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LUTAS PROFESSORES Dr. Leonardo Vidal Andreato Dr. Victor Silveira Coswig 2 LUTAS DIREÇÃO UNICESUMAR Reitor Wilson de Matos Silva, Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho, Pró-Reitor de Administração Wilson de Matos Silva Filho, Pró-Reitor de EAD William Victor Kendrick de Matos Silva, Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi. NEAD - NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Diretoria Executiva de Ensino Janes Fidélis Tomelin Diretoria Operacional de Ensino Kátia Coelho, Direção de Operações Chrystiano Mincof, Direção de Polos Próprios James Prestes, Direção de Desenvolvimento Dayane Almeida, Direção de Relacionamento Alessandra Baron, Head de Produção de Conteúdos Celso L. Filho, Gerência de Produção de Conteúdo Diogo R. Garcia, Gerência de pro- jetos especiais Daniel F. Hey, Supervisão do Núcleo de Produção de Materiais Nádila de Almeida Toledo, Coordenador(a) de Conteúdo Mara Cecilia Rafael Lopes, Projeto Gráico José Jhonny Coelho, Editoração Humberto Garcia da Silva, Designer Educacional Bárbara Neves, Revisão Textual Talita Dias Tomé e Cintia Prezoto Ferreira Ilustração Ilustrador, Fotos Shutterstock. C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a Distância; COSWIG, Victor Silveira, ANDREATO Leonardo Vidal. Lutas. Leonardo Vidal Andreato; Victor Silveira Coswig. Maringá - PR.:Unicesumar, 2018. 184 p. “Graduação em Educação Física - EaD”. 1. Lutas . 2. Pedagogia . 3. Preparação Física 4. EaD. I. Título. ISBN 978-85-459-1185-2 CDD - 22ª Ed. 796 CIP - NBR 12899 - AACR/2 NEAD Núcleo de Educação a Distância Av. Guedner, 1610, Bloco 4 Jd. Aclimação - Cep 87050-900 Maringá - Paraná www.unicesumar.edu.br | 0800 600 6360 Impresso por: Em um mundo global e dinâmico, nós trabalhamos com princípios éticos e proissionalismo, não somente para oferecer uma educação de qualidade, mas, acima de tudo, para gerar uma conversão integral das pessoas ao conhecimento. Baseamo- nos em 4 pilares: intelectual, proissional, emocional e espiritual. Iniciamos a Unicesumar em 1990, com dois cursos de graduação e 180 alunos. Hoje, temos mais de 100 mil estudantes espalhados em todo o Brasil: nos quatro campi presenciais (Maringá, Curitiba, Ponta Grossa e Londrina) e em mais de 300 polos EAD no país, com dezenas de cursos de graduação e pós-graduação. Produzimos e revisamos 500 livros e distribuímos mais de 500 mil exemplares por ano. Somos reconhecidos pelo MEC como uma instituição de excelência, com IGC 4 em 7 anos consecutivos. Estamos entre os 10 maiores grupos educacionais do Brasil. A rapidez do mundo moderno exige dos educadores soluções inteligentes para as necessidades de todos. Para continuar relevante, a instituição de educação precisa ter pelo menos três virtudes: inovação, coragem e compromisso com a qualidade. Por isso, desenvolvemos, para os cursos de Engenharia, metodologias ativas, as quais visam reunir o melhor do ensino presencial e a distância. Tudo isso para honrarmos a nossa missão que é promover a educação de qualidade nas diferentes áreas do conhecimento, formando proissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento de uma sociedade justa e solidária. Vamos juntos! Wilson Matos da Silva Reitor da Unicesumar boas-vindas Prezado(a) Acadêmico(a), bem-vindo(a) à Comunidade do Conhecimento. Essa é a característica principal pela qual a Unicesumar tem sido conhecida pelos nossos alunos, professores e pela nossa sociedade. Porém, é importante destacar aqui que não estamos falando mais daquele conhecimento estático, repetitivo, local e elitizado, mas de um conhecimento dinâmico, renovável em minutos, atemporal, global, democratizado, transformado pelas tecnologias digitais e virtuais. De fato, as tecnologias de informação e comunicação têm nos aproximado cada vez mais de pessoas, lugares, informações, da educação por meio da conectividade via internet, do acesso wireless em diferentes lugares e da mobilidade dos celulares. As redes sociais, os sites, blogs e os tablets aceleraram a informação e a produção do conhecimento, que não reconhece mais fuso horário e atravessa oceanos em segundos. A apropriação dessa nova forma de conhecer transformou-se hoje em um dos principais fatores de agregação de valor, de superação das desigualdades, propagação de trabalho qualiicado e de bem-estar. Logo, como agente social, convido você a saber cada vez mais, a conhecer, entender, selecionar e usar a tecnologia que temos e que está disponível. Da mesma forma que a imprensa de Gutenberg modiicou toda uma cultura e forma de conhecer, as tecnologias atuais e suas novas ferramentas, equipamentos e aplicações estão mudando a nossa cultura e transformando a todos nós. Então, priorizar o conhecimento hoje, por meio da Educação a Distância (EAD), signiica possibilitar o contato com ambientes cativantes, ricos em informações e interatividade. É um processo desaiador, que ao mesmo tempo abrirá as portas para melhores oportunidades. Como já disse Sócrates, “a vida sem desaios não vale a pena ser vivida”. É isso que a EAD da Unicesumar se propõe a fazer. Willian V. K. de Matos Silva Pró-Reitor da Unicesumar EaD Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está iniciando um processo de transformação, pois quando investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou proissional, nos transformamos e, consequentemente, transformamos também a sociedade na qual estamos inseridos. De que forma o fazemos? Criando oportunidades e/ou estabelecendo mudanças capazes de alcançar um nível de desenvolvimento compatível com os desaios que surgem no mundo contemporâneo. O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens se educam juntos, na transformação do mundo”. Os materiais produzidos oferecem linguagem dialógica e encontram-se integrados à proposta pedagógica, contribuindo no processo educacional, complementando sua formação profissional, desenvolvendo competências e habilidades, e aplicando conceitos teóricos em situação de realidade, de maneira a inseri-lo no mercado de trabalho. Ou seja, estes materiais têm como principal objetivo “provocar uma aproximação entre você e o conteúdo”, desta forma possibilita o desenvolvimento da autonomia em busca dos conhecimentos necessários para a sua formação pessoal e proissional. Portanto, nossa distância nesse processo de crescimento e construção do conhecimento deve ser apenas geográica. Utilize os diversos recursos pedagógicos que o Centro Universitário Cesumar lhe possibilita. Ou seja, acesse regularmente o Studeo, que é o seu Ambiente Virtual de Aprendizagem, interaja nos fóruns e enquetes, assista às aulas ao vivo e participe das discussões. Além disso, lembre-se que existe uma equipe de professores e tutores que se encontra disponível para sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de aprendizagem, possibilitando-lhe trilhar com tranquilidade e segurança sua trajetória acadêmica. boas-vindas Janes Fidélis Tomelin Diretoria Executiva de Ensino Kátia Solange Coelho Diretoria Operacional de Ensino autores Dr. Leonardo Vidal Andreato Tem experiência na área de Fisiologia do Exercício, atuando principalmente nos seguintes temas: preparação física para esportes de combate, avaliação física, treinamento intervalado de alta intensidade e obesidade. Doutorado em Ciências do Movimento Humano pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), sendo atualmente professor colaborador na mesma instituição. Mestrado em Ciências na área de Estudos do Esporte pela Universidade de São Paulo (USP) e especialização em Fisiologia do Exercício pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Graduação em Educação Física pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Currículo Lattes disponível em: <http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4249428A5 > Dr. Victor Silveira Coswig É Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas em Treinamento Esportivo e Desempenho Físico (GEPETED). Atualmente é Professor Adjunto na Universi- dade Federal do Pará (UFPA). Tem experiência na área de Educação Física, com ênfase em Fisiologia do Exercício e Treinamento Desportivo, especialmente com lutadores. Possui Doutorado na linha de Desempenho e Metabolismo Humano (ESEF/UFPel- 2017) e mestrado em Atividade Física e Desempenho pela ESEF/UFPel (2014). Pós-graduação em Fisiologia do Exercício e prescrição para academias e Personal Trainer pelo Centro Universitário de Volta Redonda (UniFOA/2011). Tem graduação em Educação Física pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel /2010). Currículo Lattes disponível em: <http://lattes.cnpq.br/0097939661129545> apresentação do material LUTAS Caro(a) aluno(a), este livro tem por objetivo apresentar aspectos relevantes e atuais sobre diferentes perspectivas relacionadas às Lutas, Artes Marciais e Modalidades Esportivas de Combate. Inicialmente, é preciso destacar que as Lutas fazem parte da cultura do movimento humano, juntamente com o Esporte, a Ginástica, o Jogo e a Dança. De fato, a dimensão “Luta” ainda perpassa pelas demais expressões e, por vezes, confunde-se com o Esporte, com o Jogo e, até mesmo, com a Dança. Dito isto, este conteúdo faz parte da base da Educação Física e a atuação dos professores e proissionais deve (ao menos deveria) contemplar aspectos