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O Movimento Anarquista em Pelotas 1890 1930 Joao Daniel Dorneles Ramos Bpi

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Anais do II Seminário Nacional
Movimentos Sociais, Participação e Democracia
25 a 27 de abril de 2007, UFSC, Florianópolis, Brasil
Núcleo de Pesquisa em Movimentos Sociais - NPMS
ISSN 1982-4602
398
O MOVIMENTO ANARQUISTA EM PELOTAS (1890-1930)
João Daniel Dorneles Ramos
Professor Orientador: Dr. Paulo Albuquerque
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS
INSTITUTO DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA
CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
1. Introdução
Esta pesquisa faz parte do projeto de monografia sobre o Movimento Anarquista em
Pelotas, Rio Grande do Sul e tem como objetivo fazer um recorte histórico da chegada
do Anarquismo na cidade de Pelotas e trazer as contribuições d(a)os ativistas
libertário(a)s para o movimento operário pelotense no período de 1890 a 1930, bem
como para a sociedade de hoje.
Utilizo o conceito de movimento social para identificar um dado grupo organizado
que busca com uma intencionalidade explicita superar uma opressão e atua para
modificar uma dada realidade social (SCHERER-WARREN, 1987). Nesta perspectiva,
a pesquisa busca mostrar que na cidade de Pelotas o Movimento Anarquista, por sua
proposta tentou construir outras sociabilidades que vão muito mais além de uma
“ ráxis” política. Assim, se evidenciam os elementos de processo, a noção de que a
sociedade flui, a continuidade nas relações que existe entre os indivíduos e a conexão
orgânica entre esses e o grupo. Há também, o conceito de passado como história
coletiva e compartilhada.
Este elementos, pertinentes na perspectiva sociológica, abrem possibilidades de
compreensão e de uma outra leitura das ações do(a)s ativistas anarquistas.
2. Sobre a pesquisa
Neste trabalho, metodologicamente trabalhou-se na construção da informação com
pesquisas bibliográficas em dois níveis: Anarquismo e anarquistas a nível internacional
e sobre o movimento operário na cidade de Pelotas, no estado do Rio Grande do Sul e
no Brasil. Como se trata de parte de uma pesquisa mais ampla e que está no bojo de um
trabalho de conclusão de curso, foi utilizada como estratégia para construção e
modelagem das informações a busca de informações diretas, em andamento e que não
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estão ainda concluídas, como entrevistas com ativistas do Movimento Anarquista atual
em Pelotas e com possíveis descendentes de anarquistas da cidade (História Oral
Temática), além de fotos dos materiais e manifestações políticas e culturais do
movimento em Pelotas, consulta a documentos atuais, a possíveis locais onde houve
espaços de discussão e de atuação dos libertários na cidade, em diferentes épocas,
pesquisa em jornais e em outras publicações sobre o Movimento Anarquista e consultas
em arquivos de 1880 a 1930 e atuais da polícia da cidade e do estado do Rio Grande do
Sul.
3. O surgimento do Anarquismo
O Anarquismo em seu sentido mais amplo, significa literalmente “sem governo”, ou
ainda, sem autoridade, se configurou como movimento ativista, durante a Associação
Internacional dos Trabalhadores (AIT), na Europa, nos anos de 1864 a 1876 e foi a
principal força organizadora do movimento operário internacional (pois teve
repercussões aqui na América) naquele período. Durante as reuniões da Primeira
Internacional (AIT), o Anarquismo se aproximou dos movimentos de massa dos
trabalhadores. A essa época, o Anarquismo tinha como precursores os ativistas Pierre-
Joseph Proudhon, francês, os russos Mikail Bakunin e Piotr Kropotkin, e mais tarde, o
italiano Errico Malatesta. Nesse momento, a luta dentro da Internacional (AIT) se
polarizara entre: as posições de Karl Marx e os seus seguidores (denominados por
Bakunin e pelos anarquistas de autoritários), que sustentavam que a Internacional
deveria obedecer a uma direção central e unificada e, a posição de Bakunin e os seus
seguidores (que se denominaram como anti-autoritários) que insistiam na
descentralização da Internacional. Outro ponto discordante entre Marx e Bakunin era
com relação à questão do Estado, onde os marxistas defendiam (e defendem) a
conquista do poder estatal pelos trabalhadores, que estabeleceriam uma ditadura dita
transitória do proletariado e Bakunin e os anti-autoritários, entretanto, defendiam a
destruição imediata do Estado, pois acreditava que o governo ditatorial proposto por
Marx acabaria por criar uma aristocracia de funcionários do partido comunista, que tudo
fariam para se conservar no poder (BAKUNIN, 2001).
