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Saúde Mental e Espiritualidade

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Saúde Mental e Espiritualidade: os limites entre patologia e vivências religiosas 
							 	Camila Araújo ¹
								Katiane Silva ²
							 Carla Lima³
Resumo: O objetivo deste artigo foi compreender e diferenciar as psicoses das experiências espirituais no contexto dos transtornos mentais. Levando em consideração a prevalência de delírios religiosos em pacientes psiquiátricos entende-se que é fundamental a distinção entre a patologia e a crença religiosa do paciente. Este estudo revisou artigos científicos de relevância no que se refere à saúde mental e espiritualidade, e assim concluiu que esta integração gera fatores positivos para os pacientes psiquiátricos no que diz respeito ao diagnóstico e na intervenção terapêutica, confirmando a necessidade do preparo dos profissionais na distinção de sintomas patológicos de espirituais para a eficácia no manejo clinico.
Abstract: The aim of this article was to understand and differentiate psychoses from spiritual experiences in the context of mental disorders. Taking into account the prevalence of religious delusions in psychiatric patients it is understood that the distinction between the pathology and the religious belief of the patient is fundamental. This study reviewed scientific articles of relevance regarding mental health and spirituality, and concluded that this integration generates positive factors for psychiatric patients with regard to diagnosis and therapeutic intervention, confirming the need to prepare professionals in the distinction of pathological symptoms of spiritual for efficacy in clinical management.
Palavras chave: “psicologia e espiritualidade”, “saúde mental e espiritualidade”, “experiências espirituais e psicoses”, “diagnóstico diferencial entre patologia e espiritualidade
1. Introdução
A relação entre espiritualidade e saúde mental foi ignorada por muito tempo na intervenção ao paciente psiquiátrico. Segundo Lukkof (1992) psicólogos e psiquiatras consideravam experiências espirituais como transtornos mentais e o envolvimento religioso como um marcador de patologia ou imaturidade psicológica. Espiritualistas de diferentes linhas religiosas têm desafiado profissionais da saúde mental na compreensão e diferenciação entre uma experiência espiritual saudável e um transtorno psicótico com conteúdo religioso.Freqüentemente pacientes psiquiátricos apresentam em seus quadros algum tipo de alucinação ou delírio, muitas vezes de cunho religioso e espiritual.Este tema ainda é emergente nos estudos das relações entre a saúde mental e a espiritualidade e um conhecimento mais profundo é importante, pois experiências espirituais podem ser confundidas com psicoses, visto que envolvem eventos de natureza visionária e auditiva, interpretados facilmente como sintomas alucinatórios de esquizofrenia.
Em alguns casos a religião pode contribuir na produção de sintomas, em outros ela integra o paciente ao seu convívio social, motivando-o na aderência e continuidade do tratamento. Diante dessa colocação estudos afirmam a influência da espiritualidade na saúde física e mental e seu impacto na intervenção clínica (Volcan et al, 2003). Diante dos diferentes quadros clínicos e a variedade dos sintomas entende-se que às necessidades específicas do sujeito devem ser trabalhadas de forma sistemática. A complexidade envolvida nesse tema leva a necessidade de diferenciação entre patologia e vivência religiosa a fim de um manejo adequado dessas experiências, utilizando os fatores espiritualidade x patologia na prática clínica e em todas as fases do tratamento psíquico. 
2. Método
Trata-se de um trabalho de revisão teórica sobre o tema.Como metodologia realizou-se um levantamento de periódicos e buscas em bancos de dados eletrônicos. As pesquisas foram realizadas no PubMed, Scielo, Capes, ferramentas de grande utilização para buscas de referências. Utilizou-se as expressões, como palavras chave “psicologia e espiritualidade”, “saúde mental e espiritualidade”, “experiências espirituais e psicoses”, “diagnóstico diferencial entre patologia e espiritualidade”, esta resultou na escolha de artigos específicos, os quais trouxeram conteúdos significativos para o processo de estudo e desenvolvimento deste artigo. A pesquisa teve como foco periódicos que relacionados aos aspectos espirituais e psicológicos trouxeram dados importantes para a prática do psicólogo no contexto psiquiátrico evidenciando as diferenças entre os conteúdos relacionados às vivências espirituais e as psicoses presentes em diferentes patologias.
