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HERMENEUTICA DE PROFUNDIDADE

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Ciências Sociais Unisinos
42(2):85-93, maio/ago 2006
@ 2006 by Unisinos
Resumo
O artigo analisa as possibilidades da Hermenêutica de Profundidade (HP), referencial
teórico-metodológico sistematizado por John B. Thompson, para a pesquisa e análise nas
ciências sociais. Problematiza-se a questão do conhecimento e da pesquisa na
contemporaneidade para, a partir daí, discutir criticamente o emprego da HP nas inves-
tigações sociais.
Palavras-chave: Hermenêutica de Profundidade, pesquisa social, conhecimento, ideologia.
Abstract
The paper analyzes the potentials of Depth Hermeneutics (DH), a theoretical and
methodological framework developed John B. Thompson, for research and analysis in
social science. Issues about knowledge and investigation in contemporary research
practices are discussed, and within this context the use of HP is critically assessed.
Key words: Depth Hermeneutics, social research, knowledge, ideology.
1 Doutora em Psicologia pela PUCRS. Docente e
pesquisadora do Programa de Pós-Graduação
em Ciências Sociais da UNISINOS-RS.
2 Doutor em Psicologia Social e Comunicação
pela University of Wisconsin at Madison
(UWM), pós-doutorados na UWM e na
University of Cambridge (UC), Inglaterra.
Professor e pesquisador da PUCRS.
Marília Veríssimo Veronese1
mariliav@unisinos.br
Pedrinho Arcides Guareschi2
guareschi@pucrs.br
Hermenêutica de Profundidade na pesquisa social
Depth Hermeneutics in social research
Introdução: reflexões sobre metodologia
Falar sobre ciência, epistemologia e método é sempre fascinante, especialmen-
te quando se buscam novas formas de racionalidade, capazes de dar conta de ambi-
entes sociais de grande complexidade. Essa busca instiga à pluralidade metodológica,
como forma de enriquecer e complexificar o cerco epistemológico ao objeto de estu-
do, essencial na investigação sociológica. Esse cerco epistemológico é sempre desafi-
ador e se coloca como base das práticas de pesquisa social; o tema deste artigo é
justamente uma das possibilidades de investigação social, a hermenêutica de profun-
didade (HP), referencial teórico-metodológico proposto por John B. Thompson (1998).
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86 HERMENÊUTICA DE PROFUNDIDADE NA PESQUISA SOCIAL
CIÊNCIAS SOCIAIS UNISINOS
O problema do conhecimento é hoje fundamental, uma
vez que, como já demonstrou Foucault, saber e poder estão
intimamente relacionados. A má distribuição do conhecimento
que a ciência moderna – forma privilegiada de conhecimento
desde o século XVII – gerou em seu desenvolvimento é uma
questão social de imensa gravidade. A ruptura epistemológica
da ciência moderna com o senso comum proporcionou avanços
sociais e tecnológicos fenomenais; entretanto, faz-se necessá-
ria a dupla ruptura, ou seja, romper com a própria ruptura, re-
conciliando-se com o senso comum na direção de um senso
comum emancipatório. Por esta razão, o estatuto epistemológi-
co dos saberes, bem como os privilégios extracientíficos da sua
hierarquização, é tema que deve ser constantemente discutido
e problematizado (Santos, 2004).
A crítica à razão instrumental da ciência moderna tem
várias vertentes e formulações. Para Santos (2004, p. 18):
O que distingue o debate moderno sobre o conhecimento
dos debates anteriores é o facto de a ciência moderna ter
assumido a sua inserção no mundo mais profundamente do
que qualquer outra forma de conhecimento anterior ou con-
temporânea: propôs-se não apenas compreender o mundo
ou explicá-lo, mas também transformá-lo. Contudo, parado-
xalmente, para maximizar a sua capacidade de transformar
o mundo, pretendeu-se imune às transformações do mun-
do. Nos termos da consciência de si próprios que a ciência e
os cientistas tenderam, dominantemente, a formar desde os
tempos da revolução científica até um período muito recen-
te, o privilégio epistemológico que a ciência moderna se
arroga pressupõe que a ciência é feita no mundo, mas não é
feita de mundo.
A partir do entendimento das limitações da ciência mo-
derna e da razão instrumental contidas nessa versão e procu-
rando efetivar o princípio das duas rupturas epistemológicas,
buscam-se patamares de superação na prática da pesquisa soci-
al. Refletir sobre essas questões, discutindo-as no espaço públi-
co da comunidade científica interessada em transformar a ci-
ência numa instância mais sensível aos dramas humanos, é um
caminho para a produção do “conhecimento prudente para
uma vida decente” (Santos, 2004).
Nesse sentido, é preciso admirar-se diante da importân-
cia da tarefa de pesquisar, da tentativa de dar conta da compre-
ensão do ser humano e suas interações em sociedade. No en-
tanto, precisamos ter cuidado para não cometer o equívoco de
confundir conhecimento científico com razão instrumental; a
razão argumentativa, também ela típica dos ideais iluministas,
é justamente um marco na direção de um horizonte normativo
que conduza ao diálogo, à crítica e autocrítica, à verdade possí-
vel e negociada e à decisão plausível, caracterizando uma raci-
onalidade dialógica e antidogmática, como um processo de
geração de consensos (provisórios, mas concretos e necessári-
os). E é justamente na razão argumentativa, dialógica, que se
baseia a HP – Thompson talvez seja o mais importante
interlocutor de Habermas, na língua inglesa –, método em que
a argumentação sobre a plausibilidade das interpretações será
fundamental.