Essas discordâncias na Primeira Internacional (AIT), junto a outros aspectos, foram
forjando o pensamento libertário, que é centrado sobre os princípios de negação do
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Estado e da propriedade privada, crítica às religiões instituídas, buscas da igualdade e da
total liberdade entre as pessoas, entre outros. O Anarquismo entende a sociedade como
constituída de indivíduos autônomos e conscientes, que autogeririam esta sociedade.
Assim, os libertários acreditam na possibilidade de estabelecer uma sociedade baseada
em formas não-coercitivas de organização social e do trabalho, recomendando como
formas de resistência e atuação, a Ação Direta, ou seja, a participação direta dos
indivíduos nos movimentos reivindicatórios e a recusa da ação política nos aparelho
estatal ou em partidos. Nessa sociedade idealizada pelos anarquistas, cada indivíduo
deveria optar livremente por pertencer a uma associação e deveria participar
diretamente de greves e/ou manifestações, sem nenhuma intermediação e também,
deveria participar ativamente na manutenção desta sociedade, pela prática da
Autogestão.
As concepções, idéias e práticas anarquistas na Primeira Internacional, começaram a
ser experimentadas em formações e criações de associações, sindicatos, grupos e
organizações de trabalhador(e)as por toda a Europa, dando assim, uma grande atividade
revolucionária em países como a França, Espanha, Alemanha, Itália e Bélgica. Também,
a atividade propagandista anarquista do(a)s indivíduos e a conexão dess(e)as com os
primeiros grupos libertários, fez com que o povo se organizasse para lutar contra a
exploração e a primeira luta que se deu, sob “influência” anarquista foi em Paris,
França, no ano de 1871, no que ficou conhecido como “Comuna de Paris”.
4. O Anarquismo na prática – A Comuna de Paris, 1871 e a Revolução Russa
de 1917
De fato, o Anarquismo não ficou só em discussões dos congressos operários ou em
círculos de intelectuais, somente idealizando essa nova sociedade. Na prática, houve
várias tentativas de fundar essa nova sociedade. E, a primeira grande atuação anarquista
(já como movimento social) foi na Comuna de Paris, em 1871, onde havia
revolucionários de várias tendências: jacobinos de esquerda, blanquistas, proudhonianos
e bakuninistas (indivíduos que seguiam os ideais e as práticas anarquistas de Proudhon e
Bakunin) e também marxistas. A Comuna de Paris trouxera o proletariado ao poder, no
sentido de que uma classe social explorada desarmava e desapropriava as classes
dominantes, formava suas próprias milícias, declarava a sua própria autonomia e o que
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se via era um “Estado em processo de extinção” (VARES, 1988). Derrotados em dois
meses, mesmo assim, a Comuna trouxe ensinamentos aos operário(a)s, que eram
guiados no sentido bakuninista de revolução. Não que a Comuna fosse uma luta
somente anarquista, mas começou assim as grandes ações libertárias e a intensificação
da propaganda e da prática anarquista na Europa e, conseqüentemente, na América, com
a vindade muitos revolucionários fugidos da Europa após a Comuna, trazendo notícias
e idéias para a América.
A Revolução Russa de 1917 também teve grande participação anarquista. Os
soviets, que eram os conselhos, as assembléias do povo russo e que existiam desde a
primeira tentativa de revolução russa, em 1905, eram vistos pelos libertários russos da
época como uma democracia direta, a extinção do Estado, pois nasceram de uma greve
geral espontânea em São Petersburgo. Mesmo depois de outubro de 1917, os
anarquistas ainda defendiam os soviets, mas nesse sentido de democracia direta, e não
como aparelho de partidos. Naquele momento, a revolução foi conduzida à
centralização, ao fortalecimento da ditadura do proletariado e ao domínio do partido
único (bolcheviques e socialistas revolucionários se aliaram para conquistar e se
perpetuarem no poder). Em 1921, os anarquistas tentariam ainda restaurar o poder do
povo pelos soviets, na cidade de Kronstadt, mas foram massacrados pelo comandante
das tropas bolcheviques, Leon Trotsky. O povo de Kronstadt reivindicava o fim do
domínio do Partido Comunista e a revitalização dos conselhos do povo, os soviets.
