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BEDZED, LONDRES, BILL DUNSTER ARCHITECTS IS S N 0 1 0 2 -8 9 7 9 9 7 7 0 1 0 2 8 9 7 0 0 6 B IL L D U N S T E R A R C H IT E C T S S É R G IO F E R R O A R Y P E R E Z M A R C IO K O G A N C ÍC E R O S A N T IN I E S ILV A H E N R IQ U E R O C H A ANO 19 NO 123 JUNHO 2004 R$ 17,00 123 junho 2004 BRASIL: EDIFÍCIO SAM, ARY PEREZ TECNOLOGIA & MATERIAIS: MÁRMORES E GRANITOS ENTREVISTA: SÉRGIO FERRO INTERIORES: SALÃO DO MÓVEL DE MILÃO CASA: MARCIO KOGAN BEDZED, LONDRES, BILL DUNSTER ARCHITECTS BRASIL: EDIFÍCIO SAM, ARY PEREZ TECNOLOGIA & MATERIAIS: MÁRMORES E GRANITOS ENTREVISTA: SÉRGIO FERRO INTERIORES: SALÃO DO MÓVEL DE MILÃO CASA: MARCIO KOGAN 2 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 E D I T O R I A L O MAIOR DOS PARADIGMAS Muito se tem discutido sobre a desvalorização do arquiteto e do projeto de arquitetu- ra. Outro tema recorrente em qualquer fórum de discussão, seja pela imprensa espe- cializada, seja em congressos e assembléias, ou mesmo em um bate-papo informal entre profissionais, é o papel do arquiteto na sociedade hoje. E o mais grave: o que vai ser dele no futuro. São assuntos espinhosos, com graves conseqüências e de difícil solução. Em primeiro lugar, porque é extremamente difícil identificar a – ou as – causas dessa situação. E, sem conhecer os motivos, fica complicado modificar o estado das coisas. Nesta edição de AU trazemos três pensadores que, com diferentes argumentos, apontam um caminho semelhante para a recuperação do valor da arquitetura e do arquiteto. Um deles é Sérgio Ferro, que há muito defende a abertura do projeto arquitetônico à interpretação e à intervenção dos colaboradores. "Cada equipe de especialistas atuando com liberdade, responsabilidade e cooperação", declarou à arquiteta e repórter free-lance Simone Sayegh. As arquitetas e pesquisadoras Silke Kapp e Ana Paula Baltazar, autoras da Interseção deste número, entendem a própria segmentação do processo de produção arquitetônica (demanda, projeto, construção e uso) como uma das principais causas dos problemas vividos hoje, e propõem o que chamam de "arquitetura livre". Desenvolvido nos moldes do software livre, esse con- ceito cria um sistema que se mantém aberto e acessível a todos. Obviamente, há aí inúmeras questões de teor ético e técnico que precisam de cuidado – uma "tarefa imensa", como elas próprias descrevem, e que, justamente por sua complexidade, "não ameaça a sobrevivência profissional do arquiteto". Trilhar o caminho proposto por esses três pensadores não seria nada simples, mas é uma saída a se considerar. SIMONE CAPOZZI EDITORA O projeto pode e deve estar aberto no momento de sua concepção para uma transformação, pois nenhuma previsão consegue antever todas as possibilidades que surgem no momento da realização ” “ Sérgio Ferro M ar ce lo S ca n d ar o li Sé rg io F er ro N o va A n d ré G al er ia A ce rv o : R o d ri g o L ef év re C E N Á R I O 6 ARQUITETURA&URBANISMO MAIO 2003 PROJETO REVIVA BROOKLIN PREVÊ REURBANIZAÇÃO AO ESTILO ALEMÃO Aprovado em fevereiro, o Projeto de Revitalização do Centro Comercial do bairro do Brooklin, zona Sul de São Paulo, é patrocinado pelo Clube dos Lojistas em parceria com a Prefeitura de São Paulo, e deverá reestruturar as ruas Princesa Isabel, Joaquim Nabuco e Barão do Triunfo. Os arquitetos Juliana Camargo e Rafael Iaconelli são os responsáveis pelas mudanças na região. As calçadas permanecerão com a mesma largura (entre 2,5 m e 3,5 m) e terão revestimentos em cores que remetem à bandeira da Alemanha. Contudo, o layout do piso irá representar a flora brasileira a partir de um desenho orgânico. Os portadores de deficiência física poderão se beneficiar com rampas de acesso e esquinas de até 5,5 m. As rampas existentes serão trocadas pelo modelo padronizado da prefeitura, que é pré- moldado. "O objetivo é dar prioridade aos pedestres: qualquer empecilho será avaliado e removido", diz Juliana Camargo. Além disso, serão instaladas câmeras para garantir a segurança da região, assim como novas luminárias. Os pontos de táxi contarão um layout renovado e mobiliário feito de alumínio e polipropileno translúcido. De acordo com a proposta inicial, o cabeamento será enterrado. No aspecto paisagístico, a arborização local inclui diferentes espécies para cada rua. "Para cada quarteirão está previsto um tipo de árvore para programar as floradas", conta a arquiteta. Na Joaquim Nabuco, por exemplo, serão colocados Ipês amarelos. "Devido à perspectiva de subida dessa via, será possível enxergar bem a copa do Ipê", justifica Juliana. O Reviva Brooklin conta com o apoio da Câmara do Comércio Alemão, Simens, Camargo Corrêa, ABCP (Associação Brasileira de Cimento Portland), Bayer e Marbo. A previsão de entrega da obra é outubro, quando ocorre a BrooklinFest. JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 7 VOTE NO 10o PRÊMIO PINI E GANHE UM NOVO CD-ROM Todos os assinantes a pagamento das revistas Construção Mercado, AU e Téchne que participarem da pesquisa para o Prêmio PINI 2004 receberão o CD-ROM Construção Mercado 2001/2003 – Artigos e Reportagens. O CD traz todas as matérias e artigos publicados em Construção Mercado desde seu lançamento, em agosto de 2001, até a edição no 29, de dezembro de 2003. Seções como Custo Comparado, Orçamento Real e Construção Mercado Responde estão incluídas no CD. Além disso, os assinantes que contribuírem com a pesquisa irão conhecer as novidades desta 10a edição do Prêmio PINI. Uma delas é poder selecionar, entre as 44 categorias ou segmentos de mercado que a pesquisa compreende, somente aquelas que de fato costumam especificar ou comprar regularmente. Para participar, os assinantes estão recebendo pelo correio, de forma escalonada, um código que permitirá acesso à área de votação no site www.premiopini.com.br. Outra novidade neste ano refere-se à criação do Prêmio PINI Construtora Parceira da Indústria. Após o término da votação do Prêmio PINI, no dia 2 agosto de 2004, os fornecedores que obtiverem as dez primeiras colocações em cada uma das 44 categorias vão escolher, de forma livre e sem qualquer indicação prévia, a construtora que mais contribuiu durante o ano para o desenvolvimento e o aperfeiçoamento tecnológico de seus produtos e sistemas. O objetivo é estimular a parceria entre fornecedores e construtores e ajudar a fortalecer a cadeia produtiva da indústria da construção civil nacional. "Nessa modalidade especial do Prêmio PINI, os fornecedores votarão nas construtoras", diz Eric Cozza, diretor de redação da PINI. Os eleitores serão, preferencialmente, diretores ou gerentes técnicos ou comerciais, conforme livre indicação das próprias empresas. Mais informações podem ser obtidas no site premiopini@pini.com.br. C E N Á R I O 8 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 Jorge Königsberger, do escritório Königsberger Vannucchi Arquitetos Associados, de São Paulo, é o novo presidente da AsBEA. A eleição foi uma das atividades da assembléia anual da entidade, realizada entre os dias 19 e 22 de maio, em Porto Seguro, na Bahia. Na ocasião, os afiliados também elegeram a nova diretoria para o biênio 2004/2006. Luiz Augusto Contier, Marcio Mazza, Nelson Dupré, Roberto Aflalo Filho, Roberto Amá e Silvio Heilbut são os novos vice-presidentes. O arquiteto Alberto Botti assumiu a presidência do conselho deliberativo. Nos conselhos regionais lideram Dalton Vidotti (presidente da AsBEA-PR), Aníbal Coutinho (AsBEA-RJ) e Ronaldo Rezende (AsBEA-RS). A Assembléia reuniu representantes de 70 escritórios associados que, além da eleição, participaram da discussão de outros temas importantes para o exercício profissional, como a criação do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU), a valorização do projeto e os novos estatutos da entidade. ASBEA TEM NOVA DIRETORIA CITY COLLECTION LANÇA SEU PRIMEIRO PROJETO EM SÃO PAULO Nova marca da Anastassiadis Arquitetos, Odebrecht e Alfa Empreendimentos, a City Collectionconsiste em uma série de empreendimentos residenciais, implantados em áreas degradadas e esquecidas pelo mercado imobiliário, mas com um importante diferencial: devolver a essas regiões os elementos que lhe conferem identidade. "A oferta do mercado imobiliário atual distancia-se do desejo de morar das pessoas", avalia Paulo Melo, diretor de contrato da Odebrecht. O executivo explica que o conceito da City Collection vai ao encontro desse desejo, aliando qualidade de vida, estilo e bom gosto em seus projetos. O primeiro empreendimento da coleção é o City Escape, localizado no Morumbi, em São Paulo. O conjunto é formado por seis casas, cada qual com um estilo próprio. De acordo com o projeto, as edificações terão entre 980 m² e 1.190 m² de área total. A arquiteta Patrícia Anastassiadis explica que a área construída no City Escape utiliza 1/3 da ocupação do terreno, proporcionando mais espaço verde e qualidade ao projeto. O conjunto dispõe de uma área para uso comum com spa, relax room, sauna úmida, hidromassagem, vestiários e piscina semi- olímpica com duas raias. As residências deverão ser entregues após 18 meses do início das obras, previsto para agosto deste ano. Além desse, outros projetos em regiões como o Ipiranga, Mooca, Barra Funda e Campinas também estão em estudo. Fo to : d iv u lg aç ão JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 9 Os primeiros resultados do trabalho realizado em Santa Gertrudes, em São Paulo, pelo Citec-CCB (Centro de Inovação Tecnológica em Cerâmica do Centro Cerâmico do Brasil) já podem ser observados em suas quatro novas séries. As peças foram inspiradas em elementos presentes na própria fazenda Santa Gertrudes, onde também ocorre o processo de fabricação do material. "A nossa idéia é valorizar o trabalho do profissional brasileiro pelo resgate de nossas origens", comenta José Octavio Armani Paschoal, presidente do CCB. Todo o processo de criação foi facilitado quando, em setembro do ano passado, foi implantado um novo laboratório de design e desenvolvimento focado na elaboração de