Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Ensaios e ci., Campo Grande, v. 9, n. 2, p. 293-304, ago. 2005 CARACTERÍSTICAS MORFOLÓGICAS EXTERNAS DISTITINTIVAS DE Myotis albescens, M. nigricans, M. simus E M. riparius (CHIROPTERA; VESPERTILIONIDAE) Eliane Cristina Vicente1, 2 Jorge Jim4 Valdir Antonio Taddei (in memorian)1, 3 1Projeto Chiroptera da Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal– UNIDERP 2Coordenadora do Instituto de Pesquisa do Pantanal (IPPAN) – UNIDERP 3Programa de Mestrado em meio Ambiente e Desenvolvimento Regional – UNIDERP. Rua Alexandre Herculano, 1400 – CEP 79037-280, Campo Grande, MS Endereço eletrônico: chiropterauniderp@yahoo.com.br 4Universidade Estadual Paulista – UNESP. Departamento de Zoologia. jjim@ibb.unesp.br RESUMO A família Vespertilionidae, constituída por aproximadamente 35 gêneros e 318 espécies, é a mais diversificada e também a mais cosmopolita da ordem Chiroptera. Das 75 espécies que ocorrem nas Américas, 19 já foram registradas no Brasil. A sintopia é bastante comum entre as espécies do gênero Myotis. Alem disso, essas espécies apresentam muitas similaridades morfológicas e morfométricas. Deste modo, destacar características distintivas entre os taxa é de fundamental importância para a interpretação de dados biológicos gerais. Neste trabalho foram destacadas características morfológicas externas que permitem a identificação segura, em campo, das espécies de Myotis que ocorrem no Estado de mato Grosso do Sul, Brasil. O ponto de inserção do plagiopatágio nos pés, assim como a coloração da região plantar são características que permitem a distinção segura de M. albescens, M. nigricans, M. simus e M. riparius. Palavras-chave: Chiropterofauna, Conservação, Identificação, Morcego, Sistemática. Ensaios e ci., Campo Grande, v. 9, n. 2, p. 293-304, ago. 2005 1 INTRODUÇÃO Os Vespertilionidae constituem a maior família de Chiroptera, incluindo cerca de 35 gêneros e 318 espécies, 75 de ocorrência conhecida nas Américas e 19 já registradas no Brasil, distribuídas pelos principais biomas nacionais, conforme sumarizado por Marinho- Filho; Sazima (1998), com algumas atualizações. Trata-se de uma família verdadeiramente cosmopolita (MILLER, 1907; ALLEN, 1939), com várias espécies atingindo as zonas temperadas mais frias (Koopman, 1970). O gênero Myotis inclui 97 espécies amplamente distribuídas, das quais, cinco já foram registradas em território brasileiro (M. albescens, M. nigricans, M. simus, M. riparius, M. ruber e M. Levis) e, a ocorrência de duas delas (M. keaysi e M. oxyotus), se restringe em registro marginais de localidades bolivianas (NOWAK, 1991). As informações existentes sobre Vespertilionidae brasileiros são, em geral, fragmentadas e, conseqüentemente, não possibilitam análises taxonômicas e biogeográficas mais detalhadas das espécies. Os espécimes disponíveis, de modo geral, foram obtidos em capturas casuais e as informações mostram que a cobertura geográfica é muito descontínua, com agrupamentos de amostras caracterizados, muitas vezes, por grande heterogeneidade geográfica. As revisões de gêneros são pontuais, e incluem pouco material obtido no Brasil. Entre os vários trabalhos de revisão de gêneros de Vespertilionidae podem ser destacados os de Thomas (1916, 1920), Davis (1966), La Val (1973), Williams (1978), Baker et al. (1988), Baud; Menu (1993) e Anderson (1997). As mais completas destas revisões são as de La Val (1973) e Anderson (1997) para as espécies de Myotis, mas, mesmo neste caso, não foi examinado material brasileiro suficiente para permitir critérios claros de separação das espécies e generalizações sobre a distribuição geográfica e biologia reprodutiva das mesmas. As espécies de Myotis demonstraram bastante complexidade taxonômica e, portanto, de difícil diagnóstico. Isto se deve ao fato de que estas espécies apresentam estreitas relações de similaridade quanto aos caracteres morfoanatômicos, ecológicos e comportamentais. Além disso, devem ser consideradas as relações de simpatria e sintopia, comuns, não só em espécies de Myotis, mas em muitas outras de Chiroptera em geral. Mediante a grande complexidade do processo de identificação das espécies de Myotis, a seleção de características morfológicas externas distintivas torna-se primordial para o reconhecimento dos taxa em campo. Este trabalho reuniu informações que permitem a distinção de M. albescens, M. nigricans, M. simus e M. riparius com base em características morfológicas externas e deverá favorecer e viabilizar atividades de pesquisa que exigem a soltura dos exemplares. 