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1 ÉTICA NO DIREITO Políticas judiciais modernas para manutenção da ética Prof. Daniel Tobias Leite de Almeida Unidade II APRESENTAÇÃO DO PROFESSOR-AUTOR Daniel Tobias Leite de Almeida é professor convidado na Unidade Paulista – UNIP, atuando nas disciplinas comuns e específicas de Teoria Geral, Direito Tributário e Direito Civil, para os cursos de Pós-Graduação de Direito, na modalidade ensino à distância EAD. É bacharel (2010) em Direito pela Unidade Paulista – UNIP, realizando MBA em Gestão Pública pela rede LFG – Luiz Flávio Gomes, atual instituição Anhanguera- UNIDERP (2019). Atua como advogado na área do direito privado, especialmente em contratos e execuções. Curriculum Lattes: http://lattes.cnpq.br/3489925247258042 3 INTRODUÇÃO Na Unidade II da disciplina Ética no Direito, nos cursos de pós-graduação em Direito, modalidade à distância, serão vistas as principais normas e mecanismos modernos, instituídos por meio do anseio popular, da atividade legislativa, para coibir e conter modalidades de corrupção. Dentre essas novidades, serão vistos os institutos criados pela Lei Anticorrupção Empresarial (Lei nº 12.846/2013), pela Lei das Organizações Criminosas – colaboração premiada (Lei nº 12.850/2013), a Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011), como os principais mecanismos que agilizam a atuação investigativa das autoridades auxiliares do Poder Judiciário e estreitam laços com o controle social acerca da condução da gestão pública. O conteúdo estudado será sempre amparado pelo entendimento jurisprudencial proferido pelo Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, e interpretações peculiares proferidas pelas demais Cortes de Justiça do país, quando cumprirem uma função didática nesse sentido. 4 1. POLÍTICAS MODERNAS DE COMBATE À CORRUPÇÃO E MANUTENÇÃO DA ÉTICA DAS INSTITUIÇÕES 1.1 COLABORAÇÃO PREMIADA E ACORDO DE LENIÊNCIA – NOÇÕES GERAIS E CONTEXTO POLÍTICO-INSTITUCIONAL BRASILEIRO É notório na história brasileira o foco dado aos escândalos de corrupção que assolam o país, principalmente após a redemocratização e a promulgação da Carta Política, de 5 de outubro de 1988. Em grande parte, tamanha notoriedade foi amparada pelo amadurecimento das próprias instituições, por intermédio dos seus órgãos investigativos, seja da Polícia Judiciária ou de autoridades que auxiliam na persecução da Justiça, como o Ministério Público. Não podendo andar no sentido contrário, o advento do massivo acesso à informatização e às redes sociais encurtou a ponte entre população civil e as instituições constituídas, e assim, os agentes políticos foram se tornando cada vez mais próximos do controle social. Em períodos recentes, o país foi abalado por estruturados esquemas de corrupção, envolvendo empresas públicas de atividade econômica estratégica e a própria atividade legislativa, onde emendas parlamentares se tornaram a mais banal das negociações políticas. No ímpeto de reconstruir as feridas causadas na confiabilidade do Poder Público, diversos mecanismos legislativos foram introduzidos ao ordenamento jurídico tentando coibir ou desestimular práticas criminosas e outras medidas foram incentivadas, principalmente no âmbito processual. Como regra, as condutas tipificadas que podem ser mencionadas não se referem às modalidades criminosas mais cruéis como vistas no noticiário, como homicídio ou roubo, mas sim crimes de ordem financeira. E condutas realizadas com a atividade mercadológica podem ser estimuladas ou desestimuladas como política de mitigar o anseio pelo enriquecimento ilícito. Alguns instrumentos judiciais, como a delação premiada, tornaram-se meios eficientes devido ao grau de vantagens que o réu pode auferir caso colabore com indícios para 5 que as autoridades competentes possam construir outras provas contra os agentes que atuaram em concurso ou organizações criminosas. Não alheio ao estímulo material ou financeiro, essa negociação acaba sendo abarcada pela denominada Teoria dos Jogos, que consiste em testes de origem lógico-matemática, onde pessoas são instigadas a tomar decisões com o intuito de limitar o grau de prejuízos que possam sofrer. Esse método ainda pode ser incorporado em muitas disciplinas e metodologias onde sejam necessárias tomadas de decisões, como modelo de gestão de negócios e de atividades financeiras. O advento de novos instrumentos normativos não revoga as leis de outrora, como a Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992) e fenômenos jurídicos como a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, amplamente prevista na seara do Direito Privado, como nas relações trabalhistas e fiscais. O Tribunal Federal Regional da 4ª Região leciona que a Norma de Improbidade Administrativa tem como finalidade a punição do agente público ímprobo, enquanto a Lei Anticorrupção Empresarial atuará para responsabilizar as pessoas jurídicas em conluio com aquele (TRF-4 Agravo de Instrumento nº 5023972-66.2017.4.04.0000. 3ª Turma. Des. Relatora: Vânia Hack de Almeida. Data de julgamento: 22 ago. 2017. Publicação em; 22 ago. 2017). Todavia, as punições da Lei nº 8.429/1992 contemplam o terceiro em conluio com o Poder Público em razão das penalidades dispostas. O julgado estatui também que: [“Não há impedimentos para que haja participação de outros órgãos da administração pública federal no acordo de leniência como a Advocacia Geral da União, o Ministério Público Federal e o Tribunal de Contas da União, havendo, portanto, a necessidade de uma atuação harmônica e cooperativa desses referidos entes públicos.”] Infere-se, assim, a intercomunicação entre as diferentes normas para adequação aos tipos e hipóteses contemplados para apuração da ilicitude e consequente reparação. Doravante, o acordo de leniência em sede de competência do CADE continua produzindo efeitos (TRF-3 Apelação nº 1592947 – SP – nº 0010414-56.2009.4.03.6100. 3ª Turma. Des. Relator Convocado: Silva Neto. Data de julgamento: 05 nov. 2015. Publicação em: 12 nov. 2015; e STJ – REsp nº 1.554.986 – SP. 3ª Turma. Min. Relator: Marco Aurélio Bellizze. Data de julgamento: 08 mar. 2016. Publicação em: 05 abr. 2016). Nesse sentido, a famigerada colaboração premiada não foi novidade após os escândalos envolvendo lavagem de dinheiro de partidos políticos por meio da 6 Petrobrás S.A. A Lei nº 12.529/2011, que houvera reestruturado a autarquia federal conhecida como Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), criou o mecanismo denominado como programa de leniência, como medida colaborativa para os processos administrativos instaurados no campo de atuação da entidade. O acordo em questão se dava no contexto da norma e quanto à fiscalização exercida pela referida autarquia. Com a Lei nº 12.846/2013, conhecida como Lei Anticorrupção Empresarial, trouxe o acordo de leniência (Art. 16) para averiguar a responsabilidade objetiva, administrativa e civil, de pessoas jurídicas que atentarem contra a Administração Pública, nos moldes da lei. A fama adveio posteriormente, com a Lei nº 12.850/2013, Norma de Combate às Organizações Criminosas, com a colaboração premiada (Art. 3º-A), que foi abundantemente aplicada no decorrer dos processos judiciais que constituíram a Operação Lava Jato. As mencionadas normas estabelecem uma amplitude de requisitos e circunstâncias, com