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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS – CCSA DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL LENIMAR MOURA ROCHA COSTA O SERVIÇO SOCIAL E O TERCEIRO SETOR: Uma reflexão acerca dos desafios e possibilidades do/a Assistente Social na APAE/Natal NATAL/RN 2019 LENIMAR MOURA ROCHA COSTA O SERVIÇO SOCIAL E O TERCEIRO SETOR: Uma reflexão acerca dos desafios e possibilidades do/a Assistente Social na APAE/Natal Monografia apresentada como parte dos requisitos exigidos para fins de obtenção do Título de Bacharel em Serviço Social na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Orientadora: Profa. Me. Mônica Maria Calixto NATAL/RN 2019 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA Elaborado por Eliane Leal Duarte - CRB-15/355 CDU 364-57 RN/UF/Biblioteca do CCSA 1. Serviço Social - Monografia. 2. Terceiro setor - - Monografia. 3. Pessoa com Deficiência. I. Calixto, Mônica Maria. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título. Costa, Lenimar Moura Rocha. O serviço social e o terceiro setor: uma reflexão acerca dos desafios e possibilidades do/a Assistente Social na APAE/Natal / Lenimar Moura Rocha Costa. - 2019. 78f.: il. Monografia (Graduação em Serviço Social) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Departamento de Serviço Social. Natal, RN, 2019. Orientador: Profa. Me. Mônica Maria Calixto. LENIMAR MOURA ROCHA COSTA O SERVIÇO SOCIAL E O TERCEIRO SETOR: Uma reflexão acerca dos desafios e possibilidades do/a Assistente Social na APAE/Natal Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Serviço Social. Aprovado em 18/06/2019 BANCA EXAMINADORA _______________________________________________ Profº. Me. Mônica Maria Calixto Orientadora UFRN/DESSO _______________________________________________ Profº. Me. Fernando Gomes Teixeira Membro UFRN/DESSO _______________________________________________ Profª. Drª. Márcia Maria de Sá Rocha Membro UFRN/DESSO NATAL 2019 Para Márcio, Manuella, Lourdes Maria e Benjamin. Com todo meu amor e gratidão, todas as minhas conquistas são dedicadas a vocês. AGRADECIMENTOS Agradeço, primeiramente a Deus, que permitiu ao longo da minha vida pessoal e acadêmica ter força e coragem para superar todas as dificuldades e chegar até ao final da graduação. A minha família, sendo Márcio Azevedo Dias (Esposo); Manuella Rocha Costa; Lourdes Maria Rocha Dias (Filhas) e Benjamin Rocha Rego (Neto), que foram compreensivos e me encorajaram nas horas difíceis, fortalecendo e dando apoio para que eu chegasse até esta etapa de minha vida. Aos familiares em geral, em especial aos meus pais: Maria de Lourdes Moura Rocha (Mãe) e Luiz de Souza Rocha (Pai) e, meus irmãos: Lindonete, Lindemberg, Luciano, Lindomar, Wellington, Leodécio e Maria Luisa, que com muito carinho sempre me compreenderam. Aos meus amigos (as) da UFRN, que contribuíram direta ou indiretamente para o meu desenvolvimento acadêmico. Obrigada por cada momento, estudo paciência e crescimento. A toda equipe profissional da APAE/Natal pela oportunidade de estágio obrigatório, especialmente a minha orientadora de campo: Nilma Pereira de Lima dos Santos. A minha professora e orientadora acadêmica Mônica Maria Calixto e, a todos os professores do curso pela enorme paciência, orientação e atenção, muito obrigada! Deixo aqui meus sinceros agradecimentos a todos aqueles que de alguma forma contribuíram e me ajudaram para que a conclusão deste trabalho fosse possível. Vocês foram de suma importância para o meu desenvolvimento profissional, obrigada por cada orientação, incentivo e segurança que me passaram durante todo o processo de construção do conhecimento. 'Deficiente' é aquele que não consegue modificar sua vida, aceitando as imposições de outras pessoas ou da sociedade em que vive sem ter consciência de que é dono do seu destino. 'Louco' é quem não procura ser feliz com o que possui. 'Cego' é aquele que não vê seu próximo morrer de frio, de fome, de miséria, e só tem olhos para seus míseros problemas e pequenas dores. 'Surdo' é aquele que não tem tempo de ouvir um desabafo de um amigo, ou o apelo de um irmão. Pois está sempre apressado para o trabalho e quer garantir seus tostões no fim do mês. 'Mudo' é aquele que não consegue falar o que sente e se esconde por trás da máscara da hipocrisia. 'Paralítico' é quem não consegue andar na direção daqueles que precisam de sua ajuda. 'Diabético' é quem não consegue ser doce. 'Anão' é quem não sabe deixar o amor crescer. E, finalmente, a pior das deficiências é ser miserável, pois: 'Miseráveis' são todos que não conseguem falar com Deus. Mario Quintana RESUMO A presente monografia tem por objetivo geral analisar o Exercício Profissional do Serviço Social nas entidades que configuram Terceiro Setor a partir da inserção na APAE/Natal. A pesquisa buscou compreender os aspectos históricos e políticos do Serviço Social no Brasil; analisar o exercício do assistente social no Terceiro Setor, e problematizar o serviço social na APAE/Natal. Aborda os aspectos históricos e políticos do serviço social a partir de reflexões sobre a gênese da profissão no Brasil, destacando a trajetória do Serviço Social no contexto Brasileiro, o Projeto Ético Político do Serviço Social e Luta contra o conservadorismo, evidenciando a reconfiguração dos espaços sócio ocupacionais dos Assistentes Sociais e as exigências da Profissão na Contemporaneidade que caracterizam o fazer profissional do Assistente Social. Discute-se, ainda, o Exercício Profissional do Assistente Social no Terceiro Setor dando ênfase a APAE/Natal e os avanços das políticas públicas voltadas para os direitos fundamentais das pessoas com deficiência no Brasil. O percurso metodológico está baseado na pesquisa qualitativa e foi realizada por meio de pesquisa bibliográfica e documental. Assim, priorizou-se a revisão da literatura sobre o objeto de pesquisa, principalmente no que se refere ao conhecimento assimilados durante a graduação em Serviço Social e no período de estágio curricular obrigatório. Dentre os resultados obtidos, destaca-se que o serviço social da APAE/Natal trabalha fundamentado no Código de Ética do Assistente Social