2 MATERIAL E MÉTODOS Foram analisados 66 exemplares de M. albescens (38 fêmeas, 28 machos), 425 de M. nigricans (277 fêmeas, 148 machos), 18 de M. simus (cinco fêmeas e 13 machos) e oito Ensaios e ci., Campo Grande, v. 9, n. 2, p. 293-304, ago. 2005 fêmeas de M. riparius, totalizando 517 indivíduos amostrados. O material é constituído por espécimes reunidos e depositados nas coleções do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo – USP, São Paulo, SP e do Laboratório de Chiroptera da Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal – UNIDERP, Campo Grande, Mato Grosso do Sul. Os espécimes foram coletados com o uso de redes de neblina ("mist nets") armadas junto aos abrigos diurnos, geralmente explorados pelas espécies “internas”, em supostos locais de vôo, de forrageamento e nas proximidades de pequenos lagos geralmente freqüentados por estes animais. Os animais foram transportados para o laboratório em sacos com numeração individual, onde foram anestesiados e mortos em recipiente fechado, contendo algodão embebido com éter. Após a morte a boca dos animais foi mantida aberta por meio da utilização de pedaços de cortiça dispostos de modo a manter afastados os maxilares, permitindo, assim, o exame da dentição, e a facilidade de retirada do crânio. A fixação foi efetuada com o uso de formol a 10% injetado na cavidade geral e na região cervical dos animais. Em seguida, os exemplares foram montados em posição adequada, de modo a facilitar a realização de medidas externas. Para a preservação definitiva os animais são mergulhados em álcool 70o G.L., em frascos de vidro. Cada exemplar foi devidamente numerado (RG de coleção) e os respectivos dados, foram anotados no catálogo geral da coleção e em fichas complementares. Os espécimes que já se encontravam em coleções foram preparados basicamente com os mesmos critérios. Os espécimes foram comparados quanto à morfologia externa, dentária e craniana, visando destacar caracteres de diagnóstico taxonômico. Foram reunidos dados morfométricos de algumas características externas e cranianas (Antebraço – Ant. e Largura pós-orbitária – Lp). Todas as medidas estão expressas em mm e foram efetuadas com a utilização de paquímetro com aproximação de 0,05mm. Os dados morfométricos foram analisados estatisticamente, determinando-se as freqüências relativa e absoluta. 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO Myotis albescens (E. Geoffroy) Vesp. (ertilio) albescens E. Geoffroy, 1809, Annales Mus. Hist. Nat., Paris, vol. 8, pp. 204-205. Myotis nigricans (Schinz) Vesp. (ertilio) nigricans Schinz, 1821, Das Thierreich, vol. 1, pp. 179-180. Myotis simus Thomas Myotis simus Thomas, 1901. Ann. Mag. Nat. Hist., ser. 7, vol. 8, p. 541. Myotis riparius Handley Myotis simus riparius Handley, 1960. Proc. U. S. Nat. Mus. 112: 466-468. Tacarcuna Village, Rio Pucro, Darien, Panamá. Myotis guaycuru Proença, 1943. Ver. Brasileira Biol. 3:313-315. Salobra, Mato Grosso, Brasil. Neste estudo, quatro espécies de Myotis foram colecionadas de diferentes regiões do Pantanal sul-mato-grossense: Myotis albescens,M. nigricans, M. riparius e M. simus. Foi registrado ainda que essas quatro espécies podem ser observadas em coabitação, em diferentes combinações, envolvendo inclusive outros gêneros de Vespertilionidae e espécies de outras famílias (Noctilionidae, Molossidae), quando as condições ambientais são extremamente favoráveis, como é o caso de Ensaios e ci., Campo Grande, v. 