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Manifestacoes_Barrocas_e_Arcadis_na_Literatura_Brasileira_20183_LET_SEC

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LETRAS (PORT)
MANIFESTAÇÕES BARROCAS E 
ARCADISMO NA LITERATURA 
BRASILEIRA
Djalma Rebelatto de Gouveia
MANIFESTAÇÕES BARROCAS E ARCADISMO NA LITERATURA 
BRASILEIRA 
 
Apresentação 
Caro Aluno 
 
 Vamos enveredar pelos caminhos do Barroco e do Arcadismo, dois 
importantes movimentos literários brasileiros, antes, porém, abordamos a 
literatura colonial, considerada prolongamento da literatura portuguesa. 
 Se o barroco sintetiza a mentalidade medieval e a renascentista, cujo 
reflexo na produção literária evidencia angústia e oposição entre mundo material 
e espiritual; o arcadismo caracteriza-se pelo objetivismo e razão, abordando 
temáticas da vida simples e bucólica. 
 Em nossos estudos, vamos verificar que essa não é a única diferença entre 
esses dois movimentos, pois em termos de uso de linguagem há uma dualidade, 
ou seja, no barroco, evidencia-se o emprego exagerado de metáforas, hipérboles, 
antítese; no arcadismo observamos uma linguagem mais simples. 
 
Professor Djalma Rebelato 
 
 
 
PLANO DE ENSINO 
MANIFESTAÇÕES BARROCAS E ARCADISMO NA LITERATURA BRASILEIRA 
 
Ementa: Contexto sociocultural e histórico da produção literária da América 
portuguesa (séculos XVI a XVIII). Autores, obras e questões relevantes para a 
compreensão da cultura letrada no período. Análise das principais características 
estilísticas dos textos selecionados. Situação da produção literária da América 
portuguesa, no quadro internacional. 
 
Objetivos 
Prover o aluno de um referencial teórico-estrutural que lhe permita identificar as 
principais manifestações artísticas e literárias do Brasil colonial e suas variações 
significativas ao longo da história. 
Desenvolver a capacidade analítica e crítica do aluno diante da obra literária, 
levando-se em conta também outros tipos de linguagem. 
Levar o aluno a compreender os fatos, a estrutura e o discurso literários, sob uma 
ótica que privilegia a história do seu desenvolvimento, expressa em textos 
literários selecionados 
 
Programa da Disciplina 
A Literatura de Informação e Catequética: Carta de Pero Vaz de Caminha, a obra 
de Anchieta. 
Barroco: contexto europeu e brasileiro; características; cultimo e conceptismo. 
O Barroco tardio na arquitetura, manifestações barrocas. 
A Lírica de Gregório de Matos Guerra, análise de poemas. 
Padre Antônio Vieira – análise do Sermão pelo Bom Sucesso das Armas de 
Portugal contra as de Holanda. 
Arcadismo ou Neoclassicismo: contexto europeu e brasileiro; características. 
Inconfidência Mineira e Arcadismo. 
A obra de Tomás Antônio Gonzaga: Marília de Dirceu e Cartas Chilenas. 
Cláudio Manoel da Costa. 
Os Épicos Árcades: Basílio da Gama, O Uraguai; Santa Rita Durão, Caramuru. 
Pré-Romantismo. 
 
Metodologia 
Adotamos para a disciplina Manifestações Barrocas e Arcadismo no Brasil Colonial 
uma metodologia que alia a teoria à prática, propiciada por meio de atividades 
que permitam, a partir de exemplos, a reflexão sobre as manifestações literárias 
do período citado. 
 
Avaliação 
No sistema EAD, a legislação determina que haja avaliação presencial, sem, 
entretanto, se caracterizar como a única forma possível e recomendada. Na 
avaliação presencial, todos os alunos estão na mesma condição, em horário e 
espaço pré-determinados, diferentemente, a avaliação a distância permite que o 
aluno realize as atividades avaliativas no seu tempo, respeitando-se, obviamente, 
a necessidade de estabelecimento de prazos. 
A avaliação terá caráter processual e, portanto, contínuo, sendo os seguintes 
instrumentos utilizados para a verificação da aprendizagem: 
1) Trabalhos individuais ou a partir da interatividade com seus pares; 
2) Provas bimestrais realizadas presencialmente; 
3) Trabalhos de pesquisa. 
 
As estratégias de recuperação incluirão: 
1) Retomada eventual dos conteúdos abordados nas unidades, quando não 
satisfatoriamente dominados pelo aluno; 
2) Elaboração de trabalhos com o objetivo de auxiliar a vivência dos 
conteúdos. 
Bibliografia Básica 
 
BOSI, A. História concisa da literatura brasileira. 44.ed. São Paulo: Cultrix, 2007. 
CANDIDO, A. Na sala de aula: caderno de análise literária. São Paulo: Ática, 1989. 
CANDIDO, A. Formação da literatura brasileira: momentos decisivos. 7.ed. Belo 
Horizonte e Rio de Janeiro: Itatiaia, 1993. 2 v. 
CANDIDO, A. Literatura e sociedade: estudos de teoria e história literária. 8.ed. 
São Paulo: T.A. Queiroz, 2002. 
CANDIDO, A. Vários escritos. 4.ed. São Paulo e Rio de Janeiro: Duas Cidades e 
Ouro sobre Azul, 2004. 
MOISÉS, M. A literatura brasileira através dos textos. São Paulo: Cultrix, 1986. 
 
Bibliografia Complementar 
 
BOSI, A. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. 
CANDIDO, A.; CASTELLO, J. A. Presença da literatura brasileira: das origens ao 
romantismo. São Paulo: DIFEL, 1974. 
DURÃO, S. R. Caramuru: poema épico do descobrimento da Bahia. São Paulo: 
Martins Fontes, 2000. 
GAMA, B. da. O Uraguai. 3.ed. Rio de Janeiro: Record, 1999. 
GONZAGA, T. A. Marília de Dirceu. 27.ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1998. 
MERQUIOR, J. G. De Anchieta a Euclides: breve história da literatura brasileira. Rio 
de Janeiro: J. Olympio, 1977. 
MOISÉS, M. História da literatura brasileira: das origens ao romantismo. São Paulo: 
Cultrix, 2009. 
OLIVIERI, A. C.; VILLA, M. A. (Org.). Cronistas do descobrimento. 3.ed. São Paulo: 
Ática, 2002. 
PICCHIO, L. S. História da literatura brasileira. Rio de Janeiro: Aguilar, 1997. 
 
UNIDADE 1 - INTRODUÇÃO E ORIGENS DA LITERATURA BRASILEIRA 
 
CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE 
 
Objetivos: Propiciar conhecimentos sobre a literatura produzida no período 
colonial brasileiro. 
Nesta unidade, discutiremos a questão de a literatura colonial brasileira não 
ser propriamente brasileira e sim prolongamento da literatura portuguesa. 
 Além disso, estudaremos as origens da literatura colonial, no período 
quinhentista, enfocando as duas mais representativas vozes da época: Pero Vaz 
de Caminha e o Padre José de Anchieta. 
 
ESTUDANDO E REFLETINDO 
 
O Brasil e toda a América inserem-se na tradição cultural artística ocidental. 
Dessa forma, quando a América e o Brasil foram descobertos, o acervo cultural 
ocidental já contava milhares de anos. 
Do século VIII a.C ao século V d.C, deu-se a Antiguidade Clássica 
antropocêntrica devido à expansão do Império Romano e ao apogeu da cultura 
grega. Foi um período de crença pagã, a mitologia greco-romana, tendo como 
maiores representantes o grego Homero, autor dos épicos Ilíada e Odisseia, além 
do latino Virgílio, autor da epopeia Eneida. 
Com o fim do Império romano, no século V d.C, foram se formando, 
gradativamente, os reinos, línguas e literaturas europeias. Trata-se do período da 
Idade Média, que consolidou a Igreja Católica, a qual impôs o teocentrismo à 
Europa. A forma de expressão literária típica dessa época foi a medida velha 
medieval, o emprego das redondilhas menor (versos de cinco sílabas) e maior 
(versos de sete sílabas), uma métrica popular e de fácil assimilação. 
A literatura medieval compreende dois estilos literários: o Trovadorismo 
das cantigas líricas e satíricas (séculos XII ao XIV), e o Humanismo (século XV), 
uma fase de transição para o Renascimento ou Classicismo, tendo, em Portugal, 
Gil Vicente e seu teatro, como grande representante. 
No século XVI, também denominado Quinhentismo, as navegações e os 
descobrimentos, fizeram renascer o antropocentrismo típico da Antiguidade 
Clássica. Surge o período do Renascimento ou Classicismo, que propagou o 
paganismo estético, o equilíbrio e o processo racional da criação literária por meio 
da medida nova clássica, os versos decassílabos empregados em sonetos, no 
gênero lírico. O grande nome do Classicismo português foi Luís Vaz de Camões, 
autor de poemas líricos e da grande epopeia Os Lusíadas. 
Portanto, se as navegações e os descobrimentos são o contextodeste 
período, foi durante o Renascimento ou Classicismo que a atividade cultural e 
literária começou a se desenvolver na América e, consequentemente, no Brasil. 
No entanto, durante os séculos XVI (Quinhentismo, Renascimento ou 
Classicismo), XVII (Seiscentismo ou Barroco) e XVIII (Setecentismo, Arcadismo ou 
Neoclassicismo), o Brasil era colônia de Portugal. Disso decorre um 
questionamento que tem gerado muita polêmica entre os críticos e historiadores 
literários: a produção literária colonial é literatura brasileira, já que o Brasil nem 
mesmo era um país independente? 
Optaremos pela posição de que a literatura colonial, embora seja de 
grande importância como fase de preparação para uma literatura nacional, não é 
propriamente brasileira. Você deve estar se perguntando, por quê? 
Embasaremos nossas respostas, principalmente, no posicionamento do 
crítico Antônio Cândido, cuja obra Literatura e Sociedade fica como sugestão de 
aprofundamento deste assunto. Mas vamos às argumentações. A literatura 
colonial não é propriamente brasileira pelos seguintes motivos: 
 O Brasil- Colônia era constituído de “ilhas sociais”, pequenas cidades e 
vilarejos isolados pela extensa costa litorânea brasileira ou próximos ao 
litoral, o que dificultava a recepção das obras e a formação de uma 
identidade nacional, a qual até hoje é questionada, apesar da unidade 
linguística e territorial; 
 O escritor ou era português ou descendente de portugueses que 
estudavam na Metrópole, ou seja, Portugal e, quando retornavam, traziam 
para cá uma extensão da cultura portuguesa ou europeia, o que também 
dificultava a formação de uma identidade nacional; 
 O escritor não tinha uma função social, já que as formas de recepção da 
obra eram escassas. No Quinhentismo, primeiro século da colonização, 
havia textos que informavam a Metrópole sobre a terra descoberta e obras 
que visavam à catequese do índio. Os autores eram todos portugueses e o 
Brasil era apenas assunto dos textos. O nativismo, valorização da terra, 
tinha a finalidade de atrair colonos, isto é, propagava a dominação 
portuguesa e não a identidade nacional. 
No século XVII, período do Barroco, o púlpito das igrejas foi a forma mais 
utilizada de veiculação das ideias, inclusive dos sermões do Padre Vieira. Gregório 
de Matos teve sua obra difundida dispersa por Salvador ou cantada em tavernas 
para um pequeno público. 
No início do século XVIII, antes da consolidação do Neoclassicismo, houve 
as Academias dos Esquecidos e a dos Renascidos (Bahia), a dos Felizes e a dos 
Seletos (Rio de Janeiro), nas quais escritores medíocres eram autores e ouvintes 
de suas próprias obras. 
Em meados do século XVIII, consolidou-se o Arcadismo ou Neoclassicismo 
no Brasil, mais precisamente em Minas Gerais, onde poetas, ao lado de Tiradentes, 
em vão se rebelaram contra a Metrópole, na conhecida Inconfidência Mineira, 
buscando a independência de Minas e não propriamente de todo o território 
nacional. Nesta época, coube ao escritor mineiro Silva Alvarenga, estabelecido no 
Rio de Janeiro na sua adolescência, ser o criador da Sociedade Literária, que afinal 
começou a dar um papel social para o escritor, formando um grupo de 
intelectuais que iriam consolidar a independência do Brasil. 
Sendo assim, em 1822, quando Dom Pedro I dá o grito da independência, 
começa a delinear-se a função social do escritor, o qual, em pleno Romantismo, 
utiliza a obra literária como início da consolidação da nossa independência 
cultural e literária em relação à Metrópole e à Europa. Dessa forma, a literatura 
brasileira inicia propriamente no Romantismo, em meados do XIX, embora até 
hoje busquemos nossa identidade nacional. 
A questão da formação do nativismo, durante o período colonial, será 
estudado ao longo desta disciplina. No entanto, antes, é importante frisar que as 
questões cronológicas, ou seja, datas, que dão início e fim e a cada movimento, 
são apenas didáticas, pois cada movimento artístico vai se formando lenta e 
gradativamente. Contudo, apenas para fins didáticos, costuma-se dividir a 
literatura colonial da seguinte forma: 
 
