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Curso de Roteiro - Teoria e Prática APOSTILA Criação de Roteiro Organização: Pedro Carvalho 1ª Edição - 2018 Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático Criação Dramática Drama, Dramaturgia e Estória Drama é ação e, consequentemente, conflito de vontades. Ação não deve ser entendida aqui no sentido em que é usada em “filmes de ação”. Ação dramática é o que um personagem faz com o propósito de alcançar alguma coisa. Da mesma forma o conflito dramático não é mero conflito, como um bate-boca ou uma briga. O conflito dramático tem um objetivo, um propósito, um sentido. Em suma, o drama se manifesta quando uma ação intencional provoca uma oposição, ou obstáculo, cuja manifestação mais poderosa é a vontade oposta. A dramaturgia, segundo Aristóteles, é a arte que estrutura os atos humanos logicamente, visando despertar intensas paixões ou uma condição de encantamento e êxtase. Em outras palavras, é a arte de escrever estórias. Já Mckee define da seguinte forma uma “estória na casca de noz”: um evento tira o equilíbrio da vida de um personagem para pior ou para melhor, despertando nele o desejo consciente e/ou inconsciente por aquilo que ele sente que irá restaurar o equilíbrio, lançando-o em uma jornada por seu objeto de desejo contra forças do antagonismo (interno, pessoal, extra-pessoal), podendo ou não alcançar seu objetivo. Etapas de Criação da Estória IDEIA INICIAL: a estória pode ter diversos pontos de partida. Você pode começar a partir de uma premissa, um personagem, um ambiente, uma temática, um gênero ou uma fusão entre gêneros, entre outros. São elementos isolados, ainda sem qualquer estrutura. SINOPSE: é uma forma de apresentar a estória de sem revelar o final nem dar detalhes sobre o desenvolvimento. É um texto objetivo, mas deve ser escrito de forma impactante, sedutora. RESUMO: conta a estória completa de forma sucinta, do início ao fim, sem detalhamento de todas as ações nem diálogos. ARGUMENTO: estória completa, com detalhamento de todas as ações, mas sem diálogos. Estes ficam subentendidos nas descrições das ações ou colocados como discurso indireto livre. ROTEIRO: forma final da dramaturgia cinematográfica. Trata-se da estória completa, com detalhamento de todas as ações e diálogos ! 2 Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático Gênero e Significado GÊNERO: Servem de código de compreensão tanto para realizadores quanto para o público. Se traduzem em uma série de convenções narrativas e estilísticas. Gêneros podem ser combinados para que seus significados ressoem mutuamente, para enriquecer a personagem e para criar variedades de clima e de emoção. CONVENÇÕES DE GÊNERO: são ambientes, papéis, eventos e valores específicos que definem gêneros individuais e seus subgêneros. Para não criar estórias previsíveis você deve tornar-se perito em seu gênero e suas convenções. PREMISSA: É uma idéia que inspira o escritor para criar uma estória. Trata-se de uma questão aberta como: “o que aconteceria se... ” (um tubarão nadasse para um resort na praia e devorasse um turista). TEMÁTICA: Conjunto dos temas que caracterizam a história. Assuntos que se quer desenvolver. Proporciona uma gama de posicionamentos a serem discutidos, refutados ou defendidos. IDEIA GOVERNANTE: é o significado supremo da estória expressado através da emoção estética do clímax do último ato. Pode ser expressa em uma única sentença descrevendo como e por que a vida passa por mudanças de uma condição de existência no início a outra no final. Em suma, ideias governantes se dividem em idealistas (positivas), pessimistas (negativas) e irônicas (positivas/negativas). Gêneros Comuns Tipos de Conflito 1. Drama 2. Romance 3. Comédia 4. Terror 5. Ação; Aventura 6. Épico 7. Filme de Arte Ambientação 8. Histórico; Biografia 9. Ficção Científica 10. Policial; Médico; Político; Esportivo 11. Faroeste; Bíblico; Mitológico 12. Guerra 13. Fantasia Linguagem 14. Docu-drama 15. Mocumentário 16. Musical 17. Animação 18. Sátira ! 