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ARTIGO-Boa-fé-Processual

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O princípio da boa-fé no Direito Processual Civil
The principle of good faith in Civil Procedural Law
Carlos Augusto Pena da Motta Leal
UFES. Departamento de Direito. Aluno de Teoria Geral do Processo, turma 2016/2, do Curso de Direito. E-mail: ca_pmleal@hotmail.com
Gabriel de Oliveira Coelho Santana
UFES. Departamento de Direito. Aluno de Teoria Geral do Processo, turma 2016/2, do Curso de Direito. E-mail: gabrielcoelho97@hotmail.com
Ícaro Batista Goltara
UFES. Departamento de Direito. Aluno de Teoria Geral do Processo, turma 2016/2, do Curso de Direito. E-mail: icarogoltara@hotmail.com
Rainer Cruz Merscher Nunes
UFES. Departamento de Direito. Aluno de Teoria Geral do Processo, turma 2016/2, do Curso de Direito. E-mail: rainercmn@hotmail.com
Resumo
O presente trabalho possui como escopo uma abordagem do princípio da boa-fé processual no NCPC, como este se porta em tal diploma legal e sua importância para que se alcance a finalidade do processo no Estado Democrático Constitucional: a tutela adequada, efetiva e tempestiva de direitos. Serão evidenciadas também as diferentes formas de boa-fé, sendo essas a boa-fé objetiva e a boa-fé subjetiva, ressaltando-se a forma como são adotadas pelo novo Código. Ademais, explorar-se-á a relação do princípio em questão com outros presentes no ordenamento jurídico brasileiro, como o princípio da cooperação e o princípio do devido processo legal, assim como haverá a discussão dos institutos relacionados à boa-fé.
Palavras-chave: Princípio da boa-fé processual; NCPC; Estado Democrático Constitucional; Boa-fé objetiva; Boa-fé subjetiva.
Abstract 
This paper has as scope an approach about the procedural good faith principle in the new Code of Civil Procedure, such as its applicability in the legal text and its importance for achieving the processual goal in the context of the Constitutional Democratic State: the adequate, timely and effective protection of rights. The different kinds of good faith, which are the objective good faith and the subjective good faith, will be evidenced as well, being highlighted the one used by the new Code. Furthermore, this article will expose the relation between the aforementioned principle and some other principles of the Brazilian legal system. In addition, a discussion about the institutes related to the good faith will be done.
Keywords: Procedural good faith principle; new Code of Civil Procedure; Constitutional Democratic State; Objective good faith; Subjective good faith.
Sumário: 1. Introdução; 2. A ambiguidade da expressão; 3. A boa-fé como princípio constitucional; 4. Concretização do princípio da boa-fé processual; 4.1 Exceptio doli; 4.2. Venire contra factum proprium; 4.3. Suppressio e surrectio; 4.4. Tu quoque; 4.5 Duty to mitigate the loss; 5. Críticas doutrinárias à ideia de boa-fé processual; 6. Relação do princípio da boa-fé processual com outros princípios processuais; 7. Considerações finais; 8. Referências. 
1. Introdução
Antes de fincar raízes profundas no tema, deve-se atentar à definição de princípio. Existem longínquas discussões na doutrina jurídica sobre o tema, que não caberiam nos limites deste trabalho. Então, para que não haja digressão do assunto, contentar-se-á com a ideia de que os princípios são a base de validade das demais asserções do ordenamento jurídico, são as verdades fundantes das normas, as regras norteadoras de todo o direito [footnoteRef:1]. [1: REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 303.] 
A boa-fé é um princípio que surgiu no Direito privado, mas que recentemente, seguindo a tendência ocidental, expandiu-se para os demais ramos do Direito, até mesmo o Direito público e ramos não civis. 