o intuito de coibir abusos por parte das autoridades contra o réu- colaborador, e oportunismos por parte do beneficiário. Como são mecanismos recentes, a devida moderação dos usos e a conjugação com princípios constitucionais precisarão de parâmetros que serão construídos pela jurisprudência e pela doutrina, e este acervo teórico será construído com o passar dos anos e das práticas acerca dos acordos mencionados.No âmbito filosófico da ética, discute-se se a construção e provas a partir de uma fonte eivada de ilicitude (o agente réu, beneficiário e colaborador), porém, o que é significativo no campo pro Direito, a partir da hermenêutica é a colaboração na construção de provas: seja por indicação de agentes em concurso, locais ou esconderijos e contratos negociais eivados de ilicitude. A partir dos indícios, as autoridades buscarão e construirão as provas de maneira independente. É observado que o órgão incumbido de interesse na investigação poderá suscitar e produzir novos elementos no campo da narrativa realizada, sob avaliação do Poder Judiciário (TJ-RJ Agrv. Instr. nº 0050528- 43.2017.8.19.0000. 4ª Câmara Cível. Des. Relator: Reinaldo Pinto Alberto Filho. Data de julgamento: 18 out. 2017. Publicação em: 18 out. 2017). No campo da Lei das Organizações Criminosas, o Art. 3º-B, §4º, prevê a hipótese de que o conteúdo do acordo proposto poderá ser objeto de instrução, para 7 identificar ou complementar o conteúdo mencionado, como objeto, fatos narrados, além de determinar o interesse público ou jurídico da negociação. 1.2 ACORDO DE LENIÊNCIA Conforme já salientado, na Lei Anticorrupção Empresarial, a construção ilícita de provas não é um fator eticamente comprometido, haja vista haver registros contábeis ou financeiros de transações com o intuito de fraude ou lavagem ilícita, para a maioria dos ilícitos cometidos por sociedades empresariais, bastando a indicação e a realização de um acordo com o intuito de delinear o alcance da responsabilização das pessoas jurídicas envolvidas. Quanto à abrangência das entidades sujeitas à disciplina desta lei, temos os parâmetros insculpidos no parágrafo único do Art. 1º, conforme vê-se a seguir: Art. 1º (...) Parágrafo único. Aplica-se o disposto nesta Lei às sociedades empresárias e às sociedades simples, personificadas ou não, independentemente da forma de organização ou modelo societário adotado, bem como a quaisquer fundações, associações de entidades ou pessoas, ou sociedades estrangeiras, que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente. A abrangência destas descrições suscitaria dúvida quanto ao alcance sobre as empresas públicas ou sociedades de economia mista, que pela sua distinta natureza, não se sujeitam em absoluto ao regime jurídico de direito privado, mas também se submetem a normas do direito público. Destarte, com a Lei nº 13.303/2016, que dispõe sobre o Estatuto Jurídico das Empresas Públicas, das Sociedades de Economia Mista e de suas subsidiárias, no âmbito de todos os entes federativos que compõem a República Federativa do Brasil, ao fim, pode sugerir um meio de dar fim a esta dúvida, porquanto estipular expressamente que a Lei Anticorrupção aplica-se às empresas públicas e às sociedades de economia mista, além de suas subsidiárias, especificando sobre as sanções, em seu Art. 94. 8 A menor problematização do assunto sugeriria que apenas as penalidades são cabíveis a essas entidades públicas; porém, não se deve olvidar que para tais imposições, faz-se necessário o trâmite do processo administrativo de responsabilização. Em julgado de similar importância, já foi questionado a sujeição das fundações, conforme conceituadas pelo Código Civil, sob a égide da Lei de Anticorrupção Empresarial, e o entendimento segue de maneira afirmativa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO MONITÓRIA. DECISÃO AGRAVADA QUE INDEFERIU PEDIDO DE INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DA ASSOCIAÇÃO AGRAVADA. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DO CÓDIGO CIVIL, EM CUJO TÍTULO REFERENTE ÀS PESSOAS JURÍDICAS ESTÁ INCLUÍDA A ASSOCIAÇÃO. INCIDÊNCIA DA LEI ANTICORRUPÇÃO (ARTS. 1º E 14). As pessoas jurídicas de direito privado, dentre as quais se incluem as associações, ainda que sem fins lucrativos, são abarcadas pelo conceito de abuso da personalidade jurídica, preconizado no art. 50, do Diploma Civil. Caso concreto que, por tratar de verbas públicas, atrai a incidência da recente Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013) que, em seu art. 1º, parágrafo único, inclui as associações entre as pessoas jurídicas alcançadas pela inovação legislativa e, em seu art. 14, expressamente estabelece a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica quando configurado abuso de direito. Associação agravada que além de ter sido declarada inidônea para contratar com o poder público municipal, ao ser intimada a pagar o débito, permaneceu inerte e, buscada a penhora online, foi constatada a inexistência de valores passíveis de constrição, tudo a apontar indícios de atuação abusiva. Admissível a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Recurso conhecido e parcialmente provido para que seja instaurado o incidente de desconsideração de personalidade jurídica, na forma do artigo 133 do Código de Processo Civil. 9 (TJRJ - Agravo de Instrumento nº 0023397-59.2018.8.19.0000. 12ª Câmara Cível. Des. Relator: José Acir Lessa Giordani. Data de julgamento: 18 dez. 2018. Publicação em: 18 dez. 2018) Assim, a Lei nº 12.846/2013 dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. Já pela ementa do texto legislativo vemos um teor menos comprometedor acerca da ilicitude do acordo, haja vista não envolver aspectos de responsabilização de caráter penal acerca das pessoas jurídicas envolvidas. Consta na lei, conforme o caput do Art. 3º, que a responsabilização da pessoa jurídica não excluirá a responsabilidade individual dos dirigentes ou administradores, ou de quaisquer pessoas físicas, que agirem de má-fé ou em coautoria e participação com a ilicitude. Uma das finalidades pretendidas pela norma é tirar de foco a observância da contaminação patrimonial entre o dirigente ou administrador de má-fé e a própria pessoa jurídica, que acaba sendo uma proteção àquele e um obstáculo paras as autoridades. Quanto a isto, a norma vai diretamente para a responsabilização da pessoa jurídica, e subsidiariamente constituir meios de alcançar a pessoa física beneficiária da ilicitude. Por esta perspectiva distinta, objetiva-se a versatilidade na colaboração da companhia para diminuir os prejuízos do ilícito, estimulando a entidade a atuar em prol da reparação, além de que a sustância financeira de uma companhia pode ser mais garantidora sobre as lesões causadas e pelo cumprimento de imposições pecuniárias (STJ – REsp nº 1.672.015 - CE. Min. Relator: Sérgio Kukina. Data de julgamento: 20 fev. 2018. Publicação em: 23 fev. 2018). Tal possibilidade é amplamente aplicável e prevista pelo ordenamento jurídico brasileiro, principalmente quando da aplicação do expediente para desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, que não está mais adstrita às hipóteses do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) ou conforme o Código Civil (Lei nº 10.406/2002). Para ilustrar o exposto, podemos observar o teor do julgado a seguir: EMENTA: (...) (...) 