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Artigo População Carcerária Feminina e a Lei de Drogas

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A POPULAÇÃO CARCERÁRIA FEMININA E A LEI 11.343/2006: AS 
CONSEQUÊNCIAS NA PRÁTICA PENAL¹ 
 
Maria Vitoria Ferreira Rodrigues²; 
Stella Frasio Stefanini da Silva²; 
Vithoria Karoline Vicente Aureliano²; 
Tais Neves²; 
Ronny Ton Zanotelli³ 
 
1. Trabalho apresentado à Faculdade de Rolim de Moura – FAROL, como pré-requisito para obtenção de nota no 
projeto Interdisciplinar do curso de Direito: junho de 2020. 
2. Acadêmico: ferreirav042@gmail.com 
2. Acadêmico: stellastefanini1@hotmail.com 
2. Acadêmico: vithoriak@outlook.com 
2. Acadêmico: taisneves@live.com 
3. Professor orientador graduado em Direito, advogado criminalista e especialista em Ciências Criminais. 
 
Resumo: O sistema penitenciário brasileiro enfrenta uma crise crônica, apresentando superlotação, violência e 
infraestrutura precária. Este artigo tem como objetivo analisar a população carcerária feminina e suas relações 
com a Lei 11.343/2006, permeando aspectos sociais em que a mulher se encontra inserida. A Lei 11.343/2006, 
asism como a Lei 6.368/1976 e as Convenções Internacionais, buscam o combate ao tráfico de drogas, por meio 
de medidas repressoras, e o tratamento e a prevenção ao consumo de drogas, através de medidas protetivas. Nota-
se que a maioria da população feminina em restrição de liberdade vem de grupos sociais desfavorecidos, oriundas 
de periferias, cuja educação foi limitada e tendo um histórico violento, frequentemente, desde a infância ainda 
no leito familiar. Além disso, as mulheres com restrição de liberdade se deparam com prisões construídas para 
atender às demandas dos homens. 
 
Palavras-chave: Criminalidade Feminina. Tráfico de Drogas. Prevenção. Punição. 
 
THE FEMALE PRISON POPULATION AND LAW 11.343 / 2006: THE 
CONSEQUENCES IN CRIMINAL PRACTICE 
 
Abstract: The Brazilian prison system faces a chronic crisis, with overcrowding, violence and poor infrastructure. 
This article aims to analyze the female prison population and its relations with Law 11.343/2006, permeating 
social aspects in which women are inserting. Law 11,43/2006, as well as Law 6,368/1976 and International 
Conventions, seek to combat drug trafficking, through repressive measures, and the treatment and prevention of 
drug use, through protective measures. It is noting that the majority of the female population in restriction of 
freedom comes from disadvantaged social groups, from peripheries, whose education was limited and having a 
violent history, often from childhood still in the family bed. In addition, women with restricted freedom face prisons 
built to meet the demands of men. 
 
Keywords: Female Crime. Drug trafficking. Prevention. Punishment. 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
Desde os primórdios, as mulheres foram educadas para se tornarem mães e esposas e 
recebem seus papéis como cuidadoras do lar. Sendo vistas como responsáveis pela criação de 
seus filhos de acordo com as instruções do casal. Neste sentido, os valores culturais interferem 
infinitamente na realidade humana. Geram rótulos, influenciam o conceito de papéis dos 
sujeitos e as funções que lhes são atribuídas, visando assimilar e expressar condições únicas 
para cada um. Tal percepção reproduz uma imagem discriminatória das mulheres, enfatizando 
 
sua honra como uma extensão da honra dos homens (FERREIRA, 2013). 
O gênero se deve não apenas às diferenças fisiológicas e sexuais entre homens e 
mulheres, mas também à cognição social. Assim, os conceitos criados pelas sociedades e 
culturas em que as mulheres estão inseridas constroem uma identificação do que serão homens 
e mulheres com base em sua distinção e desigualdade. O comportamento de homens e mulheres 
é estabelecido pela sociedade, eles são relacionados e definidos pela análise de seu 
relacionamento. Nesse sentido, isso significa que os papéis e comportamentos de homens e 
mulheres na sociedade são socialmente compreendidos, aceitos e diferentes dentro de cada 
grupo social (FERREIRA, 2013). 
Com os anos as mulheres conquistaram cada vez maior autonomia e passaram a 
influenciar os mais variados meios. As mulheres passaram a conquistar direitos políticos, obter 
acesso à educação, alcançaram lugares no mercado de trabalho e tornaram-se parte da esfera 
pública. A construção desse padrão inovador de atividade permitiu a transição das mulheres da 
classe média de suas posições previamente definidas de esposa e mãe para se tornarem 
trabalhadoras. Devido às mudanças sociais que ocorreram, as mulheres entraram no mercado e 
a conquistar direitos e deveres (GOMES, 2011). 
Com o tempo as mulheres passaram a estar presentes nos mais diferentes meios, desde 
a sala de aula até cargos de alta relevância política e social. Mas também, com o passar dos 
anos aumentou-se o número de mulheres na criminalidade, por consequência, cresceram-se os 
quantitativos de mulheres nas prisões. Na atualidade, o sistema penitenciário brasileiro enfrenta 
uma crise crônica, apresentando superlotação, violência e infraestrutura precária. Os dados 
coletados através do Departamento Penitenciário Nacional por meio do INFOPEN 
(Informações Penitenciárias) mostram que a população carcerária de mulheres em dezembro de 
2019 era de 36.929.000, das quais 17.506 estavam presas devido envolvimento com drogas. Ou 
seja, mais da metade das mulheres presas estão envolvidas em crimes de drogas. 
Os relatórios de pesquisa nacionais de Informações Penitenciárias revelam um aumento 
preocupante da população carcerária feminina desde o início do século XXVI até a atualidade. 
Em 2017, houve um aumento de 656% nos incidentes de prisões femininas, se comparado ao 
período de 2000 a 2016. Esses dados são alarmantes. Além disso, as pesquisas indicam que, 
assim como ocorre com os homens, nos sistemas penitenciários há predominância de mulheres 
negras (FARIA, 2010). 
Nesse contexto, este artigo teve como objetivo analisar a população carcerária feminina 
e suas relações com a Lei 11.343/2006, permeando aspectos sociais em que a mulher se 
encontra inserida. A metodologia utilizada para a análise foi uma revisão bibliográfica com 
 
