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AULA 2 - transfusão de sangue

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1010
Transfusão de SangueTransfusão de Sangue
10.1 Generalidades10.1 Generalidades
De início, não haveria maiores problemas em realizar a transfusão de sangue,
 já que o método visa à salvaguarda da vida, direito essencial do ser humano. To-
davia, algumas religiões não a admitem, notadamente, as “Testemunhas de Jeo-
 vá”. A base religiosa que alegam para não permitirem ser transfundidos é obtida
em alguns textos contidos na Bíblia.1
No âmbito da bioética, ter-se-ia a contraposição dos princípios da autono-
mia, liberdade do paciente em não aceitar a transfusão ou seu responsável se for
incapaz ou interdito, e da beneficência, obrigatoriedade do médico em utilizar o
método apropriado para salvar o doente do mal que o acomete.
Dois direitos constitucionais e fundamentais, previstos no art. 5º, pelo me-
nos, o de preservar a vida e a consciência religiosa, estão envolvidos. Isso causa
acirrados debates.
1 Livro do Gênesis: “Todo animal movente que está vivo pode servir-vos de alimento. Como
no caso da vegetação verde, deveras vos dou tudo. Somente a carne com sua alma – seu san-
gue – não deveis comer.” Ou no Levítico: “Quando qualquer homem da casa de Israel ou algum
residente forasteiro que reside no vosso meio, que comer qualquer espécie de sangue, eu cer-
tamente porei minha face contra a alma que comer o sangue, e deveras o deceparei dentre seu
povo” ( Bioética clínica: reflexões e discussões sobre casos selecionados. Coordenação de Gabriel
Oselka. São Paulo: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo. Centro de Bioética,
2008, p. 158).
 
194194 Manual de Bioética e Biodireito • Namba
10.2 10.2 Constitucionalidade ou Constitucionalidade ou não da não da recusarecusa
Conforme mencionado no tópico anterior, existem alguns direitos em contra-
posição: da preservação da vida e da consciência religiosa, pelo menos.
Celso Ribeiro Bastos, respondendo a indagações da “Associação das Teste-
munhas Cristãs de Jeová”, em consulta jurídica, asseverou que o paciente tem
o direito de se recusar a determinado tratamento médico, no que se inclui a
transfusão de sangue, com fundamento no art. 5º, II, da Constituição Federal,
porque, por este dispositivo, fica certo que ninguém é obrigado a fazer ou deixar
de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (princípio da legalidade). Como
não há lei obrigando o médico a fazer a transfusão de sangue no paciente, to-
dos aqueles que sejam adeptos da religião “Testemunhas de Jeová”, e que se
encontrarem nesta situação, certamente poderão recusar-se a receber o referido
tratamento, não podendo, por vontade médica, serem constrangidos a sofrerem
determinada intervenção. O seu consentimento, nesta hipótese, é fundamental.
Seria mesmo desarrazoado ter um mandamento legal obrigando a certo trata-
mento, até porque podem existir ou surgir meios alternativos para se chegar a
resultados idênticos.
2
Mesmo sob iminente perigo de vida deve-se alterar o quadro jurídico, até
porque o ordenamento jurídico não pune aquele que tenta o suicídio.
Inexiste conflito entre direito à vida e a privacidade e a liberdade (em sentido
amplo), já que todos eles devem ser entendidos em conjunto. O direito à vida é
dirigido contra a sociedade e contra o Estado, invocável contra terceiros. Este é
seu correto alcance. Vige, pois, a ampla liberdade e o direito à integridade da
pessoa humana.3
De outro lado, poder-se-ia contra-argumentar que o direito à vida é absoluto,
ou seja, não pode ser disponível, e não se pode negar que a recusa ou atraso no
procedimento reflete certa disposição, em última análise, da existência do ser
humano, prevalecendo opinião técnica, do médico, para a realização da trans-fusão de sangue, mesmo contrária ao posicionamento do paciente ou de seus
representantes legais.
 A situação seria mais delicada acaso quem deveria sofrer a transfusão esti-
 vesse em sério perigo de perder seu bem mais precioso, a vida. Ao que parece,
o exercício da consciência religiosa não poderia sobrepujar à preservação do
paciente.
2 BASTOS, Celso Ribeiro. Direito de recusa de pacientes submetidos a tratamento terapêutico
às transfusões de sangue, por razões científicas e convicções religiosas. RT , São Paulo, v. 787, maio
2001, p. 505.
3 BASTOS, Celso Ribeiro. Direito de recusa de pacientes submetidos a tratamento terapêutico às
transfusões de sangue, por razões científicas e convicções religiosas, p. 506.
 