e nos princípios fundamentais em que contempla a profissão, com vistas à garantia dos direitos sociais e políticos da população usuária, o que proporciona ao Assistente Social trabalhar de forma planejada e articulada com outros profissionais, desenvolvendo distintas possibilidades de atuação profissional. PALAVRAS-CHAVE: Serviço Social. Terceiro Setor. Pessoa com Deficiência. ABSTRACT The purpose of this monograph is to analyze the Professional Work of Social Service in the entities that make up the Third Sector from the insertion in the APAE / Natal. The research sought to understand the historical and political aspects of Social Service in Brazil; analyze the exercise of the social worker in the Third Sector, and problematize the social service in the APAE / Natal. It addresses the historicaland political aspects of social service based on reflections on the genesis of the profession in Brazil, highlighting the trajectory of Social Service in the Brazilian context, the Political Ethical Project of Social Service and Fight against conservatism, highlighting the reconfiguration of social spaces occupations of the Social Wizards and the demands of the Profession in the Contemporaneity that characterize the professional work of the Social Worker. It also discusses the Professional Worker of the Social Worker in the Third Sector, emphasizing the APAE / Natal and the advances of public policies focused on the fundamental rights of people with disabilities in Brazil. The methodological course is based on qualitative research and was carried out through bibliographical and documentary research. Thus, we prioritized the literature review on the object of research, especially with regard to knowledge assimilated during graduation in Social Work and in the period of compulsory curricular traineeship. Among the results obtained, it is worth noting that the APAE / Natal social service is based on the Code of Ethics of the Social Worker and on the fundamental principles of the profession, with a view to guaranteeing the social and political rights of the user population. allows the Social Worker to work in a planned and articulated way with other professionals, developing different possibilities of professional performance. KEY WORDS: Social Work. Third Sector. Disabled People. LISTA DE SIGLAS ABEPSS – Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa e Serviço Social ACB – Ação Católica Brasileira APAE – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais BPC – Benefício de Prestação Continuada CBAS – Congresso Brasileiro de Assistente Sociais CEAS – Centro de Estudos e Ação Social CFESS – Conselho Federal de Serviço Social CNAS – Conselho Nacional do Serviço Social CONADE – Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência CRESS – Conselho Regional do Serviço Social CRI – Centro de Reabilitação Infantil EUA – Estados Unidos da América FEAPAESS – Federações Estaduais das APAES FENAPAES – Federação Nacional das APAES IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados LBA – Legião Brasileira de Assistência LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais MÉTODO BH – Método Belo Horizonte MG – Minas Gerais ONGs – Organização Não Governamental OS – Organizações Sociais OSCIP – Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público BPC – Benefício de Prestação Continuada SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas SEMTAS – Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência Social SME – Secretaria Municipal de Educação SMS –Secretaria Municipal de Saúde SUS – Sistema Único de Saúde UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte https://www.pessoacomdeficiencia.gov.br/app/conade https://www.pessoacomdeficiencia.gov.br/app/conade SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ................................................................................ 12 2. ASPECTOS HISTÓRICOS E POLÍTICOS DO SERVIÇO SOCIAL: REFLEXÕES SOBRE A GÊNESE DA PROFISSÃO NO BRASIL . 16 2.1 Trajetória do Serviço Social no Contexto Brasileiro .................... 16 2.2 O Projeto Ético Político do Serviço Social e a Luta Contra o Conservadorismo ................................................................................ 25 2.3 A Reconfiguração dos Espaços Sócio Ocupacionais dos Assistentes Sociais e as Exigências da Profissão na Contemporaneidade ............................................................................ 33 3. O EXERCÍCIO DO ASSISTENTE SOCIAL NO TERCEIRO SETOR: O CASO DA APAE/NATAL ........................................................... 41 3.1 O Novo Trato a Questão Social e o Terceiro Setor como Mudança no Cenário Político ............................................................................... 41 3.2 O Avanço das Políticas Públicas Voltadas para os Direitos Fundamentais das Pessoas com Deficiência no Brasil ........................ 46 As ONGs e o Papel do Assistente Social na Conjuntura Social e Política .............................................................................................................. 52 3.3 O Serviço Social na APAE: Demandas e Possibilidades do Exercício Profissional ........................................................................... 58 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................... 69 5. REFERÊNCIAS .............................................................................. 