10 2. A pessoa jurídica de direito privado, enquanto realidade orgânica, não se confunde com os seus integrantes. Ocorre que, diante dos abusos por vezes cometidos pelos sócios e administradores dessas entidades, surgiu a teoria que encampou a ideia de quebra da autonomia da sociedade em relação aos seus membros, qual seja, a teoria da desconsideração da personalidade jurídica. 3. A “Teoria da penetração” possibilita que se adentre na entidade societária para responsabilizar os sócios por dívidas assumidas em nome da pessoa jurídica. 3.1. O ordenamento jurídico brasileiro permite a aplicação dessa teoria em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentençae na execução, conforme a disciplina do art. 134 do Código de Processo Civil. Para tanto, exige- se a ocorrência de abuso de direito, previsto no art. 28 do Código de Defesa do Consumidor; ou o abuso da personalidade jurídica, quando presente o desvio de finalidade ou a confusão patrimonial, nos termos do art. 50 do Código Civil. Isso sem falar na possibilidade de aplicação desse instituto com fundamento na Lei nº 9605/1198 ou na Lei nº 12846/2013. 4. O exame da responsabilidade das pessoas integrantes de um grupo econômico deve considerar necessariamente o fato de que, em maior ou menor medida, a confusão patrimonial é inerente a todo grupo econômico. Demonstrada a existência de grupo econômico, é possível a responsabilização dos demais integrantes, preenchidos os requisitos e pressupostos dispostos no art. 133 e seguintes do CPC. (...) (TJDFT - Acórdão nº 0709185-25.2018.8.07.0000. 3ª Turma Cível. Des. Relator: Alvaro Ciarlini. Data de julgamento: 18 out. 2018. Publicação em: 24 out. 2018) (destaque) Nesse sentido, traz outros dispositivos compondo as hipóteses acerca dessa responsabilização, em caso de subsistência da pessoa jurídica em face de operações societárias (Art. 4º §1º), e interdependência entre a responsabilidade dos dirigentes – quanto ao grau de sua culpabilidade - e a da pessoa jurídica (Art. 3º, §2º). A norma de combate a práticas corruptivas contra a Administração Pública traz o em seu Art. 5º os atos que configuram lesividade contra patrimônio público ou 11 Administração Pública, nacionais ou estrangeiros, e atentatórios aos compromissos internacionais assumidos pela República Federativa do Brasil. As condutas enumeradas são as seguintes: ATOS LESIVOS À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NACIONAL OU ESTRANGEIRA Prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada; Financiar, custear, patrocinar ou subvencionar, comprovadamente, e de qualquer forma, a prática de atos ilícitos previstos na Lei nº 12.846/2013; Recorrer a interposta pessoa física ou jurídica para ocultação ou dissimulação dos reais interesses ou da identificação dos beneficiários dos atos praticados pela Lei nº 12.846/2013; Condutas realizadas no trâmite de licitação ou constância de contratos Dificultar atividade investigatórias ou fiscalizatórias de órgãos, entidades ou agentes públicos, ou intervir na atuação deles, inclusive no âmbito das Agências reguladoras e dos órgãos de fiscalização do Sistema Financeiro Nacional. Fonte: Autor, 2020 CONDUTAS REALIZADAS NO TRÂMITE DE LICITAÇÃO OU CONTRATOS Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório público; Impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório público; Afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo; Fraudar licitação pública ou contrato decorrente dela; Criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica para participar de licitação pública ou celebrar contrato administrativo; Obter vantagem ou benefício indevido, de modo fraudulento, de modificações ou prorrogações de contratos celebrados com a administração pública, sem autorização da lei, no ato convocatório da licitação pública ou nos respectivos contratos; 12 Manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a Administração Pública. Fonte: Autor, 2020 Observa-se que as condutas mencionadas são de maneira genéricas, podendo englobar uma série de atos ou práticas formais, seja em sede de registros contábeis ou negócios jurídicos formalizados para ludibriar a fiscalização de órgãos e entidades públicos. Daí é plausível constatar a atuação da norma em consonância com outras leis, como a tipificação de condutas pela própria Lei de Licitações (Lei nº 8.666/1993) e da própria Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992). Ademais, já foi suscita aplicação da Lei Anticorrupção em sede de Ação Civil Pública, porém, no contexto trazido aos autos, houve pedido de indisponibilidade de bens e cessação de transmissão de radiodifusão da pessoa jurídica beneficiária (TRF3 – Agv. Instr. nº 547.912 – SP. Nº 0032307-94.2014.4.03.0000. 4ª Turma. Des. Relator: Marcelo Saraiva. Data de julgamento: 23 nov. 2016. Publicação em: 19 jan. 2017). No corpo positivado da norma, constam de maneira objetivas, as medidas punitivas aplicadas em sede de responsabilização administrativa, sendo elas multa, variando de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do faturamento bruto do último exercício ao da instauração do processo administrativo, sem exclusão de tributação sobre a base de cálculo; e publicação extraordinária da decisão condenatória. Poderão ser impostas de maneira cumulativa ou isolada, a depender da gravidade e da natureza dos atos praticados. O §2º do Art. 6º salienta também não haver exclusão da obrigação cível de reparação integral do dano causado. Judicialmente, poderão ser impostas as medidas judiciais dispostas no Art. 19, a seguir, ilustrado: Art. 19. Em razão da prática de atos previstos no art. 5º desta Lei, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, por meio das respectivas Advocacias Públicas ou órgãos de representação judicial, ou equivalentes, e o Ministério Público, poderão ajuizar ação com vistas à aplicação das seguintes sanções às pessoas jurídicas infratoras: 13 I - perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagem ou proveito direta ou indiretamente obtidos da infração, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé; II - suspensão ou interdição parcial de suas atividades; III - dissolução compulsória da pessoa jurídica; IV - proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público, pelo prazo mínimo de 1 (um) e máximo de 5 (cinco) anos. (destaque) Sob o olhar mais atento, observa-se que não há claramente punições de ordem cível, porquanto as medidas ressarcitórias se dão no âmbito do processo administrativo de responsabilização. Poder-se-á inferir que houve um desalento legislativo pela ausência de especificações; porém, as normas cíveis podem ser harmoniosamente aplicadas a partir de outras normas, como as já mencionadas Lei de Improbidade, e pelo próprio Código Civil de 2002, a Lei nº 10.406/2002, além de ações autônomas reparatórias impetradas pelos órgãos de Procuradoria, integrantes do Poder Público. O mecanismo inovador da lei se dá pela instauração do processo administrativo contra pessoa jurídica potencialmente infratora, que ficará a cargo da autoridade máxima de cada órgão ou entidade integrante de quaisquer dos Poderes. O dever pode ser exercido de ofício ou mediante provocação, observando sempre os princípios magnos que convalidam as garantias constitucionais (Art. 8º, caput). No âmbito da Administração Pública Federal do Poder Executivo, ficará a cargo da Controladoria Geral da União (CGU), como incumbência concorrente, a instauração dos processos administrativos com base na Lei nº 12.846/2013; e será sua competência exclusiva para aferição da responsabilidade e danos quando envolver compromissos internacionais lesados por atos perpetrados por pessoa jurídica ou pessoa física interessada (Art. 9º). Essa prerrogativa foi adequada a partir da Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, promulgada, no Brasil, pelo Decreto nº 3.678, de 30 de novembro de 2000. 