A natureza instrumental do Processo civil em relação ao Direito civil, fez com que aquele fosse o primeiro setor a abranger o princípio da boa-fé fora do Direito privado. Tal fato se deve a uma tradição literária da doutrina em escrever sobre a boa-fé processual, e a recepção dessa tradição pela jurisprudência alemã, que considerou o § 242 do Código Civil alemão (o devedor está adstrito a realizar a prestação tal como o exija a boa-fé, com consideração pelos costumes do tráfego [footnoteRef:2]), no direito processual civil e penal [footnoteRef:3]. Destarte, independentemente do ramo do Direito, sempre que houver uma relação jurídica as partes devem agir da forma que se espera de uma pessoa de boa-fé. A expansão da boa-fé prova que esse princípio não é um mero instituto do Direito, mas um importante fator cultural[footnoteRef:4] responsável por assegurar a ética no âmbito jurídico. [2: CORDEIRO, António Manuel da Rocha e Menezes. Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2013, p. 325.] [3: DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 18. ed. Salvador: JusPodivm, 2016. v. 1., p. 107.] [4: CORDEIRO, António Manuel da Rocha e Menezes. Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2013, p. 371.] 
No CPC/2015 o princípio (norma) está previsto no texto do art. 5º: “Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé”. Repartir-se-á o artigo supracitado em duas partes para a melhor compreensão acerca do tema.
i) “Aquele que de qualquer forma participa do processo...”. Perceba que, diferentemente do que uma parte significativa da doutrina pensa, a boa-fé processual não é destinada apenas às partes, mas a todos aqueles que participam do processo direta ou indiretamente. Assim, o princípio abrange também o órgão jurisdicional, uma vez que o Estado-juiz deve ser tolerante, leal e protetor da confiança [footnoteRef:5]. [5: DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 18. ed. Salvador: JusPodivm, 2016. v. 1., p. 111-112.] 
ii) “...deve comportar-se de acordo com a boa-fé”. É de suma importância notar que a boa-fé a que o artigo alude diz respeito à boa-fé objetiva, visto que estabelece normas de conduta independente da existência de boas ou más intenções.
O art. 5º do CPC é obviamente uma cláusula geral processual, pois, somente assim, o princípio da boa-fé é capaz de ser eficiente, visto que qualquer tentativa de enumeração exaustiva de hipóteses de comportamentos desleais não abrangeria as diversas situações do mundo fático. 
2. A ambiguidade da expressão 
É de suma importância conhecer os significados da expressão boa-fé, quais sejam, boa-fé objetiva e boa-fé subjetiva. Alguns cientistas do direito relutam em reconhecer a distinção, fato que torna o conceito ainda mais abstrato, todavia a doutrina majoritária e grande parte da jurisprudência a reconhece.
A boa-fé subjetiva diz respeito às crenças pessoais do indivíduo, abrangendo os aspectos psicológicos do ser, por isso é também denominada por “boa-fé crença”. Nesse caso é avaliada a intenção do sujeito, que, apesar de ter causado dano, pode ter sido nobre. Tal fato ocorre devido ao desconhecimento da parte, isto é, a sua ignorância ou crença errônea acerca de um determinado fato jurídico. Assim, mesmo havendo lesão, não é configurada má-fé, haja vista a intenção magnânima. Tudo se resumirá ao conhecimento do sujeito. 
A boa-fé objetiva, por sua vez, está relacionada à ética das ações analisadas objetivamente. Por isso ouve-se também “boa-fé lealdade”. Estabelecem-se regras de conduta objetiva pautadas nos valores socialmente estabelecidos e amplamente reconhecidos, de modo que sua inobservância configura uma agressão à consciência coletiva.
Onde houver relações intersubjetivas, os sujeitos devem agir com lealdade sem frustrar a confiança média alheia. Destarte, a boa-fé objetiva se adequa aos valores da comunidade, podendo ser aplicada somente ao caso concreto. Em consequência o texto legal que a prevê é uma cláusula geral, no CPC o art. 5º.
Apesar de que já fora supracitado, não é demais ressaltar que a boa-fé processual, a que alude o art. 5º do CPC, é a boa-fé objetiva, isto é, independe da existência de boas ou más intenções [footnoteRef:6]. [6: DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 18. ed. Salvador: JusPodivm, 2016.v. 1., p. 106.] 
3. A boa-fé como princípio constitucional
4.1 Exceptio doli
Em diversas circunstâncias processuais, as partes agem com dolo, sendo este tipo de atitude claramente contrário ao princípio da boa-fé processual e, portanto, é um vício que necessita de ser sanado. 
