Buscar

Aula15 - Era Trump_ON

Prévia do material em texto

1
15
ATUALIDADES
Era Trump
Alessandra de Fatima Alves 
C
ATUALIDADES
H
2
3
Era Trump
Em 2019, Donald Trump completou dois anos de seu primeiro ano de mandato como presidente dos Estados 
Unidos da América. Foi tempo suficiente para mostrar que ele é, em muitos sentidos, um líder como os estaduniden-
ses nunca viram antes. Defensor de projetos polêmicos, sempre pronto a dizer ou postar no Twitter suas verdades, 
Trump chegou ao cargo contrariando a maioria das previsões e pesquisas.
Vencedor pelo sistema do colégio eleitoral, mesmo tendo recebido menos votos que a adversária Hillary 
Clinton, o empresário assumiu o comando de um país dividido. Sua taxa de aprovação na posse, de apenas 40%, 
foi a menor entre seus três antecessores mais recentes e estava 40 pontos abaixo da de Barack Obama. Atualmen-
te, a taxa de Trump se mantém nesse mesmo patamar.
De polêmica em polêmica, no entanto, Trump seguiu adiante e conseguiu implementar algumas de suas 
propostas, como a reforma fiscal e a restrição à entrada de estrangeiros de alguns países nos EUA, sob a alegação 
de defender a segurança da nação.
Um breve histórico
Donald John Trump nasceu e cresceu no bairro Jamaica, no distrito do Queens, na cidade de Nova Iorque. 
Se formou bacharel em Economia pela Wharton University Pensylvânia, em 1968. Seu pai, Frederick Christ Trump, 
foi um empresário estadunidense que fez fortuna no ramo da construção civil, por meio de subsídios públicos e 
benefícios fiscais. No ano de 1971, Donald recebeu de seu pai o controle da empresa de imóveis Elizabeth Trump & 
Son, renomeando-a para The Trump Organization. Ao longo de sua carreira, construiu torres de escritórios, hotéis, 
cassinos, campos de golfe e outros empreendimentos em todo o Planeta.
Virou celebridade quando participou de programas de TV, sendo um deles o reality show exibido na NBC, 
The Apprentice. Entretanto, embora a fama e seus negócios estivessem em expansão, entrou em endividamento. 
Muitas das notícias sobre ele, na década de 1990, envolviam seus problemas financeiros, que tiveram como conse-
quência seu divórcio com a primeira esposa, Ivana Trump. No final dos anos 1990, foi que se viu um ressurgimento 
em sua situação financeira e fama. Em 2001, completou a Trump World Tower e começou a construir o Trump Pala-
4
ce, um edifício moderno, ao longo do rio Hudson. Atu-
almente, possui vários metros quadrados das melhores 
áreas imobiliárias de Manhattan e continua sendo uma 
figura importante no domínio do comércio imobiliário, 
nos Estados Unidos, e uma celebridade.
Trump Tower, em Manhattan, NY
Pode-se dizer que sua carreira política começou 
quando, no ano 2000, tentou receber a nomeação pre-
sidencial do Partido Reformista. Entretanto, retirou-se 
antes mesmo do início das votações. No ano de 2015, 
anunciou sua candidatura para Presidência como um 
republicano e cresceu nas pesquisas como favorito 
para nomeação do seu partido. Em junho de 2016, foi 
formalmente nomeado como candidato à Presidência 
pela Convenção Nacional Republicana.
Republicanos × democratas: 
o impasse de Washington
Historicamente, os republicanos sempre foram a 
favor de redução nos impostos e nos gastos do gover-
no – o setor privado seria o motor da economia. Os de-
mocratas, que consideram importante um Estado ativo 
no processo econômico, defendem mais contribuições 
da população e também aumento dos investimentos 
governamentais. Para eles, o setor público, aliado ao 
privado, pode ser o responsável pelo crescimento.
Esta divisão se reflete em toda a sociedade es-
tadunidense. Por este motivo, o país costuma dividir-se 
ao meio em eleições. Outros fatores também diferen-
ciam os republicanos, que tendem a ser mais conser-
vadores em questões sociais, e os democratas, que são 
mais liberais. Há variações em política externa que in-
fluenciam no voto, em épocas de insegurança, como 
no pós-11 de Setembro.
Para entender melhor
Para tornar-se presidente dos Estados Uni-
dos da América, os candidatos precisam alcançar 
o número de 270 dos 538 delegados no colégio 
eleitoral. Significa dizer que a votação nos EUA é 
indireta. Além disso, o voto não é obrigatório. Deste 
modo, os eleitores de cada Estado depositam em 
urnas o voto no candidato escolhido. Quem fizer 
mais votos nas urnas em cada Estado vira o candi-
dato daquela região no colégio eleitoral.
