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Elizandra Aparecida Oliverio

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI 
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURIDICA – CEJURPS. 
CURSO DE DIREITO 
NUCLEO PRATICA JURÍDICA - NPJ 
SETOR DE MONOGRAFIA 
 
 
 
 
 
O ABORTO DE FETOS ANENCEFÁLICOS: UMA ABORDAGEM 
DOUTRINÁRIA E JURISPRUDENCIAL ACERCA DOS DIREITOS 
ENVOLVIDOS DA GESTANTE E DO FETO 
 
 
Elizandra Aparecida Olivério 
 
 
 
 
 
 
 
ITAJAÍ, OUTUBRO DE 2007.
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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI 
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURIDICA – CEJURPS. 
CURSO DE DIREITO 
NÚCLEO PRATICA JURÍDICA - NPJ 
SETOR DE MONOGRAFIA 
 
 
O ABORTO DE FETOS ANENCEFÁLICOS: UMA ABORDAGEM 
DOUTRINÁRIA E JURISPRUDENCIAL ACERCA DOS DIREITOS 
ENVOLVIDOS DA GESTANTE E DO FETO 
 
 
Elizandra Aparecida Olivério 
 
 
 
 
Monografia submetida à Universidade 
do Vale do Itajaí – UNIVALI como 
requisito parcial à obtenção do grau de 
Bacharel em Direito. 
 
 
 
 
Orientadora: MSc. ANDRIETTA KRETZ 
 
 
 
 
 
 
 
 
ITAJAÍ, OUTUBRO DE 2007.
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DEDICATÓRIA 
 
Esta monografia, eu dedico especialmente 
a vocês, meus queridos pais Natalina e Sebastião 
Olivério, que sempre me apoiaram e, com muito 
esforço e carinho, nunca deixaram faltar nada em 
minha vida... Que para atender a um pedido meu 
são capazes de sacrificar qualquer coisa em 
razão disso. Posso dizer que a prova está desde 
o dia que nasci: quantas noites em claro para 
poder me embalar, quantas noites dormiram com 
a mão sobre a minha cabeça quando estava 
doente... Não deve ter sido fácil, porém, com 
muito amor buscaram todos os meios que podiam 
para me fazer uma criança feliz e, mesmo depois 
de tanto trabalho comigo, o amor que possuem 
por mim é assombroso... E você, minha amada 
irmã, que há oito anos está morando comigo, 
distante de todos, até mesmo da nossa família, 
pode ter a certeza que se não fosse pela sua 
companhia, amor e cuidado não teria conseguido 
realizar o meu sonho... 
Todas as palavras aqui escritas são poucas 
para agradecer a vocês e demonstrar todo o meu 
AMOR... 
 
 OBRIGADO POR TUDO! 
 
 
 
 
 
 
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AGRADECIMENTO 
A Deus, que desde o início da minha caminhada 
está comigo sendo meu amparo e fortaleza, 
superando derrotas e me proporcionando grandes 
vitórias. Quero Te agradecer com toda humildade 
pela vida, o amor e a felicidade que coloca cada 
dia, quando acordo, em meu coração. Enfim, a 
vitória deste momento. Obrigado, Senhor JESUS. 
Aos meus pais Natalina e Sebastião Olivério. A 
vocês que me deram a vida e me ensinaram a ser 
forte e vivê-la com toda a dignidade, nunca 
desistir dos meus ideais. Iluminaram meus 
caminhos, sempre me apoiando nos momentos 
mais difíceis em que passei e nunca deixando de 
acreditar em mim. Ensinaram-me a crer e 
acreditar que se pode fazer tudo quando se tem 
um ideal. Toda a minha eterna gratidão. 
A minha irmã Fernanda que iluminara os meus 
caminhos obscuros com afeto e dedicação 
quando estava só, para que os trilhasse sem 
medos e enchera de esperança meus caminhos a 
cada dia. Saiba que te amo mais e mais a cada 
dia. . . 
 Ao meu namorado Fábio que com toda a sua 
paciência, ternura, dedicação e, principalmente, 
companheirismo vêm preenchendo de alguma 
forma todos os meus dias com extrema alegria. 
 Aos meus amigos por tantas horas que 
passamos lado a lado e pela oportunidade que 
me ofereceram com sua companhia durante os 
cinco anos de faculdade... Aos meus professores 
que transmitiram seus conhecimentos e 
mostraram as dificuldades encontradas na vida 
profissional. Enfim, a todos que de alguma forma 
contribuíram para a realização deste sonho, quero 
dizer obrigado com amor. Ter vocês por perto foi 
muito importante, e há de ficar uma enorme 
saudade. 
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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE 
 
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo 
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do 
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o 
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. 
 
Itajaí, 14 de novembro de 2007. 
 
 
_______________________________ 
Elizandra Aparecida Olivério 
Graduando (a) 
 
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PÁGINA DE APROVAÇÃO 
 
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale 
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando(a) Elizandra Aparecida Olivério 
sob o título: O Aborto de Fetos Anencefálicos: uma abordagem doutrinária e 
Jurisprudencial acerca dos direitos envolvidos da gestante e do feto, foi 
submetida em 14/11/2007 à banca examinadora composta pelos seguintes 
professores MCs: Andrietta Kretz (orientadora e presidente da banca), Rogério 
Ristow e Josemar Sidnei Soares, aprovada com a nota 10,00 (dez). 
 
Itajaí, 14 de novembro de 2007. 
 
 
________________________________ 
MSc. ANDRIETTA KRETZ 
Orientadora e Presidente da Banca 
 
 
 
____________________________ 
Professor Mestre Antônio Augusto Lapa 
Coordenação da Monografia 
 
 
 
 
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ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS 
Art. Artigo 
CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002 
CP/1940 Código Penal de 1940 
CRFB/1988 Constituição da República Federativa do Brasil 
ONU Organização das Nações Unidas 
CFM Conselho Federal de Medicina 
IEG Interrupção Eugênica da Gestação 
ITG Interrupção Terapêutica da Gestação 
ISG Interrupção Seletiva da Gestação 
IVG Interrupção Voluntária da Gestação 
 
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ROL DE CATEGORIAS 
Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à 
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais. 
 
FETO 
 
Aquele que já está concebido no ventre materno ou simplesmente formado, mas 
que já apresenta a forma de um ente humano1, ou seja, organismo humano em 
desenvolvimento no período que vai da nona semana de gestação ao nascimento. 
 
NASCITURO 
 
Nascituro é o ser já concebido, mas que ainda se encontrava no ventre materno. 
A lei não lhe concede personalidade, a qual só lhe será conferida se nascer com 
vida. Mas como provavelmente nascerá com vida, o ordenamento jurídico dede 
logo preserva seus interesses futuros, tomando medidas para salvaguardar os 
direitos que, com muita probabilidade, em breve serão seus.2 
 
ABORTO 
 
Do ponto de vista jurídico aborto3 significa nascer prematuramente, ou seja, antes 
do tempo. A lei não estabelece limites para idade gestacional em que ocorre a 
interrupção da prenhez, isto é, aborto é a interrupção da gravidez com o intuito de 
morte do concepto, seja ela desde a fecundação até os momentos antes do início 
do trabalho de parto. Já na visão médica, o aborto é considerado a interrupção da 
gravidez, espontânea ou propositada, desde o momento da fecundação do óvulo 
pelo gameta masculino até a 21º semana de gestação, pois da 21º semana até a 
 
1 SILVA, de Plácido. Dicionário jurídico. 15 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 353. 
2 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil – Parte Geral. v.1. São Paulo: Saraiva. 2002. p.36. 
3 ROSAS, Cristião Fernando. O segredo médico diante de uma situação de aborto. Parecer do 
CREMESP. Disponível em< http://www.bioetica.org.br/legislacao/res_par/integra/ 24292_00.php>. 
Acesso em 17 out. 2007. 
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28º semana fala-se em parto imaturo; e da 29º até a 37º semana tem-se o 
chamado parto prematuro. Portanto, a medicina só admite a hipótese de aborto 
dentro das primeiras vinte e uma semanas de desenvolvimento do ovo. 
 
ANENCEFALIA 
 
A anencefalia é definida na literatura médica como a malformação fetal congênita 
por defeito do fechamento do tubo neural durante a gestação, de modo que o feto 
não apresenta os hemisférios cerebrais e o córtex, havendo apenas resíduo do 
tronco encefálico.4 
Pode ser um embrião, feto ou recém-nascido que, por malformação congênita, 
não possui uma parte do sistema nervoso central, ou melhor, faltam-lhe os 
hemisférios cerebrais e tem uma parcela do tronco encefálico (bulbo raquidiano, 
ponte e pedúnculos cerebrais). Como os centros de respiração e circulação 
sangüínea situam-se no bulbo raquidiano, mantém suas funções vitais, logo, o 
anencefálico poderá nascer com vida, vinda a falecer horas, dias ou semanas 
depois.5 
 
MORAL 
 
Conjunto de regras decorrentes dos costumes e da recepção das virtudes 
valoradas pelo grupo social. Impropriamente a palavra é usada como sinônimo de 
Ética.6 
 
 
 
 
 
 
4 BEHMAN, Richard E.; KIEGMAN, Robert M.; JENSON, Hal B. Nelson.Tratado de Pediatria. Rio 
de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. p. 1777. 
5 DINIZ, Maria Helena. O Estado Atual do Biodireito. São Paulo: Saraiva, 2001. 
6 MELO, Osvaldo Ferreira de. Dicionário de Política Jurídica. 18 ed. Florianópolis: OAB-SC, 
2000. p 65 
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SUMÁRIO 
SUMÁRIO ......................................................................................... VII 
 
