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EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Programa de Pós-Graduação EAD UNIASSELVI-PÓS Autoria: Carolina dos Santos Maiola CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Ivan Tesck Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Prof.ª Bárbara Pricila Franz Prof.ª Tathyane Lucas Simão Prof. Ivan Tesck Revisão de Conteúdo: Graciele Alice Carvalho Adriano Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Copyright © UNIASSELVI 2018 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. 370 M217e Maiola, Carolina dos Santos Educação integral e educação inclusiva / Carolina dos Santos Maiola. Indaial: UNIASSELVI, 2018. 129 p. : il. ISBN 978-85-69910-88-6 1.Educação. I. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. Carolina dos Santos Maiola Mestre em Educação pela Universidade Regional de Blumenau; especialista em Psicopedagogia Institucional e Educação Especial Inclusiva. Recebeu o prêmio Mérito Universitário Catarinense em pesquisas relacionadas à inclusão de pessoas com deficiência no ensino regular. Atua como professora no atendimento educacional especializado; tutora-externa em cursos de educação a distância Uniasselvi e nos cursos de especialização em Educação Especial Inclusiva, Psicopedagogia e Gestão Escolar. Desenvolve pesquisas relacionadas à Deficiência visual, ao transtorno do espectro autista e à formação de professores. Publicou: Práticas inclusivas na escola: o que os alunos têm a dizer sobre isso?; Os dizeres dos acadêmicos com deficiência sobre o seu processo de inclusão na universidade; Das relações e dos dizeres: os sentidos de escola inclusiva para colegas e aluna com deficiência visual; A criança com paralisia cerebral e o papel do fisioterapeuta no contexto escolar; Políticas públicas em educação: um olhar sobre a diferença. Sumário APRESENTAÇÃO ....................................................................01 CAPÍTULO 1 Histórico da Educação Especial Inclusiva...........................9 CAPÍTULO 2 A Educação Inclusiva na Contemporaneidade ..................29 CAPÍTULO 3 CAPÍTULO 4 CAPÍTULO 5 O Direito à Diferença na Igualdade de Direitos: Aspectos Legais ....................................................................47 Deficiências, Transtornos e Suas Especificidades ..........71 Práticas Inclusivas na Educação Integral ......................113 APRESENTAÇÃO Caro pós-graduando, O caderno de Educação integral e educação inclusiva vem contribuir para a formação pessoal e profissional através de algumas reflexões sobre os processos inclusivos no contexto social e principalmente escolar. Entendemos que a educação promove alterações no contexto social dos alunos, da escola e da comunidade. Diante disso, faz-se necessário compreendermos melhor todo esse processo para que a nossa atuação seja mais efetiva e qualitativa. Este caderno está organizado em cinco capítulos, distribuídos de forma a auxiliar o leitor a realizar algumas reflexões, elaborar conceitos e compreender/aplicar estratégias pedagógicas inclusivas no contexto da educação integral. Diante disso, veremos no Capítulo 1 – Histórico da educação especial inclusiva – reflexões sobre os aspectos das diferenças no contexto social, a deficiência na história, o início da educação especial e o seu papel no atendimento especializado, bem como as perspectivas inclusivas através dos estudos da defectologia desenvolvidas por Vygotsky. No Capítulo 2 – A educação inclusiva na contemporaneidade – acompanharemos os primeiros passos da educação especial inclusiva no Brasil, bem como as concepções presentes nesse momento histórico até os dias atuais, marcados pela exclusão, segregação, integração e inclusão. No Capítulo 3 – O direito à diferença na igualdade de direitos, aspectos legais – estudaremos sobre os documentos norteadores da educação especial/inclusiva, bem como os avanços históricos desses materiais. Apresentaremos também, os programas e ações de apoio ao desenvolvimento inclusivo dos sistemas de ensino existentes em nosso país. O Capítulo 4 – Deficiências, transtornos e suas especificidades – explanaremos sobre as deficiências e os transtornos mais comumente presentes no contexto escolar e também analisaremos os diferentes tipos de materiais e equipamentos de acessibilidade utilizados na inclusão dessas pessoas. Finalizamos nosso estudo com o Capítulo 5 – Práticas inclusivas na educação integral – que apresenta as contribuições da educação integral para a inclusão dos alunos com deficiência, algumas reflexões sobre as práticas inclusivas no contexto escolar, bem como o estudo sobre a importância da adaptação curricular e da produção de material pedagógico adaptado. Além dos textos do caderno de estudo, você encontrará no decorrer dos capítulos, sugestões de livros, filmes, sites, bem como uma vasta opção de referências bibliográficas que ampliarão ainda mais os seus estudos sobre os temas abordados. Organize sua agenda de estudos e inicie este novo desafio! Bom trabalho! CAPÍTULO 1 Histórico da Educação Especial Inclusiva A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: � Conhecer os processos históricos da deficiência no contexto social. � Identificar perspectivas inclusivas na teoria sociointeracionista de Vygotsky. � Analisar as concepções de diversidade e diferença ao longo da história. � Relacionar os estudos da defectologia com a educação especial inclusiva. 10 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA 11 Histórico da Educação Especial Inclusiva Capítulo 1 Contextualização Iniciamos nossos estudos convidando você para uma caminhada de re- flexões sobre a educação especial e as concepções de diversidade no percurso da nossa história. Você poderá perceber que a representação das pessoas com deficiência na sociedade, no decorrer dos tempos mudaram e, estas mudanças estavam muito relacionadas com o período em que ocorriam e com as concepções e expectativas sobre o ser humano que havia em cada época. A educação especial permeou grande parte dos momentos históricos com papéis característicos à época. Inicialmente, acolhendo as pessoas que eram ex- cluídas da sociedade num trabalho mais assistencialista, até a sua função mais at- ual, como mediadora do processo inclusivo nos contextos sociais e educacionais. Consideramos de fundamental importância, apresentar nesse capítulo, os estudos realizados por Vygotsky em: “Obras escogidas: estudo da defectologia”, que buscam, de forma aprofundada, esclarecedora e ainda muito atual, discutir sobre as influências que a sociedade (meio) tem sobre o desenvolvimento integral da pessoa com deficiência. Para Vygotsky, era essencial que todas as pessoas tivessem qualidade nas interações; e estas só poderiam ocorrer quando a diversi- dade humana e de experiências estivesse presente. O Olhar Sobre as Diferenças no Contexto Social A escola prepara o futuro e, de certo que, se as crianças aprendem a valorizar e a conviver com as diferenças nas salas de aulas, serão adultos bem diferentes de nós, que temos de nos empenhar tanto para entender e viver a experiência da inclusão! (MANTOAN, 2003, p. 91). Conhecer um pouco mais sobre a educação especial inclusivarequer que se retome algumas questões a essa temática. Historicamente, pode-se perceber que a escola se caracterizou por um espaço que, por muito tempo, delimitava a escolarização como privilégio de um grupo, excluindo indivíduos considerados fora dos padrões homogeneizadores; apresentando assim, características de segregação e seleção dos mais aptos para estarem nesse espaço. Outrossim, aquele que era considerado diferente e que fugia do padrão considerado normal, não deveria estar junto dos demais. 12 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Diante disso, você já parou para analisar sobre o que é ser diferente? O conceito de diferença pode ser analisado sobre várias perspectivas presentes nas práticas sociais e também alguns “marcadores”, como gênero, classe social, características físicas, intelectuais, culturais e suas respectivas conotações. A diferença também pode ser construída negativamente, por meio da exclusão ou da marginalização daquelas pessoas que são definidas como “outros”. Por outro lado, pode ser celebrada como fonte de diversidade, heterogeneidade e hibridismo, sendo vista como enriquecedora (SILVA, 2003). O conceito de diferença pode ser analisado sobre várias perspectivas presentes nas práticas sociais e também alguns “marcadores”, como gênero, classe social, características físicas, intelectuais, culturais e suas respectivas conotações. Estas pessoas costumam ser percebidas pelo que foge ao padrão, tanto no que falta, quanto no que necessitam em questão de assistência e adaptações. Figura 1 – Diferença Fonte: Disponível em: <https://br.pinterest.com/pin/550635491920698774/>. Acesso em: 13 dez. 2017. Além da definição de “diferente”, considera-se que a definição de “deficiência” também seja construída socialmente, por meio da qual, atribui-se a uma pessoa qualidades negativas. Beyer (2006) concorda com esta informação e acrescenta que a deficiência pode ser culturalmente elaborada através de um processo de atribuição das expectativas sociais, por meio de normas, preconceitos e valores presentes na interação entre os que definem e os que são definidos. No caso das pessoas com deficiência, suas diferenças se exaltam e respondem na forma de preconceitos que menosprezam suas potencialidades. Estas pessoas costumam ser percebidas pelo que foge ao padrão, tanto no que falta, quanto no que necessitam em questão de assistência e adaptações. 