dieta reduziu significativamente o risco de progressão da lesão renal (queda da taxa de filtração glomerular ou aumento na proteinúria) em 46%. Em outra meta-análise, Kasiske et al (16) analisaram 1.919 pacientes de 13 estudos randomizados e encontraram discreta redução na taxa de declínio da função renal (0,53mL/minuto/ano) com a dieta hipoprotéica. Fouque et al (17) analisaram seis estudos que incluiam 890 pacientes não-diabéticos, randomizados e acompanhados por um ano. Em cinco dos seis estudos, o número de mortes “renais” foi menor no grupo com dieta hipoprotéica, quando comparado com o controle (61 versus 95). No grupo com dieta hipoprotéica, a chance de morte “renal” foi de 0,54. Ou seja, 46% a menos de chance de progredir para a insuficiência renal terminal. Embora os resultados das dietas hipoprotéicas sejam mais evidentes na nefropatia diabética, os inibidores da enzima conversora, que retardam significativamente a progressão da DRC, não foram utilizados nos estudos que mostraram efeito significativo da dieta (18). E quando iniciar a dieta hipoprotéica? Essa recomendação é baseada nos seguintes critérios: 1) grau da DRC; 2) presença de progressão da DRC; 3) grau de proteinúria e 4) uso ou não de glicocorticóides. Não existe consenso a respeito do grau de disfunção renal em que a proteína deve ser diminuída na dieta. Estágio 2: Insuficiência Renal Leve (taxa de ? filtração glomerular entre 60 e 89mL/minuto). Em geral, a creatinina sérica está em torno de 2mg/ dL. Nesse caso, não é recomendada a redução da ingestão protéica abaixo da DRI (Dietary 8 Reference Intakes), a não ser que haja sinais de progressão da DRC. Nesse estágio, o objetivo é controlar a pressão arterial e outros fatores, como a hiperlipidemia. Estágio 3: Insuficiência Renal Moderada (taxa de ? filtração glomerular entre 30 e 59mL/minuto). Geralmente é recomendado iniciar dieta com 0,6-0,8g/kg/dia de proteína, sendo 2/3 de alto valor biológico, e controle rigoroso da pressão arterial. Para diabéticos, é recomendada a ingestão protéica de 0,8-1,0g/kg/dia. No caso de progressão da DRC na vigência do controle protéico convencional em torno de 0,6g/kg/ dia, pode ser recomendada a dieta vegetariana (0,3g/kg/dia). Essa deve ser suplementada com aminoácidos essenciais ou cetoácidos. A restrição de fósforo é essencial. Mas, felizmente, isso é alcançado facilmente em consequência da restrição protéica. Estágios 4 e 5: Insuficiência Renal Grave e ? Terminal (taxa de filtração glomerular <29mL/ minuto). As mesmas dietas recomendadas para a DRC moderada são indicadas nesses estágios. Elas podem reduzir os sintomas urêmicos e as complicações metabólicas da uremia. Pode haver retardo no declínio da função renal residual. É importante observar que os pacientes com taxa de filtração glomerular <10mL/min estão mais sujeitos à desnutrição. 2. QUALIDADE DA PROTEÍNA. Além da quantidade recomendada, a fonte da proteína pode, também, ser importante para a progressão da DRC. Um estudo em diabéticos avaliou as respostas renal, metabólica e hormonal da ingestão protéica animal versus vegetal (19). Os indivíduos receberam, principalmente, proteínas de origem animal (1,1g/kg/dia, sendo 70% animal e 30% vegetal) durante quatro semanas. Depois passaram para outro período de quatro semanas com a ingestão protéica exclusivamente vegetal (0,95g/kg/dia). A taxa de filtração glomerular e o fluxo plasmático renal foram significativamente mais baixos com a proteína vegetal. Portanto, as proteínas animais parecem influenciar negativamente na taxa de filtração glomerular e na progressão da doença renal. Em um estudo em nosso Centro (Clínica de Doenças Renais de Curitiba), foi avaliado o efeito hemodinâmico renal com diferentes cargas protéicas sobre a taxa de filtração glomerular de indivíduos normais (20). Medida através do clearance de creatinina, a taxa de filtração glomerular foi avaliada antes de uma carga protéica (70g) e após, durante 180 minutos. As fontes protéicas estudadas foram a carne vermelha (gado), o frango, o peixe, a albumina do ovo e a soja liofilizada. Os resultados mostraram que a carne vermelha elevou significativamente o clearance de creatinina, quando o tempo inicial foi comparado aos períodos pós-ingestão. Também, a carne vermelha teve clearances de creatinina renal elevados por tempo mais prolongado do que os demais tipos de proteínas utilizados. A soja foi a única fonte protéica que não aumentou significativamente o clearance de creatinina dos indivíduos. Um outro estudo, agora em ratos que sofreram nefrectomia subtotal, também avaliou os efeitos da qualidade de proteínas (caseína e soja) sobre a função renal (21). Os animais submetidos à dieta a base de soja melhoraram a sobrevida, com resultados mais baixos na proteinúria, na hipertrofia, no dano renal histológico dos néfrons remanescentes, associado ao melhor perfil lipídico sérico. Os mecanismos envolvidos no fato da proteína influenciar a função renal normal e a progressão da DRC ainda não estão bem esclarecidos. Tem sido sugerido que a composição de aminoácidos da proteína pode estar envolvida nessa resposta. A infusão da lisina em humanos, por exemplo, exerce efeito inibitório sobre a reabsorção tubular de proteínas e gera aumento da excreção de albumina (22). O efeito tem sido atribuído a aminoácidos como a valina, a histidina, a glicina e a lisina. Esses possuem um grupo amina com carga positiva na sua cadeia terminal, tornando-os capazes de interferir no processo de reabsorção tubular da proteína. De outra forma, o triptofano, que é um aminoácido neutro, parece interferir na ação de aminoácidos de carga elétrica positiva (ex.: arginina, histidina, lisina) e inibe a proteinúria (23). Entretanto, existem muitas limitações quanto às metodologias utilizadas nos estudos de avaliação do efeito de diferentesproteínas no desenvolvimento e progressão da DRC. Por exemplo, os estudos mantêm a quantidade da proteína ingerida próxima ao “usual” (em torno de 1,3g/kg/dia). Mas será que a redução na quantidade total tem o mesmo efeito? A soja parece ser a fonte protéica que melhor retarda a progressão da DRC. Mantém-se, portanto, a questão se realmente é a quantidade ou também a 9 Terapia Nutricional do Paciente Renal Crônico e Agudo qualidade da proteína que influencia na progressão. De qualquer forma, enquanto se aguarda mais pesquisas no assunto, a dieta vegetariana, se adequadamente implementada, pode ser alternativa segura e viável em substituição à proteína animal. Carboidratos e Lipídios Usualmente, é recomendado que os pacientes na fase não dialítica da DRC tenham dieta normal ou rica em carboidratos (aproximadamente 50 a 60% do total das quilocalorias), mesmo aqueles diabéticos. Existe certa vantagem no controle glicêmico de diabéticos, enquanto a DRC progride. A insulina, que é excretada via renal, endógena ou exógena, passa a circular por mais tempo no sangue desses indivíduos. Com isso, o controle glicêmico torna-se mais fácil em diabéticos com DRC avançada. E um maior aporte de carboidratos pode ser utilizado. Os lipídios são recomendados, geralmente, entre 30 e 35% do total das quilocalorias. Os mono e os polinsaturados são prefereridos, para minimizar o risco da hiperlipidemia, principalmente em diabéticos. Sódio, Potássio e Líquidos A hipertensão é um dos fatores de risco para o desenvolvimento e progressão da DRC. E o problema aumenta conforme a função renal se deteriora. Embora os estudos que comparam diferentes