RESUMO..............................................................................................IX 
 
INTRODUÇÃO.....................................................................................01 
 
O ABORTO NO DIREITO PENAL BRASILEIRO ..........................................05 
1 CONSIDERAÇÕES ACERCA DO ABORTO .................................................... 05 
1.1 O CRIME DE ABORTO ................................................................................. 10 
1.2 NOÇÕES CONCEITUAIS DA OCORRÊNCIA DO CRIME DE ABORTO. .... 17 
1.2.1ABORTO PROVOCADO PELA GESTANTE OU COM SEU 
CONSENTIMENTO.............................................................................................. 17 
1.2.2 ABORTO PROVOCADO POR TERCEIRO ................................................ 19 
1.2.2.1 ABORTO SEM O CONSENTIMENTO DA GESTANTE........................... 20 
1.2.2.2 PROVOCAR ABORTO COM O CONSENTIMENTO DA GESTANTE..... 21 
1.3 FORMA QUALIFICADA DO ABORTO.......................................................... 22 
1.4 O ABORTO LEGAL....................................................................................... 24 
1.4.1 DIFERENÇAS ENTRE ABORTO EUGÊNICO E ABORTO SELETIVO ..... 25 
1.4.2 ABORTO NECESSÁRIO ............................................................................ 29 
1.4.3 ABORTO NO CASO DE GRAVIDEZ RESULTANTE DE ESTUPRO ......... 30 
 
CAPÍTULO 2 ........................................................................................33 
 
A VIDA E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NO ORDENAMENTO 
JURÍDICO BRASILEIRO..................................................................................... 33 
2 DO INÍCIO DA VIDA HUMANA ......................................................................... 33 
2.1 DIREITO À VIDA ........................................................................................... 36 
2.2 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E OS DIREITOS 
FUNDAMENTAIS ................................................................................................ 40 
2.3 OS DIREITOS E GARANTIAS DO FETO...................................................... 43 
2.3.1 PERSONALIDADE E CAPACIDADE DO NASCITURO.............................. 44 
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2.3.2 O INÍCIO DA PERSONALIDADE JURÍDICA PARA O NASCITURO .......... 45 
2.4 OS DIREITOS E GARANTIAS DA GESTANTE.......................................49 
 
CAPÍTULO 3 ........................................................................................53 
 
ANENCEFALIA, ABORTO E DIREITO ............................................................... 53 
3 DEFINIÇÃO DE ANENCEFALIA....................................................................... 53 
3.1 TRANSPLANTES COM ÓRGÃOS ORIUNDOS DE FETOS 
ANENCEFÁLICOS .............................................................................................. 58 
3.2 ABORTO EM CASO DE ANENCEFALIA: UMA LACUNA NA LEI .............. 61 
3.2.1 AUSÊNCIA DA TIPICIDADE MATERIAL NA INTERRUPÇÃO DA 
GESTAÇÃO DO FETO ANENCEFÁLICO ........................................................... 66 
3.2.2 PENSAMENTOS DE DOUTRINADORES................................................. 68 
3.3 TENDÊNCIAS JURISPRUDENCIAIS ACERCA DO ABORTO DE 
ANENCEFÁLICOS .............................................................................................. 73 
3.3.1 ALVARÁS JUDICIAIS ....................................................................................... 74 
3.3.2 A PROPENSÃO DOS ACÓRDÃOS JURISPRUDENCIAIS........................ 77 
3.3.3 ABORTO DE ANENCEFÁLICOS EM OUTROS PAÍSES ........................... 83 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................87 
 
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ............................................91 
 
ANEXOS ..............................................................................................98 
 
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 1 
RESUMO 
 
Os fetos acometidos por anencefalia são mantidos em 
vida somente pela ligação materna, com chances muito reduzidas de viveram 
por mais um ano extra-útero. Quando diagnosticada tal malformação, as 
questões relevantes que existem dentro de uma família é o questionamento de 
qual a melhor opção a ser tomada nessa hora. Porém, esse questionamento foi 
durante muito tempo deixado de lado, pois as crianças que nasciam com 
alguma anomalia não eram bem vistas pela sociedade, sendo consideradas 
como pecaminosas e contrárias aos ensinamentos religiosos. No decorrer dos 
anos, principalmente com a evolução da medicina, o diagnóstico da anencefalia 
se tornou cada vez mais aprimorado e com menor chance de ocorrer erros, o 
que aumentou o grau de precisão dos resultados obtidos na avaliação da 
saúde fetal, sendo admitida uma margem de erro menor do que 1/1000. Em 
1940, com o advento do Código Penal, o legislador deixou de tipificar em um 
artigo especifico esse tipo de aborto, sendo que as normas penais que 
incriminam o aborto estão contidas nos artigos 124, a 128 do Código Penal e 
possuem a finalidade de proteger a vida humana intra-uterina. O aborto de 
fetos anencefálicos vem também sendo chamado de aborto seletivo. Com a 
promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a lei 
maior do Estado, visando um direito maior para a sociedade e para a gestante, 
implantou-se novos conceitos sobre à dignidade da pessoa humana (artigo 1º, 
IV), o princípio da legalidade, porém, vai ao encontro da liberdade e da 
autonomia da vontade (artigo 5º, II) e do direito à saúde (artigo 6º, caput e 196), 
todos da Constituição da República. Portanto, a escolha do tema deu-se em 
necessidade de aprofundar o conhecimento e descrever a evolução do direito 
para um melhor entendimento e espera-se que as dúvidas deixadas pela 
legislação sejam abordadas de uma forma mais clara, como é o caso do 
aumento das liminares pedindo autorizaçãopara o aborto de fetos 
anencefálicos perante a justiça. O Método de pesquisa empregado foi o 
indutivo em todo o decorrer da pesquisa. 
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 2 
INTRODUÇÃO 
 
 
A anencefalia é proveniente de um defeito de fechamento 
da parte anterior do tubo neural, tendo como principal característica a falta de 
desenvolvimento da calota craniana, couro cabeludo e hemisférios cerebrais. 
 
Uma vez diagnosticada a mal-formação, não há nada que 
a ciência médica possa fazer quanto a esse feto. O mesmo, todavia, não ocorre 
com relação ao quadro clínico da gestante. A literatura médica tem constatado 
que a permanência do feto anômalo no útero da mãe é potencialmente 
perigosa, podendo gerar danos à saúde da gestante e até perigo de vida, em 
razão do alto índice de óbitos intra-útero desses fetos. 
 
A autorização da Justiça para se fazer o aborto de fetos 
anencefálicos é algo dificílimo de se conseguir e, muitas vezes, em razão da 
lentidão do judiciário, quando concedido, a mãe já teve o dever de carregar por 
nove meses um feto que sabe, com plenitude de certeza, que não sobreviverá, 
causando-lhe dor, angústia e frustração. 
 
A potencial ameaça à integridade física e os danos à 
integridade moral e psicológica na hipótese são evidentes. A convivência diária 
com a triste realidade e a lembrança ininterrupta do feto dentro de seu corpo, 
que raramente irá completar um ano de vida, podem ser comparadas à tortura 
psicológica. 
 
Sustenta-se que o aborto nos casos de gravidez de feto 
anencefálico está tipificado no Código Penal como aborto necessário. O aborto 
é descrito pela doutrina especializada como a interrupção da gravidez com a 
conseqüente morte do feto (produto da concepção). 
O que deve ser levado em consideração no tema 
abordado é que este se depara com uma colisão de direitos fundamentais, o 
que pesa mais: o direito do feto à vida até o seu nascimento ou a escolha da 
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 3 
mãe quando decide abortar o feto que sabe que terá poucas horas de vida? A 
partir disso, deverá ser realizado um balanceamento de valores em razão do 
princípio da proporcionalidade. 
 
Assim sendo, quando se dá, entretanto, interrupção da 
gravidez, seja qual for o momento da gestação, por deliberação da mulher, 
isoladamente ou com a intermediação de terceiro, disso resultando a morte do 
feto, ocorre aborto voluntário, a teor dos artigos 124 a 128 do Código Penal, 
classificados entre os crimes contra a vida, que não deixam de ser uma 
subclasse dos delitos contra a pessoa. 
 
O artigo 5º ”caput” da Constituição Federal, que abre o 
Título alusivo aos Direitos e Garantias Fundamentais, no inciso XXXVIII, do 
mesmo artigo, reconhece a instituição do Júri com a competência para o 
julgamento dos crimes dolosos contra a vida, entre os quais se inclui o 
abortamento. O direito penal dedica distintas normas para a proteção desta 
vida desde o momento de sua concepção até seu término.7 
 
Deste modo, a presente monografia tem por objeto a 
análise da legalização do aborto de fetos anencefálicos perante o atual 
momento jurídico brasileiro. 
 
Tendo como objetivos: o institucional – produzir 
monografia para obtenção de título de Bacharel em Direito pela Universidade 
do Vale do Itajaí; geral – abordar a legalização do aborto de fetos anencefálicos 
perante o atual momento jurídico brasileiro; específicos – a) observar as 
doutrinas que fazem considerações acerca do aborto no direito penal brasileiro 
e o que regem sobre a morte e o início da vida; b) analisar os direitos da 
gestante e do feto à vida e identificar quais as implicações legais para a 
gestante caso venha cometer o aborto; c) abordar e caracterizar a anencefalia 
e o aborto nos casos de fetos anencefálicos. 
 