produtos criados em território nacional e que apresentem características brasileiras e um design original. A estratégia é estimular as vendas no mercado interno CCB DESENVOLVE LINHA DE REVESTIMENTOS CERÂMICOS COM DESIGN NACIONAL e a conquista de novos mercados no exterior pela oferta de opções diferenciadas – ainda hoje, muitas fábricas nacionais dependem de desenhos de coleções italianas e espanholas. O Centro de Cerâmica Brasileiro foi criado em 1993 pela Anfacer (Associação Nacional dos Fabricantes de Cerâmica para Revestimentos) para atuar como certificador de qualidade de produtos cerâmicos e de telhas de concreto. Hoje, o Centro mantém parceria com diversas universidades e institutos de pesquisas, caso da Universidade Federal de Santa Catarina, da Universidade Federal de São Carlos, da Unesp, da USP (São Carlos e São Paulo), do Ipen (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares) e do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo), e já dispõe de salas com laboratórios de queima, esmaltação, preparação de amostras e moagem. Fo to : d iv u lg aç ão C E N Á R I O 10 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 RESTAURO E ADAPTAÇÃO INTERNA DA ESTAÇÃO DA LUZ, EM SÃO PAULO EM PROJETO EXECUTIVO O plano de restauro e adaptação interna da Estação da Luz em espaço para exposições do centro cultural Estação da Luz da Nossa Língua já está partindo para o projeto executivo. Ainda não existe previsão para início das obras, o que poderá ser resolvido em breve. Os arquitetos Paulo e Pedro Mendes da Rocha assinam o projeto meados do século passado, será renovada para receber os equipamentos de exposições temáticas e temporárias, e terá ainda espaço multimídia para consultas. Com a entrega dessa fase estará concluído o processo de revitalização iniciado pela fachada, inaugurada em janeiro durante as comemorações dos 450 anos da cidade. O projeto executivo de restauro da fachada foi realizado pelo escritório Helena Saia e Arquitetos Associados. Para acompanhar o andamento do processo visite o site www.estacaodaluz.org.br. de restauro e adaptação interna. Segundo Pedro Mendes da Rocha, os estudos estão em processo de aprovação pelos órgãos de preservação do patrimônio histórico da Prefeitura e do Estado de São Paulo. Está prevista a total restauração da ala oeste do edifício, que não foi afetada pelo incêndio de 1949. Haverá equipamento para formação e apresentação de contadores de histórias e repentistas. Nessa ala do centro cultural também serão instaladas salas de capacitação de professores, além de auditório e biblioteca circulante. A ala leste, incorporada ao conjunto emF o to : M ar ce lo S ca n d ar o li JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 11 ÍNDIO DA COSTA ARQUITETOS GANHA CONCORRÊNCIA PARA ESCOLA DO SESC NO RIO O Diretório Nacional do Sesc divulgou o resultado da concorrência por carta-convite para o projeto de Escola Interna de Ensino Médio que será implantada no Rio de Janeiro. Entre os seis escritórios cariocas convidados, o vencedor foi Índio da Costa Arquitetos. Na elaboração desse projeto participaram o paisagista Fernando Chacel e o escritório Forte, Gimenes & Marcondes Ferraz, de São Paulo. Como parte do programa que abrange uma área de 131 mil m2, a idéia objetivava a construção de uma escola nos moldes de uma high school americana que, além do centro educacional, oferecesse aos seus alunos divertimento, lazer e moradia. As salas de aula foram dispostas no edifício central que, elevado sobre pilotis, cria um grande pátio coberto e permite a circulação livre entre as demais funções do complexo. Uma ampla área com diversas opções de entretenimento e treinamento aos internos é destinada ao complexo esportivo. O ginásio de 16 m de altura possui duas quadras para realização de atividades físicas e uma cobertura metálica apoiada em elementos modulares de concreto, formando arquibancadas dobráveis que podem ser recolhidas, liberando, assim, o espaço para realização de eventos. Em virtude do tipo de solo local, a melhor solução encontrada para a implantação de arquibancadas externas foi o rebaixamento do nível das quadras, com o conseqüente aproveitamento das escarpas laterais. Outros itens, como o teatro de 600 lugares, biblioteca, refeitório e alojamento para estudantes e apartamentos para os professores, também estão incluídos na proposta. Im ag em : Í n d io d a C o st a A rq u it et u ra e D es ig n O F I C I N A 12 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 Ecologicamente viável A madeira certificada conquista cada vez mais adeptos, principalmente nos segmentos de arquitetura e design. Clara Wajss (11 3032-9661/3813-3998, clarawajss@uol.com.br), arquiteta formada pela Faculdade de Arquitetura Mackenzie, em 1974, é um exemplo dessa realidade. Clara produz design de mobiliário utilizando, além da madeira certificada, materiais como o aço-carbono, acrílico e poliestireno. "Cada material exige uma técnica diferenciada”, diz Clara, “cabe a nós, designers, conhecer as propriedades de cada material, suas qualidades e restrições, para que o projeto se torne exeqüível e atenda à função a que se propõe – agradar o gosto e o bolso do consumidor”, completa. Uma das vantagens da madeira certificada é que ela não agride o meio ambiente e ainda evita o trabalho ilegal de madeireiros, por isso é conhecida também como ecologicamente correta. Contudo, Clara comenta que a disponibilidade de madeira certificada ainda é limitada, apesar da demanda crescente. "A produção nacional é praticamente voltada para a exportação, inviabilizando seu uso em escala mais significativa no mercado interno pelo alto custo." Dentre seus trabalhos, há o porta CD Toyou, a estante Corner, o banco Revisteiro e o cabideiro Due, que procuram privilegiar o conceito de peças multiuso. Nos projetos, desde o material utilizado até seu uso funcional, tudo deve ser analisado cuidadosamente antes da execução. "Entre a concepção, o protótipoe sua viabilização comercial há um longo caminho a ser percorrido. Não é por menos que muitos projetos às vezes levam meses ou anos para se transformarem em produtos comercialmente viáveis", explica Clara. Fo to s: M ar ce lo S ca n d ar o li Peças divertidas e com preços acessíveis são características dos objetos da Nutsdesign (11 3159-0744, www.nutsdesign.com.br). Os sócios Orlando Facioli Júnior (orlando@nutsdesign.com.br) e Maria Cláudia Flora (flora@nutsdesign.com.br) apostam no lúdico para conquistar o público. "Essa é uma característica do nosso trabalho: o feeling para criar produtos inovadores e diferentes. Nós acreditamos que o design fica mais divertido dessa maneira", comenta Facioli. O consumidor gosta de tatear, manusear e adaptar as peças ao seu ambiente, o que pode favorecer as vendas, mas o preço ainda é decisivo. "A idéia é sempre deixar o design acessível. Acreditamos que todas as pessoas devam consumir esse tipo de produto", explica o designer. Bons exemplos desse trabalho são as luminárias Orange & Lemon Box, Baguette Lamp e o conjunto em madeira As Três Marias. "A Orange & Lemon Box começou como um brinde utilitário de fim de ano, que tinha como idéia mexer com o lúdico e remeter nossos clientes a uma brincadeira", explica Maria Cláudia. Feitas em polipropileno (plástico reciclável), podem ser encontradas nas cores laranja e verde, e possuem diferentes padronagens. A luminária, que venceu o Grand Prize em design no London International Advertising & Design Awards, em 2003, vem dobrada e quem monta é o consumidor. A Nuts Objeto trabalha também com madeira certificada (FSC), como no caso das Três Marias. Produzido com madeira Teka, o móvel pode ser utilizado separado ou em conjunto, como mesa de centro, de canto ou até mesmo como bancos. A NutsDesign, Objeto e a Internuts trabalham com o desenvolvimento de materiais promocionais, peças de decoração e mobiliários, sites, além de diversos outros segmentos. Fo to s: M ar ce lo S ca n d ar o li Lúdico e acessível JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 13 espessura do tampo: 2,5 cm altura dos pés: 30 cm diâmetro dos pés: 3,5 cm distância dos pés: 4 cm da borda M A D E I N 14 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 NACIONAL Ícone da gastronomia brasileira, o feijão preto é a inspiração para esse banco, desenvolvido pelos artistas plásticos Alessandro Jordão e Kiko Sobrino. Produzido em neoprene preto, couro branco e alumínio fundido, está à venda na Mãos Contemporary Art. MO 40593 ANIVERSÁRIO A série Bubble Lamps – com design de George Nelson – retorna às lojas em comemoração aos 50 anos do produto. O modelo Pear tem superfície acetinada e pode ser encontrado com 36 cm de diâmetro x 30 cm de altura. À venda na Dominici, nas versões pendente e abajur. MO 55717 ORIENTE PRÓXIMO Importado da China, o baú de estilo vietnamita pode ser utilizado como mesa de centro. Confeccionado em junco, palha ou bambu, o móvel está à venda nas lojas da Inter Studio, em dois tamanhos. MO 40594 MASSA MODELADA A poltrona Sirpol Gomos, da Bauhaus, é fabricada na Itália e confeccionada em camurça e alumínio. Mede 74 cm de altura x 82 cm de profundidade x 92 cm de largura. MO 40595 CALEIDOSCÓPIO A luminária Infinito, da Imaginarium, é ideal para ambientes que pedem decoração com variadas cores de lâmpadas. Tem moldura em alumínio e efeito que simula diversos pontos de luz. MO 40592 DANÇARINOS Com design de Paulo Alves, a mesa lateral Valsa, da Dpot, tem pés entrelaçados feitos de madeira maciça (sucupira, freijó ou imbuia). O modelo possui ainda variedade em tampos revestidos com laminado decorativo. Mede 70 cm de diâmetro x 70 cm de altura. MO 55719 SINUOSA Produzida na cor vermelha e com elementos em aço inoxidável, a cadeira S, projetada pela estudante peruana Giuliana Rebagliati, destaca-se por suas curvas. A peça feita com painel MDF foi premiada no Concurso Masisa de Design para Estudantes. MO 55830 UTILÍSSIMO Com design das estudantes Enólia Munhoz e Mariana Sassamori, o banquinho Sanduíche possui tampo superior, gaveta e base, intercalados