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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ CAMPUS PARANGABA - FIC DIREITO ISMAEL PEREIRA DA SILVA NETO Correlação entre Ação Civil Pública e Ação de Improbidade Administrativa Fortaleza - CE 2020 ISMAEL PEREIRA DA SILVA NETO Correlação entre Ação Civil Pública e Ação de Improbidade Administrativa O trabalho trata sobre a correlação entre Ação Civil Pública e Ação por Improbidade Administrava , perpassando pelo inquérito civil , sua legitimidade, a relação jurídica entre os dois institutos, as diferenças, cu- mulação e as hipoestes. Professor(a): ERLON ALBUQUERQUE DE OLIVEIRA Disciplina: Direito Administrativo Turma: CCJ 0348_3514366 Fortaleza - CE 2020 Resumo O presente trabalho tem por escopo analisar e correlacionar alguns aspectos da ação civil pública em contraponto a ação de improbidade administrativa. Buscando, inicialmente, apresentar a natureza de ambas as ações, demonstrando a dinâmica do procedimento previsto na Lei 8.429/92 e sua correlação com os atos da Lei 7.347/85. Na sequência, porcuramos abordar a questão da competência, e da a legitimidade ativa ad causam, para porpositura de ambas as ações. Tratamos de analisar a questão dos atos persecutóris “inquéritos” que preparam a atuação do Ministério Público nas ações civis, regidas pela Lei 7.347/85 e refletimos, ainda, quanto à viabilidade de se cumular a ação civil pública com a ação de improbidade administrativa, chamando a atenção para os julgados que fazem essa correlalçao entre os dos institutos. Finalmente, discorremos sobre aaplicaão da ação de imporbidade como sendo parte da ação civil pública, onde esta última pode fgurar como sendo principal ou secundária. Palavras-chave: improbidade administrativa; ação civil pública; inquerito civil; custas legis; improbidade. Lista de abreviaturas e siglas CF/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CPC Código de Processo Civil ISS Imposto sobre Serviços MP Ministério Público STJ Superior Tribunal de Justiça TJ-MG Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais Sumário 1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 1.1 Objetivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 2 Da ação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6 2.1 Ação civil pública . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6 2.1.1 Características da Ação Civil Pública . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6 2.1.2 Principios da Ação Civil Pública . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 2.1.3 Interesses difusos e coletivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 2.2 Inquérito Civil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8 3 Da Ação de Improbidade Administrativa . . . . . . . . . . . . . . . 9 3.1 Ação Cívil Pública X Ação de Improbidade Administrativa . . . . 11 4 Relação jurídica entre ação civil pública e ato de Improbidade . 14 5 Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16 6 Referências Bibliográficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 5 1. Introdução O direito de ação, o qual faz com que o poder judiciário tenha o dever de apreciar lesão ou grave ameaça ao direito tanto do sujeito, quanto ao corpo social que busca afirmar uma necessidade latente de justiça, está consagrado na Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, XXXV, onde garante a inafastabilidade da justiça. Para isso, o instrumento criado pelo ordenamento jurídico foi a Ação Civil Pública, que decorre da Lei nº 7.347/85, e que possui o dever de proteger os danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico, paisagístico, e ainda, a qualquer outro interesse difuso ou coletivo, bem como, à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos e ao patrimônio público e social. Para atingir a finalidade a Constituição resolveu figurar o Ministério Público como sendo o agente legalmente constituído para atuar na proteção destes direitos, agindo pela promoção da Ação Civil Pública e o Inquérito Civil, nos termos do art.129, §1, III, bem como este também é legitimado a propor as Ações de Improbidade Administrativa, espécie de ação civil própria para apurar a falta de conduta proba por parte do agente público ou aqueles que a ele se equiparam, nos moldes da Lei 8.429/92. 