histó- ricos, sociais, técnicos, cientíicos e pedagógicos relacionados às lutas. Ademais, especialmente nos aspectos cientíicos, apresenta-se um crescimento em volume e relevância das pesquisas na área das ciências dos esportes de combate. Consi- derando, então, as Lutas como conteúdo base da Educação Física e reconhecendo seu papel na sociedade e na ciência, torna-se indispensável que você seja capaz de dialogar sobre a temática com criticidade e por diferentes óticas. Neste contexto, este livro busca proporcionar bases teóricas e metodológicas para dar suporte a sua atuação nos estágios e no mercado de trabalho, bem como em diversos espaços da comunidade. Para isso, inicialmente, são apresentados os conceitos terminológicos e aspectos históricos que ilustram o modo em que as Lutas estão enraizadas no DNA dos seres humanos (Figurativa e literalmente). Sim, literalmente, já que traços do nosso DNA primitivo diferenciam povos que saíram da África e conquistaram a Eurásia e o mundo daqueles que pereceram. Essas dife- renças envolviam o modo de resolver conlitos e as práticas de lutas como rituais. Na sequência, é dado foco na atuação didática e pedagógica que envolve o ato de lutar. Você será convidado a reletir criticamente sobre o modelo vigente de ensino nos diferentes espaços que oferecem práticas de lutas, bem como ao Sistema Iemoto, que é carregado de hierarquia e comando. Obviamente, não serão traçadas apenas as críticas, mas serão também sugeridos os modelos alternativos que de- verão servir de referência para as práticas dos futuros professores e proissionais. Ainda fazem parte do escopo deste livro as questões relativas ao peril físico e isiológico de lutas e lutadores de modalidades esportivas de combate, bem como acerca das avaliações e prescrições de treinamento especíicas das Lutas, já que estas apresentam características distintas de outras modalidades esportivas. Por im, esperamos que este livro ajude a qualiicar sua carreira proissional e acadêmica. Mais do que isso, esperamos que você seja encorajado a pensar com criticidade e que possa conhecer melhor um dos conteúdos base e que, por vezes, não recebe o protagonismo que lhe é devido. Boa leitura! sumário UNIDADE I CONCEITOS E HISTÓRICO DAS LUTAS 14 Conceitos em Lutas, Artes Marciais e Esportes de Combate 18 Origem e Desenvolvimento das Lutas 22 Histórico das Lutas na Perspectiva Oriental 26 Histórico das Lutas na Perspectiva Ocidental 30 As Lutas no Brasil 34 Considerações i nais 39 Referências 41 Gabarito UNIDADE II ENSINO DE LUTAS 46 O Ensino das Lutas e a Educação Física 52 Categorizações, Regras de Ação e Jogos de Oposição 56 Modelo de Ensino Tradicional e Predomi- nante 60 Modelos de Ensino das Lutas Por Meio da Tática 64 Organização e Trato Pedagógico das Lutas 68 Considerações i nais 72 Referências 74 Gabarito UNIDADE III PLANEJAMENTO DE AULAS DE LUTAS 80 Do Ensino Fundamental ao Ensino Médio 84 Ensino de Lutas no Ambiente não Escolar 86 Abordagem de Temas Transversais por Meio do Ensino de Lutas 94 Montando a Aula 100 Festivais e Competições 103 Considerações i nais 107 Referências 107 Gabarito UNIDADE IV AVALIAÇÃO E PREPARAÇÃO FÍSICA DE LUTADORES 112 Avaliações Físicas Gerais para Lutadores 118 Avaliações Físicas Especíi cas para Lutadores 122 Métodos para Condicionamento Metabólico de Lutadores 126 Métodos para Condicionamento Neuromus- cular de Lutadores 130 Periodização e Organização do Treinamento de Lutadores 133 Considerações i nais 137 Referências 139 Gabarito UNIDADE V FISIOLOGIA E PERFIL DAS MODALIDADES ESPORTIVAS DE COMBATE 144 Duração de Luta em Esportes de Combate 150 Categorias de Peso e Perda de Peso em Es- portes de Combate 156 Estrutura Temporal nos Esportes de Combate 162 Peri l Antropométrico e Funcional de Atletas de Esportes de Combate 168 Respostas Fisiológicas e Perceptivas em Es- portes de Combate 173 Considerações i nais 177 Referências 182 Gabarito 183 CONCLUSÃO GERAL Professor Dr. Victor Silveira Coswig Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: • Conceitos em lutas, artes marciais e esportes de combate • Origem e desenvolvimento das lutas • Histórico das lutas na perspectiva oriental • Histórico das lutas na perspectiva ocidental • As lutas no Brasil Objetivos de Aprendizagem • Conceituar Lutas, Artes Marciais e Modalidades Esportivas de Combate. • Indicar panorama histórico-cultural das Lutas e seu papel na sociedade. • Apresentar a evolução das lutas no oriente. • Apresentar a evolução das lutas no ocidente. • Apresentar a evolução das lutas no Brasil. CONCEITOS E HISTÓRICO DAS LUTAS unidade I INTRODUÇÃO Olá, seja bem-vindo(a)! Esta unidade se inicia com uma breve contextualização acerca da terminologia que deine as práticas corporais de combate como Luta, Arte Marcial ou Modalidade Esportiva de Combate. De modo adicio- nal, faremos uma diferenciação entre estes termos e outros que, errone- amente, também são associados às lutas, que são as brigas e guerras. É fato, inclusive, que ainda hoje muitas pessoas desencorajam seus ilhos ou a si próprios da prática de Lutas por acreditarem que é um modo de incitar a violência. Esta é uma associação infeliz, já que a prática de Lutas, Artes Marciais e Modalidades Esportivas de Combate pode, na verdade, ser uma ferramenta importante para auxiliar na redução da violência (OLIVIER, 2000). Mas de onde surgem os combates? Os homens das cavernas lutavam? Qual a importância disso para a evolução humana e a construção da so- ciedade? Existem diferenças entre regiões? E, no Brasil, existe relação en- tre Lutas e a nossa cultura? Nesta unidade, você será convidado a viajar dos primórdios da existência humana até os dia atuais e acompanhar a evolução das práticas corporais e sua associação à construção cultural de cada sociedade ao longo dos séculos. Para tentar responder a todas estas perguntas, vamos iniciar entendendo de que modo a presença de rituais de luta podem ter diferenciado os primeiros Homo Sapiens de outros hu- manos primitivos e contribuído para que estes prosperassem e conquis- tassem a Ásia e a Europa após a saída da África (MORENO, 2011). Saindo da pré-história para a história, temos uma dissociação entre as práticas orientais e ocidentais que podem ser percebidas ainda hoje, de acordo com os modelos de ensino utilizados (DEL VECCHIO; FRANCHINI,2006). Por im, você será apresentado às práticas de lutas genuinamente brasileiras, como a Capoeira, o Huka-Huka e a Agarrada Marajoara, que são expressões culturais fortemente regionalizadas. 14 LUTAS Caro(a) aluno(a), você, possivelmente, já utilizou os termos “Lutas”, “Artes Marciais” e “Modalida- des Esportivas de Combate” como sinônimos. É verdade que até mesmo as recomendações de utili- zação de termos para aumento da visibilidade dos artigos cientíi cos relacionados à temática sugerem que estes (e outros) podem ser utilizados sem dis- criminação (PÉREZ-GUTIÉRREZ; GUTIÉRREZ- -GARCÍA; ESCOBAR-MOLINA, 2011). Por outro lado, é importante que você perceba que estas ter- minologias apresentam noções e contextos diver- sii cados (CORREIA; FRANCHINI, 2010) e que a falta de clareza nestas dei nições pode dii cultar a fundamentação teórica para as práticas pedagógicas (FRANCHINI, 1998). O ato de lutar, patrimônio cultural da humani- dade (DEL VECCHIO; FRANCHINI, 2006), está presente em registros pré-históricos e parece ter tido papel fundamental na evolução da espécie humana e em seu desenvolvimento (MORENO, 2011; MOR- GAN; CARRIER, 2013). É fato que, atualmente, a premissa de lutar não se relaciona diretamente com sua origem, que era decorrente de fatores associados à sobrevivência, como conquista/manutenção de ter- ritórios, alimentação e reprodução (PAIVA, 2015). Neste sentido, parece ser indicado que a compreen- são do termo “Luta”, no contexto da Educação Física (diferente da aplicação em outros contextos sociais, como a luta de classes, por exemplo), está associada a um conteúdo da cultura corporal, juntamente com o jogo, esporte, ginástica e dança (BRASIL, 1997). Apesar de reconhecer as limitações quanto às dei - nições absolutas de Lutas, Artes Marciais e Esportes de Combate, convido você a conhecer as propostas mais sugeridas atualmente para tais conceitos, mas reforço que se trata de uma proposta que visa facili- tar didática e pedagogicamente o seu entendimento sobre a temática. Conceitos em Lutas, Artes Marciais e Esportes de Combate EDUCAÇÃO FÍSICA 15 ARTES MARCIAIS Fortemente associadas à cultura de um povo/nação, esta manifestação das Lutas se remete às práticas de guerra. Este fato reforça a utilização da nomenclatu- ra “Marcial” que deriva de “Marte”, deus romano da guerra; enquanto o termo “Arte” remete a demandas expressivas, lúdicas e criativas (CORREIA; FRAN- CHINI, 2010). Neste sentido, entende-se que, apesar da forte associação das Artes Marciais ao processo militarista e bélico, suas possibilidades transcendem a este contexto, o que indica que estas práticas rece- bem relevante inluência étnica/cultural e abrangem concepções físicas, espirituais e sociais (CORREIA; FRANCHINI, 2010; DEL VECCHIO; FRANCHI- NI, 2006; PAIVA, 2015). Esta ideia parece ser mais facilmente percebida quando estudamos a origem das Artes Marciais e sua abordagem ilosóica de base oriental, derivada essencialmente do budismo, que valoriza a trajetória do