Claro que a razão discursiva não é a única forma de nego-
ciar a verdade. Justamente a modernidade tardia viu emergi-
rem questões importantes, como a diferença, a pluralidade, o
fim das certezas e novas alternativas epistemológicas e
metodológicas. Mas, como lembra Soares (2005), a valorização
do pluralismo não implica a aceitação absoluta do relativismo; e
o legado do Esclarecimento, se devidamente despido de seus
terríveis ímpetos etnocêntricos e colonialistas, não pode ser sim-
plesmente descartado.
Na perspectiva da pesquisa, as implicações desta reflexão
são várias. Para Rolim (2005, p. 19): “O que há de científico nos
resultados aferidos por procedimentos rigorosos e pela experi-
mentação é, conceitualmente, a expressão de uma aproxima-
ção.” Essas aproximações da realidade constituem um conhe-
cimento provisório e sujeito a revisão, mas um conhecimento
que pode e deve ser continuamente produzido para contribuir
na busca por uma sociedade política, econômica e socialmente
menos desigual.
Esse texto, assim, se ocupa de apresentar uma possibili-
dade teórico-metodológica em pesquisa social, centrando-se nos
pressupostos acima descritos.
Quando da realização de uma pesquisa, ao “botar “a mão
na massa”, diante do problema empírico que se deseja investi-
gar, surgem várias questões importantes, a serem equacionadas
antes, durante e depois do trabalho de campo. Os problemas
relevantes enfrentados pelos agentes da pesquisa – pressupon-
do que já tenham uma noção razoavelmente clara do seu obje-
to de estudo e dos pressupostos epistemológicos a partir dos
quais pretendem aproximar-se deste – são: a escolha do méto-
do, a construção do corpus de dados e os procedimentos analí-
ticos. A indicação metodológica, portanto, tem de ser criteriosa
e adequada para aquele objeto específico que se investiga. Ten-
do consciência do problema da impossibilidade de apreensão
total do dado vivo, é preciso optar por uma forma de aproxima-
ção do objeto de estudo que permita ganhar clareza nos seus
principais pontos, já que, como costumava dizer Paulo Freire, o
saber cabal sobre o objeto é da ordem do impossível.
Acreditamos ainda que a pesquisa é o processo de procu-
rar conhecer os processos de sentido que se configuram nos
cenários sociais. Esses cenários, onde interagem sujeitos pro-
duzindo e sendo interpelados por formas simbólicas, vão ser
apreendidos pelo pesquisador que vai, então, tecendo os ele-
mentos de sentido, os quais se produzem na sua relação com os
eventos.
O fenômeno – ou a apreensão que temos dele – é o regis-
tro subjetivo, no nível do sentido, desses eventos. Para tecer os
elementos de sentido,uma das opções que se colocam na pes-
quisa social é a realização de um processo hermenêutico críti-
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co, em que não se desvelam sentidos, mas se propõem sentidos
viáveis, para avançar na compreensão do fenômeno, sugerindo
uma verdade plausível, mesmo que provisória.
A objetividade, que foi durante tanto tempo confundida
com neutralidade, pode expressar-se como “[...] a aplicação ri-
gorosa e honesta dos métodos de investigação que nos permi-
tem fazer análises que não se reduzem à reprodução antecipa-
da das preferências ideológicas daqueles que as levam a cabo”
(Santos, 2002, p. 31).
Identificando os valores, preconceitos e interesses que
subjazem à pesquisa – que eventualmente eram ignorados ou
tratados como viés a ser superado –, a objetividade fica
fortalecida, sem que se cometa o equívoco de entender sujeito
e objeto como dicotômicos e não mutuamente implicados.
A Hermenêutica de Profundidade (HP)
A nossa opção por trabalhar com a HP esteve calcada na
abertura metodológica que tal proposta oferece. Com essa ferra-
menta teórica e metodológica, o pesquisador pode analisar o
contexto sócio-histórico e espaço-temporal que cerca o fenôme-
no pesquisado, pode empreender análises discursivas, de con-
teúdo, semióticas ou de qualquer padrão formal que venha a ser
necessário; pode analisar a ideologia como vertente social im-
portante, conferindo um caráter potencialmente crítico à pes-
quisa, o que vem a ser destacado por Thompson (1998) em sua
obra Ideologia e cultura moderna. O referencial metodológico
da HP inclui formas de análise complementares entre si, partes
de um processo interpretativo complexo.
Representamos essas etapas, inicialmente, através da Fi-
gura 1 baseada no modelo apresentado pelo autor (Thompson,
1998, p. 365).