2. Objetivo Este trabalho, tem o objetivo de apresentar cada um dos institutos jurídicos utilizados no ordenamento para promover a preservação dos bens coletivos. Faremos um explicação de maneira suscita, das principais características da Ação Civil Pública, os aspectos gerais, sua legitimidade e ainda traçar um paralelo entre ela e a Ação de Improbidade Administrativa, esta que por ser considerada uma espécie de ação civil pública, mas especificamente tem caráter persecutório da apuração de ato ímprobo em âmbito administrativo praticado por agente público ou a ele equiparado, servirá de contraponto no estudo da correlação entre os instrumentos jurisdicionais nas ações de caráter metaindividual. 6 3. Da ação A constituição Federal de 1988, consagra em seu Art. 5º, inciso XXXV, a garantia de inafastabilidade da jurisdição, também denominada de direito de ação. Considerando esta garantia, podemos inferir que à ação identifica-se como sendo um atributo do sujeito ou do corpo social de poder exercitar perante o Estado, o direito subjetivo de dar iniciativa a atuação da vontade da lei por meio do judiciário. Com efeito, o código de processo civil, traz a ação como um direito conferido à parte, para que ela possa dispor ou mesmo transigir acerca do objeto alvo da demanda. Consequentemente a ação uma vez proposta, revela o impulso oficial, que por sua vez trará a garantia de transcorrer com toda sistemática processual. 3.1 Ação civil pública Como leciona o professor Hugo Nigro Mazilli (153/16), em seu artigo " A AÇÃO CIVIL PÚBLICA NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE", a primeira norma que mencionou a expressão “ação civil pública” foi a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei Complementar federal n. 40, de 1981), em seu art. 3º, III, d. Entretanto a expressão, só veio a ser consagrada na Lei n. 7.347/85. Noutro momento a Constituição Federal de 1988, conferiu a ação civil pública ao Ministério Público com a finalidade de promover a defesa do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, em seu art. 129, inciso III. (grifo meu) O fato é que a ação civil pública surgiu em contraposição a ação penal pública, conferindo ao Parquet o poder de atuar a jurisdição na esfera civil, sendo considerados em mesmo grau de atuação e devidamente legitimados para propositura da referida ação, os que constam do Art. 5º da Lei nº. 7.347/85. Em face a tudo que foi exposto, podemos conceituar "ação civil pública" como a ação não penal que confere aos legitimados no Art. 5º da Lei nº. 7.347/85 o poder de tutelar os interesses difusos ou coletivos. (grifo meu) 7 3.2 Características da Ação Civil Pública Com vistas a formulação de conceitos deste estudo, podemos inferir que a ação civil pública, possui características próprias, pois não se trata de um processo absolutamente autônomo, ela aproveita os ritos previstos no CPC ou em leis extravagantes¹, sendo então adaptados aos princípios da Lei nº. 7.347/85, em prol da defesa dos interesses difusos. A ação civil pública não possui um rito processual especifico, podendo as vezes assumir forma de ação ordinária, sumaria de execução, cautelares e de procedimentos especiais, desde que prevista no CPC ou legislação especial, essa poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, como previsto no Art. 3º da Lei que disciplina a ação civil pública. 3.3 Princípios da Ação Civil Pública Nelson Nery Junior (1999), ensina que a ação civil pública é regulada por 3 (três)princípios, seriam eles: • O princípio da taxatividade, que consiste na enumeração exaustiva das hipóteses em que o MP pode atuar. • O princípio da obrigatoriedade, tal qual ocorre na ação penal, a ação civil pública é de propositura obrigatória. • E não mesmo importante, o princípio da indisponibilidade, que decorre obviamente, do princípio da obrigatoriedade, já mencionado, onde por este princípio após proposta a ação, o MP não pode praticar atos que importem em disposições do direito material (transação, renúncia etc.) tampouco as que importem em direito de ação, como por exemplo, desistir da ação já proposta. 3.4 Interesses difusos e coletivos O interesse público busca identificar o bem comum almejado por toda sociedade, procurando harmonizar os interesses dos indivíduos a convivência necessárias de toda coletividade. Para Celso Antônio Bandeira de Mello, o interesse público, se contrapõe ao interesse privado, individual, sendo primeiro, o “interesse do todo, ou seja, do próprio conjunto social”, onde este não se confunde com a soma dos interesses individuais. 