Nem todos os Estados têm pesos iguais 
na eleição dos EUA. É o censo populacional que 
define o número de delegados de cada região. A 
Califórnia, por exemplo, tem população mais de 
dez vezes maior que a de Connecticut e, portanto, 
tem 55 delegados contra sete do outro Estado.
As eleições dos EUA de 2016
Pesquisas mostraram que, na eleição à Presi-
dência, os Estados Unidos estiveram tão divididos que 
metade do eleitorado mal conseguiu entender a outra 
metade. O fenômeno Donald Trump se tornou o tema 
dominante na cobertura da eleição, deixando de lado 
as usuais questões típicas de uma campanha presiden-
cial envolvendo economia e política externa.
Mas quem são as pessoas que votaram em 
Trump? São os chamados “Bloco”. Trata-se de um 
grupo que corresponde a cerca de 40% do eleitora-
do. Não representa uma maioria, mas é o maior grupo 
unificado de eleitores dos EUA. Perdeu quatro das úl-
timas seis eleições presidenciais, mas deu ao Partido 
Republicano o controle do congresso e do governo de 
vários Estados, tornando quase impossível para admi-
nistrações democratas a missão de governar o país.
O Bloco não foi criado pela grande recessão de 
2008 ou pelo 11 de Setembro, mas sim por uma série 
de eventos que foi aumentando cada vez mais as filei-
ras de eleitores republicanos. Segundo o professor e 
pesquisador Todd Gitlin, da Universidade de Columbia, 
esses eleitores republicanos vão crescendo à medida 
5
que há algum tipo de deslocamento econômico. São 
majoritariamente brancos que previamente já vota-
ram em candidatos democratas. As origens do Bloco 
remontam a crise da década de 1930, mais especifi-
camente nos períodos de seca, que criaram um êxodo 
rural dos Estados de Oklahoma e Kansas.
A Grande Depressão causou pobreza geral nos Estados Unidos e em di-
versos países do mundo. Nesta foto, temos uma família desempregada 
vivendo em condições miseráveis, em Elm Grove, Oklahoma, EUA.
Muitos desses fazendeiros e suas famílias foram 
para a Califórnia, transformando-se em partidários de 
políticos republicanos, como Barry Goldwater, o can-
didato derrotado na eleição presidencial de 1964. No 
final da década de 1960, muitos brancos do sul junta-
ram-se ao Bloco por conta da aprovação da legislação 
que deu à população negra igualdade de direitos, in-
clusive o voto.
Nos anos 1970 e 1980, recessões levaram ao 
fechamento de fábricas no norte dos EUA. Comuni-
dades, em regiões como Johnstown, na Pensilvânia, 
foram devastadas pelo desemprego, e muitas pesso-
as tiveram que deixar a região para procurar trabalho, 
normalmente em condições bem diferentes das que 
tinham sustentado gerações e permitido o crescimento 
de comunidades. Também se juntaram ao Bloco pes-
soas que discordaram da decisão judicial que deu às 
mulheres estadunidenses o direito de aborto, em 1973 
– o Partido Republicano tradicionalmente se opõe à 
interrupção da gravidez.
Nos últimos 50 anos, os democratas também 
passaram por mudanças. Sua configuração é mais di-
versa e dedicada a usar a legislação de direitos civis 
para reverter os efeitos de anos de discriminação con-
tra minorias e mulheres, além de defender uma legisla-
ção mais liberal em assuntos de sexualidade.
Uma maioria esmagadora de negros e signifi-
cante de hispânicos e asiáticos vota nos democratas, 
enquanto brancos com curso superior dominam o par-
tido. O Bloco não está, porém, permanentemente atre-
lado ao Partido Republicano, e os democratas teriam 
mais facilidade para governar se pudessem recuperar 
alguns desses eleitores;e a melhor maneira de fazer 
isso está diretamente relacionada ao emprego.
Entre as razões para a vitória de Trump es-
tão a chamada “onda branca”. Os democratas con-
fiaram demais em sua força no centro-oeste. Esses 
Estados foram reduto do partido por décadas, em 
parte por causa do apoio dos eleitores negros e 
da classe trabalhadora branca. Mas os brancos da 
classe trabalhadora, especialmente aqueles sem for-
mação universitária – homens e mulheres –, aban-
donaram o partido democrata. Os eleitores rurais 
compareceram às urnas em peso e, assim como os 
estadunidenses que se sentiram negligenciados pelo 
sistema e deixados para trás pela elite, fizeram suas 
vozes serem ouvidas.