Argumentando com base especialmente nos trabalhos
de Paul Ricoeur, o autor parte da noção de que a hermenêutica
pode oferecer tanto uma reflexão de cunho filosófico quanto
uma ferramenta metodológica para compreender situações
sociais. Se o processo de interpretação é combinado com mé-
todos explanatórios, ou objetivantes, os resultados podem ser
ainda mais proveitosos, uma vez que compreensão e explana-
ção não são por ele tomadas como antitéticas, mas como com-
plementares.
O potencial inovador da abordagem da HP poderia residir
no fato de que ela supera as abordagens tradicionais de ideologia,
invocando a necessidade de propor sentidos, discuti-los,
desdobrá-los e não desvelá-los. Nesse último marco, estaríamos
procurando descobrir os sentidos ocultos, o famoso “véu” que
supostamente cobriria todos os fenômenos sociais, esperando para
ser retirado pelo pesquisador, que então acessaria a verdade, des-
de que usasse um método científico, confiável. Não se trata dis-
so; na HP, estaremos propondo sentidos, que até poderemos
muitas vezes interpretar como ideológicos. Mas para isso precisa-
remos argumentar e debater, num exercício de racionalidade
argumentativa e comunicativa. Se afirmamos algo, através da
interpretação, temos a obrigação de justificá-lo, de fundamentar
essa interpretação em argumentos que sejam inteligíveis a todos
os parceiros engajados na ação. Por esta razão, o autor é conside-
rado um dos principais interlocutores de Habermas, no mundo
de língua inglesa. Trata-se de construir uma análise plausível,
dentro de um paradigma compreensivo; não de acessar e revelar
a verdade, mas de fazer uma leitura qualificada da realidade tal
qual ela se apresenta, no nível do sentido apreendido do fenôme-
no, no campo investigado. Esse exercício poderá ser potencial-
mente transformador do mundo social e mostra-se potente tam-
bém como ferramenta para a pesquisa social que pretenda conhe-
cer e entender um campo-sujeito.
Thompson trabalha com a idéia de que o mundo sócio-histó-
rico é um campo-sujeito construído pelas pessoas no curso rotinei-
ro de suas vidas, através de formas simbólicas, as quais define
como um amplo espectro de ações e falas, imagens e textos. Estão
constantemente interpretando essas ações, falas, imagens e acon-
Figura 1. Hermenêutica de Profundidade.
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CIÊNCIAS SOCIAIS UNISINOS
tecimentos ao seu redor e refletindo sobre eles; por isto, a pesquisa
social realiza uma re-interpretação. A análise ainda pode conter
uma dimensão propositiva, ou seja, uma contribuição para o cam-
po-sujeito que investigou. A HP, segundo Thompson (1998, p. 363):
“[...] resumidamente, é o estudo da construção significativa e da
contextualização social das formas simbólicas”.
Quanto às diferentes fases do processo metodológico, o
autor destaca que as fases não são necessariamente etapas cro-
nológicas, mas sim distintas dimensões de análise, complemen-
tares, a serem utilizadas conforme o contexto e os objetivos da
investigação (e a criatividade sociológica de quem pesquisa).
Passamos a caracterizar e comentar brevemente cada fase.
Interpretação da doxa
A interpretação da doxa é a hermenêutica da vida cotidi-
ana, uma avaliação criteriosa de como os sujeitos entendem
sua realidade cotidiana; Thompson refere essa etapa como “um
momento etnográfico” que reconstrói as maneiras como as pes-
soas estão percebendo a realidade ao seu redor, suas opiniões,
crenças e compreensões. Entretanto, ressalta que a interpreta-
ção da doxa é o ponto de partida, apenas o primeiro passo para
o início do trabalho hermenêutico.
Esse é justamente um ponto fundamental da sua argu-
mentação: na fenomenologia, por vezes, pára-se na constatação.
Há muitos que, pelo fato de descreverem, às vezes
pormenorizadamente, os fenômenos como eles se dão, como
fluem, etc., já consideram o trabalho hermenêutico completo, o
que não seria o caso, na perspectiva da HP. Mesmo quando
procuram descrever “a maneira como as pessoas compreen-
dem”, freqüentemente não se colocam os pesquisadores como
“produzindo” uma coisa nova. A HP é a produção inovadora de
um autor(a), uma produção de conhecimento específica, base-
ada, isto sim, em um referencial teórico que possa fundamentar
com rigor esse conhecimento.
Ao considerar o trabalho pronto elaborando as compre-
ensões dos sujeitos sobre sua vida cotidiana, corre-se o risco de
negligenciar aspectos que brotam da constituição do campo
investigado, seu contexto, das constelações de interações que
o cercam. A sua estruturação pode estar ligada a outros fatores,
que muitas vezes os sujeitos não percebem ou menosprezam.
Aí a HP oferece o aprofundamento, o mergulho nas condições
contextuais do fenômeno.