Era Colonial (DE 1500 A 1808) 
Quinhentismo- início em 1500, com a Carta de Achamento do Brasil de Pero Vaz 
de Caminha; 
 
Barroco ou Seiscentismo– início em 1601, com o poema épico Prosopopeia de 
Bento Teixeira; 
 
Arcadismo ou Setecentismo– início em 1768, com a publicação de Obras Poéticas 
de Cláudio Manuel da Costa e da fundação da Arcádia Ultramarina; 
 
Período de Transição (de 1808 a 1836) 
Envolve a vinda da família real portuguesa para o Brasil, em 1808; a 
independência política, em 1822; e o início do Romantismo, em 1836. Era Nacional 
(de 1836 até os nossos dias) 
Origens - Quinhentismo 
O primeiro século de nossa colonização constitui o ciclo do pau-brasil, 
planta nativa que não exigia cultivo e, por isso, o trabalho de extração era feito 
principalmente pelo índio por meio do escambo, ou seja, o trabalho em troca de 
objetos baratos que encantavam o nativo. 
Não havia ainda, portanto, a necessidade de escravizar o indígena e nem a 
presença de escravos negros. Dessa forma, as três raças formadoras da 
miscigenada população brasileira não estavam presentes na terra. 
O território estava escassamente sendo ocupado apenas na faixa litorânea 
ou próxima a ela, por meio de povoados e pequenas cidades, quase que 
totalmente sem contato entre si. 
É nesse contexto que se darão as origens de nossa literatura colonial, 
basicamente constituída de textos informativos e catequéticos, produzidos por 
autores portugueses, sendo O Brasil apenas o assunto. 
 
A Literatura de Informação 
Trata-se de textos, escritos por cronistas, visando a informar a Metrópole 
sobre a terra descoberta, além de atrair colonos. Não existe, portanto, uma 
intenção artística. 
Os principais cronistas foram Pero Vaz de Caminha, Pero de Magalhães 
Gândavo, Gabriel Soares de Sousa e Ambrósio Fernandes Brandão. Também 
houve cronistas não lusitanos que aqui estiveram e descreveram a terra: Hans 
Staden e Jean de Lery. 
Centraremos nosso estudo no primeiro texto escrito em terras brasileiras: a 
Carta de Pero Vaz de Caminha. 
 
Carta de Achamento do Brasil – Pero Vaz de Caminha 
Foi escrita em 1500, com a chegada da esquadra de Cabral. Predomina no 
texto a função informativa da linguagem, caracterizada pela clareza e 
houvemos vista: pudemos ver, chã: plana, praia-
palma: segundo o historiador português J. 
Cortesão, pode significar "toda praia, como a 
palma, muito chã e muito formosa",Entre Douro 
e Minho: nome de uma região de Portugal. 
preocupação com a verdade na descrição da fauna, flora, clima, potencial 
econômico e habitantes da terra. No entanto, a originalidade e o encantamento 
do cronista diante das novidades fazem, várias vezes, aflorar no texto também as 
funções poética e emotiva da linguagem. Esses aspectos quebram a frieza do 
texto informativo, o que veio a despertar o interesse dos europeus da época e dos 
leitores de hoje não só na carta de Caminha, mas também nas crônicas de viagens 
marítimas de outros autores. 
A função poética é verificada no trocadilho ou jogo de palavras, além de 
termos no sentido figurado ou conotativo. Já a função emotiva vem à tona, 
principalmente, pela adjetivação abundante. Estudaremos fragmentos da carta a 
partir de dois temas mais relevantes: a visão da terra e do índio. 
 
A Visão da Terra 
 “Esta terra, Senhor, me parece que da ponta que mais contra o sul vimos até 
outra ponta que contra o norte vem, de que nós deste porto houvemos vista, será 
tamanha que haverá nela bem vinte ou vinte cinco léguas por costa.(...) De ponta 
a ponta, é tudo praia-palma, 
muito chã e muito 
formosa.(...) 
Nela, até agora, não 
pudemos saber que haja 
ouro, nem prata, nem coisa 
alguma de metal ou ferro; nem lho vimos. Porém a terra em si é de muito bons 
ares, assim frios e temperados,como os de Entre-Douro e Minho5, porque neste 
tempo de agora os achávamos como os de lá. 
Águas são muitas; infindas. E em tal maneira é graciosa que, querendo-a 
aproveitar, dar-se-á nela tudo, por bem das águas que tem. Porém o melhor 
fruto, que dela se pode tirar me parece que será salvar esta gente. E esta deve ser 
a principal semente que Vossa Alteza em ela deve lançar.” 
No primeiro período do excerto, observa-se a função informativa do texto, 
preocupada com a exatidão do relato, ao fornecer coordenadas geográficas e 
léguas 
No período seguinte, a frieza do caráter informativo começa a ser 
quebrada pela adjetivação e pelo advérbio de intensidade, fazendo emergir a 
função emotiva: “muito chã e muito formosa”. 
O segundo parágrafo explicita o interesse na exploração econômica da 
terra, com a intenção de encontrar metais preciosos ou minérios. Embora a busca 
de minerais tenha sido até então frustrada, o cronista ressalta as condições 
favoráveis á agricultura, salientando o bom clima e a abundância de água, o que 
culmina na afirmação: “e em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, 
dar-se-á nela tudo, por bem das águas que tem”. Esta informação de Caminha 
gerou a famosa frase usada até hoje por nós, brasileiros, sobre nosso potencial 
agrícola: “tudo o que se planta dá”. 
No entanto, ao exceder sobre a intenção de exploração econômica, 
Caminha logo se corrige, dizendo que a mais importante intenção da Metrópole é 
a dilatação da fé cristã. Será? Reflita sobre isso, caro aluno. 
É importante frisar que, ao referir-se à expansão do cristianismo, Caminha 
faz uso da conotação nos vocábulos “fruto” e “semente”, no sentido não agrícola 
mas de conversão do índio ao cristianismo. 
A Visão do Índio 
 
A Celebração da Primeira Missa 
E hoje que é sexta-feira, primeiro dia de maio, pela manhã, saímos em terra com 
nossa bandeira; e fomos desembarcar acima do rio, contra o sul onde nos 
pareceu que seria melhor arvorar a cruz, para melhor ser vista. E ali marcou o 
Capitão o sítio onde haviam de fazer a cova para a fincar. E enquanto a iam 
abrindo, ele com todos nós outros fomos pela cruz, rio abaixo onde ela estava. E 
com os religiosos e sacerdotes que cantavam, à frente, fomos trazendo-a dali, a 
modo de procissão. Eram já aí quantidade deles, uns setenta ou oitenta; e quando 
nos assim viram chegar, alguns se foram meter debaixo dela, ajudar-nos. 
Passamos o rio, ao longo da praia; e fomos colocá-la onde havia de ficar, que será 
obra de dois tiros de besta do rio. Andando-se ali nisto, viriam bem cento 
cinqüenta, ou mais. 
Plantada a cruz, com as armas e a divisa de Vossa Alteza, que primeiro lhe haviam 
pregado, armaram altar ao pé dela. Ali disse missa o padre frei Henrique, a qual 
foi cantada e oficiada por esses já ditos. Ali estiveram conosco, a ela, perto de 
cinqüenta ou sessenta deles, assentados todos de joelho assim como nós. E 
quando se veio ao Evangelho, que nos erguemos todos em pé, com as mãos 
levantadas, eles se levantaram conosco, e alçaram as mãos, estando assim até se 
chegar ao fim; e então tornaram-se a assentar, como nós. E quando levantaram a 
Deus, que nos pusemos de joelhos, eles se puseram assim como nós estávamos, 
com as mãos levantadas, e em tal maneira sossegados que certifico a Vossa Alteza 
que nos fez muita devoção.(...) 
E segundo o que a mim e a todos pareceu, esta gente, não lhes falece 
outra coisa para ser toda cristã, do que entenderem-nos, porque assim tomavam 
aquilo que nos viam fazer como nós mesmos; por onde pareceu a todos que 
nenhuma idolatria nem adoração têm. E bem creio que, se Vossa Alteza aqui 
mandar quem entre eles mais devagar ande, que todos serão tornados e 
convertidos ao desejo de Vossa Alteza. E por isso, se alguém vier, não deixe logo 
de vir clérigo para os batizar; porque já então terão mais conhecimentos de nossa 
fé, pelos dois degredados que aqui entre eles ficam, os quais hoje também 
comungaram.(...) 
Observe, ao narrar a celebração da primeira missa, a ingenuidade do índio, 
encantado com o ritual católico, imitando todos os gestos dos portugueses, sem 
questionar a nova crença, sem perceber o processo de aculturação que começaria 
a sofrer e que o levaria à escravidão. É o que fica sugerido na fala de Caminha: “E 
bem creio que, se Vossa Alteza aqui mandar quem entre eles mais devagar ande, 
que todos serão tornados e convertidos ao desejo de Vossa Alteza”. 
 