8 Por interesse difuso, tomando por base os estudos de Carnelutti, pode-se dizer que seria o interesse de um grupo ou de grupos menos determinados de pessoas, entre as quais não haja vínculo jurídico ou fático muito preciso. Por sua vez, podemos conceitua o interesse coletivo como sendo o que abrange uma categoria determinada ou pelo menos determinável de indivíduos, a exemplo dos associados de uma entidade de classe. Assim, tomando como exemplo podemos trazer o ocorrido no estado do Ceará, quando em certo momento o governo estadual tomou a decisão de construir a Barragem Santo Antônio do Pitaguary - CE. Neste exemplo, uma barragem para represar água foi construída na região metropolitana da cidade de Fortaleza pelo governo do Estado nas proximidades de comunidades indígenas, essa construção pode ter sido ou não, a opção mais segura para população; a decisão poderia pôr em risco a vida da população em caso de inundação pelo rompimento, se fosse o caso trágico, mas sob o ângulo do interesse geral, a decisão foi a mais acertada. E é por este e outros casos que estão aí as ações populares, confirmando que nem sempre o interesse público, visto pelo administrador, coincide com o verdadeiro interesse da coletividade. 4. Inquérito Civil O inquérito civil foi instituído pela Lei nº 7.347/85, está disciplinada em seu Art. 8, §1º, no entanto, teve seu objetivo estabelecido pela Constituição Federal, em seu Art.129, inciso III, onde apresenta que é função institucional do Ministério Público "promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos". Por este viés, podemos inferir que o inquérito é o instrumento utilizado pelo Ministério Púbico para a investigação e a apuração de elementos e fatos necessários para a promoção de ação pública, civil ou penal, para a proteção do patrimônio público e social e de interesses difusos e coletivos. E por ser apenas instrumento para se atingir a finalidade, este não está submetido às exigências do artigo 5º, LV, da CF/88. Obviamente, porque o texto constitucional tratou de assegurar os direitos da ampla defesa e do contraditório ao "processo" e não ao “procedimento", o que seria o caso do inquérito. 9 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; (grifo meu) Ensina ainda, Ada Pellegrini Grinover (1991), no trabalho publicado no RDA 183/9, que o "inquérito civil do MP" é "não punitivo", não sujeito, portanto, às determinações da aludida norma constitucional (pág.13) E neste sentido, fazendo o enlace das colocações acima, podemos concluir de maneira preliminar que o inquérito civil, caracteriza à atuação do poder investigatório do Ministério Público, e tem sua natureza voltada a fase de inicial do procedimento administrativo da ação, até mesmo porque nele não se têm participantes, partes “litigantes” e muito menos acusados. 5. Da Ação de Improbidade Administrativa A improbidade administrativa é considerada um mal universal, está ligada diretamente à Administração Pública, ou seja, ocorre quando um agente público ou particular acaba prejudicando o interesse público e desrespeitando os princípios do Estado Democrático de Direito. Em vista à manutenção e disciplina deste estado, o qual presa pelo dever de honestidade funcional, e seus ditames, a Lei de Improbidade, Lei nº. 8.429/92, tomou forma e regulou a sanção a ser aplicada pela atuação dos agentes públicos frente as possíveis consequências realizadas por atos ímprobos praticados. A referida Lei no seu Art. 11, caput, resta evidente a preocupação em lidar contra os atos que atentem aos princípios da administração pública, sendo estes por ação ou omissão de seus agentes, impedindo que violem os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições. Sendo tais atos rechaçados desde a concepção da Magna Carta, onde este cobrou obediência à moralidade e probidade administrativas, consoante com dicção do Art.37, caput e §4º, onde transcreve-se: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos 10 Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. (...) § 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. A Lei nº. 8.429/92, alinha e organiza os atos de improbidade em