72 12 1. INTRODUÇÃO: Na conjuntura atual verifica-se a importância de se discutir a temática do Serviço Social e do Terceiro Setor, considerando os avanços das desigualdades sociais na sociedade brasileira. Por sua vez, as análises sobre o Serviço Social e o Terceiro Setor demonstram que a implementação das políticas de assistência social se dá a partir dos desdobramentos da Constituição Federal de 1988 nos diversos seguimentos da sociedade. Nesse sentido, o presente trabalho trata de analisar o Serviço Social e o Terceiro Setor, pesquisando a partir da reflexão dos desafios e possibilidades do/a Assistente Social na Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Natal (APAE/Natal). É público e notório que a profissão de Assistente Social tem como objeto de intervenção as expressões no campo da questão social, em que o profissional busca conhecer e analisar a realidade, para poder intervir em propostas criativas, críticas e construtivas a fim de contribuir para a efetivação dos direitos de cidadania. Nessa linha, no Projeto Ético Político do Serviço Social, a predominância teórica e metodológica da profissão foi vinculada a um projeto de transformação da sociedade e luta por direitos sociais e por políticas no contexto da cidadania no âmbito da sociedade capitalista e suas contradições. De acordo com a abordagem feita por Iamamoto e Carvalho (2014), compreendemos que a questão social é a contradição maior do modo capitalista de produção e reside no fato de que quem produz não se apropria das riquezas oriundas do seu trabalho e sua produção. Contudo, esta questão não se refere somente às desigualdades sociais geradas por essa contradição, mas, também, na resistência da classe trabalhadora, adquirida através de sua consciência de classe e entrada no cenário político da sociedade, buscando através da luta organizada nos movimentos sociais, notadamente, do movimento sindical e, também, dos partidos políticos para se fazer reconhecer como classe pelo Estado e pela classe burguesa. Cabe frisar que a crise do sistema capitalista, a partir da década de 1970 tem aprofundado o embate de classes e a disputa pelo poder político do Estado tem favorecido a transferência de responsabilidades do setor público para o setor privado e, ao mesmo, modificado a ordenação das políticas públicas 13 em desfavor da maioria da população que tem sucumbido para o pleno desenvolvimento da política neoliberal, caracterizada pele precarização e privatização das políticas sociais. É nesse contexto que o Terceiro Setor surge passando por interesses classistas, e, inclusive, de empresas que visam o desenvolvimento da filantropia organizacional e outros fatores para a difusão de uma boa imagem, mediante a sociedade. O Terceiro Setor é definido por Montaño (2010, p.182) “como organizações cunhadas de procedência norte-americana, por intelectuais orgânicos do capital o que sinaliza claramente a ligação com os interesses de classes, nas mudanças demandadas pela burguesia”. Vale salientar que as organizações denominadas Terceiro Setor, são relativamente novas chamadas Organizações Não-Governamentais (ONG’s), além das fundações,entidades beneficentes, os fundos comunitários, entidades sem fins lucrativos, associações de moradores, entre outros. O Terceiro Setor é um novo campo sócio ocupacional do Assistente Social, em que surge com novas exigências e demandas ao profissional de Serviço Social que é cada vez mais solicitado e é onde está situada a experiência na qual apontamos neste estudo, ou seja, a APAE/Natal. Para poder apreender as demandas e possibilidades de atuação do Serviço Social na Natal/APAE, tendo como particularidade a experiência de estágio, entende-se ser importante realizar uma breve descrição da instituição na qual se deu esse processo. A APAE/Natal é uma instituição de natureza organizacional não governamental, sem fins lucrativos e de caráter filantrópico, presta atendimento de habilitação e reabilitação das pessoas com deficiência, que além do acompanhamento pedagógico é efetuado o atendimento clínico, sendo estes atendimentos extraescolar, ou seja, a APAE/Natal não tem a atribuição de escola, sua função é de reabilitação física e intelectual dos usuários com necessidades especiais. A pesquisa a ser realizada contemplará um levantamento bibliográfico, cujo enfoque serão livros, monografias, artigos e documentos que examina o objeto de pesquisa. Dessa maneira, o projeto evidencia uma abordagem de natureza qualitativa, embasando-se não apenas para expor o objetivo da pesquisa, mas, acima de tudo, propor uma reflexão sobre o serviço 14 social e o terceiro setor, especialmente o exercício profissional do Assistente Social na APAE/Natal. Gerhardt (2009, p. 32) comenta a pesquisa qualitativa explicitando dessa forma: A pesquisa qualitativa preocupa-se, portanto, com aspectos da realidade que não podem ser quantificados, centrando-se na compreensão e explicação da dinâmica das relações sociais. Para Minayo (2001), a pesquisa qualitativa trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. Portanto, esse trabalho de conclusão de curso tem por objetivo geral analisar o Exercício Profissional do Serviço Social nas entidades que configuram o Terceiro Setor a partir da inserção na APAE/Natal. E, como objetivos específicos, compreender os aspectos históricos e políticos do Serviço Social no Brasil, analisando o exercício do profissional em assistência social no Terceiro Setor e, ao mesmo tempo, problematizar o Serviço Social na APAE/Natal. A escolha do tema partiu do processo de formação enquanto estudante de Serviço Social, evidenciando o estágio curricular obrigatório na APAE/Natal no período de julho de 2017 a junho de 2018, o qual despertou inquietações a respeito das contradições sobre o Terceiro Setor e sua Relação com o Estado, bem como as demandas e possibilidades do exercício profissional no âmbito da assistência social. O trabalho monográfico irá discutir os aspectos Históricos e Políticos do Serviço Social a partir da trajetória do Serviço Social no contexto brasileiro, o Projeto Ético Político e a luta contra o conservadorismo, bem como a reconfiguração dos espaços sócio ocupacionais dos Assistentes Sociais e as exigências da profissão na contemporaneidade. Alguns autores utilizados serão Iamamoto e Carvalho (2014), Piana (2009) comentando a respeito da Assistência Social na gênese da profissão. Barroco (2012) salientando os códigos de ética. Netto (2005) expressando os momentos históricos das insatisfações e indagações do serviço social, entre outros autores importantes. 