A Literatura Catequética 
Padre José de Anchieta 
 
 
1534 - 1597 
alexandreolsson.blogspot.com 
 
Trata-se de textos, visando à catequese do índio e à pregação cristão para 
os colonos. Seus representantes são os padres Manuel da Nóbrega e José de 
Anchieta, fundadores da cidade de São Paulo. 
Destaca-se a poesia e o teatro de Anchieta, de maior valor literário. Devido 
à essência doutrinária cristã da catequese, sua poesia apresenta conteúdo 
teocêntrico e, no plano da forma, a medida velha medieval, as redondilhas, de 
fácil memorização pelos colonos e índios. Portanto, em pleno Renascimento 
antropocêntrico e da medida clássica (versos decassílabos), sua obra se mantém 
medieval nos planos da forma e do conteúdo. Observe esses aspectos no excerto 
do poema A Santa Inês: 
 
“Cordeirinha santa, 
 De Jesus querida, 
 Vossa santa vida 
 O Diabo espanta. 
 Por isso vos canta 
 Com prazer o povo, 
 Porque vossa vinda 
 Lhe dá lume novo. 
 
Seu teatro também revela o maniqueísmo teocêntrico medieval, pois os 
deuses indígenas representam o mal e o universo cristão, o bem. Verifique esse 
aspecto no Auto de São Lourenço em que o diabo, alegoria do mal, tem o nome 
indígena e São Lourenço, com os padres, alegorizam o bem: 
 
“Guaixará: _ Quem é forte como eu? 
 Como eu, conceituado? 
 Sou diabo bem assado. 
 A fama me precedeu; 
 Guaixará sou chamado.(...) 
 
São Lourenço: _ Mas existe a confissão, 
bem remédio para a cura. 
Na comunhão se depura 
da mais funda perdição 
a alma que o bem procura. 
Se depois de arrependidos 
os índios vão confessar 
dizendo: "Quero trilhar 
o caminho dos remidos". 
- o padre os vai abençoar.” 
O modernista Oswald de Andrade, em seu Manifesto Antropófago, viu, na 
obra de Anchieta, uma forma de aculturar o índio: 
 
“Contra Anchieta cantando as onze mil virgens do céu, na 
terra de Iracema, - o patriarca João Ramalho fundador de 
São Paulo.” 
 
Oswald ironiza Anchieta, ao dizer que este idolatra a Virgem Maria, em 
suas inúmeras denominações no catolicismo, em plena terra da virgem índia 
Iracema, personagem do romântico José de Alencar. 
A protagonista de Alencar deixou-se seduzir pelo português Martim, 
alegoria da civilização europeia, com ele teve um filho e morreu. 
O modernista sugere que o destino de Iracema foi o mesmo do índio 
aculturado por Anchieta: a morte de sua cultura e de sua identidade. 
A crítica torna-se mais forte ao comparar Anchieta a João Ramalho, 
português que se casou com a índia Bartira, com a qual teve inúmeros filhos, mas, 
mesmo assim, escravizou índios. 
 
BUSCANDO CONHECIMENTO 
 
A carta de Caminha e dos demais cronistas serviu de fonte para os 
românticos do século XIX e modernistas do século XX. 
Com a independência do Brasil, no século XIX, os românticos utilizaram a 
literatura de informação como fonte de pesquisa, visando ao nacionalismo 
ufanista, ou seja, à idealização da terra e do índio. 
Já os modernistas do século XX resgataram as crônicas de viagem como 
forma de criticar o processo de colonização, sob o viés do diálogo intertextual 
satírico. 
Observe os textos abaixo e pesquise mais textos destes períodos que 
retratam a colonização e o índio: 
 
 I – JUCA PIRAMA 
 
“Meu canto de morte, 
Guerreiros, ouvi: 
Sou filho das selvas, 
Nas selvas cresci; 
Guerreiros, descendo 
Da tribo Tupi. 
 
Da tribo pujante, 
Que agora anda errante 
Por fado inconstante, 
Guerreiros, nasci; 
Sou bravo,sou forte, 
Sou filho do Norte; 
Meu canto de morte, 
Guerreiros, ouvi.” 
(Gonçalves Dias- poeta romântico) 
 
A CARTA DE PERO VAZ 
A terra é mui graciosa, 
Tão fértil eu nunca vi. 
A gente vai passear, 
No chão espeta um caniço, 
No dia seguinte nasce 
 
Bengala de castão de oiro. 
Tem goiabas, melancias, 
Bananas que nem chuchu. 
Quanto aos bichos, têm-nos muitos, 
De plumagens mui vistosas. 
Tem macaco até demais 
Diamantes tem à vontade 
Esmeraldas é para os trouxas. 
( Murilo Mendes, poeta modernista ) 
 
 
 
UNIDADE 2 - BARROCO - CONTEXTO E CARACTERÍSTICAS 
 
CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE 
 
Objetivos: Contextualizar o momento histórico do Barroco; 
Explicitar as características do movimento. 
Nesta unidade, efetuamos o estudo do contexto histórico europeu que 
desencadeou o estilo barroco e as principais características deste estilo de época, 
ressaltando os recursos estilísticos. 
 
ESTUDANDO E REFLETINDO 
 
Século XVII 
Contexto Histórico Europeu 
 
Embora o Barroco seja a arte do século XVII, suas causas históricas 
começam a delinear-se no século XVI, com o surgimento da Reforma Protestante, 
gerada por católicos excomungados pelo Papa. Esses católicos que criaram o 
Protestantismo foram Martinho Lutero e João Calvino que definiram os seguintes 
preceitos que se opunham à Igreja católica da época: 
a) oposição à venda de indulgências, por entenderem que a salvação da alma só 
se dá pelas boas ações espirituais; 
b) interpretação individual da Bíblia, sem a intervenção do Papa; 
c) visão do lucro material como um benefício divino e não um pecado, o que 
atraiu grande parte da burguesia. 
 
Por estar perdendo muitos fiéis, a Igreja Católica empreendeu uma reação 
denominada Contrarreforma, que se definiu no famoso Concílio de Trento, 
realizado na cidade italiana de mesmo nome. O objetivo do Concílio era conter a 
expansão do protestantismo e do antropocentrismo clássico. As principais 
decisões tomadas no concílio foram: 
a) censura a livros e autores considerados heréticos; 
b) reaparecimento, com força total, do Tribunal do Santo Ofício ou Santa 
Inquisição que tinha o poder de prender os hereges, confiscar os seus bens e até 
mesmo condená-los à morte na fogueira; 
c) criação da Companhia de Jesus, cujos membros eram os jesuítas, visando 
expandir o catolicismo de tendência medieval às terras recém-descobertas. 
d) determinação da lição tridentina, baseada na Bíblia, visando conter o 
antropocentrismo clássico. A lição tridentina consistia na seguinte máxima bíblica: 
“O homem veio do pó e para o pó voltará”; ou seja, a Igreja desejava demonstrar 
a insignificância do homem diante de Deus. Veja a influência da lição tridentina 
num fragmento da poesia lírico-sacra do poeta barroco brasileiro Gregório de 
Matos Guerra: 
 
“Que és terra Homem, e em terra hás de tornar-te, 
Te lembra hoje Deus por sua Igreja, 
De pó te faz espelho, em que se veja 
A vil matéria, de que quis formar-te.” 
 
Consequências do contexto histórico nas artes 
É evidente que o Concílio de Trento e a Contrarreforma vão influenciar o 
homem do século XVII, principalmente em países muito enraizados no 
catolicismo, como Itália, Espanha, Portugal e suas colônias, especificamente o 
Brasil, já que o homem do século XVII desejava continuar suas grandes conquistas 
mercantilistas, materialistas, embora a Igreja o forçasse a voltar-se para os valores 
espirituais, medievais e teocêntricos. 
Isso fará surgir um artista em conflito, desequilibrado, ora preso aos valores 
mundanos (antropocêntricos), ora temente a Deus (atitude teocêntrica). Todo esse 
conflito e desequilíbrio gerará uma arte rebuscada, hermética que se denomina 
Barroco, nome originado de uma “pérola de formato irregular”; e, em italiano, 
significa “acumulação”. Como vimos, a arte deste período é irregular e rebuscada. 
 
Principais Características Barrocas 
1) Fusionismo (Bifrontismo ou Dualismo): tentativa de conciliação do teocentrismo 
medieval e do antropocentrismo clássico, fazendo aflorar, no texto, ideias 
antagônicas: céu x terra; homem x Deus, pecado x perdão, carne (flor) x espírito 
(Anjo), efêmero (flor) x eterno (Anjo). O fusionismo contaminará o texto literário 
de antíteses e paradoxos ou oxímoros; 
 
2) Pessimismo, Desequilíbrio, Conflito: a lição tridentina levará o artista à 
consciência da efemeridade das coisas boas da vida e, consequentemente, à 
valorização do carpe diem: 
 
“Goza, goza da flor da mocidade, 
Que o tempo trota a toda ligeireza, 
E imprime em toda a flor sua pisada. 
 
Oh, não aguardes, que a madura idade 
Te converta em flor, essa beleza 
Em terra, em cinza, em pó, em sobra, em nada.” 
 (Gregório de Matos Guerra) 
 
3) Intensidade e Feísmo: referência aos aspectos cruéis e dolorosos; desejo de 
exprimir intensamente o sentido da existência, expressa no abuso da hipérbole, na 
exacerbação das paixões e sentimentos. 
 
4) Rebuscamento Linguístico: assimilado da pintura, escultura e arquitetura, o 
rebuscamento se verifica no excesso de figuras de linguagem: metáfora, 
metonímia, antítese, paradoxo ou oxímoro, hipérbole, hipérbato, anáfora, 
gradação, quiasmo,etc. Também se difunde a técnica da disseminação e recolha, 
em que as palavras são disseminadas pela estrofe para serem recolhidas num só 
verso. Na poesia, a medida nova clássica (decassílabos em soneto) continua sendo 
a principal forma de expressão. 
Vamos, portanto, revisar as principais figuras de linguagem que compõem 
o tecido literário do texto barroco. 
 
Figuras de Palavras ou Tropos e o Estilo Barroco 
 
As figuras de palavras consistem no emprego de um termo em um sentido 
diferente daquele em que esse termo é convencionalmente em pregado. No estilo 
barroco, as mais empregadas são: metáfora, sinestesia, metonímia ou sinédoque. 
 
Metáfora 
Metáfora é a figura de palavra em que um termo substitui outro em vista 
de uma relação de semelhança ou similaridade entre os elementos que esses 
termos designam. Essa similaridade é resultado da imaginação, da subjetividade 
de quem cria a metáfora, pois envolve elementos de universos diferentes. A 
metáfora também pode ser entendida como uma comparação abreviada, em que 
o conectivo comparativo e até mesmo a qualidade comum não estão expressos, 
mas subentendidos. Observe: 
 
Minha amada é tão bela quanto aquela garota. (comparação simples) 
Minha amada é bela como uma flor. (comparação metafórica ou símile) 
Minha amada é uma flor. (metáfora) 
 
Do ponto de vista lógico, a amada é uma pessoa e a flor é uma planta. Mas 
do ponto de vista da linguagem, o que ocorreu foi a atribuição de determinadas 
características do elemento B (flor) ao elemento A (amada). De todas as 
qualidades da flor, destacamos apenas aquelas que consideramos semelhantes às 
qualidades da amada. 
 