por almofadas e elásticos retesados. Produzido com MDF e OSB, o móvel foi um dos finalistas no Concurso Masisa de Design para Estudantes. MO 55831 JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 15 16 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 aU R E S P O N D E escreva para: auresponde@pini.com.br O ETFE é conhecido comercialmente como Tefzel, marca da Du Pont e já é bastante muito utilizado no exterior. Selma Barbosa Jaconis, engenheira química e pesquisadora responsável pelo laboratório de plásticos e borrachas do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo), explica que o ETFE é um copolímero alternado de etileno e tetrafluoretileno. Em 1972, a Du Pont introduziu em sua linha o Tefzel – ETFE, que se destaca pela alta resistência a impactos e grande dureza. Esse tipo de material difere de outras resinas, como o náilon ou o polietileno, no que se refere ao processamento em si, porque ocorre a altas temperaturas, possui altíssima EM FEVEREIRO, AU PUBLICOU UMA REPORTAGEM SOBRE O PROJETO DO CENTRO NACIONAL DE NATAÇÃO, QUE ESTÁ EM CONSTRUÇÃO EM PEQUIM. O TEXTO DIZ QUE O EDIFÍCIO SERÁ REVESTIDO DE UM MATERIAL CHAMADO ETFE. QUE TIPO DE MATERIAL É ESSE? QUAIS SUAS PROPRIEDADES? Stevem Julié, Rio de Janeiro viscosidade e necessita ser contido em recipientes resistentes à corrosão. Sua densidade é de 1.70 g/cc e sua temperatura de fusão de 270ºC. "O ETFE apresenta boas propriedades elétricas e boa resistência a diferentes produtos químicos, além de ser resistente ao intemperismo natural", descreve Selma. Fornecido na forma de grânulos para extrusão e de pó para moldagem rotacional, o fluorpolímero modificado de etileno-tetrafluoretileno pode ser utilizado para aplicações em revestimento de cabos, componentes de bombas, válvulas, equipamentos para processos químicos, componentes elétricos e outros. Existem diversos cursos de marketing dirigidos para arquitetura, graças ao número crescente de profissionais interessados em aprender como negociar e vender projetos. O engenheiro Ênio Padilha, especializado em Marketing Empresarial pela UFPR (Universidade Federal do Paraná), informa que, na prática, os profissionais encontram um mercado muito diferente daquele descrito nos livros. “Conquistar mercado implica conhecer as regras não escritas e transitar EXISTEM CURSOS DE EXTENSÃO, PÓS-GRADUAÇÃO OU ESPECIALIZAÇÃO EM MARKETING VOLTADOS ESPECIFICAMENTE PARA ARQUITETOS? Mário Luiz Menezes, estudante, São Paulo por caminhos como o da gestão de negócios e da comunicação não-verbal", afirma o engenheiro. Portanto, os cursos podem permitir atualização e reposicionamento de profissionais diante do mercado. É claro que o marketing pessoal também influi nos negócios. "Os arquitetos dependem muito de sua imagem pública, principalmente porque os clientes não conseguem diferenciar entre as qualidades, conhecimentos, habilidades e valores do profissional, Im ag en s: P TW pessoa jurídica, e as do indivíduo, pessoa física", explica Padilha. Para quem quiser mais informações, a FAAP – Fundação Armando Álvares Penteado (11 3662-7449) oferece o curso de Administração de Empresas para Engenheiros e Arquitetos. A PINI e a Câmara de Arquitetos e Consultores de São Paulo (11 3868-3090) também disponibilizam em sua grade os cursos de Marketing para Arquitetura e Engenharia e Marketing Pessoal para Profissionais Liberais. ARPE EMPREENDIMENTOS E CONSTRUÇÕES SÃO PAULO, SP EDIFÍCIO SAM BANCO SANTOS 2003/2004 B R A S I L EFEITO VISUAL AÇO PATINADO ENVOLVE A EDIFICAÇÃO COMPOSTA POR TRÊS SOBRADOS ADAPTADOS TRANSFORMANDO-A EM UMA ESCULTURA EM PLENA MARGINAL DO RIO PINHEIROS, EM SÃO PAULO POR VÂNIA SILVA FOTOS THOMAS SUSEMIHL 36 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 C omo uma escultura, o bloco avermelhado formado por pla- cas de aço SAC 300 chama a atenção às margens do rio Pinheiros, em São Paulo. E criar uma obra que se destacasse no entornoera mesmo a intenção de Ary Perez, o responsável pelo projeto do edifício SAM-Santos Asset Management, que abriga o setor de investi- mentos do Banco Santos. Construído na mesma quadra da sede da empresa, o novo edifício é parte da iniciativa de modernização da marca. O bloco denso de aço fará o contra- ponto à leveza do prédio que está se erguendo ao lado, uma torre de vidro transparente. Engenheiro civil, mestre em arquitetura e artista plástico, Ary Perez é famoso por sua inventividade e não se convenceu em utilizar chapas de aço disponíveis no mercado. Procurou a Usiminas que criou placas de tamanho e espessura específicas para o proje- to. "Aqui prevaleceu meu lado artista e desen- volvedor de sistemas construtivos", declara. E, como uma grande escultura merece uma boa iluminação, o projeto de luminotecnia adota- do para a obra cria verdadeiras coreografias na fachada durante a noite, valorizando os tons e as formas do edifício. Perez aponta as vantagens de manutenção e durabilidade desse tipo de revestimento, des- tacando que, ao contrário do que possa pare- cer, as chapas de aço tiveram baixo custo. "O prédio é simples, barato e de grande efeito plástico. Parece caríssimo por causa do cobre misturado ao aço, mas esta foi a parte mais barata da obra. Custou cerca de 1/3 do sistema de ar-condicionado, por exemplo", calcula. A utilização desse tipo de aço pressupõe alguns cuidados se instalado em áreas exter- nas, porque a água da chuva adquire tom aver- melhado quando escorre pela chapa. Para evi- tar manchas no revestimento de piso, a facha- da termina a poucos centímetros do pavimen- to, onde foram instaladas canaletas de drena- gem cobertas por mosaico português em tom semelhante ao vermelho do aço. A solução resolveu o problema de manutenção e agregou efeito estético à área externa. O aço, sem dúvida, é o elemento principal da obra. Até mesmo a gradação dos orifícios nas chapas foi cuidadosamente estudada. "Eu pretendia deixar a fachada mais vazada, com maior quantidade de furos, mas o cliente pre- feriu maior privacidade, nem mesmo a som- bra das janelas deveria ser vista, porque ele queria perceber melhor o efeito de um bloco sólido de aço", explica Perez. Três sobrados foram adaptados para formar os 732 m² de área construída. Como resultado, foram criados corredores com grandes pare- A iluminação noturna valoriza a fachada do edifício revestido em aço transformando-o em uma escultura. Os orifícios abertos no metal foram feitos de forma a preservar ao máximo a privacidade das atividades realizadas no banco 38 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 B R A S I L ARPE EMPREENDIMENTOS E CONSTRUÇÕES SÃO PAULO, SP EDIFÍCIO SAM BANCO SANTOS 2003/2004 Nas áreas internas, o requinte necessário a uma instituição dessa natureza. A fachada de aço termina a poucos centímetros do piso, onde se encontra o sistema de drenagem com acabamento em pedras vermelhas de mosaico português. Uma árvore escultural foi estrategicamente implantada em frente ao edifício, quebrando a rigidez do aço JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 39 ARPE EMPREENDIMENTOS E CONSTRUÇÕES SÃO PAULO, SP EDIFÍCIO SAM BANCO SANTOS 2003/2004 B R A S I L 0 5 Rua Hungria 0 5 R u a D . E lis a P. d e B ar ro s Rua Hungria 0 5 AA Rua D. Elisa Pereira de Barros 0 5 Rua Hungria 0 5 Estrutura metálica Parafuso 10 mm brocante auto- atarrachante Arruela de pressão Tubo horizontal 100 x 100 mm Chapa de aço SAC 300 Pino 6 mm Parafuso 10 mm Arruela de pressão 40 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 corte AA corte BB implantação/térreo Detalhe da fixação das placas de aço nas fachadas JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 41 0 5 A A B B 0 5 A A B B 0 5 A A B B 0 5 1o pavimento laje técnica cobertura 2o pavimento 42 ARQUITETURA&URBANISMO MAIO 2004 ARPE EMPREENDIMENTOS E CONSTRUÇÕES SÃO PAULO, SP EDIFÍCIO SAM BANCO SANTOS 2003/2004 B R A S I L des metálicas e interligados por pontes desco- bertas. Portas automáticas de vidro foram colocadas nas extremidades das passarelas, assim, foi possível aproveitar a luz natural pro- veniente dessas aberturas. À noite, a luz que emerge por trás da facha- da tem intensidade controlada por dimmers, intercalando tons de verde, azul e rosa, colabo- rando para ressaltar o aspecto escultural do edifício. "A luz também é um elemento estru- tural. Aprendi isso com o Ingo Maurer", conta Perez. Ele diz ainda que quando o edifício de vidro estiver pronto deverá ser instalado um sistema integrado de controle de luzes, corti- nas e temperatura para os dois blocos. A fachada dupla proporcionou ao conjun- Os escritórios ganharam piso elevado e algumas paredes coloridas ajudam a quebrar a seriedade desses ambientes. A equipe responsável pelas operações de investimentos fica isolada por uma divisória de vidro para evitar a sensação de confinamento JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 43 to isolamento acústico – tão necessário para um edifício junto a uma via de tráfego inten- so – e isolamento térmico graças ao colchão de ar criado entre a parede e a chapa de aço. Passarelas de metal foram inseridas entre as duas fachadas para facilitar a manutenção e limpeza de placas, janelas e sistema de ilu- minação, sem prejudicar o funcionamento do edifício. Na parte interna do prédio, o piso elevado foi colocado no pavimento superior, onde estão os escritórios. A equipe responsável pelas operações de investimentos está afasta- da dos demais núcleos por uma divisória de vidro com isolamento acústico, o que garan- te privacidade sem causar sensação de confi- namento. Escadas tubulares, do tipo mais utilizado em galpões, assim como algumas paredes coloridas, quebram a seriedade do edifício. "Não queria algo convencional, então escolhi alguns elementos simples para conferir um aspecto mais informal ao ambiente", conta Perez. A pouca altura do pé-direito no piso térreo, cerca de 2,35 m, inviabilizou a instalação do ar-condicionado no forro. Perez, então, embu- tiu o equipamento em uma parede, atrás de uma grade de metal também desenhada por ele, por onde o ar circula. Discreta, a