7 BRASIL. Constituição [1988] Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 19° 
ed. São Paulo: Saraiva, 1988. 
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 4 
Para que se possa realizar a pesquisa com uma maior 
veracidade, é indispensável observar as doutrinas que fazem considerações 
acerca do aborto no direito penal brasileiro e o que regem sobre a morte e o 
início da vida, além de analisar os direitos da gestante e do feto. 
 
 Para tanto, principiar-se-á, no Capítulo 1, fazendo-se 
uma explanação sobre o aborto no direito penal brasileiro, iniciando com um 
breve histórico do aborto no Brasil, além de tipificar as formas e classificações 
desse encontradas no direito penal. 
 
No Capítulo 2 far-se-á uma abordagem acerca da 
dignidade da pessoa humana no ordenamento jurídico brasileiro, os direitos e 
garantias do feto, bem como da gestante. 
 
Por fim, o último capítulo tratará da anencefalia, sua 
definição, a utilização dos órgãos dos fetos para transplantes, a visão 
internacional do aborto de anencefálicos e, por último, a ausência da tipicidade 
material na interrupção da gestação do feto anencefálico e as tendências 
jurisprudenciais acerca do aborto de tais. 
 
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as 
Considerações Finais, nas quais são apresentados os pontos conclusivos 
destacados no decorrer da pesquisa. 
 
Para a presente monografia foram levantadas as 
seguintes hipóteses: 
 
 O aborto de fetos anencefálicos não é permitido pelo 
direito brasileiro e, portanto, não possui fundamento de legalidade. 
 
 Existe a possibilidade de aborto de fetos 
anencefálicos tendo em vista que se trata de uma colisão de direitos e 
fundamentos que é resolvido, no caso concreto, através da proporcionalidade. 
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 5 
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na 
Fase de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de 
Dados o Método Cartesiano, e, dependendo do resultado das análises, no 
Relatório da Pesquisa poderá ser empregada à base indutiva e/ou outra que for 
a mais indicada8.9 
 
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as 
Técnicas do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa 
Bibliográfica. 
Assim, através do acesso a estas considerações que 
serão realizadas na presente pesquisa, espera-se que essa possa contribuir 
aos operadores do direito levando-os a um repensar no que tange ao caso da 
anencefalia sobre a ótica dos direitos garantidos acerca o da dignidade 
humana. 
 
 
8PASOLD, César Luiz.Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o 
pesquisador do direito. 7. ed. rev. atual. amp. Florianópolis: OAB/SC, 2002. p. 99-107. 
 
 
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 6 
CAPÍTULO 1 
 
 
O ABORTO NO DIREITO PENAL BRASILEIRO 
 
 
1 CONSIDERAÇÕES ACERCA DO ABORTO 
 
 
O Aborto tem sido algo muito discutido ao longo da 
história do direito e sua prática está sendo cada vez mais aplicada, objetivando 
evitar o nascimento de filhos indesejáveis. 
 
O primeiro ponto a se tratar destina-se a uma pesquisa 
histórica sobre o aborto para demonstrar que o assunto tem sido objeto de 
muitas discussões ao longo da evolução da sociedade. 
 
Mas afinal, o que vem a ser o Aborto? 
 
Nas clássicas lições de Hélio Cláudio Fragoso10 acerca do 
tipo objetivo do crime de aborto tem-se: 
O aborto consiste na interrupção da gravidez com a morte do 
feto. Pressupõe, portanto, a gravidez, isto é, o estado de 
gestação, que para os efeitos legais, inicia-se com a 
implantação do ovo na cavidade uterina. (...). A ação 
incriminada consiste na interrupção da gravidez, destruindo-seo produto da concepção ou provocando-se a morte do feto, 
sem que se exija a sua expulsão. 
No mesmo sentido, Ney Moura Teles define aborto 
como11: 
 
10 FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal: Parte Geral. 15 ed. São Paulo: 
Forense, 1995, p 127-128. 
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 7 
Aborto é a interrupção da gravidez com a morte do ser humano 
em formação. A gravidez, que começa com a fecundação do 
óvulo pelo espermatozóide, é o processo de formação do ser 
humano que termina com o início do parto. 
Assim, pode-se relatar a seguir, alguns exemplos a 
respeito do aborto ao longo do tempo. 
 
Na sua obra A República, Platão, em diálogo através de 
Sócrates, recomenda às mulheres com mais de 40 anos “que tomem todas as 
precauções possíveis para que nenhum filho fruto dessas uniões veja a luz do 
dia12”. 
 
A preocupação de Platão é que se tenha um 
direcionamento para o controle demográfico para que as mulheres apenas 
dêem luz a pessoas melhores e úteis ao interesse do Estado. 
 
Já Aristóteles13 sugeria o aborto para manter o equilíbrio 
populacional. Observa-se então que, na antiga Grécia, o aborto era geralmente 
permitido14. Pode-se deduzir que este não chocava nem o senso moral comum 
e que não existiam restrições jurídicas particulares. Uma situação análoga valia 
em Roma, onde o aborto não levantava problemas éticos. 
 
No entanto, os Hebreus possuíam um conjunto de 
preceitos morais e jurídicos diferentes que posteriormente foram reunidos em 
 
11TELES, Ney Moura. Direito Penal: parte especial: artigos 121 a 212, v. 2. São Paulo: Atlas, 
2004. 
12PLATÃO. A República: texto integral. São Paulo: Martin Claret. 2006. p.165. 
13 ARISTÓTELES. A política, trad. de Roberto Leal Ferreira, 2 ed., São Paulo: Martins Fontes, 
1998. 
14 MORI, Maurício. A Moralidade do Aborto: sacralidade da vida e novo papel da mulher. 
Brasília: Universidade de Brasília, 1997. 
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 8 
cinco livros denominados Pentateuco15, que vieram integrar o livro religioso 
conhecido por Bíblia. 
 
Num dos livros do Pentateuco, o Êxodo, encontra-se a 
seguinte expressão16: 
Se homens brigarem, e ferirem mulher grávida, e forem causa 
de aborto, sem maior dano, o culpado será obrigado a 
indenizar o que lhe exigir a marido da mulher; e pagará o que 
os árbitros determinarem. Mas se houver dano grave, então 
darás vida por vida, olho por olho, dente por dente, pé por pé, 
queimadura por queimadura, ferida por ferida, golpe por golpe. 
Segundo Nelson Fragoso Heleno Hungria, em Roma, a 
Lei das XII Tábuas e as da República não tratavam a respeito do aborto e o 
produto da concepção era considerado parte do corpo da gestante, de suas 
vísceras. Por isso, diz Hungria, tornou-se a prática comum.17 O feto podia 
dispor do corpo da mulher como lhe aprouvesse. Com o tempo, entretanto, o 
aborto passou a ser incriminado também em Roma, principalmente depois da 
influência do cristianismo. 
 
Atualmente não há uma unanimidade entre os povos 
quanto à incriminação ou a legalização do aborto. Algumas sociedades 
nacionais consideram o aborto lícito, enquanto que outras o tipificam, 
entretanto justificam sua prática excepcionalmente. 
 
Segundo Cezar Roberto Bitencourt18, o Código Criminal 
do Império vigente no Brasil de 1830 previa a criminalização apenas do aborto 
 
15 Segundo o Dicionário Aurélio, Pentateuco representa os cinco primeiros livros do Velho 
Testamento, atribuídos a Moisés: o Gênese, o Êxodo, o Levítico, o Números e o Deuteronômio. 
16 BÍBLIA. Português. Trad. Gilbertro da Silva Gorgulho. Bíblia Sagrada. 24 ed. São Paulo: 
Paulinas, 1998. Livro Êxodo, v. 22-25. 
17 HUNGRIA, Nelson Heleno Fragoso. Comentários ao Código Penal. 5 ed. Uberaba: 
Forense. 2004. p.270. 
18 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 3 ed., v.2, São Paulo: Saraiva, 
2003, p. 156 
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 9 
praticado por terceiro e não do auto-aborto, criminalizava, na verdade, o aborto 
consentido e o aborto. O aborto estava previsto no capítulo dos crimes contra a 
segurança, a pessoa e a vida19. Não havia, na mencionada legislação, previsão 
de excludentes, seja do crime, seja da pena. 
Art 199. Ocasionar aborto por qualquer meio empregado, 
interior ou exteriormente, com consentimento da mulher pejada. 
Pena: prisão com trabalho de 1 a 5 anos. 
Se o crime for cometido sem o consentimento da mulher 
pejada. 
Penas: dobradas. 
Art 200. Fornecer, com conhecimento de causa, drogas ou 
quaisquer meios para produzir o aborto, ainda que este não se 
verifique. 
Pena: prisão com trabalho de 2 a 6 anos. 
Se esse crime for cometido por médico, boticário ou cirurgião 
ou ainda praticantes de tais artes. 
Penas: dobradas. 
A punição do auto-aborto aparece pela primeira vez no 
Código Penal de 1890. Ao contrário do anterior, encontrava-se a expressão 
“aborto legal” e era previsto como legal o aborto para salvar a vida da gestante. 
Somente nessa legislação houve a previsão especial para a prática de aborto 
que ocasionasse a morte da gestante. O referido Código Penal estabelecia20: 
Art 300 Provocar aborto haja ou não a expulsão do produto da 
concepção. 
 
