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ANTROPOLOGIA CULTURAL 2 ANTROPOLOGIA CULTURAL Prof. Gilmar Vargas M. Lima www.theologiaonline.org.br gilmarvargas@gmail.com ANTROPOLOGIA CULTURAL 3 CONTEÚDO CAPÍTULO 01 ................................................................................................................................ 6 INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS ANTROPOLÓGICOS .............................................................. 6 A. INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 6 B. ANTROPOLOGIA ..................................................................................................................... 6 C. A ORIGEM DA ANTROPOLOGIA ........................................................................................... 6 D. AS CIÊNCIAS SOCIAIS ........................................................................................................... 7 CAPÍTULO 02 .............................................................................................................................. 10 SUBDIVISÕES DA ANTROPOLOGIA ...................................................................................... 10 A. INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 10 B. CAMPOS DA ANTROPOLOGIA CULTURAL ........................................................................ 11 C. ÁREAS DA ETNOLOGIA ....................................................................................................... 12 INTRODUÇÃO À ANTROPOLOGIA CULTURAL ..................................................................... 14 A. ANTROPOLOGIA CULTURAL............................................................................................... 14 B. O FOCO DE ANÁLISE DA ANTROPOLOGIA CULTURAL – O HOMEM ............................. 14 C. O HOMEM .............................................................................................................................. 15 CAPÍTULO 03 .............................................................................................................................. 21 CULTURA ................................................................................................................................ 21 A. INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 21 B. AS ESPECIFICIDADES DA CULTURA ................................................................................. 21 C. DEFINIÇÕES DE CULTURA ................................................................................................. 22 D. O HOMEM E A CULTURA ..................................................................................................... 25 CAPÍTULO 04 .............................................................................................................................. 28 SENTIDOS DA CULTURA ....................................................................................................... 28 A. SENTIDOS DE CULTURA ..................................................................................................... 28 B. ACULTURAÇÃO .................................................................................................................... 29 C. MODALIDADES DE ACULTURAÇÃO ................................................................................... 30 CAPÍTULO 05 .............................................................................................................................. 32 O OBJETO DA ANTROPOLOGIA CULTURAL ........................................................................ 32 A. OBJETO DA ANTROPOLOGIA CULTURAL ......................................................................... 32 B. ANTROPOLOGIA DA RELIGIÃO........................................................................................... 32 C. A ETNOTEOLOGIA ................................................................................................................ 32 ANTROPOLOGIA CULTURAL 4 D. A ANTROPOLOGIA CULTURAL DA BÍBLIA ......................................................................... 33 E. COSMOVISÃO E CONTEXTUALIZAÇÃO ............................................................................. 33 F. COMPREENDER A COSMOVISÃO DE UM POVO .............................................................. 34 G. COMUNICAÇÃO TRANSCULTURAL .................................................................................... 35 CAPÍTULO 06 .............................................................................................................................. 36 PRINCIPAIS ACEPÇOES DO TERMO “CULTURA” ................................................................ 36 A. INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 36 B. CLASSIFICAÇÃO DE CULTURA .......................................................................................... 37 C. ABSORÇÃO DE UMA CULTURA .......................................................................................... 38 D. RAÇA ...................................................................................................................................... 38 E. ETNIA ..................................................................................................................................... 39 F. RELATIVISMO CULTURAL ................................................................................................... 39 G. ETNOCENTRISMO ................................................................................................................ 39 H. SINCRETISMO ...................................................................................................................... 40 CAPÍTULO 07 .............................................................................................................................. 42 MITO: ELEMENTO DA CULTURA ........................................................................................... 42 A. O MITO ................................................................................................................................... 42 B. FOLCLORE ............................................................................................................................ 43 C. PSICOLOGIA SOCIAL ........................................................................................................... 45 D. O POPULAR E SUA CULTURA............................................................................................. 47 CAPÍTULO 08 .............................................................................................................................. 49 MITOS E TEORIAS DA CRIAÇÃO ........................................................................................... 49 A. A NARRATIVA MITOLÓGICA ................................................................................................ 49 B. MODELOS DE MITOS COSMOGÔNICOS ........................................................................... 50 C. A TEORIA DO BIG BANG ...................................................................................................... 55 CAPÍTULO 09 .............................................................................................................................. 62 A BÍBLIA E A CRIAÇÃO ........................................................................................................... 62 A. COMO A CRIAÇÃO BÍBLICA É CONSIDERADA?................................................................ 62 B. A TEORIA GEOLÓGICA DA CRIAÇÃO (TGC) ..................................................................... 63 C. A TEORIA DA LACUNA .........................................................................................................64 D. EXPOSIÇÃO BÍBLICA DA CRIAÇÃO .................................................................................... 65 CAPÍTULO 10 .............................................................................................................................. 71 TEORIAS DA ORIGEM DO HOMEM........................................................................................ 71 A. A TEORIA DA EVOLUÇÃO .................................................................................................... 71 B. TEORIAS CRIACIONISTAS................................................................................................... 83 ANTROPOLOGIA CULTURAL 5 CAPÍTULO 11 .............................................................................................................................. 91 A CONSTITUIÇÃO DO HOMEM .............................................................................................. 91 A. A DESCRIÇÃO BÍBLICA ........................................................................................................ 91 B. A DOUTRINA DA NATUREZA DO HOMEM ......................................................................... 92 C. A METAFÍSICA DA CRIAÇÃO DO HOMEM .......................................................................... 97 D. FUNÇÕES RESPECTIVAS DO CORPO, ALMA E ESPÍRITO .............................................. 99 CAPÍTULO 12 ............................................................................................................................ 110 A QUEDA DO HOMEM .......................................................................................................... 110 A. A OCORRENCIA DA QUEDA .............................................................................................. 110 B. ESPÍRITO, ALMA E CORPO APÓS A QUEDA ................................................................... 