lutador, popularmente conhecido como “caminho do guerreiro” (REID; CROUCHER, 2003). Este tema será aprofundado nos Tópicos 2 e 3. MODALIDADES ESPORTIVAS DE COMBATE São lutas que têm como base as Artes Marciais, mas que foram “esportivizadas” (CORREIA; FRANCHI- NI, 2010; DEL VECCHIO; FRANCHINI, 2006; PAIVA, 2015). Este termo refere-se ao fato que ca- racterísticas inerentes ao esporte foram inseridas, ao passo que o plano de fundo espiritual, social, religio- so e/ou ritualístico acabou por ser reduzido (PAI- VA, 2015). Neste processo, você pode identiicar características especíicas desta “esportivização” que envolvem a prática regrada a partir do controle por entidades institucionais que regulamentam a práti- ca (associações, federações e confederações) e que regem competições, premiações e rankings (DEL VECCHIO; FRANCHINI, 2006). Percebe-se, ainda, que, diferentemente das Artes Marciais, existe espa- ço delimitado e adequado, gestos/golpes permitidos e proibidos e pontuações, além de equipamentos de proteção, já que existe importante preocupação com a integridade física dos praticantes. São exemplos de Modalidades Esportivas de Combate aquelas Olím- picas que são o boxe, a luta olímpica, a esgrima, o judô, o taekwondo e o karatê (que estará nos jogos de 2020) e as não Olímpicas como, o Jiu-Jitsu brasi- leiro, o Sambô, o Muay-hai e o Mixed Martial Arts (MMA- Artes Marciais Misturadas). 16 LUTAS LUTAS Além do contexto geral de se referir às práticas cor- porais de combate genericamente como “Lutas”, se- jam elas Artes Marciais ou esportivas, podemos ter uma interpretação mais especíica e que remete dire- tamente às práticas pedagógicas que serão aprofun- dadas na Unidade II. Essa classiicação diz respeito à interpretação de que as lutas fazem parte dos jogos categorizados como de oposição (Agon) (CALLOIS, 2001), que apresenta como características básicas como ter por alvo o próprio adversário, ser pratica- dos por duas ou mais pessoas e apresentar ataque e defesa simultâneos (DEL VECCHIO; FRANCHINI, 2006; PAIVA, 2015). É possível, ainda, encontrar menções com os termos jogos de combate ou brin- cadeiras de luta. GUERRAS E BRIGAS Infelizmente, é preciso reconhecer que, talvez, você já tenha utilizado os termos que dão título a este tó- pico como sinônimos de Lutas. Digo infelizmente, pois esta associação, por muitas vezes, acaba por afastar e distanciar da prática de lutas quem acredi- ta que Artes Marciais ou Modalidades de Combate apresentam relação direta com o ato de brigar ou guerrear. Se você considerar que guerras envolvem oposição direta entre nações ou comunidades, uti- lização de tecnologia ilimitada e meios de destrui- ção em massa com objetivo territorial, econômico/ inanceiro ou ideológico pode facilmente associar ao termo Arte Marcial mencionado anteriormente. Não obstante, as brigas podem ser caracterizadas pela oposição direta, entre duas ou mais pessoas, Quais são as características observáveis que diferem entre lutas e brigas? REFLITA EDUCAÇÃO FÍSICA 17 que, se não fosse a ausência de regras, a não ser as in- trínsecas ao próprio indivíduo, poderia ser associa- da às modalidades esportivas de combate. Por outro lado, apesar de as diferenças terminológicas serem relativamente pequenas, o contexto sócio-histórico- -cultural é oposto. Por exemplo, enquanto as brigas são geradas e guiadas por sentimentos de aversão, repúdio e/ou ódio, as modalidades de combate de- vem seguir o espírito esportivo, ou seja, o indivíduo praticante respeita e precisa do seu adversário, já que, sem ele, não há prática. Agora você já sabe diferenciar Lutas, Artes Marciais e Esportes de Combate e, deste modo, começar a re- l etir sobre quais destas práticas podem ser aborda- das nas aulas de Educação Física, academia, clubes, entro outros espaços, bem como já pode entender que possibilidades de aplicação cada uma destas ma- nifestações das práticas corporais de combate tem nos diversos contextos. Atualmente, é possível que você, especial- mente por ser estudante de Educação Física, esteja familiarizado(a) com manifestações de Lutas, Artes Marciais e Modalidades Esporti- vas de Combate que vão além das dei nições apresentadas. Um exemplo é a utilização de gestos motores das Lutas para atender ob- jetivos relacionados à aptidão física e saúde, que estão presentes em academias e clubes. E estas se apresentam em aulas de ginástica (Body CombatTM, Fitboxing...) ou em protocolos de HIIT (exercícios intermitente de alta inten- sidade) e, de fato, parecem ser uma estraté- gia interessante para aumentar a adesão, a motivação, a aptidão física e o gasto calórico, inclusive em idosos. Fonte: Cheema et al. (2015). SAIBA MAIS 18 LUTAS Neste ponto, você já foi apresentado às diferenças terminológicas entreLutas, Artes Marciais e Moda- lidades Esportivas de Combate. Daqui em diante, o termo “Lutas” será utilizado de modo genérico neste e nos próximos tópicos, de modo que aborde as diferentes manifestações deste fenômeno cul- tural, social e esportivo. Mas de onde se originam as Lutas? Os homens das cavernas lutavam? E de que modo estas práticas corporais evoluíram até o ponto como conhecemos hoje? Neste tópico, estu- daremos questões sobre a origem e evolução das perspectivas relacionadas às Lutas. Conforme anteriormente mencionado de modo breve, o ato de lutar faz parte da história dos seres humanos e de outros grandes primatas. Imagine que você vive na pré-história em um ambiente altamente hostil, no qual sua principal preocupação envolve a sua sobrevivência e a de sua espécie. Neste ambiente primitivo, guiado principalmente pela necessidade de se alimentar e se defender de outros agressores, escolher não lutar parece não ser uma opção. Porém, além disso, o ato de lutar já era associado à conquis- ta de poder, seja pela conquista de território ou para disputas relacionadas à dominação sexual de parcei- ros para acasalamento (PAIVA, 2015). Origem e Desenvolvimento das Lutas EDUCAÇÃO FÍSICA 19 Mas estas lutas se limitavam a expressões irracionais e instintivas de sobrevivência e conquistas? Parece que não. Em um estudo importante, Moreno (2011) busca entender o papel das lutas na sociedade primi- tiva de Homo Sapiens que migrou da África para po- voar a Europa e a Ásia há, aproximadamente, 80.000 anos. Por meio de análises genéticas, etnográicas e arqueológicas, os resultados indicam que os homi- nídeos do período que prosperaram conquistando outros continentes eram agressivos, resolviam con- litos com assassinatos e praticavam rituais de lutas, que poderiam envolver atividades simples associa- das à música e dança ou mais complexas, como trei- namentos de guerreiros para futuros conlitos entre tribos ou sacrifícios ofertados aos deuses. Por outro lado, as tribos que não apresentavam estes compor- tamentos acabaram extintas. De modo adicional, te- oriza-se que os hominídeos que povoavam a Europa e a Ásia neste mesmo período (Homo Neandertha- lensis e Homo Erectus, respectivamente) acabaram sendo substituídos por estas tribos. O status de tribo guerreira foi, portanto, relacionado à prosperidade destes grupos de 1000 a 1500 indivíduos caçadores- -coletores, enquanto tribos que preferiam se deslo- car para evitar conlitos não evoluíram. Este estudo indica que há uma relação forte entre aspectos herdados geneticamente e os aspectos cul- turalmente construídos ao longo da evolução da es- pécie humana. Então isso signiica que o ato de lutar foi passado geneticamente entre gerações? Não ne- cessariamente. Na verdade, indica que as constru- ções culturais ao longo da história apresentam uma força hereditária quase tão forte quanto os fatores genéticos (PAIVA, 2015). Porém, a partir disso, de que modo as Lutas evo- luem? E qual seu papel nas sociedades que se for- mam ao longo da história? Estas práticas de luta que inicialmente estavam relacionadas especialmente ao sacrifício (oferendas aos deuses) ou ao ciclo de vida do guerreiro (transição para fase adulta) passam a ser praticadas em tempos de paz, como forma de prepa- ração física e técnica para os combates que viriam. Este fato, acredita-se, acaba por originar as Artes Marciais ao longo da história (POLIAKOFF, 1987). Curiosamente, a prática de combates para transição do jovem para o adulto permanece em diferentes so- ciedades ao longo dos séculos e, até mesmo, atual- mente. No Brasil, a prática é presente na cultura dos povos indígenas do Alto Xingu, por meio do Huka- -Huka (CURBY; JOMAND, 2015), que será melhor abordado à frente, ainda nesta unidade. O ato de lutar acompanha a evolução dos seres humanos desde a pré-história. Por isso você pode ir além dos gestos motores e re- lacionar as práticas de luta ao seu contexto sócio-histórico-cultural. REFLITA 20 LUTAS De modo paralelo, o avanço destes rituais de lutas evoluem tanto de modo bélico e militar, con- forme estudamos a caracterização das Artes Mar- ciais, quanto de modo cultural e social, ganhando características que podem ser fortemente associa- das aos jogos com regras que se transformam em espetáculo, inclusive estando presentes nos Jogos olímpicos da Antiguidade (PAIVA, 2015). Parece, ainda, haver uma relação inversa quando as prá- ticas militarizadas de combate corporal perdem relevância com a inserção de avanços tecnológicos nos campos de batalha, que se inicia com o avanço