Análise sócio-histórica
Ao realizar a análise sócio-histórica, reconstituímos as
condições sociais de produção, circulação e recepção das for-
mas simbólicas, que, afinal, não se produzem num vácuo. Pro-
curamos resgatar as situações no espaço e no tempo, ao enfocar
os campos de interação, as instituições sociais e a estrutura
social, identificando as assimetrias na distribuição de poder e
recursos e abordando temas como classe, trabalho, gênero, etnia,
geopolítica, entre outros. Ao analisar as instituições sociais, por
exemplo, precisaremos reconstruir o conjunto de regras que as
constituem e sustentam e, assim, verificar como as formas sim-
bólicas se produzem e como são recebidas naquele ambiente
específico, para depois podermos argumentar de modo funda-
mentado sobre suas implicações.
Assim, estar-se-ia contemplando tanto uma interpretação
dos padrões de significado incorporados pelos sujeitos como uma
análise das implicações de poder e conflitos a eles subjacentes,
através da atenção aos modos de operação da ideologia, que o
autor define como o uso de formas simbólicas para sustentar
relações de dominação, assimétricas, desiguais ou opressoras.
Tais relações são estabelecidas e sustentadas por estraté-
gias, por práticas, tantas vezes reproduzidas e naturalizadas
que eventualmente os próprios atores nãotenham consciência
do seu potencial opressor.
Baseando-se em Bourdieu, Thompson argumenta que um
campo de interação social pode ser conceituado, sincronica-
mente, como um espaço de posições e, diacronicamente, como
um conjunto de trajetórias. As posições ocupadas e as trajetóri-
as vividas estarão relacionadas com o tipo de recursos ou capi-
tais que o sujeito acessou e acumulou. Relembrando: o capital
simbólico está associado aos méritos acumulados, prestígio e
reconhecimento; o capital cultural, ao conhecimento, habilida-
des e qualificações educacionais.
Na análise das instituições sociais, o pesquisador tenta
acessar as constelações de regras, recursos e relações que estão
situados dentro dos campos de interação e que recursivamente
os produzem. Para tanto, é importante abordar os modos e es-
tratégias de operação da ideologia, ou como as constelações
relacionais de poder podem sustentar dominação, desigualda-
de, injustiças; quando as relações são sistematicamente assi-
métricas, materializa-se a dominação.
É nas relações sociais cotidianas que se materializam os
processos de valorização simbólica de pessoas, objetos e práticas.
A valorização simbólica pode eventualmente reverter em valori-
zação econômica, bastando pensar nas roupas de alta costura
para ter-se um bom exemplo desses processos. Como um casaco
pode vir a custar 85.000 dólares? Somente com fortes atributos
simbólicos a seu favor: se foi produzido numa maison de haute-
couture francesa, desenhado por um estilista famoso que veste
as ricas e famosas etc., fica associado ao luxo, à riqueza, ao suces-
so e ao bem-viver da sociedade de consumo capitalista.
Para dar mais um exemplo prático (Thompson refere-se a
ele na p. 208 da supra-referida obra), pensemos em uma insti-
tuição onde um indivíduo que ocupa uma posição “superior”
(dominante) na hierarquia pode utilizar-se de estratégias de
distinção, ou seja, procurar diferenciar-se das pessoas e grupos
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que ocupam posições “inferiores” na hierarquia; uma obra de
arte cara na parede de sua sala pode demarcar essa distinção,
ou o uso de uma roupa ou automóvel de luxo. Para o pesquisa-
dor social, esses detalhes não podem passar despercebidos... se
o interesse por essas questões orientar a pesquisa, é claro.
Também é preciso lembrar que a assimetria nem sempre
estará ligada à dominação. Existem relações assimétricas, como
a relação mãe-bebê (ou cuidador-bebê), ou a do professor com os
alunos na educação infantil que são, naturalmente, assimétricas,
dado que os recursos materiais e imateriais para lidar com a rea-
lidade não serão os mesmos. Mas existem outros elementos pre-
sentes nessas relações, como o amor, o cuidado, o ensino, que
impedem a dominação de marcar o relacionamento.
Mas de um modo geral, o interesse da HP irá centrar-se
naquelas relações em que o sentido opera a ideologia. É no nível
das interações e da semantização do mundo que se produzem
as estratégias e práticas e as constelações relacionais de poder,
e é o mergulho em tal nível de análise que Thompson propõe
com a análise sócio-histórica na HP.
Análise formal ou discursiva
Na fase da análise formal, parte-se do pressuposto de que
os objetos e expressões que circulam nos campos sociais, atra-
vés dos quais se dão as relações, são formas simbólicas, constru-
ções complexas que apresentam uma estrutura articulada (se-
jam elas textos, falas, imagens paradas ou em movimento,
ações, práticas etc). Que padrões de relações estão contidos
nas formas simbólicas e em sua relação com o contexto sócio-
histórico? Essa fase é de fundamental importância, pois estare-
mos examinando as formas simbólicas na perspectiva da sua
estrutura interna (por exemplo: análise semiótica para uma
imagem, análise narrativa ou de conteúdo para um texto e
assim por diante). Estaremos relacionando-a, sempre, com as
condições de sua produção ou do seu contexto sócio-histórico,
mas é importante um momento de desconstrução dos elemen-
tos internos constitutivos da forma simbólica. Existem dezenas
de tipos de análises formais; só de análise de discurso há mais
de 50 tipos, conforme referem Bauer e Gaskell (2002).