Nesse processo revolucionário russo de 1917, havia na Ucrânia um grupo de
camponeses anarquistas, entre eles, Nestor Makhno, que lutavam pela revolução através
de guerrilhas, colocando em prática a orientação anarquista-comunista, coletivizando as
terras e formando soviets camponeses. Após 1917, onde esses camponeses anarquistas
foram os principais defensores da revolução, nas fronteiras da Ucrânia, pois
acreditavam na luta do povo pela transformação da sociedade, por volta de 1920, os
bolcheviques exigiram submissão completa desses anarquistas da Ucrânia e, como esses
recusaram, houve então o início da perseguição e repressão aos anarquistas em toda a
Rússia. Isso desencadeou uma luta entre o Exército Vermelho de Trotsky e os
anarquistas, onde os bolcheviques saíram vitoriosos, acabando com o comunismo
libertário russo. Mais tarde, Nestor Makhno e alguns camponeses anarquistas
ucranianos, que conseguiram sair com vida, e diga-se, em precárias condições de vida
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da já União Soviética, formaram o que hoje é conhecido como “especifismo anarquista”
(Plataforma Organizacional), ou seja, para os seguidores desse especifismo, dessa
Plataforma, os grupos e/ou federações anarquistas, bem como os indivíduos, devem
obedecer um linha forte, com disciplina, formando assim, militantes.
4.1 A Guerra Civil Espanhola – 1936-1939
A maior participação e luta libertária foi, sem dúvida, na Guerra Civil Espanhola de
1936-1939.
Na Espanha, após a vitória eleitoral da Frente Popular, composta por republicanos,
socialistas, comunistas e até, alguns anarquistas, houve um pronunciamento dos
militares, liderados pelo general Francisco Franco, desencadeando daí, uma Revolução
Social na Espanha, pois a CNT, Confederação Nacional dos Trabalhadores, de
tendência Anarco-Sindicalista e a FAI, Federação Anarquista Ibérica, mobilizavam
milhões de adeptos em toda a Espanha e armaram, assim, as massas trabalhadoras,
ocupando fábricas e desapropriando terras dos latifundiários, coletivizando-as e
formando a resistência a esse pronunciamento.
Na Espanha, a Educação Libertária já havia sido colocada em prática por Francisco
Ferrer y Guardia, e outro(a)s anarquistas nos anos de 1905-1909, ano de fuzilamento de
Ferrer. O(a)s anarquistas não eram apenas intelectuais e sim, operári(a)os e
camponese(a)s que agiam cotidianamente na luta pela criação de uma nova sociedade.
Devido a problemas de pressão interna dos partidos que formavam a Frente Popular,
devido também a problemas de resistência dos anarquistas e do POUM, Partido
Operário de União Marxista, que era o partido que lutava nas milícias, aliados aos
anarquistas no front e devido a intervenções da Alemanha de Hitler e da Itália de
Mussolini, a favor do golpe de Franco e dos fascistas espanhóis, a revolução
autogestionária espanhola estagnou, privilegiando-se assim, a guerra das milícias
libertárias contra o fascismo, perdendo um pouco o sentido de construção de uma nova
sociedade, ou seja, houve a partir daí, somente a luta contra a ofensiva fascista. A partir
de 1937, começa então o declínio da revolução e a intensificação das forças fascistas
sobre a Espanha libertária.
Estava sendo colocada, na prática, a construção de uma nova sociedade que,
infelizmente, não se concretizou. Mas, neste sentido, hoje e no decorrer da história,
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ainda está “vigente” esse processo de luta anarquista, essa prática libertária que percebo
como exemplo de transformação da sociedade e de formação de outras “sociabilidades”,
não autoritárias, para o(a)s indivíduos do Movimento Anarquista em Pelotas. A busca e
a resistência anarquista ainda está presente e a tentativa desse movimento de recrear
outro mundo é pertinente. Entendo, assim, que esses exemplos históricos são para expor
algumas das grandes tentativas de criar outra sociedade, mas que estão presentes no
ideário do Movimento Anarquista atual, seja pelos exemplos de luta libertários desses
processos históricos, seja pelo fato de no próprio anarquismo, estar incluído essa luta e
resistência às “coisas já postas” e intensificar a luta pela transformação da sociedade
exploradora.