3. ESPIRITUALIDADE X PSICOSES: COMO DIFERENCIA-LAS?
Antes do século XX, a espiritualidade era entendida como uma influência negativa para o indivíduo em sua saúde mental, a experiência mística e outras formas de manifestações religiosas eram associadas a histeria (Appignanesi 2009 citado por Aminhana et tal, 2009), sendo a religião vista como causadora de neuroses e sintomas psicóticos. Freud (1962 ,citado por Almeida-Moreira et al, 2009) afirmou que “a religião seria uma neurose obsessiva universal da humanidade”. A teoria psicanalítica buscou esclarecer as motivações psíquicas da experiência religiosa. Freud propõe ao longo de suas obras elaborar uma interpretação psicanalítica da psicogênese e da natureza do fenômeno religioso, e também analisar o significado dos rituais e do comportamento religioso. 
Assim, para Freud (1962, citado por Moreira-Almeida et al, 2009) a religião funciona como uma neurose coletiva, isto é, uma dependência que o ser humano tem para com a figura do pai e da mãe, que ele projeta para o grande pai e grande mãe que seria Deus. Tem a religião uma função terapêutica, uma neurose que evita uma psicose, que evita uma destruição do sentido de vida, que ilude o ser humano. 
Janet (1889 citado por Moreira-Almeida et al, 2009) defende a existência de uma “segunda consciência” subjacente à corrente normal de pensamentos. Os fenômenos diversos como catalepsias, escritas automáticas, possessões, alucinações seriam formas de “desagregação psíquica”, manifestações secundárias que sobrepõe a consciência. Janet descartava origem paranormal para os fenômenos citados. O fenômeno mediúnico seria “quase sempre um neprovata quando não francamente histérico” (p.382), e que a mediunidade surgiria da histeria e alienação, sendo um sintoma e não uma causa de patologia (Janet, 1889, p.382-3). Janet afirmava que a desagregação psíquica era decorrente de traumas vivenciados pelo individuo, sendo assim pessoas saudáveis não teriam essa experiência. Buscava os sintomas histéricos em experiências traumáticas vivenciadas por seus pacientes que foram negligenciados pela personalidade primária, seu objetivo era restabelecer a unidade da consciência. 
Nesta época falava-se muito nos fenômenos de transe, possessão e as práticas mediúnicas que geravam posturas diversificadas, muitos defendiam a idéia de fraude, chegando a ser considerada causa de alienação mental. A partir da metade do século XX a religião passou a ser entendida como uma possível colaboradora no processo de tratamento dos considerados doentes mentais (Almeida,Oda & Dalgalarrondo,2007).
A complexidade existente entre a distinção de experiências religiosas e patologias foi ganhando espaço, exigindo uma abordagem mais humana e mais profunda. Pesquisadores contemporâneos passaram a explorar o tema, constatando que diferente do que se pensava a religião e espiritualidade atribuem um aspecto positivo para o indivíduo, atuando de forma protetiva em transtornos como depressão, ansiedade, abuso de drogas e álcool, bem como doenças físicas como câncer e cardiovasculares. 
Dalgalarrondo (2008), sobre esse tema, questiona o limite entre religiosidade e psicose, referindo que:
“não existe um limite nítido, e que isto também depende da cultura e das idéias prevalentes, sendo difícil distinguir as crenças religiosas culturalmente sancionadas de sintomas psicóticos, pois os delírios religiosos existem em um continuum entre as crenças normais de indivíduos saudáveis e as crenças fantásticasde pacientes psicóticos” (p.440). 
Um dos autores que estudou os possíveis efeitos benéficos da religiosidade foi William James (1991, citado por Moreira-Almeida,2011), um pioneiro a estudar psicologia e religião, que investigou as experiências místicas e apurou que quando vivenciadas em episódios breves, estas teriam efeitos benéficos para os indivíduos que as vivenciavam. Gradativamente a religião passou a ser aceita e reconhecida como fator importante para a promoção da saúde mental e no tratamento de doenças psíquicas. O autor afirma ainda que “para o psicólogo, as tendências religiosas do homem hão de ser, pelo menos, tão interessantes quanto quaisquer outros fatores pertencentes à sua constituição mental”(página).
Segundo Foucault (2004) o conceito de espiritualidade refere à constituição da subjetividade do sujeito, o que implica em um conjunto de buscas, práticas e experiências como purificações e modificações da existência. O termo “espiritualidade” surgiu como um fenômeno individual em busca de um sentido para a existência. “Sentido de conexão com algo maior que si próprio, que pode ou não incluir uma participação religiosa formal” (Saad et al., 2001; Volcan, 2003).