15 Além disso, a discussão irá centrar no exercício do Assistente Social no Terceiro Setor dando ênfase a APAE/Natal, analisando o novo trato a Questão Social e o Terceiro Setor como mudança no Cenário Político; o avanço das Políticas públicas voltadas para os direitos fundamentais das pessoas com deficiência no Brasil; as ONGs e o papel do Assistente Social na conjuntura social e política e da mesma maneira, as demandas e possibilidades do exercício profissional do Serviço Social na APAE/NATAL. Alguns autores utilizados serão Pastorini (2010) sobre a categoria de questão social. Castel (1998) estabelecendo uma nova questão social na realidade. Iamamoto (2007) constatando uma renovação da ‘velha questão social’. O Terceiro Setor definido por Montaño (2007) e Santos (2007). Bernardes (2012) comentando sobre avanços dos Direitos da Pessoa com Deficiência no marco legal federal, bem como os estudos de Capistrano (2018) a respeito da APAE. 16 2. ASPECTOS HISTÓRICOS E POLÍTICOS DO SERVIÇO SOCIAL: REFLEXÕES SOBRE A GÊNESE DA PROFISSÃO NO BRASIL: Neste capítulo pretendemos abordar os aspectos históricos e políticos do serviço social a partir de reflexões sobre a gênese da profissão no Brasil. Vale destacar que iremos elucidar a trajetória do Serviço Social no contexto Brasileiro, o Projeto Ético Político do Serviço Social e Luta contra o conservadorismo, evidenciando a reconfiguração dos espaços sócio ocupacionais dos Assistentes Sociais e as exigências da Profissão na Contemporaneidade que caracterizam o fazer profissional do Assistente Social. 2.1 Trajetória do Serviço Social no contexto Brasileiro A trajetória do Serviço Social no contexto brasileiro parte dos problemas provenientes da crise capitalista na década de 1920 cujo ápice se deu com a queda da bolsa de valores de Nova York em 1929 e que teve repercussões a nível mundial. No Brasil, a partir da década de 1930, podemos destacar as mudanças que estavam ocorrendo no âmbito econômico, político e social, sendo as mais relevantes o deslocamento da agricultura exportadora para as atividades industriais, gerando uma larga escala de industrialização, bem como a substituição da mão-de-obra por imigrantes nas regiões econômicas mais ativas. Portanto, a implementação do Serviço social se dá a partir dos desdobramentos da questão social1, a qual será analisada nesse trabalho, a partir da abordagem feita por Iamamoto e Carvalho (2014) que consideram que a expressão da contradição maior do modo capitalista de produção reside no fato de que quem produz não se apropria das riquezas oriundas do seu trabalho 1 [...] entender a ‘questão social’ é de um lado, considerar a exploração do trabalho pelo capital e de outro, as lutas sociais protagonizadas pelos trabalhadores organizados em face desta premissa central à produção e reprodução do capitalismo. Conjugadas, essas premissas derivam em expressões diversificadas da ‘questão social’ em face das quais cabe sempre um processo de investigação a fim caracterizá-la enquanto ‘unidade na diversidade’; ou seja, devemos nos esforçar, como categoria, para apontar as características e ‘formas de ser’ de cada expressão da ‘questão social’ enquanto fenômeno singular e, ao mesmo tempo, universal, cujo fundamento comum é dado pela centralidade do trabalho na constituição da vida social (SANTOS, 2012, p.133). 17 e sua produção. Contudo, esta questão não se refere somente às desigualdades sociais geradas por essa contradição, mas, também, na resistência da classe trabalhadora, adquirida através de sua consciência de classe e entrada no cenário político da sociedade, buscando através da luta organizada se fazer reconhecida como classe pelo Estado e pela classe burguesa. Assim, o Serviço Social dá-se nesse processo histórico, como sucessão de acontecimentos políticos, econômicos e sociais onde a classe dominante atua politicamente e ideologicamente para manter a ordem vigente, através do poder do Estado e tendo a Igreja como importante aliada para amenizar os conflitos sociais surgidos em decorrência das contradiçõesgeradas pelo modo de produção capitalista, ou seja, o Assistente Social é engendrado como estratégia para garantia e prevenção de conflitos vigentes no modo de produção capitalista e sob a ordem e o interesse do capital. Portanto, a reorganização do capital se evidencia desse modo mediante a utilização das funções do Estado nas relações entre as classes sociais, gerando as condições propicias para um aumento da acumulação das riquezas por meio da expansão do proletariado, e consequentemente o aumento das desigualdades sociais entre burguesia e classe operaria. A exploração abusiva que o operariado é submetido – afetando sua capacidade vital – e luta defensiva que o operariado desenvolve aparecerão para o restante da sociedade burguesa [...] como uma ameaça a seus valores, “moral, a religião e a ordem pública”. Impõe se, a partir desse momento, a necessidade do controle social da exploração da Força de Trabalho. A compra e venda dessa mercadoria especial deve sair da pura esfera mercantil pela imposição, através do Estado, de uma regulamentação jurídica no mercado de trabalho. (IAMAMOTO E CARVALHO, 2014, p. 134). Os autores acima destacam que as Leis Sociais representam a parte mais importante dessa regulamentação, pois por meio dos grandes movimentos sociais, foram visibilizados para a sociedade as terríveis condições de vida do proletariado, obrigando a classe dominante, Estado e a Igreja a posicionar-se em torno da questão social. Com o fim da República Velha, o início da era Vargas e a aceleração do processo de industrialização que favoreceu diretamente para a ampliação da urbanização e aumento da classe proletária, o Estado passa a atuar na 18 perspectiva da mediação dos conflitos de classe, garantindo a acumulação do capital e criando estratégia para a desorganização do movimento popular em crescimento, conforme nos esclarece Iamamoto e Carvalho (2014, p.161): O Estado assume paulatinamente uma organização corporativa, canalizando para sua órbita os interesses divergentes que emergem das contradições entre as diferentes frações dominantes e as reivindicações dos setores populares, para, em nome da harmonia social e desenvolvimento, da colaboração entre as classes, repolitizá-las e discipliná-las, no sentido de se transformar num poderoso instrumento de expansão e acumulação capitalista. A política social formulada pelo novo regime – que tomará forma através de legislação sindical e trabalhista – será sem dúvida um elemento central do processo. Nesse contexto, a posição da Igreja é de apoio as forças políticas