Além disso, Trump insultou o veterano de guer-
ra John McCain, senador republicano. Comprou uma 
briga com a jornalista Megyn Kelly, âncora da Fox 
News. Fez um pedido de desculpas protocolar após 
o vazamento de um vídeo em que fazia comentários 
obscenos sobre mulheres. No entanto, nada disso foi 
relevante para resultar em uma derrota nas urnas. Em-
bora tenha caído nas pesquisas após algumas polêmi-
cas, sua aprovação parecia blindada – voltando a subir 
logo depois.
Ele disputou a eleição contra os democratas, 
mas também enfrentou forças dentro do próprio par-
tido. O republicano desbancou seus adversários re-
publicanos nas primárias. Alguns, como Marco Rubio, 
Ted Cruz, Chris Christie e Ben Carson, eventualmente 
se renderam e passaram a apoiá-lo. Outros, como o 
ex-governador da Flórida, Jeb Bush, e o governador 
de Ohio, John Kasich, disseram que não o apoiariam. 
Muitas vezes, mostrou-se disposto a fazer oposição a 
figurões do próprio partido.
6
Eleição dos Estados Unidos da América
A estratégia vencedora: o ultraconservadorismo
A perplexidade generalizada com o resultado 
das eleições resultou em uma reflexão mais apurada, 
em que o sucesso de Trump não ocorreu apesar de sua 
figura polêmica, mas exatamente por causa dela, ou 
seja, o machismo, a xenofobia e a intolerância do can-
didato fizeram parte de uma bem-sucedida estratégia 
publicitária.
Donald Trump é, portanto, sintoma de um fenô-
meno que os progressistas ignoraram por muito tempo, 
em que a adesão à ética “antiética” ilustra o esgota-
mento de uma cultura política de pretensões universais 
e civilizatórias, tida como inerente a nações desenvol-
vidas e democracias consolidadas. É ingênuo acreditar 
que essa estratégia não havia produzido resultados 
positivos antes. Eles apareceram, apesar de esparsos e 
localizados, nas vitórias de candidatos municipais que 
apostaram no mesmo tipo de ética antipolítica adota-
da por Trump e que tiveram, como ele, um público pre-
disposto a aceitá-la. O sucesso das iniciativas regionais 
representou o primeiro passo para o fenômeno atingir 
dimensões nacionais.
Isso mostrou que o republicano soube reprodu-
zir a imagem de liderança que as pesquisas qualitativas 
demonstraram ser mais atraente para seu público-alvo. 
O risco de incorporar tal personagem nunca seria as-
sumido, numa campanha bilionária com centenas de 
profissionais envolvidos, se houvesse qualquer possibi-
lidade de fracasso. Ele poderia, é claro, ter optado por 
um equilíbrio e parcimônia em suas atitudes, atuando 
de forma comedida e adotando perfil ameno e hipócrita, 
como tantos candidatos. No entanto, perderia a disputa, 
pois ficaria associado à figura do político tradicional.
A persuasão executada por Trump nas eleições 
se deu longe do campo da retórica, isto é, o esforço 
maior foi o de negar valores identificados com o cam-
7
po democrata, principalmente aqueles que compõem 
o repertório do “politicamente correto”, assimilado 
por seus opositores como elitista, hipócrita, burocrá-
tico e injusto.
O perigo do ultraconservadorismo não reside na 
aparição de representantes modestos ou identificados 
com alas radicais, mas sim encontra-se, principalmente, 
no fortalecimento desse imaginário, até ele ganhar re-
alce nas estatísticas, envolvendo os partidos de modo 
que as contribuições financeiras e as lideranças presti-
giadas tornem o projeto atraente e competitivo.
Tendências na política externa
Os Estados Unidos – país cuja história oscilou 
entre momentos de abertura ao mundo e momentos 
de reclusão – entrou em uma fase de recuo que saco-
de alguns dos pilares que sustentaram sua hegemonia. 
Já em sua primeira semana na Casa Branca, Donald 
Trump decretou o fechamento das fronteiras a pessoas 
que estão fugindo da miséria econômica, da persegui-
ção política ou de guerras civis, e abriu uma crise diplo-
mática com o vizinho do sul, o México.
Uma de suas primeiras decisões foi retirar seu 
país do Tratado Transpacífico (TTP), um tratado de livre 
comércio com países da bacia do Pacífico que repre-
senta 40% da economia mundial. A saída dos EUA, 
como outros gestos de recuo internacional, pode dei-
xar o caminho livre para uma China em ascensão, já 
que o TTP a excluía.
Desmontar o legado do antecessor
Sancionado em 2010, o Obamacare proporcio-
nou planos de saúde a milhões de estadunidenses, mas 
os republicanos o atacam há tempos por vê-lo como 
uma intromissão do governo federal nos Estados e por 
se queixarem de que ele eleva os custos. Ao chegar 
à Presidência, a equipe de Trump e os republicanos 
idealizaram o American Health Care Act (Lei Ameri-
cana de Saúde), que revoga a maioria dos impostos 
do Obamacare, incluindo uma penalidade para os que 
não adquirem planos de saúde. Ele também corta o 
financiamento do Medicaid, o programa que oferece 
cobertura aos pobres e anula a maior parte da expan-
são do programa.