quantidades de ingestão alimentar de sódio sejam escassos, é consenso a necessidade de restrição do mineral. O objetivo é auxiliar no controle da hipertensão e na retenção hídrica. Os indivíduos podem diferir na sensibilidade ao sal. Porém, mesmo assim, a quantidade recomendada de sódio é de 1.000 a 2.300mg/dia, com ingestão máxima de 3.000mg/dia. O potássio não é normalmente restringido, até que haja perda significativa da função renal (taxa de filtração glomerular <10mL/minuto). Enquanto existe volume urinário médio de 1.000mL/ dia, e os pacientes recebem diuréticos, o potássio não necessita de restrição. Entretanto, alguns medicamentos antihipertensivos, como os inibidores da enzima conversora, podem elevar precocemente os níveis séricos do potássio. Isso indicará a restrição alimentar do mineral. O aumento persistente do potássio sérico do paciente que recebe dieta hipoprotéica e restrita no mineral é indicação para o início da diálise. Os líquidos também não necessitam de restrição na dieta, até que ocorra perda significativa da função renal (ex.: taxa de filtração glomerular <10mL/minuto). O monitoramento cuidadoso do peso corporal e do volume de excreção urinária auxilia no manejo hídrico. Cálcio, Fósforo e Vitamina D A absorção intestinal de cálcio diminui no curso da progressão da DRC, devido à redução da quantidade de vitamina D ativada pelos rins. As dietas pobres em fósforo são, geralmente, deficientes em cálcio. Portanto, pode ser necessária a suplementação do cálcio, assim como da vitamina D ativa. Porém, as quantidades recomendadas são baseadas mais em consensos do que em estudos controlados. Pelo fato de os níveis elevados de fósforo estarem ligados à progressão da DRC, assim como ao desenvolvimento do hiperparatireoidismo secundário, é importante o controle da ingestão do mineral. A quantidade de 5-10mg/kg/dia de fósforo na dieta seria o ideal. As dietas hipoprotéicas, automaticamente, já são pobres em fósforo. Porém, somente as dietas muito pobres em proteínas e com suplementação de aminoácidos essenciais ou cetoácidos possibilitariam o alcance da quantidade ideal de fósforo. A restrição em torno de 10 a 12mg/kg/dia, ou em torno de 800mg/dia, é mais fácil de ser alcançada. Conforme a DRC progride, além da restrição alimentar, pode ser necessária a utilização de quelantes de fósforo para manter os níveis séricos adequados. Outras Vitaminas e Minerais Os requerimentos de vitaminas e de minerais da fase não dialítica da DRC ainda não estão bem definidos. Em geral, as recomendações de vitaminas hidrossolúveis e de oligoelementos são semelhantes aquelas da população em geral. Parece haver evidência de deficiência de piridoxina. Porém, se a suplementação dela é necessária, e em qual quantidade, é assunto ainda não completamente esclarecido. As reservas de vitamina A estão aparentemente aumentadas já nessa fase da DRC. Portanto, a sua suplementação deve ser evitada. A suplementação de ferro é necessária para a maioria dos pacientes, especialmente em conjunto com a terapia com eritropoietina. O Quadro 1 mostra as principais recomendações de nutrientes para a fase não dialítica da DRC. 10 Quadro 1 Recomendações diárias de nutrientes para pacientes na fase não-dialítica da doença renal crônica Energia (kcal/kg de peso atual ou ideal, em caso de obesidade ou muito baixo peso) 30 a 35 Proteínas (g/kg de peso atual) 0,6-0,8 Fósforo (mg) Em torno de 800, ou 10 a 12mg/kg Cálcio (mg) 1.000-1.200 - Individualizado para cálcio, fósforo e PTH séricos Sódio (mg) 1.000 a 2.300 Potássio (mg) Individualizado; geralmente não restringido, ou restrição de 1.000-3.000 HEMODIÁLISE Energia Estudos com calorimetria indireta mostram que pacientes em hemodiálise (HD), pareados por sexo e idade, não apresentam gasto energético de repouso maior que os indivíduos normais (24, 25). Embora o gasto energético aumente durante e até duas horas após o procedimento dialítico (26, 27), o estilo de vida sedentário e a ingestão alimentar baixa possivelmente contrabalanceiam a demanda calórica total. Um estudo mostrou que pacientes em HD, assim como em diálise peritoneal (DP), apresentam gasto energético maior que na fase não dialítica (4). Esse estudo, entretanto, não comparou o gasto energético com indivíduos saudáveis. A conclusão, então, parece ser que os indivíduos na fase não dialítica da DRC gastam menos do que o normal. De maneira geral, 32 a 39kcal/kg/ dia, com média de 35kcal/kg/dia, são recomendadas para manutenção do peso e do balanço nitrogenado neutro de indivíduos clinicamente estáveis em HD, sedentários ou com atividade física leve. Proteínas Em virtude da perda de aminoácidos que ocorre durante o procedimento dialítico, da limitação na síntese e do maior catabolismo protéico muscular, a necessidade de proteína é superior a de indivíduos saudáveis (28, 29). Na uremia, tipicamente, são encontradas concentrações plasmáticas e musculares baixas de alguns aminoácidos essenciais. E elevadas de vários não essenciais. As causas para esses distúrbios não estão totalmente esclarecidas. A desnutrição pode ser um fator contribuinte. Ou mesmo ela pode ocorrer devido ao metabolismo alterado dos aminoácidos não essenciais. Um fato importante é que os rins têm papel significativo na síntese, degradação e excreção de aminoácidos. O excesso de toxinas urêmicas, por outro lado, pode influenciar o complexo enzimático envolvido no metabolismo e transporte de aminoácidos específicos. O catabolismo protéico pode estar aumentado devido ao processo inflamatório crônico e à acidose metabólica. Embora controverso, a correção da acidose metabólica com a suplementação oral de bicarbonato de sódio (1 a 4g/dia) melhorou as concentrações séricas da albumina de pacientes não inflamados em HD (30). Em inflamados, a correção da acidose não foi suficiente para melhorar a albumina. A suplementação com bicarbonato de sódio não afetou o ganho de peso interdialítico, o sódio plasmático ou a pressão arterial. Sem dúvidas, o maior avanço para a melhora do padrão de aminoácidos plasmáticos de pacientesem HD foi a possibilidade de uso da eritropoietina. Nesse caso, há aumento do suprimento de oxigênio a diferentes tecidos, como músculos e cérebro. Pode, também, ser resultado da melhora da ingestão alimentar, secundária ao aumento do apetite e bem-estar observados (31). A recomendação protéica em HD é de 1,0 a 1,2g/ kg/dia (alguns autores recomendam até 1,4g/kg/dia). A necessidade de proteína pode ser mais elevada, dependendo do nível de estresse e das alterações metabólicas. A uréia sanguínea possui relação direta com a ingestão protéica ou com a quebra endógena de proteínas (catabolismo). Ou com ambos. O cálculo da PNA, a partir da geração da uréia, pode ser utilizada para determinar as necessidades protéicas em pacientes estáveis. É bem reconhecido que os pacientes em diálise apresentam deficiência de carnitina e necessidade de suplementação (32). A perda durante o procedimento dialítico é a principal causa do problema. A consequência da deficiência da carnitina é a alteração no metabolismo dos lipídios (elevação dos níveis séricos de triglicerídeos), entre outras. Carboidratos e Lipídios A ingestão equilibrada de carboidratos e de lipídios 11 Terapia Nutricional do Paciente Renal Crônico e Agudo é necessária para suprir a necessidade calórica total. Caso contrário, as proteínas ingeridas são utilizadas como fonte energética. Para pacientes com níveis elevados de triglicerídeos séricos, recomenda-se