instalação passa quase despercebida. O piso térreo do SAM pode ser adaptado a múltiplos usos, como área de recepções e eventos, ou até mesmo para pequenas exposi- ções de arte. O autor do projeto revela que o banco pretende ampliar o número de edifícios no entorno e, portanto, o prédio revestido de aço pode ter caráter temporário e ser demoli- do daqui a alguns anos. Se isso acontecer, com certeza outras esculturas surgirão no mesmo local, sobre a mesma propriedade. Ary Perez é engenheiro civil formado em 1978 pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Mestre em Arquitetura pela Architectural Association de Londres, em 1983, e mestre em Construção Civil pela Escola Politécnica da USP, foi presidente da Asso- ciação Brasileira da Construção Industrializada (ABCI) e diretor do Centro de Engenharia Civil da Escola Politécnica da USP. Perez também atua em artes plásticas e design. Nessas áreas destaca-se a coordenação do projeto Arte Cidade Zona Leste, realizado em 2002, em São Paulo, e a exposição "Arqueologia Genética", apresentada na IV Bienal do Mercosul, em Porto Alegre, no ano passado. Em design, atual- mente, prepara o lançamento de uma série de cadeiras em homenagem ao arquiteto Rem Koolhaas. Inicialmente virá a poltrona S, depois a M, a L e a XL, referências ao aclamado livro S, M, L, XL (Small, Medium, Large, Extra Large), escrito por Koolhaas em 1995.As cadeiras terão fabricação da Tepperman e comercialização pela Firma Casa. FICHA TÉCNICA Arquitetura: ARPE – Empreendimentos e Construções – Ary Perez, Paula Bartorelli e Silvio Sguizzardi Colaboradores: Camila Oliveira (arquiteta), Fernando Lisboa, Luiz Felipe Bernardini e Nilton C. S. Rossi (estagiários) Interiores: Silvio Oppenheim Construção: Prósper Engenharia Consultor de acústica: João Gualberto Baring Projeto e instalação de ar-condicionado: Enthal Engenharia Projetos complementares: Enplatec Instalações elétricas e hidráulicas:Sanhidrel Projetos de estrutura metálica: Projeto Alpha Fabricação e montagem da estrutura metálica: Alufer Auditoria: Neo-Tec Consultoria Luminotécnica: DL Iluminação Instalação da fachada: Ferraz Mámores (logística e execução) *Veja fornecedores e endereços no final da revista SANTINI & ROCHA ARQUITETOS PORTO ALEGRE, RS POLIESPORTIVO PUC-RS 2001/2003 B R A S I L JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 45 PRONTO PARA SUPERAR LIMITES A VERTICALIZAÇÃO FOI A MELHOR SOLUÇÃO PARA ABRIGAR TODO O PROGRAMA DESSE GINÁSIO POLIESPORTIVO, O PRIMEIRO DO NOVO PARQUE DE ESPORTES DA PUC-RS POR VÂNIA SILVA FOTOS DANIEL MARTINON A complexidade do programa do ginásio poliesportivo da Ponti- fícia Universidade Católica (PUC) do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, foi um desafio para os profissionais envolvidos no projeto e execução da obra. O terreno de 5 hectares des- tinado às novas instalações do parque de espor- tes, que também incluía pista de atletismo e campo de futebol, ficou pequeno para conter toda a lista de equipamentos, da qual cons- tavam uma piscina olímpica com arquibanca- da, quadras de tênis e squash, quadras polies- portivas, salas de aula, laboratórios e vestiários. Assim, a solução encontrada pela equipe do escritório Santini & Rocha Arquitetos foi a ver- ticalização do edifício poliesportivo, que abriga a maior parte das necessidades. O projeto estru- tural da edificação de nove pavimentos e 19.204 m² de área construída mereceu menção no prê- mio Abece/Gerdau, promovido em 2003 pela Associação Brasileira de Engenharia e Con- sultoria Estrutural, pela solução de sustentação das lajes a partir do piso da piscina olímpica, realizada por treliças de aço e vigas protendidas. Além da complexidade do programa, a equi- pe de arquitetos teve de lidar também com o curto prazo para entrega da obra. "Tivemos 18 meses para terminar o trabalho, pouco tempo para a compatibilização dos projetos comple- mentares e execução da obra", diz Cícero Santini, sócio de Henrique Rocha no escritório. Mesmo assim, em busca da excelência, os arquitetos viajaram pelo País e para a Europa colecionando referências e visitando edifícios similares para conhecer as mais recentes tecno- logias de construção e materiais. Como as instalações serão utilizadas por todos os alunos da instituição, o programa de necessidades inicial foi elaborado pelas pró- reitorias de ensino de cada setor da universida- de, em conjunto com os arquitetos. Segundo Santini, foi preciso cerca de um ano para conso- lidar o programa e traduzir da melhor maneira os desejos dos clientes, cada um com suas necessidades específicas. Mas todo o esforço foi válido e o edifício ficou exatamente como pla- nejado. "Como fomos os responsáveis pelo gerenciamento de toda a obra e fiscalizamos a execução do projeto, foi possível detalhar ainda mais o programa durante a obra", diz Santini. O arquiteto acrescenta que parte da compatibili- zação dos diversos projetos complementares foi feita com a obra em andamento – caso das pis- cinas, cuja relação entre os sistemas hidráulicos e elétricos, além da própria definição de mate- riais, demanda mais tempo. O Edifício Poliesportivo está dividido em dois blocos com piso térreo comum. O bloco principal tem quatro pavimentos de grandes vãos e pé-direito de 7 m. Nele se concentram a piscina olímpica aquecida, três quadras polies- 46 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 SANTINI & ROCHA ARQUITETOS PORTO ALEGRE, RS POLIESPORTIVO PUC-RS 2001/2003 B R A S I L A piscina olímpica, com aquecimento a gás, tem arquibancada e visores subaquáticos. A quadra de tênis foi colocada no último piso para obedecer às medidas oficiais. Por não precisarem de pé-direito duplo, as quadras de squash foram instaladas na porção do edifício que tem pavimentos com 3,5 m de altura portivas, áreas para ginástica olímpica e artes marciais, além das quadras de tênis. O outro bloco acomoda áreas de circulação, quadras de squash, sanitários e vestiários, além de biblio- teca, auditório e laboratórios, todos com pé- direito de 3,5 m. Três piscinas menores para hidroterapia e hidroginástica foram instaladas no térreo, além de toda a infra-estrutura de equipamentos. Salas de aula e a administração da faculdade de educação física complemen- tam o programa. Esse arranjo em dois blocos com diferentes alturas de pé-direito resultou em um edifício bastante dinâmico. "A circulação visível permi- te melhor comunicação e facilita o encontro, característica muito importante para um edifí- cio dessa natureza", defende o autor. Aquecida e provida de arquibancada, a pisci- na olímpica (com 50 m x 20 m e 2 m de profun- didade) é o grande destaque do bloco principal. "No Brasil são poucas as piscinas cobertas e tér- micas desse porte", lembra Santini.A climatiza- ção foi necessária para garantir a prática da natação até nos meses de inverno, quando as temperaturas podem ficar abaixo de 0°C. O aquecimento da água é feito por caldeiras abas- tecidas por GLP, combustível que mais tarde poderá ser substituído por gás natural. Visores subaquáticos de vidro permitem o melhor acompanhamento do desempenho dos alunos durante os treinos. A quadra de tênis também tem as medidas- padrão internacionais, por isso precisou ser colocada no último piso. A cobertura de 60 m x 40 m é um arco metálico com 12 m de altura no centro e 7 m nas laterais. Os revestimentos de piso, em especial das quadras, precisavam ser eficientes, duráveis e econômicos. Assim, as quadras de tênis ganharam piso do tipo rápido cush, uma espécie de saibro com a última camada texturizada de forma antiderrapante. As quadras poliesportivas têm madeira flu- tuante e as salas de ginástica e artes marciais receberam revestimento de poliuretano auto- nivelante. Nos laboratórios foi aplicado revesti- mento vinílico e as áreas de piscina, circulação, escadas e vestiários são cobertas por cerâmica. Com 18 mil m², a área de atletismo e o campo de futebol ainda estão em construção e devem ficar prontos até o final do ano, segundo previ- são dos arquitetos. Sob esses equipamentos fica- rá o estacionamento, com 750 vagas. JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 47 48 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 B R A S I L SANTINI & ROCHA ARQUITETOS PORTO ALEGRE, RS POLIESPORTIVO PUC-RS 2001/2003 0 5 0 5 térreo 5o pavimento 3o pavimento 7o pavimento corte 9o pavimento JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 49 Estrutura Todo o Edifício Poliesportivo tem estrutura mista de concreto e aço. A solução para a sus- tentação da laje da piscina rendeu ao escritório VM Garcia, em parceria com a Tecnolínea Engenharia e França Estruturas Metálicas, uma menção no prêmio Abece/Gerdau, em 2003. O teto do pavimento da piscina é uma laje nervurada medindo 40 m x 60 m, de concreto com vigas protendidas, sem apoio de pilares. "Por isso, no andar sobre a piscina foram dis- postas vigas de aço de 40 m compondo uma treliça que faz a sustentação dessa laje", explica o arquiteto Cícero Santini. Assim, a laje sobre a piscina está apoiada no banzo inferior de treli- ças metálicas de 8 m de altura. "Há um pé-direi- to duplo nesses 8 m de treliça, então, o sexto pavimento se apóia no banzo superior", confir- ma o engenheiro Roberto Garcia, da VM Gar- cia, no relatório sobre o edifício. O sétimo pavimento se apóia nos pilares exter- nos e em pilares que nascem no banzo superior das treliças. "As treliças metálicas sustentam do te antigo e a liberdade e a credibilidade que nos deram foi fundamental para conseguirmos rea- lizar algo desse porte", comemora Santini. FICHA TÉCNICA Arquitetura: Santini & Rocha Arquitetos – Cícero Santini e Silva e Henrique Rocha Colaboradores: Luis Felipe S. Duarte e Rafael Artico (UMA Arquitetura) Gerenciamento, compatibilização e fiscalização: Santini & Rocha Arquitetos Projetos de detalhamento: Santini & Rocha Arquitetos e Quadrato Arquitetura – Eliane Salvi (PUC-RS) Prevenção de incêndio: Servincêndio Projeto e gerenciamento de climatização: Julio Curtis Filho Paisagismo: Helena Schanzer Luminotécnica: PauloKoch Instalações elétricas e hidráulicas: Voltenge Estrutura: Tecnolínea Engenharia, França Estruturas Metálicas, VM Garcia Programação visual: Midia Light – André Balle Execução: A Yoshii Engenharia Vigas de aço de 8 m de altura ocupam a área com pé-direito duplo e formam uma treliça que sustenta a laje da piscina, no pavimento inferior, e também o piso do sexto pavimento quarto ao oitavo pavimento", esclarece o enge- nheiro. Perpendicularmente às treliças existem vigas protendidas que se apóiam diretamente em seus banzos no quarto e sexto pavimentos.As tre- liças se apóiam nos pilares externos em um con- solo protendido, no sexto pavimento. Os arquitetos Cícero Santini e Henrique Rocha formaram- se pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 1977 e 1979, respectivamente. São sócios da Santini & Rocha desde 1978. Henrique é professor-titular do curso de Arquitetura e Urbanismo da PUC-RS e Cícero é presidente regional da ABDEH (Associação Brasileira para o Desenvolvimento do Edifício Hospi- talar), além de ter presidido a AsBEA-RS. Assim como no Poliesportivo da PUC, outras obras do escritório procuram a contemporanei- dade, com o uso de grandes vãos, curvas pon- tuais, cores e, quando possível, o metal. No caso do Poliesportivo, a concentração do programa facilitou a solução formal."A PUC já é um clien- BILL DUNSTER ARCHITECTS BEDDINGTON, LONDRES BEDZED 1999/2001 I N T E R N A C I O N A L EM UM MUNDO EM QUE PRESERVAR RECURSOS NATURAIS É CADA VEZ MAIS URGENTE, BILL DUNSTER CRIA PROJETOS AUTO-SUSTENTÁVEIS COM A MARCA ZED – ZERO (FOSSIL) ENERGY DEVELOPMENT – E CONVENCE MORADORES A MUDAR DE ESTILO DE VIDA POR BIANCA ANTUNES As casas, sempre voltadas para a face sul, recebem iluminação natural por todo o dia. A energia solar é captada pelas placas fotovoltaicas instaladas no último pavimento e que geram eletricidade para abastecer veículos elétricos. O design diagonal da face norte dos conjuntos impede que um bloco faça sombra no seguinte 50 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 POR UMA NOVA ATITUDE JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 51 Fo to s: B ill D u n st er A rc h it ec ts 52 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 BILL DUNSTER ARCHITECTS BEDDINGTON, LONDRES BEDZED 1999/2001 T rinta minutos de trem par- tindo da Victoria Station, em Londres, e se chega a Hack- bridge, estação mais próxi- ma ao BedZED, ao sul da capital britânica. Para encontrar o conjunto de residências e escritórios, é só perguntar a algum morador do bairro e ouvir algo como: "Siga reto até ver, à direita, umas chaminés coloridas nos telhados". Essas "chaminés colo- ridas", que se tornaram um marco do projeto e chamam a atenção logo à primeira vista, são, na verdade, um dos principais elementos do sistema de ventilação das casas. E fazem parte I N T E R N A C I O N A L PREOCUPAÇÃO COM MEIO AMBIENTE É MAIS QUE SLOGAN, É OPÇÃO DE VIDA da concepção do BedZED: baixo consumo de energia e auto-sustentabilidade. Aqui, preocupação com o meio ambiente é mais do que slogan, é estilo de vida. Cada parede levantada, sistema instalado ou mate- rial utilizado tem o objetivo de reduzir a necessidade de consumo de energia e de água, chegando a ponto de se renovar, aqui mesmo, os recursos naturais. No BedZED, a energia consumida é produzida no próprio local – ou JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 53 por meio de placas fotovoltaicas instaladas nas casas para captar o calor solar e transformá-lo em energia, ou por meio de uma miniestação, que utiliza lascas de madeira para produzir aquecimento e energia. Além disso, 50% da água é purificada e reutilizada. "Não fizemos essa escolha porque é bonito e está na moda. Tentamos produzir algo que fosse melhor e que proporcionasse aos moradores uma ótima qualidade de vida", explica o arquiteto Bill Dunster. Depois de planejar universidades e pré- dios de escritórios com alguns sistemas renováveis, o arquiteto resolveu apostar em um conjunto que reunisse todas as idéias – e surgiu o BedZED. Para começar, tudo muito compacto em um projeto que prima pela alta densidade demo- gráfica: são 240 moradores e 200 trabalhadores em uma proporção de 100 unidades por hecta- re (equivalente a 10 mil m2), construídas a um Nada de carros trafegando em frente às casas: entre os conjuntos, as passagens são exclusivas para os pedestres. Na face norte, sobre os escritórios, ficam os jardins, que proporcionam um microclima para pássaros, retêm água e servem como proteção térmica 1 Divisória que evita a mistura do ar que entra com o que sai 2 "Costeleta" / cilindro-padrão do duto em cada lado da chaminé 3 Parte da chaminé que fica à mostra no telhado 4 Seção da câmera que incorpora duto de 150 mm de diâmetro 1 2 3 4 BILL DUNSTER ARCHITECTS BEDDINGTON, LONDRES BEDZED 1999/2001 I N T E R N A C I O N A L 54 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 1 coletor de água da chuva 2 ventilação eólica das unidades 3 painéis fotovoltaicos para abastecer veículos 4 miniestação de energia 5 água quente 6 eletricidade 7 aparelhos de baixo consumo de energia 8 depósito de água da chuva 9 tratamento de água 10 tanque séptico 11 bacias de baixo consumo custo de 15,7 milhões de libras, menos de 90 milhões de reais. As residências podem ter de um a três dormitórios, há escritórios e, ainda, unidades que mesclam residência e local de trabalho. A idéia, com a otimização de espa- ços, é evitar a elevada ocupação de terras e do que ainda existe de vegetação no Reino Unido. "O que normalmente estaria espalhado, aqui nós integramos: centro de vivência, bar, cre- che, horta e até um café", conta Dunster. Diferentemente de outros projetos de alta densidade, o BedZED aposta no meio ambien- te – um dos exemplos são os jardins ao ar livre. Cada unidade residencial possui o seu, instala- do na cobertura dos escritórios – é só atraves- sar uma pequena ponte para ter acesso ao jar- dim. Além disso, adotou-se o "telhado verde" na cobertura das edificações, com plantação de gramíneas de funções múltiplas: proporcio- nam um microclima para pássaros (que não existiria em um telhado tradicional), retêm água para o sistema de drenagem, servem como proteção térmica, além de serem bonitas visualmente. Mudança no estilo de vida Transporte e alimentação também influen- ciam no cotidiano dos moradores. Carros, por exemplo, são malvistos e, se for para ter um, que seja o movido a energia elétrica (há pon- tos de abastecimento no local, servidos pelas placas fotovoltaicas). Para minimizar a neces- sidade de viagens, há acordos com supermer- cados e com fazendas de produtos orgânicos, que fazem menos jornadas para abastecer a maioria dos moradores. No acesso às casas o uso de automóvel é proibido: o objetivo é separar, ao máximo, o veículo e a moradia. Para situações de emergência, os moradores contam com um "clube do carro", em que se pode alugar um veículo por algumas horas. Nenhuma dessas restrições é um bicho-de- Sistema de tratamento de água Sistemas elétricos e de água 1 2 3 5 6 78 9 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 10 11 4 1 reator anaeróbico 2 drenagem de sujeira (tanque fechado) 3 zona de baixo teor de oxigênio 4 reator aeróbico fechado 5 reatores aeróbicos abertos 6 clarificador 7 câmaras ecológicas 8 "água verde" para reuso 9 tanque de biossólidos 10 sedimento para reciclagem 11 descarga de material limpo JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 55 sete-cabeças para os moradores, visto que a região é bem-servida por linhas de ônibus e trens – infra-estrutura essencial para um pro- jeto com esses conceitos. "Tentamos mostrar que é fácil e conveniente iniciar um novo esti- lo de vida", diz Dunster. Para Dunster, o grande desafio arquitetôni- co foi conseguir unir todas as idéias, que pos- suem forte relação técnica e matemática com o meio ambiente. Os escritórios, por exemplo, abdicam do ar-condicionado. A solução, ao integrá-los com as casas, foi voltá-los para a face norte, à sombra das residências de três pavimentos (os escritórios têm apenas dois pavimentos), sempre seguindo a lógica da otimizaçãodos recursos naturais. Assim, podem receber ilu- minação solar por todo o dia, através das grandes áreas envidraçadas e da abertura superior, com vidros triplos, que admitem a luz, mas não o calor. Os jardins das casas, em cima dos escritórios, servem também para garantir o isolamento térmico, visto que pos- suem um solo compacto com 300 mm de terra e plantas. A integração de escritórios e casas permitiu redução nos custos de cons- trução e economia de energia. Já as casas, voltadas para o sul, recebem durante todo o dia a incidência de raios solares graças ao design diagonal do lado norte do pré- dio que não faz sombra. Essa disposição das casas permite que as placas fotovoltaicas fiquem no terraço e nas janelas com vidro duplo do último pavimento. As paredes, por sua vez, garantem isolamento térmico, pois são consti- tuídas por uma parte de blocos de concreto de alta densidade colocados na parte interna, mais 300 mm de lã mineral, com fechamento em blo- cos cerâmicos. As janelas também ganham camada extra de isolação, com vidros triplos e sistema de vedação com borrachas. Com isso, estima-se ganho de 30% nas necessidades com equipamentos de aquecimento. "As paredes garantem que a casa conserve a temperatura no inverno e não fique muito quente no verão", explica Dunster. Para evitar que o ar fique confinado foi cria- do um sistema de ventilação especialmente para o BedZED, com base na energia eólica. Em cima das casas, uma chaminé colorida – que se O BedZED precisa de apenas 1/10 da energia normalmente prevista para aquecimento e tem metade a 1/3 de necessidades elétricas, se comparado a residenciais típicos britânicos. O conjunto é auto-sustentável, produzindo energia própria. As placas fotovoltaicas fornecem energia solar para abastecer 40 carros elétricos que percorram cerca de 16 mil km por ano. Há, ainda, uma miniestação que produz, simultaneamente, calor e energia, utilizando lascas de