19 FRANÇA, General Veloso de. Medicina Legal. 6 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 
2001. p. 224-225. 
20 FRANÇA, General Veloso de. Medicina Legal. 6 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 
2001. p.225. 
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 10 
No primeiro caso: pena de prisão celular por 2 a 6 anos. 
No segundo caso: pena de prisão celular por 6 meses a 1 ano. 
§ 1º. Se em conseqüência do aborto, ou dos meios 
empregados para provocá-lo, seguir a morte da mulher. 
Pena: prisão de 6 a 24 anos. 
§ 2º. Se o aborto foi provocado por médico, parteira legalmente 
habilitada para o exercício da medicina. 
Pena: a mesma procedente estabelecida e a proibição do 
exercício da profissão por tempo igual ao da reclusão. 
Art 301 Provocar aborto com anuência e acordo da gestante: 
Pena: prisão celular por 1 a 5 anos. 
Parágrafo único. Em igual pena incorrerá a gestante que 
conseguir abortar voluntariamente, empregando para esse fim 
os meios; com redução da terça parte se o crime foi cometido 
para ocultar desonra própria. 
Art 302 Se o médico ou parteira, praticando o aborto legal, 
para salvar da morte inevitável, ocasionam-lhe a morte por 
imperícia ou negligência. 
Penas: prisão celular de 2 meses a 2 anos, e privado de 
exercício da profissão por igual tempo de condenação. 
Analisando as referências anteriormente citadas, conclui-
se que o aborto, ao longo da história, foi uma prática proibida, embora a 
fundamentação da proibição para cada época não tenha sido a mesma. O 
Código Penal brasileiro em vigor dede 1940 considera o aborto como crime, 
contudo admite sua prática lícita em duas situações, que serão discutidas 
posteriormente. 
 
 
 
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 11 
1.1 O crime de Aborto 
 
 
Etimologicamente, aborto significa privação do 
nascimento e este pode ser natural, acidental ou provocado por ação humana. 
 
O aborto natural é aquele em que o próprio organismo da 
gestante, pelas mais diversas causas, não permite a conclusão do processo 
gravídico21. 
 
Já o acidental ocorre em razão de algo externo, por 
exemplo, uma situação de extremo estresse,a ingestão de uma substância 
inadequada e que seu poder destrutivo era desconhecido, enfim, qualquer ação 
externa não provocada pela vontade da gestante de ocasionar o aborto. 
 
Quando provocado, é causado por condutas humanas 
dirigidas à interrupção da gravidez, com a finalidade de impedir o 
desenvolvimento e nascimento do feto em formação. Pode ser punível ou não 
punível, sendo esse último também denominado “aborto legal”. 
 
Se o aborto for analisado sob o enfoque do ordenamento 
jurídico brasileiro, torna-se de suma importância expor algumas considerações 
sobre o tema que gera tantas discussões na Sociedade, tendo em vista que as 
pessoas possuem, no seu íntimo, seus valores morais, opiniões pró ou contra o 
aborto. 
 
Para aqueles que defendem o aborto ou a sua 
descriminalização, diversos argumentos podem ser elencados. Os mais 
representativos são os seguintes22: 
 
21 KNUPPEL, Robert A.; DRUKKER, Joan E. e colaboradores. Alto Risco em Obstetrícia: um 
enfoque multidisciplinar. 2 ed. Porto Alegre: Artes Médicas. 1996. 
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 12 
a) que a mulher é dona de seu corpo e tem o direito de 
escolha; 
 
b) que o aborto no Brasil é um caso de saúde pública, 
pois são feitos sem condições técnicas e higiênicas. A 
Organização Mundial da Saúde estima que 99% das 500 
mil mortes maternas anuais se dão nos países em 
desenvolvimento, e que destas, de 115 a 204 mil são de 
complicações decorrentes de abortos ilegais ou 
clandestinos; 
 
c) pratica-se, no Brasil, cerca de 1,5 milhão de abortos 
anuais; 
 
d) há que se levar em conta o pluralismo inerente à 
Democracia e a tendência atual do Direito de afastar a 
legislação punitiva para o aborto. 
 
Por outro lado, estão aqueles que são contrários ao 
aborto e sua legalização. Os argumentos podem ser assim representados: 
 
a) que o embrião e o feto são seres humanos e como tal 
têm integral proteção e direito à vida, com garantias 
constitucionais; 
 
b) o número elevado de abortos não justifica sua 
legalização, pois o furto e outros crimes também são 
numerosos e não são legalizados; 
 
 
22 VIVIANI, Maury Roberto. Aspectos Controvertidos do Crime de Aborto: a atualização 
judicial e o conflito de direitos fundamentais da gestante e do nascituro. 2000. 132p. 
(Dissertação). 
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 13 
c) o corpo da mulher não se confunde com o corpo do 
nascituro. Portanto, a mulher não tem direito de tirar a 
vida de um outrem; 
 
d) o problema de saúde pública deve ser solucionado com 
a educação e com a orientação sobre a maternidade, cuja 
escolha deve ser anterior à gravidez; 
 
e) as legislações que permitem o aborto não diminuíram 
sua incidência nem os problemas sociais e contrariam os 
direitos humanos. 
 
No mesmo entendimento, Hélio Gomes23, no âmbito da 
Medicina legal, define o aborto criminoso como sendo: 
A interrupção ilícita da prenhez, com a morte do produto, haja 
ou não expulsão, qualquer que seja o estado evolutivo, desde a 
concepção até momentos antes do parto. 
Devido ao fato de existir divergências de opiniões sobre o 
tema, inúmeras discussões ocorrem no Congresso Nacional brasileiro, fazendo 
com que tramitem diversos projetos de Lei sobre o assunto com entendimentos 
diferentes. Alguns pretendem a legalização do aborto somente em casos 
especiais tais como: quando a gravidez oferecer risco de morte a gestante, 
quando a gravidez é resultado de um estupro, quando a gestante é alienada 
mental e, principalmente, nos casos em que o nascituro possui anomalias ou 
doenças graves. 
 
Destaca-se, em virtude da polêmica causada, o Projeto de 
Lei n° 20 de1991, de autoria dos Deputados Eduardo Jorge e Sandra Starling, 
que foi aprovado apenas em 1997 pela Comissão de Constituição e Justiça e 
de Redação – CCJR. Este projeto tratava sobre a obrigatoriedade do 
 
23GOMES, Hélio. Medicina Legal. 30 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1993. p. 348. 
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 14 
atendimento pelo SUS - Sistema Único de Saúde - nos casos previstos no 
Código Penal. 
 
Ainda de autoria dos mesmos deputados acima citados, 
registra-se o Projeto de Lei nº 1.135 de 1991, que dispõe sobre a suspensão 
do artigo 124 do Código Penal, que incrimina o aborto provocado ou consentido 
pela gestante. Assim, a incriminação24 somente seria dirigida à ação de terceiro 
que o pratica. 
 
Também vale destacar a proposta de Emenda 
Constitucional feito pelo ex-presidente da Câmara de Deputados Severino 
Cavalcanti, que pretendia incluir na Constituição da República Federativa do 
Brasil a garantia do direito à vida desde a concepção. 
 
O projeto de Lei n° 3.609 de 1993 de autoria do então 
deputado José Genuíno prevê a liberdade de abortar, no período de 90 dias do 
início da gravidez, mediante solicitação da gestante. 
 
Em relação ao aborto de fetos com anomalias tem-se o 
Projeto de Lei n° 1956/96 de autoria de Marta Suplicy que diz25: 
Art. 1º Fica autorizada a interrupção da gravidez, quando o 
produto da concepção não apresentar condições de sobrevida 
em decorrência de malformação incompatível com a vida ou 
de doença degenerativa incurável, precedida de indicação 
médica, ou quando por meios científicos se constatar a 
impossibilidade de vida extra-uterina. 
Art. 2º A interrupção da gravidez se fará com o consentimento 
da gestante ou representante legal nos casos de 
incapacidade, após a constatação da anomalia fetal, e 
orientação por médico especialista sobre as reais implicações 
para o feto de tal diagnóstico. 
 
24 Por incriminação, entende-se que uma determinada conduta é legislada como crime; ocorre 
a descriminalização quando a legislação deixa de considerar a conduta como crime. 
25 BRASIL. Projeto de lei nº. 1.956, de 1996. Publicado no Diário da Câmara dos Deputados 
em 21 jun. 1996. Disponível em:<http://www.camera.gov.br>. Acesso em 24 maio 2007. 
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 15 
Parágrafo único. O procedimento da interrupção da gravidez 
será sempre feito em instituições hospitalares públicas ou 
privadas, dotadas de condições adequadas a qualquer 
eventualidade de risco de vida da Parte Especial. 
A opinião de Marta Suplicy, ao justificar o referido Projeto 
de Lei de sua autoria, é de que26: 
É necessário utilizar técnicas disponíveis para estudo e 
diagnóstico de problemas no feto, dando às mães que se 
tornam verdadeiros “caixões ambulantes” a possibilidade de 
decidir sobre a manutenção ou não da gravidez. Algumas 
mulheres darão preferência por levar adiante a gestação, 
enquanto outras farão opção contrária, por se sentirem sem 
estrutura emocional para suportar tal vivência. É tortura obrigar 
uma mãe, contra sua vontade, a manter uma gravidez por 
vários meses se o resultado for o óbito do nascituro. (Grifo 
nosso). 
Tramita, ainda no Judiciário, a Ação de Descumprimento 
de Preceito Fundamental de nº 54, tendo como pretensa finalidade à obtenção 
de legalização de aborto, em uma das espécies de anomalia fetal existentes: o 
aborto por feto anencefálico. No entanto, tratando-se de ação que implique em 
controle concentrado de Constitucionalidade, terá sua eficácia ampla no 
território nacional, fazendo repercutir nos demais casos existentes. 
 