Na situação em que uma das partes age com dolo, aplica-se a exceptio doli, instituto da boa-fé que age, segundo Luciano de Camargo, da seguinte forma: “a exceptio doli atua no sentido de paralisar o exercício de pretensões claramente dirigidas contra a parte contratante de modo doloso” [footnoteRef:7]. Pela passagem de Camargo, percebe-se uma definição da atuação do instituto no direito material, porém, esta também se aplica no direito processual de forma consistente, tendo uma definição mais geral dada por Daniel Mitidiero, para quem “a exceptio doli é a exceção que tem a pessoa para paralisar o comportamento de quem age dolosamente contra si” [footnoteRef:8]. [7: PENTEADO, Luciano de Camargo. Figuras parcelares da boa-fé objetiva e “venire contra factum proprium”. Disponível em: http://www.cantareira.br/thesis2/ed_8/3_luciano.pdf. Acesso em: 23 de novembro de 2016.] [8: MITIDIERO, Daniel. Processo justo, colaboração e ônus da prova. Revista TST, v.78, n°1 jan. 2012 a mar. 2012 Disponível em: https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/1939/29621/003_mitidiero.pdf?sequence=4. Acesso em: 23 de novembro de 2016.] 
O abuso de direito coloca-se como uma figura que claramente quebra a boa-fé objetiva, pois, ainda que o exercício de um direito não seja em si ilícito, a forma pela qual este está sendo utilizado torna-o contrário ao direito. Como bem coloca Taruffo, “a cláusula geral da boa-fé é também usada como um meio de colmatar as lacunas existentes em regras processuais. Este caso pode ser difícil de definir especificamente, mas o raciocínio básico é o seguinte: um ato ou uma conduta processual não pode ser especificamente previsto e explicitamente definido como abusivo pelo direito; todavia, é entendido como abusivo porque é injustamente nocivo, ou implica abuso de poder, ou é leviano e dilatório, ou é dirigido a propósitos ilegais ou inadequados etc” [footnoteRef:9]. Este caso pode ser facilmente notado pela litigância de má-fé, haja vista que o ato de litigar por si só não pode ser visto em hipótese alguma como abusivo, contendo, todavia, tal característica a partir do momento em que se nota uma postura contrária à boa-fé pela parte que litiga. No CPC/2015, evidencia-se um caso de abuso de direito no art. 80, VII, no qual se identifica que o recurso manifestamente protelatório caracteriza a parte como litigante de má-fé, havendo um mecanismo de exceptio doli nesse caso que é o previsto no art.311, I, do mesmo diploma, concedendo-se a tutela de evidência, o que faz com que os efeitos dolosos do exercício de um direito sejam paralisados. [9: TARUFFO, Michele. Abuso de direitos processuais: padrões comparativos de lealdade processual: relatório geral. Revista de processo, v. 34, n. 177, p. 154-155, nov. 2009.] 
4.2. Venire contra factum proprium
Por venire contra factum proprium, deve-se entender uma postura contraditória de um sujeito. Nesse contexto, tem-se o factum proprium, que consiste no comportamento primário de uma das partes de um processo e, em uma ocasião posterior, o mesmo sujeito age de forma contrária em relação à sua primeira postura. Destarte, esse exercício “postula dois comportamentos da mesma pessoa, lícitos em si e diferidos no tempo. O primeiro – o factum proprium- é, porém, contrariado pelo segundo” [footnoteRef:10]. [10: CORDEIRO, António Manuel da Rocha e Menezes. Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2013, p. 745.] 
Esse instituto, todavia, é indubitavelmente vedado pelos deveres decorrentes da boa-fé processual, haja vista que “porque dotado de carga ética, psicológica e sociológica negativa atenta, necessariamente, contra a boa-fé” [footnoteRef:11]. Desse modo, aquele que de algum modo agir de forma contraditória às suas anteriores condutas em um processo está claramente quebrando os deveres do art. 5° do CPC/2015 e, em algumas situações, até mesmo outros dispositivos de tal código. Com isso, a postura do texto legal relativa a essa prática consiste em uma “proibição de exercício de uma situação jurídica em desconformidade com um comportamento anterior que gerou uma expectativa legítima de manutenção da coerência” [footnoteRef:12]. [11: CORDEIRO, António Manuel da Rocha e Menezes. Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2013, p. 753.] [12: DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 18. ed. Salvador: JusPodivm, 2016. v. 1., p. 112.] 