armamentista e de tecnologias de guerra que são seguidos pela invenção da pólvora. EDUCAÇÃO FÍSICA 21 Neste tópico, estudamos a origem e a evolução das lutas. Acredito que você tenha percebido que o ato de lutar contribuiu de diversas formas para a evolução humana. Ainda, ica evidente que, para entender a sociedade atual, é preciso aprofun- dar o entendimento sobre compo- nentes de sua estrutura histórica e cultural, sendo que, para isso, é preciso estudar os fenômenos rela- cionados às práticas de combate em suas diversas manifestações. Além da evolução cultural apresentada, existem in- dícios que apontam que a morfologia humana também sofreu adaptações associa- das aos combates corpo- rais. Análises biomecânicas a anatômicas mostram que o ato de “cerrar os punhos” ou simplesmente fechar as mãos para socar pode ser uma adaptação que pro- porciona maior impacto no alvo e maior segurança para o punho durante os golpes quando comparados aos gestos executados com as mãos abertas. Este “encaixe” na estrutura das mãos não é visto em outros primatas, o que pode ter inluenciado na seleção natural entre ho- minídeos. Fonte: Morgan e Carrier (2013). SAIBA MAIS 22 LUTAS No tópico anterior, você pôde acompanhar o modo como as Lutas estão enraizadas na cultura e na evolução humana. De modo geral, foi apre- sentada uma perspectiva de como estas práticas evoluíram ao longo da história e ainda carregam marcas primitivas nos dias de hoje. Neste e no próximo tópico, convido você a estudar, de modo mais especíico, como as lutas se desenvolveram de modo diferente de acordo com as caracterís- ticas dos povos orientais e ocidentais, respecti- vamente, até as modalidades esportivas que co- nhecemos. Em cada tópico, você será convidado a reletir sobre como as características diferentes inluenciaram a construção técnica e ilosóica das Lutas, Artes Marciais e Modalidades Esportivas de Combate e como estas características moldaram os sistemas de ensino sob cada ótica. No tópico anterior, você pôde acompanhar o papel do ato de lutas na evolução dos seres huma- nos durante a pré-história. Daí em diante, indi- ca-se que, desde a transição da pré-história, para o que chamamos de história (após a invenção da escrita em aprox. 4000 a.C), existem indícios de homens lutando, como as descrições encontradas Histórico das Lutas na Perspectiva Oriental EDUCAÇÃO FÍSICA 23 em um túmulo em Beni Hasan, datado do século 20 a.C. Até mesmo antes disso, placas encontradas em escavações na Antiga Mesopotâmia (3500 a.C) indicavam a prática de modalidades de lutas com socos (MURRAY, 2008). Neste sentido, a Índia e o Egito antigos apresentam aprimoramento nas práticas corporais de combate e parece que, ainda na antiguidade, a China passa a receber maiores inluências das práticas do sul da Ásia enquanto que os impérios grego e, posteriormente, o roma- no acabam por ter maiores inluências egípcias (POLIAKOFF, 1987; REID; CROUCHER, 2003). Essas inluências geram diferenças entre estas abordagens orientais (Asiática) e ocidentais (Eu- ropeia e Norte Americana) que permanecem até o presente momento. Na perspectiva oriental, um ponto marcante parece ter sido a chegada de um mongeindiano à China, em 520 d.C. Bodhidharma é conhecido por alguns como padroeiro das Artes Marciais orientais e seria criador do estilo de luta Shaolin e do Budismo Zen. De modo resumido, as práticas corporais foram introduzidas por ele no contex- to do monastério com objetivo de condicionar os monges que permaneciam por longos períodos em meditação (REID; CROUCHER, 2003). Por outro lado, existem relatos chineses anteriores (200 d.C) que já indicavam a presença de exercícios de luta baseados em movimentos de animais, como o ti- gre, o urso e o macaco e outros relatos de práticas de Wushu (popularmente conhecido por Kung-Fu) que datariam de 5000 anos atrás. Independente- mente de você acreditar na lenda de Bodhidharma ou não, é da elevada probabilidade de a China já apresentar suas próprias práticas de lutas à época, é inegável a inluência do Templo Shaolin no de- senvolvimento das Artes Marciais deste ponto em diante (REID; CROUCHER, 2003). A partir deste momento, as Artes Marciais chinesas se dissemi- nam pela Ásia, chegando à Coréia e ao Japão, entre outros países. Novamente, é pouco provável que estes países já não tivessem suas próprias Artes Marciais, porém, a inluência chinesa parece indu- zir de modo importante no avanço destas práticas. De qualquer modo, ao avançar da história, esta co- nexão entre espiritualidade e prática corporal de combate permanece. Apesar de esta contextualização histórica se fazer necessária como base para as próximas re- lexões, este não é o objetivo central deste tópico. Então vamos a ele. Conhecendo esta perspectiva de origem oriental e o desenvolvimento das Ar- tes Marciais, você consegue perceber como isso inluenciou o modo como estas práticas são en- sinadas ainda nos dias de hoje e os componentes que ainda permanecem? Mesmo após a “esportivi- zação” que viria posteriormente, elementos essen- ciais estão presentes no ensino de lutas orientais em todo mundo. Você pode constatar isso ao ana- lisar modalidades que apresentam indumentária especíica de caráter oriental, nas quais o profes- sor utiliza contagem em idiomas, como coreano, japonês ou chinês. Nestas práticas, o Sensei (pro- fessor ou mestre em Japonês) não se trata apenas de alguém que passa técnicas e golpes aos seus alu- nos, mas é aquele indivíduo que se mantem acima hierarquicamente, responsável por ensinar valo- res, como relacionamento, a fraternidade, a dis- ciplina, o civismo e o respeito (VIRGÍLO, 2000). Este modelo é baseado no Sistema Iemoto (Mestre proprietário) que é caracterizado por Franchini, Emerson e Del Vecchio (2007): 24 LUTAS • Relação professor-aluno de pura submissão, na qual o professor é detentor de todo co- nhecimento e não deve ser questionado. Ao aluno também não é permitido trocar de pro- fessor/equipe. • Hierarquia contínua, que permite que o alu- no que permanece tempo suiciente e progri- de de graduações tenha seus próprios alunos, mas sempre sob a tutela de seu “mestre”. • Autoridade do Iemoto, que indica que o mes- tre mais graduado é responsável por toda a organização e do licenciamento dos futuros mestres, gerindo as graduações superiores. • Relação pseudoconexão, que se refere ao fato de se procurar manter a relação dos dirigen- tes das associações sob tutela de descendentes identiicáveis do criado original. Apesar dos esforços para manutenção deste modelo organizacional, é possível identiicar que sua aplica- ção em espaços de ensino formais e não-formais nos dias de hoje apresenta problemas. Estes problemas e as sugestões alternativas de sistemas de ensino serão abordadas de modo mais profundo na Unidade II. Porém, cabe adiantar que as sugestões para o ensino, em especial de crianças, perpassam por práticas mais relexivas e inclusivas, que busquem o desenvolvi- mento crítico e o empoderamento do praticante (DEL VECCHIO; FRANCHINI, 2006; ROGERIO, 2008). Atualmente, oriundas desta vertente, algumas modalidades recebem certo destaque em sua po- pularidade. Dentre as chinesas estão o Wushu, o Kempô, o Tai chi chuan e o Sanshou. Enquanto das japonesas destacam-se o Sumô, o Kendô, o Aikidô, o Caratê, o Jiu-Jitsu tradicional (ou Internacional) e o Judô. Já entre as coreanas destacam-se o Hapki- dô e o Taekwondo. Por im, apresenta-se, também, o Muay-hai como representante da Tailândia. Vale destacar que destas o Judô e o Taekwondo fazem parte dos jogos Olímpicos da era moderna, sendo que o Caratê será inserido no quadro de 2020. Você percebe que um dos motivos que dii- cultam a inserção das lutas no ensino escolar pode estar associado ao fato de que somos condicionados a pensar as lutas de modo se- melhante ao Sistema Iemoto? REFLITA EDUCAÇÃO FÍSICA 25 Neste tópico, você foi levado a reletir sobre o de- senvolvimento das lutas na perspectiva oriental, que apresenta, ainda hoje, forte ligação com fato- res tradicionais e com um sistema de ensino rígi- do e autoritário. Por outro lado, percebe, também, que existe uma preocupação voltada não apenas pela aquisição de proiciência nos gestos e golpes, mas também pelo caminho a ser percorrido para se tornar guerreiro (Budô) e a valores de cunho comportamental e social. Já mencionei anteriormente que o termo “Ar- tes Marciais” pode ser traduzido por Arte da Guerra e tem origem ocidental. No contex- to oriental, outros termos com signiicado semelhante recebem destaque como, por exemplo, o Wushu, na China, e o Bujutsu, no Japão. Atualmente, o termo mais frequente no Japão é o Budô, que associa a ilosoia do budismo e recebe um caráter mais voltado ao processo de formação, podendo ser traduzido como “Caminho ou via marcial”. Lembre-se, ainda, que o termo Kung Fu, popularmente utilizado no ocidente, signiica “trabalho duro” ou aquilo que é conquistado com esforço, não sendo limitado apenas às lutas, o termo adequado para relacionar ao que envolve combates, portanto, é o Wushu. Fonte: adaptado de Paiva (2015). SAIBA MAIS 26 LUTAS Caro(a) aluno(a) depois de viajar pelo tempo, dos primórdios aos dias atuais a partir da ótica das Lu- tas, Artes Marciais e Modalidades Esportivas de Combate, estudamos, no tópico anterior, o modo como as lutas se desenvolveram pelas inluências