3 Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático Personagens O Personagem não é um ser humano, é uma obra de arte, uma metáfora para a natureza humana. Seus aspectos são desenhados para serem claros e reconhecíveis. A personagem deve ter qualidades da caracterização necessárias para fazer escolhas convincentes. Em outras palavras, uma personagem deve ser crível: jovem ou velha, forte ou fraca, mundana ou ingênua, educada ou ignorante, nas proporções certas. A combinação de qualidades deve permitir que o público acredite que a personagem poderia agir, e agiria, da maneira que age ao longo da estória. CARACTERIZAÇÃO: É a soma de todas as qualidades aparentes de um ser humano, tudo o que pode ser descoberto através de uma observação cuidadosa: corpo, idade, vestimenta, nível de inteligência, sexo e sexualidade, formação e trabalho, etc. VERDADEIRA PERSONAGEM: Sob a superfície da caracterização, independente de aparências, quem é essa pessoa? Quais valores fazem parte de sua natureza? A verdadeira personagem só pode ser expressa através de uma escolha em um dilema. Quanto maior a pressão, mais verdadeira e profunda a escolha da personagem. PERSONAGEM X CARACTERIZAÇÃO: Quando a caracterização e a verdadeira personagem são iguais, quando a vida interior e a aparência exterior são uma única substância, o papel se torna uma lista de ações repetitivas e previsíveis. A verdadeira personagem em contraste com a caracterização é fundamental para as personagens principais. DIMENSÃO: Para que um personagem tenha dimensão, ou seja, para que seja esférico ao invés de plano, é necessário que este apresente contradições consistentes entre personagem e caracterização e / ou dentro da própria personagem verdadeira. ARCO DA PERSONAGEM: a boa escrita não apenas revela a verdadeira personagem, como cria um arco de mudança na natureza interna, para melhor ou para pior, ao longo da narração. CAUSAS DA AÇÃO: A causa da ação é tripla e se refere ao passado, presente e futuro. O passado estabelece a motivação para a ação, ou antecedentes. No presente, o desenvolvimento de uma ação se dá através de uma intenção. No futuro está a meta final, o objetivo da ação. SUBTEXTO: O que não é dito mas pode ser depreendido a partir do contexto narrativo. O subtexto pode, inclusive, ter um sentido oposto ao que está sendo dito explicitamente no texto. Nós precisamos conseguir ver as verdadeiras intenções por trás de um diálogo para percebermos as contradições dos personagens ! 4 Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático FUNÇÕES DRAMÁTICAS: Uma vez criado o personagem, é necessário encaixá-lo em uma função efetiva dentro da trama e da experiência dramática vivenciada pelo público. PROTAGONISTA: É uma personagem voluntariosa. A força de vontade dele tem que ser poderosa o suficiente para sustentar o desejo ao logo do conflito e finalmente agir e criar mudanças significativas e irreversíveis. Tem um desejo consciente. Pode ter um desejo inconsciente auto-contraditório. Tem a capacidade de buscar o objeto de desejo convincentemente. Deve ter ao menos uma chance de alcançar o seu desejo. Tem a força de vontade e a capacidade de buscar o objeto de desejo consciente e/ou inconsciente até o fim da linha, no limite humano estabelecido pelo ambiente e pelo gênero. É o personagem com maior dimensão. Na essência, o protagonista cria o resto do elenco. Todas as outras personagens, antagonistas e coadjuvantes, estão na estória simplesmente por causa do relacionamento com o protagonista e pela maneira que cada um ajuda a delinear as dimensões da natureza completa desse protagonista. Por fim é fundamental a identificação do público para com esta personagem, por isso, o protagonista deve ser empático (“como eu”), ou seja, o público precisa reconhecer uma certa humanidade compartilhada. Nesse momento de reconhecimento, o espectador súbitae instintivamente quer que o protagonista alcance o que ele deseja, seja lá o que for isso. Todo protagonista tem que ser empático. ANTAGONISTA: é um personagem, grupo de personagens, ou uma instituição, que representa a oposição ao protagonista. O antagonista não precisa ser necessariamente um personagem, podendo ser o próprio ambiente onde se encontra o protagonista, um traço de personalidade ou sentimento do próprio ou até mesmo uma idéia ou conceito, fonte dos conflitos da história. Os antagonistas ou antagonismos têm a função de apresentar constantemente empecilhos para a realização do objetivo do protagonista. COADJUVANTE: personagem secundária que que orbita ao redor das personagens principais (protagonista e / ou antagonista), auxiliando, atrapalhando ou revelando características dos personagens e do universo retratado. Podem ter funções específicas, tais como: Ajudante; Interesse amoroso; Mentor; Vítima; Comentador; Emblemático; etc… ! 