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Diários pessoais - Territórios abertos para a História

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Territórios abertos para a História
-Escrever, contar, guardar.
 A escrita registra, inventa e conserva muitos atos da experiência humana.
Escrever se constitui em uma forma de produção de memória e em instrumento de construção do passado. Roger Chartier fixa que a escrita são os “traços do passado, a lembrança dos mortos, ou a glória dos vivos.” Pode-se buscar “não a verdade do nosso passado, mas o passado de nossas verdades, não a verdade do que fomos, mas a história do que somos daquilo que talvez já estejamos deixando de ser.”.
 
 Pouco utilizados na historiografia, os diários pessoais nos faz compreender as práticas de cultura de uma época e analisar os fatos que marcaram um tempo. Chamados de escritas ordinárias, os diários pessoais permitem aos historiadores rastrearem o dia a dia de modo particular. Realçar os diários como fontes históricas, significa dar importância a esses documentos que durante algum tempo fora desconsiderados pelos historiadores.
 Somente a partir de 1980, que as fontes ordinárias foram vistas como documentos valiosos para a compreensão de vidas cotidianas, repletas de gestos de amor, amizade, ressentimento, mas também marcadas pelos freios morais de determinada época. Essa reflexão potencializou as sensibilidades, que se fazem conhecer através da leitura da descrição de emoções, do registro das intimidades, dos acontecimentos corriqueiros que faziam parte das anotações diárias.
 
 O diário pessoal “é uma escritura essencialmente de dentro, onde os sentimentos, as sensações internas ocupam um grande lugar, uma escritura que rejeita uma organização formal, uma escritura essencialmente do registro do descontínuo, do efêmero”. Ele entra em cena, como fonte histórica por conterem registros de práticas sociais que expõem as formas de como os indivíduos em sociedade tratava seu dia a dia, naquele presente na escrita. Escritos a mão, os diários eternizam ideias, saberes, valores, acontecimentos e dizeres, além de fantasias, medos e experiências. São representações de outro tempo que dão sentido ao mundo social, criando outras realidades.
 