ad- vindas, principalmente, do sul da Ásia. Neste tópico, vamos usar uma abordagem semelhante, mas agora seguindo em direção à Europa e, posteriormente, a América do Norte. Conforme mencio- nei anteriormente, as vertentes grega e ro- mana acabam por inluenciar mais for- temente o desenvol- vimento de práticas de combate na Eu- ropa (POLIAKOFF, 1987). Ainda na Idade Antiga, que se estende até a queda do império ro- mano, a luta grega recebe forte inluência do Wrestling (aqui sinô- nimo de luta) egípcio. Na Grécia, ainda no século 8 a.C., iniciam-se os Jogos Olímpicos da Antiguidade que, dentre outras modalidades, conti- nham o boxe, a luta (Wrestling) e uma modalidade chamada Pankration, que apresentava características de agarre e de impacto, de modo semelhante ao Mi- xed Martial Arts (MMA, Artes Marciais Misturadas) que conhecemos hoje (PAPANTONIOU, 2008; PO- LIAKOFF, 1987). Mesmo com uma caracterização que remete ao que hoje conhecemos como Esporte, as práticas na Grécia Antiga apresentavam elevado teor religioso, ou seja, inicialmente, competir era, na verdade, um modo de prover oferendas aos deuses, em especial a Zeus (PAPANTONIOU, 2008). Digo inicialmente, pois acaba sendo crescen- te o ato de competir pela glória de vencer em si, conquistada pela nobreza das competições. Uma luta de boxe na Grécia Antiga não apresentava catego- rias de peso ou rou- nds e o objetivo era golpear o adversário até que este fosse a knockout ou de- sistisse levantando um dedo (MURRAY, 2008). Vestindo apenas as luvas, aos lutadores não era permitido morder, agarrar ou arranhar (POLIAKOFF, 1987), ao passoque a permissão de chutes ain- da é discutida pelos historiadores (MURRAY, 2008). Estas práticas avançam na história e parecem icar ainda mais violentas quando praticadas na Roma Antiga, momento no qual é inserido o Caestus, uma espécie de luvas com componentes de metal que au- mentam substancialmente a brutalidade das lutas (MURRAY, 2008; PEATFIELD, 2007). Histórico das Lutas na Perspectiva Ocidental EDUCAÇÃO FÍSICA 27 Ao avançar da história no século 2 a.C. ocorre, em Roma, o primeiro combate documentado entre gla- diadores, prática que atingiria seu auge com a inau- guração do Coliseu em meados de 72 d.C. e per- maneceria em alta por mais 300 anos. As técnicas e armas de combate seguem a evoluir e as práticas europeias de lutas ganham um caráter ainda mais esportivo, inicialmente com os cavaleiros durante a era medieval e depois com o pugilismo na Inglaterra (entre 1000 e 1800 d.C.). Em 1896, ocorre a primeira edição dos Jogos Olímpicos da Era Moderna e já nes- ta edição estão presentes a Luta e a Esgrima. Nos Jo- gos de Atenas, em 1908, é inserido o boxe no progra- ma olímpico. Deste ponto em diante, após o im da II Guerra Mundial, ocorre uma interação maior entre Oriente e Ocidente, e o Judô (1972) e o Taekwondo (2000) são inseridos como modalidades olímpicas. Novamente reforço que essa contextualização his- tórica é importante para que possamos entender algumas diferenças relevantes quanto à evolução das Lutas, Artes Marciais e Modalidades Esporti- vas de Combate. No entanto, conforme falamos no tópico anterior, a sua dúvida, neste ponto, prova- velmente tem algo a ver com: mas de que modo estas práticas ocidentais se diferenciam das orien- tais? De que modo o modelo de ensino se apresen- ta neste contexto? 28 LUTAS Bom, enquanto no modelo Oriental o Sistema predominante era o Iemoto, no qual o professor (Sensei) era detentor do conhecimento que ia além da prática corporal e avançava para fatores ilosó- icos; no modelo Ocidental, as características são diferentes. O professor não precisava (e ainda não precisa) ser, necessariamente, alguém que passou por um processo de graduação e atravessou um mar de hierarquias e graduações. Também não precisava dominar a arte da meditação e este não tem, necessariamente, poder sobre o aluno sub- misso. O “Professor” das modalidades da Grécia Antiga, por exemplo, era chamado do “Paidotri- bo” e normalmente era um ex-campeão que pas- sava adiante seus conhecimentos sobre as técnicas das modalidades, somado a algumas noções de terapias e medicina (DEL VECCHIO; FRANCHI- NI, 2006; POLIAKOFF, 1987). Mais uma vez, a participação do aluno é nada relexiva, é coadju- vante e se limita à imitação dos gestos executados pelo indivíduo mais experiente (DEL VECCHIO; FRANCHINI, 2006). Nestes dois últimos tópicos, vimos que, apesar das diferentes perspectivas de evolução das Lutas, Ar- tes Marciais e Modalidades Esportivas de Combate, seja no ocidente ou no oriente, os modelos de ensi- no parecem não atender às demandas pedagógicas atualmente sugeridas. Na próxima unidade, discu- tiremos, de modo mais aprofundado, as consequ- ências disso e as alternativas para o ensino das lutas em diferentes contextos. Independentemente da sociedade, geograia ou data, os seres humanos lutam desde sua origem, seja por ins bélicos, status social, poder, estética, aptidão física, religião ou por ins espirituais. REFLITA EDUCAÇÃO FÍSICA 29 30 LUTAS Agora que você já teve um panorama internacional da origem e da evolução das Lutas, Artes Marciais e Esportes de Combate, faz-se necessário conhecer algumas características destas práticas corporais as- sociadas à cultura brasileira. Você já se perguntou se existem Lutas original- mente brasileiras? Se sim, é possível que a Capo- eira tenha vindo à sua mente. Mas você sabia que existem outras modalidades que podem ser consi- deradas como tendo sua origem por aqui? Obvia- mente, por ter acompanhado os tópicos anterio- res, você sabe que, de algum modo, as Lutas que se originaram no Brasil apresentam inluências de civilizações anteriores, já que a prática de combates corporais é constante em toda história da humani- dade. Mas existem práticas que sofreram inluência local a ponto de terem sido “naturalizadas” brasi- leiras? A resposta é sim. E o objetivo deste tópico será abordar estas modalidades e sua relação com a nossa cultura. As Lutas no Brasil EDUCAÇÃO FÍSICA 31 CAPOEIRA A Capoeira está fortemente associada à cultura e à história afro-brasileira. Em uma época na qual a escravidão e o tráico de pessoas eram permiti- dos, negros trazidos da África eram submetidos ao trabalho árduo de sol a sol, com sessões de tortura frequente a base de chicotadas (entre outras estra- tégias de tortura) e alimentação limitada. Um dos objetivos dessas ações pelo regime escravocrata era de limitar o potencial de rebelião destes escra- vos. Sem armas ou qualquer outro meio de defesa, em um determinado momento, grupos de negros escravizados passam a praticar uma modalidade de luta baseada em movimentos de animais e em práticas de luta africana. Inicialmente praticada às escondidas, já que havia tortura adicional quando a prática era percebida. Elementos de jogos, brin- cadeira e dança (outros componentes da cultura do movimento humano) foram adicionados, a im de mascarar em forma de ritual o que se tratava de uma prática de aprimoramento técnico e físico. Neste ponto, o Berimbau, instrumento característi- co que dá ritmo à Capoeira, torna-se ponto chave, visto que, dependendo do modo como era tocado, indicava se a prática deveria ser “suavizada” ou se podia seguir sem limitações (FRIGEIRO, 1989; SENNA, 1980). Mesmo após a abolição da escravatura, em 1888, os capoeiristas seguiram sendo marginalizados e perseguidos, o que chegou ao ponto de gerar proibi- ção por lei com pena de 2 a 6 meses de prisão a quem fosse visto fazendo “capoeiragens”. Esta proibição só seria revista na década de 30, com a liberação da prática vigiada e em locais fechados que tivessem alvará. Inicialmente classiicada como “Arte Marcial Brasileira” pela sua proximidade com golpes de mo- dalidades asiáticas com predominância de utilização dos membros inferiores, atualmente (desde 1972) a capoeira pode ser entendida (também) como mo- dalidade esportiva de combate, por atender aos pre- ceitos que você conheceu no início desta unidade (FRIGEIRO, 1989; SENNA, 1980). Para além disso, você, na posição de docente, pode abordar a Capo- eira em sua expressão mais ampla, que não se limita ao esporte, mas que avança para fatores culturais e folclóricos que envolvem a dança, a música, a arte, a religião e, em especial, a luta entre classes sociais. Você, professor/proissional de Educação Físi- ca, pode utilizar estas modalidades de modo interdisciplinar e contribuir para contar a his- tória do Brasil por meio da perspectiva das práticas corporais de combate. REFLITA 32 LUTAS HUKA-HUKA A luta Huka-Huka é de origem indígena, de modo mais especíico, é praticada pelos índios do Alto Xingu, localizado no estado do Mato Grosso. A modalidade de agarre tem por objetivo projetar o oponente ao solo, sendo vencedor, ainda, o lutador que agarrar a região posterior da coxa do adversário, levantá-lo do solo ou icar sobre suas costas. Além das competições, o Huka-Huka faz parte do Quarup (ritual de homenagens a mortos ilustres), encerran- do o ritual (GUERREIRO, 2015). Infelizmente, as informações cientíicas sobre a modalidade são escassas, mesmo assim gostaria de propor uma relexão sobre o signiicado da prática do Huka-Huka para estas tribos. Jovens que objetivam se tornar líderes ou grandes campeões passam por uma preparação especíica que envolve alimentação espe- cial, ensinamentos dos mais