Através da vedação do venire contra factum proprium, fica claro que as partes de um processo possuem um dever inquestionável de manter a coerência em seus atos, ainda que isso limite o exercício de um determinado direito. Esse dever, decorrente da boa-fé processual, é evidenciado por Joan Picó i Junoy, segundo o qual: “la conducta observada por una persona en un determinado momento puede vincularle, restringiendo sus posibles actuaciones posteriores, que serán inadmisibles cuando pretenda hacer valer un derecho en contra de su propria conducta previamente realizada, traicionando así la confianza que los terceros hayan podido depositar em él”[footnoteRef:13]. [13: JUNOY, Joan Picó i. El principio de la buena fe procesal. 1. ed. Barcelona: J.M. Bosch Editor, 2003. v. 1., p. 113] 
Pode-se encontrar a vedação da conduta contraditória em vários dispositivos do CPC/2015, como no art.1000, no qual é vedado o recurso à parte que aceitou determinada decisão. Tal proibição exige, claramente, uma postura coerente das partes de um processo, ainda que se proíba o exercício de um direito, que, no caso, é o direito ao recurso, pois o ato de aceitar uma decisão judicial vincula a parte a manter uma coerência em suas futuras condutas, o que implica em não exercer um direito para que se mantenha a boa-fé processual.
Todavia, além das proibições presentes de forma inequívoca no CPC/2015 para com o Venire contra factum proprium, há também outro tipo de proibição, pois o princípio da boa-fé processual também proíbe as condutas atipicamente contraditórias [footnoteRef:14], o que inclui as que não estão expressamente previstas no texto legal. [14: DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 18. ed. Salvador: JusPodivm, 2016. v. 1., p. 113.
 
] 
4.2.1 Venire contra factum proprium e a preclusão lógica
A preclusão é um instituto do direito processual que consiste na perda de determinados poderes processuais, podendo-se aplicar, por exemplo, no direito ao recurso e no direito ao requerimento de nulidade. Já a preclusão lógica é uma espécie de preclusão que decorre do comportamento da parte e impede um ato contraditório, sendo esta, segundo Ovídio Baptista “a impossibilidade em que se encontra a parte de praticar determinado ato ou postular certa providência judicial em razão da incompatibilidade existente entre aquilo que agora a parte pretende e sua própria conduta processual anterior” [footnoteRef:15]. Baptista ainda dá o exemplo no qual “o réu condenado pela sentença comparece a cartório e paga o valor da condenação; depois de praticar este ato, estando ainda a fluir o prazo para recurso, volta a cartório para apelar da mesma sentença” [footnoteRef:16]. Neste caso, o réu, ao realizar o pagamento da condenação, perde o direito processual ao recurso por preclusão lógica, já que o pagamento pressupõe a aceitação. [15: SILVA, Ovídio Baptista da. Curso de Processo Civil. 6ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais LTDA, 2003, v.1, p. 209.] [16: SILVA, Ovídio Baptista da. Curso de Processo Civil. 6ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais LTDA, 2003, v.1, p. 209.] 
Este instituto segue, como pode se ver, a mesma lógica do venirecontra factum proprium, haja vista que ambos impedem condutas contraditórias das partes de um processo. Destarte, Leide Maria Gonçalves Santos afirma que “a análise da jurisprudência levou a concluir que muitas decisões resolvidas sob o fundamento da preclusão lógica, na verdade, prestigiam a boa-fé objetiva no âmbito processual manifestada na figura do venire contra factum proprium” [footnoteRef:17]. [17: SANTOS, Leide Maria Gonçalves. A boa-fé objetiva no processo civil: A Teoria dos Modelos de Miguel Reale aplicada à jurisprudência Brasileira Contemporânea. 2008. 287 f. Dissertação (Mestrado em Direito) Departamento de Direito, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória. 2008. ] 
Com isso, fica evidente a relação entre a venire contra factum proprium e a preclusão lógica, podendo-se dizer que tal instituto processual segue a lógica da boa-fé proibindo condutas contraditórias e, automaticamente, proibindo o venire contra factum proprium. 
4.5 Duty to Mitigate the Loss
Instituto amplamente utilizado nos países de common law, o chamado duty to mitigate the loss teve ingresso recente na doutrina brasileira. Basicamente, este instituto é utilizado quando um determinado credor de uma relação obrigacional sofre danos e, para que seu prejuízo não aumente, torna-se o próprio credor responsável por evitar que a dívida se torne excessivamente onerosa para o devedor. Destarte, pode-se realizar a tradução, dizendo-se que “o credor tem o dever de reduzir seus próprios prejuízos”.