redução da ingestão de carboidratos e aumento dos lipídios. Em caso de nível elevado de colesterol sérico, recomenda-se redução da ingestão de lipídios saturados e de colesterol. Porém, essas são recomendações baseadas em estudos de indivíduos hiperlipidêmicos, não de nefropatas. A evidência do papel da dieta na melhora dos níveis dislipidêmicos em HD ainda não está clara. Kutner et al examinaram os hábitos alimentares de 216 pacientes em HD durante três anos (33). Os resultados mostraram que os pacientes que ingeriam peixe pelo menos uma vez a cada três dias tiveram menor probabilidade de morte, comparados com aqueles que não o comiam. Além disso, os pacientes que consumiam peixe regularmente apresentaram melhores concentrações de albumina sérica. A neuropatia é uma complicação comum da DRC, e parece afetar principalmente a parte inferior do corpo (34, 35). Com isso, muitos pacientes podem desenvolver tanto a obstipação intestinal como a diarréia. A obstipação pode acometer 8% a 57% dos pacientes em diálise (36). Por outro lado, principalmente os diabéticos estão predispostos a desenvolver períodos de diarréia. A mistura de fibras solúveis e insolúveis tem o objetivo de regularizar a função intestinal dos pacientes em diálise. Entretanto, atenção especial deve ser dada ao conteúdo de potássio e de fósforo dos alimentos e dos suplementos contendo fibras. Também, com o maior aporte de fibras, é recomendado o aumento na ingestão hídrica, que pode ser problemática para esses pacientes. Sódio, Potássio e Líquidos As recomendações de sódio e de potássio são individualizadas, dependendo do volume e perdas urinárias. Para o sódio, a ingestão recomendada é de até 2.300mg/dia, ou 6g de sal/dia (29). Para o potássio, a recomendação diária varia de 1 a 3g. Como a desnutrição é um grande risco, aqueles pacientes sem manifestações clínicas de sobrecarga hídrica e com ingestão calórica baixa podem ser orientados para o consumo normal de sódio. O melhor momento para a ingestão normal de sódio é a refeição anterior à sessão de diálise, sete a nove horas antes. Pacientes com volume urinário igual ou maior que 1.000mL/dia, em geral, não necessitam de restrição de potássio na dieta. Porém, a necessidade depende da monitorização dos níveis sanguíneos do mineral. Também para a recomendação da ingestão de líquidos, o volume de excreção urinária é um bom guia. Além disso, depende do ganho de peso interdialítico. A porcentagem de aumento relativa ao peso seco é o melhor indicador para o ganho interdialítico, pois considera as diferenças individuais da estrutura física. Em nossa experiência, o aumento de 2 a 4,5% do peso seco entre hemodiálises é seguro para a maioria dos pacientes. Cálcio, Fósforo e Vitamina D A recomendação de cálcio é em torno de 1.000mg por dia. Esse mineral pode requerer suplementação devido à absorção intestinal diminuída. Entretanto, a deposição de fosfato de cálcio nas artérias dos pacientes em diálise é um risco para complicações e morte cardiovascular (37). Então, a suplementação de cálcio deve ser cuidadosa para evitar elevações indesejadas de seus níveis sanguíneos. Por outro lado, a ingestão de fósforo deve ser restringida. O ideal seria a restrição de, no máximo, 800mg ao dia. Porém, como as proteínas devem ser ingeridas em quantidades elevadas, torna-se impossível a restrição grande de fósforo na dieta. Portanto, a ingestão recomendada de fósforo é em torno de 800 a 1.200mg por dia. Pelo fato de o controle de fósforo sérico não ser possível somente com a dieta, o uso de quelantes é, geralmente, indicada. Esses se ligam ao fósforo da dieta e são excretados via intestinal. É importante lembrar, também, que as doses de quelantes prescritos devem ser de acordo com a quantidade de fósforo presente na refeição. A vitamina D pode ser recomendada na forma ativa (1,25-diidroxicolecalciferol) ou não (25-hidroxivitamina D). O objetivo é aumentar a absorção intestinal do cálcio, prevenir e tratar o hipertireoidismo e melhorar o metabolismo ósseo. A quantidade recomendada é individualizada, e dependente dos níveis sanguíneos de cálcio, fósforo e PTH. A suplementação da vitamina D, quando indicada, é de 0,25 a 1,0mg/dia. Outras Vitaminas e Minerais Exceto para a vitamina D, as demais lipossolúveis usualmente não exigem suplementação. As vitaminas hidrossolúveis, por outro lado, são perdidas durante a diálise, além de a ingestão alimentar poder estar diminuída. A suplementação é usualmente recomendada, principalmente do complexo B 12 (ácido fólico e piridoxina) e da vitamina C. Um fato relacionado à deficiência de vitaminas hidrossolúveis é a aterosclerose, comum causa de morte de pacientes em diálise. A homocisteína é um potente agente aterosclerótico, e suas concentrações sanguíneas estão geralmente elevadas em pacientes renais crônicos (38). A hiperhomocisteinemia está correlacionada com doença vascular precoce. E as vitaminas B12, B6 e o ácido fólico funcionam como cofatores nas reações enzimáticas do metabolismo da homocisteína. Em doses farmacológicas, a suplementação diária dessas vitaminas (ácido fólico=5mg, vitamina B6=50mg, vitamina B12=500mcg) reduz as concentrações plasmáticas de homocisteína em indivíduos com DRC (39), embora os níveis não alcancem a normalidade. Investigações atuais indicam que a correção da síndrome da desnutrição, inflamação e aterosclerose na DRC é complicada, e intervenções podem exigir abordagens múltiplas e a longo prazo. A terapia com micronutrientes tem sido explorada para a possibilidade de melhorar o processo inflamatório crônico de pacientes em HD. A vitamina C, a vitamina E e o selênio funcionam sinergicamente como antioxidantes. E a suplementação pode ser benéfica. Doses terapêuticas de vitamina E, entre 300 a 700UI/dia, parecem seguras, e poderiam prevenir complicações relacionadas ao estresse oxidativo (40). Para a vitamina C, 50mg/dia parece ser seguro. Entretanto, o ácido ascórbico pode, parcialmente, ser quebrado em oxalato e elevar os níveis plasmáticos. Para o selênio, embora a dose ideal não tenha, ainda, sido estabelecida, 20 a 70mcg/dia pode ser suplementada por três a seis meses, em caso de presença de sintomas de deficiência. Carnes e pães podem ser boas fontes de selênio. A deficiência do zinco pode, também, comprometero sistema imunológico e predispor os pacientes em diálise ao estresse oxidativo e à inflamação. Embora não estabelecida, a dose de até 50mg/dia de suplementação pode ser indicada por três a seis meses para pacientes em HD com sintomas de deficiência de zinco (29). Em relação ao ferro, a recomendação de suplementação varia de acordo com o uso da eritropoietina. Os pacientes que recebem a eritropoietina normalmente necessitam da suplementação rotineira de ferro. O Quadro 2 apresenta as principais recomendações de nutrientes para pacientes em HD. DIÁLISE PERITONEAL Energia As necessidades energéticas de pacientes em DP não têm sido sistematicamente avaliadas. Um estudo pequeno demonstrou não haver diferença no gasto energético entre indivíduos saudáveis e aqueles em DP (41). Em outro estudo, não houve diferença no gasto energético entre DP e HD (4). Em geral, a recomendação calórica usual total, incluindo a dieta e o dialisato, é de 30-35kcal/kg/dia (42). A recomendação calórica deve considerar a absorção constante de glicose do dialisado. Em geral, a quantidade de glicose absorvida é em torno de 20% a 30% da ingestão calórica usual do indivíduo (42, 43). Normalmente, em pacientes