Depois da compreensão da necessidade de considerar que a espiritualidade é uma dimensão importante na subjetividade do sujeito, outros estudos foram realizados no intuito de fazer a diferenciação entre uma espiritualidade saudável e psicótica. Grof e Grof (2016), com base em suas experiências clínicas, criaram o conceito de "emergências espirituais". Esses autores apresentaram essas experiências com um duplo significado, possível pelos diferentes significados de Spiritual Emergencee Spiritual Emergency. Spiritual Emergence refere-se à eclosão de uma experiência espiritual que surge sem acarretar perturbação das funções psicológicas. Já a Spiritual Emergencyé a ocorrência descontrolada da experiência espiritual com problemas dos funcionamentos psicológico, social e ocupacional.
Autores contemporâneos passaram a estudar com maior profundidade a relação entre o espiritual e o patológico. Grof e Grof (1990) realizaram uma detalhada pesquisa com objetivo de diferenciar as manifestações espirituais de transtornos mentais. Segundo esses autores, as manifestações espirituais tendem a ser suaves e ausentes de sensações indesejáveis ou causadoras de algum desconforto, as mesmas preservam os indivíduos de sofrimento e prejuízos, sendo assim estimulam a mudança de comportamento através da aceitação, gerando assim uma expectativa positiva possibilitando a mudança de compreensão de si mesmo e do mundo. Quando às experiências tem ligação com algum transtorno mental, as mesmas tendem a serem intensas, provocando prejuízos, com sensações de desconfortos físicos, geram atitude ambivalente com perturbações diárias, induzem a resistência à mudança de comportamento provocando assim conflitos na consciência de si e do mundo (Grof e Grof, 1990).
Partindo destas definições é possível esclarecer a identificação e diferenciação entre as experiências espirituais e sintomas psicóticos. Estudos mostram a dificuldade apresentada pelos profissionais da saúde em reconhecer e interpretar as experiências psicóticas vivenciadas pelos pacientes, não considerando a história religiosa na avaliação do paciente .
Em um levantamento realizado pela OMS envolvendo 256.445 pessoas em 52 países em indivíduos que apresentavam sintomas psicóticos não diagnosticados, 12,5% da população mundial e 32% dos brasileiros referiram vivência psicótica sem associar a estado de sonolência, sob influência de álcool ou drogas, 10% dos casos apresentaram vivências psicóticas associadas a um diagnóstico de psicose (Nuevo et al 2010 citado por Moreira-Almeida 2011). O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM IV) reconhece que indivíduos possam apresentar experiências religiosas ou espirituais sem caracterizar um transtorno mental e incluiu a categoria “problemas religiosos e espirituais” com o objetivo de estimular pesquisas recorrentes ao tema que expandam o conhecimento no que refere a distinção entre experiências religiosas espirituais e transtornos mentais, esta categoria se mantém no DSM V.
Comumente delírios religiosos, alucinações e transes (possessões) são presenciados por profissionais no tratamento de pacientes psiquiátricos, estudos buscam estabelecer critérios mais claros para facilitar a diferenciação destas relações. Segundo Lewis (1989) existe a possessão saudável e a patológica, testemunhadas com freqüência no contexto cultural e no contexto psiquiátrico. A possessão saudável, segundo ele, ocorre em um tempo delimitado, em episódios específicos dentro do ambiente cultural que lhe dá o significado. Já a possessão ou transe patológica, tende a ser desorganizada, crônica,ocorrendo de forma descontrolada e incompatível com o ambiente a qual o indivíduo esteja integrado. Cardeña et al.52, utilizando os conceitos de Lewis(1989) , refere que a possessão não patológica ocorre através de uma possível predisposição biológica, que foi construída com fatores culturais organizados, permitindo assim que indivíduos vivenciem rituais controlados de possessão. Importante salientar então que é nesta premissa que se pode compreender os transes relacionados a mediunidade, vivenciados em religiões como Espiritismo, Umbanda e Candomblé. Na possessão (transe) patológica o autor afirma que se dá também através de predisposição biológica, porém quando impactadas por traumas físicos, sexuais ou emocionais, geram disfunções na identidade, onde o indivíduo encontra dificuldade em controlar, e passam a manifestar sofrimento e prejuízo psicológico, afetando seu o funcionamento social.