5 Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático Estrutura Narrativa ESTRUTURA: é uma seleção de eventos da estória da vida das personagens que é composta de uma seqüência estratégica para estimular emoções específicas e para expressar um ponto de vista específico. FUNÇÃO DA ESTRUTURA: é prover pressões progressivamente construídas que forçam a personagem a enfrentar dilemas cada vez mais difíceis, fazendo escolhas de risco e tomando atitudes cada vez mais difíceis, gradualmente revelando sua verdadeira natureza, até mesmo chegando ao eu inconsciente. UM EVENTO DA ESTÓRIA: cria uma mudança significativa na situação de vida de uma personagem que é expressa e experimentada em termos de valor. VALORES DA ESTÓRIA: são as qualidades universais da experiência humana que podem mudar do negativo para o positivo e vice-versa, a cada momento. CONFLITO: Convergência de forças de sentidos opostos que faz mudar os valores dos personagens (+ ou -). AÇÃO / ATIVIDADE / EXPOSIÇÃO: Nem sempre atividade física consiste em conflito. uma atividade com propósito, que gera mudanças e reações é ação dramática, somente assim temos conflito. Caso nada mude em relação aos personagens, estamos fazendo exposição, ou seja, simplesmente apresentando informações. BRECHA: momentos no qual uma personagem toma uma ação esperando uma reação útil de seu mundo, mas ao invés disso, o efeito de sua ação é provocar as forças do antagonismo. O mundo da personagem reage diferentemente do esperado, mais poderosamente que o esperado ou ambos. RISCO E DILEMA: Nós sempre tentamos conseguir tudo o que desejamos. Em um estado de perigo, no entanto, nós poderemos ter que arriscar algo que queremos ou possuímos para alcançar outra coisa que desejamos. Pergunte: Qual é o risco? O que o protagonista perde caso ele não consiga o que quer? Mais especificamente, qual é a pior coisa que pode acontecer ao protagonista se ele não alcançar o que deseja? Quanto maior o valor, maior o risco. ! 6 Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático Unidades de Ação Dramática BEAT: menor elemento da estrutura, uma mudança de comportamento que ocorre por ação e reação. PONTO DE VIRADA: um beat no qual valor do personagem muda a polaridade entre valores positivos e negativos. Pontos de virada são reviravoltas na estória. Oferecem novas informações e objetivos para a(s) próxima(s) cena(s). CENA: é uma ação através de conflito em tempo mais ou menos contínuo que transforma a condição de vida de uma personagem em pelo menos um valor com um grau de significância perceptível. (o ideal é que toda cena seja um evento da estória - quando isso não acontece = exposição). SEQÜÊNCIA: é uma série de cenas - geralmente de duas a cinco - que culminam com um impacto maior que qualquer cena anterior. ATO: é uma série de seqüências que culminam em uma cena climática, causando uma grande reversão de valores, mais poderosa em seu impacto do que em qualquer cena ou seqüência anterior. ! 7 Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático Eventos Fundamentais da Narrativa APRESENTAÇÃO: quando uma estória começa, o protagonista vive uma vida mais ou menos equilibrada. Ele tem sucessos e fracassos, altos e baixos, mas a vida está relativamente sob controle. Neste momento da narrativa, apresentamos o protagonista e o universo que este habita. INCIDENTE INCITANTE / ATAQUE: evento que desarranja radicalmente o equilíbrio de forças na vida do protagonista. Um Incidente Incitante pode ocorrer de duas maneiras, por coincidência ou por decisão. O Incidente Incitante de uma trama central deve acontecer na tela, não na estória pregressa, nem fora da