análise descritiva baseada em dados oficiais. 
 
2 DESENVOLVIMENTO 
 
2.1 TRANSFORMAÇÕES OCORRIDAS A PARTIR DA MUDANÇA DOS PAPEIS DA 
MULHER NA SOCIEDADE 
 
As oportunidades criadas pela conquista das mulheres levaram a uma maior participação 
nas esferas socioeconômicas, resultando em novas possibilidades e, consequente, na 
consignação do crime. A esse respeito, a criminalidade feminina parece estar aumentando em 
cenários de crime, pois as mulheres alcançam maior visibilidade diante da sociedade. No 
entanto, a entrada no mercado de trabalho não foi à causa do aumento da criminalidade 
feminina, existem outros fatores sociais que influenciam e influenciaram este contexto 
(GOMES, 2011). 
Na sociedade atual, observa-se que ainda existe uma disparidade salarial entre os 
gêneros, aumentando as tensões existentes e causando frustração. Dado o fato de uma grande 
proporção da população feminina ocupar empregos terciários não lucrativos, que por vezes 
garantem más condições de vida, isso levou à busca de formas alternativas de obter renda. 
Durante anos, nenhum estudo sobre criminalidade feminina foi observado devido ao 
fato de que os dados relacionados à criminalidade feminina são comumente associados e 
indistinguíveis dos índices masculinos. Atualmente, ainda existe certa dificuldade para obter 
dados sobre os crimes de mulheres (BORGES, 2018). Independentemente de ser praticado por 
homem ou mulher, o crime é um problema social altamente relevante (GRECO, 2014). 
Poucos estudos revelaram o envolvimento das mulheres em atividades criminosas. No 
Brasil, antes da década de 1960, a maioria dos crimes cometidos por mulheres se referia a 
crimes passionais. Nas décadas de 1960 e 1970, os atos criminosos assumiram duas formas: 
rebelde e criminal. Por um lado, não foi aceito pelos poderes superiores do Estado devido à 
negaçãoda ideologia e de grupos extremistas. Do início dos anos 1970 até a atualidade, o tráfico 
de drogas passa a ser o crime com maior superlotação nas prisões (INFOPEN, 2019). 
Em dezembro de 2007, as mulheres encarceradas representavam 6,12% da população 
carcerária total no Brasil. Portanto, embora o índice absoluto seja baixo, é importante considerar 
que, em termos de evolução quantitativa, as mulheres não devem ser ignoradas no mundo 
criminal (LUDWING, 2014). 
 
 
2.2 FATORES QUE INFLUEM NA CRIMINALIDADE FEMININA 
 
2.2.1 Violência intrafamiliar, situação socioeconômica e baixo grau de escolaridade 
 
O contexto familiar é frequentemente gerador da conduta criminal do sujeito, pois a 
família é a base responsável pelo desenvolvimento pessoal e pela formação da personalidade, 
porém é sabido que essa não é a regra máxima. No entanto, no momento em que essa instituição 
se mostra frágil, pode causar inúmeras consequências à pessoa inserida. A maioria das mulheres 
do sistema penitenciário é vítima de violência causada no ambiente familiar, muitas delas foram 
vítimas de abuso ou usuárias de entorpecentes. 
A inserção de uma figura feminina no mundo do crime está fortemente associada ao 
narcotráfico que se mostra interessante uma vez que apresenta ofertas atraentes, sem a 
necessidade de experiência e garantias de renda mais substanciais no meio de uma economia 
que intensifica o desemprego. Diante de uma série de propostas lucrativas não encontradas no 
mercado de trabalho formal, as mulheres que buscam aumentar sua renda sem prejudicar a 
família atenderão às suas necessidades na comercialização de drogas (MELLO, 2010). 
O tráfico ilegal de drogas não requer habilidades ou qualificações, não é exigida idade 
mínima, nem máxima. Ou seja, no narcotráfico podem-se contratar mulheres jovens ou 
mulheres muito velhas. Este é um mercado em que fatores de alta idade não se mostram isentos 
do trabalho que ocorre no mercado formal, ou um mercado que não é mais jovem, é uma questão 
na maioria das vezes de necessidade trabalhista e está emergindo como um potencial ganhador 
de renda. 
É sabido que o mercado de trabalho sofreu grandes mudanças na sociedade moderna e 
provocou mudanças no recrutamento por meio da reestruturação da globalização e dos meios 
produtivos voltados para o crescimento econômico e a melhoria da qualidade dos serviços 
prestados. A obtenção de qualificações profissionais é um requisito essencial para o ingresso 
no mercado de trabalho, bem como, para obtenção de melhores condições de trabalho. Este 
cenário faz com que o mercado de trabalho se torne cada vez mais competitivo e seletivo, 
criando barreiras para pessoas incompatíveis com as exigências. A avaliação da formação 
profissional, apontada como condição para obter melhores recompensas, destacou as 
disparidades da sociedade e aumentou o desemprego (MINAYO, 2010). 
Neste cenário, o tráfico de drogas mostra-se atrativo para pessoas que não se encaixam 
no perfil exigido pelo mercado de trabalho, oferecendo “oportunidades” para pessoas 
desqualificadas. O potencial de retorno financeiro rápido que não é facilmente encontrado em 
 