9, n. 2, p. 293-304, ago. 2005 alguns refúgios estudados no Pantanal de Miranda, município de Miranda, MS. López-González et al. (2001) registraram cinco espécies deste gênero no Paraguai e, em acréscimo as coligidas neste trabalho, os autores incluem M. ruber, além de considerar M. Levis com grande possibilidade de ocorrência. Esta consideração se deve ao material amostrado por Baud; Menu (1993) cujos resultados ampliaram o registro de ocorrência de espécies de Myotis no Paraguai e países adjacentes. A distinção das espécies de Myotis aqui estudadas foi feita a partir de características morfológicas e morfométricas. Foram identificados como indivíduos representantes de M. albescens, os exemplares apresentando valores das medidas tomadas da largura pós- orbitária (Lp) variando entre 3,8 e 4,2 mm, Antebraço (Ant) variando entre 33,3 e 37,2 (Figuras 1 e 2), franja de pêlos bem distinta na borda distal da membrana interfemural observada por ampliação estereoscópica e, em acréscimo às informações da literatura pertinente, mesmo a olho nu, a membrana da asa (lateral ao corpo – plagiopatágio) inserida em posição mediana-distal da região plantar dos pés e pêlos, ligeiramente dourados, bem evidentes na face dorsal dos artelhos dos pés (Figuras 3a, 3b e 5). As últimas características descritas permitem, com boa margem de segurança, a identificação de indivíduos em campo. Muitas das características mencionadas por La Val (1973) podem ser utilizadas na identificação dessas espécies, mas Myotis nigricans apresenta uma extensa variação geográfica, morfológica e morfométrica, sendo muitas vezes confundida com M. albescens e M. riparius, notadamente as fêmeas. Em algumas circunstâncias e dependendo das fases de desenvolvimento e do sexo (exemplares jovens, juvenis e fêmeas) existem maiores dificuldades. É necessário enfatizar que os padrões morfométricos valorados, mesmo considerando apenas indivíduos adultos, apresentam superposição interespecíficas dos valores amostrais, principalmente os referentes à Lp e Ant., como pode se visto nas figuras 1 e 2. As principais características distintivas de M. nigricans e M. albescens, até então utilizadas, foram os valores morfométricos de Ant. e Lp que, conforme mencionado, além de não permitir a total distinção dos táxons é de pouca utilidade, mediante aos limites de aplicabilidade em campo. 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 3.0 - 3.2 3.3 - 3.5 3.6 - 3.8 3.9 - 4.2 % M . albescens M . nigricans M . riparius M . simus Figura 1. Freqüência relativa dos indivíduos adultos quanto aos parâmetros morfométricos da largura pós- orbitária, uma das principais características distintivas em nível de espécie utilizada até agora. 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 29.2 - 31.2 31.3 - 33.2 33.3 - 35.2 35.3 - 37.2 37.3 - 40.0 % M . albescens M . nigricans M . riparius M . simus Figura 2. Freqüência relativa dos indivíduos adultos quanto aos parâmetros morfométricos do Antebraço, uma das principais características distintivas em nível de espécie utilizada até agora. Ensaios e ci., Campo Grande, v. 9, n. 2, p. 293-304, ago. 2005 De forma comparativa o tamanho dos pés e desenvolvimento de pelos nos mesmos, constituem uma boa característica de diferenciação entre M. nigricans (pés pequenos com pelos curtos e pouco visíveis) e M. albescens (pés maiores com pelos bem visíveis). Além disso, foi observado neste estudo que, em M. nigricans, a inserção da membrana da asa (lateral ao corpo – plagiopatágio) ocorre nos limites da articulação do artelho com a região plantar dos pés (Figuras 4a e 4b) e que a coloração da região plantar, dos pés de M. nigricans, quando comparado com M. riparius e M. simus, é mais escura (Figuras 5 e 6a). Figura 3. M. albescens em (A) vista parcial dos membros posteriores onde as setas indicam o ponto médio de inserção do plagiopatágio e os pêlos (melhor vistos na fig. 5) da face dorsal dos artelhos e (B) modelo esquemático que indica (pelas setas) o ponto médio de inserção do Plagiopatágio.Foto: Daniel De Granville / Ilustração: Larissa Figueiredo de Oliveira Figura 4. M. nigricans em (A) vista parcial dos membros posteriores, onde a seta indica o ponto médio de inserção do plagiopatágio na região de articulação dos artelhos com a planta do pé e (B) modelo esquemático que indica (pelas setas) o ponto médio de inserção do Plagiopatágio. Foto: Daniel De Granville / Ilustração: Larissa Figueiredo de Oliveira As características descritas para os pés permitem, com boa margem de segurança, a identificação de indivíduos em campo e, viabiliza os estudos que incluem a necessidade de manutenção de espécimes vivos, além de favorecer ao processo de identificação de filhotes, juvenis e jovens, já que estes não estão dentro dos parâmetros morfométricos estabelecidos para indivíduos adultos. M. simus, assim como outras do gênero Myotis, deve ser [a] [b] [a] [b] Ensaios e ci., Campo Grande, v. 9, n. 2, p. 293-304, ago. 2005 considerada de grande valor taxonômico. Isto se deve ao fato de que muitas das características distintivas, em nível de espécie, apresentam muitas variações entre os táxons que constituem o gênero. Deve ser identificado como M. simus indivíduos que apresentem membrana da asa (plagiopatágio) inserida no tornozelo, valores das medidas tomadas do antebraço variando entre 34,8 e 40,2 mm e com padrão de coloração do pêlo em tons de laranja (Figuras 2, 6a e 6b). Figura 5. Pés de três das espécies de Myotis aqui estudadas. 1 = M. nigricans; 2 = M. riparius; 3 = M. albescens. Note a diferença do padrão de pigmentação e tamanho dos pés. Em 3 observe a ocorrência de pêlos, mais longos e visíveis, da face dorsal dos artelhos. Foto: Daniel De Granville Figura 6. Myotis simus em (A) note a coloração em tons de laranja e a membrana lateral (plagiopatágio) inserida na altura do tornozelo (cf. indicado pela seta) e em (B) o modelo esquemático que indica (pelas setas) o ponto médio de inserção do Plagiopatágio em M. simus. Foto: Eliane C. Vicente / Ilustração: Larissa Figueiredo de Oliveira [1] [3] [2] [a] [b] Ensaios e ci., Campo Grande, v. 9, n. 2, p. 293-304, ago. 2005 Figura 7. Myotis riparius (A) e M. nigricans (B) em vista geral. Note a diferença na coloração dos pés entre as duas espécies. M. riparius pode apresentar a pelagem com Tons de marrom idênticos a M. nigricans. Foto: (A) Daniel De Granville / (B) Neiva Guedes. Figura 8. Vista geral do pé de M. riparius. Descrição de detalhes na legenda lateral. Foto: Daniel De Granville. Quanto a Myotis riparius pode-se dizer que é um taxa pouco comum e, portanto muito valiosa em coleções científicas. Isto se deve à grande similaridade, quanto à aparência, com M. nigricans (Figura 7a e 7b) e às relações de simpatria e sintopia entre as espécies que constituem o gênero. Os indivíduos que apresentam membrana da asa (plagiopatágio) inserida na região articular do artelho com o metatarso (Figuras 7a e 8), pés com coloração clara ou, quando vivo, avermelhada (Figura 8), valores das medidas tomadas do antebraço variando entre 34 e 36mm, Lp entre 3,2 e 3,6mm (Figuras 1 e 2) e com padrão de Note o ponto de inserção do plagiopatagioindicado pela seta. Este espécime foi fotografado vivo e a região plantar do pé apresenta coloração avermelhada devido a vascularização que é visível por transparência da pele. Quando fixado o animal, esta estrutura apresenta-se esbranquiçada (clara). Obs: M. riparius (a) em tom de marrom avermelhado [b] [a] Ensaios e ci., Campo Grande, v. 9, n. 2, p. 293-304, ago. 2005 coloração do pêlo em tons de marrom escuro a marrom avermelhado é, aqui, considerado M. riparius (Figura 7a). Basicamente, utilizando características já mencionadas por LaVal (1973), Myers; Wetzel (1983) e Anderson (1997) e, somando as características destacadas e utilizadas, durante o desenvolvimento deste trabalho, foi possível a elaboração de uma chave artificial de identificação para as espécies de Myotis aqui estudadas (Quadro 1). No quadro 1 são apresentadas as características distintivas, aqui destacadas e