O termo “discurso” é utilizado com referência às instân-
cias de comunicação correntemente presentes, como, por
exemplo, conversações entre amigos, editoriais jornalísticos,
interações em sala de aula, falas em programas televisivos,
que “[...] implicam uma concatenação de frases ou expres-
sões, que estão combinadas de uma maneira específica para
formar uma unidade lingüística ordenada, supraproposicional.”
(Thompson, 1998, p. 371).
Análise da conversação, análise sintática, análise da es-
trutura narrativa – são muitas as maneiras de tratar o discurso.
A análise da narrativa é apontada por Jovchelovitch e Bauer
(2002) como uma forma de compreender a perspectiva do infor-
mante sobre os fatos e relações que o rodeiam. Contar histórias
implica duas dimensões: a cronológica, que coloca em seqüên-
cia as vivências narradas, e a não-cronológica, cujo fim é arran-
jar, num sentido coerente ou enredo, os fatos ou experiências
narradas. O sentido não está ao final da narrativa, mas se cons-
titui durante a história em sua totalidade, que fluirá no tempo
conforme a cadência dos acontecimentos. Pessoas, comunida-
des e grupos sociais contam histórias com palavras e também
com expressões não verbais, podendo-se supor que suas narra-
tivas exponham sua visão de mundo e sua experiência. O léxi-
co do grupo social constitui sua perspectiva de grupo, indepen-
dentemente da educação e competência lingüística. Não há
experiência humana que não possa ser descrita em uma narra-
tiva. Dependendo do contexto, o próprio ato de narrar pode
alterar sentimentos ou mesmo acontecimentos.
Assim, utilizando-nos de um padrão formal de análise, po-
demos entender como o sentido opera, como uma possível men-
sagem é transmitida, seja pela imagem, pela fala ou pela escrita.
Uma imagem pode falar mais do que mil palavras, diz o
ditado. A análise semiótica pode revelar importantes nuances
das imagens publicitárias, por exemplo. Segundo Penn (2000),
essa forma de análise tem sido aplicada em uma variedade
enorme de sistemas de signos, como moda, arquitetura, publici-
dade e até histórias de fadas.
Essa abertura da fase da análise formal, onde o analista
pode utilizar qualquer padrão formal, o mais indicado para seu
tipo de material (texto, imagem, som etc), propicia uma rica gama
de possibilidades que torna o método da HP bastante abrangente.
Re-interpretação
Finalmente, a HP propõe a fase de re-interpretação. Essa
construção criativa é, segundo Thompson, um impulso à com-
preensão do mundo social e à construção de saberes que possu-
am um potencial crítico, de sentido emancipatório. Essa fase
dá-se a partir da análise formal, mas distingue-se dela, uma vez
que essa última procede por análise: desconstrói, quebra, divi-
de, visando ampliar o conhecimento sobre as formas simbólicas
– o cerco epistemológico –, focando sua estrutura interna.
Já na re-interpretação, procede-se por síntese, integrando
o conteúdo das formas simbólicas à análise do contexto de sua
produção. Trata-se de uma explicação interpretativa, plausível
e bem fundamentada – daí a necessidade de um referencial
teórico consistente – do fenômeno investigado.
É o aspecto referencial das formas simbólicas que está espe-
cialmente em jogo nesse momento; elas representam algo, dizem
alguma coisa sobre algo do mundo social, e é esse caráter que
deve ser compreendido no momento da re-interpretação.
O caso é que os sentidos produzidos durante o trabalho
do analista podem distanciar-se ou mesmo divergir do significa-
do atribuído às formas simbólicas por quem originalmente as
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90 HERMENÊUTICA DE PROFUNDIDADE NA PESQUISA SOCIAL
CIÊNCIAS SOCIAIS UNISINOS
produziu e pré-interpretou: os sujeitos sociais.Nesse sentido é
que Thompson argumenta: “A possibilidade de um conflito de
interpretação é intrínseca ao próprio processo de interpretação.”
(Thompson, 1998, p. 376).
Esse risco é inerente ao empreendimento de re-interpre-
tar um campo já previamente interpretado pelos sujeitos. O
autor denomina esta situação de “divergência entre uma inter-
pretação de superfície e uma de profundidade”, ou “entre uma
pré-interpretação e uma re-interpretação” (1998, p. 376).
O fato é que se sustenta a concepção de que as formas sim-
bólicas precisam ser compreendidas com referência às condições
sócio-históricas de sua produção e recepção, tanto quanto com
referência à sua estrutura interna, seus padrões e efeitos. O esque-
ma intelectual da HP deverá demonstrar os aspectos múltiplos das
formas simbólicas, evitando as armadilhas do internalismo (o texto
é independente do contexto) ou do reducionismo (o texto é pro-
duzido exclusivamente em função do contexto).