com capacidade de transporte peritoneal adequado, aproximadamente 60% da glicose do dialisato são absorvidos (44). Os sinais circulantes, como os níveis de leptina e de insulina, regulam o balanço energético. Os peptídeos cerebrais, como o neuropeptídeo Y (NPY), liberado das terminações nervosas do hipotálamo, são responsáveis pelas variações no comportamento alimentar e no gasto energético. A leptina é um peptídeo identificado como produto do gene ob, isolado no rato obese (45). Ela é produzida pelas células adiposas, e o seu sítio de ação é, predominantemente, o centro do apetite, no hipotálamo. Porém, foram identificados receptores no pâncreas, fígado e rim. A leptina funciona como inibidor da ingestão alimentar. Já o NPY é estimulante. Portanto, uma das Quadro 2 Recomendações diárias de nutrientes para pacientes em hemodiálise (28, 29) Energia (kcal/kg de peso atual ou ideal, em caso de obesidade ou muito baixo peso) 30 a 35 Proteínas (g/kg de peso atual) 1,0 a 1,2 Fósforo (mg) 800-1.000, ou ≤17mg/kg Cálcio (mg)a <1000 Sódio (mg) 1.000 a 2.300 Potássio (mg) 1.000-3.000, ou 40mg/kg de peso atual Ferro (mg)a Homens: 8; Mulheres: 15 Líquidos 500-750mL + volume urinário de 24h (750-1.000mL, se anúria) a Avaliar a necessidade de suplementação 13 Terapia Nutricional do Paciente Renal Crônico e Agudo funções normais da leptina é inibir a produção e a liberação do NPY no hipotálamo. De acordo com essa proposição, alguns indivíduos podem ter deficiência de produção ou resistência, como consequência de defeito no receptor, à leptina. Isso contribui para o desenvolvimento da obesidade. As concentrações séricas de leptina possuem correlação positiva com gordura corporal. E estão elevadas na obesidade (46). Estudos em ratos obesos mostraram que a administração da leptina recombinante reduziu dramaticamente a ingestão alimentar, pelo mecanismo da saciedade. A infusão aumentou o gasto energético. Porém, quando administrada em humanos, esses efeitos não foram reproduzidos. A insulina também é um hormônio que participa da regulação da adiposidade corporal. Aparentemente, a insulina é secretada pelo pâncreas em proporção à adiposidade, e fornece feedback ao cérebro de maneira análoga à leptina (47). Os receptores da insulina estão concentrados em áreas cerebrais envolvidas no controle da ingestão alimentar, similar à leptina. Então, a insulina age, em parte, inibindo a ação e/ou liberação do NPY do hipotálamo. Portanto, a deficiência de insulina, assim como a de leptina, pode conduzir ao aumento da ingestão alimentar. Na DP, um estudo mostrou níveis significativamente elevados de leptina sérica, comparados com indivíduos com função renal normal (48). Os níveis de leptina em ambos os grupos apresentaram correlação positiva com o IMC e com a porcentagem de gordura corporal. Não foi demonstrada correlação entre os níveis de leptina e a ingestão calórico-protéica dos indivíduos, ou níveis séricos de albumina, pré-albumina, proteína-C reativa, glicemia e IGF-1. Nesse estudo, foi, também, observado que a quantidade de leptina perdida no dialisato é muito pequena. A melhor explicação para a hiperleptinemia dos pacientes em DP é o seu clearance reduzido, pois ela não é excretada pelo procedimento dialítico da mesma forma que é, normalmente, pelos rins. Outro fator adicional pode ser que a hiperinsulinemia e a resistência periférica à insulina, comuns nos pacientes em DP, também interfiram no balanço energético dos pacientes. A hiperinsulinemia é, em parte, devida à absorção constante de glicose pelo dialisato. Outra hipótese é que a hiperleptinemia dos pacientes urêmicos reflete a resposta inflamatória crônica. Isso porque as endotoxinas, e certas citocinas, estimulam os níveis de leptina e conduzem à anorexia. Essas evidências, entretanto, não têm sido comprovadas pela maioria dos estudos. Proteínas A recomendação para manter o balanço protéico de pacientes estáveis é de, pelo menos, 1,2g/kg/dia. A ingestão de 1,3g/kg/dia aumenta a probabilidade de manutenção do estado nutricional adequado (42, 49, 50). Em caso de peritonite, é recomendado um adicional de proteínas. Isso deve-se ao aumento da permeabilidade da membrana peritoneal, que eleva a perdas e o catabolismo protéico (51). Pelo menos 50% do aporte de proteínas deve ser de alto valor biológico. As perdas protéicas são grandes em DP, e podem variar até 10 vezes entre pacientes. Porém, parecem estáveis para um mesmo indivíduo (52). Durante o programa usual de CAPD, as perdas protéicas diárias variam de 5 a 15g, com diferenças individuais. Dentro das proteínas perdidas no dialisato, 50% a 80% é albumina (53). A quantidade de proteína perdida varia de acordo com a permeabilidade da membrana peritoneal às macromoléculas. Esse fato nem sempre acompanha a permeabilidade da membrana às moléculas pequenas, já que a passagem de proteínas se dá pelos poros grandes, independente dos pequenos. Alguns dos aspectos relacionados à perda protéica no dialisato são: frequência das trocas, duração da diálise, composição e tonicidade do dialisato, área de superfície corporal do paciente, concentração protéica sérica e episódios recentes de peritonite. A perda de albumina no dialisato está diretamente relacionada às características de transporte da membrana peritoneal. Aqueles pacientes do grupo alto transportador possuem perdas maiores e níveis séricos mais baixos de albumina. A perda mais rápida de proteínas parece ocorrer nas primeiras duas horas de troca (52). E a quantidade total perdida aumenta com trocas de mais longa duração. As perdas protéicas na APD parecem ser semelhantes às da CAPD, exceto pela diferença potencial na saída de proteínas de alto peso molecular (54). As perdas protéicas são maiores em diabéticos. Também, as crianças perdem mais por quilograma de peso do que os adultos. Isso pode ser, possivelmente, atribuído à maior área de superfície corporal para o peso, apresentada pelas crianças. Durante um episódio de peritonite, as perdas protéicas podem aumentar consideravelmente em 50 a 100% (52). E permanecerem aumentadas por várias semanas. A peritonite também está associada à redução do apetite e ao aumento do catabolismo corporal, devido à infecção e à dor que ocorre durante o episódio. Além das proteínas, as perdas de aminoácidos 14 são substanciais na DP. Aproximadamente 30% dos aminoácidos perdidos no dialisato são essenciais. O peso molecular dos aminoácidos é similar ao da creatinina, e a perda é afetada pela sua concentração plasmática e pelo volume das trocas(55). Devido às perdas constantes de proteínas e de aminoácidos no dialisato, a ingestão alimentar adequada é essencial para pacientes em DP. Porém, parece que nem todos necessitam de 1,2-1,3g/kg/dia de proteínas. O balanço nitrogenado positivo pode ser encontrado com a ingestão protéica em torno de 0,7g/kg/dia (56). A necessidade mais baixa pode ser dependente da ingestão calórica, do tipo de proteína ingerida e da massa muscular (57). A qualidade da proteína pode, também, ser importante. Por outro lado, as necessidades protéicas podem ser mais altas, dependendo do nível de estresse e do aumento das necessidades metabólicas. Carboidratos e Lipídios A ingestão oral de carboidratos deve ser, predominantemente, de complexos. O ideal é prover, aproximadamente, 35% do total das quilocalorias estimadas para o dia. Isso devido à absorção constante de glicose pelo dialisado. Essa recomendação, entretanto, é difícil de ser seguida pela maioria dos