13 Histórico da Educação Especial Inclusiva Capítulo 1 Se você gostou dessa temática sobre diversidade e diferença, sugerimos a obra da autora Rosita Edler Carvalho: Escola inclusiva: a reorganização do trabalho pedagógico, Mediação, 2008. Figura 2 – Escola inclusiva: a reorganização do trabalho pedagógico Fonte: Disponível em: <https://www.editoramediacao.com.br/livro/escola-inclusiva/6/148>. Acesso em: 13 dez. 2017. Para ilustrar nossos estudos até o momento, sugerimos o filme “Sempre Amigos” (1998). Nele, você poderá conhecer a história de um garoto com problemas de aprendizagem, que passa a encarar melhor os preconceitos a sua volta quando conhece o novo vizinho, que tem uma doença que o impede de se locomover. Juntos, os garotos vivem grandes aventuras, superando as expectativas de suas famílias e escolas, mostrando que o diferente une, constrói e permite inovadoras e significativas relações. 14 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Figura 3 – Sempre amigos Fonte: Disponível em: <http://www.eovideolevou.com.br/detalhe/completo.asp?cp=39561>. Acesso em: 13 dez. 2017. Com as políticas de educação especial, surge o consenso de que as diferenças não podem continuar a serem vistas como meros desvios de norma ou resultado de comparação entre as pessoas. Conforme Veer e Valsiner (1999), Vygotsky sugere que o ser humano, antes de ser definido comparativamente, deveria ser reconhecido como detentor de identidade única, o que anularia as relações binárias do tipo normal/anormal, mais inteligente/menos inteligente, melhor/pior, entre outras. Com as políticas de educação especial, surge o consenso de que as diferenças não podem continuar a serem vistas como meros desvios de norma ou resultado de comparação entre as pessoas. 15 Histórico da Educação Especial Inclusiva Capítulo 1 Figura 4 – Diversidade Fonte: Disponível em: <https://br.pinterest.com/pin/45176802492376006/>. Acesso: 18 out. 2017. Para Maiola (2016), é importante que se constate que a educação deva se desvincular de uma pedagogia indiferente às diferenças, passando a possibilitar relações com a diversidade. É neste contexto que emerge a necessidade de uma pedagogia inclusiva, em que tanto seja discutida a diferença da pessoa com deficiência quanto a de cada indivíduo como ser único, bem como seja levado em conta esse sujeito; enfatizando assim as possibilidades pedagógicas que contemplem esta diversidade humana em sala de aula. Dentro desta proposta, o papel do professor também toma novas perspectivas, pois, para mediar um grupo tão diversificado, é preciso rever conhecimentos sobre desenvolvimento humano, aprendizagem e como intervir diante das múltiplas facetas da inteligência. É preciso, também, ver o indivíduo em sua totalidade; complexidade; potencialidade; como indivíduo ativo; cheio de emoções, desejos e sonhos; como alguém fazendo história; que deseja ser visto, escutado, entendido e, até mesmo, provocado. Todos são diferentes: pensam, aprendem, entendem e veem de forma diferente, porque também têm emoções e histórias diferentes (MAIOLA, 2016). É sobre esta diversidade humana que o professor age ou com a qual interage. Por esta razão, questiona-se o motivo pelo qual se deva resistir ao diferente, uma vez que se lida com as diferenças no dia a dia. É preciso, também, ver o indivíduo em sua totalidade; complexidade; potencialidade. 16 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Atividade de Estudos: 1) Você já vivenciou ou presenciou alguma situação em que as diferenças foram evidenciadas? Elas aconteceram de forma positiva ou negativa? Como você se sentiu diante desse cenário? Faça um breve registro sobre esse acontecimento, relatando os sentimentos envolvidos neste momento. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ A Deficiência na História Para que se possa compreender os processos de inclusão nos dias atuais, faz-se necessário conhecer um pouco sobre os caminhos percorridos pelas pessoas com deficiência nas últimas décadas. Os termos utilizados para denominar a pessoa com deficiência vão se modificando com o passar do tempo. Para que se acompanhe todo o processo de construção desse sujeito no contexto social e escolar, optou-se por manter os termos utilizados em cada época descrita, até se chegar às concepções utilizadas atualmente. Os nomes dados, de acordo com o período histórico, mostram também como as pessoas eram concebidas naquela época. Adiante, um breve recorte dessa trajetória. Pode-se observar que a pessoa com deficiência na história mundial, vivenciou dois tipos de tratamento: a rejeição e a eliminação de um lado; e a proteção assistencialista e a piedosa, de outro. Na Roma Antiga, as famílias tinham permissão de sacrificar os filhos que nascessem com alguma deficiência. Em Esparta, as pessoas eram lançadas ao mar ou em precipícios. A pessoacom deficiência na história mundial, vivenciou dois tipos de tratamento: a rejeição e a eliminação de um lado; e a proteção assistencialista e a piedosa, de outro. 17 Histórico da Educação Especial Inclusiva Capítulo 1 De acordo com registros existentes, de fato, o pai de qualquer recém-nascido das famílias conhecidas como homoio (ou seja, “os iguais”) deveria apresentar seu filho a um Conselho de Espartanos, independentemente da deficiência ou não. Se esta comissão de sábios avaliasse que o bebê era normal e forte, ele era devolvido ao pai, que tinha a obrigação de cuidá- lo até os sete anos; depois, o Estado tomava para si esta responsabilidade e dirigia a educação da criança para a arte de guerrear. No entanto, se a criança parecia “feia, disforme e franzina”, indicando algum tipo de limitação física, os anciãos ficavam com a criança e, em nome do Estado, a levavam para um local conhecido como Apothetai (que significa “depósitos”). Tratava-se de um abismo onde a criança era jogada, “pois tinham a opinião de que não era bom nem para a criança nem para a república que ela vivesse, visto que, desde o nascimento, não se mostrava bem constituída para ser forte, sã e rija durante toda a vida” (LICURGO DE PLUTARCO apud SILVA, 1987, p. 105). Diante do exposto, pode-se perceber que o processo de classificação entre pessoas hábeis ou não hábeis era algo naturalizado para a época, e se não “servissem” à sociedade, eram excluídas de forma definitiva. Atualmente, essa prática parece cruel e repugnante, no entanto, deve ser entendida de acordo com a realidade histórica e social da época. Para eles, a expectativa era de se criar sujeitos perfeitos para que se tornassem guerreiros. Ainda, há relatos de civilizações que utilizavam comercialmente as pessoas com deficiência para fins de prostituição ou entretenimento. [...] cegos, surdos, deficientes mentais, deficientes físicos e outros tipos de pessoas nascidas com má formação eram também, de quando em quando, ligados a casas comerciais, tavernas e bordéis; bem como a atividades dos circos romanos, para serviços simples e às vezes humilhantes (SILVA, 1987, p. 130). Percebe-se a exposição das pessoas que eram consideradas como “fora do padrão de normalidade”, caracterizados como seres “bizarros” e que diante disso, serviam como atração para divertimento dos demais. 18 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Figura 5 – Trabalho em circo Fonte: Disponível em: <https://www.obaoba.com.br/filmes-e-series/noticia/conheca-mais- sobre-o-circo-dos-horrores-aposta-do-seriado-american-horror-story>. Acesso em: 13 dez. 2017. Com a vinda do cristianismo, algumas mudanças sobre como as pessoas com deficiência eram vistas mudaram. O próprio conteúdo da doutrina cristã, voltado para a caridade e amor ao próximo, deu respaldo à vida daqueles que ficavam às margens da sociedade. Diante disso, criaram-se hospitais e instituições de caridade voltados ao atendimento dessa demanda (SILVA, 1987). Na Idade Média, as incapacidades físicas, problemas mentais e malformações eram considerados “castigos de Deus” e, nessa mesma época, a própria igreja, que antes propunha a caridade, passa a rejeitá- los por fugirem do “padrão de normalidade” (SILVA, 1987). O período do Renascimento marca uma fase mais esclarecida da humanidade, principalmente com a criação dos direitos reconhecidos como universais, numa filosofia humanista, bem como a realização de avanços na ciência que viabilizaram um olhar mais clínico à pessoa com deficiência. Assim, passa-se a ter uma atenção mais direcionada e constroem-se espaços de atendimento específico para essas pessoas. O período do Renascimento marca uma fase mais esclarecida da humanidade, principalmente com a criação dos direitos reconhecidos como universais, numa filosofia humanista, bem como a realização de avanços na ciência que viabilizaram um olhar mais clínico à pessoa com deficiência. 