116 CAPÍTULO 13 ............................................................................................................................ 121 O HOMEM SOB TRÊS ASPECTOS ....................................................................................... 121 A. O HOMEM NATURAL .......................................................................................................... 121 B. O HOMEM ESPIRITUAL – 1CO 2.15 .................................................................................. 122 C. O HOMEM CARNAL ............................................................................................................ 123 CAPÍTULO 14 ............................................................................................................................ 125 A ORIGEM DA ALMA E DO ESPÍRITO DO HOMEM ............................................................. 125 A. INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 125 B. TEORIA DO PREEXISTENCIALISMO ................................................................................ 127 C. TEORIA DO CRIACIONISMO .............................................................................................. 130 D. TEORIA TRADUCIONISTA .................................................................................................. 132 E. CONCLUSÃO ....................................................................................................................... 134 BIBLIOGRAFIA .......................................................................................................................... 136 ANTROPOLOGIA CULTURAL 6 CAPÍTULO 01 INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS ANTROPOLÓGICOS A. INTRODUÇÃO Por mais isoladas que tenham vivido, as diferentes sociedades humanas sempre souberam (salvo raríssimas exceções) que além de suas fronteiras haviam "outros homens", homens que viviam de formas diversas. Cuja pele era talvez de outra cor, que não adoravam os mesmos deuses, que pensavam de outra maneira. A curiosidade de conhecer esses homens e povos "diferentes" motivou o nascimento da antropologia, que atualmente não estuda apenas "os outros", mas todos os seres humanos. A Antropologia analisa as características biológicas, culturais e sociais dos seres humanos. Por ser um estudo muito complexo será privilegiado, nesse curso, o aspecto cultural com viés, quando se fizer pertinente, bíblico. Entre as muitas ciências que têm por objeto o ser humano, a antropologia ("ciência do homem", segundo a etimologia) o estuda do ponto de vista das características biológicas e culturais dos diversos grupos em que se distribui o gênero humano, pesquisando com especial interesse exatamente as diferenças. B. ANTROPOLOGIA A palavra Antropologia deriva do grego άνθρωπος – anthropos, (homem / pessoa) e λόγος (logos – razão / pensamento). C. A ORIGEM DA ANTROPOLOGIA O nascimento da antropologia como ciência ocorreu a partir dos grandes descobrimentos realizados por navegadores e viajantes europeus. A curiosidade de conhecer povos exóticos, de saber como viviam e pensavam homens de culturas tão distantes da europeia, de descobrir que aspecto físico e que costumes tinham, levou ANTROPOLOGIA CULTURAL 7 à classificação e ao estudo dos dados recolhidos in loco (isto é, no lugar de origem) por exploradores, comerciantes e missionários chegados àquelas terras longínquas. Os primeiros antropólogos tinham como característica comum a distância do objeto de seu estudo, o qual consistia sempre em homens pertencentes a culturas distintas da europeia e dela geograficamente afastadas. A moderna antropologia, no entanto, estende sua pesquisa às sociedades industriais e até mesmo às grandes concentrações urbanas. Mas seus instrumentos de trabalho se foram aos poucos delineando justamente no estudo das sociedades "primitivas" mais simples e, com um processo de mudança menos vertiginoso que o das sociedades modernas. Com frequência, os antropólogos do século XIX relacionavam as características biológicas dos povos com suas formas culturais. Mais tarde, estabeleceu-se que os traços biológicos e os culturais tinham menos ligação entre si do que se acreditara. Isso levou a uma primeira subdivisão das ciências antropológicas em antropologia física e antropologia cultural, esta última comumente assimilada ao conceito de etnologia. Desde a segunda metade do século XIX a antropologia cultural começou a ser considerada uma ciência humana, com as limitações e ambiguidades próprias dessa categoria científica, enquanto a antropologia física continuou desenvolvendo seus métodos de trabalho, medição e estabelecimento de correlações entre as medidas encontradas como uma ciência natural. Hoje os dois campos estão totalmente diferenciados e poucos são os pesquisadores que trabalham ao mesmo tempo em ambos. D. AS CIÊNCIAS SOCIAIS É o estudo das origens, do desenvolvimento e da organização das sociedades e culturas atuais. O cientista social estuda os fenômenos, as estruturas e as relações que caracterizam as organizações sociais, culturais, econômicas e políticas. Esse pesquisador analisa os movimentos e os conflitos sociais, a construção das identidades e a formação das opiniões. Pesquisa costumes e hábitos e investiga as relações entre indivíduos, famílias, grupos e instituições. Desenvolve e utiliza um conjunto variado de técnicas e métodos de pesquisa para o estudo das coletividades humanas e interpreta os problemas da sociedade, da política e da cultura. As Ciências Sociais são multidisciplinares mas, na sua concepção ela pode ser ANTROPOLOGIA CULTURAL 8 subdividida em: Sociologia; Ciências Políticas; e Antropologia. 1. SOCIOLOGIA A sociologia é a parte das ciências humanas que estuda o comportamento humano em função do meio e os processos que interligam os indivíduos em associações, grupos e instituições. Enquantoo indivíduo na sua singularidade é estudado pela psicologia, a sociologia tem uma base teórico-metodológica voltada para o estudo dos fenômenos sociais, tentando explicá-los e analisando os seres humanos em suas relações de interdependência. Compreender as diferentes sociedades e culturas é um dos objetivos da sociologia. A sociologia, por sua vez, pode até certo ponto ser considerada uma "irmã gêmea" da antropologia. Em princípio, o que distingue as duas ciências é o objeto de seu interesse: enquanto o sociólogo se dedica ao estudo das sociedades modernas, o antropólogo comumente pesquisa as sociedades primitivas, embora o estudo das sociedades coloniais e de seu rápido processo de aculturação e modernização social tenha desenvolvido um campo intermediário, no qual fica difícil estabelecer os limites entre o trabalho sociológico e o trabalho antropológico. Nesse terreno intermediário surgiu a chamada antropologia social. 2. POLÍTICA Ciência Política é o estudo da política, das estruturas e dos processos de governo. O estudo da política surgiu na Grécia Antiga, quando Aristóteles se dedicou a compreender e a definir as diferentes formas de governo. Desde então, a política entrou em pauta e recebeu grande atenção de governantes e das respectivas CIÊNCIAS SOCIAIS SOCIOLOGIA POLÍTICA ANTROPOLOGIA ANTROPOLOGIA CULTURAL 9 sociedades, pois a política está presente em toda relação humana. Destacá-las fez com que ganhasse especial atenção para análises. Mas, embora a atenção tenha sido reforçada sobre a política, a Ciência Política propriamente dita só se constituiu muito mais tarde. Ela reuniu filosofia moral, filosofia política, política econômica e história, por exemplo, para compor análises sobre o Estado, sobre o governo e suas funções. A Ciência Política surgiu no decorrer do século XIX, reconhecido por ser o século de surgimento das Ciências Humanas, como Sociologia, Antropologia e História. Surgiria nessa época algo diferente da Filosofia Política praticada pelos gregos antigos. Ao constituir família, todo ser humano contrai para si um conjunto de normas que abrangem direitos e deveres neste tipo de estrutura social, que acabam definindo um comportamento padrão deste indivíduo na organização inserida, a qual neste caso podemos denominar de política familiar. E assim, todos os tipos de estruturas sociais são definidos por esse conjunto de normas, as quais nem sempre serão rígidas, podendo assim serem flexíveis, mas mantendo a estrutura básica a qual define o tipo daquela organização. 3. ANTROPOLOGIA A Antropologia está subdividida em Antropologia Física ou Biológica, Antropologia Social e Antropologia Cultural (ou Etnológica). Antropologia Cultural é objeto do nosso estudo. ANTROPOLOGIA CULTURAL 10 CAPÍTULO 02 SUBDIVISÕES DA ANTROPOLOGIA A. INTRODUÇÃO A divisão clássica da Antropologia distingue a Antropologia Física ou Biológica da Antropologia Social e Antropologia Cultural. Cada uma destas, em sua construção, abrigou diversas correntes de pensamento. Estudar o ser humano e a diversidade cultural, envolve a integração de diversas disciplinas que procuram refletir sobre as dimensões biológicas, sociais e culturais, sendo as principais áreas: 1. ANTROPOLOGIA FÍSICA Estuda os aspectos genéticos e biológicos do homem. A antropologia física, por vezes chamada "antropologia biológica" estuda os mecanismos de evolução biológica, herança genética, adaptabilidade e variabilidade humana, primatologia e o registo fóssil da evolução humana. Alguns dos ramos primitivos da antropologia física, tais como a antropometria primitiva, são agora classificados como pseudociências. Medidas como o índice cefálico eram utilizadas para extrapolar características comportamentais, atualmente são obsoletas ou apenas com limitada aplicação na antropologia forense como auxiliar na tarefa de reconstituir identidades (sexo, idade, raça e ANTROPOLOGIA GERAL ANTROPOLOGIA FÍSICA ANTROPOLOGIA CULTURAL ANTROPOLOGIA CULTURAL 11 mesmo faces), identificar causas e circunstâncias de óbito a partir dos restos mortais encontrados. 