Meninas participam do protesto a favor do Obamacare, 
em Los Angeles, Califórnia.
Entretanto, apesar das diversas tentativas 
e de ter maioria na câmara e no senado, o Partido 
Republicano simplesmente não conseguiu “repelir 
e substituir” o Obamacare como Trump prometeu. 
É certo que algumas medidas foram tomadas para 
enfraquecer a política de saúde implementada pelo 
ex-presidente democrata, mas os fundamentos per-
manecem em vigor.
O presidente da câmara dos EUA, Paul Ryan, 
durante apresentação do plano de substituição ao Obamacare
O congresso chegou a tentar um acordo bipar-
tidário para resolver o assunto, com o qual Trump pare-
ceu concordar a princípio, mas seu apoio durou menos 
de um dia até que mudasse de ideia. Trump falou tanto 
no assunto que muitos estadunidenses parecem crer 
que ele conseguiu mais do que de fato realizou.
Uma pesquisa da The Economist revelou que 
31% dos entrevistados acreditavam que o presiden-
te manteve sua promessa de derrubar o Obamacare 
e 21% estavam incertos. Apenas 44% sabiam que ele 
não havia cumprido o prometido.
8
O ataque à Síria
Embora Donald Trump tivesse baseado sua campanha presidencial criticando democratas quanto a polí-
tica externa excessivamente intervencionista, no dia 6 de abril de 2017 a Marinha dos Estados Unidos lançou 
um bombardeio contra a base de Shayrat, em Homs, uma das principais da força aérea de Bashar al-Assad, no 
primeiro ataque de Washington, que teve como alvo a liderança do regime sírio. A ofensiva se deu em represália 
a um ataque químico realizado em Khan Sheikhun, província de Idlib, dominada por rebeldes, que a Casa Branca 
atribuiu a forças de Assad. Trata-se de um novo e importante agravamento na guerra civil síria, que, em seis anos, 
deixou centenas de milhares de mortos e cinco milhões de refugiados. Isso marca uma reviravolta dramática na sua 
postura e leva a uma revisão das expectativas sobre sua política externa.
Medidas ambientais polêmicas
Se Trump quer fazer um governo totalmente 
oposto ao de Obama, o meio ambiente é uma das áre-
as em que ele mais se empenhou para isso. Em março, 
o novo presidente assinou um decreto revogando uma 
série de regulações contra as mudanças climáticas. Ele 
suspendeu medidas do Plano de Energia Limpa, o prin-
cipal legado ambientalde Obama, e fortaleceu o uso 
de combustíveis fósseis.
Trump também anunciou formalmente que os 
EUA deixariam o Acordo de Paris contra as mudanças 
climáticas, assinado em 2015 por 195 países e no qual 
foi assumido o compromisso de que os países devem 
trabalhar para que o aquecimento global fique muito 
abaixo de 2 ºC em relação aos níveis pré-industriais.
A decisão deixou os Estados Unidos isolados 
na questão de combate às mudanças climáticas, pois 
todos os outros países aderiram ao tratado. Perto do 
final de seu primeiro ano de mandato, Trump anunciou 
mais duas medidas contestadas por ambientalistas. A 
primeira, em dezembro, foi a maior redução de reser-
vas ambientais da história dos EUA.
Vista do Monumento Nacional Bears Ears, em Utah, nos Estados Unidos
O Monumento Nacional Bear Ears, criado em 
2016 por Obama, teve sua área reduzida em 20%, e 
9
o Monumento Nacional Grand Staircase-Escalante, de-
signado por Bill Clinton, em 1996, perdeu quase meta-
de de sua área atual.
Já em 2018, Trump voltou a ser criticado por 
ambientalistas ao propor abrir quase todas as águas 
no mar dos Estados Unidos para perfuração de petró-
leo e gás, revertendo proteções nos oceanos Ártico, 
Atlântico e Pacífico.
Jerusalém como capital de Israel
No final de 2017, Trump atraiu críticas e a ira de 
uma parcela considerável da comunidade internacional 
ao anunciar que os EUA reconhecem Jerusalém como 
capital de Israel e a transferência de sua embaixada de 
Tel Aviv para a cidade santa.
Em resposta, o Hamas convocou “três dias de 
fúria”, e uma série de protestos violentos se espalha-
ram por diversos países do Oriente Médio, com mortes, 
feridos e danos materiais.