19 Histórico da Educação Especial Inclusiva Capítulo 1 Figura 6 – Renascimento Fonte: Disponível em: <https://daytodayforever.files.wordpress.com/2013/07/ambroise_ pare.jpg?w=445&h=300>. Acesso em: 13 dez. 2017. Beyer (2006) relata que as primeiras tentativas de se educar crianças com deficiência se baseavam na ideia de que elas apresentavam uma significativa limitação na aprendizagem, impedindo que houvessem avanços no seu desenvolvimento. Sua situação requeria apenas os cuidados da medicina. Somente com o surgimento das escolas especiais, as crianças com deficiência obtiveram a chance de poder frequentar um espaço educacional. Elas foram importantes historicamente, mas uma solução transitória. A longa existência e prática de segregação escolar reforçou a ideia de que não se poderia educar a pessoa com deficiência em outro lugar, a não ser nas escolas especiais, considerando esse espaço o melhor ou mais apropriado para eles. Somente com o surgimento das escolas especiais, as crianças com deficiência obtiveram a chance de poder frequentar um espaço educacional. Elas foram importantes historicamente, mas uma solução transitória. Atividade de Estudos: 1) Quais as suas impressões sobre o processo histórico da pessoa com deficiência apresentado até o momento? Percebeu algum tipo de mudança? Qual? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 20 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA A Educação Especial A escola sempre desejou simplificar o que era complexo no que diz respeito à condição humana e, por isso, selecionava o que era de sua responsabilidade e o que não cabia em suas abordagens educacionais (BLEIDICK, 1981, apud BEYER, 2006). Para isso, criava-se espaços educacionais que separavam aqueles que não cabiam nos padrões estabelecidos pela escola, dando origem a novos parâmetros de desenvolvimento e concepções de seres humanos, para atender às disparidades excluídas das instituições anteriores. Figura 7 – Educação especial Fonte: Disponível em: <http://bomjesus.br/niveis-de-ensino/educacao-especial.vm>. Aces- so em: 13 dez. 2017. Por isso, criaram-se instituições de acolhimento às pessoas que não se enquadravam no modelo estabelecido pelas escolas, as quais viam nesses espaços a possibilidade de integração social, mesmo que agrupadas a partir de uma característica ou condição clínica. 21 Histórico da Educação Especial Inclusiva Capítulo 1 Atividade de Estudos: 1) Você conhece algum espaço educacional na sua cidade ou região que realiza esse tipo de atendimento, voltado apenas às pessoas com deficiência? Faça seu registro. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Para Vygotsky (1997), a dificuldade encontrada nas escolas especiais consiste na limitação de acesso ao horizonte social das crianças com deficiência, enquanto estas precisariam da convivência com crianças com condições cognitivas e socioafetivas diferenciadas dos seus. Beyer (2006, p. 14) ainda questiona: “As escolas especiais são de fato as escolas certas para crianças com necessidades especiais?”. E explica seu posicionamento: O desafio é construir e por em prática no ambiente uma pedagogia que consiga ser comum ou válida para todos os alunos da classeescolar, porém capaz de atender aos alunos cujas situações pessoais ou características de aprendizagem requeiram uma pedagogia diferenciada. Tudo isso sem demarcações, preconceitos ou atitudes nutridoras dos indesejados estigmas. Ao contrário, pondo em andamento, na comunidade escolar, uma conscientização crescente dos direitos de cada um (BEYER, 2006, p. 76). Veja que há mais de 80 anos, Vygotsky já vislumbrava uma perspectiva que iria além do atendimento às pessoas com deficiência em escolas especiais. Diante dos seus estudos sobre o desenvolvimento humano e seus processos de aprendizagem, já conotava uma grande inclinação para os processos inclusivos. Conheça um pouco mais sobre este teórico e sua principal obra direcionada às pessoas com deficiência a seguir. 22 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Vygotsky e os Fundamentos da Defectologia Vygotsky (1997) deixou uma contribuição significativa no que se refere à educação especial, nos chamados fundamentos da defectologia, presentes num conjunto de obras intituladas “Obras escogidas”, traduzidas para o espanhol, e que aborda os aspectos da deficiência e das interações dos sujeitos com o meio. O termo defectologia era utilizado para a ciência que estudava as crianças com vários tipos de problemas (defeitos), tanto intelectuais quanto físicos. Dentre as crianças estudadas, estavam os surdos- mudos, atualmente classificados somente como surdos, cegos, não educáveis e deficientes mentais, hoje, deficientes intelectuais. Veer e Valsiner (1999) apontam que o interesse de Vygotsky por problemas de defectologia tornou-se evidente em 1924, com sua primeira publicação nessa área, na qual relatava os trabalhos que estava realizando no subdepartamento de educação de crianças defeituosas no Narkompros, academia russa de ciências. Assim, a partir de 1924, Vygotsky tentou formular sua própria visão da criança “defeituosa”, tarefa que nunca foi completada e prosseguiu até sua morte, em 1934. O termo defectologia era utilizado para a ciência que estudava as crianças com vários tipos de problemas (defeitos), tanto intelectuais quanto físicos. Você deve ter achado estranho a utilização do termo “crianças defeituosas”, não é mesmo? Porém, esta era uma referência muito comum utilizada na época para denominar as pessoas com deficiência. Os termos foram evoluindo com o passar dos tempos. 23 Histórico da Educação Especial Inclusiva Capítulo 1 Figura 8 – Obras escogidas – fundamentos de defectologia Fonte: Disponível em: <https://goo.gl/Ug2eS2>. Acesso em: 3 jan. 2018. Vygotsky (1997) distinguia dois tipos de deficiência: primária e secundária. A deficiência primária era compreendida como biológica, relacionada a lesões orgânicas, lesões cerebrais, malformações, alterações cromossômicas, ou seja, características físicas apresentadas pelo sujeito. A deficiência secundária, compreendia o desenvolvimento do sujeito com essas características (orgânicas), com base nas interações sociais, ou seja, derivada do isolamento das relações sociais e culturais características do entorno em que cada sujeito se insere. [...] uma educação ideal só é possível com base em um ambiente social orientado de modo adequado e que os problemas essenciais da educação só podem ser resolvidos depois de solucionada a questão social em toda a sua plenitude. Dai deriva também a conclusão de que o material humano possui uma infinita plasticidade se o meio social estiver organizado de forma correta. Tudo pode ser educado e reeducado no ser humano por meio da influência social correspondente. A própria personalidade não deve ser entendida como uma forma acabada, mas como uma forma dinâmica de interação que flui permanentemente entre o organismo e o meio (VYGOTSKY, 1997, p. 200). 24 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Com base nessa capacidade plástica citada por Vygotsky (1997), pode-se compreender que um indivíduo com limitações físicas ou intelectuais pode modificar seus estados a partir de estímulos externos e refinar suas capacidades já desenvolvidas, de modo a ressaltar, preferencialmente, o que cada sujeito tem de melhor para oferecer ao seu meio e a si mesmo. Um indivíduo com limitações físicas ou intelectuais pode modificar seus estados a partir de estímulos externos e refinar suas capacidades já desenvolvidas. Vygotsky (1997) enfatizava a importância da educação social de crianças deficientes e o potencial da criança para o desenvolvimento normal. Figura 9 – Estimulação precoce Fonte: Disponível em: <http://leandrafono.blogspot.com.br/2012/04/estimulacao-pre- coce-e-linguagem-em.html>. Acesso em: 13 dez. 2017. Em seus escritos, Vygotsky (1997) enfatizava a importância da educação social de crianças deficientes e o potencial da criança para o desenvolvimento normal. Afirmava que as deficiências corporais afetavam suas relações sociais, e não suas interações diretas com o ambiente físico, ou seja, o defeito orgânico manifestava-se devido à situação social da criança. Assim, as pessoas que faziam parte do seu meio o tratariam de maneira diferente das demais, de um modo positivo ou negativo (MAIOLA, 2016). 