Após tanta discussão dentro do Congresso Nacional 
sobreo assunto foi criado uma Comissão de Reforma e Modificação da 
Legislação na Parte Especial do Código Penal. Essa Comissão elaborou um 
anteprojeto de lei27 que prevê, especificamente para o crime de aborto, a 
seguinte proposta: 
ABORTO PROVOCADO PELA GESTANTE OU COM SEU 
CONSENTIMENTO 
 
26 SUPLICY, Marta. Apud: TESSARO, Anelise. Aborto Seletivo: descriminalização e avanços 
tecnológicos da medicina contemporânea. Curitiba: Juruá, 2002. p.70. 
27 BRASIL. Anteprojeto da Reforma da Parte Especial do Código Penal. Disponível em: 
<http://buscalegis.ccj.ufsc.br/arquivos/normas/anteprojetocódigopenal.html>. Acesso em 31 jun. 
2007. 
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 16 
Art 124 Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem 
provoque: 
Pena: detenção, de 1 a 9 meses. 
ABORTO CONSENSUAL PROVOCADO POR TERCEIRO 
Art 125 Provocar aborto com consentimento da gestante. 
Parágrafo único. A pena é aumentada até a metade, além de 
multa, se o crime é cometido com o fim de lucro. 
ABORTO PROVOCADO POR TERCEIRO 
Art 126 Provocar aborto sem o consentimento da gestante. 
Pena: reclusão, de 4 a 8 anos. 
LESÃO CORPORAL OU MORTE DA GESTANTE 
Art 127 Nos casos dos artigos 125 e 126, se em conseqüência 
do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, resultar à 
gestante lesão corporal grave ou morte, e as circunstâncias 
evidenciam que o agente não quis, nem assumiu o risco de sua 
produção, aplica-se também, a pena de lesão corporal culposa 
ou homicídio culposo. 
EXCLUSÃO DE ILICITUDE 
Art 128 Não constitui o aborto praticado por médico se: 
I – não há outro meio de salvar a vida ou preservar a saúde da 
gestante; 
II – a gravidez resulta de violação de liberdade sexual, ou de 
emprego não consentido de técnica de reprodução assistida; 
III – há fundada probabilidade, atestada por dois outros 
médicos, de o nascituro apresentar graves e irreversíveis 
anomalias físicas ou mentais. 
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 17 
§ 1º No caso dos incisos II e III, e da segunda parte do inciso I, 
o aborto deve ser precedido de consentimento da gestante, ou 
quando menor, incapaz ou impossibilitada de consentir, de seu 
representante legal, do cônjuge ou de seu companheiro; 
§ 2º No caso do inciso III, o aborto depende, também, da não 
oposição justificada do cônjuge ou companheiro. 
Esta alteração foi uma tentativa de pacificar a polêmica 
existente sobre o objeto em questão. 
 
Entretanto, o artigo 128 do Código Penal, que trata das 
excludentes de ilicitude ou da exclusão da pena, mantém o denominado aborto 
necessário e estende o aborto sentimental não só para os casos de gravidez 
resultante de estupro, mas também para qualquer violação contra a liberdade 
sexual da mulher, por exemplo, o atentado violento ao pudor e o emprego não 
consentido de técnica de reprodução assistida. 
 
 
1.2 Noções Conceituais da Ocorrência do Crime de Aborto 
 
 
O aborto ainda é uma prática proibida no Brasil e está 
previsto dentro do Código Penal nos crimes contra a pessoa, estando dentro da 
subclasse dos crimes contra a vida, podendo ser classificado em quatro 
modalidades que serão descritas a seguir. 
 
As normas penais que incriminam o aborto estão contidas 
nos artigos 124, 125, 126, 127 e 128 do Código Penal, possuem a finalidade de 
proteger a vida humana intra-uterina. 
 
A gravidez estende-se desde a concepção até o início do 
parto, exigindo-se a prova desse estado por meio de exame do corpo de delito 
direto ou indireto, quando desaparecidos seus vestígios. 
 
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 18 
1.2.1 Aborto Provocado Pela Gestante ou Com Seu Consentimento 
 
 
O artigo 124 do Código Penal28 descreve duas 
modalidades: o auto-aborto, descrito na primeira parte do artigo, sendo aquele 
em que a própria gestante provoca em si mesma; já na segunda parte do artigo 
tem-se o consentimento da gestante para que um terceiro provoque o aborto. 
 
Apresenta-se como sujeito ativo a gestante e como sujeito 
passivo o Estado, que tem interesse no nascimento do nascituro, e não no feto. 
Sendo assim, apresentam-se duas condutas típicas, onde ambas são formas 
de crime próprio e possuem pena de detenção prevista de 1 a 3 anos. 
Art 124 Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem 
lhe provoque: 
Pena: detenção, de 1 a 3 anos. 
É discutida a possibilidade de co-autoria ou participação, 
mas nada impede o concurso de agentes. Se esse atua em concordância com 
a gestante, também incidirá nesse artigo. 
 
Quem praticar o auto-aborto, da captação do 
consentimento da gestante, induzir, instigar ou auxiliar ou ainda colaborar de 
modo secundário sem interferir na execução do procedimento típico, sem ter, 
portanto, poder de decisão ou domínio do fato será considerado partícipe 
desse crime. Se, entretanto, contribuir materialmente para sua realização, 
praticando atos ou tendo poder de decidir sobre a consumação, responderá 
como autor do crime descrito no artigo 126 do Código Penal, adiante 
comentado. 
 
 
 
28 BRASIL, Código Penal - Decreto - lei nº 2848 de 07 de dezembro de 1940. 44 ed. São 
Paulo: Saraiva, 2006. 
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 19 
Para Edgard Magalhães Noronha29: 
No aborto consentido é outrem que o executa, porém, com 
aquiescência da mulher. A atuação desta não é secundária, 
como parece a alguns, razão tendo Maggiore para observar 
que a gestante não é inerte, mas coopera, consentindo nas 
praticas abortivas, isto é, sujeitando-se estas com movimentos 
corpóreos (ao menos pondo-se em posição obstétrica): não 
omite, age. 
O auto-aborto e o aborto consentido exigem o dolo, ainda 
que eventual. Não se pode falar, por inexistente, na figura do aborto culposo. 
Inexiste no Direito Penal Brasileiro a figura do Aborto Culposo. 
Assim, indispensável à configuração do delito é ter o agente 
atuado dolosamente. (JTACRIM 32/179) 
O auto-aborto distingue-se do infanticídio previsto no 
artigo 123 do Código Penal30, pois o aborto somente pode ocorrer antes do 
início do parto. 
 
 
1.2.2 Aborto provocado por terceiro 
 
 
No aborto provocado por terceiro, o sujeito ativo do crime 
é o qualquer pessoa que provoca o aborto na gestante, sendo este classificado 
em aborto provocado por terceiro com ou sem consentimento da gestante. Em 
ambos os casos, o sujeito passivo é representado pela gestante, bem como o 
Estado, que tem interesse não só na integridade corporal da mulher bem como 
no nascimento. 
 
No aborto sem o consentimento da gestante, a mulher 
não autoriza o aborto. Logo, não pratica crime. Já quando este é feito com seu 
 
 29NORONHA, Edgard Magalhães. Direito Penal. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 1991. p.66. 
30 Art 123. Matar, sob a influência puerperal, o próprio filho durante o parto ou logo após. Pena: 
detenção, de 2 a 6 anos. 
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 20 
consentimento, é preciso analisar a validade do consentimento, isto é, a 
gestante deve possuir capacidade para consentir. Estas duas formas serão 
analisadas mais minuciosamente nos itens abaixo. 
 
1.2.2.1 Aborto sem o consentimento da Gestante 
 
 
Neste fato delituoso, o crime é realizado contra a gestante 
e o direito da vida do nascituro. Para que ocorra essa prática basta que seja 
realizado o aborto sem o consentimento da gestante, ou seja, o agente realiza 
a intervenção no corpo da gestante contra a suavontade, provocando a 
interrupção da gravidez e matando o feto em formação. 
Art 125 Provocar aborto, sem o consentimento da gestante: 
Pena: reclusão, de 3 a 10 anos. 
O sujeito ativo do crime é o terceiro que provoca o aborto 
na gestante, já o sujeito passivo é a gestante e o Estado. Poderá o sujeito ativo 
agir com violência física ou grave ameaça, contrariando assim à vontade da 
gestante, que é a de não se submeter ao aborto. 
 
Para José Frederico Marques31, no caso de gestante 
menor de quatorze anos de idade, ou se esta é alienada mental, ou ainda, se 
há consentimento, mais obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência, a 
presunção do vício do consentimento é, portanto, inexistente e ocorre à 
ineficácia do consentimento. 
 
 O agente pode atuar com dolo eventual, quando ele 
realiza a conduta mesmo sabendo da gravidez e sabendo que o seu ato pode 
ocasionar uma possível interrupção, entretanto o agente não quer esse 
resultado, mas dele consente se acontecer. 
 
31 MARQUES, José Frederico. Tratado de Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 1961. 
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 21 
O aborto não é punido a título do culpa, somente sendo punível 
a título de dolo. Ao eliminar com um tiro uma mulher, sabendo-
a grávida, assumiu o agente o risco de sofrer a mesma um 
aborto, pelo que, ocorrendo a morte do feto, fica configurado tal 
delito, presente o dolo eventual. (RT/646/315) 
Distingue-se da provocação do aborto sem o 
consentimento da gestante o homicídio, já que nesse a conduta de matar do 
agente é posterior ao início do parto. 
 