14 Assim, foi instrumentalizado o teor do Artigo 4º da mencionada Convenção como competência do órgão de controle internodo Poder Executivo Federal, alçado ao status de Ministério de Estado: Artigo 4 Jurisdição 1. Cada Parte deverá tomar todas as medidas necessárias ao estabelecimento de sua jurisdição em relação à corrupção de um funcionário público estrangeiro, quando o delito é cometido integral ou parcialmente em seu território. 2. A Parte que tiver jurisdição para processar seus nacionais por delitos cometidos no exterior deverá tomar todas as medidas necessárias ao estabelecimento de sua jurisdição para fazê-lo em relação à corrupção de um funcionário público estrangeiro, segundo os mesmos princípios. 3. Quando mais de uma Parte tem jurisdição sobre um alegado delito descrito na presente Convenção, as Partes envolvidas deverão, por solicitação de uma delas, deliberar sobre a determinação da jurisdição mais apropriada para a instauração de processo. 4. Cada Parte deverá verificar se a atual fundamentação de sua jurisdição é efetiva em relação ao combate à corrupção de funcionários públicos estrangeiros, caso contrário, deverá tomar medidas corretivas a respeito. Doravante o escopo voltar-se para a corrupção do agente público que atua na seara internacional, pela natureza da corrupção, é plausível construir indícios ou meios de prova de formar a oficiar perante as autoridades competentes para a impetração das ações reparadoras adequadas, porquanto ser a corrupção uma forma delitiva que não se consuma unilateralmente. Quanto ao mecanismo judicial do acordo de leniência, seu dispositivo inaugural consiste no Art. 16, outrora passível de mudanças em razão da Medida Provisória nº 703/2015, que teve a vigência encerrada. 15 De antemão, ela é de propositura espontânea da pessoa jurídica processada, conforme um dos elementos condicionantes plasmados no Art. 16, §1º, I, da lei. Com lídimo didatismo, o TRF-41 explica que: “[...] o acordo de leniência pressupõe como condição de sua admissibilidade que a pessoa jurídica interessada em fazê-lo manifeste prima facie sua disposição, reconhecendo expressamente a prática do ato lesivo, cessando-o e prestando cooperação com as investigações, além de reparar integralmente o dano causado. [...]” A perspectiva oriunda do acordo de leniência é no sentido de incentivo de acordo para cessação de atos ilícitos, com vistas ao incentivo financeiro de mitigar os danos, por parte da pessoa jurídica envolvida com ilicitude. Pode-se conjecturar que seja uma dinâmica já aplicável no âmbito do Direito do Trabalho, com o fim de incentivar o acordo e diminuir demandas, e pela prioridade de verbas de cunho alimentício, dada as devidas proporções nesta comparação. Logo, ambas práticas incentivam a eficiência na resolução dos conflitos trazidos aos olhos das Instituições, porém de um lado observa-se a tutela do hipossuficiente nas relações de emprego; e no outro espectro, a cessação e resolução de práticas ilícitas. No mesmo julgado, em sua ementa, é proferida a seguinte disposição: (...) 3. O Acordo de Leniência é uma espécie de colaboração premiada em que há abrandamento ou até exclusão de penas, em face da colaboração na apuração das infrações e atos de corrupção, justamente para viabilizar maior celeridade e extensão na quantificação do montante devido pelo infrator, vis-a-vis a lesão a que deu causa, ao tempo em que cria mecanismos de responsabilização de co-participantes, cúmplices normalmente impermeáveis aos sistemas clássicos de investigação e, por isso, ocultos. Esse o objetivo da norma e sua razão de ser, tendo por pano de fundo, obviamente, o inafastável interesse público. (...) 1 TRF-4 Agravo de Instrumento nº 5023972-66.2017.4.04.0000. 3ª Turma. Des. Relatora: Vânia Hack de Almeida. Data de julgamento: 22 ago. 2017. Publicação em: 22 ago. 2017. 16 Salientando a ausência de antinomia do diploma com a Lei nº 8.249/1992, quanto aos atos de improbidade administrativa, segue a lição nos seguintes termos: (...) 4. Enquanto a Lei de Improbidade Administrativa (LIA) busca, primordialmente, punir o agente público ímprobo, alcançando, eventualmente, o particular, a Lei Anticorrupção (LAC) tem por objetivo punir a pessoa jurídica envolvida em práticas corruptas, podendo também, em sentido inverso, identificar agentes públicos coniventes, levando-os, por consequência, para o campo de incidência da LIA. 5. Não há antinomia abrogante entre os artigos 1º e 2º da Lei nº 8.249/1992 e o artigo 1º da Lei nº 12.846/2013, pois, naquela, justamente o legislador pátrio objetivou responsabilizar subjetivamente o agente ímprobo, e nesta, o mens legislatoris foi a responsabilização objetiva da pessoa jurídica envolvida nos atos de corrupção. 6. No entanto, há que se buscar, pela interpretação sistemática dos diplomas legais no microssistema em que inserido, como demonstrado, além de unicidade e coerência, atualidade, ou seja, adequação interpretativa à dinâmica própria do direito, à luz de sua própria evolução. 7. Por isso, na hipótese de o Poder Público não dispor de elementos que permitam comprovar a responsabilidade da pessoa jurídica por atos de corrupção, o interesse público conduzirá à negociação de acordo de leniência objetivando obter informações sobre a autoria e a materialidade dos atos investigados, permitindo que o Estado prossiga exercendo legitimamente sua pretensão punitiva. (...) O aspecto vantajoso e crucial para tornar o acordo produtivo, tanto para a obtenção de informação para subsidiar a instrução administrativa ou judicial e para incentivo participativo da companhia envolvida na ilicitude consiste na isenção da publicação extraordinária da condenação (Art. 6º, II); da proibição de recebimento de incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas, além de instituições financeiras públicas ou controladas pelo Poder Público, pelo prazo que pode variar por 1 (um) a 5 (cinco) anos (Art. 19, IV); e, por fim, a 17 redução de 2/3 (dois terços) sobre a multa aplicável – de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do faturamento bruto do exercício anterior ao da instauração do processo administrativo de responsabilização (Art. 16, §2º). Contudo, como adequar esses dispositivos quanto à proibição de recebimento de benefícios de incentivos fiscais ou creditícios perante o Poder Público, descritos pelos Incisos I a III do Art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa. Acarreta a instrução processual judicial da LIA oficiar à autoridade administrativa para que instaure o processo administrativo pertinente e que possa ensejar a manifestação pelo acordo de leniência, e assim diminuir os encargos e satisfazer a instrução? A primeira problemática é corroborada pela menção sobre não afetação dos processos