tela, entre as cenas. Traga o Incidente Incitante da Trama Central o mais breve possível, mas apenas quando ele estiver maduro, no instante em que o público tenha conhecimento suficiente da personagem e do mundo para reagir completamente. O Protagonista deve reagir ao Incidente Incitante, iniciando as complicações. DESENVOLVIMENTO / COMPLICAÇÕES: pontos sem volta. Uma estória não deve voltar para ações de menor qualidade ou magnitude, mas mover-se progressivamente para a frente , em direção a uma ação final além da qual o público não consiga imaginar outra. Para COMPLICAR uma estória, o escritor constrói o conflito progressivamente até o fim da linha. Para alcançar a COMPLEXIDADE o escritor deve colocar suas personagens em conflito com todos os três níveis da vida, frequentemente ao mesmo tempo. CRISE: ela significa decisão. A cada cena as personagens tomam decisões, de fazer uma coisa ao invés de outra. Mas crise é a decisão suprema. É perigo e oportunidade. Perigo porque uma decisão errada nesse momento faz com que percamos para sempre o que queremos; Oportunidade porque a escolha certa permite-nos alcançar nosso desejo. CLÍMAX: a estória é uma série de atos construídos em função do último clímax de ato ou clímax de estória, que carrega consigo uma mudança absoluta e irreversível. Um clímax de cena causa mudanças menores, porém significativas. O clímax de sequência é uma cena que causa uma reversão moderada. Já o clímax de Ato é uma cena que causa uma reversão maior. RESOLUÇÃO: momentos finais da estória que nos apresentam o equilíbrio final alcançado pelo protagonista. Pode mostrar o alastramento dos efeitos climáticos para personagens coadjuvantes, revelar a conclusão de uma trama secundária ou simplesmente servir de “cortina lenta”, permitindo que o público respire antes de deixar sua estória. ! 8 Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático Curva Dramática O desdobramento da ação dramática pode ser representado graficamente por uma curva, é uma forma didática de compreender a estrutura narrativa. É importante frisar que cada estória, ou cada design de trama, terá uma curva dramática distinta. Neste caso, a curva representa uma estrutura clássica. A curva dramática começa num traço horizontal, que representa um estado inicial em repouso, ou equilíbrio. Num determinado ponto (Incidente Incitante) ela começa a subir, pois há uma ruptura do equilíbrio inicial e uma intensificação crescente da ação, em busca de um novo equilíbrio. A curva sofre uma alteração radical quando atinge a crise, intensificando a subida até que finalmente atinge um ponto máximo, uma culminância (clímax), e cai novamente, detendo-se, porém, num patamar superior ao seu estado inicial. Ou seja: o sujeito vive uma experiência dramática que o transforma e que, depois de encerrada, o deixa num nível mais alto. Podemos dizer que a curva dramática se refere a tensão dramática, o seja, ao envolvimento, a curiosidade e o interesse do público pelos eventos da trama. Esta curva se aplica a estória como um todo, bem como a um ato, uma sequência ou até uma cena. Em outra análise, podemos dizer que esta representa o próprio arco dramático ou de transformação da personagem. ! 9 Apresentação Clímax Resolução Incidente IncitanteComplicações Crise Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático Elementos Formais da Trama PROTAGONISTA(S) ÚNICO: uma estória com um único protagonista no coração da narrativa. MÚLTIPLOS: várias estórias relativamente pequenas, cada uma com um protagonista diferente. Podem estar conectadas ou não. ATIVO: na busca de um desejo, toma a ação no conflito direto com as pessoas e com o mundo que os cerca. PASSIVO: é externamente passivo enquanto busca o desejo internamente, em conflito com aspectos de sua própria natureza. AÇÃO X ATIVIDADE: a AÇÃO verdadeira é um movimento físico, vocal ou mental que abre brechas na expectativa e cria mudanças significativas. Mera ATIVIDADE é quando o que é esperado acontece, gerando mudanças triviais ou nenhuma mudança. CONFLITO INTERNO: corpo, emoções, mente. PESSOAL: amantes, amigos, família. EXTERNO: ambiente, instituições sociais, indivíduos na sociedade. TEMPO