madeira que seriam queimadas – chamada, aqui, de Woodchip CHP (Combined Heat and Power). O princípio e os equipamentos são idênticos a uma estação de combustível fóssil, com a diferença de que se utiliza madeira para produção de gás. Essas lascas são entregues semanalmente por um caminhão e estocadas em um galpão. São, posteriormente, secas, colocadas no gaseificador e transformadas em gás combustível, que contém hidrogênio, monóxido de carbono e metanol. O gás é, então, limpo, misturado com ar e, assim, alimenta o gerador que produz eletricidade. Todo esse processo produz calor, e, como nada aqui é desperdiçado, ele serve para aquecimento – dutos cobertos por material isolante levam a água aquecida até as casas. A miniestação é projetada para produzir 130 kW de eletricidade e 260 kW de calor, utilizando 20 t de lascas de madeira por semana. ENERGIA RENOVÁVEL 1 secagem 2 lascas de madeira 3 gaseificador 4 carvão vegetal 5 limpeza do gás 6 motor 7 calor 8 tubo da chaminé 9 medidor de eletricidade 10 alternador 11 unidade de autodesconexão 12 eletricidade para os edifícios 1 2 3 4 7 8 9 10 11 12 5 6 56 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 BILL DUNSTER ARCHITECTS BEDDINGTON, LONDRES BEDZED 1999/2001 I N T E R N A C I O N A L térreo elevação norte implantação elevação sul JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 57 1o pavimento 2o pavimento corte cobertura 58 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 BILL DUNSTER ARCHITECTS BEDDINGTON, LONDRES BEDZED 1999/2001 I N T E R N A C I O N A L transformou em marco do projeto e faz fama no bairro – gira de acordo com o vento. Materiais corretos De que adiantaria montar um projeto que economize energia se os produtos utilizados vêm de longe e, por isso, gastam no trans- porte e poluem? Ou, ainda, se precisam pas- sar por processos fabris que despendam energia? Tudo isso foi levado em conta no BedZED. Os elementos estruturais têm vida útil de, pelo menos, 120 anos. E, sempre que possível, optou-se por reciclados ou por recursos sustentáveis e ecologicamente cor- retos. Todas as madeiras eram reutilizadas ou vinham de reflorestamentos e foram aprovadas por organizações responsáveis por avaliar a procedência. Além disso, prio- rizaram-se os materiais produzidos em uma área de até 56 km do empreendimento. Assim, produtos tradicionais da região foram valorizados – como o carvalho e os tijolinhos que revestem as fachadas. Outra alternativa foi usar reciclados, como os steel frames, que foram desman- chados e refabricados, assim como o concre- to usado nas fundações. Tudo para diminuir gastos energéticos. Uma das grandes exceções na busca por produtos sem energia embutida na fabricação foi o alumínio. O que motivou a escolha foram suas características, como a durabilidade. O material protege as partes mais expostas da edificação (dobrando a vida útil) e não neces- sita de acabamento. Em forma de folhas, o alu- mínio cobre as grandes aberturas de ilumina- ção e emoldura os vidros que admitem luz natural na face norte das casas. As pequenas pontes que levam ao jardim, as sacadas e os corrimãos de aço galvanizado foram desenhados para evitar detalhes com- plexos e caros. Transparência e durabilidade contaram na hora de escolher o design dos produtos e, de quebra, minimizar pinturas com alto grau de toxidade. As residências foram vendidas com a maio- ria dos eletrodomésticos e equipamentos. O banheiro, por exemplo, possui bacias de baixo consumo e funcionam com água tratada. Os chuveiros também são especiais – junto com Acima e abaixo, vistas das opções de sala de estar que integram o condomínio. Embora compactas, as unidades são espaçosas e fartamente iluminadas. Na outra página, trecho das áreas entre as edificações, onde o tráfego de automóveis é proibido JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 59 a água, há um jato de ar que reforça a vazão da ducha e garante uma economia de 11 mil litros por ano. A cozinha, pré-fabricada, conta com refrigera- dor, freezer e lavadoras totalmente eficientes no uso de água e energia.A lavadora, por exemplo, se comparada com um modelo britânico tradicional, reduz o consumo de água entre 12 e 17 mil litros anuais, além de economizar de 250 a 385 kWh de eletricidade por ano. As madeiras da cozinha são maciças – não foram utilizados compensados,que são mais sensíveis à umidade, e menos saudáveis, principalmente para pessoas com problemas res- piratórios. Há, ainda, boxes para separação de lixo reciclável, que chega a 60% do total do BedZED. E é na cozinha que ficam os relógios de luz e água: assim, fica fácil medir e controlar o consumo. Bacias sanitárias, dutos de irrigação e máquinas de lavar usam água da chuva, cap- tadas por tubos que ficam no topo da edifica- FICHA TÉCNICA Arquitetura: Bill Dunster Architects Incorporador: Peabody Trust Soluções de sustentabilidade: BioRegional Design de sustentabilidade: Bill Dunster Architects Serviços de água e energia: Arup Engenharia estrutural e infra-estrutura: Ellis & Moore Construção e administração de custos: Gardiner & Theobald Instalação fotovoltaica: BP Solar AU LEITURAS www.bedzed.org.uk www.peabody.org.uk www.zedfactory.com From A to Z: Realizing Zero (fossil) Energy Developments, Bill Dunster Architects, ZEDfactory, 2003, 171 páginas. ção e estocada em tanques no subsolo, após serem filtradas. Para reduzir drasticamente o consumo de água, o BedZED também trata o esgoto. Há, no mesmo galpão de produção energética, uma central de purificação de água. E, sur- preendentemente, tudo é feito por plantas. São sete tanques com jardins hidropônicos no topo, o que possibilita crescimento de organismos que vão "limpar" a água. O pri- meiro tanque, fechado, elimina o odor. Do segundo ao quinto tanque – todos abertos e cobertos por plantas – há um processo aeró- bico que purifica a água. O sexto tem a fun- ção de clarear a água. No sétimo, ocorre nova filtragem e, a partir daí, pode ser usada em bacias sanitárias e irrigação de jardins. O BedZED é a prova que, com um pouco de vontade, é possível construir um mundo mais eficientee humanizado. 60 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 43 o SALÃO DO MÓVEL DE MILÃO ITÁLIA 2004 I N T E R I O R E S DO MINIMALISMO AO BARROCO O AMBIENTE DE TRABALHO SE PARECE COM A CASA, ENQUANTO ESTA PASSA A VALORIZAR A CONVIVÊNCIA EM DETRIMENTO DA APARÊNCIA. O MINIMALISMO DE OUTROS ANOS DÁ LUGAR A UM CERTO BARROCO E, EM MEIO A TUDO ISSO, A COMIDA SE TRANSFORMA EM OBJETO DE DESIGN NAS RUAS DE MILÃO POR MARISA BARDA A função foi uma questão bas- tante discutida por vários designers e arquitetos nesta 43a edição do Salão do Móvel de Milão, ocorrida de 14 a 19 de abril. Entrevistas e análises tentam refletir sobre discursos e objetos produzidos desde o pronunciamento do dogma de Mies Van der Rohe, less is more. Toda essa discussão nasce de uma crise de idéias generalizada – afinal, uma Il B ag n o /B at h ro o m crise econômica mundial provoca crise de idéias principalmente em um setor como o design, que necessita do apoio do marketing e dos negócios. Por outro lado, essa crise de idéias é responsável pelo retorno às tendências orgânicas e às morfologias que não são atribuí- das a nenhuma corrente. Existe certa tendência a uma volta ao barro- co – ou a um excesso de expressividade – após a prevalência do minimalismo durante alguns anos. Provavelmente, devido ao momento crí- tico mundial que estamos vivendo. Na moda isso sempre foi muito evidente: modelos magérrimos desfilam em tempos de prosperi- dade, enquanto as formas mais abundantes surgem na realidade de uma crise. Isso sempre aconteceu em todos os setores e provavelmen- te é assim no design: minimalismo em perío- dos prósperos, barroco em períodos críticos. O design italiano significa qualidade de proje- to,inovação tecnológica,flexibilidade das empre- sas, disponibilidade das capacidades e "saber criativo". O todo faz parte de uma situação histórico-antropológica que dificilmente pode ser reproduzido em outro lugar do mundo. Alguns sociólogos, como Enrico Finzi, falam inclusive de lifestyle ou até de the art of living well. Tendências sobre a casa Estamos a caminho da maior revolução do ambiente doméstico dos últimos 100 anos, uma revolução globalizada. Seja em Berlim, Londres ou Nova York, a tendência é a mesma e prega que a "AINDA EXISTE QUEM ACREDITA QUE A ÚNICA FUNÇÃO DO DESIGN SEJA O FUNCIONALISMO" GILLO DORFLES JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 61 casa é para ser vivida e não para ser exibida.Não é uma questão de moda, mas de um novo estilo de vida, pois se ampliam os espaços destinados ao banheiro e ao quarto,reduzindo-se a sala.A inten- ção aqui é criar um spa em formato residencial. No quarto desaparecem os criados-mudos rigi- damente simétricos dos dois lados da cama,subs- tituídos por uma escrivaninha com o PC. Na sala, em vez da mesa de centro, usa-se um maxipufe onde você pode sentar e,ao mesmo tempo,apoiar a bandeja do café. E o sofá, bem profundo, serve mais para se deitar do que para sentar. Na cozinha, o lugar mais moderno da casa, a tímida mesa de apoio é substituída por uma de dimensões razoáveis, a única da casa, onde se trabalha, se janta e se convidam os hóspe- des para conversar – sem acanhamento. E, coerentemente, o fogão e a pia não estão no perímetro das paredes, mas centralizados, para não se dar as costas para ninguém. As cores ácidas, como o verde e o laranja, predominam sobre os beges, junto com o aço. O vintage, isto é, peças clássicas do passado recente, continua a sobressair-se com entu- siasmo por ser a solução das incertezas. A idéia por trás de tudo isso é estar sempre ligado com o mundo lá fora e poder fazer tudo sem sair do lugar. O conformismo dos anos 80 não existe mais, o importante é uma casa per- sonalizada. Essa é a colocação de vários teóri- cos e designers milaneses de renome como Antonio Citterio, Massimiliano Fuksas e Píerluigi Cerri. ...e sobre o escritório Luz, cores, tecidos macios, formas sinuosas, escrivaninhas sobre rodas: uma