2. ANTROPOLOGIA CULTURAL Investiga as culturas no tempo e espaço, envolvendo os costumes, mitos, valores, crenças, rituais, religião, língua. B. CAMPOS DA ANTROPOLOGIA CULTURAL 1. LINGUÍSTICA A linguística é de grande importância para a antropologia, não só porque o conhecimento do idioma se faz necessário ao antropólogo nas pesquisas de campo (feitas no local de origem), mas também porque muitos conceitos elaborados pelos linguistas são fundamentais para a análise de determinados aspectos das sociedades; por exemplo, a concepção da sociedade como uma rede de comunicação, a análise estrutural, ou a forma em que se organiza a experiência vital do sujeito de uma comunidade em estudo. 2. ARQUEOLOGIA A arqueologia é necessária para conhecer o passado das sociedades, e pode esclarecer em grande escala seu presente. A terminologia arqueológica é anterior à da antropologia; E proporcionou a esta última muitos vocábulos úteis, por outro ANTROPOLOGIA CULTURAL LINGUÍSTICA ARQUEOLOGIA ETNOLOGIA ETNOGRAFIA ANTROPOLOGIA SOCIAL ANTROPOLOGIA CULTURAL 12 lado, a própria antropologia é útil à arqueologia, na medida em que estuda ao vivo sociedades muitas vezes semelhantes. Por exemplo, no desconhecimento dos metais a outras já desaparecidas, sobre as quais pode lançar abundante luz. 3. ETNOLOGIA A etnologia é o "estudo ou ciência que estuda os fatos e documentos levantados pela etnografia no âmbito da antropologia cultural e social, buscando uma apreciação analítica e comparativa das culturas." Em sua acepção original, era o estudo das sociedades primitivas, todavia, com o desenvolvimento da Antropologia, o termo primitivo foi abandonado por se acreditar que exaltaria o preconceito étnico. Assim, atualmente se diz que etnologia é o estudo das características de qualquer etnia, isto é, agrupamento humano - povo ou grupo social - que apresenta alguma estrutura socioeconômica identificável, onde em geral os membros têm interações cara a cara, e há uma comunhão de cultura e de língua. Este estudo visa estabelecer linhas gerais e de desenvolvimento das sociedades. C. ÁREAS DA ETNOLOGIA 1. ETNOGRAFIA Etnografia é o estudo descritivo da cultura dos povos, sua língua, raça, religião, hábitos etc., como também das manifestações materiais de suas atividades. É a ciência das etnias. Do grego ethos (cultura) + graphe (escrita). A etnografia estuda e revela os costumes, as crenças e as tradições de uma sociedade, que são transmitidas de geração em geração e que permitem a continuidade de uma determinada cultura ou de um sistema social. ETNOLOGIA ETNOGRAFIA ANTROPOLOGIA SOCIAL ANTROPOLOGIA CULTURAL 13 Etnografia é inerente a qualquer aspecto da Antropologia Cultural, que estuda os processos da interação social: os conhecimentos, as ideias, técnicas, habilidades, normas de comportamento e hábitos adquiridos na vida social de um povo. A Etnografia é também parte ou disciplina integrante da etnologia, que se ocupa com o estudo descritivo, classificatório e comparativo da cultura material, ou seja, dos artefatos encontrados nas diversas sociedades. A pesquisa etnográfica tem bases antropológicas ou etnográficas, baseia-se na observação e levantamento de hipóteses, onde o etnólogo procura descrever o que, na sua visão, ou seja, na sua interpretação, está ocorrendo no contexto pesquisado. Uma das características da Etnografia é a presença física do pesquisador e a observação in loco. 2. ANTROPOLOGIA SOCIAL Analisa o comportamento do homem em sociedade, a organização social e política, as relações sociais e instituições sociais. A Antropologia Social tem como embasamento o estudo das relaçõese dos sistemas sociais que são próprios das diversas sociedades humanas. Esta classe de investigação se ocupa de comparar sistemas sociais no tempo e no espaço com a finalidade de verificar sua estrutura e os caracteres que distinguem cada forma de comportamento. Neste sentido, um dos fins principais da Antropologia Social é saber por que e como os homens se comportam de modo diferente segundo as sociedades em que vivem. ANTROPOLOGIA CULTURAL 14 CAPÍTULO 03 INTRODUÇÃO À ANTROPOLOGIA CULTURAL A. ANTROPOLOGIA CULTURAL A Antropologia Cultural é o estudo do comportamento do ser humano, das crenças religiosas e dos sistemas simbólicos. Podemos definir a Antropologia Cultural como uma possibilidade de compreendermos quem somos por intermédio da observação atenta do comportamento do outro. O outro deixa de ser visto como um indivíduo ameaçador que não tem nada para acrescentar, ou seja, o “alien”. Esse olhar diferenciado possibilita uma mudança muito relevante, posto que o outro passa a ser visto como alguém que possui hábitos, costumes e valores diferentes que os nossos e justamente por este motivo pode ensinar muitas coisas para nós, assim sendo, o outro é o “Alter” (diferente) e não o “alien” (estranho). B. O FOCO DE ANÁLISE DA ANTROPOLOGIA CULTURAL – O HOMEM A Antropologia Cultural analisa a essência humana e o que determinados grupos sociais criam historicamente. Entendemos que o homem é um ser social, portanto, ele aprende sempre com outros indivíduos. Assim, o ser humano ao utilizar suas inúmeras habilidades e competências explora a sua realidade e tenta explica-la. 1. O HOMEM É UM SER SOCIAL Quando descobrimos que somos essencialmente coletivos, percebemos que o individualismo exacerbado que existe atualmente em nossa sociedade foi algo historicamente construído, ou seja, o ser humano não possui uma essência solitária, mas ele precisa do outro para poder sobreviver. ANTROPOLOGIA CULTURAL 15 Entretanto se não fôssemos inseridos em nenhum grupo social desde o nosso nascimento poderíamos aprender a falar, andar e gesticular? Será que existe a possibilidade de iniciarmos o processo de humanização de uma forma isolada de um grupo social? Temos características e hábitos essencialmente humanos porque fomos inseridos em um grupo social e aprendemos a reconhecer determinados símbolos, expressar os nossos sentimentos como chorar, rir etc. 2. TRABALHO – UMA ATIVIDADE EXCLUSIVAMENTE HUMANA O que distingue os homens dos animais é a nossa capacidade de pensar e utilizar a nossa inteligência para sanar as nossas vicissitudes por meio do trabalho. O conceito trabalho é, na maioria das vezes, entendido como algo penoso que fazemos para ganhar um salário no fim do mês e assim continuarmos sobrevivendo. No entanto, essa conceituação (criada pelos economistas do século XIX) não explica a complexidade desse conceito. Trabalho é toda ação humana sensível com valor de uso, ou seja, todo ser humano trabalha quando desempenha qualquer ação que acontece na realidade (escola, casa, igreja) com uma finalidade. O lazer é considerado um trabalho, pois, quando alguém vai ao parque já está realizando uma atividade que tem um objetivo que pode ser diversão, entretenimento ou descanso. Assim sendo, a capacidade que o homem tem de raciocinar está intrinsecamente ligada à capacidade que ele tem de trabalhar e são essas potencialidades humanas que nos diferenciam dos outros animais. O ser humano sempre trabalhou, ou seja, transformou a natureza para atender as suas necessidades. Por intermédio da sua inteligência e da capacidade que tem para criar, a espécie humana evoluiu e continuará evoluindo. C. O HOMEM "Que é o homem, para que lhe dês importância e atenção, para que o examines a cada manhã e o proves a cada instante?” – Jó 7.17,18 “Quando contemplo os teus céus, obra dos teus dedos, a lua e as estrelas que ali firmaste, pergunto: Que é o homem, para que com ele te importes? E o filho do ANTROPOLOGIA CULTURAL 16 homem, para que com ele te preocupes?” – Sl 8.3,4 "O homem é a medida de todas as coisas" – Protágoras. "Muitas são as coisas grandiosas dotadas de vida, mas a mais grandiosa de todas é o homem" – Sófocles. 3. QUE É O HOMEM? A primeira dessas quatro frases é uma das perguntas que Jó dirige a Deus; a segunda, é a expressão de assombro do salmista diante da magnitude do universo e a pequinês do homem; a terceira uma reflexão do pensador grego Protágoras; e a quarta, uma fala da tragédia Antígona, de Sófocles. A elas poderiam reunir-se milhares de outras sobre o mesmo tema, de todas as épocas e civilizações, o que mostra que nada preocupa tanto o homem quanto a condição humana, e nenhum espetáculo é mais atraente para o homem do que o próprio homem. Em sentido amplo, homem é qualquer membro da espécie humana. Assim ele é entendido pela filosofia e abordado em cada um de seus aspectos particulares, pela biologia, antropologia, história, medicina e outras disciplinas que o têm por objeto a tarefa de definir homem. Consiste em procurar respostas para algumas perguntas essenciais como: Qual a natureza ou a essência do homem? Como se distingue o homem dos outros seres orgânicos, especialmente dos animais superiores? Essa distinção é essencial e absoluta, ou apenas uma variação de grau? Qual o lugar do homem no mundo? Qual sua missão ou seu destino? Como se relaciona com Deus ou com absoluto? 