 
1.2.2.2 Provocar aborto com o consentimento da gestante 
 
 
O crime previsto no artigo 126 do Código Penal pode ser 
praticado por qualquer pessoa, nada impede a co-autoria ou a participação de 
terceiros que atuem em favor do agente. Os dois cometem crime: a gestante 
responde pelo crime previsto no artigo 124 do Código Penal e a outra pessoa 
será punido mais severamente com a pena cominada do artigo 126 do Código 
Penal. 
 
Art 126 Provocar aborto com o consentimento da gestante: 
Pena: reclusão, de 3 a 10 anos. 
Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a 
gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, ou é alienada ou 
débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, 
grave ameaça ou violência. 
O consentimento da gestante pode ser expresso ou tácito, 
devendo existir desde o início da conduta até a consumação do delito. 
 
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 22 
A norma jurídica presume a violência, ainda que possa 
haver o consentimento da gestante, em três situações32: 
a) quando a gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, 
presumindo-se que ela tem desenvolvimento mental 
incompleto; 
b) quando a gestante é alienada (que sofre de doença 
mental) ou a débil mental (desenvolvimento mental 
retardado), que também podem consentir de maneira 
inválida; 
c) quando o consentimento da gestante for obtido por 
fraude, grave ameaça ou violência. 
Em todas as hipóteses, o agente responderá pelo ilícito 
tipificado no artigo 125 do Código Penal. 
 
 
1.3 Forma qualificada do aborto 
 
 
A forma qualificada do aborto ocorre quando houver 
somente culpa. Caso ocorra dolo do agente, direto ou eventual, com a lesão ou 
a morte, haverá concurso de crimes. Trata-se de modalidade de preterdolo 
(dolo no aborto mais homicídio ou lesões graves). Isto significa que houve dolo 
(eventual) em relação ao resultado, o agente responderá pelo concurso de 
crimes. 
 
Art.19 Pelo resultado que agrava especialmente a pena, só 
responde o agente que houver causado ao menos 
culposamente. 
 
32MIRABETE, Julio Fabbrini. Código Penal Interpretado. São Paulo: Atlas, 1999. 
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 23 
Não se aplica o dispositivo à gestante nem aquele que é 
co-autor ou partícipe de seu crime previstos nos artigo 125 ou 126 do Código 
Penal, a pena também deve ser acrescida. 
Art.127 As penas cominadas nos dois artigos anteriores são 
aumentadas de um terço, se, em conseqüência do aborto ou 
dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofrer lesão 
corporal de natureza grave; e não duplicadas, se, por qualquer 
dessas causas, lhe sobrevém a morte. 
No caso do artigo 127 do Código Penal, consiste em 
crime preterdoloso quando ocorre uma ação que é ao mesmo tempo, típica de 
um crime doloso e de um crime culposo. O agente quer um determinado 
resultado, mas dá causa a um outro resultado mais grave. 
 
O Artigo 18 do Código Penal diz: 
Art. 18 Diz-se o crime: 
I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o 
risco de produzi-lo; 
II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por 
imprudência, negligência ou imperícia. 
Parágrafo Único. Salvo os casos expressos em lei, ninguém 
pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando a 
pratica dolosamente. 
A forma qualificada do crime de aborto apresenta quatro 
figuras típicas provocado por terceiros qualificado pelo resultado, se em 
conseqüência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, resultar 
em33: 
 
 
33TELES, Ney Moura. Direito Penal: parte especial: artigos 121 a 212, v. 2. São Paulo: Atlas, 
2004. 
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 24 
a) lesão corporal de natureza grave na gestante, no 
aborto consentido, a pena será reclusão de um ano e 
quatro meses; 
b) morte da gestante, no aborto consentido, a pena será 
reclusão do dois a oito anos; 
c) lesão corporal grave na gestante, no aborto 
dissentido, a pena será reclusão de quatro a treze 
anos e quatro meses; 
d) morte da gestante, no aborto dissentido, a pena será 
de seis a vinte anos. 
Deste modo, todas essas formas típicas qualificadas pelo 
resultado são modalidades de crime preterdoloso, nos quais o agente age com 
dolo de provocar o aborto, mas, por negligência, imprudência ou imperícia, 
acaba produzindo resultado mais grave. 
 
 
1.4 O aborto legal 
 
 
Duas são as situações em que a lei considera aborto legal 
e torna lícita a prática do fato. O primeiro caso é do aborto necessário (ou 
terapêutico) que, no entender da doutrina, caracteriza uma espécie de estado 
de necessidade. A outra situação é a do aborto ético (ou sentimental), quando 
a gravidez é resultante de estupro, sendo o médico o único autorizado a 
realizar o aborto, podendo agir em favor de terceiro, no caso a gestante. 
Art 128 Não se pune o aborto praticado por médico. 
Não estando presentes os requisitos, o agente (médico) 
responderá pelo crime de aborto, mas não do exercício ilegal da medicina, já 
que a prática do aborto é, como regra geral, proibida. 
 
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 25 
1.4.1 As diferenças entre aborto eugênico e aborto seletivo 
 
 
A legislação penal brasileira posiciona-se quase que 
totalmente contrária ao aborto, admitindo apenas duas formas de aborto legal, 
como já foi dito anteriormente. 
 
Entretanto, geralmente o aborto é tratado de forma 
genérica, sem fazer distinção entre as diversas finalidades clínicas envoltas em 
cada caso. É válido, portanto, diferenciar o aborto terapêutico e o eugênico. 
Fala-se de aborto terapêutico como sendo aborto eugênico, e deste como 
aborto seletivo, gerando enorme confusão. 
 
Para esclarecer as diversas formas de aborto, o discurso 
médico oficial é o mais adequado, pois é a nomenclatura que mais representa 
a prática de tal fato. Segundo Débora Diniz e Marcos de Almeida, a literaturamédica preceitua que34: 
 
A interrupção eugênica da gestação (IEG) ocorre nos 
casos de aborto ocorridos em nome de práticas eugênicas, isto é, situações em 
que se interrompe a gestação por valores racistas, étnicos, religiosos, etc. Este 
tipo de interrupção ficou conhecido por não respeitar a vontade do indivíduo. 
Como exemplo de IEG pode-se citar as ações desumanas de Adolf Hitler, em 
que as mulheres judias eram obrigadas a praticar o aborto porque iriam gerar 
crianças também judias, e o aborto de crianças cujas mães haviam ingerido o 
fármaco Talidomida, que poderia provocar malformações, principalmente nos 
membros, porém, geralmente estas crianças tinham capacidade mental 
preservada. Esses são casos típicos de aborto eugênico. 
 
 
34 DINIZ, Débora. ALMEIDA, Marcos de. Bioética e Aborto. Disponível em: 
<http://www.cfm.org.br>. Acesso em: 10 out. 2007. 
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 26 
Eugenia, segundo Antônio Houaiss35, é a "Ciência que se 
ocupa do aperfeiçoamento físico e mental da raça humana". 
 
Denomina-se interrupção terapêutica da gestação (ITG) 
os casos em que o aborto ocorre em nome da saúde materna, isto é, situações 
em que se interrompe a gestação para salvar a vida da gestante. 
 
Atualmente, visto o grande avanço científico e tecnológico 
na medicina, os casos de ITG são cada vez menores, sendo raras as situações 
terapêuticas que exigem tal procedimento. 
 
No entanto, o fator "terapêutico" leva a pensar que o ato 
pretendido (aborto) é coisa benéfica e necessária, pois deflui de uma 
necessidade de tratar medicamentosamente a pessoa da mãe para trazer-lhe o 
bem estar e a plena saúde física, psíquica ou mental. 
 
Dernival da Silva Brandão preleciona36: 
Criança doente necessita de cuidados médicos e não de ser 
eliminada. O diagnóstico pré-natal deve ser realizado enquanto 
possa servir ao bem da pessoa, e ser adequado à prevenção, 
ao diagnóstico e ao tratamento de enfermidades; e não para 
discriminar os portadores de genes patogênicos e defeitos 
congênitos. Senão aplicar-se-iam conhecimentos médicos não 
para tratar o doente, mas para eliminá-lo (...) Sempre há meios 
de tratar a gestante e, para isso, devem ser empregados todos 
os recursos atualmente disponíveis na proteção da vida de 
ambos: mãe e filho.(...) Quando necessário, a gestante doente 
deve ser encaminhada para centro especializado em gestação 
de alto risco. O abortamento não é isento de riscos, e a 
experiência tem demonstrado que muitas vezes ele próprio é 
causa da morte para a gestante doente. 
 
35 HOUAISS, Antônio. Enciclopédia e Dicionário Ilustrado. Rio de Janeiro: Delta, 1994. p. 
642. 
36 BRANDÃO, Dernival da Silva. A Vida dos Direitos Humanos: Bioética Médica e Jurídica. 
Porto Alegre: Fabris, 1999. p. 30. 
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 27 
A interrupção seletiva da gestação (ISG) é verificada nos 
casos de aborto ocorridos em nome de anomalias fetais, isto é, situações em 
que se interrompe a gestação pela constatação de lesões fetais. Em geral, os 
casos que justificam as solicitações de ISG são de patologias incompatíveis 
com a vida extra-uterina, sendo um exemplo clássico a anencefalia37. 
 