No estilo barroco são comuns as seguintes metáforas: 
 
a) Anjo – mulher inacessível, pura, platonizada; 
b) Flor (rosa, planta) – erotismo, prazeres terrenos porém efêmeros; 
c) Marfim – dentes; 
d) Sóis – olhos 
e) incêndio, fogo, ardor – paixão, erotismo; 
f) mar, água, neve – distanciamento 
 
Também verbos têm valor metafórico como em: 
 
“Neste lance, por ser o derradeiro, 
Pois vejo a minha vida anoitecer, 
É, meu Jesus, a hora de se ver 
A brandura de um Pai, manso Cordeiro.” 
 (Gregório de Matos) 
 
A forma verbal “anoitecer” tem valor metafórico, pois subentende morte. 
Vale ressaltar que as metáforas bíblicas, como “manso cordeiro” (Jesus), são muito 
comuns no Barroco. 
 
 
 
Metonímia 
Substituição de uma palavra por outra mantendo uma relação de 
contiguidade (proximidade), sendo, portanto, mais objetiva que a metáfora. 
 
“Meu Deus, que estais pendente em um madeiro” 
 (Gregório de Matos) 
 
Pelo contexto, “madeiro” significa a cruz. Trata-se de uma metonímia, pois 
a cruz é feita de madeira; portanto, a relação entre cruze madeiro é de 
proximidade. 
 
“A vós correndo vou, braços sagrados,” 
Nessa cruz sacrossanta descobertos” 
(Gregório de Matos) 
 
Neste contexto, o eu lírico emprega a parte “braços” pelo todo “Cristo”. 
Alguns autores denominam sinédoque a metonímia que implica a parte pelo 
todo. 
 
“A serpe, que adornando várias cores, 
com passos mais oblíquos, que serenos, 
 entre belos jardins, prados amenos, 
é maio errante de torcidas flores;” 
(Manuel Botelho de Oliveira) 
 
No poema barroco acima, a “serpe” (serpente) é metáfora da primavera, 
que, na Europa, inicia em maio. Logo, “maio” é metonímia ou sinédoque, pois 
apenas um dos meses que compõem a primavera (a parte pelo todo). 
O poeta quer dizer que a primavera (maio) é como uma colorida serpente 
que rapidamente vai enchendo de cores os campos e jardins. 
 
BUSCANDO CONHECIMENTO 
 
Procure pesquisar as características barrocas em outras modalidades 
artísticas como a arquitetura, a pintura e a escultura. Veja abaixo exemplos na 
pintura e escultura. 
Observe, na pintura do espanhol El Grego, além do excesso de detalhes, a 
fusão dos planos terreno (morte) e celestial: 
 
 
O Enterro do Conde de Orgaz – El Greco 
pt.wikipedia.org/.../O_Enterro_do_Conde_de_Orgaz 
 
Observe a intensidade dos sentimentos na escultura O Êxtase de Santa 
Teresa do italiano Bernini. Atente ao rosto da santa, à sinuosidade e ao 
contorcimento de suas vestes: 
 
 
 
 
grupos.emagister.com 
 
 
 
UNIDADE 3 - FIGURAS DE PENSAMENTO E O ESTILO BARROCO 
 
CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE 
 
Objetivos: Estudar os recursos estilísticos do barroco. 
Nesta unidade, enfocamos os recursos estilísticos do texto barroco e das 
correntes cultista e conceptista. 
 
ESTUDANDO E REFLETINDO 
 
As figuras de pensamento consistem numa alteração anterior ao plano da 
expressão, ou seja, no próprio processo de elaboração mental da expressão, por 
exemplo, Você é muito bonita (no plano da expressão não há desvio algum; no 
plano do pensamento, pode expressar justamente o contrário – ironia). 
As figuras de pensamento mais empregadas pelos poetas barrocos são: 
 
Antítese 
Emprego de termos de significado diferente, sem gerar uma ideia absurda, 
por não sugerir simultaneidade. 
 
“Nasce o sol e não dura mais que um dia 
Depois da luz se segue a noite escura.” 
(Gregório de Matos) 
 
Note que os vocábulos “depois”, “se segue” quebram a ideia de 
simultaneidade e tornam o enunciado facilmente compreensível, pois é natural 
que, depois da luz do dia, venha a escuridão da noite. 
 
 
Paradoxo ou Oxímoro 
 
Ideias contrárias, aparentemente inconciliáveis, absurdas, por apresentar 
simultaneidade. 
 
“Sois anjo que me tenta e não me guarda” 
 (Gregório de Matos) 
 
A expressão “sois anjo” é apenas uma metáfora da amada. No entanto, ao 
contraí-la com “que me tenta e não me guarda”, aflora o paradoxo, pois o natural 
é um anjo guardar e não tentar, já que a tentação é característica do demônio. 
 
Hipérbole 
 
É o emprego exagerado de uma ideia ou metáfora que exagera: 
 
 “Pranto por belos olhos derramados 
Rio de neve em fogo convertido” 
 (Gregório de Matos) 
 
A expressão “rio de neve” é hipérbole, pois implica que as lágrimas da 
amada são tão intensas que se equiparam a um rio. 
 
Gradação ou Clímax 
 
Sequência de palavras que intensificam uma ideia. 
 
“O trigo nasceu, cresceu, espigou, amadureceu, colheu-se, mediu-se” 
 (Padre Antônio Vieira) 
Apóstrofe 
 
Interpelação, invocação, indicando o interlocutor do eu lírico. 
 
“Meu Deus, que estais pendente em um madeiro “ 
 
Ironia 
 
Consiste em sugerir o contrário do que se afirma: 
 
 “Holanda (protestantismo) vos dará os pregadores evangélicos, que semeiam nas 
terras dos Bárbaros a doutrina católica (...)” 
(Padre Antônio Vieira ) 
 
Figuras de Construção e o Estilo Barroco 
 
As figuras sintáticas ou de construção dizem respeito a desvios em relação 
à concordância entre os termos da oração e à ordem em que estes termos 
aparecem, ou ainda a possíveis repetições ou omissões de termos. 
 
Zeugma 
 
Omissão de um termo citado anteriormente: 
 
“Em tristes sombras morre a formosura 
Em contínuas tristezas a alegria”. 
 (Gregório de Matos) 
 
Perceba que o último verso subentende “Em contínuas tristezas (morre) a 
alegria”. 
 
Anáfora 
 
Repetição de um vocábulo ou expressão no início do verso ou da oração: 
 
“Em cuja lei protesto de viver, 
 Em cuja santa lei hei de morrer” 
 (Gregório de Matos) 
 
“Os senhores poucos, os escravos muitos; os senhores rompendo galas, os 
escravos despidos e nus, os senhores banqueteando, os escravos perecendo à 
fome...” 
 (Padre Antônio Vieira) 
 
Observe a repetição de “senhores” e “escravos” no início de cada oração, 
constituindo a anáfora. Contudo fica evidente também a sucessão de antíteses. 
 
Hipérbato ou Inversão 
 
Alteração da ordem direta dos termos na oração, ou das orações no 
período (Ordem direta: sujeito – verbo – complementos). Na estrofe abaixo, em 
todos os versos ocorre hipérbato: 
 
“Nasce o Sol, e não dura mais que um dia, 
Depois da Luz se segue a noite escura, 
Em tristes sombras morre a formosura, 
Em contínuas tristezas a alegria.” 
 (Gregório de Matos) 
 
Na ordem direta teríamos: 
 
O sol nasce e não dura mais que um dia, 
A noite escura se segue depois da luz, 
A formosura morre em tristes sombras, 
A alegria em contínuas tristezas. 
 
Quiasmo ou Conversão 
 
Repetição, com os termos invertidos em forma de “X”. Observe as antíteses 
“madrasta” x “madre”; “naturais” x “estrangeiros” na posição de quiasmo: 
 
“Senhora dona Bahia, (...) 
Madrasta dos naturais 
Dos estrangeiros madre” 
(Gregório de Matos) 
 
Anadiplose 
 
É a repetição de palavra ou expressão de fim de um membro de frase no 
começo de outro membro de frase. 
 
“Ofendi-vos, meu Deus, é bem verdade 
 É verdade que vos hei delinquido.” 
 (Gregório de Matos) 
 
Correntes Barrocas – Cultismo e Conceptismo 
 
No interior da estética barroca, observam-se duas correntes distintas, mas 
que podem estar presentes em um mesmo texto: o cultismo ou gongorismo e o 
conceptismo ou quevedismo. Gôngora e Quevedo foram poetas espanhóis que 
criaram tais estilos. 
 
a) Cultismo: relacionado à forma, consistindo no “parecer culto”, apresentando as 
seguintes características: 
 
 emprego excessivo de figuras de linguagem, de inversões e pela 
construção de imagens que envolvem o leitor por meio de estímulos 
sensoriais (sons, cores, olfato, etc.). Logo, a sinestesia também é figura 
constante no barroco cultista. 
 
 predomínio no texto descritivo. 
 agudeza: estilo extremamente conotativo ou figurado. 
 
Sobre o Cultismo ou Gongorismo afirmaram os críticos Massaud Moisés e 
Domício Proença Filho: 
 
Em resumo, era a luta por conciliar o claro e o escuro, a matéria e o 
espírito, a luz e a sombra, no esforço de anular pela unificação a 
dualidade básica do Homem, dividido entre os apelos do corpo e os da 
alma. 
Esse embate encarniçado entre os dois polos, de resultado sempre 
negativo pois a antinomia permanece ao fim e ao cabo, radica no 
problema do conhecimento da realidade. Entendendo que conhecer é 
identificar-se com, assimilar o objeto ao sujeito, parece evidente que a 
dicotomia barroca (corpo e alma, luz e sombra,etc.) corresponde a dois 
modos de conhecimento. Primeiro, o conhecimento se faria pela 
descrição dos objetos, num estado de verdadeiro delírio cromático, em 
que se procurava saber o como das coisas. Conhecer seria descrever. 
Visto o processo criativo implicar a utilização de metáforas e imagens 
para todos os sentidos (a chamada sinestesia), e a poesia se exprimir 
sobretudo por meio de metáforas e imagens, resulta que essa tendência 
se manifesta notadamente em poesia. E recebe o nome de Gongorismo 
por ser o poeta espanhol Gôngora seu grande representante. Seus 
adeptosprocuram uma linguagem rebuscada, especiosa e rica, e, para 
consegui-la, consideram de bom tom o emprego de neologismos, 
hipérbatos, trocadilhos, dubiedades e todas as demais figuras de sintaxe 
que tornam o estilo pesado, alambicado e tortuoso. 
MOISÉS, Massaud. A Literatura Portuguesa 
 