LINEAR: uma estória com ou sem flashbacks arranjada em uma ordem temporal de eventos que o público consegue acompanhar. NÃO LINEAR: estória que salta aleatoriamente através do tempo, ou que se obscureça tanto a continuidade temporal que o público não consiga entender a ordem dos acontecimentos. REALIDADES CONSISTENTES: são ambientes que misturam modos de interação entre os personagens e seu mundo, mantidos consistentemente ao longo da narrativa para explicitar seu significado. INCONSISTENTES: são ambientes que misturam modos de interação de uma maneira que os episódios da estória pulem inconsistentemente de uma realidade para outra, criando senso de absurdo. CAUSALIDADE X COINCIDÊNCIA CAUSALIDADE: conduz uma estória na qual ações motivadas causam efeitos que, por sua vez, se transformam em causas de outros efeitos, e assim interligando os vários níveis de conflito em uma reação em cadeia de episódios até o clímax da estória, expressando a interconectividade da realidade. COINCIDÊNCIA: conduz um mundo ficcional no qual ações não motivadas engatilham eventos que não causam mais efeitos, portanto fragmentando a estória em episódios divergentes e a um final aberto. Traga a coincidência cedo na estória para permitir que o tempo construa significado a partir dela. FINAL FECHADO: clímax de estória com mudanças absolutas e irreversíveis que responda todas as questões levantadas pela narrativa e satisfaça todas as emoções do público. ABERTO: deixa questões não respondidas e emoções não satisfeitas. ! 10 Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático Design de Trama TRAMA: é a escolha de eventos e a maneira como são mostrados ao espectador. Toda estória tem uma trama, por vezes formada de várias linhas narrativas (trama e sub tramas). DESIGN CLÁSSICO (ARQUITRAMA): uma estória construída ao redor de um protagonista ativo, que luta contra forças do antagonismo fundamentalmente externas para perseguir seu desejo, em tempo contínuo, dentro de uma realidade ficcional consistente e casualmente conectada, levando-o a um final fechado com mudanças absolutas e irreversíveis. Esses princípios são “clássicos" no sentido mais verdadeiro: atemporal e transcultural, vindo de milênios de narração oral. MINIMALISMO (MINITRAMA): o escritor começa com os mesmo elementos do design clássico, mas em seguida os reduz. Procura a simplicidade e a economia enquanto absorve o suficiente do clássico, de maneira que a estória satisfaça o público. Enquanto filmes clássicos envolvem a solução de questões coletivos, o minimalismo se volta para problemas individuais ou de um pequeno grupo ANTIESTRUTURA (ANTITRAMA): reverte o design clássico, contradizendo as formas tradicionais. Geralmente, para deixar claras suas ambições “revolucionárias”, a história tende para a extravagância e o exagero auto-consciente. NÃO TRAMA: estático e sem mudanças. A condição de vida da personagem no final é virtualmente idêntica à do início. Não há estória, a experiência narrativa dissolve-se em retratos. ! 11 Design Clássico Causalidade Final Fechado Tempo Linear Conflito Externo Protagonista Único Realidade consistente Protagonista ativo Final aberto Conflito interno Multi-protagonista Protagonista Passivo Minimalismo Coincidência Tempo não-linear Realidades inconsistentes Antiestrutura Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático Artifícios Dramáticos MISTÉRIO: curiosidade – o público sabe menos que as personagens. Nós criamos e então escondemos fatos expositivos, particularmente fatos na Estória Pregressa. Deliberadamente colocamos o público no escuro, de modo que ele suspeite de fatos falsos enquanto escondemos os verdadeiros. IRONIA DRAMÁTICA: preocupação – o público sabe mais do que as personagens. A revelação de algo que o personagem não sabe põe o espectador numa posição de superioridade e isto se traduz num sentimento de participação. Após a revelação a tensão dramática é mantida em um patamar alto até o momento de reconhecimento, em que o personagem descobre aquilo que já sabemos. SUSPENSE: curiosidade e preocupação – o público e as personagens sabem as mesmas informações. Nesse relacionamento, nós sentimos empatia e nos