A interpretação da ideologia
John B. Thompson toma a interpretação da ideologia como
uma forma específica de HP, numa dimensão de crítica da ideolo-
gia, ou seja, de como o sentido opera para estabelecer e sustentar
relações de dominação (assimetrias sistemáticas que impliquem
efeitos nocivos para determinados grupos ou atores sociais). As
assimetrias mais gritantes, nas sociedades contemporâneas, são
aquelas relativas às divisões de classe, gênero, etnia e estado-
nação, dentro dos seus campos de interação (há muitas outras
formas, evidentemente). Citando o autor: “Interpretar a ideolo-
gia é explicitar a conexão entre o sentido mobilizado pelas for-
mas simbólicas e as relações de dominação que este sentido
ajuda a estabelecer e sustentar.” (Thompson, 1998, p. 379).
Não é nosso objetivo, nesse artigo, discutir a complexida-
de da teoria da ideologia de Thompson, empreitada que merece
um texto próprio no futuro. Detemo-nos aqui, refletindo sobre a
pesquisa social, no interesse específico do entrecruzamento das
formas simbólicas com as relações de poder.
Embora o autor beba da fonte marxista ao manter um
sentido negativo para a ideologia – embora não a conceba como
falsa consciência –, rompe (como era de se esperar) com a pers-
pectiva de que são as relações de subordinação de classe que
constituem necessariamente os eixos da exploração e da desi-
gualdade, hoje. Nas sociedades contemporâneas, outras for-
mas de conflito, em alguns contextos, são mais agudas do que
essas, embora, é claro, a dominação de classe não seja um
problema extinto, pelo contrário. Apenas a subordinação da
importância ou magnitude das formas de dominação depende
de muitos fatores, de uma pluralidade imensa de variáveis, a
exemplo das relações entre os sexos, os grupos étnicos, as co-
munidades, entre os cidadãos e o Estado, entre blocos de esta-
dos-nação, da mídia hegemônica com os cidadãos.
Somente a título de informação, caso o leitor o desconhe-
ça, reproduzimos, na Tabela 1, o quadro dos modos e estratégi-
as de operação da ideologia apresentado por Thompson (1998,
p. 81), acrescido do modo de banalização, com suas respecti-
vas estratégias, feito por Guareschi e outros (2003, p. 322).
Como exemplo de modo de operar a ideologia na socieda-
de, tomemos o cenário econômico contemporâneo, calcado no
consenso de Washington; procede-se à naturalização de uma
situação sócio-histórica específica, que tem por base acordos
institucionais entre Estados e instituições financeiras, tratan-
do-a como se fosse natural, como se constituísse resultado ine-
vitável de um desenrolar aparentemente inexorável das rela-
ções humanas e econômicas. A naturalização da própria con-
juntura econômica parece pairar sobre toda a sociedade, sendo
apresentado como inevitável o cenário atual, como fruto de
auto-ajuste do sistema, resultado de leis naturais que a ciência
econômica elucida, ao enunciá-las. O contraponto é a corrente
que vê esse cenário como fruto de leis econômicas, construídas
pelas pessoas e instituições que detêm poderes para tanto.
Relações de dominação podem ser apresentadas como
justas e dignas de apoio, procedendo-se à sua legitimação. A
mídia, na sociedade contemporânea, é um veículo difusor po-
tente de formas simbólicas as mais diversas. Eventualmente,
pode legitimar mensagens reacionárias, como, por exemplo, a
necessidade do cidadão comum de adquirir armas e utilizá-las
para defender seus interesses, diante da incompetência do Es-
tado para fazê-lo. Ou ao veicular, repetidamente, filmes e séries
para a televisão, produzidos nos Estados Unidos, em que o “ban-
Modos gerais Algumas estratégias típicas de construção simbólica
Legitimação Racionalização, Universalização, Narrativização
Dissimulação Deslocamento, Eufemização, Tropo (metonímia, metáfora, sinédoque)
Unificação Estandardização, simbolização da unidade
Fragmentação Diferenciação, expurgo do outro
Reificação Naturalização, eternalização, nominalização
Banalização Divertimento, Fait-divers, Ironia, Chiste
Tabela 1. Modos e estratégias de operação da ideologia.
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MARÍLIA VERÍSSIMO VERONESE, PEDRINHO ARCIDES GUARESCHI
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dido” deve sempre morrer trucidado pelos tiros dos “bons”,
para a “população ordeira” ter a alma lavada e sentir que assim
expia os crimes cometidos pelos “maus”.
Ou quantas vezes, durante a ditadura militar no Brasil,
supressões violentas de protestos foram descritos como “a res-
tauração da ordem”...? Exemplos abundam. Não só na mídia,
mas nas instituições com as quais interagimos quotidiana-
mente, convivemos com esses modos e estratégias e muitos
outros.
Análises de mídia, ou estudos de recepção, são formas de
pesquisa social que podem utilizar-se da metodologia da HP
para demonstrar aspectos ideológicos das mensagens de forma
fundamentada.