Na tentativa de manter a neutralidade e não 
influenciar diretamente o já complicado acordo de paz 
na região, a comunidade internacional nunca reconhe-
ceu a soberania de Israel sobre a cidade. A maioria 
dos países, por exemplo, estabeleceu representações 
diplomáticas em Tel Aviv e arredores, mas não em Je-
rusalém. Por isso, o anúncio do reconhecimento de Je-
rusalém como capital de Israel por Donald Trump e a 
mudança da embaixada foram criticados também por 
aliados dos EUA, como o Reino Unido. Até mesmo o 
papa Francisco se manifestou pedindo que a decisão 
fosse revista.
A decisão de Trump vai na mesma direção de 
uma medida aprovada em 1995 pelo congresso dos 
Estados Unidos, prevendo a transferência da embaixa-
da para Jerusalém. No entanto, isso nunca havia sido 
posto em prática, porque era necessária aprovação da 
Presidência, o que nunca ocorreu – até agora.
E quanto ao México?
Nos primeiros dias de seu mandato, o presiden-
te dos Estados Unidos anunciou uma série de medidas 
no âmbito da segurança nacional que mostraram sua 
determinação em cumprir as promessas feitas durante 
a campanha, inclusive as mais controversas.
Veja onde Trump pretende construir o muro: presidente assinou ordem 
para construir barreira contra imigrantes na fronteira com o México.
Além disso, Trump também assinou uma ordem 
executiva para bloquear fundos federais para as cha-
madas “cidades-santuários”, que protegem da depor-
tação os imigrantes sem documentos. Os fundos fe-
derais seriam abolidos para cidades que se recusarem 
a fornecer informações às autoridades federais sobre 
status de imigração de pessoas detidas nessas locali-
dades, entre as quais estão Chicago, Nova Iorque e Los 
Angeles. Entretanto, ainda não obteve êxito em cortar 
essas verbas.
À construção do muro, soma-se o iminente de-
sastre para as indústrias que puderam prosperar com 
o Nafta, o Acordo de Livre Comércio da América do 
Norte. O primeiro tipo de indústria a ser atingido deve 
ser a automobilística. No mesmo dia em que Donald 
Trump ameaçou a General Motors com “um alto im-
posto fronteiriço” caso abra uma planta no México, a 
Ford anunciou que desistiu de investir US$ 1,6 bilhão 
numa fábrica no país vizinho. Em vez disso, informou 
que vai ampliar a produção de veículos elétricos nos 
10
EUA, injetando US$ 700 milhões numa instalação em 
Michigan. A montadora foi alvo de Trump por causa de 
seus planos de investimento no México.
Quanto ao muro, a ordem executiva para iniciar 
sua construção foi assinada cinco dias após a posse, 
mas até então nem um metro foi erguido... Não por 
falta de tentativa. Trump continua afirmando que en-
viará a conta da construção ao México, que, por sua 
vez, continuou respondendo que não pagaria.
As manifestações maciças em diversas cidades 
do México contra a política de Donald Trump demons-
tram a indignação que o novo presidente dos Estados 
Unidos vem despertando na população mexicana, em 
decorrência do caráter agressivo e xenófobo de suas 
declarações, propostas e medidas. O fato de a classe 
média do México – que, ao lado do Canadá e do Rei-
no Unido, tem a mais estreita relação com os Estados 
Unidos – sair às ruas para responder aos ataques e 
demonstrações de intolerância de Trump é uma prova 
desse inconformismo.
Manifestantes participam da marcha contra a política de Donald Trump.
Além das polêmicas declarações, antes, durante 
e depois das eleições, Trump foi responsável, em apenas 
algumas semanas no cargo, por uma importante queda 
de investimentos na indústria automobilística no Méxi-
co. Não precisou construir seu famoso muro para causar 
um prejuízo econômico e humano real ao vizinho.
Em março de 2019, o Pentágono anunciou o 
desbloqueio de US$ 1 bilhão para o projeto e a cons-
trução de um trecho do muro. O fundo financiará 91 
km da barreira. O montante é o primeiro liberado sob 
estado de emergência, que foi declarado pelo presi-
dente Donald Trump para contornar o congresso e 
cumprir sua promessa.
Em um comunicado, o chefe interino do Pen-
tágono, Patrick Shanahan, “autorizou o comandante 
do Corpo de Engenheiros do Exército a começar a 
projetar e executar até US$ 1 bilhão de apoio ao de-
partamento de Segurança Interna, à Alfândega e à 
Patrulha de Fronteira“. A liberação da verba é uma 
resposta do Departamento de Segurança Interna para 
a construção de 91 km de uma cerca de 5,5 metros 
de altura, a reforma de uma estrada paralela e a ilu-
minação da linha de fronteira.