Há uma preocupação com tornar a linguagem culta. O artista utiliza o 
latim para criar novas palavras, que acabarão por incorporar-se 
deliberadamente ao idioma; há uma tentativa de aristocratizar a 
expressão literária. O uso do hipérbato, isto é, da inversão da frase, é 
imitação da sintaxe latina, e obedece à mesma preocupação.(...) Na 
metáfora o autor encontra uma forma de poetizar os objetos vulgares 
através de objetos poéticos, dentro da intenção geral de aristocratizar a 
linguagem. Acrescente-se ainda a exibição de um amplo conhecimento 
da mitologia. 
PROENÇA FILHO, Domício. Estilos de Época na Literatura 
 
b) Conceptismo: jogo de ideias, de raciocínio, portanto relacionado ao conteúdo, 
buscando seduzir o leitor pela construção intelectual, formada por meio de: 
 
 argumentações; 
 analogias ou comparações; 
 diálogos intertextuais, principalmente com a Bíblia; 
 relação causa e efeito; 
 adaptação do silogismo cartesiano para justificar o antropocentrismo e o 
pecado humano como um bom valor, embora isso acabe implicando 
sofismas, ou seja, argumentos apenas aparentemente válidos. 
Sobre a corrente barroca conceptista, afirmou o crítico Massaud Moisés: 
O segundo modo (de expressão barroca) pressupunha a análise dos 
objetos no encalço de lhes conhecer a essência, ou melhor, saber o que 
são as coisas, conceituá-las. Para alcançá-lo, utilizam-se da inteligência e 
da Razão, mais do que dos sentidos. Ao caos plástico que resulta da 
descrição gongórica, opõe-se a ordem racionalista, lógica, discursiva, 
própria de quem procura estabelecer silogismos em torno da vida e das 
coisas.(...) Recebeu a denominação de Conceptismo, e seu representante 
típico foi Quevedo. 
Entenda-se, porém que Gongorismo e Conceptismo, constituem 
tendências interinfluentes e contemporâneas, inclusive num mesmo 
escritor.(...) Em muitos casos, torna-se mesmo difícil estabelecer uma 
nítida distinção entre os dois procedimentos.” 
MOISÉS, Massaud. A Literatura Portuguesa. 
 
Observe que, no trecho final de Massaud, há a referência ao 
entrelaçamento de cultismo e conceptismo num mesmo texto. A argumentação 
(conceptismo), por meio de muitas figuras de linguagem (cultismo) denomina-se 
estilo engenhoso. 
 
BUSCANDO CONHECIMENTO 
 
A análise da argumentação conceptista barroca exige o conhecimento do 
conceito e depreensão do silogismo. 
O silogismo é uma forma de argumentação dedutiva, partindo de uma 
premissa geral para uma conclusão particular. O silogismo mais famoso é o 
cartesiano, ou seja, do filósofo René Descartes (1596 – 1650), também conhecido 
pelo seu nome latino Renatus Cartesius. 
 
Vamos examinar o Silogismo Cartesiano (de Descartes): 
 
Premissa Maior: Todo ser que pensa existe 
Premissa Menor: Eu penso 
Conclusão: Logo existo. 
O silogismo pode ser utilizado para expor um sofisma, ou seja, uma 
argumentação enganosa. O silogismo que leva ao sofisma possui premissas 
verdadeiras mas conclusão falsa. No caso dos textos barrocos, como estudaremos 
a seguir, o sofisma se dá por obter conclusões incorretas, a partir das semelhanças 
entre dois conceitos, desprezando-se as diferenças que os separam, como 
podemos verificar no exemplo: 
 
Premissa Maior: Os cidadãos brasileiros devem dirigir os destinos do Brasil. 
 
Premissa Menor: Os militares são cidadãos brasileiros. 
 
Conclusão: Logo os militares devem dirigir os destinos do Brasil. 
 
 
 
UNIDADE 4 - BARROCO BRASILEIRO - CONTEXTO BRASILEIRO E 
PADRE ANTÔNIO VIEIRA 
 
CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE 
 
Objetivos: Estudar as manifestações barrocas no Brasil; 
Propiciar conhecimentos sobre a oratória de Vieira. 
Nesta unidade, dedicamo-nos ao estudo do contexto das manifestações 
barrocas no Brasil e da oratória do Padre Antônio vieira. 
 
ESTUDANDO E REFLETINDO 
 
No Brasil, o movimento barroco iniciou em 1601, com a publicação do 
poema épico Prosopopeia de Bento Teixeira, português de nascimento. 
 
Contexto Histórico Brasileiro 
O Barroco no Brasil dá-se, portanto, no século XVII (Seiscentismo), 
apresentando o seguinte contexto histórico local: 
 
a) ciclo da cana-de-açúcar no nordeste, tendo, portanto, Bahia e Pernambuco 
como centros culturais e econômicos, além de Salvador como capital da 
colônia. 
 
b) Início do processo de formação da sociedade e da miscigenada raça 
brasileira, visto que a atividade açucareira exigia muito trabalho braçal. 
Disso decorre o início da escravidão do negro. No território, portanto, 
estavam presentes, agora, as três raças que, miscigenadas, formarão a 
sociedade brasileira: o branco, o negro e o índio. 
 
c) Invasão holandesa no nordeste, desencadeando o primeiro movimento da 
sociedade local em defesa do território. Disso decorre o início de um 
sentimento nativista mais forte, porém sem rebeliões contra a metrópole, 
que só se darão no próximo século. Vale ressaltar que se tratou não só de 
uma disputa política pelo território mas também religiosa, uma vez que os 
invasores holandeses eram protestantes e o colonizador português, 
católico. 
 
d) Processo de ocupação do território pela doação de capitanias hereditárias 
e de grandes extensões de terras, gerando os latifúndios. 
. 
e) Tentativa de criar centros culturais, ocorrendo na Bahia, já no final do 
período Barroco, em pleno século XVIII, a fundação da Academia dos 
Esquecidos e da Academia dos Renascidos. Como já vimos na aula 
introdutória, essas Academias produziram obras medíocres e pouco 
contribuíram para a criação de um público local, já que seus membros 
escreviam para si próprios. 
 
Principais Representantes no Brasil 
 
Nascido em Lisboa, mudou-se para o Brasil, com seis anos de 
idade, quando começou a cursar o Colégio dos Jesuítas de 
Salvador. Ingressou na Companhia de Jesus como noviço em 
maio de 1623. No ano seguinte ocorreu a invasão holandesa de 
Salvador. 
Ordenou-se padre em 1634. Nesta época já era conhecido 
pelos seus primeiros sermões, tendo fama de notável pregador. 
Em 1640, os holandeses são expulsos da Bahia. Vieira parte 
para Portugal, onde conquista a admiração de D. João IV 
,sendo por ele nomeado embaixador e posteriormente 
pregador régio. 
Vieira passa a fender os cristãos-novos ( judeus que apenas na 
aparência se convertiam ao catolicismo para fugirem da 
perseguição da Inquisição ). Essa defesa aos cristão-novos o fez 
entrar em conflito com o Santo Ofício, ou seja, a Inquisição. Na 
verdade,Vieira defendia os judeus pois considerava o poderio 
econômico destes importante para o enriquecimento do reino 
português. 
Voltou para o Brasil onde permaneceu de 1652 a 1661, como 
missionário no Maranhão e no Grão-Pará, sempre defendendo 
a liberdade dos índios, os quais o chamavam de “Paiaçu” 
(Padre Grande). Já quanto ao negro, Vieira posicionava-se 
favorável à escravidão mas não admitindo os maus tratos. 
Novamente retorna a Portugal e, anos mais tarde, viaja para 
Roma, onde fica por seis anos. Com seus sermões, ganha a 
simpatia do Papa e consegue, com o apoio deste, o fim da 
Inquisição em Portugal, para onde novamente retorna. 
Em 1681, regressa ao Brasil, onde se dedicou à tarefa de 
continuar a coligir os seus escritos, visando à edição completa 
em 16 volumes dos seus Sermões, iniciada em 1679. As suas 
obras começaram a ser publicadas na Europa, onde foram 
elogiadas até pela Inquisição. 
 Em 1694, já não conseguia escrever pelo seu próprio punho. 
Em 10 de junho começou a agonia, perdeu a voz, silenciaram-
se seus discursos. Morre na Bahia a 18 de julho de 1697, com 89 
anos. 
Portanto, Vieira é representante tanto da literatura portuguesa 
quanto da literatura brasileira. Assim como os poemassatíricos 
de Gregório de Matos, os sermões de Vieira constituem um 
importante painel do Brasil no século XVII. 
 
Centraremos nossos estudos nos dois maiores representantes deste 
período: Padre Antônio 
Vieira e Gregório de Matos 
Guerra. 
 
Padre Antonio Vieira 
1608 - 1697 
 
 
portalsaofrancisco.com.br 
 
Estilo 
 
Como a essência da 
oratória ou dos sermões é 
a argumentação, 
predomina na obra de 
Vieira a corrente 
conceptista. No entanto, 
pelo estilo engenhoso do orador, ou seja, a adequada aplicação da agudeza 
(linguagem figurada, figuras de linguagem) à argumentação, afloram em seu 
discurso fortes traços cultistas, embora Vieira tivesse criticado essa corrente em 
sua obra prima, o Sermão da Sexagésima, pregado em Portugal. Observe um 
fragmento deste sermão: 
 
“Este desventurado estilo que se usa hoje, os que querem honrar 
chamam-lhe culto, os que condenam chamam-lhe escuro, mas ainda lhe 
fazem muita honra.O estilo culto não é escuro, mas negro braçal e 
muito cerrado.(...) os pregadores cultistas ficam a motivar desvelos, a 
acreditar empenhos, e requintar finezas, a lisonjear precipícios, a brilhar 
auroras, a derreter cristais, a desmaiar jasmins, a toucar primaveras e 
outras mil indignidades destas(...)" 
 “Não fez Deus o céu em xadrez de estrelas, como os pregadores 
fazem o sermão em xadrez de palavras. Se de uma parte está branco, 
da outra há de estar negro: se de uma parte está dia, outra há de estar 
negro; se de uma parte dizem luz, da outra hão de dizer sombra; se 
uma parte dizem desceu, da outra hão de dizer subiu. 
Basta que não havemos de ver um sermão de duas palavras em paz? 
todas hão de estar sempre em fronteira com o seu contrário?(...) Como 
hão de ser as palavras? Como as estrelas. As estrelas são muito distintas 
e muito claras. Assim há de ser o estilo da pregação, muito distinto e 
muito claro." 
 