pacientes. Para facilitar, é normalmente recomendada a restrição de doces concentrados e o uso de adoçante artificial, ao invés da sacarose. Alternativas de substituição da glicose no dialisato, disponíveis em outros países, mas ainda não no Brasil, são a icodextrina e as soluções contendo aminoácidos. Essas podem ser úteis no controle do peso, na hipertrigliceridemia, na hiperglicemia, na hiperinsulinemia, entre outros. A prevalência de anormalidades lipídicas nos pacientes em DP, incluindo a hipertrigliceridemia, é alta. Para aqueles que apresentam níveis elevados de triglicerídeos séricos, é recomendada a redução da ingestão de carboidratos e o aumento do aporte de lipídios. De maneira geral, é recomendado 30-35% do total das quilocalorias na forma de lipídios, com preferência aos mono e polinsaturados. No caso de nível elevado de colesterol sérico, é indicada a redução da ingestão de lipídios saturados, principalmente, e de colesterol. Essa restrição pode ser difícil de ser alcançada, pois muitos alimentos ricos em gorduras, como as carnes, são excelentes fontes protéicas de alto valor biológico. Fibras A obstipação em DP pode levar ao aumento do desconforto abdominal. O problema é, frequentemente, causado pela baixa ingestão de fibras na dieta, pouca atividade física, suplementação oral de ferro e uso de quelantes de fósforo. A recomendação diária de fibras é 20-25g. O estímulo da atividade física é essencial para aliviar a obstipação desses pacientes, além de ter outros benefícios. Sódio, Potássio e Líquidos O balanço de sódio e de líquido, e a pressão arterial são problemáticos em DP. Para a ingestão de sódio, cada paciente deve ser avaliado individualmente, considerando parâmetros como peso, pressão arterial, respiração curta e edema. Em caso de ganho excessivo de peso líquido ou de hipertrigliceridemia, a restrição de sódio na dieta é indicada com o objetivo de evitar aumento do número de trocas com altas concentrações de glicose. Havendo controle na ingestão alimentar de sódio, não há necessidade de restrição grande de líquidos. A hipocalemia é comum em pacientes em DP, e pode trazer sintomas como câimbras e arritmias cardíacas. Nesse caso, o paciente deve ser encorajado a aumentar a ingestão de potássio na dieta. Já na hipercalemia, faz-se necessária melhor investigação da adequação da diálise. E, enquanto os problemas não se resolvem, a restrição de potássio na dieta pode ser necessária. Deve ser verificado, também, o uso de beta-bloqueadores e inibidores da enzima de conversão, para o manejo da hipertensão arterial. Esses podem elevar os níveis sanguíneos de potássio. Os líquidos não são, em geral, restringidos na DP. Porém, os pacientes devem ser monitorizados para o peso e a pressão arterial. Fósforo, Cálcio e Vitamina D Na DP, existe remoção substancial de fósforo. Porém, não o suficiente para prevenir o uso de quelantes. O fósforo da dieta, em geral, necessita de restrição. Mas, devido às necessidades elevadas de proteínas, é difícil a restrição de menos de 1.000- 1.200mg por dia. A dose prescrita de quelante de fósforo deve estar de acordo com a quantidade do mineral presente em cada refeição. Existe fluxo de cálcio na membrana peritoneal, que depende da concentração sérica dele ionizado. Há evidência de que o balanço positivo do cálcio pode 15 Terapia Nutricional do Paciente Renal Crônico e Agudo suprimir a secreção do PTH e causar a doença óssea adinâmica. O líquido de diálise contém cálcio. E, para possibilitar o menor aporte, estão disponíveis no mercado soluções de diálise com concentrações mais baixas de cálcio (2,5mEq/L). Portanto, essas soluções são indicadas em caso de necessidade de restrição do mineral. A recomendação para a ingestão oral de cálcio é em torno de 1.000mg por dia. Mas essa quantidade inclui a dieta e o teor absorvido com o uso de quelantes de fósforo a base de cálcio. A vitamina D tem indicação individualizada, e é suplementada de acordo com os níveis sanguíneos de cálcio, fósforo e PTH (58), da mesma forma que em pacientes em HD. Outras Vitaminas e Minerais As vitaminas A e E, usualmente, não exigem suplementação. A vitamina K é recomendada quando o paciente não está se alimentando de maneira suficiente e está em uso prolongado de antibióticos. As vitaminas hidrossolúveis são perdidas na DP. Outros fatores importantes para a deficiência são a ingestão baixa, o metabolismo alterado e a interação com medicamentos. A recomendação é individualizada e depende da avaliação nutricional completa e periódica. A depleção vitamínica é mais provável em pacientes com episódios frequentes de peritonite, quando a perda no dialisato é maior, e a ingestão está usualmente inadequada. A piridoxina, o ácido fólico e o ácido ascórbico são, provavelmente, as únicas vitaminas que necessitam ser suplementadas rotineiramente (43, 59). A menos que haja evidência de sobrecarga de ferro, os pacientes em DP necessitam de suplementação do mineral. Isso é feito, usualmente, na forma de sulfato ferroso. O mineral pode ser administrado, também, parenteral e de maneira intermitente, quando o suplemento oral não for bem tolerado ou absorvido via enteral. A indicação para a suplementação do ferro varia de acordo com o uso ou não da eritropoietina, e depende da avaliação de suas reservas corporais. Essas são melhor avaliadas pelos níveis de ferritina sérica. O Quadro 3 apresenta recomendações de nutrientes para pacientes em DP. TRANSPLANTE RENAL O manejo nutricional do paciente transplantado renal é dividido em pré-transplante, período de recuperação da cirurgia (pós-transplante imediato) e pós-transplante tardio. O período pré-transplante inclui pacientes na fase não dialítica da DRC. Mas, principalmente, aqueles em diálise. O período pós-transplante imediato, que compreende as primeiras quatro semanas após a cirurgia, pode ter o rim enxertado funcionante ou não. Nessa fase, alguns pacientes podem ser mantidos em diálise por vários dias ou mesmo semanas. A longo prazo, o cuidado nutricional é importante para prevenir a obesidade, a resistência insulínica, o diabetes, a hiperlipidemia e a hipertensão. A dieta, os exercícios físicos e as modificações no estilo de vida são os principais cuidados na prevenção e tratamento dessas condições. Outros problemas que podem se beneficiar dos cuidados na dieta pós-transplante incluem a hipomagnesemia, a hipofosfatemia, a hiperuricemia, a hipercalemia, a hiperhomocisteinemia, a anemia e a doença óssea renal. E a rejeição crônica do enxerto. Energia O gasto energético de pacientes submetidos ao transplante (tx) renal ainda não foi estabelecido. Estudo em nosso centro (Serviço de Nefrologia do Hospital Evangélico de Curitiba) avaliou o gasto energético de repouso (GER) pela calorimetriaindireta (Delta Trek, USA) durante o primeiro mês pós-tx renal. Nossos resultados em sete transplantados, comparados com indivíduos saudáveis, demonstraram diferença no GER entre os grupos. Pacientes transplantados apresentaram GER médio de 27,6±2,5kcal/kg versus 23,7±2,7kcal/kg no grupo controle. Essa diferença tendeu a diminuir a partir do quinto dia pós-tx. Nossas conclusões foram de que esses pacientes gastam em torno de 33-35kcal/kg/dia no pós-tx imediato, e menos Quadro 3 Recomendações diárias de nutrientes para pacientes em diálise peritoneal (28, 29) Energia (kcal/kg de peso atual ou ideal, em caso de obesidade ou muito baixo peso) 30-35 (dieta + dialisato) Proteínas (g/kg de peso atual) 1,2 a 1,3 Carboidratos Em