4. O HOMEM SOB A PERSPECTIVA FILOSÓFICA A noção ocidental de homem como indivíduo tem como ponto de partida o pensamento grego. Para Sócrates e Platão cada ente só pode ser definido se todos os seres do universo estiverem classificados segundo certas articulações lógicas e ontológicas. Definir um ente consiste então em tomar a categoria à qual ANTROPOLOGIA CULTURAL 17 ele pertence e situar essa categoria no lugar ontológico que lhe corresponde. Esse lugar ontológico é determinado por dois elementos de caráter lógico: a categoria próxima e a diferença específica. Por eles se chega à definição de Aristóteles: o homem é um animal racional. Animal é a categoria próxima, na qual se inclui o homem; racional é a diferença específica, por meio da qual se distingue conceitualmente o homem dos outros animais. Para a filosofia grega, o homem é um "ser racional", ou melhor dito, um animal que possui razão. Essa definição implica dizer que o homem é uma coisa cuja natureza consiste em poder dizer o que são as outras coisas. Ou seja, a razão permite ao homem definir-se e definir o conjunto do universo. Os gregos admitem que o homem tenha sido "formado", e também que sua formação tenha obedecido a condições especiais em relação aos demais seres, mas rejeitam a hipótese da criação. A visão do homem como ser criado é comum ao judaísmo e ao cristianismo e exerceu forte influência sobre todas as concepções filosóficas relacionadas com essas religiões e também com o islamismo. O homem seria, então, uma criatura, ou seja, um ser cuja realidade não é própria, mas que foi criado "à imagem e semelhança de Deus", o que lhe confere superioridade em relação aos outros seres. Para os gregos, o homem vive em dois mundos: o mundo sensível, que ele apreende pelos sentidos, e o mundo inteligível, que apreende pela razão, e onde se confirma sua realidade como ser racional. Na concepção judaico-cristã, o homem também se acha suspenso entre dois mundos: o finito e infinito, o que opõe em uma mesma natureza a insignificância e a imensa grandeza. Afirma Pascal que "... a natureza do homem pode ser considerada de duas maneiras: uma, segundo seu fim, e então é grande e incomparável; outra, segundo a multidão, como se aprecia a natureza do cavalo e do cão, e então é abjeto e vil. Esses são os dois caminhos que levam a julgamentos tãodiversos do homem, e a tantas discussões dos filósofos". 5. O HOMEM SOB A PERSPECTIVA BIOLÓGICA Para as ciências naturais, a dificuldade de definir o que seja "homem" consiste em escolher entre dois pontos de vista: o da estrutura anatômica e o que se refere às faculdades reflexivas. No primeiro caso, o homem encontrar-se-ia imerso em sua animalidade; no segundo, estaria pairando sobre o mundo, isolado da ANTROPOLOGIA CULTURAL 18 natureza. Uma definição mais abrangente e completa de homem deveria levar em conta, portanto, tudo o que nele seja suscetível de constatação positiva, isto é, além da conformação anatômica, é preciso considerar a faculdade de pensar. Dessa dupla abordagem se depreende a originalidade do fenômeno humano. O mais exterior dos caracteres humanos é sua tênue diferenciação morfológica, dada por especializações anatômicas (a face menor que o crânio, a postura vertical etc.) e fisiológicas (o desamparo em que se encontra o ser humano nos primeiros meses de vida, a sexualidade aperiódica etc.). Mesmo assim, dentro dos critérios adotados pela biologia para classificar os seres vivos, pode-se dizer que, por sua estrutura orgânica, o homem não pode aspirar senão a um lugar modesto na taxionomia animal: ele pertence ao subfilo dos vertebrados, à ordem dos primatas e a uma família formada por um único gênero, Homo. Mas outra característica zoológica do homem evidencia prontamente sua originalidade: a capacidade de expansão e conquista. Apesar da homogeneidade do grupo humano, o homem conquistou em relação ao conjunto do globo um sucesso vital sem precedentes, que se explica, pelo menos em parte, pela aparição de uma nova fase na história da vida, que é a do uso de instrumentos artificiais, mais uma característica do fenômeno humano. As tentativas de inserir o homem dentro da ordem dos primatas não primam pela precisão, uma vez que as diferenças de detalhes são complexas e controversas. O tamanho, e mais ainda, a complexidade do cérebro humano em relação ao dos primatas não-humanos constitui o principal ponto de diferenciação anatômica. A postura ereta é também um aspecto importante. Outras características anatômicas que distinguem o homem dos outros primatas, seja dos macacos antropoides, seja dos primatas inferiores, além do tamanho absoluto e relativo do cérebro, são: O pé, que serve de suporte e não é preênsil O primeiro dedo do pé, que não é oponível; Os maxilares, de tamanho reduzido e pouco salientes; A ausência de caninos salientes e interpostos; Curva lombar, bacia e pelve formadas ou modificadas para atender às funções ANTROPOLOGIA CULTURAL 19 de equilíbrio e suporte do corpo na posição ereta; Membros inferiores hipertrofiados, adaptados para o andar bípede; Membros superiores mais curtos e aperfeiçoados, com mãos grandes e preênseis, dotadas de dedos curtos e polegar oponível; Nariz saliente com pontas e asas bem desenvolvidas; Ausência completa de pelos táteis ou tentáculos; Escassez acentuada de pelo secundário no corpo, exceto na cabeça, regiões axilares e púbica e no rosto dos adultos masculinos; Presença de lábios cheios, invertidos e membranosos. 6. O HOMEM SOB A PERSPECTIVA PSICOSSOCIOLÓGICA Permanece vaga e ambígua a correlação entre as dimensões física e cultural do homem. Tal ambiguidade levanta a dúvida quanto ao problema de ser o homem causa ou resultado, criatura ou criador de seu patrimônio cultural. A questão do determinismo ou da liberdade da condição humana extrapola o âmbito da antropologia e convoca a uma perspectiva inovadora no campo das ciências humanas. Foi trazida pela psicologia o conceito psicanalítico de inconsciente. Essa noção, que foi a principal descoberta de Sigmund Freud, veio mostrar que o psiquismo não é redutível ao consciente e que certos conteúdos psíquicos só se tornam acessíveis à consciência depois de vencidas certas resistências. Para a sociologia, o homem, como ser social, é resultado de processos sociais e de cultura que antecedem ao aparecimento do indivíduo. O homem nasce com uma base orgânica, que o permite desenvolver-se em pessoa. Seus órgãos e sentidos estabelecem o contato entre o que é verdadeiramente hereditário, natural e individual, e a vida social e a cultura. O comportamento humano dá-se num quadro de circulação permanente de informação. Cada homem recebe ininterruptamente estímulos diversos e diversamente organizados, aos quais responde por comportamentos. Se isso é verdadeiro para qualquer ser vivo, no homem se distingue pelas propriedades de sistematização, de transferência e de significação. ANTROPOLOGIA CULTURAL 20 7. O HOMEM SOB A PERSPECTIVA ANTROPOLÓGICA A classificação dos seres vivos proposta por Lineu e George - Louis Leclerc Buffon, no século XVIII, permitiu pela primeira vez integrar o homem numa série zoológica e estudá-lo pelo método das ciências naturais. A espécie Homo Sapiens faz parte do gênero Homo, o que deixa aberta a possibilidade de existência de outras espécies. O próprio gênero Homo pertence à família dos hominídeos, à ordem dos primatas, à classe dos mamíferos, ao subfilo dos vertebrados e ao filo dos cordados. Dentro da espécie, pode-se distinguir os grupos (negro, branco, pigmeu etc.) e dentro de cada grupo as raças (nórdica, alpina, australiana etc.), depois as sub- raças, os tipos etc. A classificação do homem a partir do modelo zoológico introduziu o conceito diferencial de raça e, ao mesmo tempo, tornou possível definir a espécie por outros aspectos que não a racionalidade. Homo sapiens não é necessariamente sinônimo de animal racional. Os critérios anatômicos e fisiológicos é que foram considerados com maior rigor para a diferenciação da espécie. A antropologia preocupou-se também com os problemas da origem e da filiação da espécie, O Homo Sapiens não é senão o elo atual de uma ou várias longas cadeias de ancestrais hominídeos e pré-hominídeos e talvez símios. Mas a reação à taxionomia positivista acabou por impor um modelo que, sem desprezar os traços anátomo-fisiológicos, restituiu à antropologia geral as dimensões mentais do homem (psicológicas, culturais, etc.). Outra contribuição ao aprofundamento da perspectiva antropológica foi o estudo da herança cultural. Em muitos aspectos é ela que permite ao homem moldar uma vida adaptada à variedade de ambientes naturais e possibilita, dentro das limitações ambientais, tipos de vida que tanto podem resultar de uma escolha como de uma determinação psicológica interna. A herança cultural é a transmissão das características culturais pelo ensino e aprendizagem. A cultura se transmite sob forma de padrões explícitos e implícitos de comportamento e em suas materializações. O homem é portanto, um animal portador de cultura, seja pelo domínio da linguagem, seja pelos padrões de organização familiar, pelo uso de ferramentas, enfim, pelo controle de um vasto domínio de conhecimento empírico e pela presença de elementos de ordem simbólica, como tabus, mitos, rituais religiosos etc. ANTROPOLOGIA CULTURAL 21 CAPÍTULO 03 CULTURA A. INTRODUÇÃO O conceito que vamos trabalhar nesta disciplina é o de Cultura. O que é cultura? Essa não é uma pergunta fácil, pois, ainda hoje, entre os antropólogos, há diversas definições para esse conceito. Será que todos possuem cultura? Você tem cultura? Muitas vezes ouvimos falar que uma determinada pessoa tem cultura por ter lido muito livros ou por ter conhecimento apurado na área artística. Também já ouvimos falar de manifestações culturais que são relacionadas ao folclore, crenças, danças, lendas de uma determinada região. É um termo muito difundido atualmente é o de cultura de massa que faz referência ao cinema, televisão, rádio etc. Definir