Vieira adotava o método parenético em seus sermões, o qual consiste em 
justificar os fatos da época por meio das sagradas escrituras, o Velho e o Novo 
Testamento, citados em latim, para dar efeito de autoridade. 
O método parenético faz emergir o fusionismo barroco, visto que os fatos 
da época, promovidos pelo homem (invasão holandesa, escravidão do negro e do 
índio, latifúndio açucareiro, perseguição aos judeus, etc.) são de caráter 
antropocêntrico; já o diálogo intertextual com as sagradas escrituras constitui a 
vertente teocêntrica. 
No Brasil colonial seiscentista, o púlpito era um dos raros locais onde se 
discutiam as grandes questões da comunidade diante de uma grande quantidade 
de fiéis. Logo os sermões de Vieira apresentam um amplo painel político, 
econômico e social da época, embora sempre privilegiando a Metrópole. Isso 
gerou, no século XX, reação do modernista Oswald de Andrade em seu Manifesto 
Antropófago: 
 
Contra o Padre Vieira. Autor do nosso primeiro empréstimo, para 
ganhar comissão. O rei-analfabeto dissera-lhe: ponha isso no papel mas 
sem muita lábia. Fez-se o empréstimo. Gravou-se o açúcar brasileiro. 
Vieira deixou o dinheiro em Portugal e nos trouxe a lábia(...) 
 
Vale ressaltar que, em seus sermões, Vieira também estabelece diálogo 
intertextual com o universo clássico-pagão, mas para justificar as fraquezas 
humanas. Observe este aspecto no Sermão dos Demônios do Mundo: 
 
A formosura é um bem frágil, e quando mais se vai chegando aos anos, 
tanto mais vai diminuindo e desfazendo em si e fazendo-se menor. Seja 
exemplo desta lastimosa fragilidade, Helena, aquela famosa e formosa 
grega, filha de Píndaro, rei da Lacónia, por cujo roubo foi destruída 
Troia.Durou dez anos a guerra;e,ao passo que ia durando e crescendo a 
guerra, se ia juntamente com os anos diminuindo a causa dela. Era a 
causa a formosura de Helena, flor enfim da terra, e cada ano cortada 
com o arado do tempo.Estava já tão murcha, e a mesma Helena tão 
outra,que,vendo-se ao espelho, pelos olhos , que já não tinham 
viveza,lhe corriam as lágrimas;e,não achando a causa por que duas 
vezes fora roubada, ao mesmo espelho e a si perguntava por ela. 
 
Em seguida, analisaremos fragmentos do Sermão Pelo Bom Sucesso Das 
Armas De Portugal contra as De Holanda: 
 
 (...)Considerai, Deus meu – e perdoai-me, se falo inconsideradamente – 
considerai a quem tirais as terras do Brasil e a quem as dais. Tirais estas 
terras aos portugueses a quem nos princípios as destes; e bastava dizer 
a quem as dais, para perigar o crédito de vosso nome, que não podem 
dar nome de liberal mercês com arrependimento. Para que nos disse S. 
Paulo, que vós, Senhor, “quando dais, não vos arrependeis”: Sine 
paenitentia enim sunt dona Dei? (por que os dons e a vocação de Deus 
são irrevogáveis?). Mas deixado isto à parte: tirais estas terras àqueles 
mesmos portugueses a quem escolhestes entre todas as nações do 
Mundo para conquistadores da vossa Fé, e a quem destes por armas 
como insígnia e divisa singular vossas próprias chagas. E será bem, 
Supremo Senhor e Governador do Universo, que às sagradas quinas de 
Portugal e às armas e chagas de Cristo, sucedam as heréticas listas de 
Holanda, rebeldes a seu rei e a Deus? Será bem que estas se vejam 
tremular ao vento vitoriosas, e aquelas abatidas, arrastadas e 
ignominiosamente rendidas? Et quid facies magno nomini tuo? (E então 
que farás ao teu grande nome?) E que fareis (como dizia Josué) ou que 
será feito de vosso glorioso nome em casos de tanta afronta? 
Tirais também o Brasil aos portugueses, que assim estas terras 
vastíssimas, como as remotíssimas do Oriente, as conquistaram à custa 
de tantas vidas e tanto sangue, mais por dilatar vosso nome e vossa Fé 
(que esse era o zelo daqueles cristianíssimos reis) que por amplificar e 
estender seu império.(... ) Se esta havia de ser a paga e o fruto de 
nossos trabalhos, para que foi o trabalhar, para que foi o servir, para 
que foi o derramar tanto e tão ilustre sangue nestas conquistas? Para 
que abrimos os mares nunca dantes navegados? Para que descobrimos 
as regiões e os climas não conhecidos? Para que contrastamos os 
ventos e as tempestades com tanto arrojo, que apenas há baixio no 
Oceano, que não esteja infamado com miserabilíssimos naufrágios de 
portugueses? E depois de tantos perigos, depois de tantas desgraças, 
depois de tantas e tão lastimosas mortes,ou nas praias desertas sem 
sepultura, ou sepultados nas entranhas dos alarves, das feras, dos 
peixes, que as terras que assim ganhamos, as hajamos de perder assim? 
Oh! Quanto melhor nos fora nunca conseguir, nem intentartais 
empresas! (...) 
Entregai aos holandeses o Brasil, entregai- lhes as Índias, entregai-lhes 
as Espanhas (que não são menos perigosas as conseqüências do Brasil 
perdido); entregai- lhes quanto temos e possuímos (como já lhes 
entregastes tanta parte); ponde em suas mãos o Mundo; e a nós, aos 
portugueses e espanhóis, 
deixai-nos, repudiai-nos, desfazei-nos, acabai-nos. Mas só digo e 
lembro a Vossa Majestade, Senhor, que estes mesmos que agora 
desfavoreceis e lançais de vós, pode ser que os queirais algum dia, e 
que os não tenhais.(...) 
Abrasai, destruí, consumi-nos a todos; mas pode ser que algum dia 
queirais espanhóis e portugueses, e que os não acheis. Holanda vos 
dará os apostólicos conquistadores, que levem pelo Mundo os 
estandartes da cruz; Holanda vos dará os pregadores evangélicos, que 
semeiem nas terras dos bárbaros a doutrina católica e a reguem com o 
próprio sangue; Holanda defenderá a verdade de vossos Sacramentos e 
a autoridade da Igreja Romana; Holanda edificará templos, Holanda 
levantará altares, Holanda consagrará sacerdotes e oferecerá o sacrifício 
de vosso Santíssimo Corpo; Holanda, enfim, vos servirá e venerará tão 
religiosamente, como em Amsterdão, Meldeburgo e Flisinga e em todas 
as outras colônias daquele frio e alagado inferno se está fazendo todos 
os dias.(...) 
 
Análise do Sermão 
 
No que diz respeito ao plano da forma, verifica-se o estilo grandiloquente, 
típico do gênero sermonístico,caracterizado pela oralidade, por ser veiculado, a 
princípio, nos púlpitos. 
A oralidade grandiloquente, neste caso, estrutura-se principalmente nas 
anáforas e nas ansiosas apóstrofes, que indicam Deus como interlocutor do 
orador. 
No entanto, a grandiloquência revela também as funções emotiva e 
apelativa da linguagem, uma vez que o pregador sente-se indignado com Deus, 
ao ver o território de domínio católico, sendo subjugado pelos protestantes, e 
deseja uma atitude. Mas atitude de quem? Isso veremos mais à frente. 
A função emotiva se explicita, de maneira mais convincente, por meio da 
ironia, presente em todo o último parágrafo do excerto. 
Quanto ao plano do conteúdo, vamos tomar como referência as palavras 
do crítico Alfredo Bosi: 
 
De Vieira ficou o testemunho de um arquiteto incansável de sonhos e 
de um orador complexo e sutil, mais conceptista do que cultista, amante 
de provar até o sofisma, eloquente até à retórica, mas assim mesmo, ou 
por isso mesmo, estupendo artista da palavra.” 
BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira 
 
Já no primeiro parágrafo, constata-se o que disse o mestre Alfredo Bosi. 
Vieira recorre ao sofisma, uma verdade falsa, ao culpar Deus pela invasão e 
domínio holandeses e protestantes. Essa argumentação pode ser verdadeira para 
a doutrina católica mas na essência é falsa, uma vez que funde universos 
diferentes: fé com questões políticas e econômicas. Afinal, Deus não criou o 
conceito de Estado, de divisão territorial, e sim o homem. Esse sofisma advém do 
fusionismo ou bifrontismo barroco: fusão de fé ( teocentrismo ) e atitudes 
humanas ( antropocentrismo ). 
Vieira procura provar como verdadeiro seu sofisma por meio do silogismo 
fundamentado no discurso de autoridade, nas palavras de São Paulo, inclusive 
citado em latim, o que enfatiza a argumentação como verdadeira. 
O silogismo pode ser estruturado da seguinte forma: 
 
Premissa Maior: Todos os atos divinos são irrevogáveis (“vós, Senhor, “quando 
dais, não vos arrependeis” ). 
Premissa Menor: Deus deu o Brasil aos portugueses católicos (“tirais estas terras 
àqueles mesmos portugueses a quem escolhestes entre todas as nações do 
Mundo para conquistadores da vossa Fé”). 
Conclusão: Logo o Brasil tem de pertencer aos portugueses, caso contrário Deus 
cai em descrédito (“e bastava dizer a quem as dais, para perigar o crédito de 
vosso nome”) 
 
Nos dois parágrafos seguintes, o tom de ameaça a Deus se intensifica, por 
meio das anáforas, pois o orador expõe ao Criador os sofrimentos vividos pelos 
portugueses no processo de dilatação da fé católica pela América e pelo Oriente. 
Conclui os parágrafos num tom afrontoso de revolta para com o interlocutor, 
fazendo com que o antropocentrismo se sobreponha ao teocentrismo: “ Oh! 
Quanto melhor nos fora nunca conseguir, nem intentar tais empresas!” (...) “Mas 
só digo e lembro a Vossa Majestade, Senhor, que estes mesmos que agora 
desfavoreceis e lançais de vós, pode ser que os queirais algum dia, e que os não 
tenhais”. 
O último parágrafo expõe o tom irônico do pregador em relação a Deus. 
Fica evidente o espírito contrarreformista de Vieira, para quem só o catolicismo 
representa Deus e o cristianismo. Esta visão se concretiza linguisticamente por 
meio do paradoxo “como em Amsterdão, Meldeburgo e Flisinga e em todas as 
outras colônias daquele frio e alagado inferno se está fazendo todos os dias”. 
Resta-nos questionar de quem Vieira está cobrando de fato uma atitude: 
de Deus? Não. Não somente de Deus, mas principalmente dos ouvintes católicos. 
O tom afrontoso promovido pelos recursos cultistas (anáforas, apóstrofes, 
ironia, paradoxo) é apenas um recurso para fazer prevalecer o aspecto 
conceptista, ou seja, a argumentação emotiva, grandiloquente, e 
simultaneamente apelativa que inflamava os receptores da pregação, e os fazia 
pegar em armas para defender o sonho do pregador: a manutenção do grande 
império católico lusitano. 
Mantuano: Virgílio de Mântua, poeta latino, 
autor da Eneida. Nesta obra, o herói Enéias 
desce ao inferno. 
BUSCANDO CONHECIMENTO 
 
Pesquise sobre o poema Prosopopeia de Bento Teixeira. Tal obra segue à 
risca o modelo camoniano, por ser escrito em versos decassílabos empregados 
em oitavas rimas, estrofes de oito versos com rimas dispostas em: ab ab ab cc. 
Trata-se de uma homenagem a Jorge de Albuquerque Coelho, donatário 
da capitania de Pernambuco. A obra consiste apenas num marco inicial, 
apresentando pouca originalidade. Vejamos um fragmento desta epopeia: 
 
 “Cantem poetas o poder romano 
Submetendo nações ao jugo 
duro 
O Mantuano pinte o rei troiano 
Descendo à confusão do Reino escuro 
Que eu canto um Albuquerque soberano 
Da Fé, da cara Pátria firme muro 
Cujo valor, e ser, que o Céu lhe inspira 
Pode estancar a lácia e grega lira.” 
 