outras “formas de trabalho” incentiva as mulheres a participarem do crime e vitimizam suas 
famílias com essa prática. Aqueles que vendem drogas ilegais esperam recompensas melhores 
e mais rápidas que não poderiam ser alcançadas com emprego legal. Caso isso não ocorra, 
fornece recursos financeiros inadequados para a sobrevivência de suas famílias, além da 
saturação das demandas de consumo impostas pela sociedade. Essa reflexão permite entender 
o problema do crime. Percebe-se um contexto de desigualdade, alienação e criminalidade 
(MINAYO, 2010). 
 
2.2.2 Influência masculina 
 
A presença de homens é frequentemente a causa do envolvimento das mulheres no 
crime, e as emoções íntimas e emocionais as levam a cometer tal ato. Influenciadas por amigos, 
namorados, colegas e parentes que agregam valor a esses relacionamentos sem se preocupar 
com as consequências e são dominadas por impulsos emocionais. 
A presença de homens é a força motriz da inserção de mulheres no tráfico de drogas. 
Estudos realizados no nível prisional mostram que há relatos de que os homens participam em 
determinados momentos de um episódio de crime e são direta ou indiretamente responsáveis 
pelo envolvimento das mulheres no crime (NETO e BORGES, 2013). 
 
2.2.3 Auferição de renda 
 
Nem todos têm acesso a empregos bem remunerados, fazendo do crime uma maneira 
alternativa ainda que ilegal de sucesso econômico, resultando em altas taxas de criminalidade 
percebidas na maioria dos casos em comunidades de baixa renda. Esse cenário faz com que o 
indivíduo, ao não atingir o estilo de vida desejado, busque meios de alcançá-lo através de 
formas alternativas que violem normas estabelecidas no ordenamento jurídico brasileiro. 
Destaca-se que a necessidade de se complementar ou mesmo obter renda é um fator 
motivador da atividade criminosa. O trabalho não é apenas um meio de obter sustentos e 
também um meio de se inserir na sociedade, não é apenas o fator econômico, mas também 
psicológico e cultural. 
Ao analisar a situação social em que as mulheres envolvidas no crime estão inseridas, 
aponta-se que a maior parte delas dispõe de baixa rentabilidade e de baixos níveis de 
escolaridade, condições financeiras precárias, falta de oportunidades de emprego e de outros 
elementos essenciais para a sobrevivência humana. Mediante a ausência desses fatores 
 
fundamentais, buscam-se formas alternativas de retificação do problema, incluindo a figura 
feminina no crime. Em destaque encontra-se a comercialização de drogas que é um crime que 
oferece recompensa rápida, sem necessidade de experiência. 
A sociedade brasileira é caracterizada por falta de estruturas e problemas como fome, 
analfabetismo, corrupção e extrema desigualdade social. A criminalidade é consequência de 
todo este contexto social. Também é importante notar que o emprego legal, se presente, fornece 
na maioria das vezes escassos recursos financeiros para aqueles que dependem dessa renda para 
prover seus meios de subsistência (SILVA, 2011). 
É importante destacar que, em relação ao tráfico de drogas, as famílias com poucos 
recursos que vivem do tráfico de drogas podem se tornar reféns desse sistema devido as más 
condições econômicas, impedindo a remoção do indivíduo de um ambiente ilegal, sem prejuízo 
de outros membros da família. Da mesma forma, não há como controlar ou combater a 
comercialização e distribuição de narcóticos em todas as regiões, uma vez que a policial 
brasileira não se encontra intacta. 
Além do que a problemática que envolve o uso de drogas ilegais é um problema 
diretamente ligado à saúde pública, por acarretar ônus ao sujeito e afins. 
A Constituição Federal garante sem eu artigo 1° que o objetivo da república é a 
dignidade humana e o valor social do trabalho, mas também envolve a erradicação da pobreza, 
a exclusão da alienação e da desigualdade. 
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados 
e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e 
tem como fundamentos: 
I - a soberania; 
II - a cidadania; 
III - a dignidade da pessoa humana; 
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; 
V - o pluralismo político. 
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de 
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição (BRASIL, 1988, 
s/p). 
 
Sendo necessário, conforme previsto no artigo 3° da Constituição Federal, construir uma 
sociedade livre e justa. 
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: 
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; 
II - garantir o desenvolvimento nacional; 
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdadessociais e 
regionais; 
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e 
quaisquer outras formas de discriminação (BRASIL, 1988, s/p). 
 
 
O conteúdo dessas regras constitucionais é muito importante, pois se aplicadas tornam-
se eficazes e garantem os direitos básicos da sociedade brasileira. Mas, nota-se que esses 
princípios são diariamente negligenciados. 
 