25 Histórico da Educação Especial Inclusiva Capítulo 1 Vygotsky (1997) considerava que os problemas de crianças com deficiência resultavam de falta de adequação entre sua organização psicofisiológica desviante e os meios culturais disponíveis. Sendo assim, a educação social, baseada na compensação social dos problemas físicos, era a maneira de proporcionar uma vida satisfatória às pessoas com deficiência. Por isso, defendia uma escola que integrasse, tanto quanto fosse possível, todas as crianças na sociedade para que aquelas com deficiência tivessem a oportunidade de conviver junto com pessoas sem deficiência. Ao enfatizar que grande parte das crianças com deficiência era “normal” e tinha potencialidade para se desenvolver normalmente, Vygotsky reivindicou que os muros das escolas especiais fossem derrubados e que essas crianças participassem da vida escolar comum a todos. O teórico opunha-se a todos os procedimentos diagnósticos que fossem baseados em uma abordagem puramente quantitativa, lembrando que na época dos seus estudos, havia uma valorização aos testes de Quociente de Inteligência (QI). Vygotsky (1997) considerava que os problemas de crianças com deficiência resultavam de falta de adequação entre sua organização psicofisiológica desviante e os meios culturais disponíveis. Atividade de Estudos: 1) Você percebeu que, em nossos estudos, muitas ideias de Vygotsky contribuem para uma perspectiva inclusiva da pessoa com deficiência. Retome o texto e pontue algumas dessas ideias. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Outra contribuição dos escritos de Vygotsky (1997) refere-se à ideia de grupos de níveis mistos como condição de promover o desenvolvimento do indivíduo. Diferentemente das práticas segregacionistas da época, em que a pessoa com deficiência permanecia agrupada com pessoas que tivessem o mesmo tipo de deficiência que ela. 26 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Em seus estudos, concluiu que as pessoas com deficiência encontravam como suporte para o seu desenvolvimento, ações recíprocas sociais com outras pessoas que estivessem em um nível superior a elas próprias. Esta ideia antecipao conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal, da forma como ela é tradicionalmente compreendido. Você se recorda do conceito de zona de desenvolvimento proximal proposta por Vygotsky? Ele define que a zona de desenvolvimento proximal da criança é a distância entre seu desenvolvimento real, determinado com a ajuda de tarefas solucionadas de forma independente, e o nível de seu desenvolvimento potencial, determinado com a ajuda de tarefas solucionadas pela criança com a orientação de adultos e em cooperação com seus colegas mais capazes (VEER; VALSINER, 1999). Em linhas gerais, pode-se dizer que, para Vygotsky, não bastava conhecer o desempenho cognitivo atual da criança, mas dar importância à qualidade da mediação dada a ela, e avaliar o desempenho posterior. Nas palavras do teórico, importante seria conhecer a possibilidade de dilatamento intelectual que a criança apresenta, antes de concluir meramente sobre suas capacidades. Para Vygotsky, não bastava conhecer o desempenho cognitivo atual da criança, mas dar importância à qualidade da mediação dada a ela, e avaliar o desempenho posterior. Atividade de Estudos: 1) Qual a contribuição dos estudos sobre a zona de desenvolvimento proximal nos processos de aprendizagem dos alunos com deficiência? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 27 Histórico da Educação Especial Inclusiva Capítulo 1 Algumas Considerações No primeiro capítulo do nosso caderno de estudos, pudemos acompanhar os caminhos percorridos pelas pessoas com deficiência em vários momentos históricos na nossa sociedade. As concepções sobre diversidade e diferença, bem como a forma de compreender o indivíduo na sua particularidade, com habilidades e limitações passaram por modificações no decorrer dos tempos. Vimos, em nosso texto, que a sociedade vivenciou movimentos de exclusão social, nos quais só os considerados normais poderiam ter seu espaço, bem como direitos e deveres. As pessoas com deficiência eram invisíveis nesse cenário. A educação especial teve papel fundamental nesse primeiro momento de acolhimento às pessoas com deficiência. Essas instituições oportunizavam a socialização dessa demanda, permitindo que estes conhecessem novos espaços e novas experiências, mesmo que ainda em contextos limitados Foi através dos escritos de Vygotsky na obra “Defectologia”, que novas perspectivas sobre as pessoas com deficiência se fizeram presentes. Para o teórico, era através da interação com o outro, na riqueza de estímulos e, pela diversidade humana, que as pessoas se desenvolviam e aprendiam. E que as pessoas com deficiência teriam muito mais avanços se estivessem envolvidos nesses espaços. Até hoje, as ideias de Vygotsky são amplamente estudadas e fundamentam os trabalhos desenvolvidos dentro das políticas de educação inclusiva. Referências BEYER, Hugo Otto. Inclusão e avaliação na escola: de alunos com necessi- dades educacionais especiais. Porto Alegre: Mediação, 2006.127p. MAIOLA, Carolina dos S. Práticas inclusivas para formação de professores. Indaial: Uniasselvi, 2016. MANTOAN, Maria Teresa Egler. Inclusão escolar: o que é? por quê? como fazer? 2. ed. São Paulo: Moderna, 2003. SILVA, Tomás Tadeu. Documentos de identidade: uma introdução as teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 2003. SILVA, Otto Marques. Epopéia ignorada: a história da pessoa deficiente no mun- do de ontem e de hoje. São Paulo: Cedas, 1987. VEER, Rene Van der; VALSINER, Jaan. Vygotsky: uma síntese. 3. ed. Tradução Cecília C. Bartalotti. São Paulo: Loyola, 1999. VYGOTSKY, Lev Semenovich. Obras escogidas V: fundamentos de defectologia. Madrid: Visor, 1997. 28 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA CAPÍTULO 2 A Educação Inclusiva na Contemporaneidade A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: � Compreender as concepções de exclusão, segregação, integração e inclusão da pessoa com deficiência no contexto social e escolar. � Conhecer as perspectivas da educação inclusiva. � Analisar a trajetória de educação especial/inclusiva no Brasil e no mundo. � Avaliar as concepções de exclusão, segregação, integração e inclusão escolar. 30 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA 31 A Educação Inclusiva na Contemporaneidade Capítulo 2 Contextualização No capítulo anterior, acompanhamos os momentos históricos da deficiência no contexto social, as concepções de diversidade, diferença e os estudos pioneiros na educação especial, a partir das ideias de Vygotsky na obra intitulada “Defectologia” (1983) (estudo do defeito). Avançaremos no Capítulo 2, no qual trataremos sobre a trajetória da educação especial, principalmente em nosso país, as contribuições desse trabalho nas discussões sobre deficiência e educação, as instituições precursoras dessa nova modalidade de ensino, bem como os movimentos de inclusão que começam a acontecer na sociedade e nas instituições escolares. Nesse contexto, você irá identificar as concepções de exclusão, segregação, integração e inclusão, podendo analisar todos esses momentos, que ainda estão presentes no nosso dia a dia. A Educação Especial Inclusiva No Brasil Estar junto é se aglomerar com pessoas que não conhecemos. Inclusão é estar com, é interagir com o outro (MANTOAN, 2003, p. 26). No Brasil, o atendimento a pessoas com deficiência iniciou na época do Império, com a criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos, em 1854, atual Instituto Benjamin Constant (IBC), e o Instituto dos Surdos-Mudos, em 1857, conhecido como Instituto Nacional da Educação dos Surdos (INES), ambos no Rio de Janeiro. 32 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Figura 10 – Instituto Benjamim Constant Fonte: Disponível em: <www.ibc.org.br>. Acesso em: 13 dez. 2017. Figura 11 – Ines Fonte: Disponível em: <https://chpenhanews.wordpress.com/2012/02/17/forum-permanen- te-de-educacao-linguagem-e-surdez-em-2012/>. Acesso em: 13 dez. 2017. 33 A Educação Inclusiva na Contemporaneidade Capítulo 2 Atividade de Estudos: 1) Convidamos você para acessar o site do Instituto Benjamin Constant <www.ibc.gov.br> e acompanhar as principais atividades e projetos desenvolvidos ainda hoje nessa instituição. Registre aqui os programas de atendimento, os centros de estudos e os trabalhos realizados na educação básica. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ___________________________________________________ ____________________________________________________ No início do século XX, fundou-se o Instituto Pestalozzi (1926), cujo atendimento estava direcionado às pessoas com deficiência intelectual; em 1954, foi fundada a primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE); e, em 1945, foi criado o primeiro atendimento educacional especializado às pessoas com superdotação na Sociedade Pestalozzi, por Helena Antipoff. Em 1954, foi fundada a primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE). Figura 12 – Instituto Pestalozzi Fonte: Disponível em: <http://pt.slideshare.net/bernardoalves967/303-o-inclusiva>. Acesso em: 13 dez. 2017. 34EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Figura 13 – Primeira Apae do Brasil Fonte: Disponível em: <http://niteroi.apaebrasil.org.br/artigo.phtml/23740>. Acesso em: 13 dez. 2017. Figura 14 – Helena Antipoff Fonte: Disponível em: <http://www.pestalozzi.org.br/historia.html>. Acesso em: 13 dez. 2017. 