velhos, treinamentos in- tensose diários, além de longos períodos de reclusão (chegando a 6 anos) e o adiamento do início da vida se- xual até que este se torne um grande lutador (MADEI- RA, 2006; PAIVA, 2015). A relação destas práticas com o passado da tribo e com a espiritualidade associada aos seus deuses parece remeter ao que foi visto junto aos primórdios do início das práticas de luta, apesar de que, atualmente, a modalidade ganha características esportivas, mas tem por objetivo manter viva a memó- ria dos ancestrais e dos tempos de guerra, mantendo, ainda, os indivíduos em constante preparação. EDUCAÇÃO FÍSICA 33 Seja Capoeira, Huka-Huka ou Agarrada Marajoara, ica evidente que essas modalidades de combate fa- zem parte da identidade cultural brasileira de modo muito particular. Deste modo, convido você a pen- sar a prática de lutas não apenas no aspecto técnico e esportivo, mas ministrar aulas que relacionem os conteúdos de modo a inserir os componentes sócio- -culturais e propor relexões que transcendam aos fatores tecnicistas. AGARRADA MARAJOARA A Agarrada Marajoara é uma modalidade de com- bate típica da região norte do Brasil, de modo mais especíico no arquipélago do Marajó, no Estado do Pará. Com elementos semelhantes ao Huka-Huka, a Agarrada Marajoara é, também, uma luta de agarre, em que o objetivo é sujar as costas do oponente ao promover contato com o solo. Teoriza-se que a ori- gem da modalidade tem ligação com a observação do modo como os búfalos da região lutavam. A prática apresenta relação altamente íntima a outros elementos culturais do local, sendo praticada, em sua maioria (98%), pelo homem do campo ma- rajoara, em geral vaqueiros que declaram recorrer a santos protetores, o que denota a conexão entre a prática desportiva com fatores religiosos e espiritu- ais (ASSIS; PINTO; SANTOS, 2017). A prática ain- da se mostra tão fortemente ligada ao cotidiano do povo local que, além da prática de treinamento para os eventos competitivos institucionalizados, os indi- víduos chamados “caboclos” utilizavam-na ao inal do dia para aquecer o corpo antes do banho. Eles declaram, ainda, que a prática foi criada localmente em função do ambiente de luta e reconhecem como elemento cultural da região, juntamente a outros elementos conhecidos como as ervas medicinais, o artesanato e o Círio de Nazaré. O Brasil ainda apresenta um papel impor- tante no desenvolvimento de outras mo- dalidades de combate, a exemplo do Jiu- -Jitsu que se tornou Brazilian Jiu-Jitsu ao ser adaptado pela família Gracie e recebe, hoje, popularidade internacional reconhe- cida como modalidade brasileira. Por outro lado, diferentemente das três modalidades estudadas neste tópico, o Brazilian Jiu-Jitsu carrega, ainda, uma identidade cultural for- temente oriental, que pode ser vista pela indumentária de prática (Gi ou Kimono) e pelos termos frequentemente utilizados em idioma japonês, como a expressão “Oss” que signiica “perseverança sob pressão” e frequentemente é utilizada como sinônimo de “sim senhor”. Fonte: Gracie (2008). SAIBA MAIS 34 considerações inais N esta unidade, foi possível estudar o modo como surgem e evoluem as lutas de modo associado à evolução humana, não só biológica, mas, principalmente, como seres sociais. Além disso, você deve ser capaz de entender a terminologia debatida e identiicar as diferentes expressões destas práticas de combate. Por outro lado, não existe necessidade real de classiicar uma prática especíica como Luta, Arte Marcial ou Modalidade de Combate, o que existe é a necessidade de contextualizar o que será abordado de acordo com uma destas perspectivas. É importante que você identiique, nos tópicos abordados, que as práticas corporais de combate sempre estiveram presentes, desde a sociedade mais pri- mitiva até a mais evoluída. Negar a relação da luta com nossa história parece ser semelhante a reprimir instintos que são naturalmente humanos, o que, teo- ricamente, poderia desencadear situações extremas que geram conlitos e brigas. Ao contrário, vivenciar e conhecer o dano que pode ser causado e recebido em embates corporais pode aumentar a capacidade do indivíduo de avaliar quando entrar ou não em confronto. Atualmente, as práticas de combate receberam uma conotação “esportivi- zada”, mas você, sendo professor/proissional de Educação Física, não deve se limitar aos Esportes de luta. Nesta unidade, você pôde perceber que Lutar apre- senta relação com signiicados ilosóicos, sociais e culturais que não devem ser esquecidos. Evitar práticas pouco relexivas e contextualizá-las pode aumentar o interesse e o fascínio dos alunos. As estratégias para fazer isso serão apresentadas ao longo da próxima unidade, mas já adianto que tematizar as aulas de lutas pode ser uma escolha inteligente para estimular o componente lúdico e a fuga da rea- lidade. Por im, são apresentados elementos que permitem que você associe estes conteúdos a outras disciplinas em uma abordagem interdisciplinar. 35 atividades de estudo 1. Os termos nominais para lutas são fundamentais para aumento da visibilidade dos artigos cientíi- cos relacionados à temática, sugerindo que estes (e outros) podem ser utilizados sem discrimina- ção, como potencial especiicação destas modali- dades esportivas. Sobre terminologia aplicada às Lutas, assinale a alternativa correta. a) Estes termos são sinônimos. b) Lutas não têm relação com fatores culturais. c) Artes Marciais e guerras são sinônimos. d) Modalidades esportivas de combate e jogos de oposição são sinônimos. e) Nenhuma das anteriores. 2. A presença de rituais de luta podem ter diferencia- do os primeiros Homo Sapiens de outros huma- nos primitivos e contribuído para que estes pros- perassem. Os primeiros relatos de expressões corporais relacionadas às lutas remetem a: a) Índia. b) Grécia. c) África antiga. d) China antiga. e) Egito antigo. 3. A histórica das lutas é muito importante para que possamos entender algumas diferenças relevan- tes quanto à evolução das diferentes modalida- des que as envolve. Principalmente, os modelos metodológicos empregados. Assinale a alternativa que não corresponde à característica do sistema Iemoto: a) Relação professor-aluno de pura submis- são, na qual o professor é detentor de todo conhecimento e não deve ser ques- tionado. Ao aluno também não é permitido trocar de professor/equipe. b) Hierarquia inexistente, que permite que o aluno permaneça tempo suiciente, progri- da de graduações e tenha seus próprios alunos, mas sem necessidade de tutela de seu “mestre”. c) Autoridade do Iemoto, que indica que o mestre mais graduado é responsável por toda a organização e do licenciamento dos futuros mestres, gerindo as graduações superiores. d) Relação pseudoconexão, que se refere ao fato de se procurar manter a relação dos dirigentes das associações sob tute- la de descendentes identiicáveis do cria- dor original. 4. As Lutas que se originaram no Brasil apresentam inluências de civilizações anteriores, já que a práti- ca de combates corporais é constante em toda his- tória da humanidade. No Brasil, três modalidades recebem destaque, o Huka-Huka, a agarrada Mara- joara e a Capoeira. Das modalidades citadas a se- guir, indique qual recebeu grande contribuição a ponto de ser internacionalmente conhecida brasileira. a) Judô. b) Boxe. c) Muay-Thai. d) Jiu-Jitsu. e) Karatê. 5. Nos dias atuais, as práticas de combate rece- beram uma conotação “esportivizada”, o que não deve se limitar aos Esportes de luta e suas origens históricas. Indique as principais diferen- ças que podem ser percebidas ainda hoje nas modalidades de combate, de acordo com sua origem oriental ou ocidental. 36 LEITURA COMPLEMENTAR Leia este trecho do artigo “Conceito dos tipos de lutas a partir de uma visão de cultura cor- poral”, que reforça os conceitos abordados nesta unidade e apresenta as lutas folclóricas. Lutascomo Cultura Corporal e a Educação Física Partindo de que os movimentos naturais do ser humano (andar, correr, saltar, trepar, nadar, etc.) sejam inerentes ao ser humano pré-histórico, provavelmente, o primeiro gesto abstraído, pensado, tenha sido aquele ligado a gestos de defesa ou de ataque. Quando pensamos em lutas, não podemos deixar de citar as Artes Marciais. Entende- mos por artes marciais as formas de lutas praticadas e guiadas por princípios religiosos e/ou i losói cos. Também aquelas formas de lutas que tenham sido usadas compro- vadamente em conl itos de guerra. Aqui se encaixam os exemplos de lutas orientais indianas, chinesas, japonesas e coreanas. Devemos salientar que, em algum momento, a maioria das modalidades tratadas a seguir foram consideradas artes marciais, pois foram criadas para guerra, mas esta- mos contextualizando a partir da atualidade, após sistematizações para se tornarem esporte para possíveis práticas com cunho educacional e competitivo, sendo agregadas regras para praticantes de todos os gêneros e faixa etária sem distinção. Assim, sua caracterização é por maior predominância, atualmente, podendo ser categorizada em uma classii cação de luta. Hoje, quando pensamos em ataque e defesa, caracterizamos da seguinte maneira. As técnicas de ataque e defesa são formas abreviadas de Artes Marciais aplicadas de forma prática por proi ssionais de segurança (agentes de segurança do metrô, seguranças pessoais), formas de