torno de 35 (dieta) Sódio (mg) 1.000-4.000 Fósforo (mg) 1.000-1.200, ou ≤17mg/kg Cálcio (mg)a <1.000 Ferro (mg)a Homens: 8; Mulheres: 15 a Avaliar a necessidade de suplementação 16 no pós-tx tardio, aproximadamente 25-30kcal/kg/dia. Outro estudo em nosso centro, com 142 pacientes, coletou dados retrospectivos do período imediato até quatro anos pós-tx. Os resultados confirmaram o aumento significativo do peso até o primeiro ano pós-tx e, então, a estabilização. Foi observado, em nossa população, que o ganho de peso não levou à obesidade significativa. A conclusão é de que o peso pré-tx influencia na magnitude do ganho pós-tx. Isso confirma resultados de outro estudo (60). Portanto, a recomendação calórica é estabelecida para manter ou alcançar o peso adequado. E determinada pelo ganho ou perda ponderal. Pacientes obesos, ou em risco de obesidade, devem iniciar um programa de controle ou redução de peso. Este deve ser baseado em restrição calórica, com aproximadamente 20-25kcal/kg/dia, em aumento da atividade física, em mudanças no comportamento alimentar e em apoio psicológico. Por outro lado, a presença de febre, infecção ou estresse indica a necessidade de aumento do aporte calórico, sendo recomendadas em torno de 35-45kcal/kg/dia. Proteínas No pós-tx imediato e na rejeição aguda, a recomendação protéica é de 1,3-1,5g/kg para o peso atual, por dia. Estes níveis parecem suficientes, também, para aqueles pacientes que continuam necessitando de HD ou DP após o tx. A ingestão protéica somente deve ser restringida na presença de necrose tubular aguda com sintomas urêmicos associados, ou no evento de insuficiência renal. Em caso de rejeição aguda, altas doses de esteróides produzem aumento na taxa de catabolismo protéico. Com a elevação dos níveis sanguíneos de uréia e de creatinina, o pensamento lógico seria restringir a ingestão protéica. Entretanto, nesse caso, a restrição protéica poderia conduzir ao catabolismo intenso. Então, ao contrário, é recomendada a dieta hiperprotéica. Para o período pós-tx tardio, um estudo prospectivo, com acompanhamento de 14 anos, mostrou que a ingestão protéica média diária de 0,8g/ kg e a restrição de 3g de sódio mantiveram a função renal dos pacientes (61). Esse nível de ingestão foi comparado com a média de 1,4g/kg de proteína e 5g de sódio por dia. Aqueles pacientes com ingestão mais elevada de proteínas e de sódio apresentaram perda de mais de 40% da função renal no tempo do estudo. A indicação de maior restrição protéica, como 0,6g/kg/dia, é considerada para aqueles com função renal anormal. Ou seja, na rejeição crônica. Isso se o aporte calórico estiver adequado, ou maior que 25kcal/kg/dia. Essa prescrição tem o objetivo de minimizar a proteinúria e controlar a taxa de filtração glomerular (62). Entretanto, para essa indicação, o estado nutricional dos pacientes deve ser rigorosamente monitorizado. Carboidratos e Lipídios No pós-tx imediato e tardio, os carboidratos são recomendados em torno de 50% do total de quilocalorias. As fontes de carboidratos simples devem ser controladas, pois podem contribuir para a hiperglicemia e a hipertrigliceridemia. Os carboidratos complexos são preferidos. A prevalência de dislipidemia na população de transplantados renais é alta (63). A hipercolesterolemia pós-tx é um grande fator de risco para o desenvolvimento de complicações cardiovasculares. As concentrações séricas de colesterol aumentam imediatamente após o tx e, frequentemente, são acompanhadas por níveis baixos de HDL e altos de triglicerídeos. A maioria dessa população experimenta a hipertrigliceridemia e a hipercolesterolemia, isoladas ou combinadas. O ganho de peso é um forte contribuinte para a dislipidemia de pacientes que recebem imunossupressão. A modificação da dieta é a intervenção inicial para esses indivíduos. Não relacionada à causa, a hiperlipidemia associada ao tx é, frequentemente, amenizada pela terapia nutricional (64). A redução significativa do peso pode melhorar as concentrações de triglicerídeos e de colesterol (65). O uso de agentes farmacológicos para a redução do colesterol está, normalmente, associado a efeitos adversos. É, então, mais apropriado permitir um teste de aproximadamente três meses somente com a dietoterapia, antes de indicar o uso desses medicamentos. No pós-tx imediato, a quantidade e a composição dos lipídios, provavelmente, não afetam os resultados. Nesse período, é recomendado 30- 35% do total de quilocalorias na forma de lipídios. Já na rejeição crônica, a hiperlipidemia é um achado comum. Pacientes com rejeição vascular crônica apresentam distúrbios nas lipoproteínas, quando comparados aqueles com função normal do enxerto (66). Dessa forma, o controle da hiperlipidemia parece ter papel crucial na progressão da doença. 17 Terapia Nutricional do Paciente Renal Crônico e Agudo Sódio e Potássio Conforme já apresentado, o sódio da dieta deve ser limitado em até 3g/dia, mesmo para indivíduos não hipertensos (61). Em caso de hipertensão ou retenção hídrica, o mineral pode ter indicação de ser mais restrito, entre 1-2g/dia. O uso da ciclosporina está associado com incidência substancial de hipercalemia, aparentemente causada por supressão de níveis de renina e de aldosterona. Isso é mais frequentemente observado no período pós-tx imediato, quando as doses de ciclosporina são mais altas. O tratamento da hipertensão com agentes beta- bloqueadores ou inibidores da enzima de conversão podem, também, exacerbar a hipercalemia. Com isso, pode ser recomendada a restrição alimentar de potássio (1-2g/dia). Cálcio, Fósforo e Vitamina D O metabolismo do cálcio, do fósforo e da vitamina D é influenciado por vários fatores interligados. Esses resultam do período prévio da insuficiência renal, da terapia imunossupressora e da restauração incompleta da função renal pelo tx. O hiperparatireoidismo e a doença óssea podem persistir mesmo após a restauração da função renal. Exceto em caso de preexistência de hipercalcemia ou de elevação do fósforo sérico, o cálcio é recomendado em 1.200-1.500mg/dia. Quando a ingestão pela dieta não alcança os níveis recomendados, o uso de suplemento de cálcio é indicado. Já a recomendação da ingestão diária de fósforo é individualizada, de acordo com os níveis séricos do paciente. A recomendação é 1.200-1.500mg/dia. Em caso de hipofosfatemia, alguns pacientes podem, até mesmo, necessitar de suplementação de fosfato. Na rejeição crônica, a restrição de fósforo, de aproximadamente 800mg/dia, é prudente quando a taxa de filtração glomerular estiver menor que 50mL/minuto. A terapia com quelantes de fósforo pode, também, ser necessária nessa fase. Em caso de hipocalcemia persistente, a suplementação com a vitamina D deve ser considerada. Porém, é importante tomar cuidado para que a hipercalcemia não seja promovida. Outras Vitaminas e Minerais Em geral, pacientes com tx renal bem-sucedido não exigem suplementos vitamínicos, embora o assunto ainda não tenha sido bem estudado.Caso o paciente continue temporariamente em HD ou DP, é importante manter a reposição das vitaminas hidrossolúveis. Já aqueles com rejeição crônica e em dieta hipoprotéica necessitam de suplemento multivitamínico rotineiro. O Quadro 4 apresenta as recomendações de nutrientes para pacientes pós-tx renal. INJÚRIA RENAL AGUDA Pacientes com injúria renal aguda (IRA) representam um grupo extremamente heterogêneo, com necessidades nutricionais diversificadas. Por exemplo, a IRA pode ocorrer em situações não