A fim de auxiliar na distinção entre experiências espirituais e transtornos mentais, Jackson e Fulford (1997 citado por Dalgarrondo, 2008, p.169) identificaram sintomas que diferenciam uma experiência espiritual e um transtorno mental que serão apresentados na tabela a seguir. 
 Diferenciação entre experiências espirituais e sintomas psicopatológicos
	Características
	Experiências espirituais
	Sintomas Psicopatológicos
	 Conteúdo das vivências
	Os conteúdos seguem uma doutrina religiosa: são aceitáveis pelo subgrupo cultural.
	O conteúdo é bizarro: geralmente reinvidica um status ou a posse de poderes especiais.
	Características das experiências sensoriais (ilusões, alucinações, visões, vozes)
	Os elementos sensoriais são mais “intelectuais”; são sentidos como “conteúdos mentais”.
	Os elementos sensoriais são percebidos como “corpóreos”, dão a sensação de serem percepções reais.
	Modalidade sensorial das vivências
	Predominantemente alucinações e ilusões visuais.
	Predominantemente alucinações auditivas.
	Grau de certeza das vivências
	As crenças se formam com a possibilidade da dúvida.
	As crenças são “incorrigíveis”, geralmente há certeza absoluta.
	Insight
	Às vezes insight presente, às vezes ausente.
	Freqüentemente insight ausente.
	Duração da vivência
	Duração Breve.
	Duração longa.
	Controle volitivo
	Há, por parte do sujeito, um grau de controle e direcionamento sobre as vivências.
	São experiências vivenciadas sem qualquer controle por parte do sujeito.
	Orientação em relação a outras pessoas
	Vivências são orientadas em direção a outras pessoas.
	Vivências são quase sempre orientadas para si (auto-orientadas).
	Significado para a vida do sujeito
	Sentido de “auto-realização” experiências que “alargam” a vida, produzem “frutos”.
	Experiências geralmente desintegrativas, que produzem a deterioração do funcionamento vital do sujeito. 
 (continue)
	Positividade/negatividade
	As vivências têm, de modo geral, sentido “positivo” para a vida do sujeito.
	As vivências têm, de modo geral, sentido “negativo” para a vida do sujeito.
	Implicação na “ação” do sujeito
	São experiências nas quais o sujeito se percebe como “agindo”, produzindo sua vida.
	São experiências nas quais o sujeito se percebe “sendo agido”, vive passivamente a experiência.
	Relaçãocom sintomas psicopatológicos em outras esferas da vida
	São experiências “isoladas”, que não se articulam com outros sintomas de transtornos mentais.
	Geralmente não são vivências isoladas. Ao lado do delírio ou da alucinação mística, há outros sintomas psicóticos.
	Estilo de vida e de personalidade do sujeito
	Tanto o estilo de vida como a personalidade do sujeito revelam religiosidade presente e antecedendo a vivência.
	O estilo de vida e a personalidade indicam alterações e deterioração associadas a transtornos mentais.
	Comunicação da experiência com as outras pessoas
	Sujeito busca relatar sua experiência para outras pessoas, sobretudo de seu grupo cultural.
	Sujeito é, geralmente, reticente em relatar e discutir essas experiências.
 Fonte : Dalgalarrondo, Paulo Religião, psicopatologia e saúde mental / Porto Alegre : Artmed, 2008.
Diante das evidências apresentadas e as diferenciações citadas, é possível perceber que o âmbito espiritual é um componente importante nos cuidados referentes a saúde mental, sendo assim é de fundamental importância que os profissionais possam integrá-lo na prática clínica identificando e distinguindo o espiritual do patológico. Independentemente das relações existentes entre saúde, religião e doença a crença do paciente deve ser levada em consideração ao realizar um diagnóstico bem como sua intervenção.
Discussão dos resultados:
Percebe-se que há um avanço significativo na compreensão e percepção da espiritualidade no contexto da psiquiatria, embora esta prática ainda seja pouco evidente no âmbito clinico é preciso reconhecer que este avanço é uma importante ferramenta no cuidado ao paciente. Este olhar torna-se uma estratégia na busca do bem-estar de forma integral, a interligação entre espiritualidade e a saúde mental busca favorecer a autonomia e reabilitação do paciente, sendo assim fundamental no contexto clinico. Para que esta interligação seja saudável é preciso entender o sentido como o paciente recebe e interpreta a experiência espiritual em sua vida.