Transfusão de Sangue 195195
10.3 10.3 Parâmetros Parâmetros do Conselho Rdo Conselho Regional de Medicina do egional de Medicina do EstadoEstado
de São Paulo e do Conselho Nacional de de São Paulo e do Conselho Nacional de Ética paraÉtica para
Ciências da Vida (Portugal)Ciências da Vida (Portugal)
 A matéria não é problemática apenas em nosso país, por isso mesmo, a com-
paração com outras proposições é conveniente para o correto enquadramento do
assunto.
 A tendência, por estudo realizado pelo Conselho Regional de Medicina do
Estado Paulista, é aceitar a recusa na transfusão de sangue, com respeito à au-
tonomia, invocando-se os arts. 56 (veda-se ao médico “desrespeitar o direito do
paciente de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou te-
rapêuticas, salvo em caso de iminente perigo de vida”), 48 (o médico não pode
“exercer sua autoridade de maneira a limitar o direito do paciente de decidir
livremente sobre sua pessoa ou seu bem-estar”) e 51 (por analogia, veda-se: “ali-
mentar compulsoriamente qualquer pessoa em greve de fome que for considera-
da capaz física e mentalmente, de fazer juízo perfeito das possíveis consequências
de sua atitude. Em tais casos, deve o médico fazê-la ciente das prováveis compli-
cações do jejum prolongado e, na hipótese de perigo de vida iminente, tratá-la”)
do Código de Ética Médica e pareceres nesse sentido:
• Parecer Consulta 19.123/94: “torne-se claro que o paciente tem o direi-
to de decidir quanto à sua aceitação ou não, de transfusão de sangue,
baseado em crença, religião, ou qualquer outra condição inerente à sua
 vontade”. Menciona-se, ainda, “embora jurisprudencialmente, no Brasil,
se tenda a considerar a vida como sendo um ‘bem indisponível’, do qual
a pessoa conscientemente não teria o direito de abrir mão, a posição
pode ser questionada. Afinal, a Constituição assegura o ‘direito à vida’ e
não ‘o dever à vida’”.
• Parecer 27.278/96: “deverá o médico procurar os recursos técnicos e
científicos para proteger a saúde do paciente, sem contrariar sua von-
tade expressa. Contudo, com relação à criança, a transfusão deve ser
realizada perante risco iminente de morte”.
• Parecer 41.191/99: “o Código de Ética Médica vigente, não se desape-
gando plenamente do Princípio da Beneficência, deixa realmente uma
brecha para a intervenção compulsória do médico em situações de imi-
nente risco de morte.”4
 A situação é controversa quanto se trata de crianças. Uns acreditando que não
deveria prevalecer a vontade dos pais; para outros, que ela prevaleceria a não ser
em caso de iminente risco de morte, com base no princípio da beneficência.
4 OSELKA, Gabriel (Coord.). Bioética clínica: reflexões e discussões sobre casos selecionados,
p. 158-159.
 
196196 Manual de Bioética e Biodireito • Namba
O Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida de Portugal, de seu
lado, no Parecer nº 46, de junho de 2005, emitiu as seguintes opiniões:
1. Ao médico é reconhecido o dever de agir em benefício do doente,
usando os meios indicados para o tratar, pelo que são justificados os
atos terapêuticos que se destinam a salvar a vida, designadamente a
administração de sangue quando está clinicamente indicada.
2. A autonomia implica a capacidade do doente para exprimir as suas
preferências, nomeadamente as decorrentes das suas convicções reli-
giosas.
3. A recusa em aceitar transfusões de sangue e hemoderivados enquadra-
-se no direito de o doente decidir sobre os cuidados de saúde que de-
seja receber, desde que lhe seja reconhecida a capacidade para tal e
existam condições para a exercer.
4. A recusade tratamento com sangue e hemoderivados em situação de
perigo de vida só pode ser considerado pelo médico quando é o pró-
prio destinatário da terapêutica e manifestá-la de um modo expresso
e livre.
5. Para qualquer tratamento existe o dever de esclarecimento prévio, o
qual, em caso de haver recusa, deverá ser reiterado.
6. Quando haja uma recusa válida o médico e/ou outros profissionais de
saúde têm o dever de a respeitar.
7. Embora não se requeira que o consentimento revista uma forma de-
terminada, é da máxima conveniência, para fins probatórios, que seja
adotada a forma escrita.
8. A manifestação antecipada da vontade tem apenas um valor indica-
tivo, não dispensando a obtenção do consentimento informado que
obriga a um efetivo esclarecimento quanto às consequências da recusa
de tratamento.
9. Em situações de extrema urgência, com risco de vida em que o pacien-
te não possa manifestar o seu consentimento, é o mesmo dispensado,
prevalecendo o dever de agir decorrente do princípio da beneficência
consagrado na ética médica.
10. Os doentes interditos ou com anomalia psíquica e os doentes menores
de idade carentes do discernimento necessário não podem considerar-
-se como tendo competência para assumir decisões sobre cuidados da
saúde, pelo que são justificados os atos terapêuticos para os quais não
foi obtido consentimento e que se destinam a salvar a sua vida ou
prevenir sequelas, designadamente a administração de sangue e he-
moderivados.
 