5. As principais correntes de ação anarquistas
Os exemplos acima vêm demonstrar que o Movimento Anarquista é, além de outras
coisas, a Ação Direta e constante de indivíduos, grupos, comunas, centros de estudo,
uniões, federações e outras formas autônomas de organização, que resiste e se opõe à
sociedade opressora, se apresentando como adversário de toda e qualquer forma de
governo, buscando construir uma nova sociedade, descentralizada e autogestionária.
Assim, há no Movimento Anarquista, duas principais correntes de ação e mobilização, a
corrente Anarco-Comunista ou Comunismo Libertário e a corrente Anarco-Sindicalista
ou Sindicalismo Revolucionário. As duas divergem quanto à maneira de organizar os
trabalhadores e a futura sociedade anárquica, ou seja, em comunas livres ou em
sindicatos de produtores. As duas correntes foram as correntes articuladoras do
movimento operário no Brasil de 1906 a 1928, aproximadamente. O Sindicalismo
Revolucionário foi a corrente mais seguida por operári(a)os do Brasil. Essas duas
correntes foram as principais e não as únicas, ou seja, elas não excluem as outras
correntes e foram as principais naqueles períodos históricos, sendo hoje quase como
“denominações” e não mais existem “correntes” no Movimento Anarquista, o que existe
são grupos que incluem diversas correntes ou formas de ação libertárias. Assim, não há
uma só “corrente” organizadora no Movimento Anarquista em Pelotas hoje e sim,
diversa(o)s indivíduos com práticas e idéias libertárias diferentes como Anarco-
Feministas, Punxs, Comunistas Libertários... preocupado(a)s com questões ambientais,
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com a luta pela terra, em outros movimentos como o estudantil e estão na luta contra
toda e qualquer forma de poder em diferentes “esferas” de convivência social.
6. O Anarquismo no Brasil – breve história...
No Brasil, o Anarquismo surge com a vinda dos imigrantes que formavam
comunidades libertárias, como no caso da Colônia Cecília, de anarquistas italianos,
instalada no interior do Paraná, em 1890 e de outras experiências libertárias dos
imigrantes. Além desse fato, notíciasdos atos anarquistas e revolucionários do(a)s
operário(a)s da Europa chegavam ao Brasil por viajantes e pessoas que iam para a
Europa e traziam literatura e jornais revolucionários para o Brasil. O(A)s imigrantes
também traziam muitas vezes, esses jornais e notícias d(o)as anarquistas de seus locais
de origem e divulgavam o Anarquismo no Brasil, onde começava a industrialização.
Segundo o historiador autodidata anarquista, Edgar Rodrigues, o Brasil já era um
local fértil a ideais revolucionários pelo fato da escravidão, por exemplo, onde vemos a
resistência negra e as formas organizatórias dos escravos que fugiam para os quilombos,
além de atos de revolta e de sabotagem dos escravos contra os seus senhores, mostrando
que havia resistência ao sistema escravocrata.
No início do século XX, ou seja, no começo da industrialização no Brasil, o
Anarquismo teve grande influência no Movimento Operário brasileiro, com a criação de
sindicatos, a realização do Primeiro Congresso Operário Brasileiro, em 1906, no Rio de
Janeiro e com a forte organização dos operários até 1930, ano do golpe getulista, que
atrelou os sindicatos ao Estado, perseguindo os anarquistas e comunistas. Após esse
golpe, ainda houve muita resistência por parte dos anarquistas, que não se entregaram,
apesar de alguns anarquistas terem aderido, em 1922, ao recém criado Partido
Comunista Brasileiro.
6.1 O Anarquismo no Rio Grande do Sul
No Rio Grande do Sul, o Anarquismo tem suas origens ligadas à Colônia Cecília,
recebendo pessoas desta comunidade libertária, quando essa se extinguiu, em 1893. Há
também indícios de anarquistas que viam de outras comunidades também do interior de
Santa Catarina, como no caso de Kniestedt (anarquista alemão que citarei logo mais), ou
também de imigrantes que formaram comunidades libertárias no Rio Grande do Sul,
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como a comunidade de anarquistas ucranianos em Erebango, norte do estado. Também,
nos jornais da época, aparecem notas sobre o desembarque de imigrantes propagandistas
anarquistas nas cidades de Rio Grande, Porto Alegre e Pelotas, cidade onde é efetuada a
pesquisa.