Breve exemplo empírico da
análise hermenêutica
Thompson faz algumas ressalvas importantes a duas pos-
síveis tendências da pesquisa social contemporânea – ou tenta-
ções epistemológicas –, que ele chama de falácias: falácia do
internalismo e falácia do reducionismo. A primeira significa o
ato de considerar as formas simbólicas, por exemplo, um discur-
so ou texto, totalmente descolado do contexto, ou seja,
analisável em si mesmo, totalmente autônomo, como se suas
características não possuíssem referência alguma nas condi-
ções sócio-históricas de sua produção. A última significa tratar
a forma simbólica, analisá-la, somente em função das suas con-
dições sociais de produção e reprodução. O esquema intelectu-
al e metodológico que Thompson propõe leva em conta ambas
as dimensões, procurando articulá-las na busca da relação en-
tre poder e sentido. O autor considera as relações de domina-
ção como um tipo particular de relações de poder, sistematica-
mente assimétricas e desiguais e relativamente duráveis. As
divisões de classe, etnia, estado-nação e gênero são alguns ele-
mentos que estruturam as instituições sociais e os campos de
interação, sustentando as assimetrias.
No caso da mídia, tem-se um terreno fértil para a utiliza-
ção da HP, uma vez que a mídia mobiliza o sentido de forma
ampla, poderosa e persistente, tendo um poder de penetração e
conformação significativo e relevante.
Mas o caso que trazemos como ilustração do uso da HP
versa sobre outro tema importante, especialmente neste ano de
2006, que é um importante ano eleitoral no Brasil: as represen-
tações sociais da política.
O exemplo que apresentamos aqui está publicado no arti-
go “A representação social da política”, fruto de pesquisa reali-
zada pelo grupo Ideologia, Comunicação e Representações So-
ciais, do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da PUCRS,
coordenado pelo professor Pedrinho Guareschi e cujos resulta-
dos foram publicados no livro Os construtores da informação:
meios de comunicação, ideologia e ética (Guareschi et al.,
2000). Desse trabalho, retiramos o seguinte exemplo de uso da
Hermenêutica de Profundidade na pesquisa social.
A categorização das informações foi feita a partirde 411
unidades de sentido, recolhidas da transcrição de seis grupos
focais. Participaram desses grupos estudantes universitários, es-
tudantes do ensino médio e moradores de uma vila popular em
Porto Alegre-RS, no ano de 1996, ou seja, quando os brasileiros já
haviam votado duas vezes para presidente da República.
Ao redor de 70% das verbalizações foram agrupadas nas
seguintes categorias: Manipulação/Dominação, Falta de edu-
cação/Alienação, Coisa ruim/Sujeira e Desilusão/Injustiça.
A análise tradicional dessas categorias, baseada na doxa
ou numa hermenêutica de superfície, permanece no agrupamen-
to e descrição do fenômeno e das categorias produzidas pelos
discursos dos sujeitos. Já a análise re-interpretativa “dá um mer-
gulho” sob essa superfície e propõe interpretações mais sutis.
Uma análise interpretativa a partir da ideologia, isto é,
dos modos e estratégias presentes em determinadas formas
simbólicas que servem para criar ou manter relações de domi-
nação, revela facetas novas para a compreensão mais profunda
do fenômeno e suas eventuais conseqüências para a socieda-
de. Não podemos esquecer que toda interpretação é parcial e
conflituosa, sujeita a re-interpretações.
No caso em questão, as interpretações avançaram e sugeri-
ram algumas possibilidades de ler-se esse fenômeno. Falas de en-
trevistados, tais como “cada povo tem o político que merece; o
povo não tem educação; trocam o voto por um saco de feijão; falta
informação na hora do voto, e não podemos esquecer que se os
políticos são corruptos, é porque o povo é corrupto, pois foi o povo
que o colocou lá, etc.” mostram, de forma indireta, que, se a classe
dominante opera uma política de exploração e dominação, é por-
que o povo o quer assim, por que ele não sabe votar, porque é
ignorante, analfabeto etc. Portanto, a “culpa” da corrupção recai
sobre o povo brasileiro, que é quem a mantém, através do seu voto
corrompido. Além de elas revelarem uma introjeção da imagem do
opressor (conforme falava Paulo Freire), evidencia-se também uma
clara estratégia de deslocamento e expurgo do outro em que se
procura um bode expiatório para redimir as culpas dos verdadeiros
responsáveis. Ao mesmo tempo, isso serve muito bem aos interes-
ses dos políticos profissionais interessados na impunidade da
corrupção, pois, além de se eximirem da culpa, mantêm as pessoas
afastadas da prática política, uma vez que já foi introjetada, em
suas consciências, a convicção de que “o povo é ignorante, não
presta, não tem condições de exercer tal atividade etc.”.
A partir dessa percepção pode-se, também, suspeitar do
interesse dos grandes empresários da comunicação em colocar
cada vez mais o tema da política na mídia, apresentando-a
como o “oitavo pecado capital”. A mensagem que fica é que, se
todos os políticos são igualmente corruptos, não podemos nem
devemos nos aproximar deles. A conseqüência é a repetição e a
continuidade de tais práticas que, indiretamente, vêm manter
a permanência de seus privilégios.
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92 HERMENÊUTICA DE PROFUNDIDADE NA PESQUISA SOCIAL
CIÊNCIAS SOCIAIS UNISINOS
Outras falas foram coletadas, tais como: “Nenhum políti-
co vale nada; de 10 bons, 100 não valem nada; não dá para
votar em ninguém; é tudo farinha do mesmo saco”.