Shanahan destacou que o gasto se justifica 
pelo artigo que autoriza o Departamento de Defesa a 
construir estradas, barreiras e instalar iluminação para 
impedir o tráfico de drogas na fronteira.
Senadores democratas reclamam porque o Pen-
tágono não pediu permissão dos comitês apropriados, 
antes de notificar o congresso sobre a transferência de 
fundos. Os democratas se opõem à iniciativa e trava-
ram uma disputa com Trump que resultou na parali-
sação parcial do governo (também conhecida como 
shutdown) mais longa da história do país.
Em 15 de fevereiro, Trump declarou “emergên-
cia nacional“, manobra que lhe dá a permissão para 
usar fundos federais sem aprovação do congresso, já 
que os democratas vetaram os US$ 5,7 bilhões que 
Trump exigia para a construção do muro.
Em maio deste ano, Trump deu um passo adian-
te em sua tensa relação com o México e na luta contra 
a imigração irregular, ao anunciar uma taxação de 5% 
sobre todos os produtos importados do país vizinho, a 
partir de 10 de junho. Essa alíquota, segundo ele, po-
derá subir gradualmente até 25%, enquanto Washing-
ton não notar uma melhora no controle dos imigrantes 
sem documentos. Sobre este assunto, o presidente dos 
Estados Unidos já recriminou o anterior governo me-
xicano, comandado por Enrique Peña Nieto, e, agora, 
pelo centro-esquerdista Andrés Manuel López Obra-
dor. Se entrar em vigor, a medida representará um duro 
golpe para um comércio bilateral, que está entre os 
mais movimentados do mundo e, especialmente, para 
a economia mexicana.
Trump tinha ameaçado anteriormente com ou-
tra medida nociva para a economia estadunidense, que 
não se atreveu a aplicar: fechar a fronteira. Também 
chegou a usar como moedade troca os dreamers – 
forma como ficaram conhecidos os imigrantes que 
chegaram aos EUA, ainda menores de idade e cres-
ceram como estadunidenses. E já havia ameaçado 
11
usar a guerra tarifária para obrigar o México a ado-
tar medidas mais radicais contra o fluxo de imigrantes 
sem documentos que fogem, sobretudo, da miséria na 
América Central.
Em comunicado utilizando uma linguagem du-
ríssima, Trump disse que, se a imigração ilegal for ali-
viada por meio de medidas adotadas pelo México, algo 
que determinaremos segundo o nosso critério, as tari-
fas serão eliminadas. Se a crise persistir, entretanto, su-
birão para 10% a partir de 1º de julho. A ameaça surge 
no mesmo dia em que foi noticiado que a Casa Bran-
ca busca acelerar a aprovação no congresso do novo 
tratado comercial com o México e Canadá, selado no 
ano passado. Esta é uma contradição só concebível no 
universo de Trump, onde não há outra estratégia senão 
a aparente ausência dela: a improvisação.
Além disso, as declarações de Trump aparecem 
quando se acumulam os dados sobre o colapso do sis-
tema de acolhida de imigrantes na fronteira sul, devido 
à chegada maciça de famílias com crianças. A patru-
lha fronteiriça anunciou em nota que deteve o maior 
grupo já encontrado na fronteira dos Estados Unidos 
com o México. Foram 1.036 pessoas que cruzaram o 
rio Grande todas de uma vez, por volta das 4h00 da 
madrugada (1h00, em Brasília), na altura de El Paso, 
Texas. Todos os detidos no grupo eram da Guatemala, 
Honduras ou El Salvador; havia 39 adultos sozinhos e 
934 membros de “unidades familiares”, o termo téc-
nico usado para definir pelo menos um adulto acom-
panhado de pelo menos uma criança; outros 63 eram 
menores desacompanhados. A diferença entre esses 
casos é que os adultos sozinhos podem ser detidos, 
até que seu caso passe por um juiz. Se forem cidadãos 
mexicanos, são deportados imediatamente em segui-
da; se não, ficam detidos enquanto durar o processo. 
As crianças, por outro lado, só podem permanecer de-
tidas por 72 horas e, depois, devem passar à custódia 
dos serviços sociais para serem alojadas em refúgios, 
com famílias de acolhida, ou com familiares que se 
encarreguem deles nos Estados Unidos. Essa situação 
complica enormemente a papelada e as transferências 
e torna impossível sua gestão eficiente, segundo o De-
partamento de Alfândegas e Proteção de Fronteiras 
(CBP), o que paralisa os centros de internamento. A 
chegada de famílias com crianças aumentou fortemen-
te no último ano, embora as cifras absolutas de deten-
ções na fronteira sejam baixas em comparação com os 
máximos históricos.