6.2 O Movimento Anarquista em Pelotas – 1890-1930
A bibliografia consultada mostra que o primeiro anarquista a chegar a Pelotas teria
sido o sapateiro italiano de nome José Saul, em 1897, que seria, talvez, um
remanescente da Colônia Cecília. Devido às más condições de vida deste anarquista e às
perseguições por parte dos poderosos, José Saul teve que deixar a cidade onde era tido
como louco.
O fato é que José Saul representou uma ameaça à burguesia pelotense da época. Do
trabalho deste anarquista expulso de Pelotas, por reação dos conservadores e das
autoridades, teve origem na cidade o núcleo anarquista. Nos jornais da grande imprensa,
nada consta sobre a presença de José Saul, mas na bibliografia consultada,
especialmente em Edgar Rodrigues e no periódico anarquista “A VIDA”, do Rio de
Janeiro, dos anos de 1914-1915, se tem relatos deste libertário em Pelotas e de sua
atuação na fundação da Liga Operária Pelotense, tendo realizado algumas palestras.
Os jornais da grande imprensa em Pelotas, como o Diário Popular, se referiam na
época ao Anarquismo apenas como atentado à bomba na Europa ou sobre as greves
operárias que para o jornal “desolavam” a Europa. O que, de fato, não se mudou essa
concepção do referido jornal ainda hoje. Ainda nesse mesmo jornal, de 1902, consta a
prisão de três italianos anarquistas, que teriam sido expulsos para a Argentina, para
após, serem deportados para a Itália. O jornal afirma que os três homens, um alfaiate,
um pintor e um vendedor de azeite confirmaram serem anarquistas e partiram dizendo
que eles iam embora, mas suas idéias ficariam em Pelotas.
Em 1913, influenciados pela Confederação Operária do Brasil, de tendência Anarco-
Sindicalista e por literaturas anarquistas, os operários pelotenses retiraram da Liga
Operária o programa recreativo que ela mantinha e retomaram o caráter reivindicativo
desta. Assim, os anarquistas começaram a se organizar como grupo. O Anarquismo,
baseado não só na organização de operários e sim de indivíduos que se opõem e dão
combate ao Capitalismo e ao Estado, numa prática autônoma e libertária, começa a
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crescer na cidade de Pelotas. Em 1914, os anarquistas criam o Grupo Iconoclasta, que
era uma espécie de centro de estudos e também conquistam a direção da Liga Operária
Pelotense até 1933, quando essa foi extinta pela ditadura getulista.
Em termos de manifestações culturais, o auge do Movimento Anarquista em Pelotas
ocorreu nos anos de 1914 e 1915, onde houve atividades de um grupo teatral, o Grupo
Teatral Cultura Social, fundado em 1914 e reorganizado em 1918, atividades de uma
banda musical (Grupo Musical 18 de Março, uma homenagem a Comuna de Paris), em
1914 e a Banda Musical 11 de Novembro, de 1916. Também existiu o Grupo Feminino
de Estudos Sociais, de 1915 a 1916, de jovens (Grupo Juventude Anti-Militarista, em
1915) e o Centro de Estudos Sociais, de 1914. Houve também uma escola para crianças
(Escola Primária), em 1914 e o Atheneu Operário, além de um jornal em 1915, o “A
Terra Livre”, da Federação Operária e outro em 1916, o “A Luta”, do Grupo Iconoclasta
(LONER, 2001).
