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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURIDICA – CEJURPS. CURSO DE DIREITO NUCLEO PRATICA JURÍDICA - NPJ SETOR DE MONOGRAFIA O ABORTO DE FETOS ANENCEFÁLICOS: UMA ABORDAGEM DOUTRINÁRIA E JURISPRUDENCIAL ACERCA DOS DIREITOS ENVOLVIDOS DA GESTANTE E DO FETO Elizandra Aparecida Olivério ITAJAÍ, OUTUBRO DE 2007. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURIDICA – CEJURPS. CURSO DE DIREITO NÚCLEO PRATICA JURÍDICA - NPJ SETOR DE MONOGRAFIA O ABORTO DE FETOS ANENCEFÁLICOS: UMA ABORDAGEM DOUTRINÁRIA E JURISPRUDENCIAL ACERCA DOS DIREITOS ENVOLVIDOS DA GESTANTE E DO FETO Elizandra Aparecida Olivério Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientadora: MSc. ANDRIETTA KRETZ ITAJAÍ, OUTUBRO DE 2007. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com DEDICATÓRIA Esta monografia, eu dedico especialmente a vocês, meus queridos pais Natalina e Sebastião Olivério, que sempre me apoiaram e, com muito esforço e carinho, nunca deixaram faltar nada em minha vida... Que para atender a um pedido meu são capazes de sacrificar qualquer coisa em razão disso. Posso dizer que a prova está desde o dia que nasci: quantas noites em claro para poder me embalar, quantas noites dormiram com a mão sobre a minha cabeça quando estava doente... Não deve ter sido fácil, porém, com muito amor buscaram todos os meios que podiam para me fazer uma criança feliz e, mesmo depois de tanto trabalho comigo, o amor que possuem por mim é assombroso... E você, minha amada irmã, que há oito anos está morando comigo, distante de todos, até mesmo da nossa família, pode ter a certeza que se não fosse pela sua companhia, amor e cuidado não teria conseguido realizar o meu sonho... Todas as palavras aqui escritas são poucas para agradecer a vocês e demonstrar todo o meu AMOR... OBRIGADO POR TUDO! Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com AGRADECIMENTO A Deus, que desde o início da minha caminhada está comigo sendo meu amparo e fortaleza, superando derrotas e me proporcionando grandes vitórias. Quero Te agradecer com toda humildade pela vida, o amor e a felicidade que coloca cada dia, quando acordo, em meu coração. Enfim, a vitória deste momento. Obrigado, Senhor JESUS. Aos meus pais Natalina e Sebastião Olivério. A vocês que me deram a vida e me ensinaram a ser forte e vivê-la com toda a dignidade, nunca desistir dos meus ideais. Iluminaram meus caminhos, sempre me apoiando nos momentos mais difíceis em que passei e nunca deixando de acreditar em mim. Ensinaram-me a crer e acreditar que se pode fazer tudo quando se tem um ideal. Toda a minha eterna gratidão. A minha irmã Fernanda que iluminara os meus caminhos obscuros com afeto e dedicação quando estava só, para que os trilhasse sem medos e enchera de esperança meus caminhos a cada dia. Saiba que te amo mais e mais a cada dia. . . Ao meu namorado Fábio que com toda a sua paciência, ternura, dedicação e, principalmente, companheirismo vêm preenchendo de alguma forma todos os meus dias com extrema alegria. Aos meus amigos por tantas horas que passamos lado a lado e pela oportunidade que me ofereceram com sua companhia durante os cinco anos de faculdade... Aos meus professores que transmitiram seus conhecimentos e mostraram as dificuldades encontradas na vida profissional. Enfim, a todos que de alguma forma contribuíram para a realização deste sonho, quero dizer obrigado com amor. Ter vocês por perto foi muito importante, e há de ficar uma enorme saudade. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Itajaí, 14 de novembro de 2007. _______________________________ Elizandra Aparecida Olivério Graduando (a) Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando(a) Elizandra Aparecida Olivério sob o título: O Aborto de Fetos Anencefálicos: uma abordagem doutrinária e Jurisprudencial acerca dos direitos envolvidos da gestante e do feto, foi submetida em 14/11/2007 à banca examinadora composta pelos seguintes professores MCs: Andrietta Kretz (orientadora e presidente da banca), Rogério Ristow e Josemar Sidnei Soares, aprovada com a nota 10,00 (dez). Itajaí, 14 de novembro de 2007. ________________________________ MSc. ANDRIETTA KRETZ Orientadora e Presidente da Banca ____________________________ Professor Mestre Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS Art. Artigo CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002 CP/1940 Código Penal de 1940 CRFB/1988 Constituição da República Federativa do Brasil ONU Organização das Nações Unidas CFM Conselho Federal de Medicina IEG Interrupção Eugênica da Gestação ITG Interrupção Terapêutica da Gestação ISG Interrupção Seletiva da Gestação IVG Interrupção Voluntária da Gestação Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com ROL DE CATEGORIAS Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais. FETO Aquele que já está concebido no ventre materno ou simplesmente formado, mas que já apresenta a forma de um ente humano1, ou seja, organismo humano em desenvolvimento no período que vai da nona semana de gestação ao nascimento. NASCITURO Nascituro é o ser já concebido, mas que ainda se encontrava no ventre materno. A lei não lhe concede personalidade, a qual só lhe será conferida se nascer com vida. Mas como provavelmente nascerá com vida, o ordenamento jurídico dede logo preserva seus interesses futuros, tomando medidas para salvaguardar os direitos que, com muita probabilidade, em breve serão seus.2 ABORTO Do ponto de vista jurídico aborto3 significa nascer prematuramente, ou seja, antes do tempo. A lei não estabelece limites para idade gestacional em que ocorre a interrupção da prenhez, isto é, aborto é a interrupção da gravidez com o intuito de morte do concepto, seja ela desde a fecundação até os momentos antes do início do trabalho de parto. Já na visão médica, o aborto é considerado a interrupção da gravidez, espontânea ou propositada, desde o momento da fecundação do óvulo pelo gameta masculino até a 21º semana de gestação, pois da 21º semana até a 1 SILVA, de Plácido. Dicionário jurídico. 15 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 353. 2 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil – Parte Geral. v.1. São Paulo: Saraiva. 2002. p.36. 3 ROSAS, Cristião Fernando. O segredo médico diante de uma situação de aborto. Parecer do CREMESP. Disponível em< http://www.bioetica.org.br/legislacao/res_par/integra/ 24292_00.php>. Acesso em 17 out. 2007. Created with novaPDF Printer(www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.bioetica.org.br/legislacao/res_par/integra/ http://www.novapdf.com 28º semana fala-se em parto imaturo; e da 29º até a 37º semana tem-se o chamado parto prematuro. Portanto, a medicina só admite a hipótese de aborto dentro das primeiras vinte e uma semanas de desenvolvimento do ovo. ANENCEFALIA A anencefalia é definida na literatura médica como a malformação fetal congênita por defeito do fechamento do tubo neural durante a gestação, de modo que o feto não apresenta os hemisférios cerebrais e o córtex, havendo apenas resíduo do tronco encefálico.4 Pode ser um embrião, feto ou recém-nascido que, por malformação congênita, não possui uma parte do sistema nervoso central, ou melhor, faltam-lhe os hemisférios cerebrais e tem uma parcela do tronco encefálico (bulbo raquidiano, ponte e pedúnculos cerebrais). Como os centros de respiração e circulação sangüínea situam-se no bulbo raquidiano, mantém suas funções vitais, logo, o anencefálico poderá nascer com vida, vinda a falecer horas, dias ou semanas depois.5 MORAL Conjunto de regras decorrentes dos costumes e da recepção das virtudes valoradas pelo grupo social. Impropriamente a palavra é usada como sinônimo de Ética.6 4 BEHMAN, Richard E.; KIEGMAN, Robert M.; JENSON, Hal B. Nelson.Tratado de Pediatria. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. p. 1777. 5 DINIZ, Maria Helena. O Estado Atual do Biodireito. São Paulo: Saraiva, 2001. 6 MELO, Osvaldo Ferreira de. Dicionário de Política Jurídica. 18 ed. Florianópolis: OAB-SC, 2000. p 65 Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com SUMÁRIO SUMÁRIO ......................................................................................... VII RESUMO..............................................................................................IX INTRODUÇÃO.....................................................................................01 O ABORTO NO DIREITO PENAL BRASILEIRO ..........................................05 1 CONSIDERAÇÕES ACERCA DO ABORTO .................................................... 05 1.1 O CRIME DE ABORTO ................................................................................. 10 1.2 NOÇÕES CONCEITUAIS DA OCORRÊNCIA DO CRIME DE ABORTO. .... 17 1.2.1ABORTO PROVOCADO PELA GESTANTE OU COM SEU CONSENTIMENTO.............................................................................................. 17 1.2.2 ABORTO PROVOCADO POR TERCEIRO ................................................ 