2.7 APLICAÇÃO DA LEI 11.343/2006 
 
A lei 11.343 de 23 de agosto de 2006 tipifica em seus artigos 28 e 33 as condutas de 
usuário e traficante, não obstante, a referida lei não é explicativa o suficiente para permitir uma 
interpretação adequada aos casos concretos. O artigo 28 tipifica o tráfico para fins de uso 
pessoal e submete o usuário às penas de advertência, prestação de serviços à comunidade ou 
medida educativa. Já em seu artigo 33 prevê a conduta do traficante cuja pena mínima é de 05 
anos podendo chegar até 15 anos de reclusão. Além do pagamento mínimo de 500 a 1.500 dias-
multa (BORGES, 2018). 
O tráfico também passou a ser considerado um crime hediondo, sendo incluído na Lei 
nº 8.072/90, de 25 de julho de 1990 (Lei dos crimes hediondos). Segundo a referida legislação, 
em seu art. 2º, §1º, há previsão de que o condenado por tráfico deve ter seu regime inicial para 
cumprimento de pena obrigatoriamente no fechado, podendo progredir de pena após o 
cumprimento de 2/5 da pena, enquanto que um apenado por crime comum precisa cumprir 
apenas 1/6 do total da pena. Caso ele seja reincidente, mesmo que por crime comum praticado 
anteriormente, a progressão de regime para a pena aplicada pelo cometimento de crime 
hediondo passa a ser de 2/5, o que altera drasticamente o tempo de cumprimento em 
determinado regime (BRASIL, 1990). 
A obrigatoriedade da fixação de regime inicial fechado para condenados por crimes 
hediondos também contraria as disposições sobre a imposição de regime inicial prevista nos 
arts. 33 e 59 do Código Penal (BRASIL, 1940). Com base nos referidos artigos, ao traficante 
eventual poderia ser imposto o regime aberto, caso fosse aplicado o redutor previsto no art. 33, 
§4º da Lei. 11.343/06, o qual prevê a figura do tráfico privilegiado. Vale ressaltar, ainda, o 
entendimento sumular do Supremo Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, os quais 
solidificaram que deve haver motivação suficiente para que seja imposto regime mais gravoso 
do que o cabível, considerando a quantidade de pena e não podendo ser levada em conta a 
gravidade em abstrato do delito, conforme orientações das súmulas 440 do Supremo Tribunal 
de Justiça, e 718/719 do Supremo Tribunal Federal. 
No entanto, apesar de todas as disposições acima, a realidade das condenações contra 
crimes de tráfico de drogas mostra que o entendimento da Suprema Corte é frequentemente 
 
ignorado. Na maioria das condenações, altas penalidades e aplicação cumulativa de multas 
impõem o primeiro regime de aplicação disciplinar no regime fechado, independentemente da 
quantidade de drogas apreendidas (FARIA, 2010). 
Ao analisar esta lei, não há previsão para a quantidade ou tipo pelo qual um indivíduo 
pode ser qualificado como um mero usuário ou revendedor. De fato, a quantidade de drogas 
apreendidas por um criminoso nem sempre deixa claro que tipo de criminoso ele pode ser, seja 
um usuário ou um traficante, sendo frequentemente condenado por tráfico de drogas (FARIA, 
2010). 
Uma condição que é sempre ponderada entre os magistrados nesses casos são os 
antecedentes, caso seja primário e de bons antecedentes, o acusado muitas vezes é condenado 
como incurso no art. 28, ou no art. 33, §4º, cujo dispositivo legal prevê a modalidade do tráfico 
privilegiado, reduzindo a pena de 1/6 a 2/3, podendo inclusive a pena privativa de liberdade ser 
convertida para restritiva de direitos, conforme mais recente entendimento do Supremo 
Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus Nº 97.256/RS. (FERREIRA, 2013). 
Porém, frequentemente há condenações por tráfico com fulcro no art. 33, caput, da lei 
nº 11.343/06 mesmo se tratando de acusado primário e de bons antecedentes, somente em razão 
da quantidade/variedade de drogas encontradas em sua posse, ou do depoimento dos policiais 
que realizaram a abordagem (FERREIRA, 2013). 
Muitas situações, bem como muitos dos critérios de "comportamento e antecedentes" 
dos agentes, são claramente subjetivos; portanto, o desempenho policial e judicial utiliza 
condições pessoais, locais e precedentes arbitrários para categorizar as ações. Assim, os 
estereótipos do traficante de drogas criados pelo próprio sistema de punição atuam como um 
componente central do comportamento típico (GOMES, 2011). 
Nessas circunstâncias, muitas mulheres são presas devido tráfico de drogas e, com 
bastante frequência, ocupam o papel de transportadora do material. Ou seja, as mulheres são 
responsáveis pelo transporte de grandes quantidades de drogas, constantemente viajando entre 
estados ou países e recebendo dinheiro para esse fim. 
Com a entrada de mulheres no mercado de trabalho e a necessidade de manter as 
famílias financeiramente, principalmente em casos de mães solteiras, a busca por renda 
proveniente do comércio ilegal de drogas tende a crescer. Dados mundiais apontam que a 
população carcerária masculina aumentou 293% de 2000 a 2016. Enquanto isso, no mesmo 
período, a população carcerária feminina aumentou 656% (GOMES, 2011). 
Observando o exposto, milhares de mulheres são reclusas, a maioria das quais foram 
processadas por tráfico de drogas e ainda aguardam julgamento. Na maioria das vezes, fica 
 