Conforme Élcio Nacur Rezende, por meio do duty to mitigate the loss, “justifica-se a não reparação integral da vítima individualizada (repita-se que essa teoria não se aplica ao Dano Difuso) pela ausência de comportamento da vítima que poderia evitar ou atenuar o dano que sofreu” [footnoteRef:18]. Portanto, torna-se claro o fato de que o conceito em questão está intimamente conectado ao princípio da boa-fé, pois aquele que aumenta seu próprio prejuízo e, por conseguinte, aumenta o dever de indenizar da outra parte, está agindo de forma antiética e, destarte, de forma contrária as normas de conduta que a boa-fé impõe. Para Pablo Stolze, tal dever do credor funciona nas relações obrigacionais “em prol inclusive do princípio da confiança” [footnoteRef:19], que indubitavelmente é conexo ao princípio da boa-fé processual. [18: REZENDE, Élcio. ‘Duty to mitigate the loss’- O dever de se mitigar o prejuízo. Disponível em: http://www.domtotal.com/artigo.php?artId=3959. Acesso em: 20 de novembro de 2016. ] [19: STOLZE, Pablo. Duty to Mitigate. Editorial 12. Disponível em: http://pablostolze.com.br/. Acesso em: 20 de novembro de 2016.] 
No direito civil brasileiro, este dever é extraído por meio da interpretação do Art. 422[footnoteRef:20] do Código Civil de 2002, haja vista que se prevê neste que os contratantes são obrigados a guardar o princípio da boa-fé e, como já foi visto, mitigar seus próprios prejuízos é um dever que decorre da boa-fé. Como bem evidenciam Paulo Henrique Helene e Eduardo Hoffmann, “o fato de o credor não se empenhar para que não aumente o valor dos próprios prejuízos, incorreria em abuso de direito, afrontando o princípio da boa-fé” [footnoteRef:21]. Portanto, ainda que não haja de forma explícita em nenhum dispositivo do Código Civil o dever de mitigar os próprios prejuízos, este se explicita quando se analisa o princípio da boa-fé objetiva. [20: Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. ] [21: HELENE, Paulo Henrique e HOFFMANN, Eduardo. Duty to mitigate the loss: O dever de mitigar sua própria perda. Disponível em: http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=de3f712d1a02c5fb. Acesso em: 20 de novembro de 2016.] 
Já no âmbito processual civil, que é o foco do presente trabalho, este dever pode ser encontrado em decorrência da cláusula geral do art. 5° do CPC/2015, extrai-se o duty to mitigate the loss, realizando-se um trabalho interpretativo que considere a doutrina, os precedentes e as demandas sociais, pois assim fica claro ao exegeta que a boa-fé processual exige tal instituto. Com isso, pode-se ter um exemplo no qual uma pessoa deixou os juros de uma dívida se tornarem excessivamente onerosos e, após isso, exerceu seu direito de ação. Nota-se que o autor da ação está agindo em desacordo com o princípio da boa-fé processual, pois o exercício de seu direito está sendo corrompido pelo fato de não ter sido realizada a mitigação de seus próprios prejuízos.
Ademais, pode-se encontrar no Art.805[footnoteRef:22] do CPC/2015 uma situação que segue a mesma lógica que o duty to mitigate the loss, pois neste torna-se obrigatória ao exequente a escolha da execução menos gravosa ao executado quando houver mais de uma opção de execução. Com isso, segue-se também a boa-fé processual para que o polo passivo da relação tenha os menores prejuízos possíveis. Paulo Henrique Helene e Eduardo Hoffmann já haviam observado esta semelhança com o duty to mitigate the loss no Art. 620 do CPC/1973[footnoteRef:23], sendo este dispositivo análogo ao Art. 805 do CPC/2015. [22: Art. 805. Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado.] [23: HELENE, Paulo Henrique e HOFFMANN, Eduardo. Duty to mitigate the loss: O dever de mitigar sua própria perda. Disponível em: http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=de3f712d1a02c5fb. Acesso em: 20 de novembro de 2016.] 