utilizadas, das espécies de Myotis ora estudadas. Tais características são de total aplicabilidade tanto em campo como em material de coleções. As características que permitem a identificação em campo (características morfológicas externas) estão em destaque (Negrito). Quadro 1: Chave artificial de Identificação de espécies de Myotis que ocorrem no Estado de Mato Grosso do Sul. 1. Membrana da asa (plagiopatágio) inserida no tornozelo; antebraço maior (Ant: 34,8 – 40,2); coloração geral alaranjada Myotis simus Membrana da asa (plagiopatágio) inserida na base do dedo do pé (artelho) ou um pouco mais deslocado em relação à região mediana da planta do pé; Antebraço geralmente menor que 36,0; coloração geral marrom, às vezes marrom avermelhado ou ferrugíneo 02 2. Crista sagital geralmente não desenvolvida; largura pós-orbitária geralmente maior que 3.6; pés com a região plantar mais escura 03 Crista sagital geralmente desenvolvida; largura pós-orbitária geralmente menor que 3,6; plagiopatágio inserido na base do dedo do pé (artelho); pelos dos pés pouco desenvolvidos e pouco visíveis a olho nu; pés com a região plantar mais clara (Figura 7) Myotis riparius 3. Borda distal da membrana interfemural sem franja de pelos, mesmo quando observada com ampliação; largura pós-orbitária geralmente menor que 3,8; plagiopatágio inserido na base do dedo do pé (artelho); dedos dos pé providos de pelos curtos e pouco visíveis (Figura 4) Myotis nigricans Borda distal da membrana interfemural com franja de pelos bem distinta quando observada com ampliação; largura pós-orbitária geralmente maior que 3,8 (3.8 – 4,2); plagiopatágio inserido abaixo da base do dedo do pé (artelho), ligeiramente deslocado em direção à região mediana plantar; dedos dos pé providos de pelos longos e bem visíveis, sobretudo por ampliação (Figura 5) Myotis albescens As políticas de manejo de quirópteros, muitas vezes, incluem estratégias de controle populacional frente às importantes implicações médico-sanitárias (TADDEI, 1999). A aplicação de tais políticas é fundamentada em informações referentes à biologia básica das espécies. Os resultados, aqui discutidos, não só fornecem importantes subsídios para a aplicabilidade das informações taxonômicas em campo. Muitas vezes as características utilizadas como distintivas, entre espécies Ensaios e ci., Campo Grande, v. 9, n. 2, p. 293-304, ago. 2005 cogenéricas, demonstram, quanto a sua utilização, reservas e se isolam nos limites das coleções científicas. Isto se deve ao fato de que os valores morfométricos mais precisos e estabelecidos como funcionais para o processo de identificação, são, em sua maioria, referentes a estruturas cranianas. Deste modo, a utilização destes parâmetros só é possível por meio do sacrifício do espécime e estudos que envolvem a soltura de animais acabam permeados de pouca fidelidade taxonômica. Implicações desta ordem permearam por muito tempo espécies de Platyrrhinus e foram tratadas por Taddei; Vicente-Tranjan (1998), Vicente (2000) e Vicente et al. (2005). Estas publicações seguem os critérios, aqui discutidos e defendidos, de utilização de características morfológicas destacadas como principal meio de identificação em campo. Tais características, muitas vezes são referentes a morfologia dentária, como é o caso de distinção entre P. lineatus, P. helleri e P. recifinus. Contudo, para maior segurança e precisão do trabalho de reconhecimento e identificação, os critérios morfométricos de características externas são imprescindíveis. Com atividades desenvolvidas em uma área mais ampla do Cerrado brasileiro foram registradas 80 espécies distribuídas por 42 gêneros e entre estas 11 de Vespertilionidae (MARINHO-FILHO, 1996). Neste estudo foram obtidos exemplares de três espécies de Myotis (M. albescens, M. nigricans e M. riparius), que, com exceção de M. simus, constituem as mesmas aqui estudadas. A estrutura de uma taxocenose de morcegos, frente à fragmentação de hábitat em São Paulo, foi estudada por Pedro et al. (1995). Foram capturados 