combate corpo-a-corpo desenvolvida por policiais militares e sol- dados das forças armadas. Também são formas de técnicas de ataque e defesa as lutas criadas para este i m. Exemplo disto é a luta israelense conhecida como Krav-maga. 37 LEITURA COMPLEMENTAR As lutas folclóricas e/ou culturais são aqui conceituadas por aqueles folguedos feitos por uma cultura ou país com características de confronto, pertencente à tradição de deter- minado país. Assim, poderíamos dizer que existe, para cada país, uma formas de luta típica. Por exemplo: Damnyè ou Ladja da Martinica, no Caribe. O Many de Cuba. Cheibi gad ga de Manipur na Índia, Chausson ou Savate francês, Escrima ou Arnis das Filipinas, Krabi-krabong e Muay thai da Tailândia, Guresh da Turquia, Glima da Islândia, Pentjak silat da Indonésia, Gouren Bretão e o Uka uka de índios no alto Xingu, entre outros. Também podemos enquadrar como lutas folclóricas e culturais as brincadeiras infantis, realizadas em forma de confronto. Enquadram-se, aqui, os desai os de cabo de guerra, desai os de desequilíbrio, as brigas de galo, e outros, típicos dos conteúdos das aulas de Educação Física infantil. Algumas modalidades de lutas foram tão difundidas que acabaram se esportivizando. Sendo assim, por esporte de combate entendemos as Artes Marciais que se tornaram competitivas, tais como o Judô e o Taekwondô. Para se tornarem modalidades espor- tivas, foi necessário minimizar de alguma maneira sua forma de execução tradicional, criando-se regras para as competições. Também podemos entender por esporte de combate as lutas historicamente feitas nos Jogos Olímpicos, tais como boxe, luta olímpica e greco-romana. Estas últimas derivadas do antigo Pankracio grego, luta realizada nos Jogos Olímpicos da antiguidade. Ainda como esporte de combate entendemos como as lutas criadas para competição. Exemplos são o Full Contact e o Kick boxing. O primeiro criado na década de 70 quando caratecas americanos criaram regras especíi cas para competições desta modalidade. Já o Kickboxing é uma junção de técnicas de chutes ao boxe tradicional.” Fonte: Oliveira, Rodrigo e Suzuki (2009). 38 material complementar Olhar Clínico nas Lutas, Artes Marciais e Modalidades de Combate Leandro Paiva Editora: OMP Sinopse: o livro Olhar Clínico nas Lutas é uma obra completa com informações inéditas sobre o universo das Lutas e Artes Marciais. Pode ser compreendido em duas partes macro. A primeira abrange a área de Preparação Física, Nutrição (per- da de ‘peso’), Psicologia e Medicina Esportiva. A segunda, História, Antropologia, Sociologia e História da Arte. Completamente em cores e escrito em linguagem bem acessível, aguça a curiosidade de qualquer indivíduo, quer seja ai cionado, fã, pesquisador, universitário, atleta, praticante, técnico ou outro proi ssional, até mesmo se estiver deparando pela primeira vez com esta área. Após o lançamento no Rio de Janeiro, o livro foi aclamado pelos críticos e é forte candidato ao Prêmio Jabuti - 2016. Indicação para Ler Terra de luta Ano: 2017 Sinopse: o documentário faz uma viagem pelas origens da luta no Brasil, partin- do dos primeiros registros arqueológicos pré-históricos encontrados no Brasil, na Serra da Capivara (PI); passando pela Huka-Huka dos índios do Xingu, no Mato Grosso; pela Luta Marajoara, da Ilha de Marajó (PA), até a Capoeira em Salvador (BA). Indicação para Assistir 39 referências ASSIS, J. W. P.; PINTO, R. F.; SANTOS, C. A. S. A Agarrada Marajoara como ma- nifestação de identidade cultural da ilha do Marajó, Pará. Lecturas-EFDeportes, p. 1–7, 2017. BRASIL, S. D. E. F. Parâmetros Curriculares Nacionais: Introdução aos Parâme- tros Curriculares Nacionais. Ministério da Educação (MEC), 1997. CALLOIS, R. Man, Play and Games. Chicago: University of Illinois Press., 2001. CHEEMA, B. S. et al. he feasibility and efectiveness of high-intensity boxing training versus moderate-intensity brisk walking in adults with abdominal obe- sity: a pilot study. 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Professor Dr. Victor Silveira Coswig Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: • O ensino das lutas e a educação física • Categorizações, regras de ação e jogos de oposição • Modelo de ensino tradicional e predominante • Modelos de ensino das lutas por meio da tática • Organização e trato pedagógico das lutas Objetivos de Aprendizagem • Contextualizar o ensino das lutas na escola e nas academias de luta. • Categorizar pedagogicamente as lutas, os jogos de oposição e as brincadeiras de lutas. • Apresentar os problemas dos modelos vigentes. • Apresentar modelos de ensino por meio da tática como alternativa aos modelos tecnicistas. • Sugerir progressão de conteúdo das lutas de acordo com faixas etárias. ENSINO DE LUTAS unidade II INTRODUÇÃO A pesar de ser altamente indicado por diferentes diretrizes de en- sino da Educação Física, sabe-se que o ensino das lutas neste contexto é extremamente raro. Infelizmente, outros conteúdos são “preferidos” e, normalmente, envolvem modalidades es- portivas coletivas, como futebol, futsal, handebol, basquetebol e voleibol. Nos piores cenários, as modalidades coletivas dominam a totalidade das aulas de Educação Física, ainda em uma perspectiva na qual a Educação Física se confunde com o ensino de esportes. Além disso, esporte é apenas uma das dimensões da cultura do mo- vimento humano, ao lado dos jogos, ginástica, dança e as lutas. Por isso, não são apenas as lutas que acabam por receber menor atenção do que o ideal. É possível perceber essa disparidade, inclusive, em progra- mas governamentais, como o Segundo Tempo, ou ainda, em diretrizes com a Base Comum Curricular. Para ter como exemplo, no primeiro, existem sugestões sobre modalidades “para aprender” e modalidades “para conhecer”. Não surpreende que aquelas que estão na primeira categoria são usualmente coletivas, enquanto as lutas se apresentam (quando muito) na segunda. Mas você provavelmente já conhece essa realidade. Se pergunte quan- tas aulas de lutas você teve no ensino fundamental e médio. Agora faça este mesmo exercício com a turma. Caso vocês estejam na média do que se conhece do ensino no Brasil, poucos indicarão contato com as lutas e, destes, serão relatos sobre atividades isoladas. Nesta unidade, vamos problematizar estes aspectos e o modelo vi- gente de ensino de luta. Além disso, é objetivo dar condições teóricas e indicações diretas sobre como modiicar essa realidade! Vamos lá! 46 LUTAS Caro(a) aluno(a), permita-me iniciar este tópico com algumas provocações sobre o ensino das lutas. Primeiramente, gostaria de perguntar sobre sua opi- nião quanto ao ensino das Lutas na Educação Física Escolar. Você acredita que ensinar lutas na escola é algo positivo ou apresenta mais riscos do que bene- fícios? E quanto ao ensino de lutas para crianças e jovens fora do ambiente escolar? É algo a ser estimu- lado ou os fatores negativos são maiores que os posi- tivos? Neste tópico, vamos aprofundar nestas ques- tões, em especial, focando nos benefícios e riscos da utilização do conteúdo lutas na Educação Física. Se você respondeu às perguntas anteriores de acordo com o senso comum e de acordo com grande parte dos Professores de Educação Física, possivelmente indicou que existem riscos que se sobrepõem aos benefícios acerca da aplicação de lutas na escola. Por outro lado, possivelmente tam- bém indicou que, fora da escola, a prática apresenta mais benefícios do que riscos, e que pode ajudar a disciplinar os alunos (entre outros benefícios). Mas por que existe essa contradição? Por que lutar fora da escola parece ser interessante enquanto que, no ambiente escolar, icamos cheios de “dependes”. Se O Ensino das Lutas e a Educação Física EDUCAÇÃO FÍSICA 47 você me permite, ainda vou além. Busque na me- mória seu histórico com Lutas e Educação Física Escolar, compartilhe essas memórias com seus colegas, amigos e familiares. Possivelmente pou- cas pessoas participaram de atividades de lutas na escola (lembre-se que luta é diferente de briga) e, quando houve, provavelmente foi por meio de al- guma atividade com professores de modalidades esportivas de combate convidados. Isso nos leva a outra questão: para dar aula de lutas, na escola, o professor precisa ter experiência com Modalidades Esportivas de Combate? No decorrer desta aula vou tentar ajudar você a encontrar argumentos que lhe permitam responder a todas essas questões. tre as práticas ofertadas nas disciplinas de educação física, 93% envolve Futebol/Futsal, 90% jogos, 75% Handebol, 70% Voleibol, 60% Dança, Ginástica e Atletismo, 40% Basquetebol, enquanto Lutas apa- rece com 14%, atrás, até mesmo, da opção “outros”, que ica com 30% (VIEIRA; SOUZA, 2007). E como isso se justiica? Os argumentos são diversos, mas acabam envolvendo, de modo geral, a falta de estru- tura, a falta de preparação especíica do professor, resistência dos pais e o risco de promover situa- ções violentas, além, é claro, daqueles que indicam que o conteúdo Lutas é inapropriado para escolas (FONSECA; FRANCHINI; DEL VECCHIO, 2013; REGO; FREITAS; MAIA, 2011; VIEIRA; SOUZA, 2007). A partir de agora, convido você a aprofundar cada um desses argumentos. A ritualização ou tematização das Lutas pode signiicar “brincar de fazer como se fosse”, sem violência, já que esta não faz parte do jogo e fazê-lo