que possuía interesse no regime liberal, porém, a partir doa anos 1930 preocupada em consolidar sua ordem junto da disciplina social permite uma ação política mais abrangente no sentido de fazer valer uma grande diversificação e ampliação dos movimentos católicos. Nesse mesmo período, as instituições religiosas mais desenvolvidas se afirmam e se destacam com o fortalecimento da Ação Católica Brasileira – ACB que se articulam com o intuito da recuperação da hegemonia ideológica da Igreja Católica, e preocupados com as formações de seus componentes implementam cursos e seminários de estudos a um grupo de jovens religiosas. Por sua vez, o Centro de Estudos e Ação Social – CEAS se apresenta com o objetivo de promover um estudo aprofundado dos problemas sociais e como uma iniciativa para promover a formação e a filantropia das classes dominantes a fim de dinamizar as mobilizações e intervir diretamente junto ao proletariado. Com a expansão da Ação Social verifica-se como a gênese do Serviço Social está diretamente ligada à igreja Católica, em servir os mais necessitados e inspiradas na caridade cristã na qual deveria estar recristianizando as pessoas e as adaptando dentro da sociedade. Em 1936 com a necessidade de uma formação técnica especializada para a prestação de assistência é fundada a primeira escola de Serviço Social em São Paulo, que posteriormente tem novas demandas oriundas das instituições estatais, e assim se aplica a política de encaminhamentos com o 19 Serviço social de casos individuais como método central. Iamamoto e Carvalho (2014, p. 185) expressa sobre os acontecimentos desse período: Em 1938 será organizada a Seção de Assistência Social, que tendo por finalidade “realizar o conjunto de trabalhos necessários ao reajustamento de certos indivíduos ou grupos as condições normais de vida”, organiza para tal: o Serviço Social dos Casos Individuais, a Orientação Técnica das Obras Sociais, o Setor de investigação e Estatística e o Fichário Central de Obras e Necessitados. Nesse período, a fim de garantir o controle social por meio de recursos de assistencialismo e o de responsabilização do indivíduo pela sua condição, isto é, o método central em casos individuais, o objetivo das assistentes sociais se caracteriza numa linha de ajustar politicamente e ideologicamente a classe trabalhadora aos princípios da classe dominante. No decorrer dos anos 1940 o Brasil passa por um momento de crescimento econômico e uma vez que a demanda por Assistentes Sociais diplomados aumenta, surgem diversas escolas de serviço social nas capitais dos Estados, assim como emergem congressos que reuniam representantes das principais entidades particulares ligadas a assistência e ao serviço social. Nesse cenário, emergindo da ideia do desenvolvimentismo dos países latino americanos e reconhecendo a necessidade de uma revisão teórico- metodológica de sua ação profissional, o serviço social passa a ser influenciado pelo caráter positivista e tecnicista do Serviço Social Norte-Americano, sob atuação de Mary Richmond com o Serviço social de caso, grupo e comunidade. Nessa linha, Piana (2009, p. 33) comenta que: As exigências de tecnificação do Serviço Social são atendidas, mantendo-se a mesma razão instrumental: busca-se uma maior qualificação dos procedimentos interventivos, utilizando-se, inclusive, fundamentos advindos da Psicologia, na expectativa de que os profissionais, assistentes sociais fossem capazes de executar programas sociais com soluções consideradas modernizantes para o modelo desenvolvimentista adotado no Brasil. Essa legitimação profissional perpassa a emergência do assalariamento, e as novas demandas que surgem na ocupação na divisão sócio técnica do trabalho, assumindo no mercado de trabalho funções de coordenação 20 e de planejamento de programas sociais. Vale salientar que nesse contexto histórico ainda há a referências as bases da doutrina social da igreja católica, e como expressa Barroco (2003) o Serviço Social traduz sua ação profissional por meio, de uma ética vinculada à moral conservadora e dogmática segundo a base ideológica neotomista, contudo, com a formação profissional nas disciplinas de filosofia e ética surge documentos que marcam o posicionamento da profissão. [...] Os “problemas sociais” são concebidos como um conjunto de “disfunções sociais”, julgados moralmente segundo uma concepção de “normalidade” dada pelos valores cristãos. A tendência ao “ajustamento social”, a psicologização da questão social, transforma as demandas por direitos sociais em “patologias”; com isso, o Serviço Social deixa de viabilizar o que eticamente é de sua responsabilidade: atender às necessidades dos usuários, realizar objetivamente seus direitos. (BARRACO, 2003, p. 94). Em 1947 surge o primeiro código de ética da profissão, em que Barroco (2012) destaca a eminente vinculação do Serviço Social com a doutrina social da Igreja Católica, sendo extremamente doutrinário e subordinado aos dogmas religiosos. Nos primeiros anos da década de 1960, a crescente instabilidade política e a aceleração da inflação intensificaram as tensões, e com um cenário de mudanças políticas e econômicas observa-se grandes transformações, especialmente na América Latina,com a Revolução Cubana que, criticando as estruturas capitalistas, manifesta-se como alternativa de desenvolvimento, libertando-se dos Estados Unidos. É grande o inconformismo popular com o modelo de desenvolvimento urbano industrial dominante. Diante dessa conjuntura, o modelo de desenvolvimento entra em crise, gerando uma inquietação política e muitos protestos populares, e, o profissional do Serviço Social inspirado neste momento de inconformismo popular com o modelo de desenvolvimento urbano industrial dominante, dá início a um processo de discussão política no interior da categoria. Assim, o Serviço Social tradicional foi posto em questão, como esclarece Netto (1996, p.06): A segunda metade dos anos de 1960 marca, na maioria dos países em que o Serviço Social já se institucionalizara como 21 profissão, uma conjuntura de profunda erosão das suas práticas tradicionais [...]