identificamos com o protagonista porque dividimos o mesmo conhecimento, mas ninguém sabe “no que isso vai dar." SURPRESA: susto, desorientação – a surpresa se opõe ao suspense, pois é uma revelação súbita de uma informação e / ou de um acontecimento. Ainda que saibamos as mesmas informações que os personagens, não há tempo para preocupação. Ao invés disso, o público precisa de alguns instantes após a surpresa para “digerir" este acontecimento, entender seu significado e as consequências para a estória. CONSTRIÇÃO DE TEMPO: quando temos uma meta sem prazo definido, tudo parece mais fácil, porém, se o tempo é curto, a preocupação se instaura imediatamente. Estabelecer horários, compromissos, contagens regressivas, etc., é uma forma muito eficaz de incutir tensão, uma vez que há um risco evidente para o personagem. PISTA E RECOMPENSA: uma pista é um artifício preparatório (uma fala, uma ação, um gesto, um objeto, etc.) que pode passar desapercebida ou causar um certo estranhamento, pois não é compreendida completamente. A pista pode ser reforçada ao longo da estória. Perto da resolução, geralmente em um ponto de virada, surge a recompensa e a pista adquire um novo significado. O público então “liga os pontos” e experimenta satisfação. Se o público prevê a recompensa esse efeito se perde, sua pista pode ter sido óbvia demais ou enfatizada desproporcionalmente. PREPARAÇÃO E CONSEQUÊNCIA: um momento de preparação é aquele em que o personagem e o espectador se preparam para um próximo momento dramático. Já na consequência se permite “digerir” um evento imediatamente anterior. Em ambos, a poesia visual e auditiva são usadas como apelo direto às emoções do público. Outro tipo de recurso é a preparação por contraste, em que estimulamos no público uma expectativa emocional oposta aos efeitos que o próximo momento provocará. ANÚNCIO E ELEMENTOS DO FUTURO: anúncio é a indicação, para o público, de uma experiência iminente que um personagem deseja e/ou pode vir a ter. Se parecer importante para a história, nós também viveremos esta expectativa. Profecias, maldições, visões, pressentimentos, premonições, etc., são elementos do futuro. Enquanto o anúncio trabalha com intenções, elementos do futuro se baseiam em esperanças e medos dos personagens. Ambos nos fazem esperar e antecipar o que está prestes a acontecer. ! 12 Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático Formatando a Estória SINOPSE Apresentação sucinta da estória. Geralmente é pedida em exercícios que propõe a criação de produtos audiovisuais em série. Também pode ser pedida no exercício de Interpretação Audiovisual. Neste exercício a clareza e o poder de síntese são fundamentais. Segue abaixo um modelo para realização de sinopse em apenas uma sentença:[Nome do filme] conta a estória de [Descrição do protagonista] que [Motivações Iniciais], está [Apresentação], até que [Incidente Incitante], o que o levará a [Objetivo Central]. ARGUMENTO Sua escrita deve utilizar verbos no presente ao longo de todo o texto e descrever as imagens e sons de cada cena. Não use narrador que faça comentários nem se termos técnicos. Limite-se a descrever, de modo sucinto, o que seu espectador deve ver e ouvir, Mude o parágrafo a cada nova cena. Se houver diálogo, dê preferencia ao discurso indireto livre ou caso necessário, trabalhe com o discurso indireto. Evite descrições baseadas em negativas, ou seja, não diga aquilo que não é, mas sim o que é, o que de fato acontece. Por exemplo: “Maura não fica feliz com a situação” é uma descrição vaga, já “Maura tenta disfarçar sua irritação, sem sucesso” é muito mais precisa e imagética. BIOGRAFIA / PERFIL DO PERSONAGEM Sua função é revelar aspectos da vida do personagem através de acontecimentos importantes de sua vida. Evite detalhes desnecessários, ao invés disso, descreva os eventos que geraram características físicas e psicológicas que você deseja enfatizar em seu personagem. Não é absolutamente necessário que o texto siga um tempo linear, mas é necessário que o texto tenha uma ordem lógica. ! 