Transfusão de Sangue 197197
11. Nas situações anteriores, deve ser requerida a autorização dos repre-
sentantes legais, prevalecendo igualmente, em caso de recusa, o dever
de agir decorrente do princípio da beneficência, porquanto aquela au-
torização não corresponde ao exercício da autonomia, pessoal e inde-
legável, sem prejuízo do recurso às vias judiciais quando indicado.
 Aqui, também, respeita-se a vontade do paciente, recomendando-se que sua
recusa na transfusão seja obtida por escrito. No que tange a interditos ou com
anomalia psíquica e menores, deve-se intervir para assegurar a integridade da
 vida, mesmo com vontade contrária dos representantes legais.
10.4 Jurisprudência10.4 Jurisprudência
 A jurisprudência não ficou alheia à discussão, para conciliar os diferentes
diplomas legais para a melhor solução da controvérsia.
Exarou-se V. Acórdão muito interessante, em São Paulo, em que não se ques-
tionou a recusa ao tratamento sem a transfusão de sangue, todavia, os recusantes
não poderiam impor sua vontade para o plano de saúde, por utilizarem médicos
de cidade não abrangente:
“Plano de Saúde – Esposa do autor que, fazendo uso de medicação anti-
coagulante, apresentou quadro de hemorragia no ovário, para a qual seria
necessária intervenção cirúrgica – Médicos credenciados que não se com-
prometeram a não utilizar, durante o procedimento, transfusão sanguínea,
caso esta se fizesse estritamente necessária – Autor e paciente se dirigiram
a outros nosocômios, buscando profissionais que realizassem o procedi-
mento em seus termos. Tratamento ministrado em cidade fora da abran-
gência do plano contratado – Reembolso – Impossibilidade – Livre escolha
por atendimento em hospital descredenciado – Ausência de negativa de
cobertura pelo plano – Não constatada qualquer abusividade – Ré cumpriu
com sua obrigação contratual – Rede credenciada que estava apta para a
realização do procedimento – Recusa que se deu por parte dos contratan-
tes – Recusa ao tratamento que é direito do indivíduo – Todavia, não se
pode compelir o plano de saúde a arcar com ônus maior que o contratado
se os autores escolherem não fazer uso do serviço – Recurso desprovido”
( Apelação Apelação nnº 0001509-65.2004.8.26.0150 0001509-65.2004.8.26.0150 – 6ª Câmara de Direito Pri-
 vado do Tribunal de Justiça de São Paulo – Relatora Desembargador Ana
Lucia Romanhole Martucci – J. 5.9.2013).
Noutro V. Acórdão decide-se de maneira similar, acentuando a possibilidade
de intervenção mesmo com a recusa religiosa:
 