. No século passado, a transição da década de 1960 para 1970 foi, de fato, assinalada em todos os quadrantes por uma forte crítica ao que se pode, sumariamente, designar como “Serviço Social tradicional” [...]. Diante de uma conjuntura de instabilidade, surge a procura por uma nova visão profissional, que supra as novas demandas que a profissão vem enfrentando, surgindo o Movimento de Reconceituação2, com um serviço social pautado em teorias e métodos provenientes do próprio país. Assim sendo, o movimento de reconceituação se percebe enquanto um momento de reflexão teórica crítica, haja vista que ocorre em 1964 o período de regime militar3. Esse acontecimento, segundo Cardoso (2013, p. 129-130), “fez com que a influência da Reconceituação no Brasil tivesse características distintas do restante da América Latina”, pois as possibilidades concretas de participação ativa dos brasileiros nesse processo foram minadas. Isto posto, fez com que a categoria profissional firmasse um compromisso com os valores da democracia e a garantia de direitos de cidadania, principalmente pelo fato do Estado assumir a função de assegurar a reprodução do grande capital por meio de um Estado Antidemocrático e por meio de políticas sociais compensatórias, conforme elucida NETTO (2005, p. 09): [...] Neste marco, assistentes sociais inquietos e dispostos à renovação indagaram-se sobre o papel da profissão em face de 2 O Movimento de Reconceituação é o marco do Serviço social que vem propor a ruptura das práticas tradicionais, é através deste movimento que surge um perfil profissional mais crítico, capaz de atuar nos desafios postos a profissão. É um importante momento do Serviço Social, pois é partir daí que surge uma outra visão acerca da prática profissional, voltada a uma análise crítica da realidade social, buscando assim um melhor desempenho no agir profissional ao atender as demandas da questão social, pautado em bases teórico-metodológicas que buscam superar as práticas tradicionais do Serviço Social. VIANA, Beatriz Borges; Carneiro, Kássia Karise Carvalho; Gonçalves, Claudenora Fonseca. O Movimento de Reconceituação do Serviço Social e seu Reflexo no exercício profissional na contemporaneidade. Disponível em: << https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/180648 >> Acesso em 18 março de 2019. 3 O regime militar foi o período de tomada de poder por parte dos militares brasileiros, esse momento histórico é marcado por repressão e a violação de direitos para a manutenção da ditadura. Ficou conhecido como “Golpe de 1964” com um Estado que tinha como função assegurar a reprodução do grande capital, além de passar a enfrentar a questão social não apenas com repressão, mas também com políticas sociais compensatórias. Dessa forma, o assistente social nesse espaço de tempo era considerado como profissional liberal, tecnicamente independente na execução de seu trabalho, sendo obrigado a prestar contas e seguir diretrizes emanadas do chefe hierárquicos, além disso, colaborando com os poderes públicos na preservação do bem comum e dos direitos individuais, lutando para o estabelecimento de uma ordem social. https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/180648 22 expressões concretamente situadas da “questão social”, sobre a adequação dos procedimentos profissionais tradicionais em face das nossas realidades regionais e nacionais, sobre a eficácia das ações profissionais, sobre a pertinência de seus fundamentos pretensamente teóricos e sobre o relacionamento da profissão com os novos protagonistas que surgiam na cena político-social. Nesse momento histórico percebe-se as insatisfações e indagações ao Serviço Social Tradicional e se identifica um amadurecimento acerca da reflexão teórica e crítica da profissão, logo, é demonstrado uma nova forma de ver e interferir na realidade social, em que a tradição marxista começa a se aproximar, a ganhar espaço na profissão de Serviço Social trazendo à tona novas formas de compreensões a respeito da sociedade e das relações sociais de produção. Assim, Netto (2005) comenta que o Movimento de Reconceituação se dá a partir de novas influências ideológicas e filosóficas que seguem as transformações societárias, em que se buscaram novas formulações teóricas e práticas, através de críticas ao Serviço Social tradicional. Dessa maneira, Barroco (2012) expressa a respeito do segundo código de ética reformulado em 1965 que revela traços da renovação profissional no contexto da modernização conservadora posta pela autocracia burguesa, introduzindo valores liberais sem romper a base filosófica neotomista e funcionalista, contudo, introduzindo o assistente social como profissional liberal inserido sob princípios do pluralismo, democracia e justiça. Isso posto, Silva (2016, p.09) esclarece a respeito da profissão: O Serviço Social começa a romper com o que praticava até o momento e passa a apresentar polêmicas, heterogeneidade nas propostas interventivas, busca por uma elaboração teórica mais consistente e, principalmente, apresenta sua laicização. Sumariamente, podemos mencionar que se coloca em curso, no Serviço Social brasileiro, um processo de renovação, que se desenvolve a partir do pós-64 até meados da década de 1980, apresentando três direções e/ou projetos profissionais. São elas: a perspectiva modernizadora, reatualização do conservadorismo – ou fenomenológica – e a intenção de ruptura. Percebe-se a perspectiva modernizadora a partir de Netto (2015, p. 200) sob concepções profissionais inseridas “no arsenal de técnicas sociais a ser operacionalizado no marco de estratégias de desenvolvimento capitalista, as 23 exigências postas pelos processos sociopolíticos emergentes no pós-1964”, ou seja, adequa o serviço social conservador as exigências do momento histórico sem romper com a origem da profissão. O autor ainda salienta que os grandes monumentos desse período são os textos do Documento de Araxá4 e Teresópolis5. Contudo a reatualização do conservadorismo foi bastante contraditória, haja vista que segundo Netto (2015) de um lado se afronta e generaliza o acervo positivista e de outro se recusa as vertentes crítico-dialética de raiz marxiana. Assim, o autor mostra que dar-se-á uma intervenção profissional microscópica com ênfase na ação por