hipercatabólicas, como picada de cobra ou de insetos, obstrução do trato urinário, uso de contraste radiológico ou por drogas nefrotóxicas. Mas, a IRA pode ser consequência, também, de uma enfermidade de base grave, como grandes queimaduras, cirurgias complicadas, septicemia e choque cardiogênico. Além disso, as necessidades nutricionais variam de acordo com o tempo e fase da doença de base e da IRA. Portanto, as necessidades nutricionais têm diferenças significativas entre pacientes, ou de um dia para outro, num mesmo indivíduo. Os principais fatores que determinam o desfecho clínico e as recomendações, além da presença da IRA, é o grau de catabolismo, o tipo e a gravidade da doença de base, o estado nutricional prévio e atual, e a necessidade, tipo, frequência e duração da terapia de reposição renal. Infelizmente, devido à heterogeneidade da população, à gravidade, à alta taxa de mortalidade, Quadro 4 Recomendações diárias de nutrientes para transplantados renais Energia (kcal/kg de peso atual ou ideal, em caso de obesidade ou muito baixo peso) Imediato: 30-35; Tardio: 25-30 Proteínas (g/kg de peso atual) Imediato: 1,3 a 1,5; Tardio: 0,8 Carboidratos (% das kcal) Imediato: 40-50; Tardio: 50-60 Sódio (mg) 1.000-3.000 Fósforo (mg) 1.200-1.500 Cálcio (mg) <800-1.500 Ferro (mg) Individualizado para reservas corporais 18 à dificuldade de provisão adequada de nutrientes e à limitação na avaliação do estado nutricional, não existem estudos prospectivos, randomizados e controlados em relação ao aporte nutricional ideal para esses pacientes. Energia e Proteínas O gasto energético de pacientes com IRA tem sido pouco estudado. E parece depender, principalmente, da doença de base. A infecção pós-operatória, com subsequente insuficiência de múltiplos órgãos, pode conduzir a um estado extremamente hipermetabólico. A recomendação protéica do paciente com IRA também depende da natureza da doença de base, do grau de catabolismo e do uso de terapia de reposição renal. Porém, poucos dados estão disponíveis em relação ao aporte protéico ideal. Em estudo não-controlado, somente cerca de 1/3 dos pacientes sob terapia de reposição renal alcançaram balanço nitrogenado positivo com a ingestão protéica de 2,5g/kg/dia e 35kcal/kg/dia (67). Outro estudo mostrou que o balanço nitrogenado foi mais provável de ocorrer com ingestão acima de 2g/ kg/dia (68). Já uma investigação mostrou que os pacientes hipercatabólicos com IRA apresentaram maior déficit nitrogenado quando receberam menos que 1,0g/kg/dia de proteína, comparados aqueles com aporte maior (69). Um estudo mostrou a média da PNAn de 1,57g/kg/dia em 25 pacientes graves em IRA, que recebiam terapia de reposição renal contínua (70). Nenhum estudo avaliou a eficácia e a segurança de diferentes quantidades ofertadas de proteína e de energia. Com isso, ainda não há o estabelecimento claro do limites mínimos e máximos para a recomendação. O que parece, nesse momento, é que a necessidade protéica depende do aporte calórico. Porém, essa proporção ainda não está clara. O estudo de Macias et al (69), que avaliou pacientes com IRA em terapia de reposição renal contínua, encontrou balanço nitrogenado menos negativo com o aporte de 1,5g/kg/dia de proteína e cerca de 25kcal/kg/dia. O aumento do aporte calórico não foi associado com melhor balanço nitrogenado. Além disso, o aporte calórico elevado pode conduzir a maiores complicações metabólicas, como hiperglicemia, hipertrigliceridemia, maior produção de CO2 e sobrecarga hídrica (71). Carboidratos e Lipídios A glicose é a fonte energética preferida. Porém, na IRA hipercatabólica é comum a intolerância à glicose, resultando em hiperglicemia. Em muitos casos, o uso exógeno de insulina é indicado para controlar a glicemia. O clearance de triglicerídeos pode estar, também, significativamente alterado em pacientes com IRA (72). Mesmo a mistura de triglicerídeos de cadeia longa e média é menos tolerada em pacientes com IRA do que naqueles sem a enfermidade (73). Vitaminas, Minerais e Líquidos Em relação às vitaminas, não existem estudos controlados que definam as necessidades de indivíduos com IRA. Extrapolando do paciente renal crônico, a vitamina A, se suplementada, deve ser cuidadosamente monitorada, devido ao risco de toxicidade. O excesso de suplementação de vitamina C pode aumentar o risco de oxalose secundária (74). Portanto, até que estudos sejam realizados, a recomendação para a vitamina C é 60 a 100mg/dia. As demais vitaminas hidrossolúveis são recomendadas de acordo com as DRIs. Em um estudo, o cálcio e o magnésio foram significativamente perdidos durante a terapia de reposição renal contínua (75). Portanto, esses minerais podem necessitar de suplementação, de acordo com o monitoramento sérico. Já para o zinco, não houve perda significativa durante o procedimento (75). Mesmo assim, em caso de terapia de reposição renal contínua, autores recomendam pelo menos o dobro da DRI para o zinco, cobre, selênio e tiamina (76). A recomendação hídrica depende, principalmente, da fase da IRA e da presença de perdas, que podem ocorrer com a ultrafiltração contínua, diarréia, vômitos, drenos e fístulas. Em caso de anúria ou oligúria, a recomendação hídrica é de 500-750mL, mais o volume de diurese. O Quadro 5 apresenta resumo das recomendações de nutrientes para pacientes com IRA. 19 Terapia Nutricional do Paciente Renal Crônico e Agudo Quadro 5 Recomendações diárias de nutrientes para pacientes com injúria renal aguda Energia (kcal/kg de peso atual ou ideal, em caso de obesidade ou muito baixo peso) Estresse leve: 30-35 ? Estresse moderado: 25-30 ? Estresse grave: 20-25 ? Proteínas (g/kg de peso atual ou ideal) ou aminoácidos essenciais e não-essenciais Estresse leve: 0,6-1,0 ? Estresse moderado, com terapia de reposição renal: ? 1,0-1,5 Estresse grave, com terapia de reposição renal: 1,3- ? 1,8 Carboidratos (g/kg de peso atual ou ideal) 3-5 (máximo 7) ou 45%-60% Lipídios (g/kg de peso atual ou ideal) 0,8-1,2 ou 20% (sepse)-35% Líquido (mL) 500-750 + diurese de 24h + outras perdas (ex.: dreno, vômito, fístulas) TERAPIA NUTRICIONAL Para a terapia nutricional (TN) de pacientes com DRC e IRA, a via oral com modificações na dieta é a primeira indicação. O aconselhamento nutricional especializado, com orientações específicas para manter ou aumentar a ingestão alimentar, é a primeira conduta. No entanto, em caso de os marcadores nutricionais continuarem a piorar, e o aconselhamento intensivo não estar sendo capaz de manter o aporte alimentar adequado, a suplementação oral deve ser considerada (29, 59). Porém, na presença de sintomas, como anorexia, confusão mental, letargia e coma, que acompanham os pacientes graves, a via oral pode não ser viável. O próximo passo fisiológico é a alimentação via sonda. Em geral, os pacientes crônicos e estáveis, adultos, enquanto têm poder de tomar decisão, não aceitam a colocação de sonda para nutrição a longo prazo. Então, essa modalidade deve ficar reservada para aqueles graves ou inconscientes. A indicação depende, principalmente, da gravidade da condição clínica do paciente, do nível de desnutrição e da inadequação da ingestão alimentar (42). Caso o trato gastrintestinal não estejaviável, total ou parcialmente, a nutrição parenteral é indicada. Além do convencional, em acesso central ou periférico, parcial ou total, pacientes em diálise têm a possibilidade de receber modalidades especiais de nutrição parenteral. Em HD, a nutrição intradialítica é uma