claro que elas não são realmente grandes traficantes de drogas associadas a organizações 
criminosas, mas sim mulheres que costumam fazer distribuições de drogas por várias razões 
sociais (GRECO, 2014). 
Devido à grande quantidade de drogas, as mulheres são frequentemente acusadas de 
traficantes e têm uma sentença de mais de 5 anos. No entanto, na maioria dos casos, não há 
evidências suficientes do envolvimento direto de uma mulher no narcotráfico, mas é a 
quantidade de drogas apreendidas que os magistrados entendem estarem envolvidos na vida 
dos criminosos. E a maioria das mulheres é condenada à prisão, mesmo se provar ser mãe de 
uma criança com menos de 12 anos (GRECO, 2014). 
Com efeito, ainda que a pena seja fixada no mínimo legal, grande parte dos magistrados 
impõe a fixação de regime fechado, embora seja possível determinar regime mais brando, como 
o semiaberto ou aberto. Observa-se que os juízes de 1º grau, principalmente quando se trata de 
crime de tráfico, violam os artigos 33, § § 2º e 3º, e 59, ambos do Código Penal, além das 
Súmulas 440 do STJ, 718 e 719 do STF (INFOPEN, 2017). 
Além do mais, a 2ª instância também frequentemente ratifica o entendimento dos juízes 
a quo, em evidente discordância com os artigos e Súmulas mencionados, somente com base na 
gravidade abstrata do delito de tráfico de entorpecentes, embora já possuam altas reprimendas 
previstas, vide trecho extraído de um acórdão proferido pela 15ª Câmara Criminal do Tribunal 
de Justiça do Estado de São Paulo, em sede da Embargos de Declaração nº 0062204-
08.2015.8.26.0050: (INFOPEN, 2017). 
De fato, quanto à questão especialmente aqui ventilada, verifica-se ter sido ela 
rechaçada, aliás, explicitamente pelo V. Acórdão, às fls. 281, observando-se que, em 
se tratando de tráfico de entorpecentes, correta a fixação do regime fechado, que é o 
único que se coaduna com a gravidade do crime praticado pelo embargante, de 
catastróficas consequências à saúde pública, e responsável, também, pela 
desagregação familiar e social (BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo (15ª 
Câmara Criminal). Embargos de Declaração nº 0062204-08.2015.8.26.0050. Julgado 
em 29 de agosto de 2018). 
 
Pelo exposto, é possível verificar que, apesar das milhares de condenações por tráfico 
de drogas no Brasil, ainda não há redução nessaatividade ilegal, por falta de uma política 
pública eficaz no enfrentamento do crime que envolve drogas ilícitas, existe apenas a punição 
sem considerar os fatores causadores. 
 
2.8 MUDANÇAS EM RELAÇÃO A LEI 6.368/1976 
 
 
Com a promulgação da Lei de Antidrogas no ano de 2006, houve um nítido 
endurecimento das penas corpóreas e também pecuniárias. A pena in abstracto prevista para o 
crime de tráfico antes era de no mínimo 03 anos, e foi elevada para 05 anos, mantendo-se seu 
patamar máximo de 15 anos de reclusão. O que não parece fazer tanta diferença para o leitor 
leigo, porém, impõe que não poderá ser fixado regime aberto para início de cumprimento da 
pena – mesmo que aplicada no mínimo legal – visto que só faz jus a esse regime o réu primário 
e tenha a pena cominada de até 04 anos de reclusão, nos termos do art. 33, § 2º, alínea “c” do 
Código Penal (LUDWING, 2014). 
Além da imposição de regime inicial obrigatoriamente semiaberto ou fechado, a 
elevação da pena mínima para o crime de tráfico também afasta a possibilidade da conversão 
da pena restritiva de liberdade em restritiva de direitos, pois com essa quantidade de pena não 
estariam preenchidos os requisitos do art. 44, do Código Penal. (LUDWING, 2014). 
Superado isso, como se não bastassem as penas corpóreas altíssimas e o caráter 
hediondo, ainda são aplicadas cumulativamente as penas de dias-multa. Em regra, de acordo 
com o art.49 do Código Penal, o mínimo a ser fixado deve ser de 10, e de no máximo 360, sobre 
pelo menos 1/30 do maior salário mínimo vigente à época do fato, e não podendo ser superior 
a 05 vezes esse salário (BRASIL, 1940). 
Pois bem, com a promulgação da lei 11.343/06, para o tráfico abre-se uma exceção, 
visto que, de acordo com o art. 33, caput, a pena mínima de dias-multa é 500, e o limite é 1500, 
sobre pelo menos 1/30 do maior salário mínimo vigente à época do fato, e pode ser aumentada 
até 10 vezes esse salário, conforme parágrafo único do artigo 43, da lei de Drogas. Na lei 
anterior, o mínimo era de 50 e o máximo 360, bem parecido com a pena para um crime comum, 
tal como um latrocínio (BRASIL, 1940). 
Convertendo esses números em valores, o valor mínimo de criminalidade comum é de 
R$ 318,00 e a multa máxima é de R $ 1.717.200,00. Para crimes de tráfico, a pena mínima 
fixada é de R $ 15.900,00 e o nível máximo é de R $ 14.310.000,00 (LUDWING, 2014). 
Com base nisso, é claro que essas sanções aplicadas cumulativamente violam o princípio 
da proporcionalidade. Isso porque na realidade, embora o comércio ilícito de entorpecentes seja 
uma atividade lucrativa, é notório que um pequeno traficante, muitas vezes, não consiga investir 
esse dinheiro ou se quer guardá-lo, tendo em vista a ilicitude da origem das quantias auferidas. 
Deste modo, embora o indivíduo seja de fato envolvido no tráfico, não significa que sua 
situação financeira seja positiva, a maioria continua morando em comunidades, e com o 
patamar financeiro pouco elevado (MARANGONI e OLIVEIRA, 2013). 
Além disso, são cobradas após o trânsito em julgado da sentença condenatória, ou seja, 
 