e penalidades decorrentes da Lei de Improbidade Administrativa, conforme o Inciso I, do Art. 30, da Lei nº 12.846/2013. A redação dada pela Medida provisória nº 703/2015 ressalvava a hipótese do acordo. O conflito surge pela instauração do processo administrativo instaurado, porque o caput do Art. 16 menciona que o acordo dar-se-á em sede de investigações e processo administrativo. Caso mencionasse a hipótese do processo judicial, poderia haver uma comunicação com a ação de responsabilização com base na LIA, o que não é o caso. Ao mencionar processo administrativo, a Lei nº 8.429/1992 comunica com a Lei nº 8.112/1990, que dispõe sobre o Estatuto dos Servidores Públicos Civis Federais, com o fim de investigar a conduta praticada pelo agente público. E quanto à penalidade que restringe o acesso do infrator aos benefícios e incentivos do Poder Público não seriam aplicados ao agente público, em razão do princípio da impessoalidade (e da finalidade), e regras de suspeição e impedimento, a depender do cargo públicoocupado. É um caso a ser discutido e trazido à tona pela jurisprudência. Na prática, parece ser adequada a linha pela escolha da condução da investigação e do processo administrativo pela Lei nº 12.846/2013, pelo viés da eficiência a que se propõe. Entendendo que as duas leis possuam penalidade similar, subentende-se também a aplicação do princípio da especialidade da norma para afastar o conflito aparente de normas, além da vedação à dupla sanção (bis in idem). 18 1.3 COLABORAÇÃO PREMIADA Cumpre também adentrar ao texto da Lei nº 12.850/2013, que alcançou maior repercussão dentro das instituições, por prever o instituto da colaboração premiada. O §1º do Art. 1º já nos propõe a definição de Organização Criminosa, sendo, portanto, a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional. Observa-se, porém, a hipótese residual do conceito trazido, haja vista tratar-se da associação de 4 ou mais pessoas e que as infrações penais praticadas possuam pena superiores a 4 anos. Pois, alheio a este conceito, o Decreto-lei nº 2.848/1940, o Código Penal brasileiro, conceitua o tipo penal de Associação Criminosa, crime contra a paz pública, consistindo na associação de 3 (três) ou mais pessoas associadas para o fim de cometimento de crimes. De antemão, a lei genérica trata da associação criminosa de aspecto mais simplório, enquanto a lei específica disciplina a associação de natureza mais danosa e complexa. O §2º, do Art. 1º, da Lei nº 12.850/2013, estabelece que esta lei também se aplicará às infrações penais previstas em Tratado ou Convenções Internacionais, na hipótese em que a execução do crime tenha sido iniciada no país, e o resultado tenha ocorrido ou deveria ter ocorrido em território estrangeiro; também aplicável para a situação inversa; não bastando, também será aplicável em processo ou investigação acerca de organizações terroristas, nos termos da lei que definem atos terroristas. A persecução criminal, nos termos da lei, dar-se-á com base nos mecanismos a seguir esquematizados: MEIOS DE OBTENÇÃO DE PROVAS Colaboração premiada 19 Captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos Ação controlada Acesso a registros de ligações telefônicas e telemáticas; Acesso a dados cadastrais de bancos de dados públicos ou privados; Acesso a informações eleitorais e comerciais. Intercepção de comunicações telefônicas e telemáticas, nos termos da legislação específica Afastamento dos sigilos (financeiro, bancário e fiscal) nos termos da legislação específica Infiltração em atividades de investigação, por parte dos agentes policiais Cooperação entre instituições e órgãos federais, distritais, estaduais e municipais: busca de provas e informações para os fins da investigação ou da instrução criminal Fonte: Autor, 2020. São, portanto, métodos complexos e invasivos para produção de provas em contextos de crimes graves e estruturados na égide da associação criminosa, necessitando, pois, de disciplina específica sobre o tema. Convém, para nossos estudos, a análise do teor da colaboração premiada, tendo como principal norte o Art. 3º-A, sendo definido como negócio jurídico processual e meio de obtenção de provas. Pela natureza negocial do acordo, sua propositura, a priori, não é unilateral, porquanto estar atrelada ao interesse público e fins da instrução criminal. Pode ser instruído pela parte que se pretende colaboradora, como pelas autoridades e agentes competentes quanto ao andamento da instrução criminal. Conduto, torna-se oportuno observar que a colaboração premiada não é um meio de prova com eficácia em si, não podendo haver condenação com fulcro exclusivamente no termo de colaboração, conforme preceitua o Art. 4º, §16, III, da Lei de Organizações Criminosas (STF – Inquérito nº 4.118 DF. 2ª Turma. Min. Relator: Edson Fachin. Data de julgamento: 08 mai. 2018. Publicação em: 05 set. 2018). Sob o amparo do posicionamento do Supremo Tribunal Federal - STF, a maior garantia auferida pelo colaborador (réu ou indiciado) fica abarcada pelo sigilo e confidencialidade. Ademais, há um flagrante interesse público e até mesmo atinente ao campo da segurança pública, razões suficientes para a manutenção da 20 confidencialidade do teor compromissado (STF – Inquérito nº 4.619 Agr – DF. 1ª Turma. Min. Relator: Luiz Fux. Data de julgamento: 10 set. 2018. Publicação em: 25 set. 2018). Findas as diligências por parte das autoridades, que necessitariam do sigilo, não cumpre mantê-lo por mais tempo, principalmente quando o conteúdo das informações também é de conhecimento público (STF – Inquérito nº 4.435 Agr – DF. 1ª Turma. Min. Relator: Marco Aurélio. Data de julgamento: 12 set. 2017. Publicação em: 19 fev. 2018). Não obstante a garantia do sigilo para atendimento do interesse público, deve ser acessível quando for indispensável para o exercício do contraditório e ampla defesa (STF – Pet. Nº 6.351 Agr – DF. 2ª Turma. Min. Relator: Edson Fachin. Data de julgamento: 07 fev. 2017. Publicação em: 21 fev. 2017). O acervo de decisões emanadas pelas Cortes da Justiça Comum denota especial zelo pelo atributo do sigilo, haja vista haver de um lado a busca por fatos que desestruturem a rede de organização criminosa, e de outro a garantia de presunção de inocência, legítima defesa e contraditório, acerca do réu colaborador. Como título exemplificativo, podemos constatar o seguinte julgado do Pretório Excelso: Reclamação. 2. Direito Penal. 3. Delação premiada. “Operação Alba Branca”. Suposta violação à Súmula Vinculante 14. Existente. TJ/SP negou acesso à defesa ao depoimento do colaborador Marcel Ferreira Júlio, nos termos da Lei n. 12.850/13. Ocorre que o art. 7º, § 2º, do mesmo diploma legal consagra o “amplo acesso aos elementos de prova que digam respeito ao exercício do direito de defesa”, ressalvados os referentes a diligências em andamento. É ônus da defesa requerer o acesso ao juiz que supervisiona as investigações. O acesso deve ser garantido caso estejam presentes dois requisitos. Um, positivo: o ato de colaboração deve apontar a responsabilidade criminal do requerente (INQ 3.983, rel. min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, julgado em 3.3.2016). Outro, negativo: o ato de colaboração não deve referir-se à diligência em andamento. A defesa do reclamante postulou ao Relator do processo o acesso aos atos de colaboração do investigado. 