Rogério Fernandes – registra a importância de uma memória de papel, que serve como testemunho de uma era que evita seu esquecimento.
- No papel, diários e escritas de si.
 As pesquisas feitas com diários pessoais foram encontra-los em arquivos ou coleções particulares, deixados como herança. Trouxeram a visão do sujeito comum e ordinário que adquirem importância uma vez que as ações da experiência cotidiana são cada vez mais valorizadas.
Beatriz Sato traz à tona a valorização do indivíduo produziu um movimento de restauração da primazia desse sujeito “comum” não valorizado nos anos anteriores.
 Desde o final do século XVII e durante o século XVIII, procedimentos comuns da escritura pessoal ainda não havia uma “consciência do eu privado” nos moldes que conhecemos hoje. As escritas eram feitas por homens e eram produtos da escritura individual de personalidades públicas sobre a repercussão de seus atos, o brilho da própria glória ou sobre homens e fatos dos quais foram testemunhas privilegiadas. Confissões de Rousseau é um exemplo disso, que apresenta o pensamento do autor e entrelaçam vida e obra em forma de relato memorialista.
 Nesse seguimento, outras escrituras são os relatos de viagem, que eram obras feitas por estrangeiros que se deslocavam da Europa para o Novo Mundo coma finalidade de descrever espécies da flora e fauna. Também falavam sobre a vida cotidiana, os hábitos e os saberes das populações que visitavam.
 Somente no século XIX, os diários pessoais se estabeleceram como uma prática social e educativa adotada entre as “senhoritas” e ”mulheres” burguesas e aristocráticas que tinham acesso á alfabetização.
 Manuel Alberca: “há um conceito econômico burguês que inspira a escrita de diários. O livro de contas, onde se anotavam as cifras da economia familiar, era uma maneira de registrar por escrito as entradas e saídas das contas da vida”.
 Michelle Perrot: Os estudos evidenciaram que foram as mulheres as principais produtoras desses arquivos familiares, nos quais “preservavam os anais do lar, as correspondências familiares que deram origem ao diário íntimo cujo emprego é recomendado às jovens solteiras pelos confessores e, mais tarde, pelos pedagogos, como uma forma de controle sobre si.”.
 Pode-se afirmar que uma significativa produção de diários coincide com a ascensão política e social da burguesia e com o desenvolvimento da vida nas cidades, aliados aos progressos da alfabetização feminina a partir do século XIX. A casa burguesa, com seus espaços individualizados, criava um refúgio para a intimidade e estimulou a escritura do diário íntimo. A afirmativa pode ser respaldada quando se sabe que, as mulheres de classes populares ficavam excluídas, pois careciam de condições que lhes garantissem maior intimidade ou isolamento, além de terem pouco acesso à escolarização.
			Na tela, diários e escritas de si.
 As práticas da escrita diminuíram ao longo do século XIX até o final do século XX. Entretanto, o aumento de blogs pessoais (internet) é crescente. Os estudos de Zahidé Muzart registram a tendência de escrever como ato de exibicionismo. Escreve-se para se deixar ver. Muzart transcreve um trecho muito significativo encontrado em site. É uma análise desse gênero de escrita.
 Com o surgimento da internet, essa prática (diários) migrou para outras mídias. Assim, os links tornam possível o público. O que antes era privado, agora passa ser de conhecimento de todos, como mostra Luiza Lobo: “em lugar do contato direto, face a face, estamos diante da tele presença.”.
 Muda o suporte da escrita, mas permanecem as funções. Escrever um diário envolve funções terapêuticas (desabafar, contar os desassossegos da alma e do corpo), funções éticas (guardar a memória de momentos exemplares referentes à boa conduta) e funções estéticas (conservar o diário como ato de escrita, como expressão da cultura gráfica de seu tempo).
 Esses mecanismos instauram novas formas de sociabilidade e novos modos de escritas pessoais, registram a nossa época. Em vez de “escritas de dentro” – escritas no quarto, escondido – popularizam-se as “escritas de fora” – quando os diários se tornam públicos. Entretanto, permanece a construção de si, pela escrita de diários pessoais, embora de algum modo mais compatíveis com as demandas da sociedade contemporânea.
			 O historiador e os diários
 Esses materiais nos permitem analisar as formas de linguagens que transcendem o momento de sua produção e revelam as transformações históricas da escrita. 
 Se observarmos os diários como artefatos, podemos estudar os utensílios usados para escrever e a frequência de objeto-relíquia colocados em seu interior.
 Pensando nos diários como registros de vida, podemos investir na interpretação de seus conteúdos, problematizar o registro dessa memória, na qual o diário é ancorado, que impactam o diarista e fizeram parte da experiência da sua realidade.
 Roger Chartier aconselha o historiador a evitar cair numa dupla ilusão. As idealizações compõem as narrativas pessoais e, convém estar atento para o que Pierre Bourdieu chama de ilusão biográfica. O historiador deve submeter os diários a uma operação historiográfica: construir hipóteses que problematizam a fonte, cruzar dados dessa fonte com o de outras fontes provenientes de outros locais de produção, considerar o passado ali descrito uma representação do vivido.
		 O que se escreve e o que se guarda
 Papeis como cartas, diários, cadernos de receitas, cartões de felicitações e cartões postais, até então dentro de gavetas, armários e caixinhas, tornaram-se presentes nos territórios da história como vozes que clamam por visibilidade.
 Sua valorização coincidiu om a ascensão da história oral.
 Os diários eram geralmente, feitos em caderno o que nos faz crer que sua produção tinha início a partir da escola.
 O texto nos apresenta o diário de MRRH, que em meio aosexercícios escolares, surgem anotações do que era vivido. Em suas descrições, a frase “é bom registrar para o futuro”, nos remete ao salvaguardar do esquecimento, o preservar para não esquecer. Práticas dessa natureza foram identificadas por Philippe Altieres como arquivamento do eu.
 Guardar foi o verbo da MRRH, que conservou por anos seus diários e os doou para estudos. Os relatos de MRRH nos permite compreender aspectos gerenciais e de gêneros. Pode-se ter uma ideia do momento histórico e político vivido pelo país e não somente isso. Aspectos culturais também são de grande importância para o historiador.
 O relato de MRRH traz registros de datas comemorativas como o Natal e sua infinidade de objetos “modernos” como discos de vinil, pulseiras coloridas de relógio, maquiagem... Seu diário traz informações sobre músicas, shows, programas de televisão. Eles enaltecem a amizade, as relações afetivas e sociais.
 A descrição de acontecimentos simples e “miúdos” da vida diária, afetos, lazeres, modelos culturais que circulavam na época, a menção das leituras feitas, os relatos dos tempos da escola e de sonhos, quando lidos pelo pesquisador, parecem confirmar o que foi intuído pela diarista;” os historiadores podem aproveitar algo”.

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