seria acabar com a brincadeira. (Jean-Claude Olivier) REFLITA Vamos lá! De acordo com um estudo feito no sul do Brasil, as contradições acerca do tema parecem ser profundas (FONSECA; FRANCHINI; DEL VEC- CHIO, 2013). Neste trabalho, dos 69 docentes entre- vistados, apenas 6,25% indicou que a prática de lutas na escola é inadequada, o que eu e você entendemos como algo positivo. Por outro lado, desses mesmos docentes, 91,3% indicou não contemplar lutas como conteúdo de suas aulas e, quando o faziam, era por meio de atividades lúdicas, vídeos ou por um espe- cialista convidado. Outra pesquisa indica que, den- 48 LUTAS FALTA DE ESTRUTURA FÍSICA A ausência de estrutura e material adequado fa- zem parte da realidade dos professores de Educa- ção Física. Mas será que isso impede a realização de práticas de combate? Se, para você, a prática das atividades de luta na escola remete à prática espor- tiva, você deve estar calculando que, para uma ati- vidade destas, você precisaria de roupas adequadas (Kimono, Gi, Dobok etc.), protetores (capacetes, ca- neleiras, luvas e bucais) e piso adequado (Tatame). Mas se você lembrar da classiicação do termo luta na unidade anterior, perceberá que existem possi- bilidades para além das propostas esportivas e que não exigem materiais tão especíicos (OLIVIER, 2000). De fato, muitas das atividades de luta não precisam, sequer, de material, outras são possíveis apenas com lenços, prendedores de roupas e cor- das. Em último caso, para vivências maisespecí- icas, visitas a espaços de treinamento podem ser uma estratégia interessante. FALTA DE PREPARAÇÃO ESPECÍFICA DO PROFESSOR O professor de Educação Física precisa ter sido luta- dor ou ser um faixa preta para ministrar suas aulas de lutas na educação física escolar? Não, não precisa. Um estudo interessante comparou o ponto de vista de três professores: a. Professor/Treinador de Modalidades Esporti- vas de Combate em ambientes não-escolares. b. Professor de Educação Física em escola, mas sem experiência pessoal com lutas. c. Professor de Educação Física em escola com experiência pessoal com lutas. Os achados, apesar de preliminares, indicam que, en- quanto o professor/treinador (a) sugere foco em aspec- tos técnicos, especíicos e que especializam os alunos, o professor (b) aborda as Lutas como conteúdo da cul- tura corporal, de modo que mantém presente relexões sobre brigar e lutar, sobre valores e sobre aspectos his- tóricos, sociais e ilosóicos dessas práticas. Além disso, o professor (b) ressalta a lógica não necessariamente pelo aprimoramento de gestos técnicos, mas pela re- lação dos movimentos na composição do leque motor dos alunos (SO; BETTI, 2009). De modo geral, a expe- riência do professor poderia até mesmo prejudicar sua visão mais ampla de conteúdo, limitando o conteúdo Lutas ao que se relaciona às suas particularidades. EDUCAÇÃO FÍSICA 49 Quadro 1 - Jogo de luta versus Luta a sério Dimensões Jogo de luta Luta a sério Comportamento Movimentos vigorosos (bater, caçar), sem contatos, ou com as mãos abertas. Movimentos vigorosos com contato físico voluntário e intencional. Afetividade Positivo, faces sorridentes, relaxadas, boca aberta (face de jogo). Negativo, faces franzidas, boca fechada (dentes cerrados). Consequências Ficam juntos após a luta. Afastam-se após a luta. Estrutura As crianças alternam os papéis de caçador e caça. Sem mudança de papéis. Nº de alunos Pode envolver várias crianças em simultâneo. Quase sempre acontece entre duas crianças. Ecologia Frequentemente acontece em superfícies macias. Acontece em qualquer área. Observadores Não tem observadores. Atrai muitos observadores. Fonte: Marques (2010). de conlitos sociais, vide novelas, ilmes, telejornais e a própria convivência em comunidade. Por outro lado, torna-se papel do professor de Educação Físi- ca e da escola desmistiicar esta ideia e transformar as brigas em jogos de luta que sejam regrados, rela- cionados aos valores inerentes às práticas corporais e relexivo, no sentido controle da agressividade e o conhecimento desta ação oposta do outro. LUTAS E VIOLÊNCIA NA ESCOLA Como vimos, apesar de não ser o pensamento da maioria dos docentes, a prática de Lutas para crian- ças ainda é vista como possível catalisadora de ações violentas (FONSECA; FRANCHINI; DEL VECCHIO, 2013; REGO; FREITAS; MAIA, 2011; VIEIRA; SOUZA, 2007). Mas será que isso relete Percebe-se, portanto, que as situações são ampla- mente diferentes e a distinção entre elas não é di- fícil, facilitando, assim, o julgamento de quando intervir ou não. E o jogo de luta pode levar à briga? Segundo Oli- vier (2000), a proposta é justamente o inverso. Em um mundo informatizado, é perceptível que a prá- tica de lutas é frequentemente associada à resolução a realidade? Alguns desses indivíduos indicam que depende da abordagem do professor. Pois bem, ini- cialmente vamos diferenciar uma briga de uma brin- cadeira de luta? De acordo com Marques (2010), as características de cada uma destas situações se mos- tram de acordo com o quadro a seguir: 50 LUTAS De modo adicional, a ciência têm conirmado a hipótese de que a prática de Lutas parece redu- zir e não aumentar a violência. Uma meta-análise recente, realizada a partir de 9 estudos que reu- niram 507 crianças de 6 a 18 anos, mostrou que a prática de Artes Marciais reduziu o comporta- mento antissocial e de externalização e promoveu maior autocontrole, autoconiança, autoestima e estabilidade emocional (HARWOOD; LAVI- DOR; RASSOVSKY, 2017). No mesmo sentido, outra pesquisa investigou o efeito da prática de Artes Marciais em relação à práticas de bullying. Os achados indicam que aqueles alunos que mais frequentaram as atividades de luta apresentaram a menor frequência de agressões e a maior fre- quência de comportamento de suporte (ajuda a quem é vítima de bullying). Os autores relacio- naram os resultados à melhoria de empatia e ao autocontrole, além de estratégias paciicadoras (TWEMLOW et al., 2008). EDUCAÇÃO FÍSICA 51 Tomando estes argumentos em conjunto, percebemos que existe a possibilidade de qualiicar o ensino das lutas, especialmente para crianças. Mas talvez tudo isto ainda pa- reça um pouco abstrato para você. Por isso, adianto aqui um exemplo que será aprofun- dado nos próximos tópicos: Imagine que você solicita aos alunos que for- mem duplas e que iquem de frente para o colega. Ao seu sinal o objetivo do aluno será tocar em um dos ombros do seu adversário que, obviamente, irá tentar defender e con- tra-atacar. Esta atividade ocorre entre duas ou mais pessoas? (Sim!). Apresenta ataque e defesa de modo mútuo e simultâneo? (Sim!). O objetivo é ou está no corpo do oponente? (Sim!). Portanto é Luta! E quanto material es- pecial você precisaria para executar esta ati- vidade? O quanto de conhecimento especíico de gestos e golpes você precisará ensinar? Será que um pai/mãe proibiria esta prática? Será que esta é realmente uma prática que estimula a violência? Fonte: o autor. SAIBA MAIS 52 LUTAS Neste ponto você já avançou consideravelmente no entendimento sobre o conteúdo Luta. Inicial- mente quanto a origem histórica e a evolução ao longo dos séculos na Unidade I e no tópico an- terior quanto a rel exões especíi cas da aplicação deste conteúdo nas aulas de Educação Física. A partir de agora, pressupondo que você entendeu a importância de inserir esta temática na educação de crianças e jovens, avançaremos para fatores de instrumentalização, ou seja, vamos focar no “como fazer”. Vamos nessa? Como visto anteriormente, a prática de lutar está inserida na classii cação dos jogos, neste contexto, considere as seguintes manifestações dos jogos, pro- postas por Callois (2001) e sua relação com as mo- dalidades de combate: Alea: remete-se a fatores que não podem ser controlados pelo jogador, ou seja, o jogador é nor- malmente passivo e o vencedor é dei nido por fa- tores associados ao acaso, pelo destino, por sorte. Nestes jogos de azar encontramos relações apenas indiretas relacionadas às Lutas. Quando, por exem- plo, o lutador depende de um chaveamento por sor- teio, quando um apostador investe dinheiro ao “adi- vinhar” quem vencerá ou mesmo quando a vitória é alcançada por um motivo diferente do desempenho do lutador (Lesão do oponente, por exemplo). Categorizações, Regras de Ação e Jogos de Oposição EDUCAÇÃO FÍSICA 53 Ilynx: remete-se à busca da vertigem, a exemplo de práticas em que crianças giram até sentirem tontu- ra. Não será difícil para você lembrar de atividades de luta, em especial relacionadas ao modelo orien- tal, nas quais o praticante se coloca em situações de desequilíbrio extremo. Apesar desse exemplo, ica evidente que esta não é a melhor dimensão para se classiicar os jogos de combate. Agon: remete-se à competição por comparação, per- seguição ou oposição, nas quais inserem-se nesta manifestação do jogo as características de igualdade de chances de vitória. Supõe, ainda, preparação para a prática e vontade de vencer. É nesta dimensão dos jogos que as lutas se inserem, de modo mais especíico na categoria de jogos de oposição, apesar de ser possí- vel encontrar relação com as demais dimensões (vide exemplos anteriores). As tentativas de manutenção de igualdade de chances de vitória é aparente e você pode perceber, por exemplo, nos
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