Cultura não é uma tarefa fácil. Faremos isso mais adianteem nosso estudo. B. AS ESPECIFICIDADES DA CULTURA O elemento fundamental das preocupações com cultura foi a constatação da variedade de modos de vida entre povos e nações. No final do século XV e início do XVI os europeus começaram a buscar novos mercados, ou seja, lugares onde pudessem explorar as riquezas naturais e levá-las consigo. Os portugueses conquistaram o Brasil e tiverem contato com os nativos e a mesma coisa aconteceu com os espanhóis quando conquistaram outras áreas da América. Os povos encontrados pelos europeus tinham hábitos, costumes e valores muito diferentes dos que eram aceitos na Europa, então era necessário conhecer as especificidades dessas culturas para explorar os nativos com mais facilidade. Há alguns séculos atrás essa dificuldade de definir cultura já existia e intelectuais na Alemanha no século XVIII tentaram definir o que seria esse conceito. Há uma explicação para isso: a Alemanha, neste momento, era uma nação dividida em várias ANTROPOLOGIA CULTURAL 22 unidades políticas. Discutir cultura era relevante, porque poderia corroborar para a criação de um sentimento de identidade entre os alemães na ausência de uma unidade política. Assim, os alemães poderiam identificar um modo de vida comum para todos que pertenciam àquela nação. Embora existam várias definições para o termo cultura, duas concepções são mais discutidas e aceitas: Cultura são todos os aspectos de uma realidade social; Cultura é o conhecimento, ideias e crenças de um povo. Vamos englobar essas duas concepções para definir qual conceito de cultura iremos utilizar neste curso. Cultura, portanto, será entendida por nós como a variedade de modos de vida, crenças, hábitos, valores e práticas de diversos povos. Assim, o termo cultura também pode ser entendido como modo de produção já que ambos significam o jeito de ser de uma determinada sociedade e o que ela produz. Aprendemos que o ser humano é coletivo e que necessita do grupo para dar início ao seu processo de humanização e que, por meio do trabalho e da sua capacidade de pensar modifica a natureza para sanar as suas necessidades. Além disso, cria códigos de comunicação que são utilizados pelo grupo ao qual pertence. C. DEFINIÇÕES DE CULTURA Em antropologia, a palavra cultura tem muitas definições. Veremos, resumidamente, qual a definição de Cultura que os principais pensadores e estudiosos desta área do saber nos deixou como legado. 1. EDWARD BURNETT TYLOR Edward Burnett Tylor (Londres, 2/10/1832 — Wellington, 2/01/1917) foi um antropólogo britânico. Tylor filia-se à escola antropológica do evolucionismo social. Considerado o pai do conceito moderno de cultura, Tylor vê, porém, a cultura humana como única, pois defende que os diferentes povos sofreriam convergência de suas práticas culturais ao longo de seu desenvolvimento, ideia que não é consenso hoje em dia. Sua principal obra é Primitive Culture ANTROPOLOGIA CULTURAL 23 (1871). “É todo complexo de conhecimentos, crenças, arte, leis, moral, costumes e quaisquer outras capacidades e hábitos adquiridos pelos indivíduos”. 2. BRONISŁAW KASPER MALINOWSKI Bronisław Kasper Malinowski (Cracóvia, 7/04/1884 — New Haven, 16/05/1942) foi um antropólogo polonês. Ele é considerado um dos fundadores da antropologia social. Fundou a escola funcionalista. A principal contribuição de Malinowski à antropologia foi o desenvolvimento de um novo método de investigação de campo, cuja origem remonta à sua intensa experiência de pesquisa na Austrália, inicialmente com o povo Mailu (1915) e posteriormente com os nativos das Ilhas Trobriand (1915-16, 1917-18). “São sistemas funcionais para dar conta das necessidades básicas dos seres humanos”. 3. CLAUDE LÉVI-STRAUSS Claude Lévi-Strauss (Bruxelas, 28/11/1908 — Paris, 30/10/2009) foi um antropólogo, professor e filósofo francês. É considerado fundador da antropologia estruturalista, em meados da década de 1950, e um dos grandes intelectuais do século XX. Professor honorário do Collège de France, ali ocupou a cátedra de antropologia social de 1959 a 1982. Foi também membro da Academia Francesa - o primeiro a atingir os 100 anos de idade. “É um sistema simbólico de uma criação que se acumula na mente humana”. 4. CLIFFORD JAMES GEERTZ ANTROPOLOGIA CULTURAL 24 Clifford James Geertz (São Francisco, 23/08/1926 — Filadélfia, 30/10/2006) foi um antropólogo americano, professor emérito da Universidade de Princeton, em New Jersey (USA). Seu trabalho no "Institute for Advanced Study" de Princeton se destacou pela análise da prática simbólica no fato antropológico. Foi considerado, por três décadas, o antropólogo mais influente nos Estados Unidos. “Conjunto de mecanismos de controle, planos, receitas, regras, instruções para governar o comportamento humano”. 5. ROQUE DE BARROS LARAIA Roque de Barros Laraia (Pouso Alegre, 15/09/1932 é um antropólogo brasileiro. Participou da primeira turma do curso de Especialização em Teoria e Pesquisa em Antropologia Social do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 1960. Atualmente é professor emérito da Universidade de Brasília, membro do Conselho Nacional de Imigração e do Conselho Consultivo do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. “Cultura é uma lente através da qual o homem vê o mundo”. 6. ROBERTO AUGUSTO DAMATTA Roberto Augusto DaMatta (Niterói, 29 de julho de 1936) é um antropólogo brasileiro. Roberto DaMatta realizou pesquisas etnológicas entre os índios Gaviões e Apinayé. Foi pioneiro nos estudos de rituais e festivais em sociedades industriais, tendo investigado o Brasil como sociedade e sistema cultural. Considerado um dos grandes nomes das Ciências Sociais no País, é autor de diversas obras de referência na Antropologia, Sociologia e Ciência Política. “É um mapa, um receituário, um código através do qual as pessoas de um ANTROPOLOGIA CULTURAL 25 dado grupo pensam, classificam e modificam o mundo e a si mesmas”. D. O HOMEM E A CULTURA 1. SÓ O HOMEM É PORTADOR DE CULTURA Só o homem é portador de cultura, por isso, só ele a cria, a possui e a transmite. As sociedades animais e vegetais a desconhecem. É um complexo, porque forma um conjunto de elementos inter-relacionados e interdependentes, que funcionam em harmonia na sociedade. Os hábitos, ideias, técnicas, compõem um conjunto, dentro do qual os diferentes membros de uma sociedade convivem e se relacionam. A organização da sociedade, como um elemento desse complexo, está relacionada com a organização econômica; os dois entre si relacionam-se igualmente com as ideias religiosas. O conjunto dessa inter-relação faz com que os membros de uma sociedade atuem em perfeita harmonia. 2. A CULTURA É UMA HERANÇA QUE O HOMEM RECEBE AO NASCER Desde o momento em que é posta no mundo, a criança começa a receber uma série de influências do grupo em que nasceu; as maneiras de alimentar-se, o vestuário, a cama ou a rede para dormir, a língua falada, a identificação de um pai e de uma mãe, e assim por diante. À proporção que vai crescendo, recebe novas influências desse mesmo grupo, de modo a integrá-la na sociedade da qual participa como uma personalidade em função do papel que nela exerce. Se individualmente o homem age como reflexo de sua sociedade, faz aquilo que é normal e constante nessa sociedade. Quanto mais nela se integra, mais adquire novos hábitos, capazes de fazer com que se considere um membro dessa sociedade, agindo de acordo com padrões estabelecidos. Esses padrões são justamente a cultura da sociedade em que vive. 3. A HERANÇA CULTURAL NÃO SE CONFUNDE COM A HERANÇA BIOLÓGICA O homem ao nascer recebe essas duas heranças; A herança cultural lhe transmite hábitos e costumes, ao passo que a herançabiológica lhe transmite as ANTROPOLOGIA CULTURAL 26 características físicas ou genéticas de seu grupo humano. Se uma criança, nascida numa sociedade bororo, é levada para o Rio de Janeiro, passando a ser criada por uma família de Copacabana, crescerá com todas as características físicas (cor da pele e do cabelo, forma do rosto, em especial os olhos amendoados) de seu grupo bororo, todavia, adquirirá hábitos, costumes, a língua, as ideias, modos de agir da sociedade carioca, em que se cria e vive. Além desses hábitos e costumes que recebe de seu grupo, o homem vai ampliando seus horizontes e passa a ter novos contatos; contatos com grupos diferentes em hábitos, costumes ou língua, os quais farão com que adquira alguns desses hábitos, costumes, ou modos de agir. Trata-se da aquisição pelo contato. Foi o que se verificou no Brasil do século XIX com hábitos introduzidos pelos imigrantes alemães ou italianos. O mesmo sucedeu em séculos anteriores, com costumes introduzidos pelos negros escravos trazidos da África; tais costumes vão-se incorporando à sociedade, e com o tempo, são transmitidos como herança do próprio grupo. É certo que essa transmissão pelo contato não abrange toda a cultura do outro grupo. Somente alguns traços se transmite e se incorporam à cultura receptora. Esta, por sua vez, se torna também doadora em relação à cultura introduzida, que incorpora a seus padrões hábitos ou costumes que até então lhe eram estranhos. É o processo de transculturação, ou seja, a troca recíproca de valores culturais, pois em todo contato de cultura as sociedades são ao mesmo tempo doadoras e receptoras. Dessa forma, o homem adquire novos elementos culturais, e enriquece seu tipo cultural. Esses elementos que compõem o conceito de cultura permitem mostrar que ela está ligada à vida do homem de um lado, e de outro, se encontra em estado dinâmico, não sendo estática sua permanência no grupo. 