muitas vezes após o cumprimento da pena corpórea. Sendo assim, após passar anos recluso, o 
preso irá se deparar com uma multa nessa quantia, sem qualquer possibilidade de ingresso no 
mercado de trabalho, e com mínimas chances de quitá-la. Ainda que tal pena de multa, caso 
descumprida, não enseje uma conversão em pena restritiva de liberdade, o condenado poderá 
sofrer uma execução fiscal, e ser inscrito em dívida ativa, em razão do elevado valor devido. 
Poderá ter seus bens liquidados, contraindo uma dívida, ocasionando uma série de problemas 
futuros (MARANGONI e OLIVEIRA, 2013). 
Se o valor equivalente à multa não for pago dentro de 10 dias e não tendo o condenado 
solicitado o seu parcelamento, deverá ser extraída certidão de sentença condenatória com 
trânsito em julgado, que valerá como título executivo judicial, para fins de execução. Todas 
essas considerações apontam apenas para negligência e falta de proporção entre as normas 
criminais e a realidade nacional e, nas condições da arte, até criam a natureza preventiva da 
punição (MARANGONI e OLIVEIRA, 2013). 
Segundo a teoria mista, prevista no Estatuto Repressivo, há uma dupla finalidade da 
pena: prevenção e retribuição. No entanto, uma análise da gravidade das sentenças criminais, 
dos desequilíbrios, das altas taxas de reincidência e da falta de redução de crimes deixa dúvidas 
sobre o objetivo das sanções aplicadas pela justiça criminal. Além de definir um novo 
paradigma de punição abstrata, a nova lei de drogas inseriu novos tipos penais: o financiamento 
do tráfico ou de sua fabricação (art. 36), com pena mínima de 08 anos, e máxima de 20 anos, 
além do pagamento de pelo menos 1.500 a 4.000 (dias-multa). Também foi tipificada a figura 
do informante (art. 37), com penas de reclusão de 02 a 06 anos, e pagamento de 300 a 700 dias-
multa. (MARANGONI e OLIVEIRA, 2013). 
Havia uma expectativa falsa de que a lei sobre drogas seria inovadora porque 
descriminalizava o usuário. Porém, ficou claro que os efeitos eram opostos e a taxa de prisão 
só aumentava a cada ano. Apesar do aumento das multas referentes ao tráfico e outros tipos de 
crimes relacionados, não houve diminuição no tráfico ilegal de drogas no Brasil. 
 
2.9 ANÁLISE SOBRE O HISTÓRICO DO RACISMO NO BRASIL E A RELAÇÃO 
COM AS PRISÕES 
 
O Brasil é um país com uma longa história de escravidão, no qual os negros foram 
trazidos da África por meio de navios, sendo escravizados nas lavouras, comercializados como 
mercadorias e não considerados como merecedores de direitos e obrigações humanas. Mesmo 
após a abolição da escravidão em 1888, o racismo ainda existe na sociedade brasileira. Dados 
 
históricos mostram que, logo após a abolição da escravidão, os funcionários negros ainda eram 
considerados inferiores e, como resultado, eram usados como trabalhadores baratos. 
Mesmo no período pós-abolição, esse processo ainda mostra-se difícil. Com a 
industrialização, o crescimento e a construção de grandes cidades, negros anteriormente 
explorados receberam empregos e melhores condições de vida. Trata-se de um processo 
chamado de macrocefalia urbana. Todavia, o crescimento desordenado das cidades sem 
controle estatal resulta nas precárias condições de vida da cidade e na incapacidade de fornecer 
condições estruturais para atender às necessidades da população, gerando, desde o princípio, 
graves problemas sociais (MINAYO, 2010). 
O fato é que as áreas mais valiosas foram, desde sempre, ocupadas pela elite. Enquanto 
que, nas áreas menos valiosas, faz parte da rotina a falta de recursos básicos para garantir a 
sobrevivência dos seres humanos, como saneamento básico, escolas e hospitais adequados. 
Devido à falta de estrutura e à fraca situação financeira, as casas passaram a ser construídas em 
locais irregulares que foram invadidos em situações incertas ou em encostas onde os mais 
privilegiados não estavam interessados em ocupar, dando origem às grandes periferias e favelas 
(MINZON, DANNER e BARRETO, 2010). 
O Brasil tem uma vasta herança racista e discriminatória. Entre eles, alguns estereótipos 
se aplicam a grupos minoritários como negros, mulheres e homossexuais. Todos esses aspectos 
influenciam o contexto da justiça no Brasil. Assim, a justiça penitenciária mostra-se como uma 
forma de repressão social. Além da privação de liberdade, a prisão significa uma série de 
negações de direitos e situações que aprofundam a vulnerabilidade. Neste sentido, a prisão, 
muitas vezes, significa a morte social de homens e mulheres negros que mal restabeleceram sua 
posição na sociedade (NETO e BORGES, 2013). 
 