198198 Manual de Bioética e Biodireito • Namba
“Plano de saúde – Cirurgia autorizada – Recusa da ré em garantir a res-
trição de transfusão de sangue – Convicção religiosa do paciente – Dano
moral não configurado – Realização fora da rede credenciada – Reembolso
não previsto no contrato – Indenização por dano material indevida – Re-
curso improvido” ( Apelação Cível Apelação Cível com Revisão ncom Revisão nº 442.163-4/1-00 442.163-4/1-00 – 8ª 
Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
– Relator Desembargador Caetano Lagrasta – J. 13.6.2007).
Respeitou-se o direito à crença religiosa, existindo técnica alternativa, em
Julgado do Mato Grosso, por maioria de votos:
“TESTEMUNHA DE JEOVÁ – PROCEDIMENTO CIRÚRGICO COM POS-
SIBILIDADE DE TRANSFUSÃO DE SANGUE – EXISTÊNCIA DE TÉCNICA
 ALTERNATIVA – TRATAMENTO FORA DO DOMICÍLIO – RECUSA DA AD-
MINISTRAÇÃO PÚBLICA – DIREITO À SAÚDE – DEVER DO ESTADO – RES-
PEITO À LIBERDADE RELIGIOSA – PRINCÍPIO DA ISONOMIA – OBRIGA-
ÇÃO DE FAZER – LIMINAR CONCEDIDA – RECURSO PROVIDO. Havendo
alternativa ao procedimento cirúrgico tradicional, não pode o Estado recu-
sar o Tratamento Fora do Domicílio (TFD) quando ele se apresenta comoúnica via que vai ao encontro da crença religiosa do paciente. A liberdade
de crença, consagrada no texto constitucional não se resume à liberdade de
culto, à manifestação exterior da fé do homem, mas também de orientar-se
e seguir os preceitos dela. Não cabe à administração pública avaliar e jul-
gar os valores religiosos, mas respeitá-los. A inclinação de religiosidade é
direito de cada um, que deve ser precatado de todas as formas de discrimi-
nação. Se por motivos religiosos a transfusão de sangue apresenta-se como
obstáculo intransponível à submissão do recorrente à cirurgia tradicional,
deve o Estado disponibilizar recursos para que o procedimento se dê por
meio de técnica que dispense-na, quando na unidade territorial não haja
profissional credenciado a fazê-la. O princípio da isonomia não se opõe a
uma diversa proteção das desigualdades naturais de cada um. Se o Sistema
Único de Saúde do Estado de Mato Grosso não dispõe de profissional com
domínio da técnica que afaste o risco de transfusão de sangue em cirurgia
cardíaca, deve propiciar meios para que o procedimento se verifique fora
do domicílio (TFD), preservando, tanto quanto possível, a crença religiosa
do paciente” (Número de protocolo 22395/2006Número de protocolo 22395/2006 – 5ª Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso – Relator Desembargador
Sebastião de Arruda Almeida – Julg. 31.5.2006).
Em outro momento, no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em que
a vida estava em perigo, considerou-se desnecessária a intervenção judicial,
devendo-se efetivar a transfusão de sangue, sem consentimento da paciente ou
familiar:
 
Transfusão de Sangue 199199
“(....) Inexiste, pois, a omissão apontada, porquanto a ementa reflete
os fundamentos jurídicos adotados pela maioria, no sentido de que, em
se tratando de autorização para transfusão de sangue em paciente tes-
temunha de Jeová –, não há necessidade de intervenção judicial, pois o
profissional de saúde tem o dever de, havendo iminente perigo de vida,
empreender todas as diligências necessárias ao tratamento da paciente, in-
dependentemente do consentimento dela ou de seus familiares. Embargosde declaração rejeitados” (Número do processo 70021268982Número do processo 70021268982 – 5ª Câ-
mara Cível – Relator Desembargador Umberto Guaspari Sudbrack – Julg.
26.9.1997). Posição já asseverada em outro V. Acórdão (Número do pro-Número do pro-
cesso 70020868162cesso 70020868162 – 5ª Câmara C ível – Relator Desembargador Umberto
Guaspari Sudbrack – Julg. 22.8.2007).
No Estado de São Paulo, já se pronunciou pelo acerto da conduta de se reali-
zar a transfusão de sangue, mesmo com a recusa do paciente:
“AÇÃO CAUTELAR INOMINADA – Hospital que solicita autorização judi-
cial para realizar transfusão de sangue em paciente que se encontra na
UTI,com risco de morte, e que se recusa a autorizá-la por motivos reli-
giosos – Liminar bem concedida porque a Constituição Federal preserva,
antes de tudo, como bem primeiro, inviolável e preponderante, a vida dos
cidadãos – Jurisprudência deste Tribunal de Justiça do Estado de São Pau-
lo – Recurso não provido” ( Agravo de Instrumento n Agravo de Instrumento nº 307.693-4/4 307.693-4/4 – 7ª 
Câmara de Junho/2003 de Direito Privado – Relator Desembargador Maia
da Cunha – Julg. 20.10.2003).
Noutro V. Acórdão, não se reconheceu a existência de responsabilidade civil,
por dano moral, pela feitura da cirurgia com o procedimento:
“DANO MORAL – Responsabilidade civil – Contrato – Prestação de Ser-
 viços – Plano de Saúde – Necessidade de tratamento cirúrgico pelo autor
– Inexistência de recusa da requerida em autorizar a cirurgia – Pedido deque o procedimento fosse realizado sem transfusão de sangue – Convicção
religiosa do paciente – Comprometimento que não poderia ser assumido
pela ré – Dano moral não configurado – Indenização indevida – Decisão
mantida – Recurso improvido” ( Apelação Apelação Cível Cível nnº 442.163-4/1-00 442.163-4/1-00 – 8ª 
Câmara de Direito Privado – Relator Desembargador Caetano Lagrasta –
Julg. 13.6.2007).
Num outro Julgado, além de se reconhecer a prevalência da vida, na esfera da
Constituição Federal, anotou-se que os tratamentos alternativos foram esgotados,
não havendo recusa expressa da transfusão quando da internação da paciente:
“INDENIZATÓRIA – Reparação de danos – Testemunha de Jeová – Rece-
bimento de transfusão de sangue quando de sua internação – Convicções
 