Usmca: o novo Nafta
Iniciada há quase dois anos, a renegociação do 
Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Naf-
ta, na sigla em inglês) resultou em um novo acordo 
comercial, o chamado United States-Mexico-Canada 
Agreement (Usmca). A revisão do Nafta era um dos 
principais pontos da campanha presidencial de Donald 
Trump, que prometia recompor postos de trabalho ex-
portados para o México, além de buscar reverter o re-
corrente e significativo deficit comercial com o parceiro 
do sul. Durante as várias rodadas de renegociação do 
livre comércio na região, diversos congressistas repu-
blicanos e democratas se manifestaram contrários à re-
tirada dos Estados Unidos do acordo trilateral de livre 
comércio, que remonta aos anos 1990.
Do mesmo modo, governadores estaduais e as-
sociações de classe se posicionaram em favor da mo-
dernização do acordo trilateral de comércio. O Usmca, 
nesse sentido, parece acomodar essas reivindicações 
de grupos internos dos EUA, sem, no entanto, deixar 
de lado a promessa de campanha de Trump. Tal aco-
modação de interesses significa condições mais favo-
ráveis aos EUA nas relações comerciais, por meio da 
modernização de um acordo de livre comércio com um 
quarto de século de vigência, e que necessita atualizar 
questões que, hoje, são de fundamental importância 
na agenda do comércio internacional. O Usmca, desse 
modo, trata de questões como e-commerce e regras de 
origem mais bem detalhadas. Além disso, o novo acor-
do tem-se configurado como capital político de Trump 
para pressionar o México em outras questões de políti-
ca externa e, ao mesmo tempo, conseguir apoio para a 
aprovação do Usmca.
Durante a renegociação do Nafta, congressis-
tas, como o democrata Vicente Gonzalez (D-TX) e o 
republicano Dan Newhouse (R-WA), escreveram ao 
presidente Trump solicitando que os EUA permaneces-
sem no acordo a partir da modernização de seus dis-
positivos. A carta, que também foi assinada por outros 
congressistas, enfatizava que dependiam desse acordo 
milhões de empregos nos EUA e que pequenos e mé-
12
dios empresários só puderam expandir seus negócios 
por conta do livre comércio garantido pelo Nafta, visto 
que, cerca da metade de todos os bens importados por 
Canadá e México, são oriundos dos EUA.
Coalizões internas e governadores estaduais 
também se manifestaram em favor da permanência 
dos Estados Unidos no Nafta. Em declaração à impren-
sa, a governadora de Iowa, Kim Reynolds, considerou 
que a retirada dos EUA do Nafta teria consequências 
sem precedentes para produtores rurais e industriais 
do Estado. No que se refere à produção excedente para 
o mercado externo, seria “devastador”, afirmou Rey-
nolds. O Missouri, por exemplo, tem mais de 60% de 
suas exportações destinadas a áreas de livre comércio, 
como os mercados do Canadá e do México.
Os republicanos Roger Marshall (KS) e Kevin 
Brady (TX), este também presidente do Conselho de 
Lideranças dos Negócios do Texas, reconheceram a 
necessidade de atualização dos termos do Nafta – 
portanto, sem a saída dos EUA do acordo. Para eles, 
o acordo de livre comércio da região tem sido bené-
fico não apenas para grupos específicos no país, de 
diferentes setores da economia, como também tem 
beneficiado a economia dos EUA como um todo. Para 
Marshall, a modernização do Nafta não é tarefa fácil, 
mas é perfeitamente possível. Ambos, partidários de 
Trump, acompanharam as rodadas de renegociação do 
Nafta até a criação do Usmca. Associações de classe e 
grupos de interesse, como o Americans for Farmers and 
Familiese American Farm Bureau Federation, além de 
empresas, como Heineken e Softwear Alliance, também 
se manifestaram publicamente em favor da continui-
dade dos EUA no acordo de 1994.
Desde as primeiras negociações para a efe-
tivação do Nafta, não há regras bem determinadas 
sobre o comércio digital. Tradicionalmente, deman-
das estadunidenses referentes a esse segmento, bem 
como com relação à propriedade intelectual, estão 
presentes, hoje, não apenas nas negociações de cunho 
regional, mas também nas tratativas no âmbito mul-
tilateral, como no caso da Organização Internacional 
do Comércio (OMC). Do início da década de 1990 à 
renegociação do Nafta, não apenas tem havido um 
recrudescimento da complexidade das tecnologias, 
como também o volume de comércio nessas áreas 
tem se expandido crescentemente. Com o Usmca, os 
direitos autorais serão estendidos de 50 anos após o 
falecimento do autor para 70 anos, o que representa 
um ganho para os EUA, de onde provém boa parte da 
produção científica e tecnológica entre os parceiros do 
Nafta. A proteção a um novo medicamento também 
seria estendida – neste caso, de oito para dez anos, o 
que significa que, dentro desse período, não poderia 
haver genéricos. Além disso, o acordo prevê proteções 
a plataformas de comércio eletrônico para que essas 
empresas não sejam responsabilizadas por aquilo que 
seus usuários postam. Também poderá haver isenção 
de impostos a produtos comprados eletronicamente.