4. A CULTURA SE APERFEIÇOA A cultura se aperfeiçoa, se desenvolve, e se modifica continuamente, nem sempre de maneira perceptível pelos membros do próprio grupo. É justamente isso que contribui para seu enriquecimento constante, por meio de novas criações da própria sociedade e ainda do que é adquirido de outros grupos. Graças às pesquisas em jazidas arqueológicas, tem sido possível recompor ou ANTROPOLOGIA CULTURAL 27 reconstruir as culturas, o que permite conhecer o desenvolvimento cultural do homem, sobretudo no campo material. É mais difícil, porém, conhecer o desenvolvimento da cultura espiritual, embora muita coisa já se tenha podido esclarecer. De qualquer forma o que se sabe é que, nascida com o homem, a cultura, sofreu modificações ao longo dos tempos, enriquecendo-se de novos elementos e adquirindo novos valores. A cultura acompanha, pois, a marcha da humanidade; está ligada à vida do homem, desde o ser mais antigo. Com a expansão do homem pela terra, ocupando os grupos humanos novos meios ambientes, a cultura se ampliou e se diversificou em face das influências impostas pelo meio, cujas relações com o homem condicionaram o aparecimento de novos valores culturais ou o desaparecimento de outros. ANTROPOLOGIA CULTURAL 28 CAPÍTULO 04 SENTIDOS DA CULTURA A. SENTIDOS DE CULTURA Assim, dentro do conceito geral de cultura, é possível falar de culturas, e por isso, se identificam sentidos específicos segundo os quais a cultura é antropologicamente considerada. São quatro, a saber: 1. ELEMENTOS DE CULTURA COMUNS O primeiro sentido apresenta aqueles elementos de cultura comuns a todos os seres humanos, como a linguagem (todos os homens falam, embora se diversifiquem os idiomas ou línguas faladas). São aqueles hábitos (o de dormir, comer, ter uma atividade econômica) que se tornam comuns a toda a humanidade. 2. ELEMENTOS COMUNS A UM GRUPO DE SOCIEDADES No segundo sentido, encontram-se os elementos comuns a um grupo de sociedades, como o vestuário chamado ocidental, que é comum a franceses, a portugueses, a ingleses. São diversas sociedades que têm o mesmo elemento cultural; um exemplo é o uso do inglês por habitantes da Inglaterra, da Austrália, da África do Sul, dos Estados Unidos, que entre si, entretanto, têm valores culturais diferentes. 3. CONJUNTO DE PADRÕES DE DETERMINADA SOCIEDADE O terceiro sentido é formado pelo conjunto de padrões de determinada sociedade, por exemplo, aqueles padrões culturais que caracterizam o comportamento da sociedade do Rio de Janeiro; ou as peculiaridades que ANTROPOLOGIA CULTURAL 29 assinalam os habitantes dos Estados Unidos. 4. MODOS ESPECIAIS DE COMPORTAMETO DE UM SEGMENTO SOCIAL O quarto sentido de cultura refere-se a de modos especiais de comportamento de um segmento de sociedade mais complexa. Uma dada sociedade possui valores culturais comuns a todos os seus integrantes. Dentro, porém, dessa sociedade encontram-se elementos culturais restritos ou específicos de determinados grupos que a integram. São certos costumes que, dentro da sociedade multíplice do Rio de Janeiro, apresentam os habitantes de Copacabana, os de uma favela ou de um subúrbio distante. A esses segmentos culturais de uma sociedade complexa, dá-se também o nome de subcultura. São esses sentidos que permitem verificar a diferenciação de cultura entre os diversos grupos humanos. Tal diferenciação resulta de processos internos ou externos, uns e outros atuando de maneira diversa sobre o fenômeno cultural. Entre os processos internos, encontram-se as inovações, traduzidas em descobertas e invenções, que às vezes, surgem em determinado grupo e depois se transmite a outros grupos, não raro, sofrendo modificações ao serem aceitas pela nova sociedade. Os processos externos explicam-se pela difusão, que é a transmigração de um elemento cultural de uma sociedade a outra. Em alguns casos o elemento cultural mantém a mesma forma e função; em outros, modifica-as ou mantém apenas a forma e modifica a função. B. ACULTURAÇÃO O termo aculturação é usado em antropologia para designa o contato entre duas ou mais culturas diferentes, bem como as transformações decorrentes em cada uma delas, por força desse contato. Os antropólogos, especialmente Bernard Siegel, conceituam a aculturação como "uma mudança de cultura que se inicia pela conjugação de dois ou mais sistemas culturais autônomos". Para eles, os sistemas culturais de características próprias já estão por si mesmos em contínua transformação e, se dois ou mais se aproximam, surgem estímulos tanto para maiores mudanças internas de cada um como para outras, recíprocas, no ANTROPOLOGIA CULTURAL 30 conjunto que se formou. Como indicadores dessas modificações e dos significados que assumem, esses antropólogos apontam etapas como a da "transmissão intercultural" e a das "adaptações reativas", do ajustamento por assimilação ou fusão. Tratam ainda de dois fatos sociológicos inerentes ao processo, o papel e a comunicação interculturais. Por papel intercultural entendem a função desempenhada pelos indivíduos que entram em contato, os quais, pelo fato de jamais dominarem todos os aspectos da própria cultura, transmitem apenas parte do inventário cultural. Comunicação intercultural seria "o esboço da trama de papéis interculturais" que provê linhas de comunicação e de transmissão entre duas culturas. C. MODALIDADES DE ACULTURAÇÃO Vários autores se detêm no exame das diferentes modalidades de ação e reação no processo aculturativo. Em linhas gerais, são contemplados casos-padrão como os que se seguem. 1. ACEITAÇÃO Na aceitação, com maior ou menor cuidado e resistência, adotam-se componentes da cultura alheia (não necessariamente a dominante: o tabaco, por exemplo, entrou na Europa a partir do contato com as culturas ameríndias). 2. ADAPTAÇÃONa adaptação, uma cultura se altera para incorporar componentes culturais tomados de empréstimo a outro, ou outros povos e de presença constante e inevitável. É o caso dos cultos dos aborígines de ilhas do Pacífico; muito sobrevoados pelos aviões, passaram a integrá-los em seus cultos, preparando- lhes rituais "de aterrissagem" e levando-lhes oferendas. 3. CORTE No corte, os agentes de uma cultura aceitam uma parcela relativamente grande ANTROPOLOGIA CULTURAL 31 de componentes culturais alheios, o que leva ao surgimento de dois padrões coexistentes de comportamento, usados alternativamente conforme a situação. O corte cultural é típico do Japão contemporâneo. 4. OPOSIÇÃO Na oposição, as reações vão do desprezo ou hostilidade às influências estrangeiras até um messianismo que se opõe ao novo, como a rebelião de Canudos e outros movimentos do século XIX, no Brasil. 5. FUGA Na fuga, uma cultura tenta ignorar a outra e isolar-se ao se ver ameaçada, seja restabelecendo costumes do passado, seja buscando refúgio geograficamente favorável, como seria o caso da "cidade perdida" de Machu Pichu, no Peru, uma provável maneira de ocultar dos espanhóis, importantes remanescentes da civilização inca. 6. DESTRUIÇÃO Na destruição, os representantes de uma cultura se esforçam, direta ou indiretamente, para exterminar aquela ou aquelas que lhe causem estorvo. Todas as culturas ameríndias, por exemplo, foram destruídas, total ou parcialmente, após contato com as europeias. ANTROPOLOGIA CULTURAL 32 CAPÍTULO 05 O OBJETO DA ANTROPOLOGIA CULTURAL A. OBJETO DA ANTROPOLOGIA CULTURAL A antropologia cultural estuda o homem integrado em seu contexto social, psicológico, biológico, físico e teológico; Apreciando o seu comportamento, valores, hábitos, língua e crença. O conceito chave da Antropologia Cultural é a cultura, mostrando a sua beleza, singeleza, simplicidade, complexidade e arquitetura relacional. A antropologia cultural é o espelho do homem refletido na sociedade. Ela apanha todo o sistema de valores, de comportamento, de atitudes e expressões e reflete tudo isto numa expressão cultural distinta. B. ANTROPOLOGIA DA RELIGIÃO É o ramo da antropologia que se dedica ao estudo das crenças religiosas do povo. A religião é a maior expressão da crença de um povo. A religião é uma das instituições sociais universal em todas as culturas. Toda sociedade conhecida pratica alguma forma de religião. A palavra religião vem do latim, e que dizer “religar”, dando a ideia de laço, aliança, pacto. Religião é a ligação do homem com Deus. Para a antropologia, “religião são todas as crenças e práticas em forma de doutrinas e rituais de uma religião”. C. A ETNOTEOLOGIA Etnoteologia é a área de estudo relacionada com a apresentação do evangelho e os modelos culturais relevantes na cultura receptora. “Etnoteologia é a disciplina concernente a desculturalização (separação da cultura) e contextualização da teologia”. Cada cristão aprende sua teologia num conjunto ANTROPOLOGIA CULTURAL 33 cultural e logo começa a ver seu comportamento como um “comportamento cristão”. A Etnoteologia nos mostra que cada cristão aprende sua teologia num conjunto cultural. A Bíblia é o mapa cultural e teológico do povo de Deus e nela está contido o ensino de toda a teologia, padrões culturais e comportamento aplicável ao povo de Deus. Ela é um manual teológico e antropológico aos adoradores do único Deus vivo e verdadeiro. D. A ANTROPOLOGIA CULTURAL DA BÍBLIA A Bíblia é a única Regra de Fé e Prática, e a única fonte de confiança do cristão. A veracidade e autoridade final da Bíblia sobrepõem a todas outras ciências e argumentos. A única fonte fidedigna que temos sobre Deus e as coisas relacionadas a Ele é a Bíblia. A Bíblia é a revelação divina, possui inspiração divina e tem autoridade divina. Deus se revelou a si mesmo na Bíblia (2Tm 3.16). Revelação divina é Deus comunicando a verdade para o homem, e inspiração divina é a influência divina que garante a transferência fiel daquela verdade revelada. A Antropologia Cultural confere ao estudante da Bíblia conceitos e ferramentas para compreender a cultura em que a Bíblia foi escrita e consequentemente entender melhor a passagem bíblica. No campo da etnoteologia, a antropologia cultural ajuda- nos a estabelecer uma teologia verdadeira intercultural e totalmente relevante à cultura local, fornecendo ferramentas para a contextualização da mensagem. O estudo da etnologia mostra que a Bíblia é Sagrada e infalível, mas a transmissão da mensagem está atada à cultura. É preciso então distinguir o que é uma verdade bíblica absoluta, e o que é um aspecto cultural expresso na passagem bíblica. E. COSMOVISÃO E CONTEXTUALIZAÇÃO Cosmovisão é a maneira pela qual as pessoas vêm ou percebem o mundo, a maneira pela qual elas entendem o mundo ao seu redor e percebem sua participação e localização neste mundo. É a compreensão pessoal da realidade ao redor e do que elas são. 1. COSMOVISÃO ANIMISTA A visão é que a terra é governada por espíritos, e devido a esta percepção do ANTROPOLOGIA CULTURAL 34 mundo tudo é regulado por esta crença, a plantação, a colheita, a arquitetura de suas casas, os rituais, a religião, as festas e os modos de expulsar os maus espíritos. 