meio da ajuda psicossocial em busca do ajustamento do sujeito a sociedade. A intenção de ruptura com o Serviço social “tradicional” surge como proposta alternativa sob um novo suporte teórico, metodológico e ideológico, isto é, se coloca a favor do marxismo e a ideia de emancipação humana, fazendo com que os assistentes sociais participassem dos partidos políticos e grupos sociais com a finalidade de uma transformação societária. Netto (2015) destaca que esse momento foi manifestado a partir da pretensão de rompimento com a tradição positivista e com os paradigmas do reformismo conservador. Vale ressaltarque, nesse momento histórico um dos elementos essenciais na construção dessa vertente foi o Método Belo Horizonte – Método BH6 que foram constituídas sob perspectivas ideopolíticas, teórico- 4 “O seminário de Araxá (MG), ocorreu durante a ditadura militar e trata-se de um seminário de teorização na qual os profissionais perceberam que era precisa dar um novo conceito ou substituir velhos padrões com relação a profissão. Teve como objetivo teorizar o serviço social com a realidade da demanda brasileira, isto é, a necessidade do conhecimento e avaliação fundamental para que o serviço social reformulasse a sua teoria e prática, identificando na realidade nacional um planejamento para intervenção da realidade para implementar diferentes mudanças nas políticas sociais. 5 Depois do seminário de Araxá, houve a necessidade de estudar a metodologia do Serviço social brasileira, em 1970 tem-se o seminário de Teresópolis, cujo debate foi os fundamentos da metodologia do serviço social. Seu objetivo era estabelecer relação entre o método científico e profissional, fundamentando epistemologicamente conexão com as ciências sociais. 6 O Método BH “é o traço mais visível da explicitação do projeto de ruptura que se plasmou na atividade da Escola de Serviço Social da Universidade Católica de Minas Gerais na primeira metade dos anos 1970 – o “método” que ali se elaborou foi além da crítica ideológica, da denúncia epistemológica e metodológica e da recusa das práticas próprias do tradicionalismo; envolvendo todos estes passos, ele coroou a sua ultrapassagem no desenho de um inteiro projeto profissional, abrangente, oferecendo uma pauta paradigmática dedicada a dar conta inclusive do conjunto de suportes acadêmicos para a formação dos quadros técnicos e para a intervenção do Serviço Social.” (NETTO, 2015, p. 351,352). 24 metodológicas e operativo-funcionais, destacando assim a importância da universidade legitimado pelo caráter científico no período ditatorial. Em 1975 se tem o terceiro código de ética suprimindo as referências democrático-liberal do código anterior e configurando-se como uma das expressões de reatualização do conservadorismo profissional, isto é, no contexto de oposição e luta entre projetos profissionais. Consequentemente, SILVA (2016, p .11) expressa sua opinião sobre a influência das universidades nesse período: Deste modo cabe destacar que a universidade possui um vínculo estreito com a construção e desenvolvimento da chamada intenção de ruptura com o conservadorismo, pois, as universidades mesmo num contexto ditatorial, representam um espaço de construção de saber, legitimado pelo caráter científico, além do notável amadurecimento teórico- metodológico acumulado através das atividades de ensino, pesquisa e extensão (experiências de estágio). A partir dos anos 1980 com as transformações sociais e por meio da redemocratização do país o Serviço Social passa por algumas alterações, Barroco (2012, p. 48) expressa que a mudança operada no Código de Ética de 1986 descaracterizou a tendência legalista do código anterior, politizando a natureza do documento e construído coletivamente pela categoria por meio de suas entidades. O conjunto das conquistas efetivadas no CE de 1986 pode assim ser resumido: o rompimento com a pretensa perspectiva “imparcial” dos códigos anteriores, o desvelamento do caráter de classe dos usuários, antes dissolvidos no conceito abstrato de “pessoa humana”; a negação de valores a-históricos, a recusa do compromisso velado ou explícito com o poder instituído. A partir de 1986, o CE passa a se dirigir explicitamente ao compromisso profissional com a realização dos direitos e das necessidades dos usuários, entendidos em sua inserção de classe. Como se percebe, são conquistas políticas inestimáveis, sem as quais não seria possível alcançar o desenvolvimento verificado nos anos 1990. Portanto, nesse ciclo favorável ao avanço no contexto de reorganização política dos trabalhadores, movimentos sociais e categoria profissional, acontece profundas mudanças na conjuntura de democratização da 25 sociedade brasileira, que posteriormente terá condições distintas para uma nova reformulação do Código de Ética do serviço social e um projeto profissional da categoria, na qual Netto (1999, p. 95) expressa que: Os projetos profissionais apresentam a autoimagem de uma profissão, elegem os valores que a legitimam socialmente, delimitam e priorizam seus objetivos e funções, formulam os requisitos (teóricos, institucionais e práticos) para o seu exercício, prescrevem normas para o comportamento dos profissionais e estabelecem as balizas da sua relação com os usuários de seus serviços, com as outras profissões e com as organizações e instituições sociais, privadas e públicas. Surge assim a necessidade de um novo projeto profissional, na qual foi nomeado como Projeto Ético-Político, conseguindo predominância teórica e metodológica no Serviço Social Brasileiro em meados dos anos 1990 e vinculado a um projeto de transformação da sociedade a partir de dimensões teórico metodológicas, ético político e técnico operativo. Surge então o Código de Ética profissional de 1993 na qual foi resultado do amadurecimento das reflexões iniciadas a partir do Código de ética de 1986, e sinalizasse os princípios para permitir uma instrumentalização melhor na prática cotidiana do exercício profissional. Fazendo referência a Montaño (2006) é através de seus instrumentos profissionais que o assistente social pode trabalhar para intervir positivamente na redução das desigualdades sociais, bem como nas mudanças da realidade social. Em vista disso, pode-se apresentar o Serviço Social como uma profissão historicamente importante para o enfrentamento da Questão Social. 