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O covid-19 e os possíveis impactos nas relações contratuais

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O COVID-19 E OS POSSÍVEIS IMPACTOS NAS RELAÇÕES CONTRATUAIS.
Muitos são os artigos publicados explanando possíveis soluções a serem adotadas pelas partes e pelo poder judiciário com intuito de amenizar os efeitos da crise sem precedentes provocada pelo covid-19. Diante de tal cenário de instabilidade, surgem diversos questionamentos acerca de como as relações contratuais se sustentarão frente a atual crise cujo impacto na economia é, ainda, imensurável. 
Ante as medidas restritivas adotadas para conter a pandemia, espera-se que ocorra no mercado um significativo aumento no inadimplemento das obrigações. Para tanto, institutos já consagrados pelo Código Civil e pelo Código de Defesa do consumidor têm sido apontados como um possível socorro as relações contratuais.
O primeiro deles é a forca maior ou caso fortuito, previsto no artigo 393 do CC, que, para se configurar, pressupõe uma impossibilidade objetiva no cumprimento da obrigação, justificando, assim, o inadimplemento contratual. De acordo com o dispositivo em questão, em regra, o devedor não responde pelos prejuízos resultante desses eventos. 
A impossibilidade de cumprimento pode ocorrer, inclusive, por intervenção do poder público ao suspender determinada atividade, conhecido como fato do príncipe, como se verificou por meio de atos normativos editados por alguns Estados e Municípios. Neste caso, é possível pleitear a suspenção do pagamento ou até mesmo a resolução sem imputação de culpa às partes contratantes.
Porém, em recente artigo, o professor José Fernando Simão aduz que se a prestação é exequível, mesmo que de maneira mais custosa ao devedor, não estamos diante da força maior em seu sentido clássico, visto que não há impossibilidade do cumprimento da obrigação pecuniária (dar dinheiro). Existe, segundo ele, instrumento específico para essa situação que não o ora mencionado. Afirma ainda que, de fato, existem hipóteses em que a força maior resulta da pandemia, mas estão relacionadas à prestação de fazer. Neste caso, o contrato se resolve e as partes voltam ao estado anterior, sem se falar em perdas e danos.
O segundo instituto é o da onerosidade excessiva, situação em que a prestação continua materialmente possível de ser cumprida, porém se tornou excessivamente onerosa. Neste caso, houve um desequilíbrio contratual em virtude da pandemia. O fundamento para tal argumento se encontra nos artigos 317, 478 e seguintes do Código civil e tratando-se das relações de consumo, no artigo 6º, inciso V do CDC.
No que tange as relações civis, a onerosidade excessiva pode ser invocada quando cumulativamente estiverem preenchidos os seguintes requisitos: evento superveniente, imprevisível e extraordinário e que não possa ser imputado a nenhuma das partes; Além disso, o contrato deve ser de execução diferida ou de trato sucessivo, ou seja, deve sujeitar-se ao fator tempo e, por fim, exige-se que tal evento tenha causado desequilíbrio a relação contratual, gerando excessiva onerosidade a uma das partes e uma extrema vantagem a outra.
Nas relações de consumo, o CDC traz a previsão de revisão ou resolução contratual, porém é prescindível ao consumidor o requisito da imprevisibilidade, bastando para tanto, provar que fato superveniente desequilibrou a relação contratual e quebrou a base objetiva do negócio, fazendo com que as prestações se tornassem desproporcionais.
Há duas resultantes da onerosidade excessiva: a resolução do contrato ou a revisão contratual, que deve servir, a princípio, para sanar o excesso da onerosidade que enseja a aplicação do instituto restaurando o equilíbrio contratual. No entanto, diante da instabilidade econômica que abala o mercado atual, cada relação contratual deve ser analisada em sua individualidade para aferir qual impacto resultante da pandemia, sob pena de desrespeitar princípios basilares que permeiam as relações contratuais e a segurança jurídica.
 	Como bem argumenta Anderson Schreiber em publicação eletrônica, não se pode classificar acontecimentos, mesmo que gravíssimos como se mostra a pandemia, de forma teórica e genérica para declarar que, de agora em diante, todos os contratos podem ser extintos ou devem ser revistos. Afirma ainda, que o “pacta sun servanda não merece ataques desnecessários neste momento”, sendo imprescindível a manutenção da maioria dos contratos já firmados para o bem da economia em geral e das relações sociais.
Neste mesmo sentido, em recente artigo publicado sobre o coronavírus e os contratos, o professor Flavio Tartuce, apesar de reconhecer a previsão dos institutos ora citados para revisão e extinção das relações contratuais, aduz o perigo da generalização de tais institutos e a importância de se priorizar a manutenção dos contratos de acordo com o que foi pactuado ou então em sentido muito próximo. 
Para tanto, apresenta argumentos como a boa-fé objetiva, a força obrigatória das convenções (pacta sun servanda), a função social do contrato em sua eficácia interna e externa, o princípio da intervenção mínima do estado. Leciona ainda que, visando a manutenção das avenças, é possível optar por um plano de pagamento, inclusive pactuado extrajudicialmente e assim, afastar a cobrança dos encargos e acessórios decorrentes da dívida (Juros moratórios e multas contratuais). O referido professor aponta também a colaboração entre as partes como possível alternativa, no sentido de instituir uma extensão do prazo para pagamento ou cumprimento da obrigação. 
Portanto, diante da situação extraordinária que se apresenta, imperioso se faz evitar a generalização da extinção e revisão contratual, visto que, com a pandemia, nem todos os contratos se tornaram impossíveis de serem cumpridos ou apresentam onerosidade excessiva. Em uma crise global como a atual, todos perdem, uns mais outros menos, porém, cada uma das relações contratuais deve ser analisada individualmente sob o prisma da boa-fé objetiva a qual deve permear todos os contratos.
Por fim, neste momento, a negociação entre os contratantes se apresenta como a melhor opção. No entanto, caso não seja possível uma solução extrajudicial que atenda aos anseios das partes envolvidas na relação, caberá ao judiciário utilizar-se das ferramentas ora mencionadas e demais dispositivos constantes na legislação de maneira casuística, a fim de apresentar a melhor solução de forma a restabelecer o equilíbrio e preservar a relação contratual e, com isso, evitar um caos econômico ainda maior do que já provocado pela atual pandemia.
SCHREIBER, Anderson. Devagar com o andor: coronavírus e contratos - Importância da boa-fé e do dever de renegociar antes de cogitar de qualquer medida terminativa ou revisional. Migalhas Contratuais. Migalhas, 23.03.2019. Acesso em: 12 mai. 2020.
SIMÃO, José Fernando. O Contrato nos tempos da covid-19. Esqueçam a força maior e pensem na base do negócio. Acesso em 18 de abril de 2020 
TARTUCE, Flávio. O coronavírus e os contratos - Extinção, revisão e conservação - Boa-fé, bom senso e solidariedade. Migalhas Contratuais. Migalhas, 27.03.2020. Acesso em:13 mai. 2020.

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