Essas verbalizações revelam, através de uma simplicida-
de objetiva, a imagem unificada dos políticos como uma massa
indiferenciada, sem possibilidades de subjetividade própria,
pluralidade e mudança. A idéia da unificação expressa-se mui-
to bem no uso repetido do dito popular farinha do mesmo saco.
Esta representação, colocando todos os membros de um grupo
no mesmo nível, produz um sentimento de impotência: “Não
dá para votar em ninguém”, leva à construção e fortificação de
comportamentos que sugerem que não se deva participar da
política, pois não é possível mesmo transformar a sociedade. Em
um nível mais profundo de interpretação, podemos dizer que
há a criação de uma mensagem que sugere o afastamento da
população da participação política. Desse modo, fica mais fácil
aos que já estão na política continuarem com suas práticas.
Tais verbalizações revelam estratégias ideológicas que,
no final das contas, levam, contraditoriamente, à reprodução
do estado atual da sociedade, pois nada melhor, para manter as
coisas como estão, que impedir que alguém se decida a enfrentá-
las a fim de transformá-las.
Entrevê-se, nas falas, uma inversão de valores, expressa
pelas idéias de que a política é “suja; é uma lama; não interessa;
seus representantes são ladrões” e assim por diante. Esta repre-
sentação da política produz o afastamento das pessoas, fazen-
do com que não exista o desejo de apropriação e participação
política. Se a política está associada à “sujeira; corrupção;
safadeza”, o raciocínio que está construído aí é que, se um
cidadão é idôneo, não deve se envolver em política, isto é, se
política é coisa suja e eu sou uma pessoa honesta, não devo me
aproximar da política nem dos políticos.
As representações sociais da política apresentam-se com
conotações fortemente negativas. Sabemos que tais representa-
ções são saberes/fazeres historicamente constituídos. Elas têm
uma função latente que, paradoxalmente, vem ajudar a repetir
a história de nosso país, marcada pela dominação, exploração e
impunidade dos crimes praticados pela classe dominante. A
apropriação da prática política por parte da população brasileira
é uma importante via de transformação dessa realidade, mas se
houver o afastamento das pessoas que a consideram como algo
negativo, sujo, “deles” e não “nosso”, dificilmente se poderá
pensar numa mudança significativa. Essa é a face oculta, ideo-
lógica, uma vez que sustenta relações desiguais e injustas, de
tal representação social da política.
Comentário final
Há quem diga que trabalhar sob o enfoque da ideologia é
algo como que “ultrapassado”; que a denúncia, afinal, cai em
ouvidos moucos; que não é preciso preocupar-se em, eventual-
mente, apontar injustiças. Zygmunt Bauman (2001, p. 245)
posiciona-se de forma contundente sobre essa questão. Vejamos:
Nada é menos inocente, lembra Bourdieu, que o laissez-
faire. Observar a miséria humana com equanimidade, apla-
cando a dor da consciência com o encantamento ritual do
credo “não há alternativa” implica cumplicidade. Quem
quer que, por ação ou omissão, participe do acobertamento
ou, pior ainda, da negação da natureza alterável e contin-
gente, humana e não inevitável da ordem social, notadamente
um tipo de ordem responsável pela infelicidade, é culpado
de imoralidade – de recusar ajuda a alguém.
A pesquisa social pode se realizar com diferentes interesses
do conhecimento, segundo a classificação de Jürgen Habermas,
citado por Bauer et al. (2002). Tais interesses podem ser divididos
em controle e predição (controlar a natureza visando melhores
condições de vida), construção de consenso sobre um tema (com-
preensão intersubjetiva fidedigna), emancipação e empoderamento
social (transformação social). Na verdade, tais interesses não são
mutuamente excludentes, sendo encontrados na mesma investi-
gação de diferentes formas. A HP, ao nosso ver, propicia o encontro
de diferentes interesses e perspectivas, constituindo um referencial
potente para a pesquisa social e para uma eventual contribuição
desta última em processos de transformação social.
O conceito de pluralismo metodológico – algo que o mé-
todo também permite – também tem importante papel quando
se faz pesquisa social visando a teorização sobre um tema e a
produção de conhecimento crítico. A partir desse critério, for-
mas diversas de coleta e análise de dados podem auxiliar o
pesquisador na boa prática de pesquisa, qual seja, clareza e
transparência nos critérios e procedimentos e prestação pública
de contas com os relatórios e artigos que produzir. Essa postura
epistemológica crítica e rigorosa em termos de procedimentos
garante a contribuição efetiva da pesquisa social qualitativa,
que deve se preocupar menos em diferenciar-se do positivismo
do queem constituir-se de forma criteriosa e criativa.
Há que desconstruir referências fixistas, mas tomando o
cuidado de não levar a desconstrução ao extremo de desconstruir
os valores que subjazem à pesquisa interessada em emancipação
social, na possibilidade de resistência e de alternativas ao que é
dado de forma hegemônica. A nosso ver, a ferramenta teórico-
metodológica da HP situa-se justamente nessa perspectiva, sen-
do de inestimável valor para pesquisadores em vários campos do
conhecimento nas ciências humanas e sociais.
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