13 Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático DIÁLOGO (ROTEIRO) Ao escrevermos o roteiro, mantemos a formatação de um argumento para descrever as ações e adicionamos o diálogo. O diálogo não é uma conversa. Conversas são casuais. O diálogo é selecionado, ordenado e com finalidade. Procure criar um estilo de fala, um ritmo, um vocabulário para cada personagem. O texto deve ser simples. Palavras raras devem ser evitadas, a menos que ajudem a caracterizar o personagem. Um mecânico fala diferente de um executivo. Um mecânico conversando com um cliente ou se dirigindo a um fornecedor fala de dois modos diferentes. Não seja caricato, mas se for o caso procure a frase regional. Ele utiliza gírias ou algum jargão técnico? Um médico sempre deixa escapar alguma palavra especializada. Se ele usa gírias, cuidado que elas podem não ser compreendidas. Os diálogos são descontínuos. As pessoas quando falam usam palavras incompletas e hesitam muito. Por isso o diálogo pode ser quebrado com comentários e reações. Atenção aquilo que não é dito. A palavra que é evitada, o silêncio que se impõe, podem ser mais interessantes que a melhor linha de diálogo. Criando a Diegese O universo de uma estória é uma criação única, uma variação - desde a mais realista até a mais fantasiosa - da realidade do nosso mundo, atual ou em uma outra época qualquer. A especificidade do universo contido numa estória vem de duas fontes: da natureza do protagonista (sua história e valores) e da natureza de quem conta a história (seus pontos de vistas, estilo, temática). 1. DO QUE AS PERSONAGENS SOBREVIVEM? a. COMO É O TRABALHO? b. COMO SÃO AS TROCAS? 2. QUAL A POLÍTICA DO MEU MUNDO? a. QUEM EXERCE O PODER? b. QUEM EXERCE A JUSTIÇA? c. QUAIS SÃO AS HIERARQUIAS? d. QUEM PUNE OS INFRATORES DE REGRAS? COMO? 3. QUAIS OS RITUAIS DO MEU MUNDO? a. EVENTOS IMPORTANTES NA VIDA DAS PESSOAS b. FESTAS / LAMENTAÇÕES / RITOS DE PASSAGEM 4. QUAIS OS VALORES DO MEU MUNDO? a. O QUE É CONSIDERADO BOM? ! 14 Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático Criando Personagens Para se criar uma boa estória, é imprescindível ter personagens interessantes. É consenso entre autores que personagens fortes “ganham vida própria”. Suas convicções, contradições e características são tão bem definidas que a escritura do texto torna-se fluida, pois sabemos de antemão todas as possíveis reações de nossas criaturas. Ficha de Personagem Função:_________________________________________________________ Biografia: _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ Objetivo consciente: _______________________________________________________________ Objetivo Inconsciente: _______________________________________________________________ Virtudes: _______________________________________________________________ Defeitos: _______________________________________________________________ Medos: _______________________________________________________________ Desejos: _______________________________________________________________ Vícios/Hábitos/Hobbys: _______________________________________________________________ Gosta de: _______________________________________________________________ Não gosta de: _______________________________________________________________ Personalidade: _______________________________________________________________ _______________________________________________________________ ! 15 Curso de Roteiro - Teoria e Prática: Material Didático Evitando Erros Comuns Evite os excessos, o que não atende a nenhuma função dramática deve ser cortado sem piedade. “Na dúvida sempre corte” (Giacomo Rossini). Situações conflituosas nem sempre são dramáticas. É comum que se recorra a gritos, prantos e situações de violência para compensar arcos dramáticos ineficientes ou inexistentes. Respeite sempre a verossimilhança, lembre-se que o público percebe facilmente situações forçadas. Cuidado com a primeira ideia que lhe vier a mente para sua estória. De todas as estórias que são escritas, muitas recorrerão a ideias e situações muito parecidas. Naturalmente, aquelas que fogem do lugar comum serão recompensadas. Se o seu incidente incitante (ataque) se encontra na estória pregressa, ou seja, se o conflito se inicia antes de começar a estória, existe um problema grave de estrutura. ! 16