4. Direito de defesa violado. 5. Reclamação julgada procedente, confirmando a liminar deferida. 21 (STF – Rcl. Nº 24.116 – SP. 2ª Turma. Min. Relator: Gilmar Mendes. Data de julgamento: 13 dez. 2016. Publicação em: 13 fev. 2017) Perante a Justiça Federal, houvera sido perquirido o acesso a documentação para construção de provas, sendo contraditado acerca da incomunicabilidade de fatos concernentes ao conteúdo do acordo: HABEAS CORPUS. PENAL. PROCESSO PENAL. ACORDO DE COLABORAÇÃO PREMIADA. SIGILO. ACESSO À DEFESA. LEI Nº 12.850/2003. 1. Hipótese em que o pedido de acesso a eventuais acordos de colaboração premiada foi apreciado pelo Juízo de origem, que consignou não haver acordos firmados após a vigência da Lei 12.850/13 - anterior à denúncia no caso -, e que a exordial está fundada apenas nos elementos constantes dos autos e à disposição das partes, não havendo menção a provas ou indícios cujo acesso não tenha sido outorgado aos acusados e a suas defesas técnicas. 2. Não demonstrado constrangimento ilegal a ser sanado neste momento, e em caso de superveniência de condenação com base em eventual acordo decolaboração premiada, a alegação de cerceamento de defesa pode ser argüida em preliminar de apelo. (TRF4 - HC nº 5021515-61.2017.4.04.0000. 7ª Turma. Min. Relator: Márcio Antônio Rocha. Data de julgamento: 04 jul. 2017. Publicação em: 04 jul. 2017) De acordo com a letra do §4º do Art. 3º-B, os termos de recebimento de proposta da colaboração e de confidencialidade serão elaborados pelo celebrante e assinados por ele, ou pelo colaborador e seu advogado, ou ainda por defensor público com poderes específicos para este fim. Qualquer tratativa ou termo não poderá ser realizado sem a presença de um advogado constituído ou defensor público; na hipótese de surgir conflito de interesses, o celebrante poderá solicitar a atuação de outro advogado ou defensor público. As medidas concessivas em sede da colaboração premiada podem ser o perdão judicial, a redução em até 2/3 (dois terços) da pena privativa de liberdade ou sua substituição por sanção restritiva de direitos (Art. 4º). Porém, são necessários dois 22 requisitos: colaboração efetiva e voluntária, com a investigação ou instrução criminal; e que a delação realizada acarrete resultados concretos, estes dispostos nos Incisos I a V do Art. 4º, a seguir elencados: a) a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas; b) a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa; c) a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa; d) a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa; e) a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada. A norma salienta que serão levados em consideração para a concessão dos benefícios a personalidade do colaborador, a eficácia da colaboração e elementos condizentes ao fato criminoso, como a natureza do tipo penal praticado, as circunstâncias pertinentes, a gravidade e a repercussão social (Art. 4º, §1º). Por iniciativa ex officio, em conformidade com a letra do §2º do mesmo dispositivo, a autoridade policial e o membro do Ministério Público poderão requerer ao juízo a concessão do perdão judicial, mesmo que não previsto na minuta inicial do acordo, resultando até mesmo no arquivamento do inquérito policial, de acordo com o Art. 28 do Código de Processo Penal (Decreto-lei nº 3.689/1941), dependendo da relevância da colaboração prestada. São direitos garantidos ao colaborador aqueles elencados no Art. 5º, sendo observável o binômio preservação dos direitos e integridade do colaborador e interesse público da investigação: a) Usufruir das medidas protetivas previstas em legislação específica; b) Manter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservadas; c) Condução, perante o juízo, em separado dos demais coautores e partícipes; d) Participação na audiência sem contato visual com os outros acusados; e) Garantia de não ter sua identidade revelada em meios de comunicação – até mesmo fotografia ou filmagem, exceto quando autorizado por escrito; f) Cumprimento de pena ou prisão cautelar em estabelecimento prisional diverso dos demais corréus ou condenados. 23 O Artigo seguinte elenca o conteúdo do termo de acordo de colaboração, necessitando conter: a) Relato da colaboração e seus possíveis resultados; b) Condições da proposta do Ministério Público ou do delegado de polícia; c) Declaração de aceitação do colaborador e de seu defensor; d) Assinaturas dos representantes do Ministério Público ou do delegado de polícia, do colaborador e de seu defensor; e) Especificações das medidas protetivas ao colaborador e à sua família, quando forem necessárias. Ao fim da participação beneficiária, a sentença apreciará os termos do acordo homologado e sua eficácia (Art. 4º, §11), em todo seu escopo (STF – Pet. Nº 7.074 Qo – DF. Tribunal Pleno. Min. Relator: Edson Fachin. Data de julgamento: 29 jun. 2017. Publicação em: 03 mai. 2018). Devido ao caráter personalíssimo da negociação, ”[...] Eventual desconstituição de acordo de colaboração premiada tem âmbito de eficácia restrito às partes que o firmaram, não beneficiando e nem prejudicando terceiros. [...]2” Observa-se que antes da mudança proposta pela Lei nº 13.964/2019, denominada como Pacote Anticrime, advogava a jurisprudência pela ausência de hipóteses de rescisão do acordo celebrado. Com a inovação trazida pela lei, o acordo poderá ser rescindido em caso de omissão dolosa de fatos objetos da colaboração (Art. 4º, §17); e pela continuidade das práticas delituosas, conforme afastamento da presunção mencionada no dispositivo (Art. 4º, §18). Pode-se ilustrar que, perante o teor do termo de colaboração, os demais envolvidos na associação criminosa ainda poderiam exercer seu direito de contraditório frente à narrativa. Nesse sentido, o convencimento por intermédio da defesa acarretaria per si a ilegalidade do conteúdo da colaboração premiada? Nesse aspecto, tornar-se-ia imperiosa uma análise robusta dos fatos e negócios ocorridos, até mesmo pelo interesse da persecução criminal (STJ – AgInt HC nº 392.452 – PR. 6ª Turma. Min. Relator: Rogerio Schietti Cruz. Data de julgamento: 13 jun. 2017. Publicação em: 23 jun. 2017). 2 STF HC nº 127.483. Tribunal Pleno. Min. Relator: Dias Toffoli. Data de julgamento: 27 ago. 2015. Publicação em: 04 fev. 2016 24 Conforme disciplina o Remédio Constitucional nº 127.483 sob competência do STF3, a pertinência quanto ao acesso aos documentos produzidos, deve ser balizada frente ao direito de defesa dos agentes mencionados: (...) 4. Tratando-se de colaboração premiada contendo diversos depoimentos, envolvendo diferentes pessoas e, possivelmente, diferentes organizações criminosas, tendo sido prestados em ocasiões diferentes, em termos de declaração separados, dando origem a diferentes procedimentos investigatórios, em diferentes estágios de diligências, não assiste a um determinado denunciado o acesso universal a todos os depoimentos prestados. O que a lei lhe assegura é o acesso aos elementos da colaboração premiada que lhe digam respeito (...) Cumpre mencionar, que pelos demais dispositivos trazidos pela norma de 2019, o juiz torna-se o gestor da manutenção do acordo, perscrutando o que for necessário e limitando o que houver de impertinente, para atendimento da instrução processual. Conforme emanado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, os vícios materiais ou formais de prova poderão ser arguidos no curso da própria ação penal e no campo recursal. Poder-se-ia discutir acerca de acarretar morosidade no andamento da máquina judicial; porém, objetiva a eficiência em sede de acordo para limitação e contenção da atividade ilícita investigada e processada. (TRF-4 - HC nº 5038233- 02.2018.4.04.0000. 