19 1.2.2.1 ABORTO SEM O CONSENTIMENTO DA GESTANTE........................... 20 1.2.2.2 PROVOCAR ABORTO COM O CONSENTIMENTO DA GESTANTE..... 21 1.3 FORMA QUALIFICADA DO ABORTO.......................................................... 22 1.4 O ABORTO LEGAL....................................................................................... 24 1.4.1 DIFERENÇAS ENTRE ABORTO EUGÊNICO E ABORTO SELETIVO ..... 25 1.4.2 ABORTO NECESSÁRIO ............................................................................ 29 1.4.3 ABORTO NO CASO DE GRAVIDEZ RESULTANTE DE ESTUPRO ......... 30 CAPÍTULO 2 ........................................................................................33 A VIDA E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO..................................................................................... 33 2 DO INÍCIO DA VIDA HUMANA ......................................................................... 33 2.1 DIREITO À VIDA ........................................................................................... 36 2.2 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS ................................................................................................ 40 2.3 OS DIREITOS E GARANTIAS DO FETO...................................................... 43 2.3.1 PERSONALIDADE E CAPACIDADE DO NASCITURO.............................. 44 Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 2.3.2 O INÍCIO DA PERSONALIDADE JURÍDICA PARA O NASCITURO .......... 45 2.4 OS DIREITOS E GARANTIAS DA GESTANTE.......................................49 CAPÍTULO 3 ........................................................................................53 ANENCEFALIA, ABORTO E DIREITO ............................................................... 53 3 DEFINIÇÃO DE ANENCEFALIA....................................................................... 53 3.1 TRANSPLANTES COM ÓRGÃOS ORIUNDOS DE FETOS ANENCEFÁLICOS .............................................................................................. 58 3.2 ABORTO EM CASO DE ANENCEFALIA: UMA LACUNA NA LEI .............. 61 3.2.1 AUSÊNCIA DA TIPICIDADE MATERIAL NA INTERRUPÇÃO DA GESTAÇÃO DO FETO ANENCEFÁLICO ........................................................... 66 3.2.2 PENSAMENTOS DE DOUTRINADORES................................................. 68 3.3 TENDÊNCIAS JURISPRUDENCIAIS ACERCA DO ABORTO DE ANENCEFÁLICOS .............................................................................................. 73 3.3.1 ALVARÁS JUDICIAIS ....................................................................................... 74 3.3.2 A PROPENSÃO DOS ACÓRDÃOS JURISPRUDENCIAIS........................ 77 3.3.3 ABORTO DE ANENCEFÁLICOS EM OUTROS PAÍSES ........................... 83 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................87 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ............................................91 ANEXOS ..............................................................................................98 Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 1 RESUMO Os fetos acometidos por anencefalia são mantidos em vida somente pela ligação materna, com chances muito reduzidas de viveram por mais um ano extra-útero. Quando diagnosticada tal malformação, as questões relevantes que existem dentro de uma família é o questionamento de qual a melhor opção a ser tomada nessa hora. Porém, esse questionamento foi durante muito tempo deixado de lado, pois as crianças que nasciam com alguma anomalia não eram bem vistas pela sociedade, sendo consideradas como pecaminosas e contrárias aos ensinamentos religiosos. No decorrer dos anos, principalmente com a evolução da medicina, o diagnóstico da anencefalia se tornou cada vez mais aprimorado e com menor chance de ocorrer erros, o que aumentou o grau de precisão dos resultados obtidos na avaliação da saúde fetal, sendo admitida uma margem de erro menor do que 1/1000. Em 1940, com o advento do Código Penal, o legislador deixou de tipificar em um artigo especifico esse tipo de aborto, sendo que as normas penais que incriminam o aborto estão contidas nos artigos 124, a 128 do Código Penal e possuem a finalidade de proteger a vida humana intra-uterina. O aborto de fetos anencefálicos vem também sendo chamado de aborto seletivo. Com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a lei maior do Estado, visando um direito maior para a sociedade e para a gestante, implantou-se novos conceitos sobre à dignidade da pessoa humana (artigo 1º, IV), o princípio da legalidade, porém, vai ao encontro da liberdade e da autonomia da vontade (artigo 5º, II) e do direito à saúde (artigo 6º, caput e 196), todos da Constituição da República. Portanto, a escolha do tema deu-se em necessidade de aprofundar o conhecimento e descrever a evolução do direito para um melhor entendimento e espera-se que as dúvidas deixadas pela legislação sejam abordadas de uma forma mais clara, como é o caso do aumento das liminares pedindo autorizaçãopara o aborto de fetos anencefálicos perante a justiça. O Método de pesquisa empregado foi o indutivo em todo o decorrer da pesquisa. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 2 INTRODUÇÃO A anencefalia é proveniente de um defeito de fechamento da parte anterior do tubo neural, tendo como principal característica a falta de desenvolvimento da calota craniana, couro cabeludo e hemisférios cerebrais. Uma vez diagnosticada a mal-formação, não há nada que a ciência médica possa fazer quanto a esse feto. O mesmo, todavia, não ocorre com relação ao quadro clínico da gestante. A literatura médica tem constatado que a permanência do feto anômalo no útero da mãe é potencialmente perigosa, podendo gerar danos à saúde da gestante e até perigo de vida, em razão do alto índice de óbitos intra-útero desses fetos. A autorização da Justiça para se fazer o aborto de fetos anencefálicos é algo dificílimo de se conseguir e, muitas vezes, em razão da lentidão do judiciário, quando concedido, a mãe já teve o dever de carregar por nove meses um feto que sabe, com plenitude de certeza, que não sobreviverá, causando-lhe dor, angústia e frustração. A potencial ameaça à integridade física e os danos à integridade moral e psicológica na hipótese são evidentes. A convivência diária com a triste realidade e a lembrança ininterrupta do feto dentro de seu corpo, que raramente irá completar um ano de vida, podem ser comparadas à tortura psicológica. Sustenta-se que o aborto nos casos de gravidez de feto anencefálico está tipificado no Código Penal como aborto necessário. O aborto é descrito pela doutrina especializada como a interrupção da gravidez com a conseqüente morte do feto (produto da concepção). O que deve ser levado em consideração no tema abordado é que este se depara com uma colisão de direitos fundamentais, o que pesa mais: o direito do feto à vida até o seu nascimento ou a escolha da Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 3 mãe quando decide abortar o feto que sabe que terá poucas horas de vida? A partir disso, deverá ser realizado um balanceamento de valores em razão do princípio da proporcionalidade. Assim sendo, quando se dá, entretanto, interrupção da gravidez, seja qual for o momento da gestação, por deliberação da mulher, isoladamente ou com a intermediação de terceiro, disso resultando a morte do feto, ocorre aborto voluntário, a teor dos artigos 124 a 128 do Código Penal, classificados entre os crimes contra a vida, que não deixam de ser uma subclasse dos delitos contra a pessoa. O artigo 5º ”caput” da Constituição Federal, que abre o Título alusivo aos Direitos e Garantias Fundamentais, no inciso XXXVIII, do mesmo artigo, reconhece a instituição do Júri com a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, entre os quais se inclui o abortamento. O direito penal dedica distintas normas para a proteção desta vida desde o momento de sua concepção até seu término.7 Deste modo, a presente monografia tem por objeto a análise da legalização do aborto de fetos anencefálicos perante o atual momento jurídico brasileiro. Tendo como objetivos: o institucional – produzir monografia para obtenção de título de Bacharel em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí; geral – abordar a legalização do aborto de fetos anencefálicos perante o atual momento jurídico brasileiro; específicos – a) observar as doutrinas que fazem considerações acerca do aborto no direito penal brasileiro e o que regem sobre a morte e o início da vida; b) analisar os direitos da gestante e do feto à vida e identificar quais as implicações legais para a gestante caso venha cometer o aborto; c) abordar e caracterizar a anencefalia e o aborto nos casos de fetos anencefálicos. 7 BRASIL. Constituição [1988] Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 19° ed. São Paulo: Saraiva, 1988. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 4 Para que se possa realizar a pesquisa com uma maior veracidade, é indispensável observar as doutrinas que fazem considerações acerca do aborto no direito penal brasileiro e o que regem sobre a morte e o início da vida, além de analisar os direitos da gestante e do feto. Para tanto, principiar-se-á, no Capítulo 1, fazendo-se uma explanação sobre o aborto no direito penal brasileiro, iniciando com um breve histórico do aborto no Brasil, além de tipificar as formas e classificações desse encontradas no direito penal. No Capítulo 2 far-se-á uma abordagem acerca da dignidade da pessoa humana no ordenamento jurídico brasileiro, os direitos e garantias do feto, bem como da gestante. Por fim, o último capítulo tratará da anencefalia, sua definição, a utilização dos órgãos dos fetos para transplantes, a visão internacional do aborto de anencefálicos e, por último, a ausência da tipicidade material na interrupção da gestação do feto anencefálico e as tendências jurisprudenciais acerca do aborto de tais. O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados os pontos conclusivos destacados no decorrer da pesquisa. Para a presente monografia foram levantadas as seguintes hipóteses: O aborto de fetos anencefálicos não é permitido pelo direito brasileiro e, portanto, não possui fundamento de legalidade. Existe a possibilidade de aborto de fetos anencefálicos tendo em vista que se trata de uma colisão de direitos e fundamentos que é resolvido, no caso concreto, através da proporcionalidade. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 5 Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados o Método Cartesiano, e, dependendo do resultado das análises, no Relatório da Pesquisa poderá ser empregada à base indutiva e/ou outra que for a mais indicada8.9 Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa Bibliográfica. Assim, através do acesso a estas considerações que serão realizadas na presente pesquisa, espera-se que essa possa contribuir aos operadores do direito levando-os a um repensar no que tange ao caso da anencefalia sobre a ótica dos direitos garantidos acerca o da dignidade humana. 8PASOLD, César Luiz.Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 7. ed. rev. atual. amp. Florianópolis: OAB/SC, 2002. p. 99-107. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 6 CAPÍTULO 1 O ABORTO NO DIREITO PENAL BRASILEIRO 1 CONSIDERAÇÕES ACERCA DO ABORTO O Aborto tem sido algo muito discutido ao longo da história do direito e sua prática está sendo cada vez mais aplicada, objetivando evitar o nascimento de filhos indesejáveis. O primeiro ponto a se tratar destina-se a uma pesquisa histórica sobre o aborto para demonstrar que o assunto tem sido objeto de muitas discussões ao longo da evolução da sociedade. Mas afinal, o que vem a ser o Aborto? Nas clássicas lições de Hélio Cláudio Fragoso10 acerca do tipo objetivo do crime de aborto tem-se: O aborto consiste na interrupção da gravidez com a morte do feto. Pressupõe, portanto, a gravidez, isto é, o estado de gestação, que para os efeitos legais, inicia-se com a implantação do ovo na cavidade uterina. (...). A ação incriminada consiste na interrupção da gravidez, destruindo-seo produto da concepção ou provocando-se a morte do feto, sem que se exija a sua expulsão. No mesmo sentido, Ney Moura Teles define aborto como11: 10 FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal: Parte Geral. 15 ed. São Paulo: Forense, 1995, p 127-128. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 7 Aborto é a interrupção da gravidez com a morte do ser humano em formação. A gravidez, que começa com a fecundação do óvulo pelo espermatozóide, é o processo de formação do ser humano que termina com o início do parto. Assim, pode-se relatar a seguir, alguns exemplos a respeito do aborto ao longo do tempo. Na sua obra A República, Platão, em diálogo através de Sócrates, recomenda às mulheres com mais de 40 anos “que tomem todas as precauções possíveis para que nenhum filho fruto dessas uniões veja a luz do dia12”. A preocupação de Platão é que se tenha um direcionamento para o controle demográfico para que as mulheres apenas dêem luz a pessoas melhores e úteis ao interesse do Estado. Já Aristóteles13 sugeria o aborto para manter o equilíbrio populacional. Observa-se então que, na antiga Grécia, o aborto era geralmente permitido14. Pode-se deduzir que este não chocava nem o senso moral comum e que não existiam restrições jurídicas particulares. Uma situação análoga valia em Roma, onde o aborto não levantava problemas éticos. No entanto, os Hebreus possuíam um conjunto de preceitos morais e jurídicos diferentes que posteriormente foram reunidos em 11TELES, Ney Moura. Direito Penal: parte especial: artigos 121 a 212, v. 2. São Paulo: Atlas, 2004. 12PLATÃO. A República: texto integral. São Paulo: Martin Claret. 2006. p.165. 13 ARISTÓTELES. A política, trad. de Roberto Leal Ferreira, 2 ed., São Paulo: Martins Fontes, 1998. 14 MORI, Maurício. A Moralidade do Aborto: sacralidade da vida e novo papel da mulher. Brasília: Universidade de Brasília, 1997. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 8 cinco livros denominados Pentateuco15, que vieram integrar o livro religioso conhecido por Bíblia. Num dos livros do Pentateuco, o Êxodo, encontra-se a seguinte expressão16: Se homens brigarem, e ferirem mulher grávida, e forem causa de aborto, sem maior dano, o culpado será obrigado a indenizar o que lhe exigir a marido da mulher; e pagará o que os árbitros determinarem. Mas se houver dano grave, então darás vida por vida, olho por olho, dente por dente, pé por pé, queimadura por queimadura, ferida por ferida, golpe por golpe. Segundo Nelson Fragoso Heleno Hungria, em Roma, a Lei das XII Tábuas e as da República não tratavam a respeito do aborto e o produto da concepção era considerado parte do corpo da gestante, de suas vísceras. Por isso, diz Hungria, tornou-se a prática comum.17 O feto podia dispor do corpo da mulher como lhe aprouvesse. Com o tempo, entretanto, o aborto passou a ser incriminado também em Roma, principalmente depois da influência do cristianismo. Atualmente não há uma unanimidade entre os povos quanto à incriminação ou a legalização do aborto. Algumas sociedades nacionais consideram o aborto lícito, enquanto que outras o tipificam, entretanto justificam sua prática excepcionalmente. Segundo Cezar Roberto Bitencourt18, o Código Criminal do Império vigente no Brasil de 1830 previa a criminalização apenas do aborto 15 Segundo o Dicionário Aurélio, Pentateuco representa os cinco primeiros livros do Velho Testamento, atribuídos a Moisés: o Gênese, o Êxodo, o Levítico, o Números e o Deuteronômio. 16 BÍBLIA. Português. Trad. Gilbertro da Silva Gorgulho. Bíblia Sagrada. 24 ed. São Paulo: Paulinas, 1998. Livro Êxodo, v. 22-25. 17 HUNGRIA, Nelson Heleno Fragoso. Comentários ao Código Penal. 5 ed. Uberaba: Forense. 2004. p.270. 18 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 3 ed., v.2, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 156 Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 9 praticado por terceiro e não do auto-aborto, criminalizava, na verdade, o aborto consentido e o aborto. O aborto estava previsto no capítulo dos crimes contra a segurança, a pessoa e a vida19. Não havia, na mencionada legislação, previsão de excludentes, seja do crime, seja da pena. Art 199. Ocasionar aborto por qualquer meio empregado, interior ou exteriormente, com consentimento da mulher pejada. Pena: prisão com trabalho de 1 a 5 anos. Se o crime for cometido sem o consentimento da mulher pejada. Penas: dobradas. Art 200. Fornecer, com conhecimento de causa, drogas ou quaisquer meios para produzir o aborto, ainda que este não se verifique. Pena: prisão com trabalho de 2 a 6 anos. Se esse crime for cometido por médico, boticário ou cirurgião ou ainda praticantes de tais artes. Penas: dobradas. A punição do auto-aborto aparece pela primeira vez no Código Penal de 1890. Ao contrário do anterior, encontrava-se a expressão “aborto legal” e era previsto como legal o aborto para salvar a vida da gestante. Somente nessa legislação houve a previsão especial para a prática de aborto que ocasionasse a morte da gestante. O referido Código Penal estabelecia20: Art 300 Provocar aborto haja ou não a expulsão do produto da concepção. 19 FRANÇA, General Veloso de. Medicina Legal. 6 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001. p. 224-225. 20 FRANÇA, General Veloso de. Medicina Legal. 6 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001. p.225. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 10 No primeiro caso: pena de prisão celular por 2 a 6 anos. No segundo caso: pena de prisão celular por 6 meses a 1 ano. § 1º. Se em conseqüência do aborto, ou dos meios empregados para provocá-lo, seguir a morte da mulher. Pena: prisão de 6 a 24 anos. § 2º. Se o aborto foi provocado por médico, parteira legalmente habilitada para o exercício da medicina. Pena: a mesma procedente estabelecida e a proibição do exercício da profissão por tempo igual ao da reclusão. Art 301 Provocar aborto com anuência e acordo da gestante: Pena: prisão celular por 1 a 5 anos. Parágrafo único. Em igual pena incorrerá a gestante que conseguir abortar voluntariamente, empregando para esse fim os meios; com redução da terça parte se o crime foi cometido para ocultar desonra própria. Art 302 Se o médico ou parteira, praticando o aborto legal, para salvar da morte inevitável, ocasionam-lhe a morte por imperícia ou negligência. Penas: prisão celular de 2 meses a 2 anos, e privado de exercício da profissão por igual tempo de condenação. Analisando as referências anteriormente citadas, conclui- se que o aborto, ao longo da história, foi uma prática proibida, embora a fundamentação da proibição para cada época não tenha sido a mesma. O Código Penal brasileiro em vigor dede 1940 considera o aborto como crime, contudo admite sua prática lícita em duas situações, que serão discutidas posteriormente. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 11 1.1 O crime de Aborto Etimologicamente, aborto significa privação do nascimento e este pode ser natural, acidental ou provocado por ação humana. O aborto natural é aquele em que o próprio organismo da gestante, pelas mais diversas causas, não permite a conclusão do processo gravídico21. Já o acidental ocorre em razão de algo externo, por exemplo, uma situação de extremo estresse,a ingestão de uma substância inadequada e que seu poder destrutivo era desconhecido, enfim, qualquer ação externa não provocada pela vontade da gestante de ocasionar o aborto. Quando provocado, é causado por condutas humanas dirigidas à interrupção da gravidez, com a finalidade de impedir o desenvolvimento e nascimento do feto em formação. Pode ser punível ou não punível, sendo esse último também denominado “aborto legal”. Se o aborto for analisado sob o enfoque do ordenamento jurídico brasileiro, torna-se de suma importância expor algumas considerações sobre o tema que gera tantas discussões na Sociedade, tendo em vista que as pessoas possuem, no seu íntimo, seus valores morais, opiniões pró ou contra o aborto. Para aqueles que defendem o aborto ou a sua descriminalização, diversos argumentos podem ser elencados. Os mais representativos são os seguintes22: 21 KNUPPEL, Robert A.; DRUKKER, Joan E. e colaboradores. Alto Risco em Obstetrícia: um enfoque multidisciplinar. 2 ed. Porto Alegre: Artes Médicas. 1996. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 12 a) que a mulher é dona de seu corpo e tem o direito de escolha; b) que o aborto no Brasil é um caso de saúde pública, pois são feitos sem condições técnicas e higiênicas. A Organização Mundial da Saúde estima que 99% das 500 mil mortes maternas anuais se dão nos países em desenvolvimento, e que destas, de 115 a 204 mil são de complicações decorrentes de abortos ilegais ou clandestinos; c) pratica-se, no Brasil, cerca de 1,5 milhão de abortos anuais; d) há que se levar em conta o pluralismo inerente à Democracia e a tendência atual do Direito de afastar a legislação punitiva para o aborto. Por outro lado, estão aqueles que são contrários ao aborto e sua legalização. Os argumentos podem ser assim representados: a) que o embrião e o feto são seres humanos e como tal têm integral proteção e direito à vida, com garantias constitucionais; b) o número elevado de abortos não justifica sua legalização, pois o furto e outros crimes também são numerosos e não são legalizados; 22 VIVIANI, Maury Roberto. Aspectos Controvertidos do Crime de Aborto: a atualização judicial e o conflito de direitos fundamentais da gestante e do nascituro. 2000. 132p. (Dissertação). Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 13 c) o corpo da mulher não se confunde com o corpo do nascituro. Portanto, a mulher não tem direito de tirar a vida de um outrem; d) o problema de saúde pública deve ser solucionado com a educação e com a orientação sobre a maternidade, cuja escolha deve ser anterior à gravidez; e) as legislações que permitem o aborto não diminuíram sua incidência nem os problemas sociais e contrariam os direitos humanos. No mesmo entendimento, Hélio Gomes23, no âmbito da Medicina legal, define o aborto criminoso como sendo: A interrupção ilícita da prenhez, com a morte do produto, haja ou não expulsão, qualquer que seja o estado evolutivo, desde a concepção até momentos antes do parto. Devido ao fato de existir divergências de opiniões sobre o tema, inúmeras discussões ocorrem no Congresso Nacional brasileiro, fazendo com que tramitem diversos projetos de Lei sobre o assunto com entendimentos diferentes. Alguns pretendem a legalização do aborto somente em casos especiais tais como: quando a gravidez oferecer risco de morte a gestante, quando a gravidez é resultado de um estupro, quando a gestante é alienada mental e, principalmente, nos casos em que o nascituro possui anomalias ou doenças graves. Destaca-se, em virtude da polêmica causada, o Projeto de Lei n° 20 de1991, de autoria dos Deputados Eduardo Jorge e Sandra Starling, que foi aprovado apenas em 1997 pela Comissão de Constituição e Justiça e de Redação – CCJR. Este projeto tratava sobre a obrigatoriedade do 23GOMES, Hélio. Medicina Legal. 30 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1993. p. 348. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 14 atendimento pelo SUS - Sistema Único de Saúde - nos casos previstos no Código Penal. Ainda de autoria dos mesmos deputados acima citados, registra-se o Projeto de Lei nº 1.135 de 1991, que dispõe sobre a suspensão do artigo 124 do Código Penal, que incrimina o aborto provocado ou consentido pela gestante. Assim, a incriminação24 somente seria dirigida à ação de terceiro que o pratica. Também vale destacar a proposta de Emenda Constitucional feito pelo ex-presidente da Câmara de Deputados Severino Cavalcanti, que pretendia incluir na Constituição da República Federativa do Brasil a garantia do direito à vida desde a concepção. O projeto de Lei n° 3.609 de 1993 de autoria do então deputado José Genuíno prevê a liberdade de abortar, no período de 90 dias do início da gravidez, mediante solicitação da gestante. Em relação ao aborto de fetos com anomalias tem-se o Projeto de Lei n° 1956/96 de autoria de Marta Suplicy que diz25: Art. 1º Fica autorizada a interrupção da gravidez, quando o produto da concepção não apresentar condições de sobrevida em decorrência de malformação incompatível com a vida ou de doença degenerativa incurável, precedida de indicação médica, ou quando por meios científicos se constatar a impossibilidade de vida extra-uterina. Art. 2º A interrupção da gravidez se fará com o consentimento da gestante ou representante legal nos casos de incapacidade, após a constatação da anomalia fetal, e orientação por médico especialista sobre as reais implicações para o feto de tal diagnóstico. 24 Por incriminação, entende-se que uma determinada conduta é legislada como crime; ocorre a descriminalização quando a legislação deixa de considerar a conduta como crime. 25 BRASIL. Projeto de lei nº. 1.956, de 1996. Publicado no Diário da Câmara dos Deputados em 21 jun. 1996. Disponível em:<http://www.camera.gov.br>. Acesso em 24 maio 2007. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.camera.gov.br http://www.novapdf.com 15 Parágrafo único. O procedimento da interrupção da gravidez será sempre feito em instituições hospitalares públicas ou privadas, dotadas de condições adequadas a qualquer eventualidade de risco de vida da Parte Especial. A opinião de Marta Suplicy, ao justificar o referido Projeto de Lei de sua autoria, é de que26: É necessário utilizar técnicas disponíveis para estudo e diagnóstico de problemas no feto, dando às mães que se tornam verdadeiros “caixões ambulantes” a possibilidade de decidir sobre a manutenção ou não da gravidez. Algumas mulheres darão preferência por levar adiante a gestação, enquanto outras farão opção contrária, por se sentirem sem estrutura emocional para suportar tal vivência. É tortura obrigar uma mãe, contra sua vontade, a manter uma gravidez por vários meses se o resultado for o óbito do nascituro. (Grifo nosso). Tramita, ainda no Judiciário, a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental de nº 54, tendo como pretensa finalidade à obtenção de legalização de aborto, em uma das espécies de anomalia fetal existentes: o aborto por feto anencefálico. No entanto, tratando-se de ação que implique em controle concentrado de Constitucionalidade, terá sua eficácia ampla no território nacional, fazendo repercutir nos demais casos existentes. Após tanta discussão dentro do Congresso Nacional sobreo assunto foi criado uma Comissão de Reforma e Modificação da Legislação na Parte Especial do Código Penal. Essa Comissão elaborou um anteprojeto de lei27 que prevê, especificamente para o crime de aborto, a seguinte proposta: ABORTO PROVOCADO PELA GESTANTE OU COM SEU CONSENTIMENTO 26 SUPLICY, Marta. Apud: TESSARO, Anelise. Aborto Seletivo: descriminalização e avanços tecnológicos da medicina contemporânea. Curitiba: Juruá, 2002. p.70. 