 
 
UNIDADE 5 - GREGÓRIO DE MATOS GUERRA: LIRISMO AMOROSO E 
REFLEXIVO 
 
CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE 
 
Objetivos: Propiciar conhecimentos a respeito das obras de Gregório de Matos. 
Gregório de Matos, grande representante do Barroco, possui obra 
efetivamente sólida, seguindo, com genialidade os cânones poéticos de sua época 
em obras satíricas, líricas de cunho filosófico e religioso. 
 
ESTUDANDO E REFLETINDO 
 
Gregório de Matos Guerra 
 
 
1636 – 1695 
pt.wikipedia.org/wiki/Gregório_de_Matos 
 
Aspectos Biográficos 
 
Gregório de Matos Guerra nasceu na Bahia, em l633, e morreu em Recife, 
em l696. Filho de família abastada e não miscigenada com árabes, judeus ou 
mulatos, após os primeiros estudos no Colégio dos Jesuítas, vai, com 14 anos de 
idade, para Portugal, onde, anos mais tarde, matricula-se na universidade de 
Coimbra. Forma-se em Direito. A questão racial foi uma tônica em sua poesia: 
 
“Não sei, para que é nascer 
 Neste Brasil empestado 
 Um homem branco, e honrado 
 Sem outra raça” 
 
Viveu alguns anos em Lisboa exercendo a profissão. Em Portugal, casa-se 
com Micaela de Andrade, que veio a falecer em 1678. Devido a suas sátiras, foi 
obrigado a retornar à Bahia. Passou a levar uma vida boêmia, compondo canções, 
que agradavam ao povo. Escreveu sátiras ao governador Antônio de Souza 
Menezes, o “Braço de Prata”. Eis um fragmento de sátira a este governador: 
 
“Xinga-te o negro, o branco te pragueja, 
 E a ti nada te aleija, 
 E por teu sensabor, e pouco graça 
 És fábula do lar, riso da praça, 
 Té que a bala, que o braço te levara, 
 Venha segunda vez levar-te a cara”. 
 
Na Bahia, casou-se com a viúva Maria dos Povos. Consta que com ela 
tivera seu único filho, Gonçalo. Ainda devido a suas sátiras, foi degredado para 
Angola; já bastante doente, retornou ao Brasil, mas sob duas condições: estava 
proibido de pisar a terra baiana e de apresentar as suas sátiras. 
Devido à veia satírica, recebeu a alcunha de Boca do Inferno e não se sabe 
se todos os poemas de sua antologia são de fato de sua autoria, uma vez que, 
proibida a imprensa na colônia, sua obra se difundiu dispersa. 
O crítico Varnhagen, em 1850, foi o primeiro a publicar poemas de 
Gregório de Matos, no livro Florilégio da Poesia Brasileira. A antologia disponível 
atualmente foi feita por James Amado com o título de Obras Completas. No 
entanto, como já foi dito, não há total certeza se de fato Gregório de Matos seja o 
autor de todos os poemas publicados. 
 Gregório militou em vários tipos da poesia (satírica, lírico-sacra, lírico-
amorosa, lírico-reflexivo-filosófica, encomiástica e obscena). 
 
Lirismo-Amoroso 
 
Gregório de Matos abordou, em seus versos, mulatas, freiras e damas da 
sociedade baiana. Quanto à forma, ao dirigir-se às freiras e mulatas, deu 
preferência ao metro popular, à medida velha medieval o que se dá também nos 
poemas obscenos. Isso porque muitos desses temas foram feitos com a finalidade 
de serem cantados nas praças e tavernas. 
O nativismo de sua poesia lírica reside,justamente, nas canções compostas 
para as mulatinhas lindas (Brites, Bartola, Joana Gafeira, Damásia, etc.). Ao dirigir-
se às mulatas e às freiras opta pela abordagem do amor carnal, pela sensualidade 
feminina, chegando, às vezes, à obscenidade. 
 
Cançoneta 
 
Ao som de uma guitarrilha, 
que tocava um colomim 
vi bailar na Água Brusca 
as Mulatas do Brasil: 
Que bem bailam as Mulatas, 
que bem bailam o Paturi! (...) 
 
Atadas pelas virilhas 
cuma cinta carmesim, 
de ver tão grandes barrigas 
lhe tremiam os quadris. 
Que bem bailam as Mulatas, 
que bem bailam o Paturi. 
 
Assim as saias levantam 
para os pés lhes descobrir, 
porque sirvam de ponteiros 
à discípula aprendiz, 
Que bem bailam as Mulatas, 
que bem bailam o Paturi. 
 
Observe, já no título, a intenção para o canto, o que justifica a estrutura 
poemática: versos em redondilha maior, metro bastante musical e popular, com 
acento rítmico predominante nas 3ª e 7ª sílabas; bem como a presença de refrão 
nos dois últimos versos de cada estrofe. 
No plano do conteúdo, trata-se da exaltação à beleza sensual das mulatas 
brasileiras, configurando também o aspecto nativista, a cor local, além de ser 
registro do início da miscigenação no Brasil colonial. 
Na primeira estrofe, destaca-se a habilidade corporal das mulatas que, ao 
som do ritmo musical “colomim”, bailam um estilo de dança popular da época o 
Paturi. 
Nas estrofes seguintes, emerge a sensualidade, sugerida na cor “carmesim” 
( vermelha) e explicitada nos vocábulos “virilhas”, “barrigas”, “quadris”, “pés”. 
Finalizando a temática explicitamente erótica de Gregório de Matos, 
divirta-se com a oitava abaixo, também composta na redondilha maior: 
 
O amor é finalmente 
um embaraço de pernas, 
uma união de barrigas, 
um breve tremor de artérias 
Uma confusão de bocas, 
uma batalha de veias, 
um reboliço de ancas, 
quem diz outra coisa é besta 
 
Já, ao dirigir-se às damas da sociedade, optou pela sofisticada medida 
nova clássica, os versos decassílabos em soneto.. 
Ao exaltar as damas da sociedade, como Ângela, Maria e Catarina, assimila 
o platonismo amoroso ou o conflito carne x espírito. Percebe-se em alguns de 
seus versos o declínio do processo de composição com material extraído da 
natureza, prenunciando o retrato de Marília de Dirceu: 
 
“Deixa o prado; vem cá, minha adorada, 
 Vês de esse mar a esfera cristalina 
 Em sucessivo aljôfar desatada? 
 
 Parece aos olhos ser de prata fina? 
 Vês tudo isto bem? Pois tudo é nada 
 À vista do teu rosto, Catarina.” 
 
A Dona Ângela 
 
Anjo no nome, Angélica na cara. 
Isso é ser flor, e Anjo juntamente, 
Ser Angélica flor, e Anjo florente, 
em quem, senão em vós se uniformara? 
Quem veria uma flor, que a não cortara 
De verde pé, de rama florescente? 
E quem um Anjo vira tão luzente, 
Que por seu Deus, o não idolatrara? 
Se como Anjo sois dos meus altares, 
Fôreis o meu custódio, e minha guarda, 
Livrara eu de diabólicos azares. 
Mas vejo, que tão bela, e tão galharda, 
Posto que os Anjos nunca dão pesares, 
Sois Anjo, que me tenta, e não me guarda. 
 
Observe a estrutura poemática clássica, os versos decassílabos em soneto, 
com rimas dispostas em abba abba cdc dcd. 
Ainda no que tange ao plano da forma, verifica-se a rebuscada linguagem 
cultista barroca, visto que as metáforas “anjo” e “flor”, combinadas no texto, 
acabam gerando antíteses que se convertem em paradoxo. 
Quanto ao conteúdo, verifica-se o fusionismo barroco pela temática do 
conflito entre o erotismo, metaforizado na flor, e o platonismo, metaforizado no 
anjo. 
Por ser fisicamente bela, Ângela é flor, é angélica (nome de uma for), mas, 
por ser inacessível, Ângela é comparada ao anjo. 
A primeira estrofe é predominantemente cultista, por ser descritivo. A partir 
da segunda estrofe, surgem questionamentos do eu lírico, representados nas 
interrogações. Esses questionamentos, já tendendo às argumentações 
conceptistas, podem ser interpretados da seguinte forma: 
Sendo fisicamente bela como uma flor, o eu lírico fica tentado a tocá-la, 
possuí-la, a “arrancá-la da rama” e, dessa forma, ele satisfaria seus desejos físicos 
de homem, caráter antropocêntrico, mas poderia desgastar a ideia de perfeição 
contida na amada, além de cair em pecado “diabólicos azares”. 
Pelo conceito platônico, o ideal, se concretizado, desgasta-se. Dessa forma, 
o eu lírico passa a questionar se não seria melhor idolatrá-la, ou seja, mantê-la a 
distância, como um anjo, caráter teocêntrico, para assim sempre tê-la perfeita em 
sua mente e não cair em pecado. 
No entanto, a última estrofe, iniciada com a conjunção adversativa “mas”, 
revela o eu lírico mais propenso a tocá-la, fechando o soneto com a chave de 
ouro do paradoxo “Sois anjo, que me tenta, e não me guarda”, ou seja, Ângela é 
anjo demoníaco, que, como o demônio, tenta e, ao contrário de um anjo, não o 
protege. Logo, em pensamento, o eu lírico já é um pecador. 
Este soneto ilustra, portanto, a dificuldade, muitas vezes, de identificar a 
predominância de cultismo e conceptismo, num mesmo texto. 
 
Lirismo Reflexivo-Filosófico 
 
As temáticas reflexivas gregorianas apresentam o pessimismo devido à 
efemeridade do tempo, à instabilidade (efemeridade, transitoriedade, fugacidade) 
dos bens da vida, o conflito essência (o que realmente somos) e aparência (o que 
parecemos ser). 
É evidente que a preocupação com a brevidade da vida leva o poeta a 
aproveitar o tempo (carpe diem, aspecto antropocêntrico). O carpe diem convive 
com a consciência de que “in pulvere homo revertetur” (o homem se converterá 
em pó, o homem veio do pó e para o pó retornará, caráter teocêntrico), gerando 
o típico feísmo barroco: “cinzas”, “cadáveres”, “campa fria”, “sepultura”, etc. Vamos 
à análise de um soneto reflexivo do poeta: 
 
Nasce o Sol, e não dura mais que um dia, 
Depois da Luz se segue a noite escura, 
Em tristes sombras morre a formosura, 
Em contínuas tristezas a alegria. 
 