35 A Educação Inclusiva na Contemporaneidade Capítulo 2 Para ilustrar nosso estudo, deixamos como sugestão o documentário: Do luto à luta. O título expressa a passagem do sentimento de perda para o de afirmação da vida, que nem todos os pais de crianças com Síndrome de Down conseguem fazer, e que Mocarzel fez. É um filme corajoso e comovente, e que lança um novo olhar sobre a síndrome de Down. Figura 15 – Documentário: do Luto à Luta Fonte: Disponível em: <http://tvbrasil.ebc.com.br/programadecinema/episodio/do-luto-a- luta-1>. Acesso em: 13 dez. 2017. Com o passar dos anos, novas escolas de educação especial foram criadas, com base nessas instituições de referência. Demarcando assim, um período histórico até então caracterizado pela exclusão, para um momento de inserção do sujeito com deficiência na escolarização, mesmo que ainda segregacionista. A educação especial também foi marcada pelo atendimento em salas de recursos. Estas salas ficavam na instituição escolar, porém, separadas das salas de ensino comum. O aluno com deficiência tinha suas aulas nestes espaços, junto de alunos com o mesmo tipo de deficiência, como se fossem “salas especiais”. Novas escolas de educação especial foram criadas, com base nessas instituições de referência. 36 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Figura 16 – Sala de recurso Fonte: Disponível em: <http://www.dgabc.com.br/Noticia/512226/o-mundo-em-libras>. Acesso em: 13 dez. 2017. É importante salientar que a sala de recurso descrita não é a mesma que a atual sala de recurso multifuncional. A proposta da sala de recurso é a escolarização de alunos com o mesmo tipo de deficiência em uma mesma sala (dentro da escola regular), atendidos por um educador especial. Essas aulas acontecem todos os dias, cumprindo a carga horária escolar. Diferentemente da atual sala de recurso multifuncional, que consiste num serviço de atendimento realizado no contraturno das aulas do aluno, em que ele irá receber o suporte para as suas necessidades específicas. Em 2007, foi lançado o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) e dentre os eixos norteadores do trabalho, o documento sugere a oferta de formação de professores para a educação especial e a implantação de salas de recursos multifuncionais nas redes de ensino comum. Nestas salas, os professores de educação especial realizariam o atendimento educacional especializado, no contraturno das aulas, de modo a complementar ou suplementar a escolarização. O detalhamento desse trabalho é apresentado posteriormente no documento que embasará a educação especial pelos próximos anos, conhecido como Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, que será visto no decorrer dos estudos (MAIOLA, 2016). 37 A Educação Inclusiva na Contemporaneidade Capítulo 2 Concepção de Exclusão, Segregação, Integração e Inclusão Conforme Beyer (2006), até o momento, pode-se perceber em relação à trajetória da educação especial no Brasil, quatro momentos históricos da pessoa com deficiência: a exclusão do sistema escolar, atendimento especial, integração no sistema escolar regular, e inclusão no sistema escolar, demonstrados da seguinte forma: Figura 17 – Momentos históricos da pessoa com deficiência Fonte: Disponível em: <http://umanjoazulentrenos.blogspot.com.br/2013/11/a-indu- stria-da-exclusao-escolar.html>. Acesso em: 13 dez. 2017. Na exclusão as pessoas com deficiência eram ignoradas, rejeitadas, perseguidas e exploradas, pois não havia nenhuma forma de atenção educacional dada a elas (SASSAKI,1997). Figura 18 – Exclusão Fonte: Disponível em: <http://umanjoazulentrenos.blogspot.com.br/2013/11/a-indu- stria-da-exclusao-escolar.html>. Acesso em: 13 dez. 2017. 38 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Figura 19 – Exclusão Fonte: Disponível em: <http://www.liga.ufc.br/?p=1139>. Acesso em: 13 dez. 2017. Na segregação, buscou-se o desenvolvimento educacional das pessoas com deficiência através do atendimento educacional que era oferecido geralmente nas chamadas instituições especializadas, surgindo assim, as escolas especiais. Figura 20 – Escola especial Fonte: Disponível em: <http://posglobal.com.br/educacao-especial-e-inclusao/>. Acesso em: 13 dez. 2017. A integração, de acordo com Sassaki (1997), é identificada no momento que acontece a proliferação das classes especiais nas escolas de ensino regular. Essas salas se baseavam na compreensão de que, separados dos alunos sem deficiência em salas à parte, os alunos com deficiência não atrapalhariam o ensino dos demais. 39 A Educação Inclusiva na Contemporaneidade Capítulo 2 Figura 21 – Sala de recurso para surdos Fonte: Disponível em: <http://escolasbilingueparasurdodobrasil.blogspot.com.br/2012/12/ sala-de-aula.html>. Acesso em: 13 dez. 2017. Na inclusão, os alunos com deficiência devem ser matriculados diretamente no ensino regular, cabendo à instituição se adaptar para atender às suas necessidades no contexto escolar. Figura 22 – Inclusão escolar Fonte: Disponível em: <https://novaescola.org.br/conteudo/3436/boas-praticas-de-inclu- sao>. Acesso em: 13 dez. 2017. Percebe-se que os termos integração e inclusão são comumente vistos, porém com base de concepção e objetivos diferentes. Entende-se que a definição de inclusão é algo mais amplo e complexo do que integração. 40 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Figura 23 – Inclusão Fonte: Disponível em: <http://rutevera.blogspot.com.br/2013/12/>. Acesso em: 13 dez. 2017 O MEC disponibiliza uma central de mídia com alguns vídeos relacionados à inclusão. Sugerimos que você acesse o material e acompanhe as discussões sobre essa temática com histórias e práticas educacionais inclusivas no ensino regular. Entre esses vídeos, destacamos: <http://centraldemidia.mec.gov.br/index. php?option=com_hwdmediashare&view=mediaitem&id=9326:par te-1-caminhos-para-inclusao&Itemid=484?&filter_mediaType=4>. Acesso em: 3 jan. 2018. Pode-se perceber que esses quatro momentos (exclusão, segregação, integração e inclusão) não podem ser vistos de forma linear e cronológica. Eles permanecem presentes em situações escolares diferenciadas, ou seja, algumas experiências escolares ainda se encontram num momento apenas de integração das pessoas com deficiência, com o intuito de possibilitar a elas maior socialização; outras já criaram estratégias bem-sucedidas para a permanência de todas as crianças, cada qual com suas especificidades, procurando, mesmo que nas suas limitações, o maior índice de aproveitamento e experiência educacional (MAIOLA, 2016). Quanto à palavra inclusão, esta implica numa mudança de perspectiva educacional, porque não atinge apenas os alunos com deficiência e os que apresentam dificuldades de aprender, mas a todos. 41 A Educação Inclusiva na Contemporaneidade Capítulo 2 A sociedade e as instituições precisam se redimensionar para a remoção dos obstáculos existentes à participação das pessoas com deficiência na vida social e escolar. Para isso, entende-se que a sociedade e as instituições precisam se redimensionar para a remoção dos obstáculos existentes à participação das pessoas com deficiência na vida social e escolar, através de uma política de educação inclusiva pautada no princípio da “cidadania” e que norteie a promoção do atendimento à demanda: a) com garantiade acesso e permanência na escola; b) com priorização da formação continuada de educadores e de projetos arquitetônicos adaptados e acessíveis a todos; c) com propostas, materiais e recursos pedagógicos que viabilizem a participação efetiva da pessoa com deficiência; d) com base em uma individualização dos percursos, ritmos e intervenções educativas; e e) com a socialização contida na convivência escolar. Atividades de Estudos: 1) Elabore um esquema que contemple as principais ideias dos quatro momentos históricos vivenciados pela pessoa com deficiência (exclusão, segregação, integração e inclusão): ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 2) Na escola em que você atua (ou outro espaço profissional), há inclusão de pessoas com deficiência? Você acredita que exista respeito e acolhimento às diferenças? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 42 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Caminhos Para uma Educação Mais Inclusiva A perspectiva de inclusão exige, por um lado, modificações profundas nos sistemas de ensino; e estas modificações [...] demandam ousadia, por um lado e prudência por outro; - que uma política efetiva de educação inclusiva deve ser gradativa, contínua, sistemática e planejada, na perspectiva de oferecer às crianças deficientes educação de qualidade; e que a gradatividade e a prudência não podem servir para o adiamento “ad eternum” para a inclusão [...] devem servir de base para a superação de toda e qualquer dificuldade que se interponha à construção de uma escola única e democrática (BUENO, 2001, p. 27). No Brasil, o projeto ainda caracterizado de integração escolar surgiu com mais ênfase na década de 1990, como decorrência das pressões e experiências desenvolvidas em outros países. Diante disso, medidas políticas foram necessárias, a mencionar, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, nº 9.394 de 1996, que, ainda com imprecisões e indefinições, sinaliza um espaço de atendimento educacional com alunos com deficiência no ensino comum. Assim, pode-se acompanhar um lento progresso no sentido de democratização do ensino e da inserção gradual dessas crianças no cenário da educação formal, até se chegar em novas discussões com foco na inclusão propriamente dita. Adotou-se o termo educação inclusiva para traduzir a orientação política proposta e que influencia em diversas mudanças nas atitudes das pessoas e práticas educacionais nas instituições escolares. A partir de uma perspectiva de educação para todos, é necessário possibilitar condições viáveis e ao mesmo tempo desafiadoras para que cada aluno possa explorar a aprendizagem em suas possibilidades, e não em suas deficiências. As pessoas com deficiência estão sendo inseridas nas escolas regulares, porque, além de um direito conquistado, têm um maior número de estímulos e possibilidades de desenvolvimento que, adquiridos nas inter-relações, nos centros de interesse e na motivação frente aos novos desafios, contribuem com todos os alunos da sala. Conforme relata Mantoan (2003), a educação inclusiva entende que a presença de alunos com deficiência, embora torne o conjunto da turma de alunos mais heterogêneo e complexo, também pode torná-lo mais rico, no sentido de que a convivência com a diversidade colocaria em pauta as diversas formas de aprender e de ensinar, bem como a variedade de ideias e concepções de pessoa e de mundo. A partir de uma perspectiva de educação para todos, é necessário possibilitar condições viáveis e ao mesmo tempo desafiadoras para que cada aluno possa explorar a aprendizagem em suas possibilidades. 43 A Educação Inclusiva na Contemporaneidade Capítulo 2 Referente à análise das realidades educacionais brasileiras, Afonso (2004) sugere que se deve considerar quatro níveis de análise da realidade educacional: • Nível microssociológico: no caso, a sala de aula, pois é onde predo- mina o processo de ensino-aprendizagem e a proposta de educação inclusiva pode traduzir-se apenas pela presença física de pessoas com deficiência, sem as indispensáveis ações para remover barreiras para a aprendizagem e para a participação de todos os alunos. • Nível mesossociológico: a instituição escolar no qual as práticas de- vem ser avaliadas, permitindo identificar as características excludentes ou inclusivas em relação aos alunos que apresentam diferenças signif- icativas na aprendizagem e no desenvolvimento. • Nível macrossociológico: o Estado tem papel na definição de sua política educacional. Isso inclui os processos de gestão, prestação de contar e também analisar as articulações entre políticas públicas, pois os movimentos inclusivos não dependem só das escolas e dos educa- dores. • Nível megassociológico: o papel das organizações, no contexto da globalização, impõe certas ações que acarretam a prevalência das re- gras de uma pedagogia mais humanista, na qual a educação não é bem de investimento e sim bem de consumo essencial para todos os cidadãos. Pode-se perceber que estes quatro níveis apontam três dimensões: cultura; política; e práticas pedagógicas que precisam estar em consonância para se vivenciar uma escola para todos. Compreender a dimensão dessa realidade educacional ajudará no trabalho pedagógico na diversidade, envolvendo práticas pedagógicas comuns para todos e sensíveis às diferenças individuais. Compreender a dimensão dessa realidade educacional ajudará no trabalho pedagógico na diversidade, envolvendo práticas pedagógicas comuns para todos e sensíveis às diferenças individuais. Você sabia que o escritor de histórias em quadrinhos Maurício de Sousa criou personagens com algum tipo de deficiência e que eles participam de muitos gibis da Turma da Mônica? Sabemos da importância da literatura para a disseminação de informações e esclarecimentos, e essa foi a contribuição do escritor para que as crianças tivessem contato com a diversidade na sua mais variada forma. Veja! 44 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Figura 24 – Personagens do Maurício de Sousa Fonte: Disponível em: <http://blogs.atribuna.com.br/deficienciaempauta/mauricio-de-sou- sa-e-a-turminha-da-inclusao/>. Acesso em: 13 dez. 2017. Figura 25 – Inclusão Fonte: Disponível em: <http://turmadamonica.uol.com.br/saibamaisinclusaosocial/>. Aces- so em: 13 dez. 2017. 45 A Educação Inclusiva na Contemporaneidade Capítulo 2 Algumas Considerações No Capítulo 2 do nosso caderno, acompanhamos os primeiros trabalhos da educação especial desenvolvidos no Brasil. Entendemos que esse serviço ofereceu acolhimento a uma demanda bastante excluída pela sociedade, dando assistência e espaço para que essas pessoas pudessem conviver e se integrar. Novas discussões e ações surgem com o intuito de ampliar o campo de possibilidades desse público-alvo. Vimos também os momentos históricos que perpassaram àqueles que fugiam do modelo, do padrão estabelecido pela sociedade. Assim, acompanhamos o processo de exclusão, em que não havia aceitação e nem participaçãodas pessoas com deficiência no contexto social. Em seguida, acompanhamos os primeiros passos segregacionistas, cujo papel da educação especial foi fundamental para iniciar o processo de discussão dessa demanda na sociedade. Também pudemos compreender sobre os movimentos de integração e, por fim, as perspectivas inclusivas discutidas e reivindicadas até hoje. Referências BEYER, Hugo Otto. Inclusão e avaliação na escola: de alunos com necessi- dades educacionais especiais. Porto Alegre: Mediação, 2006.127p. MANTOAN, Maria Teresa Egler. Inclusão escolar: o que é? por quê? como fazer? 2. ed. São Paulo: Moderna, 2003. SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de Janeiro: WVA, 1997. VEER, Rene Van der; VALSINER, Jaan. Vygotsky: uma síntese. 3. ed. Tradução Cecília C. Bartalotti. São Paulo: Loyola, 1999. VYGOTSKY, Lev Semenovich. Obras escogidas V: fundamentos de defectologia. Madrid: Visor, 1997. 46 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA CAPÍTULO 3 O Direito à Diferença na Igualdade de Direitos: Aspectos Legais A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: � Conhecer os documentos norteadores da educação especial/inclusiva no Brasil. � Avaliar os avanços históricos presentes nos documentos e leis norteadores da política de educação especial inclusiva. � Analisar os programas e ações de apoio ao desenvolvimento inclusivo dos sistemas de ensino. 48 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA 49 O Direito à Diferença na Igualdade de Direitos: Aspectos Legais Capítulo 3 Contextualização Nas escolas, inclusivas pela força da lei, não há preparação antes, para o exercício das relações do depois. O próprio exercício das relações de ensino tem preparado os professores para receber e acolher ‘alteridade deficiente’ (FONTANA, apud GÓES, p. 163, 2004). Nos capítulos anteriores, estudamos a pessoa com deficiência que, por um significativo período histórico, esteve às margens da escolarização; e percebemos, ao longo do tempo, movimentos para a criação de leis na tentativa de reconfigurar a inserção da pessoa com deficiência no ensino comum. A educação inclusiva é um movimento ainda em construção e que necessita ser constantemente repensada sobre as políticas públicas e as práticas pedagógicas nas escolas. Por isso, abordaremos neste momento, os principais aspectos da trajetória legal revisados por Maiola (2016), com as principais leis e documentos norteadores da educação especial, notas técnicas e os programas e ações de apoio ao desenvolvimento inclusivo dos sistemas de ensino. Você perceberá que esse percurso se inicia com discussões feitas em conferências nas quais vários países se reuniram para repensar as políticas de inclusão, resultando em declarações e leis norteadoras. A educação inclusiva é um movimento ainda em construção e que necessita ser constantemente repensada sobre as políticas públicas e as práticas pedagógicas nas escolas. Da Conferência de Jomtien à Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva – Caminhos Trilhados A partir do século XX, movimentos sociais de luta contra todas as formas de discriminação se tornaram mais intensos e a importância do exercício de cidadania das pessoas com deficiência surge, em nível mundial, através da defesa de uma sociedade mais inclusiva. 