27 BRASIL. Anteprojeto da Reforma da Parte Especial do Código Penal. Disponível em: <http://buscalegis.ccj.ufsc.br/arquivos/normas/anteprojetocódigopenal.html>. Acesso em 31 jun. 2007. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://buscalegis.ccj.ufsc.br/arquivos/normas/anteprojetoc�digopenal.html http://www.novapdf.com 16 Art 124 Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem provoque: Pena: detenção, de 1 a 9 meses. ABORTO CONSENSUAL PROVOCADO POR TERCEIRO Art 125 Provocar aborto com consentimento da gestante. Parágrafo único. A pena é aumentada até a metade, além de multa, se o crime é cometido com o fim de lucro. ABORTO PROVOCADO POR TERCEIRO Art 126 Provocar aborto sem o consentimento da gestante. Pena: reclusão, de 4 a 8 anos. LESÃO CORPORAL OU MORTE DA GESTANTE Art 127 Nos casos dos artigos 125 e 126, se em conseqüência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, resultar à gestante lesão corporal grave ou morte, e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis, nem assumiu o risco de sua produção, aplica-se também, a pena de lesão corporal culposa ou homicídio culposo. EXCLUSÃO DE ILICITUDE Art 128 Não constitui o aborto praticado por médico se: I – não há outro meio de salvar a vida ou preservar a saúde da gestante; II – a gravidez resulta de violação de liberdade sexual, ou de emprego não consentido de técnica de reprodução assistida; III – há fundada probabilidade, atestada por dois outros médicos, de o nascituro apresentar graves e irreversíveis anomalias físicas ou mentais. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 17 § 1º No caso dos incisos II e III, e da segunda parte do inciso I, o aborto deve ser precedido de consentimento da gestante, ou quando menor, incapaz ou impossibilitada de consentir, de seu representante legal, do cônjuge ou de seu companheiro; § 2º No caso do inciso III, o aborto depende, também, da não oposição justificada do cônjuge ou companheiro. Esta alteração foi uma tentativa de pacificar a polêmica existente sobre o objeto em questão. Entretanto, o artigo 128 do Código Penal, que trata das excludentes de ilicitude ou da exclusão da pena, mantém o denominado aborto necessário e estende o aborto sentimental não só para os casos de gravidez resultante de estupro, mas também para qualquer violação contra a liberdade sexual da mulher, por exemplo, o atentado violento ao pudor e o emprego não consentido de técnica de reprodução assistida. 1.2 Noções Conceituais da Ocorrência do Crime de Aborto O aborto ainda é uma prática proibida no Brasil e está previsto dentro do Código Penal nos crimes contra a pessoa, estando dentro da subclasse dos crimes contra a vida, podendo ser classificado em quatro modalidades que serão descritas a seguir. As normas penais que incriminam o aborto estão contidas nos artigos 124, 125, 126, 127 e 128 do Código Penal, possuem a finalidade de proteger a vida humana intra-uterina. A gravidez estende-se desde a concepção até o início do parto, exigindo-se a prova desse estado por meio de exame do corpo de delito direto ou indireto, quando desaparecidos seus vestígios. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 18 1.2.1 Aborto Provocado Pela Gestante ou Com Seu Consentimento O artigo 124 do Código Penal28 descreve duas modalidades: o auto-aborto, descrito na primeira parte do artigo, sendo aquele em que a própria gestante provoca em si mesma; já na segunda parte do artigo tem-se o consentimento da gestante para que um terceiro provoque o aborto. Apresenta-se como sujeito ativo a gestante e como sujeito passivo o Estado, que tem interesse no nascimento do nascituro, e não no feto. Sendo assim, apresentam-se duas condutas típicas, onde ambas são formas de crime próprio e possuem pena de detenção prevista de 1 a 3 anos. Art 124 Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lhe provoque: Pena: detenção, de 1 a 3 anos. É discutida a possibilidade de co-autoria ou participação, mas nada impede o concurso de agentes. Se esse atua em concordância com a gestante, também incidirá nesse artigo. Quem praticar o auto-aborto, da captação do consentimento da gestante, induzir, instigar ou auxiliar ou ainda colaborar de modo secundário sem interferir na execução do procedimento típico, sem ter, portanto, poder de decisão ou domínio do fato será considerado partícipe desse crime. Se, entretanto, contribuir materialmente para sua realização, praticando atos ou tendo poder de decidir sobre a consumação, responderá como autor do crime descrito no artigo 126 do Código Penal, adiante comentado. 28 BRASIL, Código Penal - Decreto - lei nº 2848 de 07 de dezembro de 1940. 44 ed. São Paulo: Saraiva, 2006. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 19 Para Edgard Magalhães Noronha29: No aborto consentido é outrem que o executa, porém, com aquiescência da mulher. A atuação desta não é secundária, como parece a alguns, razão tendo Maggiore para observar que a gestante não é inerte, mas coopera, consentindo nas praticas abortivas, isto é, sujeitando-se estas com movimentos corpóreos (ao menos pondo-se em posição obstétrica): não omite, age. O auto-aborto e o aborto consentido exigem o dolo, ainda que eventual. Não se pode falar, por inexistente, na figura do aborto culposo. Inexiste no Direito Penal Brasileiro a figura do Aborto Culposo. Assim, indispensável à configuração do delito é ter o agente atuado dolosamente. (JTACRIM 32/179) O auto-aborto distingue-se do infanticídio previsto no artigo 123 do Código Penal30, pois o aborto somente pode ocorrer antes do início do parto. 1.2.2 Aborto provocado por terceiro No aborto provocado por terceiro, o sujeito ativo do crime é o qualquer pessoa que provoca o aborto na gestante, sendo este classificado em aborto provocado por terceiro com ou sem consentimento da gestante. Em ambos os casos, o sujeito passivo é representado pela gestante, bem como o Estado, que tem interesse não só na integridade corporal da mulher bem como no nascimento. No aborto sem o consentimento da gestante, a mulher não autoriza o aborto. Logo, não pratica crime. Já quando este é feito com seu 29NORONHA, Edgard Magalhães. Direito Penal. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 1991. p.66. 30 Art 123. Matar, sob a influência puerperal, o próprio filho durante o parto ou logo após. Pena: detenção, de 2 a 6 anos. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 20 consentimento, é preciso analisar a validade do consentimento, isto é, a gestante deve possuir capacidade para consentir. Estas duas formas serão analisadas mais minuciosamente nos itens abaixo. 1.2.2.1 Aborto sem o consentimento da Gestante Neste fato delituoso, o crime é realizado contra a gestante e o direito da vida do nascituro. Para que ocorra essa prática basta que seja realizado o aborto sem o consentimento da gestante, ou seja, o agente realiza a intervenção no corpo da gestante contra a suavontade, provocando a interrupção da gravidez e matando o feto em formação. Art 125 Provocar aborto, sem o consentimento da gestante: Pena: reclusão, de 3 a 10 anos. O sujeito ativo do crime é o terceiro que provoca o aborto na gestante, já o sujeito passivo é a gestante e o Estado. Poderá o sujeito ativo agir com violência física ou grave ameaça, contrariando assim à vontade da gestante, que é a de não se submeter ao aborto. Para José Frederico Marques31, no caso de gestante menor de quatorze anos de idade, ou se esta é alienada mental, ou ainda, se há consentimento, mais obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência, a presunção do vício do consentimento é, portanto, inexistente e ocorre à ineficácia do consentimento. O agente pode atuar com dolo eventual, quando ele realiza a conduta mesmo sabendo da gravidez e sabendo que o seu ato pode ocasionar uma possível interrupção, entretanto o agente não quer esse resultado, mas dele consente se acontecer. 31 MARQUES, José Frederico. Tratado de Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 1961. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 21 O aborto não é punido a título do culpa, somente sendo punível a título de dolo. Ao eliminar com um tiro uma mulher, sabendo- a grávida, assumiu o agente o risco de sofrer a mesma um aborto, pelo que, ocorrendo a morte do feto, fica configurado tal delito, presente o dolo eventual. (RT/646/315) Distingue-se da provocação do aborto sem o consentimento da gestante o homicídio, já que nesse a conduta de matar do agente é posterior ao início do parto. 1.2.2.2 Provocar aborto com o consentimento da gestante O crime previsto no artigo 126 do Código Penal pode ser praticado por qualquer pessoa, nada impede a co-autoria ou a participação de terceiros que atuem em favor do agente. Os dois cometem crime: a gestante responde pelo crime previsto no artigo 124 do Código Penal e a outra pessoa será punido mais severamente com a pena cominada do artigo 126 do Código Penal. Art 126 Provocar aborto com o consentimento da gestante: Pena: reclusão, de 3 a 10 anos. Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência. O consentimento da gestante pode ser expresso ou tácito, devendo existir desde o início da conduta até a consumação do delito. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 22 A norma jurídica presume a violência, ainda que possa haver o consentimento da gestante, em três situações32: a) quando a gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, presumindo-se que ela tem desenvolvimento mental incompleto; b) quando a gestante é alienada (que sofre de doença mental) ou a débil mental (desenvolvimento mental retardado), que também podem consentir de maneira inválida; c) quando o consentimento da gestante for obtido por fraude, grave ameaça ou violência. Em todas as hipóteses, o agente responderá pelo ilícito tipificado no artigo 125 do Código Penal. 1.3 Forma qualificada do aborto A forma qualificada do aborto ocorre quando houver somente culpa. Caso ocorra dolo do agente, direto ou eventual, com a lesão ou a morte, haverá concurso de crimes. Trata-se de modalidade de preterdolo (dolo no aborto mais homicídio ou lesões graves). Isto significa que houve dolo (eventual) em relação ao resultado, o agente responderá pelo concurso de crimes. Art.19 Pelo resultado que agrava especialmente a pena, só responde o agente que houver causado ao menos culposamente. 32MIRABETE, Julio Fabbrini. Código Penal Interpretado. São Paulo: Atlas, 1999. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 23 Não se aplica o dispositivo à gestante nem aquele que é co-autor ou partícipe de seu crime previstos nos artigo 125 ou 126 do Código Penal, a pena também deve ser acrescida. Art.127 As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em conseqüência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofrer lesão corporal de natureza grave; e não duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte. No caso do artigo 127 do Código Penal, consiste em crime preterdoloso quando ocorre uma ação que é ao mesmo tempo, típica de um crime doloso e de um crime culposo. O agente quer um determinado resultado, mas dá causa a um outro resultado mais grave. O Artigo 18 do Código Penal diz: Art. 18 Diz-se o crime: I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo; II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. Parágrafo Único. Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando a pratica dolosamente. A forma qualificada do crime de aborto apresenta quatro figuras típicas provocado por terceiros qualificado pelo resultado, se em conseqüência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, resultar em33: 33TELES, Ney Moura. Direito Penal: parte especial: artigos 121 a 212, v. 2. São Paulo: Atlas, 2004. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 24 a) lesão corporal de natureza grave na gestante, no aborto consentido, a pena será reclusão de um ano e quatro meses; b) morte da gestante, no aborto consentido, a pena será reclusão do dois a oito anos; c) lesão corporal grave na gestante, no aborto dissentido, a pena será reclusão de quatro a treze anos e quatro meses; d) morte da gestante, no aborto dissentido, a pena será de seis a vinte anos. Deste modo, todas essas formas típicas qualificadas pelo resultado são modalidades de crime preterdoloso, nos quais o agente age com dolo de provocar o aborto, mas, por negligência, imprudência ou imperícia, acaba produzindo resultado mais grave. 1.4 O aborto legal Duas são as situações em que a lei considera aborto legal e torna lícita a prática do fato. O primeiro caso é do aborto necessário (ou terapêutico) que, no entender da doutrina, caracteriza uma espécie de estado de necessidade. A outra situação é a do aborto ético (ou sentimental), quando a gravidez é resultante de estupro, sendo o médico o único autorizado a realizar o aborto, podendo agir em favor de terceiro, no caso a gestante. Art 128 Não se pune o aborto praticado por médico. Não estando presentes os requisitos, o agente (médico) responderá pelo crime de aborto, mas não do exercício ilegal da medicina, já que a prática do aborto é, como regra geral, proibida. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 25 1.4.1 As diferenças entre aborto eugênico e aborto seletivo A legislação penal brasileira posiciona-se quase que totalmente contrária ao aborto, admitindo apenas duas formas de aborto legal, como já foi dito anteriormente. Entretanto, geralmente o aborto é tratado de forma genérica, sem fazer distinção entre as diversas finalidades clínicas envoltas em cada caso. É válido, portanto, diferenciar o aborto terapêutico e o eugênico. Fala-se de aborto terapêutico como sendo aborto eugênico, e deste como aborto seletivo, gerando enorme confusão. Para esclarecer as diversas formas de aborto, o discurso médico oficial é o mais adequado, pois é a nomenclatura que mais representa a prática de tal fato. Segundo Débora Diniz e Marcos de Almeida, a literaturamédica preceitua que34: A interrupção eugênica da gestação (IEG) ocorre nos casos de aborto ocorridos em nome de práticas eugênicas, isto é, situações em que se interrompe a gestação por valores racistas, étnicos, religiosos, etc. Este tipo de interrupção ficou conhecido por não respeitar a vontade do indivíduo. Como exemplo de IEG pode-se citar as ações desumanas de Adolf Hitler, em que as mulheres judias eram obrigadas a praticar o aborto porque iriam gerar crianças também judias, e o aborto de crianças cujas mães haviam ingerido o fármaco Talidomida, que poderia provocar malformações, principalmente nos membros, porém, geralmente estas crianças tinham capacidade mental preservada. Esses são casos típicos de aborto eugênico. 34 DINIZ, Débora. ALMEIDA, Marcos de. Bioética e Aborto. Disponível em: <http://www.cfm.org.br>. Acesso em: 10 out. 2007. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.cfm.org.br http://www.novapdf.com 26 Eugenia, segundo Antônio Houaiss35, é a "Ciência que se ocupa do aperfeiçoamento físico e mental da raça humana". Denomina-se interrupção terapêutica da gestação (ITG) os casos em que o aborto ocorre em nome da saúde materna, isto é, situações em que se interrompe a gestação para salvar a vida da gestante. Atualmente, visto o grande avanço científico e tecnológico na medicina, os casos de ITG são cada vez menores, sendo raras as situações terapêuticas que exigem tal procedimento. No entanto, o fator "terapêutico" leva a pensar que o ato pretendido (aborto) é coisa benéfica e necessária, pois deflui de uma necessidade de tratar medicamentosamente a pessoa da mãe para trazer-lhe o bem estar e a plena saúde física, psíquica ou mental. Dernival da Silva Brandão preleciona36: Criança doente necessita de cuidados médicos e não de ser eliminada. O diagnóstico pré-natal deve ser realizado enquanto possa servir ao bem da pessoa, e ser adequado à prevenção, ao diagnóstico e ao tratamento de enfermidades; e não para discriminar os portadores de genes patogênicos e defeitos congênitos. Senão aplicar-se-iam conhecimentos médicos não para tratar o doente, mas para eliminá-lo (...) Sempre há meios de tratar a gestante e, para isso, devem ser empregados todos os recursos atualmente disponíveis na proteção da vida de ambos: mãe e filho.(...) Quando necessário, a gestante doente deve ser encaminhada para centro especializado em gestação de alto risco. O abortamento não é isento de riscos, e a experiência tem demonstrado que muitas vezes ele próprio é causa da morte para a gestante doente. 35 HOUAISS, Antônio. Enciclopédia e Dicionário Ilustrado. Rio de Janeiro: Delta, 1994. p. 642. 36 BRANDÃO, Dernival da Silva. A Vida dos Direitos Humanos: Bioética Médica e Jurídica. Porto Alegre: Fabris, 1999. p. 30. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 27 A interrupção seletiva da gestação (ISG) é verificada nos casos de aborto ocorridos em nome de anomalias fetais, isto é, situações em que se interrompe a gestação pela constatação de lesões fetais. Em geral, os casos que justificam as solicitações de ISG são de patologias incompatíveis com a vida extra-uterina, sendo um exemplo clássico a anencefalia37. Já a interrupção voluntária da gestação (IVG) advém nos casos de aborto ocorridos em nome da autonomia reprodutiva da gestante ou do casal, isto é, situações em que se interrompe a gestação porque a mulher ou o casal não mais desejam a gravidez, seja ela fruto de um estupro ou de uma relação consensual. Muitas vezes, as legislações que permitem a IVG impõem limites gestacionais à prática. Com exceção da interrupção eugênica da gestação, todas as outras formas de aborto levam em consideração à vontade da gestante ou do casal em manter a gravidez. Em geral, a interrupção seletiva da gestação é também denominada por interrupção terapêutica da gestação, sendo esta última à terminação é mais comum. Esta é uma tradição semântica herdada, principalmente, de países onde a legislação permite ambos os tipos de aborto (ISG e ITG), não sendo necessária, assim, uma diferenciação entre as práticas. No entanto, considera-se que, mesmo para estes países onde o conceito ITG é mais adequado, em alguma medida ele ainda pode gerar confusões, uma vez que há limites gestacionais diferenciados para os casos em que se interrompe a gestação em nome da saúde materna ou de anomalias fetais. Além disso, o 37 DINIZ, Débora. O Aborto Seletivo no Brasil e os Alvarás Judiciais. In Série, Anais 12. Brasília: Letras Livres, jun. 2000. p. 5:19-24. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 28 alvo das atenções é diferente nos casos de ISG e ITG. No primeiro, a saúde do feto é a razão do aborto; no segundo, a saúde materna38. O termo "seletivo" remete diretamente à prática a que se refere aquele feto que, devido a malformação fetal, faz com que a gestante não deseje o prosseguimento da gestação. Tratar aborto seletivo como eugênico é nitidamente confundir as práticas. Em julgados recentes, diversos juizes vêm autorizando a prática do aborto em casos de fetos anencefálicos. Numa dessas sentenças, há o registro de que "não se está admitindo por indicação eugênica com o propósito de melhorar a raça, ou evitar que o ser em gestação venha nascer cego, aleijado ou mentalmente débil. Deve-se buscar evitar o nascimento de um feto cientificamente sem vida, inteiramente desprovido de cérebro e incapaz de existir por si só".39 Entretanto, pode-se verificar que, quando o magistrado entende o pedido de aborto como sendo eugênico, esse é totalmente rejeitado e indeferido. Assim tem entendido o Tribunal de Justiça de Goiás: (...) Na realidade, a ilação que se tira do exame do pedido é que o fundamento da Requerente para o mesmo é a circunstância de que o feto é portador de anomalia que, certamente, levará a morte de seu filho pouco tempo após o nascimento, cuidando-se, pois, de aborto eugênico, para o qual não existe autorização na lei, merecendo, pois, o repúdio da Justiça, a quem cumpre o indeclinável dever de assegurar os direitos do nascituro, conforme disposição expressa no Código Civil Brasileiro, entre os quais, evidentemente, está elencado o direito de nascer. (...) É que se a Justiça passar a autorizar o aborto eugênico na situação do caso em julgamento, amanhã os jurisdicionados poderão bater às portas do Tribunal para exigir autorização, em outras situações como, por exemplo, porque o feto apresenta algum problema que o impossibilitará de ter uma vida tida como normal ou porque a mãe ou pai 38 DINIZ, Débora. ALMEIDA, Marcos de. Bioética e Aborto. In: Conselho Federal de Medicina. Iniciação à Bioética. Brasília: CFM, 1998, p.125-138. 39 FRANÇA, Genival Veloso de. Aborto Eugênico - considerações ético-legais. Disponível em: <http://www.ibemol.com.br/sodime/>. Acesso em: 10 out. 2007. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.ibemol.com.br/sodime/ http://www.novapdf.com 29 daquele feto não dispõe de recursos para prover sua manutenção, entre outros casos.40 A lei não prevê a isenção de pena para o abortamento eugênico. Porém, o feto anencefálico certamente não se inclui entre os abortos eugênicos, porque a ausência de encéfalo é incompatível com a vida extra- uterina pós-parto. No aborto eugênico o feto tem possibilidade de vida pós- parto, embora sem qualidade, o que não é o caso presente, atestada a impossibilidade de sobrevivência sem o fluido do corpomaterno. 1.4.2 Aborto Necessário O direito entrega ao médico o poder de decidir se a continuidade da gravidez constitui um perigo para a vida da gestante, caso afirmativo o aborto poderá ser autorizado. Esse risco pode decorrer de fatores diversos. Entretanto, patologias como anemias profundas, diabetes, cardiopatias, tuberculose pulmonar, câncer uterino, má conformação da mulher, entre outras situações que, com o avanço da medicina, hoje podem normalmente ser contornadas, não há necessidade de interromper a gravidez. Também é certo que a mera indicação psiquiátrica por doença mental não sustenta a interrupção da gravidez. O médico não pode escolher a quem salvar, pois a lei nesse caso, só justifica a morte do ser em formação. O médico somente deverá provocar o aborto: Art 128 Não se pune o aborto praticado por médico: 40 BRASIL, Tribunal de Justiça de Goiás. Dr. José Machado de Castro Neto, juiz substituto, respondendo pela 14ª Vara Criminal de Goiânia. Disponível em: <http://www.tj.go.gov.br>. Acesso em: 15 dez. 2006. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.tj.go.gov.br http://www.novapdf.com 30 I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante. A situação de perigo para a vida da gestante não precisa ser atual, mas pode ser iminente e até mesmo futura, desde que, neste último caso, possa concluir, com segurança e certeza, a possibilidade de sua reversão. Se o médico tiver agido com dolo, ainda que eventual, responderá pelo aborto sem o consentimento da gestante, mesmo que esta tenha, por engano, anuído à interrupção da gravidez. Nesse caso, seu consentimento terá sido obtido mediante fraude. Não sendo o médico o agente, mas estando presente a situação de perigo para a vida da gestante e a inevitabilidade da interrupção da gravidez, não sendo possível obter o socorro médico, qualquer pessoa poderá provocar o aborto, sendo sua conduta justificada pela norma do artigo 23, inciso I do Código Penal. 1.4.3 Aborto no Caso de Gravidez Resultante de Estupro O estupro é uma violência inominável. Se dele resultar gravidez, não pode o Direito obrigar a mulher a gerar e depois ser mãe de quem não queria. A lei exige que esse aborto lícito seja praticado por um médico. Não sendo médico, o aborto será ilícito, exceto quando é invocado o estado de necessidade previsto no artigo 24 do Código Penal. O terceiro que auxilia o médico não pode ser incriminado, eis que colabora em fato lícito. Quando a gravidez resulta de estupro e há o consentimento da gestante ou do seu representante legal para a prática do aborto esse é denominado sentimental (ou ético ou humanitário), identificando alguns casos especiais de estado de necessidade e outros de não-exigibilidade de conduta diversa. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 31 Justifica-se a norma permissiva porque a mulher não deve ficar obrigada a cuidar de um filho resultante de coito violento, não desejado. O aborto ético tem fundamento diverso do aborto necessário. Art.128 Não se pune o aborto praticado por médico: I – [...] II - Se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal. A lei não se refere à necessidade de qualquer prova a respeito do estupro, mas a cautela manda que o médico, antes de realizar o aborto, procure certificar-se, dentro do possível, de sua ocorrência. No caso de menor de 14 anos de idade, como a conjunção carnal é presumidamente estupro, é suficiente a prova da idade da gestante. Indispensável, porém, é o consentimento da mesma e, quando é esta incapaz, do seu representante legal. É pacífico na doutrina que, por analogia, está autorizado o aborto quando a mulher engravidou em razão de atentado violento ao pudor. Na Medicina Legal, tem-se entendido que, havendo gravidez, houve estupro e não atentado violento ao pudor. Acerca da abordagem realizada neste capítulo, restou-se demonstrado que a vida do nascituro é um objeto de proteção no Direito Penal, sendo que a conduta do aborto é proibida, salvo as exceções esplanadas anteriormente. O direito à vida é um direito fundamental resguardado pela Constituição da República Federativa do Brasil. Assim sendo, tanto a Constituição quanto às leis ordinárias que garantem a inviolabilidade da vida do nascituro devem ser itens de abordagens quando se trata do aborto. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 32 No decorrer da pesquisa, far-se-ão considerações a respeito da existência de conflito de direito entre o nascituro e a gestante em razão da mesma poder cometer a prática do aborto. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 33 Capítulo 2 A VIDA E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO 2 DO INÍCIO DA VIDA HUMANA O início da vida é indagado toda vez que se fala em aborto, seja ele espontâneo, provocado ou até mesmo eugênico, ou seja, não se tem uma unanimidade se a vida inicia-se com a fecundação, com o nascimento ou ainda entre estas duas fases. Esta questão é objeto de discussão no senso comum e da opinião de cada individuo. Fernando Barcellos Almeida41 conceitua a vida como sendo: O conjunto de propriedades e qualidades graças às quais animais e plantas, ao contrário de organismos mortos ou da matéria bruta, se mantêm em continua atividade, manifesta em funções orgânicas tais como metabolismo, o crescimento, a reação a estímulos, a adaptação ao meio e a reprodução. É extremamente difícil definir o que é vida, mesmo porque a vida está em constante movimento, acontecendo a todo instante diante de nós. Indaga Sílvia Mota42 a respeito da vida: 41ALMEIDA, Fernando Barcellos de. Teoria Geral dos Direito Humanos. Porto Alegre: Renova, 1996. p. 54. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 34 Sem querer nem poder atingir a impérvia essência da criação, ou desvendar as verdades biológica, sociológica e psicológica do indivíduo, entende-se a vida como o agrupado de todos esses mistérios revelados através da energia mantida pela ação dos elementos naturais e alterados, iminentemente, pela intercessão da cultura. A vida se ampara na cumplicidade entre homem e mundo, que os torna inseparáveis e necessário um ao outro. Vertente dos outros bens jurídicos é, pela sua essência - independente de qualquer avanço biotecnológico - única e irreplicável. Por isso, exige o respeito absoluto de não ser tratada como simples meio, mas como fim. As diversas correntes sobre o momento do início da vida humana podem ser destacadas em três pontos, sendo que esta conceituação ainda está distante por parte da Sociedade, já que é fortemente influenciada pelos valores religiosos e ideológicos de cada um. Como primeiro ponto pode-se destacar que o início da vida humana se dá com a fecundação ou ainda que ocorre em determinado momento entre o desenvolvimento e a fecundação. Nesta corrente podem ser encontrados posicionamentos que a vida tem início com a nidação do óvulo no útero, ou ainda com a formação do sistema nervoso, o que não ocorre no feto que possui anomalias genéticas, por último, mas não menos importante, pode- se dar início com o nascimento. Pelo fato de ter muitos posicionamentos controvertidos é que se busca auxilio na Embriologia humana43, na Medicina Legal44 e nadoutrina jurídica para que se possa estabelecer um marco inicial, ainda que hipotético, do início da vida humana. 42MOTA. Silva Maria Leite de. Da Bioética ao Biodireito: a tutela jurídica no âmbito do direito civil. 1999. 308 p. dissertação (mestrado em Direito Civil) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. 1999. p.20-21. 43Ciência que estuda a origem e o desenvolvimento do ser humano desde o zigoto até o seu nascimento. 44Medicina Legal é o conjunto de conhecimentos médicos e paramédicos destinados a servir ao Direito, cooperando na elaboração, auxiliando, auxiliando a interpretação e colaborando na execução dos dispositivos legais atinentes ao se campo de Medicina Aplicada. GOMES, Hélio. Medicina legal. 30 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1993. p. 7. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 35 O início do ser humano ocorre quando o óvulo feminino é fecundado pelo espermatozóide masculino sendo formado o zigoto, que seria o óvulo fertilizado, se dando assim o início da concepção. Depois de passado esta fase de fertilização, ocorre uma segunda fase, onde o zigoto passa a ser denominado mórula, fase que é atingida depois de três dias em que ocorreu a fertilização. Nesta fase o ser humano está pronto, vindo da trompa uterina para fixar-se no útero da mulher. Dentro do útero, forma-se uma cavidade que é denominada cavidade blastocística e a mórula é transformada em blastocisto. A implantação do blastocisto (chamada de nidação) começa no fim da primeira semana e termina no final da segunda semana. As células desenvolvidas do blastocisto vão dar origem ao embrião, sendo que este termo não é usado antes da 3º semana. O período embrionário estende-se da terceira semana até o final da oitava semana, quando já estão formandos as principais estruturas e características do ser humano, chegando ao fim do período embrionário. A partir desse momento, o embrião passa a ser chamado de feto e dá-se início ao período fetal, que vai da nona semana até o nascimento. Sob o enfoque médico, Hélio Gomes45 diz que a gravidez ou o período de gestação, como também pode ser chamado, inicia-se com a realização da fecundação, “que é a cédula inicial formadora do homem”. Já na visão jurídica, Edgard Magalhães Noronha46 diz que: Durante a gestação, em qualquer momento se tem vida no produto da concepção, pois cresce e se aperfeiçoa, assimila as substâncias que lhe são fornecidas pelo corpo materno e 45 GOMES, Hélio. Medicina legal. 30 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1993. p.318. 46 NORONHA, Edgard Magalhães. Direito Penal. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 50. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 36 elimina os produtos de recusa; executa, assim, funções típicas de vida (...) a verdade é que ali existe uma vida humana em germe. O fato de haver diversas opiniões induz à dúvida nesta operadora do direito com relação ao início da vida, já que o feto ou o embrião é totalmente dependente do organismo que o abriga, que seria o corpo da mãe. 2.1 Direito à Vida Partindo do princípio de que o direito à vida é um dom recebido diretamente de Deus e que os homens são apenas meros administradores, existe um consenso entre as crenças religiosas no que diz respeito ao caráter sagrado da vida. A liberdade individual garante a todo indivíduo o direito à livre tomada de decisão nas suas ações, desde que estas não interfiram no direito de outrem. O Código Civil brasileiro47, em vigor desde janeiro de 2003, propõe, em seu artigo 2º, que: "A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida, mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”. Verifica-se que, apesar do posicionamento radical da igreja católica, seguida de uma forma tênue pelos judeus e espíritas (que oferecem uma explicação para o fato de existirem seres malformados e seres fisicamente perfeitos), já existem muitas religiões onde prevalece o entendimento de que há casos em que o princípio da inviolabilidade da vida 47 BRASIL. Código Civil Brasileiro: principais alterações comentadas: anotações, legislação. São Paulo: Saraiva, 2003. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 37 humana deve ser ponderado em face de outros valores48. Como exemplo pode- se citar grande parte das igrejas evangélicas, que, como não possuem dogmas a serem seguidos como nas demais igrejas, a opção pela interrupção da gravidez por anencefalia é aceita, já que visam o bem estar da gestante e de sua família. Assim, o direito à vida deve ser associado a um direito à conservação da vida, em que o indivíduo pode gerir e defender sua vida, mas não pode dela dispor, apenas justificando ação lesiva contra a vida em casos de legítima defesa e estado de necessidade. O direito à vida é um direito fundamental do homem, porque é dele que decorrem todos os outros direitos. É também um direito natural inerente à condição de ser humano. Por isso, a Constituição Federal do Brasil declara que o direito à vida é inviolável. O Artigo 5, caput da Constituição Federal49, de 1988, assegura a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil, o direito à vida: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. (Grifo nosso) Sabe-se que todos os direitos são invioláveis; não existe direito passível de violação. Mas a Constituição Federal fez questão de frisar a inviolabilidade do direito à vida, exatamente por se tratar de direito fundamental. 48TESSARO, Anelise. Aborto seletivo: descriminalização & avanços tecnológicos da medicina contemporânea. Curitiba: Juruá, 2002. 49 BRASIL. Constituição [1988] Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 1988. Created with novaPDF Printer (www.novaPDF.com). Please register to remove this message. http://www.novapdf.com 38 É importante lembrar que a Constituição Federal é a Lei Maior do país, a qual devem se reportar todas as demais leis. Além disso, os direitos previstos no artigo 5º da Constituição Federal são “cláusulas pétreas”, isto é, são direitos que não podem ser suprimidos da Constituição, nem mesmo por Emenda Constitucional. José Joaquim Gomes Canotilho50 aduz que o direito à vida é um direito subjetivo de defesa, e implica na garantia, que deve ser exercida pelo Estado, de uma dimensão protetiva deste direito à vida. Portanto, o indivíduo tem o direito de não ser morto pelo Estado; por outro lado, o indivíduo tem o direito à vida perante os outros indivíduos e estes devem abster-se de praticar atos que atentem contra a vida de alguém. E conclui: o direito à vida é um direito, mas não é uma liberdade. Assevera, ainda, sobre tutela privada e pública do direito à vida, admitindo que o direito aos alimentos é uma tutela complementar da vida, sendo diferente do direito à vida, pois não é a vida o seu objeto, mas um bem material para servir a conservação da vida. Como acentua José Cretella Junior51 em seus Comentários à Constituição Brasileira de 1988, institui que: Bastaria que se tivesse dito ”o direito“ ao invés de ”a inviolabilidade do direito à vida“. Se ”vida é um direito“ garantido pelo Estado, esse direito é inviolável, embora não ”inviolado”.
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