2.10 O AUMENTO DA POPULAÇÃO CARCERÁRIA FEMININA 
 
Há no Brasil, 726.712 pessoas privadas de liberdade, englobando presos em carceragens 
nas delegacias e no sistema prisional. Dentre essas, 42.355 são mulheres, enquanto665.482 são 
homens aprisionados. Embora haja uma significativa diferença entre a população carcerária 
feminina e a masculina, o Brasil mostra-se o quarto país mais encarcerado do mundo, depois 
dos Estados Unidos, China e Rússia. Considerando a proporção da população e o número de 
prisões, o Brasil está na terceira posição de prisão. Além disso, no período de 16 anos (2000 e 
2016), a taxa de presos no Brasil aumentou 455% (INFOPEN, 2017). 
Desde a promulgação da nova lei sobre drogas em 2006, a população carcerária feminina 
 
aumentou continuamente. A porcentagem de mulheres nas prisões em 2005 era de 12,9%, 
contra 17,2% no ano seguinte. Essa taxa saltou para 42,4% em 2016. Pesquisas mostram que 
45% dessas mulheres estão presas sem condenação, estando presas em um centro de detenção 
temporário e ainda aguardam a punição absoluta. Trinta e dois por cento foram presos em 
regime fechado, 16% em regime semiaberto, 7% em regime aberto e cerca de 0% foram 
hospitalizados ou tratados ambulatorialmente por segurança (INFOPEN, 2017). 
Outro fato alarmante é que 62% das atribuições de prisão feminina até 2016 consistiam 
em mulheres negras. Por outro lado, 37% são brancos, 1% são indígenas e cerca de 0% são 
amarelos ou outras raças/etnias. Em cada grupo de 100.000 mulheres brancas, 40 mulheres 
brancas foram presas e, no grupo de 100.000 mulheres negras, 62 negras foram privadas de 
liberdade, considerando a população acima de 18 anos (INFOPEN, 2017). 
Considerando a população brasileira, os negros representam 53%, mas no sistema 
prisional, o percentual de negros presos é de 64%. Em relação à escolaridade, 45% não se 
formaram no ensino fundamental. Uma constatação notável é que 62% das mulheres na prisão 
são solteiras, mas 74% têm filhos. Isso significa que a maioria dessas mulheres é mãe solteira 
(INFOPEN, 2017). 
Além disso, observou-se que 62% dos crimes cometidos por mulheres estavam 
relacionados ao narcotráfico em 2016. Por outro lado, 11% cometeram roubo, 9% roubo, 6% 
assassinato, 2% formação de quadrilha, 2% desarmamento, 1% recepção e roubo, 0% violência 
doméstica e outros crimes (INFOPEN, 2017). 
Diante desse cenário, os ramos judicial, legislativo e administrativo parecem não ter 
tomado medidas para mudar essa realidade. Além disso, as prisões encontram-se em condições 
degradantes para qualquer ser humano, não garantindo as condições básicas de sobrevivência 
(NUCCI, 2011). Outro problema nas prisões é a falta de higiene ambiental, e acordo com os 
dados já apontados, o sistema penitenciário sempre foi dominado por homens com necessidades 
básicas diferentes das mulheres. Geralmente, por exemplo, cada prisioneiro recebe dois pacotes 
de papel higiênico por mês, não é suficiente para o sexo feminino (QUEIROZ, 2015). 
 
2.11 O PERFIL DAS MULHERES EM SITUAÇÃO PRISIONAL 
 
Entende-se que baixos níveis de escolaridade provavelmente estejam associados a 
condições socioeconômicas, mesmo quando não for possível afirmar a relação causal entre os 
dois fatores. Em geral, o perfil das mulheres presas é de baixa classe social (financeiramente 
desfavorecida), com baixa escolaridade e solteiras que realizavam atividades profissionais sem 
 
vínculos formais antes de entrar na prisão (SHIMIZU e CACICEDO, 2016). 
De acordo com dados do IBGE de 2018, dos 24,30 milhões de jovens de 15 a 29 anos 
que não concluíram o ensino básico ou superior, 13% eram mulheres que não podiam pagar o 
custo, 27,9% eram mulheres que procuram emprego para sustentar suas famílias. Fato é que a 
realidade vivenciada por essas mulheres e políticas públicas ineficazes as induzem ao mundo 
do crime. 
Os primeiros relatos de crimes femininos referem-se à bruxaria e prostituição, 
comportamento que violava o papel predeterminado para as mulheres pela sociedade da época, 
pois deveriam ser limitadas à extensão do espaço privado da casa. A beleza também sempre 
desempenhou um papel importante na construção do estigma criminal. No caso de crimes 
relacionados à sexualidade, como a prostituição, a beleza era considerada um fator crucial para 
medir o risco de uma mulher. Em outros casos, a aparência era usada para minimizar a situação 
em que uma mulher era perpetradora de um crime (ANDRÉ, 2013). 
Assim, as figuras femininas foram vinculadas por vários conhecimentos e práticas ao 
longo da história, estando ligados à fragilidade, dependência, maternidade e vocações 
familiares, e seu comportamento diverso é inaceitável. Ainda na atualidade nota-se tal aspecto 
na justiça. O direito penal brasileiro apresenta o ideal de uma mulher honesta e a criminalidade 
resultante de um comportamento contrário ao que não se espera que ela pratique (BORGES, 
2018). 
Segundo dados globais, existem 660.000 mulheres carentes no mundo. No Brasil, esse 
número é 37.380. O número de mulheres na prisão está aumentando gradualmente. Houve um 
aumento de cerca de 50% nos últimos 15 anos. Números surpreendentes quando comparados 
ao crescimento masculino. O número de mulheres é de 2 a 9% da população carcerária total do 
mundo. O número mais proeminente foi observado em Hong Kong, China, representando 19% 
desse total. Devido aos altos custos econômicos e sociais da prisão feminina, esse aumento 
espantoso no número de detidas deve levar a estratégias políticas rápidas em todos os países. 
Por outro lado, o uso desse sistema penitenciário não melhora a segurança (NETO e BORGES, 
2013). 
Paralelamente à situação das prisões femininas no mundo, o número crescente de 
populações carcerárias brasileiras dobrou o aumento nas populações carcerárias masculinas, 
mostrando um aumento de 567% no período 2000-2014. Como resultado, ocorre a superlotação 
das prisões. Em termos de perfis sociodemográficos, o Tabela 01 mostra as características das 
mulheres privadas de liberdade (NETO e BORGES, 2013). 
 