A saúde mental exige um olhar que inclua os fatores bio-psico-social-espiritual do indivíduo, sendo levados em consideração impactam de forma positiva diretamente no cuidado clinico do paciente. O reconhecimento das crenças religiosas ou espirituais auxilia no tratamento psiquiátrico levando os profissionais a compreender melhor seus pacientes, refletindo diretamente de forma efetiva no diagnóstico, evolução do tratamento e no manejo destinado aos mesmos. Sabe-se que as experiências espirituais afetam de forma positiva ou negativa a saúde mental, algumas características presentes nas vivências espirituais são semelhantes a sintomas apresentados em pacientes psicóticos e dissociativos. 
Características como visões (alucinações visuais), escutas de vozes (alucinações auditivas), transe (dissociação da identidade) entre outros, são comumente presentes na esquizofrenia, transtorno delirante, quadros maníacos, depressivos psicóticos e em outras psicoses estes devem ser avaliados considerando os interesses pessoais, núcleo familiar e grupo social (incluindo as experiências espirituais e religiosas)do paciente. Alterações de consciência, rompimento da fronteira entre o self e o objeto, alteração do sentido de tempo e conexão com o divino, são características vivenciadas tanto nas experiências religiosas quanto nas psicoses com delírios religiosos. Os delírios religiosos são um continuum correlacionado entre as crenças de indivíduos saudáveis e as fantasias de pacientes psicóticos, estes apresentam outros sintomas de doença mental e nenhuma funcionalidade positiva (Siddle et AL., 2002). 
Critérios pesquisados por diferentes autores, a fim de distinguir os sintomas psicóticos de experiências espirituais, buscam elucidar profissionais na diferenciação entre a patologia e espiritualidade a fim de identificar a que tipo de experiência se refere determinadas sintoma quais suas conseqüências para o paciente. 
Jackson e Fulford (1997) destacam os sintomas que diferenciam a psicose de experiências espirituais: a vivência espiritual geralmente é destinada aos outros, com episódios de curta duração, é vivida de forma intelectual, o indivíduo apresenta dúvida sobre a real existência, tem insight preservado garantindo o entendimento sobre a experiência, é controlada, mantém o contato com a realidade, leva a valorização da vida, gera crescimento pessoal, estes critérios levam o indivíduo classificar como uma experiência emocionalmente positiva. No entanto a experiência psicótica leva o indivíduo a centrar-se em si mesmo, tem longa duração, existe certeza sobre a veracidade do sintoma mesmo com evidências contrárias, há ausência de insight, de controle e contato com a realidade, não apresenta consciência em relação a compreensão dos outros, leva à desvalorização da vida comumente através da ideação suicida, seu conteúdo é desconhecido no contexto social vivido pelo indivíduo sendo emocionalmente uma experiência negativa acarretando prejuízos na vida pessoal.
É importante uma avaliação minuciosa ao que diz respeito ao diagnóstico diferencial. Diante da inserção do indivíduo na saúde mental é imprescindível avaliar distintos cenários, não apenas nos cuidados psíquicos, mas na rede de apoio social e familiar que o envolve, buscando identificar a crença religiosa/ espiritual e sua relevância na vida do paciente. Koenig e Larson (2011) concluíram uma interligação positiva entre a espiritualidade e a saúde mental, referem através de estudos que indivíduos pertencentes a alguma crença religiosa são os mais saudáveis , com menor índice de transtornos mentais e sintomas patológicos. 
Conclusão
A espiritualidade é um marco da história das civilizações e deve ser reconhecida como elemento importante na construção do ser humano no que refere as questões de significado e sentido de vida. Ela auxilia no bem-estar físico e psicológico, tornando-se uma ferramenta positiva na promoção da saúde. A espiritualidade se apresenta intensamente em fenômenos patológicos através de alucinações, delírios religiosos e dissociação da identidade entre outros. Assim é imprescindível a diferenciação entre fenômenos psicóticos e experiências espirituais, esta ocorre através de parâmetros que distinguem os sintomas e devem servir para precisão no diagnóstico, evitar avaliação distorcida e preconceituosa de experiências espirituais saudáveis como patológicas, auxiliar clínicos no processo psicoterapêutico e na compreensão dos papéis positivos e negativos que a espiritualidade desempenha na vida do sujeito. Através dos resultados apresentados neste trabalho é possível concluir que existe a necessidade de estudos que auxiliem no preparo do profissional para a compreensão e elaboração de estratégias que possibilitem a pratica clínica, sobretudo pesquisas mais aprofundadas sobre o tema são de extrema relevância.
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