alternativa quando ocorre perda parcial da capacidade de absorção intestinal de nutrientes. Nesse caso, uma solução de nutrição parenteral é infundida durante o procedimento dialítico, três vezes por semana. Na DP, o uso de dialisato contendo aminoácidos, em substituição parcial da glicose, é outra modalidade peculiar de nutrição parenteral. A Fig. 1 apresenta um modelo de decisão da via de alimentação para pacientes em diálise. Para pacientes graves com IRA, a TN enteral e/ ou parenteral está indicada sempre que ocorrer hipercatabolismo associado, dificuldade de alcance das necessidades nutricionais por meio da dieta convencional via oral ou existência de depleção pré-existente. Para esses pacientes, a TN enteral e/ ou parenteral deve ser iniciada assim que ocorra estabilidade hemodinâmica. Mesmo que não tenha o objetivo de ofertar quantidades significativas de nutrientes, a nutrição via sonda deve ser iniciada o mais brevemente possível, na tentativa de preservar o trofismo intestinal e as funções imunológicas. Na IRA não complicada e com baixo nível de hipercatabolismo, a TN por meio de suplementos orais e sonda está indicada somente quando a dieta via oral não for suficiente para alcançar as necessidades nutricionais. VIA ORAL A aderência a longo prazo à dieta recomendada é um grande problema para pacientes em qualquer estágio da DRC. Porém, uma ferramenta poderosa para o alcance e manutenção do aporte nutricional adequado e do controle metabólico e hídrico, quando aplicada por profissional experiente, é a educação alimentar. O uso de técnicas apropriadas de entrevista e de aconselhamento torna efetiva a tarefa de otimizar a aderência à dieta. Um dos princípios mais importantes da educação é compreender que o relapso faz parte do comportamento humano. Tanto os pacientes como os profissionais envolvidos devem estar preparados para isso. A repetição, portanto, deve ser parte integral do atendimento. Um profissional preparado não pode se cansar, ou subestimar, essa necessidade. O desenvolvimento do inter-relacionamento pessoal, que exige alto grau de empatia do profissional, é essencial para o sucesso. No princípio do tratamento, o trabalho é a longo prazo. Isso facilita o planejamento de intervenções passo a passo, individualizadas para 20 Fig. 1 Manejo nutricional de pacientes em diálise crônica Abreviações: S: sim; N: não; ID: intradialítica; IP: intraperitoneal; G.I.: gastrintestinal; V.O.: via oral 21 Terapia Nutricional do Paciente Renal Crônico e Agudo a capacidade intelectual, educacional e emocional do paciente. Estudos têm mostrado que o aconselhamento nutricional com o objetivo de corrigir a ingestão inadequada de nutrientes foi benéfico para a melhora dos níveis da albumina sérica e manutenção do peso corporal (77, 78). Entretanto, um grande problema é que o apetite é deficiente em grande parte dos pacientes em diálise. Conforme a doença progride, a anorexia também piora. Isso pode contribuir significativamente com a desnutrição e alterações metabólicas, e aumentar as taxas de morbidade e mortalidade. Estimulantes do apetite, em particular o acetato de megestrol, tem sido usados para tratar a anorexia, com melhora significativa nos níveis de albumina sérica (79-83). Diferentes doses foram testadas com pacientes em diálise: 20mg duas vezes ao dia (79), 40mg duas vezes ao dia (83), 160mg/dia (81), 400mg/dia (82), 400mg duas vezes ao dia (80). Somente doses de 800mg/dia não foram seguras para os pacientes em diálise. Os efeitos colaterais incluíram diarréia, confusão, hiperglicemia, cefaléia, tontura e aumento da desidrogenase lática (80). Portanto, em caso de anorexia grave, o acetato de megestrol pode ser opção benéfica e segura para melhorar a ingestão via oral dos pacientes renais, embora o uso não tenha apoio irrestrito (84). Doses mais baixas, como 40 a 80mg/dia são efetivas. Entretanto, a função hepática e a glicemia devem ser monitoradas periodicamente. Outra tentativa de melhorar o apetite dos pacientes renais crônicos é a suplementação oral com aminoácidos ramificados. É bem conhecido o desequilíbrio no perfil de aminoácidos dos pacientes renais, com concentrações diminuídas de aminoácidos essenciais, particularmente daqueles de cadeia ramificada (valina, leucina e isoleucina). Esse fato parece envolvido com a anorexia a nível hipotalâmico. Um estudo controlado mostrou melhora significativa da ingestão alimentar e estado nutricional com a suplementação de 12g/dia de aminoácidos ramificados via oral em pacientes em HD (85). Mais estudos, entretanto, são necessários para a indicação dos benefícios dessa terapia. Suplementos nutricionais orais Além dos alimentos, o uso de suplementos, artesanais ou industrializados, pode ser indicado para o objetivo de atingir as necessidades de nutrientes de pacientes com doenças renais. Diversos estudos já demonstraram que essa terapia é capaz de aumentar significativamente a ingestão energética e protéica, sem ultrapassar as restrições de fósforo e de sódio (86- 90). Além disso, pode elevar a albumina sérica, tratar e reduzir a frequência da desnutrição (87, 91-98). Uma meta-análise reuniu 18 estudos de pacientes em HD e DP (5 randomizados e 13 não randomizados), e avaliou o efeito dos suplementos orais sobre os parâmetros clínicos, bioquímicos e nutricionais (90). O uso de suplementos orais aumentou a ingestão de energia e de proteína, e elevou a concentração de albumina sérica em 0,23g/dL. Resultados semelhantes foram observados em outro trabalho randomizado e controlado (99). Neste, a suplementação oral contendo 500kcal e 19g de proteína por dia, durante três meses, aumentou a ingestão energética e protéica. E foi associada com a elevação da albumina sérica. Entretanto, uma das limitações do uso da suplementação oral diária é a baixa adesão e/ou a descontinuação após o primeiro mês de tratamento (29, 90). Pensando nisso, Caglar et al avaliaram o efeito do uso de suplemento oral somente durante as sessões de HD (três vezes por semana) por nove meses (100). Os autores observaram melhora da albumina sérica após o sexto mês de suplementação, e do escore da avaliação subjetiva global ao final do estudo. Outro estudo também investigou a suplementação peridialítica (antes ou imediatamente após a sessão) de adultos em HD (101). Após três meses, os resultados mostraram manutenção das concentrações de albumina sérica e da qualidade de vida no grupo que recebeu o suplemento. Houve piora no grupo controle, que não usou a suplementação. Portanto, oferecer a suplementação oral durante as sessões de HD facilita a aderência e a aceitação. E parece ser ótima alternativa para melhorar o estado nutricional e a qualidade de vida de pacientes em HD (29, 59). VIA SONDA A alimentação via sonda pode ser indicada para aqueles que são cronicamente anoréxicos e incapazes de ingerir quantidades adequadas de alimentos e de suplementos (42, 102). Deve ser considerada para pacientes hipercatabólicos, inconscientes ou com algum impedimento para a alimentação oral. O uso da gastrostomia ou da jejunostomia, colocadas cirurgicamente ou por endoscopia percutânea, apesar de relatos positivos (103) e de uso comum em crianças, 22 é contra indicada para pacientes adultos em DP, devido ao aumento da incidência de peritonite (59). É um risco para o comprometimento da membrana peritoneal, que pode ser a única opção de vida para o paciente. Em IRA, dois estudos clínicos sugeriram
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