117 exemplares pertencentes à seis espécies de duas famílias, entre elas Histiotus velatus. Estes dados mostram que a antropização dos habitats gera uma simplificação na estrutura das taxocenoses de morcegos (AGUIAR, 1994; PEDRO et al., 1995). De modo geral estudos que visam à obtenção de informações relacionadas à reprodução, exploração de refúgios, assim como quaisquer outros aspectos da biologia animal, só serão, de fato, reconhecidos e validados, frente a um embasamento sistemático seguro. O levantamento de dados precisos e específicos é possível apenas a partir da diferenciação taxonômica correta. Isto se deve ao fato de que muitas espécies apresentam estreitas relações de similaridade quanto aos caracteres morfoanatômicos, ecológicos e comportamentais. Além disso, devem ser consideradas as relações de simpatria e sintopia, comuns, não só em espécies de Myotis, mas em muitas outras, sobretudo, de Chiroptera. Seguindo as características distintivas sugeridas por LaVal (1973), Myers; Wetzel (1983), Anderson (1997) e López-González et al. (2001) que de fato somam as melhores referências taxonômicas para Myotis, a identificação destas espécies em campo é, em muitos casos, impraticável, já que se baseiam principalmente em diferenciação morfométrica cujos valores apresentam alto índice de superposição e variação geográfica (LOPEZ- GONZALEZ, 2001). Não obstante quando acrescidas características de fácil observação externa, como as dos pés, que foram sugeridas neste trabalho, o processo de identificação torna-se bastante seguro e, de certo modo, de simples execução. A garantia do quão precisa Ensaios e ci., Campo Grande, v. 9, n. 2, p. 293-304, ago. 2005 são estas informações está, obviamente, no número de indivíduos ora examinados. 4 CONCLUSÃO Este estudo permite afirmar que a partir da análise morfológica é possível solucionar problemas quanto à identificação de Myotis albescens, M. nigricans, M. simus e M. riparius. Entretanto foi necessário reunir um número considerável de informações morfométricas externas e cranianas. Em reserva, é prudente considerar a necessidade de coleção de maior número de exemplares de M. riparius e outras espécies do gênero. Não obstante, foi possível demonstrar que a expressão morfológica existe mesmo em espécies muito similares. Os dados morfométricos não constituem um meio restrito, objetivo e eficaz para a identificação segura das espécies de Myotis. Todavia a morfometria constitui um importante subsídio da taxonomia numérica, seja em qual grupo for considerada. EXTERNAL DISTINCTIVE MORPHOLOGIC CHARACTERISTICS OF Myotis albescens, M. nigricans, M. simus E M. riparius (CHIROPTERA; VESPERTILIONIDAE) ABSTRATC The familyVespertilionidae is composed of about 35 genus and 318 species and is considered one of the most diversified and cosmopolitan order of Chiroptera. Of the 75 species which occurs in the American Continent, 19 were already registered for Brazil. Syntopy is a quite commom feature among species of Myotis. Also, the species show various morphometric and morphological similarities. Therefore, it is important to define distinct characteristics among the taxa in order to provide sound interpretation to general biological data. In this paper, external morphological characteristics were selected which allow for safe field identification of Myotis species occurring in the state of Mato Grosso do Sul, Brazil. The point of insertion of the plagiopatagium as well as the color of the plantar region are characteristics which allow for secure distinction between M. albescens, M. nigricans, M. simus and M. riparius. Keywords: Chiropterofauna, Conservation, Identification, Bat, Sistematics. REFERÊNCIAS AGUIAR, L. M. S. Comunidades de Chiroptera em três áreas da Mata Atlântica em diferentes estádios de sucessão – Estação Ecológica de Caratinga, Minas Gerais. M. Sc. Thesis, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, M.G. 1994. ALLEN, G.M. Bats. Cambridge, Masschusetts: Harvard Univ. Press. 