Já em 1917, trabalhou em Pelotas, Friedrich Kniestedt, imigrante anarquista alemão,
na fábrica de escovas Wirth. O imigrante relata nos jornais “Aktion” (Ação) e “Der
Freie Arbeiter” (O Trabalhador Livre), ambos de Porto Alegre, que, assim que chegou a
cidade de Pelotas, os trabalhadores declararam-se em greve. Primeiro só os da
construção civil, depois os da indústria madeireira e, uma semana depois, quase todos
os trabalhadores haviam aderido a greve. Descrevendo a “grande greve de 1917”, afirma
que a sede da Liga Operária foi atacada pela polícia, no momento de uma reunião, que
atirou para dentro do salão, matando um operário. Essa reunião só pode recomeçar e ter
andamento, quando o exército da época permitiu que esses operários continuassem,
deslocando a polícia da cidade. A greve durou três semanas, com vitória parcial dos
operários. Kniestedt permaneceu quatro meses em Pelotas, transferindo-se assim, para
Porto Alegre, onde permaneceu lutando no movimento social anarquista até o fim da
vida, aos 74 anos, mantendo-se um anarquista convicto de seus ideais (GERTZ, 1989).
Sobre a atuação feminina no Movimento Anarquista em Pelotas, encontrou-se na
bibliografia consultada, descrição de uma anarquista, do Centro Feminino de Estudos
Sociais, de nome Eliza de Carvalho, que teria participado do Congresso Internacional da
Paz, no Rio de Janeiro, de 14 a 16 de outubro de 1915. Outra anarquista, Catalice Silva,
participava do teatro anarquista, de assembléias e congressos, sempre defendendo a
igualdade homem-mulher (PRADO, 1987).
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Essas informações trazem à tona que, o auge do Movimento Operário em Pelotas se
deu sob a hegemonia d(a)os anarquistas, pois a maior atividade anarquista ocorreu de
1911 à 1925, época em que marcaram a vida política e social da cidade, com sua
organização e sua cultura, através de artigos de jornais, publicações, peças teatrais e
fundação de sindicatos, escolas e grupos de estudos e também na grande atuação na
greve de 1917. Já a prática anarquista promove, na maioria das vezes, um
comportamento ascético dos ativistas, como o incentivo à alimentação vegetariana, a
repulsa ao álcool e ao fumo,a recusa em falar em religião, entre outros aspectos,
condenando toda essa sociedade baseada no autoritarismo, na opressão e no
consumismo. Essa prática libertária também será analisada, tentando encontrar esses
aspectos atualmente no Movimento Anarquista em Pelotas.
7.Considerações Finais
É interessante ressaltar que Pelotas, no início do século XX, pode ser considerada
uma cidade tradicional e conservadora e, por isso, jamais poderia ser pensada como
lugar favorável ao aparecimento do Anarquismo, que busca justamente o oposto desta
sociedade vigente, busca assim a criação de uma “nova ordem social”, baseada na
liberdade, onde a produção, o consumo e a educação devem satisfazer as necessidades
de cada um e de todos.
O “recorte” histórico deste período e desta práxis política é importante porque os
instrumentos de luta adotados pelos libertários- a greve geral ou parcial, o boicote, a
sabotagem, a manifestação pública, seja individual ou coletiva, etc- fundam-se sempre
na Ação Direta, onde o indivíduo mesmo dirige o conflito, evidenciando que, o
Anarquismo prega que as pessoas e as comunidades não confiem a outrem uma tarefa
que lhes pertence, ou seja, a total autonomia dos indivíduos.
A pertinência deste estudo está no fato de encontrarmos várias das idéias anarquistas
presentes ainda hoje, seja nas experiências autogestionárias e cooperativas, sejam no
movimento ecológico, feminista, pacifista, nas práticas educacionais alternativas e
também em outras manifestações autônomas e populares.
A atuação do(a)s anarquistas em Pelotas no início do século XX, a Ação Direta
daquele(a)s libertário(a)s na cidade, permitiu a construção de entidades e organizações
de classe e de grupos que tinham projetos para criar uma nova sociedade, fazendo o
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contraponto à sociedade burguesa. Atualmente, a(o)s anarquistas se organizam e lutam,
buscando essa transformação da sociedade. O Movimento Anarquista é uma práxis e um
projeto social, propondo que as comunidades e os indivíduos valorizem a auto-
organização, o apoio mútuo, a solidariedade, a liberdade e a igualdade nas relações
sociais e que recusem as formas centralizadoras e autoritárias de organização social.
8.Bibliografia
BAKUNIN, Mikaihl. Escritos contra Marx. São Paulo, Editora Imaginário, 2001.
CARONE, Edgard. Movimento Operário no Brasil (1877-1944).
CUBERO, Jaime et alli. El Sindicalismo Revolucionario en el Brasil. São Paulo,
Editora Acadêmica, 1988.
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