200200 Manual de Bioética e Biodireito • Namba
religiosas que não podem prevalecer perante o bem maior tutelado pela
Constituição Federal que é a vida – Conduta dos médicos, por outro lado,
que se pautou dentro da lei e ética profissional, posto que somente efetua-
ram as transfusões sanguíneas após esgotados todos os tratamentos alter-
nativos – Inexistência, ademais, de recusa expressa a receber transfusão de
sangue quando da internação da autora – Ressarcimento, por outro lado,
de despesas efetuadas com exames médicos, entre outras, que não mereceacolhida, posto não terem sido os valores despendidos pela apelante – Re-
curso não provido” ( Apelação Cível n Apelação Cível nº 123.430-4 123.430-4 – 3ª Câmara de Direito
Privado – Relator Desembargador Flávio Pinheiro – Julg. 7.5.2002).
 Aliás, pelo estrito cumprimento do dever médico, decidiu-se pela não neces-
sidade da autorização judicial para a transfusão sanguínea:
“MEDIDA CAUTELAR – Autorização judicial para cirurgia e transfusão de
sangue em paciente necessitada que se recusa à prática do ato por questão
religiosa – Desnecessidade – Estrito cumprimento do dever legal do médi-
co – Recurso não provido” ( Apelação Cível n Apelação Cível nº 264.210-1 264.210-1 – 6ª Câmara de
Direito Privado – Relator Desembargador Testa Marchi – Julg. 1
º
.8.1996).
Na esfera penal, igualmente, ocorreram decisões sobre a transfusão de san-
gue em quem é “Testemunha de Jeová”, descaracterizando-se as condutas em
típicas.
Não seria tipificada a conduta de médico, mesmo contrariando a vontade
expressa de quem é responsável, ao realizar a transfusão de sangue:
“CONSTRANGIMENTO ILEGAL – Inteligência: art. 132 do Código Penal,
art. 135 do Código Penal, art. 17 do Código Penal, art. 146, parágrafo 3º, I,
do Código Penal 162 (f) – Uma vez comprovado efetivo perigo de vida para
a vítima, não cometeria delito nenhum o Médico que, mesmo contrariando
a vontade expressa dos por ela responsáveis, à mesma tivesse ministrado
transfusão de sangue” ( Habeas Corpus n nº 184.642/5 184.642/5 – 9ª Câmara do Tri-
bunal de Alçada Criminal de São Paulo – Relator Juiz Marrey Neto – Julg.
em 30.8.1989).
Em outro momento, não incidiu em omissão de socorro responsável que não
permitiu a transfusão de sangue, porém, aderiu a tratamento alternativo:
“OMISSÃO DE SOCORRO – Agentes que não permitem a transfusão de
sangue a vítima menor – Socorro ministrado sob diferente forma terapêu-
tica – Inteligência: art. 132 do Código Penal, art. 135 do Código Penal, art.
17 do Código Penal, art. 146, parágrafo 3º, I, do Código Penal – Ausência
de justa causa para ação penal – Ordem concedida para o seu trancamento.
 