8ª Turma. Des. Relator: João Pedro Gebran Neto. Data de julgamento: 07 nov. 2018. Publicação em: 07 nov. 2018). Por fim, consta no Art. 7º os expedientes acerca da homologação da colaboração, distribuído sigilosamente, contendo apenas informações que não possam identificar o colaborador e seu objeto. Consta no §2º do dispositivo mencionado, que o acesso aos autos, como regra, permanecerá restrito ao Ministério Público e ao delegado de polícia, para garantia do êxito das investigações. Admite-se, no entanto, amplo acesso aos elementos de prova 3 Op.cit. 25 que digam respeito ao exercício do direito de defesa, devidamente precedido de autorização judicial. Todavia, são ressalvados os conteúdos que digam respeito à manutenção ou êxito das diligências realizadas pela instrução. Frente a todo o exposto analisado quanto à lei de organização criminosa,cumpre ao operador do Direito discutir e refletir acerca do amplo acesso midiático às proposituras de acordos de delação premiada, no sentido da preservação dos direitos do colaborador e se essa exposição pode ou não comprometer o andamento das investigações realizadas. É um parâmetro ainda a ser traçado, já que a lei ainda é uma novidade legislativa, necessitando ser podada e moderada frente às garantias e direitos fundamentais do réu-colaborador, porquanto estar protegido pela presunção de inocência, até o momento em que assume o delito, e do outro lado a necessidade de obter êxito nas investigações e produções de prova decorrentes da narrativa daquele. 26 2. LEI DE ACESSO À INFORMAÇÃO E PORTAL DA TRANSPARÊNCIA Com o intuito de dar maior concretude ao direito fundamental de acesso à informação sobre os órgãos e entidades públicos dos Três Poderes Constituídos, foi promulgada a Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, como modo de instrumentalizar a disposição constitucional do Art. 5º, XXXIII, conforme segue: Art. 5º (...) (...) XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; No âmbito das disposições constitucionais concernentes à Administração Pública, também ampliou o escopo do Art. 37, §3º, II: Art. 37 (...) (...) § 3º A lei disciplinará as formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente: (...) II - o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII; Por fim, a lei possibilita também a análise do acervo patrimonial cultural do país, conforme vemos na seguinte norma plasmada no texto constitucional: Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: (...) 27 § 2º Cabem à administração pública, na forma da lei, a gestão da documentação governamental e as providências para franquear sua consulta a quantos dela necessitem. Não obstante o teor positivado, também foi oportuna a edição da lei para conter o avanço do descontentamento social contra as instituições, em virtude de escândalos de corrupção e ineficiência na condução de gastos, seja pela desídia de serviços públicos prestados à população ou desconfiança pela situação da carga tributária brasileira. Desta feita, a lei em comento permitiu que a população em geral pudesse ter acesso ao teor econômico-financeiro dos atos realizados pelo Poder Público, inclusive podendo consultar o valor de salário e remuneração de agentes públicos. Expediente que também facilitou o ofício de profissionais da comunicação e analistas do campo econômico. Na esfera federal, o Portal da Transparência pode ser acessado pela url: http://www.portaltransparencia.gov.br/, e tem um rol extenso de dados de caráter público, como orçamento; despesas e receitas; licitações e contratos; cartões de pagamento; benefícios a cidadão; emendas parlamentares; dados que dizem respeito aos servidores públicos; dentre outros. No entendimento exalado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, o direito à informação possui natureza jurídica de direito fundamental de quarta geração, sendo a publicidade dos atos administrativos o meio de consecução dessa garantia.4 Oportunamente, em respaldo aos ditames constitucionais, já foi registrado o ajuizamento de ação civil pública pelo Ministério Público Federal, com o fim de obrigar Municipalidade a corrigir e complementar o conteúdo exposto pelo respectivo portal de transparência: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. LEIS DE ACESSO À INFORMAÇÃO E DA TRANSPARÊNCIA. OBRIGAÇÃO DE 4 TJ-MG. Remessa Necessária nº 1.0620.17.001555-1/001. 3ª Câmara Cível. Des. Relator: Elias Camilo. Data de julgamento: 31 jan. 2019. Publicação em: 06 fev. 2019. http://www.portaltransparencia.gov.br/ 28 REGULARIZAÇÃO DO PORTAL. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. ART. 128, § 5º, INCISO II, ALÍNEA "A", DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal objetivando que o Município de Santana do Livramento/RS proceda à regularização de pendências encontradas no sítio eletrônico para o fim de promover a correta implantação do Portal da Transparência. Incumbe ao Município adotar as medidas necessárias ao cumprimento das obrigações que ainda não foram implementadas, para atender aos requisitos de transparência da administração pública, nos termos da legislação de regência. Deve ser mantida a sentença de procedência parcial da demanda a fim de que o município réu promova a efetiva regularização de seu portal da transparência dando integral cumprimento aos normativos legais previstos na Lei nº 12.527/2011 (Lei de acesso à informação) e Lei Complementar nº 131/2009 (Lei da Transparência). Na dicção do art. 128, § 5º, inciso II, alínea "a", da Constituição Federal, é vedado aos membros do Ministério Público receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais. (TRF4 – Apelação/Remessa Necessária nº 5001668- 32.2016.4.04.7106. 4ª Turma. Des. Relatora: Vivian Josete Pantaleão Caminha. Data de julgamento: 12 dez. 2018. Publicação em: 12 dez. 2018) Salienta-se, inclusive, que o tema da transparência e informação públicas não ficam restritos à Lei nº 12.527/2011. Nesse sentido, a Lei Complementar nº 131/2009 já inovava quando empregava disposições quanto à transparência da gestão pública acerca da condução responsável do orçamento público, ao modificar dispositivos da Lei Complementar nº 101/2000, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Objetivando dar exercício ao mencionado direito, o Ministério Público Federal também pleiteou que o Estado do Mato Grosso do Sul cumprisse as disposições da Lei de Acesso à Informação e da Lei que modificou a LRF (TRF-3 – Apelação nº 0006710-97.2016.4.03.6000. 6ª Turma. Des. Relatora: Consuelo Yoshida. Data de julgamento: 20 set. 2018. Publicação em: 28 set. 2018). 29 A postura ativa da ação cominatória de iniciativa do Parquet se mostra constante (TRF-2 Processo nº 0152658-58.2015.4.02.5119. 8ª Turma Especializada. Des. Relator: Marcelo Pereira da Silva. Data de julgamento: 09 nov. 2018. Publicação em: 26 nov. 2018; e TRF-4 Apelação nº 5002301-95.2016.4.04.7121. 