1939, 368 p. ANDERSON, S. Mammals of Bolivia. Taxonomy and distribution. Bull. Amer. Mus. Nat. Hist., [S.I.], v. 231, p. 1-652, 785, 1997. BAKER, R. J., PATTON, J. C., GENOWAYS, H.H. & BICKHAM, J.W. Genic studies of Lasiurus (Chiroptera: Vespertilionidae). Occas. Pap., Mus. Texas Tech Univ., v.117, p. 1-15, 1988. BAUD, F. J.; MENU, H. Paraguayan bats of the genus Myotis, with a redefinition of M. simus (Thomas, 1901). Rev. Suisse Zool., [S.I.], v.100, n.3, p. 595-607, 1993. DAVIS, W. B. Review of South American bats of the genus Eptesicus. Southeastern Nat., v.11, [S.I.], p. 245-274, 1966. KOOPMAN, K. F. Zoogeography of bats. Pp. 29-50 in About Bats (B. H. Slaughter and D. W. Walton, eds.). Dallas: Southern Methodist Univ. Press, 1970, 339 p. LAVAL, R. K. A revision of the Neotropical bats of the genus Myotis. Bull. Nat. Hist. Mus., Los Angeles Co., v.15, p. 1-54, 1973. LÓPEZ-GONZÁLEZ, C., et al. Taxonomic status of Myotis (Chiroptera : Vespertilionidae) in Paraguai. Journal of Mammalogy, [S.I.], v.82, n.1, p. 138-160, 2001. Ensaios e ci., Campo Grande, v. 9, n. 2, p. 293-304, ago. 2005 MARINHO-FILHO, J. Distribution of bat diversity in the southern and southeastern Brasilian Atlantic Forest. Chiroptera neotropical, [S.I.], v.2, n.2, p. 51-54, 1996. MARINHO-FILHO, J.; SAZIMA, I. Brazilian bats and conservation biology. A first survey. Pp. 282-294 in “Bat biology and consevation” (T. H. Kunz and P. A. Racey, eds.). Washington: Smithsonian Institution Press, 1998, 365p. MILLER, G. S. The families and genera of bats. Bul. U. S. Nat. Mus., [S.I.], v.57, 1907, 282p. MYERS, P.; WETZEL, R. M. Systematics and zoogeography of the bats of the Chaco Boreal. Misc. Publ., Mus. Zool. Univ. Michigan, v. 165, p. 1-59, 1983. NOWAK, R.M. Walker’s Mammals of the World. The Johns Hopkins University Press Baltimore and London, 1991, 642p. v.2. PEDRO, W. A. et al. Fragmentação de hábitat e a estrutura de uma taxocenose de morcegos em São Paulo. Chiroptera Neotropical, [S.I.], n.1, v.1, p.4-6, 1995. THOMAS, O. Notes on bats of the genus Histiotus. Ann. Mag. Nat. Hist., [S.I.], ser. 8, v.17, p.272-276, 1916. THOMAS, O. On Neotropical bats of the genus Eptesicus. Ann. Mag. Nat. Hist., [S.I.], ser. 9, v.5, p.360-367, 1920. TADDEI, V. A. Os morcegos. Pp.249-283 in: Insetos e outros invasores de residências. (F.A.M. Mariconi, coord.), “Biblioteca de Ciências Agrárias Luis de Queirós”, USP, Piracicaba, SP, 1ed., 1999, 460p. TADDEI, V. A. & VICENTE-TRANJAN, E. C. Biological and distributional notes on Platyrrhinus helleri (Chiroptera : Phyllostomidae) in Brazil. Mammalia, [S.I.], v.62, n.1, p. 112-117, 1998. VICENTE, E. C. Análises morfológica e morfométrica comparativas em espécies do gênero Platyrrhinus Saussure, 1860 (Chiroptera: Phyllostomidae). M. Sc. Thesis, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, 2000. VICENTE, E. C., LIMA, V. S. S.; TADDEI, V. A. Características morfológicas e padrões morfométricos diferenciais de espécies de Platyrrhinus Saussure, 1918 (Chiroptera: Phyllostomidae). 16O ENCONTRO DE BIÓLOGOS DO CRBIO-1 (SP, MT e MS), 2005. Resumo...Campo Grande: CRBio-1, 2005, p. WILLIAMS, D.F. Taxonomic and karyologic comments on small brown bats, genus Eptesicus, from South America. Ann. Carnegie Mus., [S.I.], v.47, n.16, p. 361-383, 1978. AGRADECIMENTOS Agradeço a Fundação Manoel de Barros (FMB), a Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal (UNIDERP), FUNDECT, Capes e CNPq pelo apoio financeiro. A Neiva Guedes e ao Prof. Dr. Erich Fischer (UFMS) e equipe pelo apoio e testes realizados com a chave artificial proposta neste trabalho. Aos Profs. Drs. Cleber Alho, Silvio Fávero, Reginaldo Donatelli, Wagner André Pedro e Rosemary Matias pela leitura cuidadosa (e valiosas contribuições) de meu trabalho de doutorado, do qual foi extraído este artigo. A Eveline Guedes, Larissa F. Oliveira, Marilize Duarte, e Luciene Andrade pelo auxilio na organização dos dados. Em especial ao Prof. Dr. Valdir Taddei, pela orientação, apoio, companheirismo e incentivo sempre prestados.
Compartilhar