Transfusão de Sangue 201201
162 (d) – No crime de omissão de socorro, diferentemente do crime de
abandono de incapaz, o dever de assistência não está ligado a relações
 jurídicas especiais e qualquer pessoa está adstrita a socorrer, desde que
lhe seja possível fazê-lo em risco pessoal. O que o art. 135 do CP define
como crime é a falta de assistência. Comprovado que as acusadas estão
assistindo a menor, ainda que através de terapêutica distinta, mas abona-
da por critério médico, inexiste justa causa, sob esse título, para a açãopenal” ( Habeas Corpus n nº 184.642/5 184.642/5 – 9ª Câmara do Tribunal de Alçada
Criminal de São Paulo – Relator Juiz Marrey Neto – Julg. 30.8.1989 – RJD-
TACRIM 7/175).
Noutro sentido decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo, em caso de ho-
micídio:
“Homicídio – Sentença de pronúncia – Pais que segundo consta, impe-
dem ou retardam transfusão de sangue na filha, por motivos religiosos,
provocando-lhe a morte. Médico da mesma religião que, também segundo
consta, os incentiva a tanto e ameaça de processo os médicos que assistiam
a paciente, caso realizem a intervenção sem o consentimento dos pais –Ciência da inevitável consequência do não tratamento – Circunstâncias
que, em tese, caracterizam o dolo eventual, e não podem deixar de ser le-
 vados à apreciação do júri – Recursos não providos” (Recurso em SentidoRecurso em Sentido
Estrito nEstrito nº 993.99.085354-0 993.99.085354-0 – 9ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal
de Justiça de São Paulo – Relator Desembargador Francisco Bruno – J.
28.1.2010).
“HABEAS CORPUS – Pretendido trancamento de ação penal – Homicídio
– Paciente que influenciou para que a vítima fatal, testemunha de Jeová,
não recebesse transfusão de sangue – Alegando os motivos espirituais e de
religião – Fato típico – Ausente a falta de justa causa – Ordem denegada”
( Habeas Corpus n nº 253.458-3 253.458-3 – 3ª Câmara do Tribunal de Justiça do Esta-
do de São Paulo – Relator Desembargador Pereira Silva – Julg. 5.5.1998).
10.5 Considerações finais10.5 Considerações finais
 A questão é tormentosa. Existem argumentos para a proibição da transfusão
sanguínea pela religião professada pelo doente e outros favoráveis, principal-
mente se a vida está na iminência de ser comprometida.
Embora a incerteza pareça predominar, deve-se atentar para os princípios
da bioética na solução de um caso concreto (autonomia, beneficência, não ma-
leficência e justiça), não se olvidando de direitos fundamentais insertos na Carta
Magna (direito à vida e à liberdade religiosa).
 
202202 Manual de Bioética e Biodireito • Namba
Deve-se ter cuidado para evitar o predomínio de interesses menores, daque-
les que desejam se aproveitar do suplício de outrem para obterem benefícios
indevidos. Exemplo disso é encontrado se alguém está interessado na herança de
uma pessoa que professa uma religião e, em face disso, quer evitar a transfusão
de sangue, almejando, em verdade, o falecimento e a sucessão universal. Outra
hipótese similar é a de quem fica em silêncio, permite a transfusão de sangue, de-
pois alega motivos religiosos para não aceitar o procedimento feito para ajuizar
ação de dano moral contra o hospital e médicos.
Não se pode desconsiderar, igualmente, que o médico jurou defender a saúde
e a vida dos pacientes e, se está em uma situação de dubiedade, não pode ser
responsabilizado por agir de pronto para garanti-los e, possivelmente, realizar a
transfusão de sangue, mesmo diante da recusa do paciente ou dos responsáveis.
 Ao verificar sua conduta, num possível questionamento, atentar se desprezou, de
maneira total, aquelas vontades ou se teve de agir para salvaguardar os deveres
de sua profissão.
O médico, atualmente, não tem, conforme se verá,de prolongar uma vida que
 vai se extinguir (distanásia), porém, deixar uma viável não prosseguir por falta de
autorização de uma pessoa ou indivíduos para a transfusão em foco, não parece
ser a melhor medida. Se agir assim, dificilmente terá responsabilidade civil.
Deve-se realizar a “ponderação de valores”, crença religiosa e vida humana,
diante desse contraste, numa sociedade predominantemente laica, parece pre-
ponderar o último aspecto. Se possível salvar alguém por transfusão de sangue,
deve-se fazê-lo, mesmo sem autorização judicial, a menos que se tenha em mãos
os meios alternativos e se comprometa em usá-los dadas as circunstâncias pecu-
liares do caso concreto.
No caso concreto, o resultado do exame necroscópico será importante, por-
que, se a pessoa optou em não realizar a transfusão sanguínea, havia meios al-
ternativos para seu tratamento, o médico utilizou-os, todavia, se aquela técnica
usada pudesse salvar sua vida, esse será o ponto controverso. Num primeiro mo-
mento, parece estar isento o médico, porém, se ele não se despe de sua condiçãoprofissional, deveria analisar a situação e intervir, se possível.

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