quatro modalidades, o enriquecimento ilícito, prejuízo ao erário, atos contra os princípios que regem a administração Pública e atos ímprobos decorrentes de concessão ou aplicação indevida de benefício financeiro ou tributário. De maneira didática iremos caracterizar brevemente cada modalidade dessas e evidenciar o nexo de causalidade com a prática do ilícito: • A caracterização do enriquecimento ilícito esculpido no Art. 9º da lei é exercido quando o agente público tenha recebido vantagem patrimonial indevida, através de um comportamento ilícito, e no momento da conduta ele teve conhecimento da ilicitude do fato (dolo), este que é o liame entre a conduta do agente e a vantagem patrimonial. • A coerção prevista no Art. 10º, da referia lei, visa gerar consequência o sujeito passivo da improbidade administrativa, que causa lesão ao erário, sendo caracterizado por qualquer conduta ilegal que ofenda a integridade do patrimônio público. • A Lei Complementar 157/16, incluiu uma nova seção na Lei 8.429/92, criando uma nova espécie de ato de improbidade. Este que está prescrito no Art. 10-A desta mesma legislação, o qual tem a função de apresentar punição a concessão indevida de benefício fiscal ou tributário, pelo agente público, principalmente gestores públicos os quais são responsáveis pela fixação de alíquotas do ISS e respectivos benefícios financeiros ou tributário. • Por fim, temos o trazido no Art. 11 da lei em comento, que denota as consequências sobre a improbidade que está associada a violação aos princípios que regem a atividade estatal. O instrumento preparatório de coerção aos agentes que afrontam os artigos supra da Lei nº. 8.429/92, atos considerados ilícitos a condução do bem público, é a “ação de improbidade administrativa”, tipo de ação que visa apurar e punir a práticade ilícitos na administração pública direta e indireta, além de recuperar os prejuízos em favor dos cofres públicos. 11 A ação de improbidade administrativa tem natureza, contornos e regramento próprios, não se confundindo com aqueles específicos das ações civis públicas em geral, por exemplo, a ação de improbidade administrativa mesmo se aproximando da ação civil pública quer seja pela busca dos interesse coletivos e difusos, quer seja pela busca da moralidade, tem um objetivo a mais, que seria a perda de cargos públicos e/ou de direitos políticos, bem como restrições para contratações futuras de particulares com o Poder Público. Cabe lembrar que mesmo a lei não dizendo expressamente, poderá ocorrer a acumulação de atos de improbidade em pelo menos duas, ou mesmo em todas as três categorias discriminadas, ou seja, um mesmo ato de improbidade pode gerar enriquecimento ilícito de alguém, causar prejuízo ao erário e violar princípios da administração pública. Por exemplo: um funcionário público que aceite suborno para assinar um contrato superfaturado, neste caso verifica-se enriquecimento ilícito do funcionário e do contratante, prejuízo ao erário pelo superfaturamento e observa-se nitidamente a violação a vários princípios da administração pública. E fato que a desonestidade do agente público, como elemento da improbidade, deve ser entendida em seu sentido amplo. Equivale lembrar, que a desonestidade se caracteriza quando o agente sabe ou devia saber da ilicitude de sua ação ou omissão. Isso porque existem atos de improbidade administrativa provenientes de negligência, imprudência ou imperícia. Portanto, é necessário que o agente público, ou o equiparado, atue com “dolo” ou “culpa”. Nesse diapasão, o ato de improbidade também é assim caracterizado quando, o agente embora não tenha intenção de lesar, deixa de observar o dever de cuidar da res pública. 