6. Relação do princípio da boa-fé processual com outros princípios processuais
No Estado Democrático Constitucional, a finalidade do processo é, como já foi visto, a tutela adequada, efetiva e tempestiva de direitos, sendo que todos os princípios processuais, de alguma forma, guiam-se como vetores para que seja alcançada esta meta. Dessa maneira, torna-se indubitável o fato de que os princípios processuais, por estarem guiados a uma mesma finalidade, têm ligações entre si que não podem ser ignoradas.
Autores como Didier afirmam que “do devido processo legal podem ser extraídos todos os princípios que regem o direito processual” [footnoteRef:24], sendo esta uma posição coerente, pois, para que um processo seja devido, há a necessidade de outros princípios como o do contraditório, o da boa-fé e o da duração razoável do processo. Com isso, percebe-se uma relação inegável entre os princípios no processo, sendo o da boa-fé um dos que possui vínculos mais evidentes. [24: DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 18. ed. Salvador: JusPodivm, 2016. v. 1., p. 115.
] 
Um dos exemplos mais claros de um princípio que mantém relação com o princípio da boa-fé processual é o caso do princípio da cooperação. Para alguns, como Daniel Mitidiero, a cooperação (ou colaboração) “estrutura-se a partir da previsão de regras que devem ser seguidas pelo juiz na condução do processo” [footnoteRef:25], enquanto para Didier a cooperação “atua diretamente, imputando aos sujeitos do processo deveres” [footnoteRef:26]. Com isso, percebe-se que o conceito do princípio da cooperação é diferente para os diversos autores, pois, como se viu, enquanto para um este se aplica ao juiz, para outro este se aplica a todos os sujeitos processuais. Contudo, independente da definição, é evidente que, para se cumprir o princípio da cooperação, é necessário também se cumprir a boa-fé, pois aquele que não segue os deveres de colaboração em um determinado processo está, automaticamente, agindo de forma contrária à boa-fé processual e vice-versa. Esta relação é tão clara que se pode afirmar que o princípio da boa-fé processual, juntamente com o do devido processo legal, serve como embasamento para o surgimento do princípio da cooperação [footnoteRef:27]. [25: MITIDIERO, Daniel. Colaboração no processo civil como prêt-à-porter? Um convite ao diálogo para Lenio Streck. Disponível em:< https://www.academia.edu/3223922/Colabora%C3%A7%C3%A3o_no_processo_civil_como_pr%C3%AAt-%C3%A0-porter_Um_convite_ao_di%C3%A1logo_para_Lenio_Streck_-_Revista_de_Processo_194>.Acesso em: 24 de novembro de 2016.] [26: DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 18. ed. Salvador: JusPodivm, 2016. v. 1., p. 128.] [27: DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 18. ed. Salvador: JusPodivm, 2016. v. 1., p. 125.] 
No caso do princípio do contraditório, também se percebe uma forte ligação com o princípio da boa-fé. O contraditório funciona como uma garantia de participação das partes no processo, algo que está enraizado na ideia de um processo democrático, pois, em uma democracia, não há processo sem que as partes possam ter uma ampla presença em seu decorrer. Porém, a ligação entre o princípio do contraditório e o da boa-fé processual está atrelada ao fato de que o debate judicial não deve ser irrestrito, pois, como bem evidencia Antônio do Passo Cabral, “no Brasil e no direito comparado vem sendo vencedora a tese de que deve existir um debate judicial ético, com a correta utilização dos instrumentos do processo” [footnoteRef:28]. Destarte, torna-se notório que o contraditório deve ser exercido de forma ética e, portanto, de acordo com o princípio da boa-fé processual. [28: CABRAL, Antônio do Passo. O CONTRADITÓRIO COMO DEVER E A BOA-FÉ PROCESSUAL OBJETIVA. Revista de Processo, vol. 126, ago. 2015. Disponível em: < http://docslide.com.br/documents/antonio-do-passo-cabral-contraditorio-como-dever-e-boa-fe-processual-objetiva.html>. Acesso em: 24 de novembro de 2016. ] 
Fica claro, nesse diapasão, que o princípio da boa-fé processual não pode ser interpretado de forma isolada em relação aos outros princípios, pois todos têm, de forma mais ou menos evidente, alguma ligação.

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