 
Tabela 01 – População feminina no Brasil sob privação de liberdade 
Características sociodemográficas Brasil 
Faixa etária 18 a 24 anos - 27% 
Estado Civil Solteira - 57% 
Cor da pele Negra - 68% 
Escolaridade Fund. Inc. - 50% 
Fonte: INFOPEN (2014) – Adaptado pelos autores. 
 
Informações nacionais e estaduais dão conta que o perfil sociodemográfico das mulheres 
presas são jovens, solteiras, negras, com idades entre 18 e 29 anos, com baixa escolaridade. A 
faixa etária observada no cenário nacional é de mulheres jovens com menos de 25 anos. 
Aproximadamente 57% das mulheres presas são solteiras, demonstrando hegemonia nos 
cenários estadual e nacional. Muitas mulheres não incluem relacionamentos informais como 
forma de casamento, mas referem-se a situações formais de casamento. Além desse fator, há o 
abandono de parceiros masculinos ou femininos após a prisão, o que se correlaciona com a 
sociologia da apreciação machista ao passar pela complexidade do afeto feminino (LUDWING, 
2014). 
Baixos níveis de educação são observados dentre as detentas. Em geral, esses dados 
estão associados a baixas condições socioeconômicas e ainda apontam altas taxas de 
criminalidade. No entanto, essas relações devem ser cuidadosamente analisadas. Isso ocorre 
porque é inadequado determinar que todos os indivíduos com baixa escolaridade são propensos 
ao crime, uma vez que existem outros fatores influenciadores que devem ser analisados 
(FERREIRA, 2013). 
É essencial ressaltar que 70% das mulheres privadas de liberdade no Brasil estavam 
desempregadas antes da prisão. Acredita-se que o desemprego contribua para o aumento das 
inserções femininas no mundo do crime. Devido à falta de remuneração das mulheres, estas se 
tornam vulneráveis ao crime. Dado que a maioria das populações carcerárias de mulheres está 
interessada em desenvolver atividades ocupacionais, o declínio no número de mulheres nessa 
prisão é visto como a dificuldade de reunificação social dessas mulheres. Essa falta de 
oportunidade para essas mulheres, após o término da sentença, inviabiliza arepetição social e 
priva a esperança de um futuro melhor, em termos de emprego fora da prisão. 
As informações sobre crimes para mulheres sob privação de liberdade mostram que 
cerca de 80% dos tipos de regime são fechados. Por outro lado, a tipologia do crime mostra que 
o narcotráfico é mais comumente abordado com uma cifra de 77% em todos os cenários 
analisados. Em relação ao total de prisões anuais condenadas a presos, pode-se observar que a 
maioria de 61% ainda não foi julgada (GRECO, 2014). 
 
Em relação aos tipos de crimes cometidos, 68% dos crimes cometidos por mulheres 
domésticas carentes são tráfico de drogas. Vale ressaltar que muitas dessas mulheres trabalham 
no tráfico, principalmente como coadjuvantes e, muitas vezes, sob a influência de seus parceiros 
já envolvidos no tráfico, sendo quase abandonadas por esses parceiros emocionais depois de 
serem presas. 
 
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
Historicamente, mulheres e homens não se envolveram igualmente em atividades 
ilegais; portanto, uma análise dos meandros que envolvem o mundo do crime revela o impacto 
das estruturas culturais associadas a mulheres e homens. O crime está sempre fortemente 
associado aos homens. Isso se deve em grande parte ao trabalho de violência e crimes 
masculinos, bem como ao resultado de trabalhos discursivos que aprimoram as habilidades dos 
homens relacionadas a essas práticas e características. 
No entanto, essa realidade está em um período de transição, devido à crescente 
incidência de mulheres envolvidas na prática de atividades ilegais e violência na sociedade 
moderna. Todavia, a Lei de drogas não considera os aspectos sociais em que as mulheres 
criminosas estão submetidas. Aplicar a Lei vai além de punir sujeitos que são vítimas de sua 
própria realidade. É necessário repensar a avaliação punitiva da justiça quando se trata de 
mulheres que cometeram crimes, principalmente, os relacionados às drogas. 
Por fim, é necessário repensar o modelo criminal, especialmente em relação ao 
narcotráfico, focando nas mulheres presas em situação de vulnerabilidade e que apresentam 
necessidades especiais. Uma vez que as penitenciárias não consideram as especificidades das 
mulheres e não garantem as condições básicas de sobrevivência com dignidade, nem mesmo, 
permitem a possibilidade de reintegração após o cumprimento da pena. 
 
 
 
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