6. Ação Civil Pública em contraponto a Ação de Improbidade Administrativa A Lei nº 8.429, de 1992, foi editada para regular especificamente as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de cargo público, trazendo em seu corpo normativo disposições de natureza penal e complementarmente as sanções e procedimentos administrativos e civis. Noutro sentido, a Lei nº 7.437/85, Lei da ação civil pública, tem em sua concepção à defesa do meio ambiente, do consumidor, dos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, dos direitos difusos 12 e coletivos e da ordem econômica (Artigo 1º), portanto, não tratando especificamente de improbidade administrativa. É de se esperar diante a discussão doutrinária, se a ação prevista na Lei nº 8.429/92 seria uma ação civil ou penal. Acredito que a resposta leva a consequências processuais distintas, principalmente no que tange à fixação da competência. Arnoldo Wald e Rodrigo Garcia da Fonseca (2006), entendem que embora a ação prevista na lei de improbidade administrativa seja formalmente civil, tem ela repercussões quase-penais, haja vista a gravidade das sanções aplicáveis ao réu. Diverge desse entendimento Fábio Konder Comparato, segundo o qual afirma que, se por conseguinte, a própria Constituição distingue e separa a ação condenatória do responsável por atos de improbidade administrativa às sanções por ela expressas, da ação penal cabível, é, obviamente, porque aquela demanda não tem natureza penal. De fato, verificamos que a parte final do art. 37, § 4º, da CF/88, realmente distingue a ação de improbidade da ação penal, já que ressalva a possibilidade desta última ser proposta independentemente da primeira, a qual passa a ter um nítido caráter extrapenal. Senão vejamos: §4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e na gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. (grifo meu) Veja que a autoria da ação de improbidade, via de regra, será do Ministério Público (na qualidade de substituto processual) ou mesmo a própria pessoa jurídica lesada, qualquer uma das listadas no Art. 1º da lei nº 8.429/92, conforme for o caso, a exemplo, a União, os Estados, os Municípios ou uma empresa da administração indireta ou fundacional com participação e custeio do erário em mais de cinquenta por cento do patrimônio ou da sua receita anual, neste caso admite-se a atuação em litisconsórcio com o ministério público, que na qualidade processual de custos legis, deverá intervir, sendo a sua ausência caso de nulidade do processo (art. 17, § 4º). Lembrando que a Fazenda Pública poderá promover as ações eventualmente cabíveis para assegurar o integral ressarcimento do dano sofrido pelo patrimônio público (Art. 17, § 2º). A fase persecutória da ação de improbidade, bem como a da ação civil pública, carece de um inquérito os Art.(s) 14 e 15 da Lei nº 8.429/92 disciplinam o inquérito prévio à propositura da ação de improbidade 13 administrativa, procedido pela própria pessoa jurídica interessada ou pelo Ministério Público, como disciplina o Art. 22, do mesmo diploma legal. Mesmo sendo disciplinado pelos artigos em comento, o STJ já se pronunciou em algumas demandas sobre a falta de obrigatoriedade da existência de inquérito anterior a ação de improbidade, com legação de que os réus terão a oportunidade de exercício do amplo direito de defesa na própria ação, em juízo. Como trazido no julgado abaixo: EMENTA: APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EX-PREFEITO DO MUNICÍPIO DE MIRADOURO. PRELIMINAR. INQUÉRITO CIVIL PÚBLICO PRÉVIO. DESNECESSIDADE. MÉRITO. DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. REALIZAÇÃO DE CIRURGIA. SUPOSTA VIOLAÇÃO A PRINCÍPIOS. ELEMENTO SUBJETIVO NÃO EVIDENCIADO. ATO DE IMPROBIDADE NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA CONFIRMADA. - Na esteira do entendimento do STJ revela-se dispensável a instauração prévia de inquérito civil à ação civil pública para apuração de eventual prática de ato de improbidade administrativa - A configuração do ato de improbidade por ofensa a princípios depende da comprovação do elemento subjetivo, consubstanciado no dolo, na desonestidade e na má-fé do agente público em cometer um ato ímprobo - O descumprimento de ordem judicial constitui ato que, inegavelmente, exige forte e grave censura, mas é ditado, muitas vezes, pelo despreparo intelectual e pelas carências de uma gestão ineficiente que caracteriza o nosso universo municipal, às vezes premido pelos orçamentos da saúde e que não são nem mesmo regularmente atendidos pelo Estado e pela União, fato que geraria excesso se levasse à conclusão de constituir, por sua própria natureza, um ato de improbidade, que a doutrina e jurisprudência qualificam para acatar. As deficiências pessoais de servidores e as pressões orçamentárias explicam muito dessas negativas, que ocorrem, sem raridade, também no âmbito do Estado e da União, como se constata todos os dias nos postos de saúde do País. No contexto, há mais