2. COSMOVISÃO HINDÚ A vida não está num tempo linear começando com o nascimento e terminando com a morte, mas num tempo circular, onde os indivíduos renascem centenas e milhares de vezes. Para eles, a morte é apenas um ponto de reiniciar o processo circular da vida, visto que irá nascer e começar outras vezes. 3. COSMOVISÃO ESPÍRITA A reencarnação e contato com os mortos e espíritos é algo natural. 4. COSMOVISÃO CATÓLICA ROMANA Maria é a personagem principal no cristianismo e a que assume a memória cultural constantemente. 5. COSMOVISÃO HUMANÍSTICA O homem é o centro de todo saber e de todas as coisas. 6. COSMOVISÃO ISLÂMICA Ocorre uma substituição das ideias do cristianismo, onde Maomé é a autoridade máxima, o alcorão o livro de regras, fé e prática, e Deus um juiz impessoal que julgará sem qualquer misericórdia. F. COMPREENDER A COSMOVISÃO DE UM POVO Entender a cosmovisão é o ponto de partida para estabelecer uma ponte naquela cultura pessoal e naquela mentalidade formada, a verdade transcultural do evangelho de Cristo. A cosmovisão de um povo reflete as suas suposições, valores e entendimento a ANTROPOLOGIA CULTURAL 35 respeito da vida e do mundo onde eles vivem. Por isto é necessário participar da vida e das experiências de um povo com entendimento para entender esta sua cosmovisão. Daí, a necessidade de uma contextualização, ou seja, a de apresentar a mensagem ajustável ao “ponto de vista”, contexto e estilo cultural local. G. COMUNICAÇÃO TRANSCULTURAL A Comunicação Transcultural vem a ser, uma comunicação contextualizada, onde é necessário ter os conhecimentos da antropologia cultural para entender a cultura e a cosmovisão de um povo. Partindo do campo da Antropologia entramos no campo da Teologia, que é o estudo de Deus, sendo a Bíblia um documentário histórico da revelação de Deus aos homens. Teologia é a ideia, o pensamento, o conhecimento que o homem tem acerca de Deus, e a religião é a prática, nela o homem expressa em atitudes, ações e hábitos o que esse conhecimento de Deus produziu nele. Cada sistema cultural e religioso traça um caminho para o homem expressar sua crença e prática religiosa. ANTROPOLOGIA CULTURAL 36 CAPÍTULO 06 PRINCIPAIS ACEPÇOES DO TERMO “CULTURA” A. INTRODUÇÃO O conceito cultura varia muito na sua essência, no tempo e no espaço. Tylor, Linton, Boas e Malinwski consideram a cultura como ideias. Para Kroeber e Kluckhohn, Beals e Hoijer culturaé abstração do comportamento. Keesing e Foster a definem como comportamento aprendido. Leslie A. White afirma que a cultura deve ser vista em si mesma, fora do organismo humano. Leslie A. White e Foster inserem no conceito de cultura os elementos materiais e não materiais de cultura. Geertz propõe a cultura como um “mecanismo de controle” do comportamento. Essas definições divergentes permitem que aprendamos cultura por meio de seus diversos nexos constitutivos: A cultura, portanto, pode ser analisada, ao mesmo tempo, sob vários enfoques: Ideias (conhecimento e filosofia); Crenças (religião e superstição); Valores (ideologia e moral); Normas (costumes e leis); Atitudes (preconceito e respeito ao próximo); Padrões de conduta (monogamia, tabu); Abstração do comportamento (símbolos e compromissos); Instituições (família e sistemas econômicos); Técnicas (artes e habilidades) e Artefatos (machado de pedra, telefone). Segundo Leslie A. White cultura situa-se no tempo e no espaço e pode ser classificada em: “Intraorgânica” (conceitos, crenças, atitudes, emoções, etc.); “Interorgânica” (interação social entre os seres humanos) e “Extraorgânica” (objetos materiais, ou seja, localizada fora de organismos ANTROPOLOGIA CULTURAL 37 humanos). Para os antropólogos cultura consiste em: Ideias (concepções mentais de coisas abstratas ou concretas – crenças religiosas, míticas, científicas etc.); Abstrações (aquilo que se encontra no campo das ideias, da mente – acontecimentos não observáveis, não concretos, não sensível) e Comportamento (modo de viver comum de um determinado grupo humano). B. CLASSIFICAÇÃO DE CULTURA 1. CULTURA MATERIAL São coisas materiais, concretas, que foram criadas pelo ser humano com uma finalidade. São, por exemplo, vestuários, arco e flechas, vasos, talheres, alimentos, habitações etc. 2. CULTURA IMATERIAL São elementos não concretos da cultura como valores, hábitos, crenças, potencialidades, normas, significados etc. 3. CULTURA REAL (AÇÃO E PENSAMENTO) A cultura real só pode ser percebida parcialmente, posto que ela representa aquilo que todos os membros de uma sociedade praticam ou pensam nas suas tarefas cotidianas. A cultura real é subjetiva, por este motivo, os estudiosos da cultura não podem ter uma única visão da realidade, pois a mesma é apresentada de diversas maneiras de acordo com o ponto de vista de cada indivíduo. 4. CULTURA IDEAL (FILOSOFIA CORRETA EM TERMOS TEÓRICOS) Representa um conjunto de comportamentos que são propagados como corretos, perfeitos, no entanto, na prática não são seguidos por todos os membros de um grupo social. ANTROPOLOGIA CULTURAL 38 C. ABSORÇÃO DE UMA CULTURA 1. ENDOCULTURAÇÃO É a aprendizagem e estabilidade de uma cultura, ou seja, cada indivíduo recebe as crenças, os modos de vida da sociedade a que pertence, o comportamento, hábitos e valores. A sociedade controla os atos, comportamentos e atitudes de seus membros. 2. ACULTURAÇÃO É a fusão de duas culturas diferentes, ou seja, dois grupos que entraram em contato. Esse contato, quando contínuo, gera alterações nos padrões de cultura de ambos os grupos. Paulatinamente, essas culturas fundem-se e formam uma sociedade e cultura nova. 3. SUBCULTURA É um meio peculiar de vida de um grupo menor dentro de uma sociedade maior. Exemplo: a cultura do Nordeste brasileiro; skinheads; punks, etc. 4. SINCRETISMO CULTURAL É a fusão de dois elementos culturais análogos (práticas e crenças), de culturas diferentes ou não. Exemplo: a cultura africana que entra em contato com a cultura cristã. D. RAÇA A palavra raça foi introduzida há aproximadamente 200 anos nos estudos científicos. No entanto, pouco se sabe sobre a sua origem. Etimologicamente a palavra raça viria de “radix”, palavra latina que quer dizer raiz ou tronco. Em vários estudos a palavra raça tem sido empregada para fazer referência a ANTROPOLOGIA CULTURAL 39 indivíduos que são identificados como pertencentes a um determinado grupo. Assim sendo, são indivíduos que pertencem a uma mesma linhagem ancestral e possuem os mesmos hábitos, ideais, crenças, costumes e tradições. A palavra raça, entretanto, tem uma conotação muito mais ampla. Cientificamente ela significa o que é único biologicamente. Assim, não existem subdivisões raciais quando falamos em seres humanos, pois, neste caso, só existe uma raça que nos distingue dos outros animais, ou seja, a raça humana. E. ETNIA É um grupo de seres humanos unidos por um fator comum (língua, religião, costumes, valores, nacionalidade) e possuem afinidades culturais e históricas. F. RELATIVISMO CULTURAL Mostra as particularidades de cada modo de vida. Os indivíduos possuem modos de vida específicos adquiridos pela endoculturação. Assim, possuem suas próprias ideologias e costumes: Toda a cultura é considerada como configuração saudável para os indivíduos que a praticam. Todos os povos formulam juízos em relação aos modos de vida diferentes dos seus. Por isso, o relativismo cultural não concorda com a ideia de normas e valores absolutos e defende o pressuposto de que as avaliações devem ser sempre relativas à própria cultura onde surgem. (MARCONI; PRESSOTO, 1989, p. 51) Exemplo: a figa é utilizada por algumas pessoas como um amuleto da sorte. No entanto, para os antigos romanos ela significava uma relação sexual. G. ETNOCENTRISMO É a supervalorização da própria cultura em detrimento das demais. O etnocentrismo gerou e ainda gera muita intolerância, preconceito e discriminação. Quando julgamos a cultura do outro, entendemos que a nossa cultura é a única correta e que o outro precisa modificar-se e seguir os nossos “ideais perfeitos”. O nazismo é um exemplo de etnocentrismo, posto que os alemães supervalorizaram a sua cultura e afirmavam pertencer a uma “raça pura”, assim, praticaram atrocidades contra todos aqueles que não pertenciam ao mesmo modelo