atmosfera residencial transferida para o ambiente de tra- balho. Os espaços severos, cinzas e assépticos, serão substituídos por outros que mais pode- rão lembrar clubes. É importante dar ao ambiente de trabalho uma atmosfera relaxan- te, desenvolver o gosto pela estética e fantasia, acrescentar ao móvel do escritório uma emo- ção próxima à do ambiente doméstico. Segundo Domenico De Masi, hoje, o traba- lho que requer somente racionalidade pode ser feito por máquinas e, ao homem, fica somente o trabalho criativo, um conjunto de racionalidade e emotividade. É a partir disso que se torna imperativo recuperar a esfera emotiva nos ambientes de trabalho. Assim, em plena era pós-industrial, tenta-se fazer uma síntese: a emotividade fornece fantasia e a racionalização fornece concretizações. O food design versus o fast food Street dining design foi a exposição organiza- da este ano pela revista italiana Interni, em cola- boração com o Salão do Móvel de Milão, e rea- lizada na Trienal de Milão. Seguindo sempre uma linha condutora temática – no ano passado eram dez espaços projetados para o bem-estar – este ano o protagonista é a cozinha. Sob a ótica de uso criativo do espaço urbano foram convi- dados dez arquitetos conceituados para projetar os dez espaços de quiosques monotemáticos. Em um ambiente cenográfico projetado pelo Studio Azzurro foram ambientados os dez bote- quins, cada um com específicos projetos de espaço que abrangiam da estética do ambiente à embalagem, da comunicação visual à apresenta- ção dos alimentos inventados especialmente para a ocasião. Com esse percurso, a exposição procurou criar relações interligadas e pensadas sobre a arte de comer, o espaço urbano e o design. A relação entre food e design (alimento e forma) nasce de um profundo enlace entre o amor pela preparação e pela apresentação das comidas e bebidas, o que até poucos anos era privilégio do sushi. Ao lado, ambiente da mostra Il Bagno. Acima, parte da exposição Eimu.2004 - Work & Emotion, de mobiliário para escritório: atmosfera residencial no ambiente de trabalho Ei m u .2 00 4: W o rk & E m o ti o n 62 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 43 o SALÃO DO MÓVEL DE MILÃO ITÁLIA 2004 I N T E R I O R E S Sempre nessa idéia de food e design outro even- to, o Dining Design, organizado pelo Salão do Móvel, buscou relacionar a alimentação, o modo e o projeto. Organizada pelo arquiteto Adam D. Tihany, o percurso se abre com diversas e gigan- tescas projeções de célebres nomes ligados à cozi- nha internacional, que revelaram alguns de seus segredos de culinária. Uma retrospectiva sobre cadeiras projeta- das por designers importantes de várias épo- cas e, para completar, um restaurante criado pelo food artist Nir Adar, onde nada era apre- sentado por acaso, nem as guloseimas prepa- radas, nem a cenografia que permitia andar em cima das mesas. A cada três dias, um esti- lista preparava a mesa com toalhas, pratos e acessórios, criando uma dining experience. Completa o percurso a Street of restaurants, “rua” dedicada aos restaurantes do futuro, com projetos de dez escolas e universidades cujo objetivo era promover um pequeno tour gastronômico pelo mundo. Cada escola tinha um tema para criar um reencontro étnico diferente, em sintonia com o lugar a ser reali- zado: um restaurante francês em Tel Aviv, um Chinês em Roma, um japonês em Helsinki, um café vienense em Brighton, um bistrô em Torino, uma pizzaria em Kioto, um wine bar em Tribeca (Nova York), uma steakhouse em Sidney, um karaokê sushi bar em Lausane. A mostra Street Dining Design, organizada pela revista Interni, apresentou ambientes relacionando a arte de comer, o espaço urbano e o design D in in g d es ig n D in in g d es ig n JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 63 No espaço da feira Muita coisa está mudando no sistema do design, seja no interior de suas estruturas, seja na percepção do público consumidor. Há mais de um ano, grandes grupos de empreen- dedores, italianos ou estrangeiros, e não necessariamente ligados ao mundo da moda, começaram a comprar as marcas mais conhe-cidas do design italiano. Por um lado é um sinal positivo que mostra o potencial crescimento do setor. Por outro, provoca radicais transformações em um setor cujas relações são diretas entre empreendedor e projetistas. Tudo coincide com um mercado global e transversal. Os 185 mil visitantes de 158 países e os 3.300 jornalistas que cobriram o Salão excederam as expectativas e demonstraram que o quadro negativo do ano passado foi superado. Os expo- sitores foram 1.900 em 197 mil m² que hospe- daram quatro setores diferentes de design: 1) o Salão Internacional do Móvel e o Complemento d'Arredo, com 1.600 exposi- tores em 149 mil m², subdivididos em qua- tro estilos formais: clássico, moderno, design e fusion 2) Eurocucina, com 150 expositores em 27.800 m² 3) Eimu, com 160 expositores em 20.500 m² 4) Il Bagno e Tessile per la Casa, que, depois do sucesso obtido no ano passado, duplicou, com 4.400 m² e 72 expositores. O Salone Satellite confirma a própria vocação de "caçador de talentos" trazendo 440 jovens projetistas, dos quais 155 são italianos. No- vamente, o espaço foi ambientado pelo arquite- to pernambucano Ricardo Bello Dias. Além disso, durante a ocasião foi apresenta- da a 5a Edição do Convênio Internacional Designing Designers. E pelas ruas da cidade... Arquitetos e designers se envolveram em iniciativas que, entre o lúdico e o inútil, ocu- param as ruas de Milão. No espaço do estilista milanês Trussardi foi encenado um reality show com Night Shift, em que uma cama exposta na vitrine transforma-se em palco, onde todos podem se expressar. O público torna-se protagonista e as encenações foram filmadas e transmitidas ao vivo, tanto no Salão do Móvel quanto na entrada da Trienal. O design se ampliou, passou pela moda e agora está na cozinha, onde o próprio ali- mento se torna objeto de design. Parece que a inventividade do objeto tradicional se exauriu e passou a se concentrar em outras áreas. Esta edição do Salão é um convite para se pensar sobre a autocelebração do design e não esquecer as raízes. Diversos chefs de cozinha, de renome internacional, estiveram presentes em espaços alternati- vos organizados especialmente para a oca- sião. Em toda a cidade triunfou a combina- ção comida-design. Na doceria mais antiga e prestigiada foi celebrado o bolo de grife: 23 designers foram convidados pela revista italiana de interiores Case da Abitare para redesenhar doces. Em uma rua somente para pedestres, a cada dia eram apresenta- dos novos "biscoitos de design". Foi uma alegre anarquia que prevalece este ano, com um design todo a ser "experimentado". Salão Internacional do Móvel/ Salone Internazionale del Complemento d'Arredo clássico design moderno fusion espaço Tessile per la casa Il Bagno – Bathroom Eurocucina Eimu.2004 Work & Emotion Salão Satélite Entradas para exibições e imprensa Mapa da feira M ar co P iv a 64 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 43 o SALÃO DO MÓVEL DE MILÃO ITÁLIA 2004 I N T E R I O R E S LANÇAMENTOS A linha de cadeira, poltrona e chaise-long Lofty, da MDF Itália, tem design de P. Cazzaniga e peças em aço polido O armário Layout, da Alias, tem linhas orgânicas em alumínio e design de Michele De Lucchi Fo to : M D F It ál ia Fo to : M D F It ál ia Fo to : L u ca T am b u rl in i JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 65 Acima, produtos da Kartell e ambientes da grife Dolce & Gabbana, onde imperam as cores vivas. Abaixo, cadeira Meridiana, da Dríade. O designer Christophe Pillet criou a peça com estrutura de aço cromado e assento em policarbonato nas opções transparente, fluorescente ou branco. A versão para áreas externas tem estrutura com pintura branca Fo to : K ar te ll/ D o lc e e G ab an a Fo to : D rí ad e Fo to : K ar te ll Fo to : K ar te ll 66 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 43 o SALÃO DO MÓVEL DE MILÃO ITÁLIA 2004 I N T E R I O R E S Da B&B, a linha Simplice Collection – Maxalto tem cama com cabeceira de material reciclado trançado, mesinha em diversos tamanhos e formas além de escrivaninha de madeira que pode acomodar um PC. Design de Antonio Citterio. Ao lado, o divertido chuveiro Al-Dente, da Agape. Linhas orgânicas e transparência valorizam as peças da série Paesaggi Italiani, de Edra. Fo to : B & B It ál ia Fo to : Á g ap e Fo to : E d ra JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 67 A poltrona Lazy, de Patrícia Urquiola é destaque da B&B. A estrutura de metal recebe revestimentos variados em tecido e couro perfurado (no detalhe). Abaixo, o sofá Phoenix, de Moroso Fo to : B & B It ál ia Fo to : B & B It ál ia Fo to : M o ro so It ál ia 68 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 43 o SALÃO DO MÓVEL DE MILÃO ITÁLIA 2004 I N T E R I O R E S A banqueta El-vis foi criada pela dupla Cécile Toitzky e Achille Habay para a Ghaadé. Em polipropileno, com assento regulável e depósito interno, a El-vis é produzida em cinco cores e pesa 2,8 kg. Ao lado, painel de automóvel, desenhado pela equipe de designers da Fiat. A linha de dormitórios Quasar Big Bang, da Cia. Internacional, que faz o máximo aproveitamento de espaço com beliche que acomoda uma escrivaninha Fo to : F ia t/ A le ss i Fo to : D iv u lg aç ão /G h aa d é Fo to : C ia In te rn ac io n al JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 69 O showroom da Dríade encontra-se em um palácio – o Gallarati Scotti, do século 17. Na ocasião do 43o Salão do Móvel, foi inaugurado um projeto de ampliação e reforma da loja. O projeto é do arquiteto colombiano Mauricio Cardenas Laverde, que trabalhou durante certo período com Renzo Piano. O showroom não é uma loja convencional, mas, sim, um espaço onde também acontecem exposições e encontros culturais. Com a ampliação, que ocupou espaços vizinhos, sempre no mesmo edifício, foram criados percursos que atravessam o espaço de uma rua para outra paralela, conferindo novas perspectivas e luminosidade à loja. Além disso, um amplo