irregularidade do que efetivo dolo ou vontade consciente de não atendimento, ou mesmo ilegalidades formais, mas sem o exigido desvio de caráter que constrói o ato ímprobo - No caso, muito embora esteja constatada a censurável omissão praticada pelo Chefe do Poder Executivo Municipal, não ficou comprovada a sua intenção dolosa, motivo pelo qual não se configura ato de improbidade. (grifo meu) (TJ-MG - AC: 10421150011870001 MG, Relator: Wander Marotta, Data de Julgamento: 10/09/0019, Data de Publicação: 17/09/2019) 14 Vejamos que é inegável perceber que a ação civil pública e a ação de improbidade administrativa são procedimentos especiais distintos, com finalidades e regras de legitimação (tanto ativa, como passiva) diversas. A ação de improbidade administrativa tem âmbito de atuação bem mais restrito, pois se destinaà tutela de um particular interesse que é a probidade administrativa, porquanto a ação civil pública, tem motivações de proteção de interesses transindividuais. No entanto, apesar dessa (necessária) distinção, esses remédios processuais de busca pela manutenção dos interesses da coletividade, não podem ser tratados de forma estanque, muito pelo contrário, elas se entrelaçam em algumas situações de maneira subsidiaria uma da outra, é o caso em que o STJ reconheceu que a ação civil pública é o meio adequado para que o Ministério Público obtenha a recomposição do dano ao erário por ato de improbidade, ainda que a pretensão à aplicação das demais sanções esteja prescrita conforme os artigos da Lei n. 8.429/92. É como aduz o julgado abaixo: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LEGITIMIDADE - MINISTÉRIO PÚBLICO - PEDIDO DE REPARAÇÃO DE DANOS CAUSADOS AO ERÁRIO - POSSIBILIDADE - PROVA DE DANO MATERIAL AO ERÁRIO - DESNECESSIDADE. 1. Não se conhece do recurso especial nos pontos em que não foram preenchidos os seus pressupostos de admissibilidade. 2. É perfeitamente cabível na ação civil pública, regulada pela Lei 7.347/85, pedido de reparação de danos causados ao erário pelos atos de improbidade administrativa, tipificados na Lei 8.429/92. Precedentes desta Corte. 3. Para a configuração do ato de improbidade não se exige que tenha havido dano ou prejuízo material, restando alcançados os danos imateriais. 4. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, improvido. (STJ - REsp: 541962 SP 2003/0101035-8, Relator: Ministra ELIANA CALMON, Data de Julgamento: 27/02/2007, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 14/03/2007 p. 235) 7. Relação jurídica entre ação civil pública e ato de Improbidade Para construir a relação entre os dois institutos, vale a pena lembrar que tanto a ação civil pública quanto o ato de improbidade administrativa têm lei específica, sendo, no caso, a ação civil pública a Lei 7.347/85 e de Improbidade Administrativa a Lei 8.429/92. 15 A Lei de ação civil pública tem como objetivo a reparação de dano enquanto a de improbidade objetiva a responsabilização do agente. Outra diferença são os legitimados a propor ação civil pública: o Ministério Público, a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios, a Defensoria Pública, as Autarquias, as empresas públicas e as sociedades de economia mista. Podem, ainda, propor a ação civil pública as associações que tenham como uma de suas finalidades a proteção ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, ao meio ambiente e também ao patrimônio, estético, artístico, turístico, paisagístico e histórico. Contrariamente à pluralidade de autores que tem na ação civil, a propositura de ação por ato de improbidade administrativa, somente dá direito as pessoas jurídicas interessadas e o Ministério Público fazê-la. Nessa estreita relação podemos perceber que o Ministério Público pode tornar-se protagonista em ambas as ações, seja por propositura, seja como custas legis. O fato é que deste estudo extrai que majoritariamente as cortes tem entendido que que a ação civil pública tem como espécie o ato de improbidade administrativa. Tal afirmação fica evidente quando trazemos à baila o julgado do ministro Mauro Campbell Marques, do STJ, que transcrevo: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AO ERÁRIO. RESSARCIMENTO. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. MINISTÉRIO PÚBLICO. DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO. SÚMULA 329/STJ. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. 1. O Ministério Público é parte legítima para ajuizar ação civil pública objetivando tutelar o patrimônio público, bem como apurar eventual ato de improbidade administrativa cometido por prefeito de município. 2. Precedentes desta Corte. 3. Recurso especial não provido. (STJ - REsp: 874618 SP 2006/0181072-8, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 01/10/2009, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: --> DJe 15/10/2009) Também é possível observar a adoção da aplicação da ação civil pública em referência à ação principal, prevista no Art. 17 da Lei de Improbidade Administrativa, conforme consta em ementa de acórdão abaixo: 16 Ação civil pública de improbidade administrativa e de ressarcimento de danos intentada contra Vereadores e ex- Vereadores pelo recebimento de diárias e transportes indevidos, e de remuneração sem o desconto por faltas injustificadas a sessões do Legislativo, cumulada com pedido de decretação de afastamento das funções e inelegibilidade. Legitimação ativa do Ministério Público, afirmada expressamente na Constituição (art. 129, III), ou nela implicitamente inscrita (arts. 129, IX, e 58, § 4º), e nas Leis 8.429/92 (arts 15, 17, §§ 3º e 4º, e 22) e 8. 625/93 (art. 25, IV, letra b). Sentença extintiva fundamentada em ilegitimidade ativa. Recurso provido, reconhecendo-se no caso o cabimento da ação, a legitimação do Ministério Público e a necessidade de participação do Município como litisconsorte. (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 14.02.96, publicado na RJTJRGS 175/623, relator Des. Élvio Schuch Pinto) 8. Considerações finais Dou início as considerações finais levando em consideração a amplitude dos institutos jurídicos tratados neste estudo, enfatizando que este trabalho acadêmico abordou o tema de ação civil pública e ato de improbidade administrativa, por entender à grande importância desses elementos para a tutela dos direitos difusos “coletivos”, bem como a preservação do interesse público na atuação dos seus agentes para com a o bem público. Teve como problemática quais as diferenças conceituais e de aplicação entre ação civil pública e ato de improbidade administrativa, visando esclarecer quais os requisitos que cada uma necessita para sua caracterização tendo como objetivo específico, mostrar o ponto onde o ato de improbidade administrativa se torna objeto da ação civil pública. Após o conhecimento acumulado dos estudos realizados, temos propriedade para inferir que a ação civil pública e a lei de improbidade administrativa possuem leis distintas, o que deveria fazer com que as duas fossem independentes, porém, como a lei é interpretativa, vários doutrinadores passaram a entender que o ato de improbidade administrativa era um objeto da ação civil pública e não um ato independente, já que dispõe de características semelhantes e complementares. 17 9. Referências Bibliográficas GARCIA, Emerson, Improbidade Administrativa/ Emerson Garcia, Rogério Pacheco Alves. – 8ª ed. 2014. PEGORARO, Luiz Nunes. Controle jurisdicional dos atos administrativos discricionários. Campinas: Servanda, 2010 Artigo. A AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA CONTRA O PRESIDENTE DA REPÚBLICA E A PERDA DA SUA FUNÇÃO PÚBLICA, publicado na revista da OAB Olinda – PE em 14.11.2019. Luiz Nunes Pegoraro e Ana Julia Ramos Padua. SOUZA, Motauri Ciocchetti de. Ação civil pública e inquérito civil. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. 211 p. CRETELLA JÚNIOR (1997). CRETELLA JÚNIOR, José. O "Desvio de Poder" na Administração Pública. 4ª Edição. Editora Forense. Rio de Janeiro.1997. WALD, Arnoldo e FONSECA, Rodrigo Garcia da. Ação de Improbidade Administrativa. Disponível em: http://seer.uenp.edu.br/index.php/argumenta/article/view/123 Acesso em 05/05/2020. LOBO, Arthur Mendes - a ação prevista na lei de improbidade administrativa – competência, legitimidade, interesse de agir e outros aspectos polêmicos - PUC/MG, Brasil, Artigo aprovado em 25/08/2008. BRASIL. Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985. Disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (VETADO) e dá outras providências. Brasília, 1985. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L7347orig.htm. 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