Porém se acaba o Sol, por que nascia? 
Se formosa a Luz é, por que não dura? 
Como a beleza assim se transfigura? 
Como o gosto da pena assim se fia? 
 
Mas no Sol, e na Luz, falte a firmeza, 
Na formosura não se dê constância, 
E na alegria sinta-se tristeza. 
 
Começa o mundo enfim pela ignorância, 
E tem qualquer dos bens por natureza 
A firmeza somente na inconstância. 
 
Observe, mais uma vez, a estrutura poemática clássica, os versos 
decassílabos em soneto, com rimas dispostas em abba abba cdc dcd. 
Ainda no que diz respeito ao plano da forma, verifica-se a rebuscada 
linguagem cultista barroca, já que, além da forte presença de hipérbatos, as 
metáforas “sol”, “luz”, “formosura”, “noite escura” e “sombras”, combinadas no 
texto, acabam gerando antíteses. 
No entanto, o caráter reflexivo faz predominar a argumentação 
conceptista, fundamentada na efemeridade da alegria. 
Na primeira estrofe, a alegria, metaforizada no sol, na luz, na formosura, 
morre ou acaba sempre em tristeza, metaforizada na noite escura e nas tristes 
sombras. 
Essa constatação leva o eu lírico a questionar, na segunda estrofe, o 
porquê de a alegria surgir se logo ela acabará, o que culmina, na terceira estrofe, 
no paradoxo “e na alegria sinta-se tristeza”, ou seja, ao estarmos alegres, já 
devemos ficar tristes, por termos consciência de que a alegria acabará. 
O soneto traz novamente, na chave de ouro, o paradoxo “A firmeza 
somente na inconstância”, interpretado como: a única coisa constante na vida é 
que nada é constante. 
 
BUSCANDO CONHECIMENTO 
 
A temática da efemeridade do tempo relacionada à morte é uma constante 
na cultura ocidental. Fica aqui a sugestão de ouvir e traduzir a bela canção Dust in 
The Wind: 
 
Dust In The Wind 
Kansas 
Composição : Kerry Livgren 
letras.terra.com.br › ... › Kansas › Dust In The Wind 
 
I close my eyes 
Only for a moment 
And the moment's goneAll my dreams 
Pass before my eyes, a curiosity 
Dust in the wind 
All they are is dust in the wind 
 
Same old song 
Just a drop of water 
In an endless sea 
All we do 
Crumbles to the ground 
Though we refuse to see 
Dust in the wind 
All we are is dust in the wind, ohh 
 
Now, don't hang on 
Nothing lasts forever 
But the earth and sky 
It slips away 
And all your money 
Won't another minute buy 
Dust in the wind 
All we are is dust in the wind 
Dust in the wind 
Everything is dust in the wind 
The wind 
 
 
 
 
UNIDADE 6 - LIRISMO-SACRO E POESIA SATÍRICA 
 
CONHECENDO A PROPOSTA DO TEMA 
 
Objetivos: Explicitar as características do lirismo sacro de Gregório de Matos. 
Dando sequência no estudo sobre Gregório, nesta unidade, estudamos a 
poesia lírico-sacra, satírica e fescenina de Gregório de Matos Guerra. 
 
ESTUDANDO E REFLETINDO 
 
É no lirismo-sacro que o poeta se vê frente a frente face a face com os 
problemas da vida espiritual, muitas vezes trazendo à tona o fusionismo barroco, 
predominantemente conceptista, mas sem deixar de apresentar fortes traços 
cultistas, no plano da linguagem. 
Gregório de Matos tinha consciência de seus pecados (aspecto 
antropocêntrico) e certeza do perdão divino (caráter teocêntrico) por ser a 
misericórdia a maior graça de Deus. Essa argumentação se fundamenta no 
diálogo intertextual com as sagradas escrituras, gerando silogismo e até mesmo 
sofismas. 
Vamos à análise de um dos mais representativos poemas sacros deste 
poeta. 
 
 
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“Então ele (Jesus) lhes propôs esta parábola: qual de vós é o homem que, 
possuindo cem ovelhas, e perdendo uma delas, não deixa as noventa e nove no 
deserto, e não vai após a perdida até que a encontre? 
E achando-a, põe-na sobre os ombros, cheio de júbilo; e chegando a casa, reúne 
os amigos e vizinhos e lhes diz: Alegrai-vos comigo, porque achei a minha ovelha 
que se havia perdido. 
Digo-vos que assim haverá maior alegria no céu por um pecador que se 
arrepende, do que por noventa e nove justos que não necessitam de 
arrependimento.” 
 (Lucas, capítulo 15) 
 
Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado, 
da vossa alta clemência me despido; 
porque quanto mais tenho delinquido, 
vos tenho a perdoar mais empenhado. 
Se basta a vos irar tanto um pecado, 
a abrandar-vos sobeja um só gemido: 
que a mesma culpa, que vos há ofendido, 
vos tem para o perdão lisonjeado. 
Se uma orelha perdida e já cobrada, 
glória tal e prazer tão repentino 
vos deu, como afirmais na sacra história, 
eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada, 
cobrai-a; e não queirais, pastor divino, 
perder na vossa ovelha a vossa glória. 
Gregório de Matos Guerra 
 
No lirismo-sacro gregoriano também predomina e estrutura poemática 
clássica, os versos decassílabos em soneto, com rimas dispostas em abba abba 
cde cde. 
Quanto à linguagem, verifica-se o rebuscamento cultista, justificado pela 
presença de antíteses: “pecado” x “clemência”; “delinquido” x “perdoar”; “irar” x 
“abrandar”; “ofendido” x “lisonjeado”. 
Também se nota a presença de metáforas bíblicas: “ovelha perdida”, 
“ovelha desgarrada” (pecador), “pastor divino” (Deus). 
Contudo, pela análise do conteúdo, constata-se o predomínio da 
argumentação conceptista, que se estrutura, a partir do diálogo intertextual com a 
parábola bíblica. 
Nos primeiro quarteto, vem à tona o fusionismo barroco, visto que o eu 
lírico assume-se pecador “Pequei, Senhor, “aspecto antropocêntrico, porém deseja 
o perdão de Deus “mas não porque hei pecado, / da vossa alta clemência me 
despido;” (aspecto teocêntrico). 
No segundo quarteto, começa a se armar a argumentação com o 
interlocutor, Deus, pela obtenção da misericórdia divina: “porque quanto mais 
tenho delinquido, / vos tenho a perdoar mais empenhado.” 
No primeiro terceto, inicia-se o diálogo intertextual com a parábola bíblica, 
fundamentada na seguinte argumentação pelo eu lírico: toda a glória de Deus só 
existe devido ao fato de o homem pecar. 
Segundo o poeta, se todos nós homens nos mantivéssemos sempre puros, 
seríamos perfeitos e, portanto, não haveria a necessidade de Deus, pois 
passaríamos a ser Deus. 
Essa argumentação do poeta toma como referência a própria Bíblia, ou 
seja, a “sacra história”, pois o próprio Jesus disse: “Digo-vos que assim haverá 
maior alegria no céu por um pecador que se arrepende, do que por noventa e 
nove justos que não necessitam de arrependimento.” 
 A argumentação pode ser enquadrada no seguinte silogismo: 
 
Premissa Maior: A glória ou a grandeza de Deus está em perdoar (cobrar) ao 
pecador ( “ovelha perdida ou desgarrada”); 
Premissa Menor: eu sou pecador (“eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada”); 
Conclusão: Logo serei perdoado (caso contrário Deus perde sua glória e 
grandeza: “não queirais, pastor divino, / perder na vossa ovelha a vossa glória.” 
 
Perceba que, neste silogismo, o poeta ameaça Deus, pois, segundo seu 
raciocínio, se o homem não pecasse, Deus não existiria. Portanto, no fusionismo 
barroco, na tentativa de conciliação entre teocentrismo e antropocentrismo, 
sobressai, no soneto, o antropocentrismo. 
Entretanto esse silogismo contém um sofisma, pois omite um dado bíblico: 
a necessidade de penitência da parte do pecador, ou seja, do esforço de não 
voltar a pecar. Veja o texto bíblico: “Digo-vos que assim haverá maior alegria no 
céu por um pecador que se arrepende, do que por noventa e nove justos que não 
necessitam de arrependimento.” 
Se tomássemos as palavras do poeta como verdadeiras, a humanidade 
cada vez mais se tornaria uma barbárie. O homem jamais será santo ou perfeito 
como Deus, porém, quanto menos ele incorrer em erros, mais humana será a 
humanidade. 
Contudo, vale ressaltar que o poeta sofisma para justificar sua vil condição 
humana, enquanto a Igreja sofismava, na época, justificando com as sagradas 
escrituras a punição aos hereges no Tribunal do Santo Ofício ou Santa Inquisição. 
 
 
Inquisição espanhola - repressão à homossexualidade. 
pt.wikipedia.org/wiki/Inquisição 
 
Poesia Satírica e Fescenina 
 
Gregório de Matos foi o introdutor da sátira no Brasil. Sua poesia satírica e 
fescenina (pornográfica) é consequência do meio em que viveu, da conjuntura 
política, religiosa e econômica da época (século XVII), constituindo, portanto, um 
amplo painel desse período da história brasileira. 
Segundo o crítico Alfredo Bosi, seu populismo é chulo e, antes de significar 
uma atitude antiaristocrática, nada mais é que válvula de escape para velhas 
obsessões sexuais ou arma para ferir os poderosos por ele invejados, já que o 
Boca do Inferno, de raça branca e formado em Coimbra, não admitia ver mestiços 
se tornando ricos no Brasil. 
Em Gregório de Matos, o desejo de ascensão é marcado por um discurso 
moralizante, embora ele próprio fosse um imoral, como afirma o crítico Araripe 
Junior: “ desconhece que é fruto do meio a que pertence, pensa reagir e apenas 
traduz a sociedade, cuida moralizar e apenas se enlameia.” 
Para Gregório, calar era um silêncio de morte: 
 
“Se o que fui, sempre hei de ser, 
“paiaiá” = pajé 
 “cobepá” = idioma da tribo Cobé, que habitava 
os arredores de Salvador 
Eu falo, seja o que for.” 
 
No último verso acima, depreende-se a justificativa de sua alcunha de Boca 
do Inferno. 
Foram alvo de sua crítica: o mau clero, os maganos (degredados de 
Portugal), que aqui chegavam na miséria e partiam ricos, o mulato, os políticos 
corruptos, os fidalgos caramurus (nobreza indígena que se dizia, segundo a lenda, 
descendente de Diogo Alvarez Correia): 
 
“Há cousa como ver um Paiaiá 
 Mui prezado de ser Caramuru, 
 
 Descendente de sangue de tatu, 
Cujo torpe idioma é cobepá.” 
 
“Que os brasileiros são bestas 
 E estão sempre a trabalhar 
 Toda a vida por manter 
 Maganos de Portugal” 
 
Também criticou os governadores, a fidalguia

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