O setor automobilístico sofreu, por sua vez, 
importante mudança com o novo acordo, no que 
se refere às regras de origem. Com o Usmca, 75% 
dos componentes de carros e caminhões devem ser 
oriundos de um dos países do acordopara não ser 
tarifado em nenhum nível. No Nafta, esse percentu-
al é de 62,5. O intuito é fomentar a compra desses 
componentes na América do Norte e fazer frente a 
custos mais competitivos proveniente da Ásia. Outra 
mudança importante e que evidencia mais um ganho 
do governo dos EUA diz respeito aos dispositivos 
trabalhistas no novo acordo. O Usmca pretende es-
tabelecer um piso de 16 dólares a hora de trabalho 
para empregados no setor automobilístico, o que é 
uma clara tentativa de o governo Trump recompor os 
empregos exportados. A lógica é que, se não houver 
salários menos valorizados no México, como ocorre 
atualmente, as empresas não terão razão para deixar 
o território estadunidense, em princípio.
Durante as tratativas do acordo, o México tam-
bém se comprometeu a fortalecer os sindicatos locais 
por meio da ampliação da legislação trabalhista in-
terna. Outra mudança substancial do texto do Nafta 
13
– mais especificamente de seu capítulo 11 – para o 
novo acordo é que investidores não poderão proces-
sar os governos. No caso de EUA e Canadá, em ne-
nhuma hipótese e, com relação ao México, a restrição 
ocorreu em termos relativos. A mudança é relevante 
porque pode relativizar questões ambientais, o que 
não é desejável por setores domésticos nos EUA e por 
parte considerável do congresso. No Usmca, algo que 
se manteve e que pode ser considerado um ganho da 
diplomacia canadense foi a manutenção dos termos 
do capítulo 19 do Nafta, cujo conteúdo permite que 
os Estados-membros adotem medidas contra decisões 
desfavoráveis provenientes de tribunais e agências dos 
EUA, em casos de disputas no âmbito do Nafta.
Estimativas do Fundo Monetário Internacional 
(FMI) apontam que os efeitos das possíveis mudanças 
com o Usmca no Canadá poderão concentrar-se no 
encolhimento de seu setor de veículos automotores, 
acompanhado por um declínio na produção de peças. 
No México, a contração na produção de veículos será 
superior a 5%, enquanto os setores de veículos, têxtil 
e de vestuário também reduzirão de tamanho. Ainda 
segundo o FMI, o México poderá compensar essas per-
das no setor automobilístico com ganhos conjuntos em 
equipamentos elétricos e bens de capital. Nos EUA, os 
declínios mais notáveis podem concentrar-se nos setores 
têxteis e de peças de veículos, em face do efeito nega-
tivo dos preços mais altos na demanda do consumidor.
Nesse sentido, a aprovação e vida útil do Usmca 
são ainda incertas. O acordo possui a chamada sunset 
clause – ou “cláusula pôr do sol”, em uma tradução 
livre. Além disso, precisa passar pelo crivo dos con-
gressos dos EUA, México e Canadá. Em decorrência 
dessa cláusula, o acordo estará sujeito à revisão pelos 
três países a cada seis anos, podendo expirar ao final 
desse prazo ou se renovar por igual período. Quanto à 
apreciação do Legislativo dos EUA, a análise dos im-
pactos do Usmca na economia estadunidense deman-
dará tempo. O Usmca tem 34 capítulos, 13 anexos e 13 
contratos paralelos, enquanto seu antecessor possui 
22 capítulos, nove anexos e nenhum contrato paralelo.
Desse modo, ainda com relação ao congresso 
dos EUA, Nancy Pelosi (D-CA) e seu Partido Democra-
ta, maioria na câmara, já se pronunciaram no senti-
do da criação de dispositivos mais rígidos no acordo, 
tanto no que diz respeito à matéria trabalhista quan-
to ambiental. Pelosi também salientou que o avanço 
do acordo depende da efetivação de novos dispositi-
vos legais trabalhistas no México. A reação de Trump 
foi aumentar a pressão sobre o vizinho do sul em 
questões de fronteira e migração, o que demonstra 
que a práxis do America First é mais complexa do que 
um slogan de campanha e que, portanto, depende de 
outras variáveis e atores do campo doméstico e da 
arena internacional.
ATUALIDADES
Era Trump
Alessandra de Fatima Alves 
15
C
ATUALIDADES
H

Continue navegando