de perfeição que eles. Inúmeros judeus foram ANTROPOLOGIA CULTURAL 40 assassinados em campos de concentração durante a Segunda Guerra Mundial, vítimas dessa intolerância. H. SINCRETISMO Sincretismo é palavra para muitos considerada maldita, que provoca mal-estar em muitos ambientes e autores. Diversos pesquisadores evitam mencioná-la considerando seu sentido negativo, como sinônimo de mistura confusa de elementos diferentes, ou imposição do evolucionismo e do colonialismo. O Dicionário de Aurélio Buarque de Holanda apresenta cinco sentidos desta palavra. O primeiro deles como “reunião dos vários Estados da Ilha de Creta contra o adversário comum”. Como explica Canevacci (1996, p. 15): “Dizia-se que, de fato, os cretenses, sempre dispostos a uma briga entre si, se aliavam quando um inimigo externo aparecia.” Segundo o antropólogo holandês André Droogers (1989) o termo sincretismo possui duplo sentido. É usado com significado objetivo, neutro e descritivo, de mistura de religiões, e com significado subjetivo que inclui a avaliação de tal mistura. Devido a essa avaliação muitos propõem a abolição do termo. Droogers informa que o termo sincretismo sofreu mudanças de significado com o tempo e que a distinção entre a definição objetiva e subjetiva tem raízes históricas. Na Antiguidade significava junção de forças opostas em face ao inimigo comum, de acordo com o primitivo sentido político apresentado pelo Dicionário do Aurélio. A partir do século XVII, tomou caráter negativo, passando a referir-se à reconciliação ilegítima de pontos de vista teológicos opostos, ou heresia contra a verdadeira religião. Hoje no Brasil este sentido encontra-se muito difundido. Embora alguns não admitam, todas as religiões são sincréticas, pois representam o resultado de grandes sínteses integrando elementosde várias procedências que formam um novo todo. No Brasil, quando se fala em religiões afro-brasileiras pensa- se imediatamente em sincretismo, como “ ‘aglomerado indigesto’ de ritos e mitos, ou como ‘bricolagem’ no sentido de mosaico as vezes incoerente de elementos de origens diversas.” (POLLAK-ELTZ, 1996, p. 13). Costuma-se atribuir também o termo sincretismo em nosso país, quase que exclusivamente ao catolicismo popular e às religiões afro-brasileiras. Mas o sincretismo está presente tanto na umbanda e em outras tradições religiosas africanas, quanto no catolicismo primitivo ou atual, popular ou erudito, como em qualquer religião. ANTROPOLOGIA CULTURAL 41 Consideramos que o sincretismo pode ser visto como característica do fenômeno religioso. Isto não implica desmerecer nenhuma religião, mas em constatar que, como os demais elementos de uma cultura, a religião constitui uma síntese integradora, englobando conteúdos de diversas origens. Tal fato não diminui mas engrandece o domínio da religião, como ponto de encontro e de convergência entre tradições distintas. No campo das religiões afro-brasileiras, diversos dirigentes e militantes, sobretudo os mais intelectualizados, tendem atualmente a seguir a estratégia de condenar o sincretismo. Esta atitude defendida por alguns há tempos, difundiu-se entre nós principalmente após a realização, em 1983 na Bahia, da II Conferência Mundial da Tradição dos Orixás e Cultura. Desde então alguns líderes bastante conhecidos das religiões afro-brasileiras passaram a condenar o sincretismo afro-católico, afirmando não ser hoje mais necessário disfarçar as crenças africanas por trás de uma máscara colonial católica. ANTROPOLOGIA CULTURAL 42 CAPÍTULO 07 MITO: ELEMENTO DA CULTURA A. O MITO A superioridade do mito sobre a explicação científica é que ele lida com sentimentos opostos, representações irracionais, é o próprio discurso da contradição. O homem desde sua origem tenta explicar situações que ocorrem ao seu redor. Eis a contumácia da humanidade. Ou seja, saber o fundamento da sua existência, como ocorreu a criação do mundo, o que é a vida e a morte. Questões não muito fáceis de serem respondidas. Porém, de certo modo, o homem inventa maneiras de explicar fatos abstratos, partindo do obséquio a ajudar o seu grupo social fazendo com que aceitem, através destas explicações, situações ainda sem respostas. Estou me referindo a lendas, mitos, contos que são inventados pelo homem que busca, desta maneira, uma explicação “mágica”, para concluir um fato real. Nas narrações de diversos mitos são encontrados: feitos heroicos, milagres, castigos, amores, lutas etc. Nos mitos encontram-se as experiências de vida de uma determinada sociedade em uma determinada época. É a busca de uma intimidade interior, através da capacidade que o homem tem de criar e cultivar o que há de comum no seio de toda humanidade. Ou seja, não explicar fatos de uma forma racionalmente analítica, contudo, entender o sentido genuíno do existir. Há um acervo de mitologias, umas muito conhecidas, outras nem tanto; o importante, no entanto, é que todas elas implicam no social, criando padrões de comportamento de uma certa sociedade. Podemos citar, como exemplo, a sociedade da antiga Grécia. A mitologia grega, uma das mais afamadas, mostra em seus contos, deuses poderosos, porém, envoltos em imperfeições humanas. Ora, os poetas ao escreverem os mitos gregos quiseram retratar, sem culpa alguma, que até mesmo os seres aparentemente perfeitos, possuem limites e desejos como o homem. ANTROPOLOGIA CULTURAL 43 Creio que os mitos gregos até hoje são muito aceitos por descreverem essas imperfeições. O que é imperfeito causa amor. O que quero dizer é que, a ideia de pecado, cria no homem mazelas pungentes, e faz com que se sinta culpado por atender seus anseios e desejos. Descrever seres especiais, porém imperfeitos, ressalta a ideia que falhar é próprio dos seres “racionalmente pensantes”, notar isto, faz com que nos sintamos menos culpados de nossos “terríveis” pecados. Mitologia nórdica - A mitologia retrata a realidade de um certo grupo. Na mitologia nórdica essa realidade é bem notável. Os povos denominados bárbaros eram guerreiros por excelência, seus deuses eram fortes e os ajudavam nas batalhas. Na mitologia nórdica, Odin é o mais poderoso de todos os deuses. Vejamos o que essa mitologia mostra da realidade dos povos bárbaros: O Valhala, na mitologia nórdica e escandinava era a habitação dos deuses e dos heróis mortos em combate. Estava situado no Paraíso escandinavo. Ali os heróis mortos combatiam todos os dias, mas ao meio dia ressuscitavam, cicatrizando também todas as feridas dos combatentes. Ajudados pelas Valquírias, eles se lavavam em hidromel, que brotava dos úberes da cabra Heidrum. A seguir participavam de um lauto banquete presidido por Odin, durante o qual, as Valquírias serviam aos heróis hidromel e cerveja, dentro de crânios de inimigos mortos por ele. As Valquírias que quer dizer “que escolhem os mortos” eram nove louras, virgens guerreiras, auxiliares de Odin, companheiras de combate. Sobrevoavam os campos de batalhas, cavalgando em lindos corcéis, usavam elmo e portavam lança e escudo. Escolhiam e transportavam os heróis mortos para o Valhala [...] Observando a mitologia nórdica, percebe-se que a essência das suas narrações é a realidade em que viviam os povos bárbaros. Estes viviam nos combates entre distintas tribos e acreditavam que numa vida após a morte, onde, se porventura tivessem morrido honrosamente, podiam desfrutar dos regozijos da recompensa de Odin. O que busco mostrar é que todo mito vem carregado de uma essência real de um certo grupo. Entendendo a função principal do mito, podemos partir para os saberes que o invocam. Ou seja, crenças, danças e tradições. Enfim, o folclore de um determinado grupo social. B. FOLCLORE A palavra folclore foi usada pela primeira vez pelo arqueólogo inglês William John ANTROPOLOGIA CULTURAL 44 Thoms (Londres-1846). Ele solicitou apoio à revista The Athenaeun, no sentido de se fazerem pesquisas para se conhecer os costumes, as crenças e os hábitos das diversas regiões da Inglaterra. Essa carta foi publicada em 22 de agosto de 1846, daí esta data para se comemorar o dia do folclore até os nossos dias. Folclore vem de Folk-Lore que quer dizer, literalmente, “povo-conhecimento”. William John Thoms sugeriu esta denominação, substituindo as expressões usadas por alguns eruditos da época William Thoms, como “antiguidades populares” e “literatura popular”. Atualmente, considera-se relevante o registro das crenças, costumes, hábitos, cerimônias, músicas, superstições etc., não como “antiguidades do povo” (expressão que veicula uma ideia de primitivismo), mas como conhecimentos adquiridos por um grupo social: é a sabedoria do povo desagrilhoada de qualquer intenção erudita.2 O folclore é o conjunto de mitos, ritos, crenças religiosas, danças, linguagem, música, artesanato etc. Folclore, portanto, vai muito além da ideia de tradição popular; ele está associado à vida do povo, à sua disposição de criar e recriar algo. Não é somente as celebrações populares, mas o lastro da vida cotidiana de um determinado grupo. O folclore é uma criação subjetiva; entretanto, sua reprodução tende a ser coletivizada. Ele perdura de uma geração a outra, portanto, também é reconhecido como tradição e não modismo. É uma identidade do modo de vida de uma determinada classe produtora de sua própria cultura. O folclore tem sua representação nas tradições e crenças populares expressas de diversas maneiras. É denominado folclore algo que tenha origem anônima, algo que ninguém sabe quem criou. Além disso não deve possuir cronologia alguma; sendo divulgado e praticado por um grande número de pessoas
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