Já a interrupção voluntária da gestação (IVG) advém nos 
casos de aborto ocorridos em nome da autonomia reprodutiva da gestante ou 
do casal, isto é, situações em que se interrompe a gestação porque a mulher 
ou o casal não mais desejam a gravidez, seja ela fruto de um estupro ou de 
uma relação consensual. Muitas vezes, as legislações que permitem a IVG 
impõem limites gestacionais à prática. 
 
Com exceção da interrupção eugênica da gestação, todas 
as outras formas de aborto levam em consideração à vontade da gestante ou 
do casal em manter a gravidez. 
 
Em geral, a interrupção seletiva da gestação é também 
denominada por interrupção terapêutica da gestação, sendo esta última à 
terminação é mais comum. 
 
Esta é uma tradição semântica herdada, principalmente, 
de países onde a legislação permite ambos os tipos de aborto (ISG e ITG), não 
sendo necessária, assim, uma diferenciação entre as práticas. No entanto, 
considera-se que, mesmo para estes países onde o conceito ITG é mais 
adequado, em alguma medida ele ainda pode gerar confusões, uma vez que 
há limites gestacionais diferenciados para os casos em que se interrompe a 
gestação em nome da saúde materna ou de anomalias fetais. Além disso, o 
 
37 DINIZ, Débora. O Aborto Seletivo no Brasil e os Alvarás Judiciais. In Série, Anais 12. 
Brasília: Letras Livres, jun. 2000. p. 5:19-24. 
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 28 
alvo das atenções é diferente nos casos de ISG e ITG. No primeiro, a saúde do 
feto é a razão do aborto; no segundo, a saúde materna38. 
 
O termo "seletivo" remete diretamente à prática a que se 
refere aquele feto que, devido a malformação fetal, faz com que a gestante não 
deseje o prosseguimento da gestação. Tratar aborto seletivo como eugênico é 
nitidamente confundir as práticas. 
 
Em julgados recentes, diversos juizes vêm autorizando a 
prática do aborto em casos de fetos anencefálicos. Numa dessas sentenças, 
há o registro de que "não se está admitindo por indicação eugênica com o 
propósito de melhorar a raça, ou evitar que o ser em gestação venha nascer 
cego, aleijado ou mentalmente débil. Deve-se buscar evitar o nascimento de 
um feto cientificamente sem vida, inteiramente desprovido de cérebro e incapaz 
de existir por si só".39 
 
Entretanto, pode-se verificar que, quando o magistrado 
entende o pedido de aborto como sendo eugênico, esse é totalmente rejeitado 
e indeferido. Assim tem entendido o Tribunal de Justiça de Goiás: 
(...) Na realidade, a ilação que se tira do exame do pedido é 
que o fundamento da Requerente para o mesmo é a 
circunstância de que o feto é portador de anomalia que, 
certamente, levará a morte de seu filho pouco tempo após o 
nascimento, cuidando-se, pois, de aborto eugênico, para o qual 
não existe autorização na lei, merecendo, pois, o repúdio da 
Justiça, a quem cumpre o indeclinável dever de assegurar os 
direitos do nascituro, conforme disposição expressa no Código 
Civil Brasileiro, entre os quais, evidentemente, está elencado o 
direito de nascer. (...) É que se a Justiça passar a autorizar o 
aborto eugênico na situação do caso em julgamento, amanhã 
os jurisdicionados poderão bater às portas do Tribunal para 
exigir autorização, em outras situações como, por exemplo, 
porque o feto apresenta algum problema que o impossibilitará 
de ter uma vida tida como normal ou porque a mãe ou pai 
 
38 DINIZ, Débora. ALMEIDA, Marcos de. Bioética e Aborto. In: Conselho Federal de Medicina. 
Iniciação à Bioética. Brasília: CFM, 1998, p.125-138. 
39 FRANÇA, Genival Veloso de. Aborto Eugênico - considerações ético-legais. Disponível em: 
<http://www.ibemol.com.br/sodime/>. Acesso em: 10 out. 2007. 
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 29 
daquele feto não dispõe de recursos para prover sua 
manutenção, entre outros casos.40 
A lei não prevê a isenção de pena para o abortamento 
eugênico. Porém, o feto anencefálico certamente não se inclui entre os abortos 
eugênicos, porque a ausência de encéfalo é incompatível com a vida extra-
uterina pós-parto. No aborto eugênico o feto tem possibilidade de vida pós-
parto, embora sem qualidade, o que não é o caso presente, atestada a 
impossibilidade de sobrevivência sem o fluido do corpomaterno. 
 
 
1.4.2 Aborto Necessário 
 
 
O direito entrega ao médico o poder de decidir se a 
continuidade da gravidez constitui um perigo para a vida da gestante, caso 
afirmativo o aborto poderá ser autorizado. 
 
Esse risco pode decorrer de fatores diversos. Entretanto, 
patologias como anemias profundas, diabetes, cardiopatias, tuberculose 
pulmonar, câncer uterino, má conformação da mulher, entre outras situações 
que, com o avanço da medicina, hoje podem normalmente ser contornadas, 
não há necessidade de interromper a gravidez. Também é certo que a mera 
indicação psiquiátrica por doença mental não sustenta a interrupção da 
gravidez. 
 
O médico não pode escolher a quem salvar, pois a lei 
nesse caso, só justifica a morte do ser em formação. O médico somente deverá 
provocar o aborto: 
Art 128 Não se pune o aborto praticado por médico: 
 
40 BRASIL, Tribunal de Justiça de Goiás. Dr. José Machado de Castro Neto, juiz substituto, 
respondendo pela 14ª Vara Criminal de Goiânia. Disponível em: <http://www.tj.go.gov.br>. 
Acesso em: 15 dez. 2006. 
 
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 30 
I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante. 
A situação de perigo para a vida da gestante não precisa 
ser atual, mas pode ser iminente e até mesmo futura, desde que, neste último 
caso, possa concluir, com segurança e certeza, a possibilidade de sua 
reversão. 
 
Se o médico tiver agido com dolo, ainda que eventual, 
responderá pelo aborto sem o consentimento da gestante, mesmo que esta 
tenha, por engano, anuído à interrupção da gravidez. Nesse caso, seu 
consentimento terá sido obtido mediante fraude. 
 
Não sendo o médico o agente, mas estando presente a 
situação de perigo para a vida da gestante e a inevitabilidade da interrupção da 
gravidez, não sendo possível obter o socorro médico, qualquer pessoa poderá 
provocar o aborto, sendo sua conduta justificada pela norma do artigo 23, 
inciso I do Código Penal. 
 
 
1.4.3 Aborto no Caso de Gravidez Resultante de Estupro 
 
 
O estupro é uma violência inominável. Se dele resultar 
gravidez, não pode o Direito obrigar a mulher a gerar e depois ser mãe de 
quem não queria. A lei exige que esse aborto lícito seja praticado por um 
médico. Não sendo médico, o aborto será ilícito, exceto quando é invocado o 
estado de necessidade previsto no artigo 24 do Código Penal. O terceiro que 
auxilia o médico não pode ser incriminado, eis que colabora em fato lícito. 
 
Quando a gravidez resulta de estupro e há o 
consentimento da gestante ou do seu representante legal para a prática do 
aborto esse é denominado sentimental (ou ético ou humanitário), identificando 
alguns casos especiais de estado de necessidade e outros de não-exigibilidade 
de conduta diversa. 
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 31 
Justifica-se a norma permissiva porque a mulher não deve 
ficar obrigada a cuidar de um filho resultante de coito violento, não desejado. O 
aborto ético tem fundamento diverso do aborto necessário. 
Art.128 Não se pune o aborto praticado por médico: 
I – [...] 
II - Se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de 
consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu 
representante legal. 
A lei não se refere à necessidade de qualquer prova a 
respeito do estupro, mas a cautela manda que o médico, antes de realizar o 
aborto, procure certificar-se, dentro do possível, de sua ocorrência. 
 
No caso de menor de 14 anos de idade, como a 
conjunção carnal é presumidamente estupro, é suficiente a prova da idade da 
gestante. Indispensável, porém, é o consentimento da mesma e, quando é esta 
incapaz, do seu representante legal. 
 
É pacífico na doutrina que, por analogia, está autorizado o 
aborto quando a mulher engravidou em razão de atentado violento ao pudor. 
Na Medicina Legal, tem-se entendido que, havendo gravidez, houve estupro e 
não atentado violento ao pudor. 
 
Acerca da abordagem realizada neste capítulo, restou-se 
demonstrado que a vida do nascituro é um objeto de proteção no Direito Penal, 
sendo que a conduta do aborto é proibida, salvo as exceções esplanadas 
anteriormente. 
 
O direito à vida é um direito fundamental resguardado 
pela Constituição da República Federativa do Brasil. Assim sendo, tanto a 
Constituição quanto às leis ordinárias que garantem a inviolabilidade da vida do 
nascituro devem ser itens de abordagens quando se trata do aborto. 
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 32 
No decorrer da pesquisa, far-se-ão considerações a 
respeito da existência de conflito de direito entre o nascituro e a gestante em 
razão da mesma poder cometer a prática do aborto. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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 33 
Capítulo 2 
 
 
A VIDA E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NO 
ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO 
 
 
2 DO INÍCIO DA VIDA HUMANA 
 
 
O início da vida é indagado toda vez que se fala em 
aborto, seja ele espontâneo, provocado ou até mesmo eugênico, ou seja, não 
se tem uma unanimidade se a vida inicia-se com a fecundação, com o 
nascimento ou ainda entre estas duas fases. 
 