4ª Turma. Des. Relator: Luís Alberto D’azevedo Aurvalle. Data de julgamento: 22 ago. 2018. Publicação em: 22 ago. 2018). Sujeitam-se, assim, ao alcance da norma de transparência e acesso à informação os entes federativos do Brasil, seus órgãos públicos, integrantes da administração direta dos Três Poderes, incluindo os Tribunais de Contas, e os órgãos que atuam perante o Poder Judiciário, como o Ministério Público; e as entidades que compõem a administração indireta da União, estados, DF e municípios. Aplica-se o conteúdo legiferante às entidades privadas sem fins lucrativos que recebam recursos públicos diretamente do orçamento ou mediante subvenções sociais, contrato de gestão, termo de parceria, convênios, acordos, ajustes ou instrumentos contratuais similares, com o fim de realizar sua atividade de interesse público (Art. 2º, caput). O dispositivo abarca a maioria das formas de parceria público- privadas (PPP) que se dão no país. Conforme estipula o Art. 3º, os procedimentos da lei destinam-se a asseguração dodireito fundamental de acesso à informação e necessitam ser executados em harmonia com os princípios da Administração Pública, obedecendo às diretrizes a seguir: a) observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como exceção; b) divulgação de informações de interesse público, independentemente de solicitações; c) utilização de meios de comunicação viabilizados pela tecnologia da informação; d) fomento ao desenvolvimento da cultura de transparência na administração pública; e) desenvolvimento do controle social da administração pública. Como escopo da política de acesso à informação, a gestão transparente da informação, com amplitude e acessibilidade de seu teor (Art. 6º, I). Nesse sentido, tornou-se de conhecimento comum o Portal da Transparência do governo federal, posteriormente replicado nas esferas estaduais e municipais. Conforme o Art. 7º, a informação acessível compreenderá os seguintes direitos: a) orientação sobre os procedimentos para a consecução de acesso, bem como sobre o local onde poderá ser encontrada ou obtida a informação almejada; b) informação contida em registros ou documentos, produzidos ou acumulados por seus órgãos ou entidades, recolhidos ou não a arquivos públicos; 30 c) informação produzida ou custodiada por pessoa física ou entidade privada decorrente de qualquer vínculo com seus órgãos ou entidades, mesmo que esse vínculo já tenha cessado; d) informação primária, íntegra, autêntica e atualizada; e) informação sobre atividades exercidas pelos órgãos e entidades, inclusive as relativas à sua política, organização e serviços; f) informação pertinente à administração do patrimônio público, utilização de recursos públicos, licitação, contratos administrativos; e g) informação relativa à implementação, acompanhamento e resultados dos programas, projetos e ações dos órgãos e entidades públicas, bem como metas e indicadores propostos; e ao resultado de inspeções, auditorias, prestações e tomadas de contas realizadas pelos órgãos de controle interno e externo, incluindo prestações de contas relativas a exercícios anteriores. Por razões de segurança ou funcionalidade das instituições e de projetos políticos, a norma comporta exceções quanto ao acesso e disponibilidade, como o teor de projetos de pesquisa e desenvolvimento científicos ou tecnológicos, cujo sigilo torna-se imperioso para a segurança da sociedade e do Estado (Art. 7º, §1º). Quanto a documentos que mantenham pertinência ao cidadão que solicitar o acesso, este poderá pleitear a parcela não afetada pelo sigilo (Art. 7º, §2º). Oportunamente, manifesta-se algum entendimento adotado por Tribunal de que a mera exposição de informações ao alcance da população por intermédio de um sítio de internet não corrobora suficientemente o direito de acesso à informação, necessitando, pois, o requerimento especificado pela Lei para o devido acesso e conferência de dados (STJ – REsp nº 1.661.697 – AM. 2ª Turma. Min. Relator: Herman Benjamin. Data de julgamento: 19 out. 2017. Publicação em: 19 dez. 2017). Contudo, há abrangência de distintas visões quanto àquela informação de caráter obrigatória e outras que possam estar sujeitas ao juízo discricionário do Gestor Público: REMESSA NECESSÁRIA DE OFÍCIO - RECURSO VOLUNTÁRIO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DIVULGAÇÃO E ATUALIZAÇÃO DE INFORMAÇÕES NO PORTAL DA TRANSPARÊNCIA - DADOS RELATIVOS À FROTA DE VEÍCULOS DO MUNICÍPIO - INOCORRÊNCIA - ROL DE OBRIGATORIEDADE DE DIVULGAÇÃO PREVISTA NO §1º DO ART. 8º DA LEI 12.527/2011 - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO VOLUNTÁRIO PREJUDICADO. 1. Incumbe ao judiciário, no julgamento das demandas propostas, delimitar, o máximo possível, qual é a tênue linha divisória das 31 competências administrativa e jurisdicional, para não se tornar um ordenador de linha para a administração pública. 2. O art. 8º, §1º, da Lei de Acesso à Informação elenca uma série de informações que devem ser, obrigatoriamente, disponibilizadas via internet, independentemente da realização de qualquer requerimento. 3. Não sendo a divulgação e a atualização, no sítio eletrônico do "Portal da Transparência", de informações referentes à frota de veículos do Ente Público Municipal não é medidas obrigatórias, não há falar na omissão ou negligência do ente estadual porquanto se trata de medida eminentemente discricionária da Administração Pública, a qual poderá ser adotada de acordo com a conveniência e oportunidade. (TJMG - Apelação nº 1.0035.17.015047-4/001. 2ª Câmara Cível. Des. Relator Convocado: Lailson Braga Baeta Neves. Data de julgamento: 13 nov. 2018. Publicação em: 26 nov. 2018) Por oportuno, é de fundamental observância, quanto à jurisprudência já consolidada, que acesso à informação de remuneração ou salário de funcionário público é direito do cidadão; porém, dados alheios a essa esfera, como situação matrimonial, número de identidade e outros documentos acabam por lesar o direito à intimidade do agente público consultado (STJ – REsp nº 1.395.623 – DF. 2ª Turma. Min. Relator: Herman Benjamin. Data de julgamento: 01 set. 2015. Publicação em: 11 nov. 2015). Nos autos perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, discutiu-se, inclusive, que para o acesso a informações acerca do agente público consultado, tornar-se-ia pertinente o cadastramento ou escrutínio quanto ao cidadão consulente do Portal de Transparência, em obediência ao princípio de boa-fé e igualdade entre requerente e consultado (TJ-SP Apelação nº 1009710-20.2016.8.26.0114. 1ª Câmara de Direito Público. Des. Relator: Danilo Panizza. Data de julgamento: 07 out. 2018. Publicação em: 07 out. 2018). Todavia, o entendimento acerca dos institutos aqui tratados e o respaldo das garantias de acesso e privacidade dos agentes públicos estão bem sedimentadas conforme a jurisprudência e a sistemática empregada pelo ordenamento jurídico, podendo, a depender do caso concreto, novas orientações serem proferidas. 32 REFERÊNCIAS CUNHA, Rogério Sanchez; SOUZA, Renee do Ó. Lei anticorrupção empresarial: Lei nº 12.846/2013. 3ª ed. Salvador; JUSPODIVM, 2019. COMPARATO, Fábio Konder. Ética: direito, moral e religião no mundo moderno. Companhia das Letras: SÃO PAULO, 2016 VAZQUEZ, Adolfo Sanchez. Ética. 37ª ed. Rio de Janeiro: CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA, 2017
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