pátio interno foi coberto para Novo showroom Dríade poder ser usufruído o ano todo. A leveza e transparência da nova cobertura em vidro curvo e aço não tiraram a sensação de espaço aberto e dialogam em harmonia com os elementos históricos do edifício. Fo to : D iv u lg aç ão /D rí ad e e M au ri ci o C ar d en as E N T R E V I S T A 70 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 SÉRGIO FERRO GRIGNAN, FRANÇA 2004 PODERIA SER A MAIOR DAS ARTES ARTISTA CONSAGRADO INTERNACIONALMENTE, O ARQUITETO SÉRGIO FERRO PODE, COM AUTORIDADE, DIZER O QUANTO DE ARTE EXISTE – OU DEVERIA EXISTIR – EM ARQUITETURA. AOS PERCALÇOS DO CAPITAL FINANCEIRO SENTENCIA: “É SUICÍDIO”. À ARQUITETURA DESCONSTRUÍDA DE NOSSA ÉPOCA REFLETE: “É LOUCURA...” POR SIMONE SAYEGH FOTO MARCELO SCANDAROLI ivendo na França desde 1972, Sérgio Ferro continua a abalar os principais pilares do exercício da arquitetura no Brasil e no mundo. Há quem prefira "não entender" o que ele diz a ter que se despojar dos privilégios autorais que acompanham a profis- são.As idéias de Sérgio Ferro levam tempo para serem digeridas e, quando pensamos neste mundo digital, onde tudo é rápido, descartável e obsoleto, tornam-se quase impossíveis. No en- tanto, chegando mais perto, percebemos que Sérgio Ferro nada mais é que um grande huma- nista.E que por trás da simplicidade com que de- fine arte e vida está um profundo conhecimento dos porquês da sociedade capitalista em que vivemos. "O que faremos depois de Ferro?", poderão se perguntar alguns arquitetos.Atrás de seu cigarro sem fumaça, com voz discreta e mansa, ele simplesmente responderia: "Descon- fiem sempre e façam arte". Sérgio Ferro Pereira nasceu em Curitiba, em 25 de julho de 1938, e concluiu o curso científico em São Paulo.Ingres- sou na FAUUSP em 1957 e, como aluno, par- ticipou de uma série de concursos de arquitetura e mostras de pintura.Em 1960,junto com o cole- ga de faculdade Rodrigo Lefévre, morto em 1984, projetou um conjunto de edifícios para a nova capital do País. O trabalho em conjunto possibilitouaos dois arquitetos desenvolverem grande parte das idéias progressistas caracterís- ticas do grupo Arquitetura Nova,formado com a entrada do arquiteto e cenógrafo Flávio Império, posso me vestir por inteiro".Em recente visita ao Brasil,concedeu entrevista à AU.A seguir,um re- sumo da conversa. aU SUAS IDÉIAS NOS LEVAM A QUES- TIONAR A POSIÇÃO DA ARQUITETURA DIANTE DAS ARTES. O QUE O SENHOR CONSIDERA ARTE, AFINAL? sérgio ferro Eu utilizo sempre uma definição de arte de Willian Morris, designer e pensador do século 19.Arte é a manifestação da alegria no trabalho, apesar da contradição nas palavras, pois trabalho vem de 'tripalium',um instrumen- to de tortura. E essa alegria não é possível sem liberdade. Então, arte é a manifestação do tra- balho livre, no qual o autor tem diante de si o material específico de seu ofício e define, sem influência estrangeira, o que quer fazer. aU À LUZ DESSA DEFINIÇÃO, É POSSÍVEL CONCEITUAR O QUE SEJA BOA ARTE, BOA ARQUITETURA? sérgio ferro A boa arte é aquela que com- preende melhor as possibilidades do material e, com liberdade, leva essas possibilidades além. O material tem suas próprias exigências e possibili- dades. E é muito mais fácil entender isso na ar- quitetura,que exige material e execução específi- cos. Mas apesar disso, 99,9% da produção atual não é arte. A arte, entendida dessa maneira, é marginal e será sempre marginal enquanto a lógica do capital impuser à produção a marca da alienação, da dominação estrangeira. Tudo é co- morto em 1985. O conceito-chave do trabalho dos três baseava-se na valorização dos esforços humanos, muitas vezes menosprezados pela matéria. O intercâmbio de idéias resultou em obras executadas a um custo baixo, a partir de um melhor aproveitamento dos materiais e téc- nicas construtivas disponíveis, resultado da Poética da Economia criada pelo trio. Graduado em 1961, Ferro passa a lecionar na própria FAU USP. Ao mesmo tempo, continua seu trabalho como arquiteto e pintor, com obras que procu- ravam denunciar as condições sociais geradas pelo subdesenvolvimento do País. Sua veemente crítica político-social teve um preço: a prisão em 1970, durante o regime militar, sendo solto um ano depois. Em abril de 1972 muda-se para a França e torna-se professor da Escola de Ar- quitetura de Grenoble, onde vive até hoje. Em 1979 é publicado no Brasil seu famoso livro O canteiro e o desenho, que reúne ensaios publica- dos desde 1972 e sintetiza a mais contundente preocupação de Ferro: a exploração da mão-de- obra em favor do capital. Na obra, disseca a lógi- ca da dominação imposta aos operários e traba- lhadores da construção civil, além de reforçar a idéia da produção como saída para uma so- ciedade mais humanizada e justa.Ferro multipli- cou seus trabalhos como pintor e,hoje,em para- lelo à docência,participa de exposições coletivas e individuais. Também promove conferências, escreve livros e ensaios. E, diante dessa pro- dução, insiste em afirmar: "Arte é a coisa mais simples que existe. É o trabalho com o qual eu V JUNHO 2004 ARQUITETURA&URBANISMO 71 O autor de O Canteiro e o Desenho continua a causar desconforto com sua crítica à exploração da mão-de-obra e ao cada vez maior afastamento entre a concepção e a produção. Abaixo, três exemplos da aplicação das idéias de Ferro junto ao Grupo Arquitetura Nova, que incluía Rodrigo Lefévre e Flávio Império: as residências Boris Fausto, à esquerda, Juarez Brandão Lopes, no centro, e Pery Campos A ce rv o Pe sq u is a G ru p o A rq u it et u ra N o va . Fo to : R en at o A n el li A ce rv o R o d ri g o L ef év re A ce rv o F lá vi o Im p ér io E N T R E V I S T A 72 ARQUITETURA&URBANISMO JUNHO 2004 SÉRGIO FERRO GRIGNAN, FRANÇA 2004 mandado por essa vontade externa à produção, que é o dinheiro. A pintura, a escultura e outras artes estão valorizadas atualmente porque, teori- camente, são os últimos domínios nos quais ainda é possível um trabalho livre.Teoricamente, porque quando se torna uma oposição ao traba- lho não-livre, perde a liberdade. É muito comum na história da pintura que o artista,que é artesão, negue essa condição. Para isso, vive de olho no trabalho que não lhe diz respeito,no trabalho es- cravo, tentando fazer o contrário ao artesanal. Acaba perdendo a liberdade,essencial à arte. aU ENTÃO, A OBRA DE ARQUITETURA PODE ESTAR DESTINADA A FICAR FORA DO CAMPO DAS ARTES.... sérgio ferro Atualmente é raríssima a obra de arquitetura que possa ser chamada de obra de arte. Simplesmente porque aquele que projeta e pensa não é o mesmo que manipula,não é aque- le que faz, que transforma a matéria.Arte é uma idéia concreta, efetivada no material. É o mo- mento de encontro entre o humano e o não-hu- mano. E no material já existe muito de humano. E dessa união nasce a alegria. aU ENTÃO O ARQUITETO, PARA PRO- DUZIR ARTE, DEVE CONSTRUIR COM SUAS PRÓPRIAS MÃOS O ESPAÇO CON- CEBIDO? sérgio ferro O eu criador varia de arte para arte. O eu da pintura e da escultura é unitário, o eu da arquitetura é coletivo, social, composto do arquiteto e dos produtores. Por isso, talvez a ar- quitetura devesse ser a maior e a melhor das artes. Porque não apareceria mais o ego isolado de cada um de nós, de cada arquiteto, mas sim a subjetividade humana compartilhada. aU COMO ELIMINAR A IDÉIA DE CRIADOR INDIVIDUAL AO CONCEBER UM PLANO, UM DESENHO PRÉVIO PARA AS EQUIPES DE CONSTRUÇÃO? sérgio ferro Uma coisa é criar no escritório e depois mandar fazer. Outra é escutar as possibili- dades advindas de cada equipe de trabalho e pro- mover a colaboração entre parceiros. O projeto pode e deve estar aberto no momento de sua con- cepção para uma transformação, uma modifi- cação, pois nenhuma previsão consegue antever todas as possibilidades que surgem no momento da realização.Daí a necessidade de colaboradores que participem da criação do projeto global e se sintam realmente responsáveis pelo que estão fazendo. Cada equipe de especialistas atuando com liberdade,responsabilidade e cooperação. aU DESSA MANEIRA, A IDÉIA DA CRIA- ÇÃO COMO PRIVILÉGIO INDIVIDUAL DILUI-SE NA AÇÃO COLETIVA.... sérgio ferro Todo o meu trabalho valoriza o momento produtivo. Se o momento de pro- dução e gestação for rico, fértil e livre, aparecerá no resultado a liberdade e a riqueza da con- cepção. A temporalidade da criação é diferente do tempo medido no relógio.A carga do conhe- cimento do passado, a ação do presente e a in- tenção do futuro estão contidas em um simples gesto de talhar a pedra. Todas as dimensões do tempo estão gravadas em cada momento de pro- dução e podem ser reconstruídas pela percepção de um outro ser humano,ao tomar conhecimen- to dessa marca no objeto, espaço ou produto. Se nós conseguirmos falar uns aos outros dessa maneira, o maior momento será o da produção, quando o espírito humano impregna o material e produz uma coisa única. aU A PRODUÇÃO COLETIVA DA ARTE, QUASE SEM AUTOR, NÃO EXIGIRIA MUITO DESAPEGO PARA UMA SO- CIEDADE INDIVIDUALISTA COMO A NOSSA? sérgio ferro Não foi sempre assim. O indivi- dualismo exacerbado de hoje tem profundas razões históricas.A Revolução Francesa promul- gou uma lei horrorosa que dizia que todos os ho- mens são livres, iguais e irmãos e, portanto, es- tavam proibidas as associações, sindicatos e agremiações,que foram sistematicamente fecha- dos. É a ultravalorização da individualidade. Todos deveriam enfrentar o mercado sozinhos, em nome da liberdade. Mas, ao mesmo tempo, existem exemplos de outras sociedades que va- lorizaram o coletivo. Na sociedade indígena, por exemplo, a fronteira entre o eu e o coletivo é muito tênue.Na Grécia antiga,a noção do indiví- duo fechado não existia. Até o século 12 ou 13 não existia a noção de autoria, não existiam as intermináveis notas de rodapé para explicar as citações.As idéias estavam disponíveis,eram so- ciais,não conferiam autoria às produções. aU QUAL O INTERESSE DE SE FAZER AR- QUITETURA DESSA MANEIRA? QUAL O RESULTADO? sérgio ferro Algo muito simples,
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