50 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Ainda marcada por práticas de categorização e segregação, fortalece-se a crítica a essas ações, questionando-se os modelos de ensino e aprendizagem homogeneizadores. A Constituição Federal de 1988, traz como seus objetivos fundamentais “promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quais outras formas de discriminação” (artigo 3º, inciso IV) (BRASIL, 1988, p. 160) e define, no artigo 205, a educação como um direito de todos, garantindo o pleno desenvolvimento da pessoa, o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho (BRASIL, 1988). No seu artigo, 206, inciso I, estabelece “igualdade de condições de acesso e permanência na escola” (BRASIL, 1988, p. 160) como um dos princípios para o ensino e garante como dever do Estado, a oferta do atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino (artigo 208). Mesmo essa exposição clara, relatada pela Constituição, não foi suficiente para garantir a igualdade de direitos e de oportunidades às pessoas com deficiência no contexto da educação comum. Na tentativa de enfrentar esses desafios e pensar em ações capazes de superar esses processos históricos de exclusão, conferências importantes aconteceram, e delas, novos documentos norteadores de políticas públicas foram criados, conforme alguns exemplos especificados a seguir. A Constituição Federal de 1988, traz como seus objetivos fundamentais “promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quais outras formas de discriminação” (artigo 3º, inciso IV). Conferência Mundial de Educação Para Todos: Jomtien A Conferência Mundial de Educação para Todos aconteceu na cidade de Jomtien, na Tailândia, em 1990. Neste encontro, evidenciou-se os altos índices de crianças, adolescentes e jovens sem escolarização, objetivando assim, a promoção de transformações nos sistemas de ensino e o acesso e permanência de todos na escola. Desse encontro, surgiu um plano de ação (Declaração de Jomtien), do qual participaram representantes de governos e organizações não governamentais (ONGs), com o intuito de garantir as necessidades básicas da aprendizagem de todas as crianças, jovens e adultos. Essas necessidades básicas compreendem tanto os instrumentos essenciais para a aprendizagem como a leitura, a escrita, a expressão oral, o cálculo, a solução de problemas, quanto a aquisição de conhecimentos, habilidades, valores e atitudes necessários para que os seres humanos possam sobreviver e se desenvolver plenamente. Ao mencionar as pessoas com deficiência, o documento refere, em seu artigo 3º, a universalizar o acesso à educação e promover a equidade: 51 O Direito à Diferença na Igualdade de Direitos: Aspectos Legais Capítulo 3 1. A educação básica deve ser proporcionada a todas as crianças, jovens e adultos. Para tanto, é necessário universalizá-la e melhorar sua qualidade, bem como tomar medidas efetivas para reduzir as desigualdades. 2. Para que a educação básica se torne equitativa, é mister oferecer a todas as crianças, jovens e adultos, a oportunidade de alcançar e manter um padrão mínimo de qualidade da aprendizagem. [...] 5. As necessidades básicas de aprendizagem das pessoas portadoras de deficiências requerem atenção especial. É preciso tomar medidas que garantam a igualdade de acesso à educação aos portadores de todo e qualquer tipo de deficiência, como parte integrante do sistema educativo (On-line. Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/ images/0008/000862/086291por.pdf>). Os países que participaram desta conferência foram incentivados a elaborar planos decenais, em que as diretrizes e metas do plano de ação da conferência fossem contempladas. No Brasil, o Ministério da Educação divulgou o Plano Decenal de Educação Para Todos para o período de 1993 a 2003, elaborado em cumprimento às resoluções da conferência. A partir deste plano, ocorreu a aceitação formal, do governo federal, das propostas formuladas nos foros internacionais para a melhoria da educação básica. Diante disso, pode-se considerar que a Conferência de Jomtien foi um marco político e conceitual na educação ao reafirmar a necessidade de que todos dominem os conhecimentosindispensáveis à compreensão do mundo em que vivem, recomendando a todos os países participantes que se empenhem nesse movimento. A Conferência de Jomtien foi um marco político e conceitual na educação ao reafirmar a necessidade de que todos dominem os conhecimentos indispensáveis à compreensão do mundo em que vivem. Conferência Mundial de Necessidades Educativas Especiais: Acesso e Qualidade: Declaração de Salamanca A Conferência Mundial de Necessidade Educativas Especiais: Acesso e Qualidade foi realizada pela UNESCO em 1994, na cidade de Salamanca na Espanha, com a participação de 92 governos e 25 organizações internacionais, cujo objetivo consistiu na discussão sobre a escola não acessível a todos os estudantes. 52 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA A partir dessas discussões, sobre as práticas educacionais e a desigualdade social, surgiu o documento denominado Declaração de Salamanca e Linhas de Ação sobre Necessidades Educativas Especiais, no qual se evidenciou a necessidade de combater as atitudes discriminatórias, conforme vemos em Brasil (1994, p. 17-18): O princípio fundamental desta Linha de Ação é de que as escolas devem acolher todas as crianças, independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas ou outras. Devem acolher crianças com deficiência e crianças bem-dotadas; crianças que vivem nas ruas e que trabalham; crianças de populações distantes ou nômades; crianças de minorias linguísticas, étnicas ou culturais e crianças de outros grupos e zonas desfavorecidas ou marginalizados. Adiante são apresentados alguns dos itens discutidos nesse documento, que mos- tram as ações indicadas para uma perspectiva de educação para todos. Eles per- passam, tanto dos conceitos da educação especial, quanto da estrutura escolar, profissionais envolvidos, capacitação, recursos financeiros, participação da famí- lia, mercado de trabalho e outros. Seguem alguns recortes do documento pertinen- tes para estudo e compreensão. Assim, proclama-se que: • toda criança tem direito fundamental à educação, e deve ser dada a oportunidade de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem; • toda criança possui características, interesses, habilidades e necessidades de aprendizagem que são únicas; • sistemas educacionais deveriam ser designados e programas educacionais deveriam ser implementados no sentido de se levar em conta a vasta diversidade de tais características e necessidades; • aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola regular, que deveria acomodá-los dentro de uma Pedagogia centrada na criança, capaz de satisfazer a tais necessidades; • escolas regulares que possuam tal orientação inclusiva constituem os meios mais eficazes de combater atitudes discriminatórias criando-se comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcançando educação para todos; além disso, tais escolas provêm uma educação efetiva à maioria das crianças e aprimoram a eficiência e, em última instância, o custo da eficácia de todo o sistema educacional. (BRASIL, 1994, p. 1) Propondo a todos os governos que (BRASIL, 1994, p. 1-2): 53 O Direito à Diferença na Igualdade de Direitos: Aspectos Legais Capítulo 3 • atribuam a mais alta prioridade política e financeira ao aprimoramento de seus sistemas educacionais no sentido de se tornarem aptos a incluírem todas as crianças, independentemente de suas diferenças ou dificuldades individuais; • adotem o princípio de educação inclusiva em forma de lei ou de política, matriculando todas as crianças em escolas regulares, a menos que existam fortes razões para agir de outra forma; • desenvolvam projetos de demonstração e encorajem intercâmbios em países que possuam experiências de escolarização inclusiva; • estabeleçam mecanismos participatórios e descentralizados para planejamento, revisão e avaliação de provisão educacional para crianças e adultos com necessidades educacionais especiais; • encorajem e facilitem a participação de pais, comunidades e organizações de pessoas portadoras de deficiências nos processos de planejamento e tomada de decisão concernentes à provisão de serviços para necessidades educacionais especiais; • invistam maiores esforços em estratégias de identificação e intervenção precoces, bem como nos aspectos vocacionais da educação inclusiva; • garantam que, no contexto de uma mudança sistêmica, programas de treinamento de professores, tanto em serviço como durante a formação, incluam a provisão de educação especial dentro das escolas inclusivas. Na estrutura de ação, esclarece como termos (BRASIL, 1994, p. 3-4): [...] necessidades educacionais especiais, refere-se a todas aquelas crianças ou jovens cujas necessidades educacionais especiais se originam em função de deficiências ou dificuldades de aprendizagem. Muitas crianças experimentam dificuldades de aprendizagem e, portanto, possuem necessidades educacionais especiais em algum ponto durante a sua escolarização. Escolas devem buscar formas de educar tais crianças bem-sucedidamente, incluindo aquelas que possuam desvantagens severas. Existe um consenso emergente de que crianças e jovens com necessidades educacionais especiais devam ser incluídas em arranjos educacionais feitos para a maioria das crianças. E reforça a importância da educação inclusiva (BRASIL, 1994, p. 4-5): 6. [...] O desafio que confronta a escola inclusiva é no que diz respeito ao desenvolvimento de uma pedagogia centrada na criança e capaz de bem sucedidamente educar todas as crianças, incluindo aquelas que possuam desvantagens severa. O mérito de tais escolas não reside somente no fato de que 54 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA elas sejam capazes de prover uma educação de alta qualidade a todas as crianças: o estabelecimento de tais escolas é um passo crucial no sentido de modificar atitudes discriminatórias, de criar comunidades acolhedoras e de desenvolver uma sociedade inclusiva. [...] 