Esta questão é objeto de discussão no senso comum e da 
opinião de cada individuo. Fernando Barcellos Almeida41 conceitua a vida como 
sendo: 
O conjunto de propriedades e qualidades graças às quais 
animais e plantas, ao contrário de organismos mortos ou da 
matéria bruta, se mantêm em continua atividade, manifesta em 
funções orgânicas tais como metabolismo, o crescimento, a 
reação a estímulos, a adaptação ao meio e a reprodução. 
É extremamente difícil definir o que é vida, mesmo porque 
a vida está em constante movimento, acontecendo a todo instante diante de 
nós. 
 
Indaga Sílvia Mota42 a respeito da vida: 
 
41ALMEIDA, Fernando Barcellos de. Teoria Geral dos Direito Humanos. Porto Alegre: 
Renova, 1996. p. 54. 
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 34 
Sem querer nem poder atingir a impérvia essência da criação, 
ou desvendar as verdades biológica, sociológica e psicológica 
do indivíduo, entende-se a vida como o agrupado de todos 
esses mistérios revelados através da energia mantida pela 
ação dos elementos naturais e alterados, iminentemente, pela 
intercessão da cultura. A vida se ampara na cumplicidade entre 
homem e mundo, que os torna inseparáveis e necessário um 
ao outro. Vertente dos outros bens jurídicos é, pela sua 
essência - independente de qualquer avanço biotecnológico - 
única e irreplicável. Por isso, exige o respeito absoluto de não 
ser tratada como simples meio, mas como fim. 
As diversas correntes sobre o momento do início da vida 
humana podem ser destacadas em três pontos, sendo que esta conceituação 
ainda está distante por parte da Sociedade, já que é fortemente influenciada 
pelos valores religiosos e ideológicos de cada um. 
 
Como primeiro ponto pode-se destacar que o início da 
vida humana se dá com a fecundação ou ainda que ocorre em determinado 
momento entre o desenvolvimento e a fecundação. Nesta corrente podem ser 
encontrados posicionamentos que a vida tem início com a nidação do óvulo no 
útero, ou ainda com a formação do sistema nervoso, o que não ocorre no feto 
que possui anomalias genéticas, por último, mas não menos importante, pode-
se dar início com o nascimento. 
 
Pelo fato de ter muitos posicionamentos controvertidos é 
que se busca auxilio na Embriologia humana43, na Medicina Legal44 e nadoutrina jurídica para que se possa estabelecer um marco inicial, ainda que 
hipotético, do início da vida humana. 
 
42MOTA. Silva Maria Leite de. Da Bioética ao Biodireito: a tutela jurídica no âmbito do direito 
civil. 1999. 308 p. dissertação (mestrado em Direito Civil) – Universidade do Estado do Rio de 
Janeiro, Rio de Janeiro. 1999. p.20-21. 
43Ciência que estuda a origem e o desenvolvimento do ser humano desde o zigoto até o seu 
nascimento. 
44Medicina Legal é o conjunto de conhecimentos médicos e paramédicos destinados a servir ao 
Direito, cooperando na elaboração, auxiliando, auxiliando a interpretação e colaborando na 
execução dos dispositivos legais atinentes ao se campo de Medicina Aplicada. GOMES, Hélio. 
Medicina legal. 30 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1993. p. 7. 
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 35 
O início do ser humano ocorre quando o óvulo feminino é 
fecundado pelo espermatozóide masculino sendo formado o zigoto, que seria o 
óvulo fertilizado, se dando assim o início da concepção. 
 
Depois de passado esta fase de fertilização, ocorre uma 
segunda fase, onde o zigoto passa a ser denominado mórula, fase que é 
atingida depois de três dias em que ocorreu a fertilização. Nesta fase o ser 
humano está pronto, vindo da trompa uterina para fixar-se no útero da mulher. 
 
Dentro do útero, forma-se uma cavidade que é 
denominada cavidade blastocística e a mórula é transformada em blastocisto. 
A implantação do blastocisto (chamada de nidação) começa no fim da primeira 
semana e termina no final da segunda semana. 
 
As células desenvolvidas do blastocisto vão dar origem ao 
embrião, sendo que este termo não é usado antes da 3º semana. O período 
embrionário estende-se da terceira semana até o final da oitava semana, 
quando já estão formandos as principais estruturas e características do ser 
humano, chegando ao fim do período embrionário. A partir desse momento, o 
embrião passa a ser chamado de feto e dá-se início ao período fetal, que vai da 
nona semana até o nascimento. 
 
Sob o enfoque médico, Hélio Gomes45 diz que a gravidez 
ou o período de gestação, como também pode ser chamado, inicia-se com a 
realização da fecundação, “que é a cédula inicial formadora do homem”. 
 
Já na visão jurídica, Edgard Magalhães Noronha46 diz 
que: 
Durante a gestação, em qualquer momento se tem vida no 
produto da concepção, pois cresce e se aperfeiçoa, assimila as 
substâncias que lhe são fornecidas pelo corpo materno e 
 
45 GOMES, Hélio. Medicina legal. 30 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1993. p.318. 
46 NORONHA, Edgard Magalhães. Direito Penal. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 50. 
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 36 
elimina os produtos de recusa; executa, assim, funções típicas 
de vida (...) a verdade é que ali existe uma vida humana em 
germe. 
O fato de haver diversas opiniões induz à dúvida nesta 
operadora do direito com relação ao início da vida, já que o feto ou o embrião é 
totalmente dependente do organismo que o abriga, que seria o corpo da mãe. 
 
 
2.1 Direito à Vida 
 
 
Partindo do princípio de que o direito à vida é um dom 
recebido diretamente de Deus e que os homens são apenas meros 
administradores, existe um consenso entre as crenças religiosas no que diz 
respeito ao caráter sagrado da vida. 
 
A liberdade individual garante a todo indivíduo o direito à 
livre tomada de decisão nas suas ações, desde que estas não interfiram no 
direito de outrem. 
O Código Civil brasileiro47, em vigor desde janeiro de 
2003, propõe, em seu artigo 2º, que: "A personalidade civil da pessoa começa 
do nascimento com vida, mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos 
do nascituro”. 
 
Verifica-se que, apesar do posicionamento radical da 
igreja católica, seguida de uma forma tênue pelos judeus e espíritas (que 
oferecem uma explicação para o fato de existirem seres malformados e seres 
fisicamente perfeitos), já existem muitas religiões onde prevalece o 
entendimento de que há casos em que o princípio da inviolabilidade da vida 
 
47 BRASIL. Código Civil Brasileiro: principais alterações comentadas: anotações, legislação. 
São Paulo: Saraiva, 2003. 
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 37 
humana deve ser ponderado em face de outros valores48. Como exemplo pode-
se citar grande parte das igrejas evangélicas, que, como não possuem dogmas 
a serem seguidos como nas demais igrejas, a opção pela interrupção da 
gravidez por anencefalia é aceita, já que visam o bem estar da gestante e de 
sua família. 
 
Assim, o direito à vida deve ser associado a um direito à 
conservação da vida, em que o indivíduo pode gerir e defender sua vida, mas 
não pode dela dispor, apenas justificando ação lesiva contra a vida em casos 
de legítima defesa e estado de necessidade. 
 
O direito à vida é um direito fundamental do homem, 
porque é dele que decorrem todos os outros direitos. É também um direito 
natural inerente à condição de ser humano. 
 
Por isso, a Constituição Federal do Brasil declara que o 
direito à vida é inviolável. O Artigo 5, caput da Constituição Federal49, de 1988, 
assegura a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil, o direito à 
vida: 
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de 
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos 
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à 
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. 
(Grifo nosso) 
Sabe-se que todos os direitos são invioláveis; não existe 
direito passível de violação. Mas a Constituição Federal fez questão de frisar a 
inviolabilidade do direito à vida, exatamente por se tratar de direito 
fundamental. 
 
 
48TESSARO, Anelise. Aborto seletivo: descriminalização & avanços tecnológicos da medicina 
contemporânea. Curitiba: Juruá, 2002. 
49 BRASIL. Constituição [1988] Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 19 
ed. São Paulo: Saraiva, 1988. 
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 38 
É importante lembrar que a Constituição Federal é a Lei 
Maior do país, a qual devem se reportar todas as demais leis. Além disso, os 
direitos previstos no artigo 5º da Constituição Federal são “cláusulas pétreas”, 
isto é, são direitos que não podem ser suprimidos da Constituição, nem mesmo 
por Emenda Constitucional. 
 
José Joaquim Gomes Canotilho50 aduz que o direito à 
vida é um direito subjetivo de defesa, e implica na garantia, que deve ser 
exercida pelo Estado, de uma dimensão protetiva deste direito à vida. Portanto, 
o indivíduo tem o direito de não ser morto pelo Estado; por outro lado, o 
indivíduo tem o direito à vida perante os outros indivíduos e estes devem 
abster-se de praticar atos que atentem contra a vida de alguém. E conclui: o 
direito à vida é um direito, mas não é uma liberdade. Assevera, ainda, sobre 
tutela privada e pública do direito à vida, admitindo que o direito aos alimentos 
é uma tutela complementar da vida, sendo diferente do direito à vida, pois não 
é a vida o seu objeto, mas um bem material para servir a conservação da vida. 
 
Como acentua José Cretella Junior51 em seus 
Comentários à Constituição Brasileira de 1988, institui que: 
Bastaria que se tivesse dito ”o direito“ ao invés de ”a 
inviolabilidade do direito à vida“. Se ”vida é um direito“ 
garantido pelo Estado, esse direito é inviolável, embora não 
”inviolado”.

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