7. Princípio fundamental da escola inclusiva é o de que todas as crianças devem aprender juntas, sempre que possível, independentemente de quaisquer dificuldades ou diferenças que elas possam ter. Escolas inclusivas devem reconhecer e responder às necessidades diversas de seus alunos, acomodando ambos os estilos e ritmos de aprendizagem e assegurando uma educação de qualidade a todos através de um currículo apropriado, arranjos organizacionais, estratégias de ensino, uso de recurso e parceria com as comunidades [...] 8. Dentro das escolas inclusivas, crianças com necessidades educacionais especiais deveriam receber qualquer suporte extra requerido para assegurar uma educação efetiva. Educação inclusiva é o modo mais eficaz para construção de solidariedade entre crianças com necessidades educacionais especiais e seus colegas. O encaminhamento de crianças a escolas especiais ou a classes especiais ou a sessões especiais dentro da escola em caráter permanente deveria constituir exceções, a ser recomendado somente naqueles casos infrequentes onde fique claramente demonstrado que a educação na classe regular seja incapaz de atender às necessidades educacionais ou sociais da criança ou quando sejam requisitados em nome do bem-estar da criança ou de outras crianças. Da política e organização (BRASIL, 1994, p. 6-7): 16. Políticas educacionais em todos os níveis, do nacional ao local, deveriam estipular que a criança portadora de deficiência deveria frequentar a escola de sua vizinhança: ou seja, a escola que seria frequentada caso a criança não portasse nenhuma deficiência. Exceções à esta regra deveriam ser consideradas individualmente, caso por caso, em casos em que a educação eminstituição especial seja requerida. 17. A prática de desmarginalização de crianças portadoras de deficiência deveria ser parte integrante de planos nacionais que objetivem atingir educação para todos. Mesmo naqueles casos excepcionais em que crianças sejam colocadas em escolas especiais, a educação dela não precisa ser inteiramente segregada. Frequência em regime não integral nas escolas regulares deveria ser encorajada [...] 19. Políticas educacionais deveriam levar em total consideração as diferenças e situações individuais. A importância da linguagem de signos como meio de comunicação entre os surdos, por exemplo, deveria ser reconhecida e provisão deveria ser feita no sentido de garantir que todas as pessoas surdas tenham acesso à educação em sua língua nacional de 55 O Direito à Diferença na Igualdade de Direitos: Aspectos Legais Capítulo 3 signos. Devido às necessidades particulares de comunicação dos surdos e das pessoas surdas/cegas, a educação deles pode ser mais adequadamente provida em escolas especiais ou classes especiais e unidades em escolas regulares. [...] 26. O currículo deveria ser adaptado às necessidades das crianças, e não vice-versa. Escolas deveriam, portanto, prover oportunidades curriculares que sejam apropriadas a criança com habilidades e interesses diferentes. 27. Crianças com necessidades especiais deveriam receber apoio instrucional adicional no contexto do currículo regular, e não de um currículo diferente. O princípio regulador deveria ser o de providenciar a mesma educação a todas as crianças, e também prover assistência adicional e apoio às crianças que assim o requeiram. [...] 29. Para que o progresso da criança seja acompanhado, formas de avaliação deveriam ser revistas. Avaliação formativa deveria ser incorporada no processo educacional regular no sentido de manter alunos e professores informados do controle da aprendizagem adquirida, bem como no sentido de identificar dificuldades e auxiliar os alunos a superá-las. 30. Para crianças com necessidades educacionais especiais uma rede contínua de apoio deveria ser providenciada, com variação desde a ajuda mínima na classe regular até programas adicionais de apoio à aprendizagem dentro da escola e expandindo, conforme necessário, à provisão de assistência dada por professores especializados e pessoal de apoio externo. 31. Tecnologia apropriada e viável deveria ser usada quando necessário para aprimorar a taxa de sucesso no currículo da escola e para ajudar na comunicação, mobilidade e aprendizagem. [...] Ainda, sobre a administração da escola (BRASIL, 1994, p. 9-10): 34. Diretores de escola têm a responsabilidade especial de promover atitudes positivas através da comunidade escolar e via arranjando uma cooperação efetiva entre professores de classe e pessoal de apoio. Arranjos apropriados para o apoio e o exato papel a ser assumido pelos vários parceiros no processo educacional deveria ser decidido através de consultoria e negociação. 35. Cada escola deveria ser uma comunidade coletivamente responsável pelo sucesso ou fracasso de cada estudante. O grupo de educadores, ao invés de professores individualmente, deveria dividir a responsabilidade pela educação de crianças com necessidades especiais. Pais e voluntários deveriam ser convidados assumir participação ativa no trabalho da escola. Professores, no entanto, possuem um papel fundamental enquanto administradores do processo educacional, apoiando as crianças através do uso de recursos disponíveis, tanto dentro como fora da sala de aula. 56 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Além disso, também recomenda a participação dos alunos com deficiência nas áreas prioritárias de atendimento (BRASIL, 1994, p. 12-13): Educação infantil 51. O sucesso de escolas inclusivas depende em muito da identificação precoce, avaliação e estimulação de crianças pré-escolares com necessidades educacionais especiais. Assistência infantil e programas educacionais para crianças até a idade de 6 anos deveriam ser desenvolvidos e/ou reorientados no sentido de promover o desenvolvimento físico, intelectual e social e a prontidão para a escolarização. [...] Preparação para a vida adulta 53. Jovens com necessidades educacionais especiais deveriam ser auxiliados no sentido de realizarem uma transição efetiva da escola para o trabalho. Escolas deveriam auxiliá- los a se tornarem economicamente ativos e provê-los com as habilidades necessárias ao cotidiano da vida, oferecendo treinamento em habilidades que correspondam às demandas sociais e de comunicação e às expectativas da vida adulta. [...] Enfatiza a participação da família e comunidade (BRASIL, 1994, p. 13-14): 57. A educação de crianças com necessidades educacionais especiais é uma tarefa a ser dividida entre pais e profissionais. Uma atitude positiva da parte dos pais favorece a integração escolar e social. [...] Procedimentos-Padrões das Nações Unidas para a Equalização de Oportunidades para Pessoas Portadoras de Deficiências, A/RES/48/96, Resolução das Nações Unidas adotada em Assembleia Geral Referência: Declaração de Salamanca A Declaração de Salamanca foi um documento fundamental para impulsionar novas práticas educacionais que beneficiassem as pessoas com deficiência, valorizando a busca pelo repensar do espaço escolar e os rumos da educação especial, a fim de assegurar condições de acesso, participação e aprendizagem de todos, concebendo a escola como uma instituição que reconhece as diferenças. A Declaração de Salamanca foi um documento fundamental para impulsionar novas práticas educacionais que beneficiassem as pessoas com deficiência, valorizando a busca pelo repensar do espaço escolar e os rumos da educação especial. 57 O Direito à Diferença na Igualdade de Direitos: Aspectos Legais Capítulo 3 Atividade de Estudos: 1) A Declaração de Salamanca foi um dos principais movimentos da educação especial inclusiva, muito significativa para a época, um marco para as políticas públicas e, consequentemente, estratégias educacionais. Pontue os principais aspectos desse documento, de acordo com cada área de ação desenvolvida no texto: a) Ações do governo: ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ b) Políticas educacionais: ____________________________________________________ ____________________________________________________ ___________________________________________________ ___________________________________________________ ____________________________________________________ c) Administração da escola: ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ d) Família e comunidade: ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 58 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO INCLUSIVA Política Nacional de Educação Especial A Política Nacional de Educação Especial de 1994 ficou conhecida como um documento que veio na contramão dos movimentos de educação para todos. Utilizou como foco o paradigma ainda integracionista, dando ênfase ao modelo clínico de deficiência e o caráter incapacitante
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