2.2 O Projeto Ético Político do Serviço Social e a Luta Contra o Conservadorismo Conforme abordamos anteriormente, com o Projeto Ético Político do Serviço social tem-se a predominância teórica e metodológica da profissão vinculado a um projeto de transformação da sociedade, esse acontecimento partiu sinalizou os princípios para permitir uma instrumentalização melhor na prática cotidiana do exercício profissional. 26 Vale ressaltar que da área social o Serviço Social foi uma das primeiras profissões a ter aprovada a lei de regulamentação da profissão e o Decreto 994 de 15 de maio de 1962 que determinava no artigo 6° a disciplina e fiscalização do exercício profissional, isto é, tem-se a criação do Conselho Federal de Assistentes Sociais – CFAS e aos Conselhos Regionais de Assistentes Sociais – CRAS, posteriormente denominados de CFESS E CRESS. [...] Nesse patamar legal, os Conselhos têm caráter basicamente corporativo, com função controladora e burocrática. São entidades sem autonomia, criadas para exercerem o controle político do Estado sobre os profissionais, num contexto de forte regulação estatal sobre o exercício do trabalho. (CFESS, 2017) Segundo o site do CFESS(2017) a criação desses conselhos se constituiu como entidades autoritárias, que a fiscalização se restringia a exigência da inscrição do profissional e pagamento do tributo devido. Além disso, essa concepção conservadora foi caracterizada devido o reflexo da perspectiva vigente na profissão em que seus pressupostos eram acríticos e despolitizados face às relações econômico-sociais. Na década de 1960 também se destaca do universo político cultural o interesse dos movimentos sociais e sindicais pela luta por diferentes sujeitos, que socializaram a agenda política por reinvindicação de direitos. Com isso, a agenda política da classe trabalhadora marca as lutas pela democracia e liberdade, ressaltando os direitos por liberdades e sendo contra as variadas formas de autoritarismo, preconceito e repressão. Como já mencionadoanteriormente, os assistentes sociais possuíam uma perspectiva conservadora, eram apenas executadores das políticas sociais do Estado ou de instituições privadas, contudo, Piana (2009, p. 86) comenta a respeito do processo de ruptura com o conservadorismo. No processo de ruptura com o conservadorismo, o Serviço Social passou a tratar o campo das políticas sociais, não mais no campo relacional demanda da população carente e oferta do sistema capitalista, mas acima de tudo como meio de acesso aos direitos sociais e à defesa da democracia. Dessa forma, não se trata apenas de operacionalizar as políticas sociais, embora importante, mas faz-se necessário conhecer as contradições da sociedade capitalista, da questão social e suas expressões que desafiam cotidianamente os assistentes sociais, pensar as 27 políticas sociais como respostas a situações indignas de vida da população pobre e com isso compreender a mediação que as políticas sociais representam no processo de trabalho do profissional, ao deparar-se com as demandas da população. Nesta perspectiva, o Serviço Social, inicia-se um movimento de modificação na estrutura de legitimação dos projetos profissionais tradicionais do Serviço Social, o que contribui para um pluralismo de ideias dentro da profissão e cria a possibilidade de uma abordagem numa perspectiva crítica. Houve uma busca de uma parcela dos assistentes sociais, comprometido com a classe trabalhadora, para redimensionamento profissional, vale destacar que o protagonismo desses assistentes sociais foi influenciado pela elaboração de um novo projeto profissional distinto do tradicional, cujo desenvolvimento foi realizado pelo grupo de assistentes sociais de Belo Horizonte. No ano de 1979, foi realizado III Congresso Brasileiro de Assistente Sociais – CBAS, também conhecido de “Congresso da Virada”. Este encontro estabelece mudanças significativas no campo da formação, do exercício profissional e da organização política da categoria. Foi no “Congresso da Virada” que se afirmou o compromisso do Serviço Social com a luta da classe trabalhadora e com a defesa da cidadania e da democracia. Isto exigiu uma reconfiguração na direção da profissão e, para tanto, também foi necessário que as entidades da categoria se renovassem. Assim, com o III CBAS é exteriorizada a opção política do Serviço social pelo compromisso com os interesses da classe trabalhadora e na defesa da cidadania e da democracia, conforme explicita Guerra (2009, 128.129): A destituição da Mesa de Honra prevista para o III CBAS, bem como as deliberações tiradas a partir daí, expressaram a clara opção política do Serviço Social pelo compromisso com os interesses da classe trabalhadora, e, por conseguinte, a decisão pela construção de um novo projeto para o Serviço Social brasileiro, e a adoção de um novo perfil profissional para os sujeitos profissionais [...]. Ou seja, o III Congresso deixava claro que era urgente a ruptura com a herança conservadora presente desde a emergência do Serviço Social no Brasil e a notória importância de um novo projeto de profissão. Era fundamental que o Serviço Social e seus profissionais estivessem articulados com a luta mais geral da classe trabalhadora, na defesa da cidadania e da democracia. E, neste sentido, tornava-se inconteste a necessidade de que as entidades do Serviço Social – seu sujeito profissional coletivo – se reconfigurassem na 28 direção do que a “Virada” politicamente apontava. Foi imbuído desta “virada” progressista que o próprio, e então, conjunto CFAS/CRAS se renovou (Idem, grifos da autora). Diante das lutas pela redemocratização da sociedade por uma parte da categoria profissional, tem-se a disputa pela direção dos Conselhos Federais e Regionais na perspectiva de fortalecer o projeto profissional. Com isso, a gestão que assumiu o conselho por meio de uma nova direção política das entidades se comprometeu com a democratização e articulação com os movimentos sociais e demais entidades de categoria. A partir do amplo debate na década de 1980 tem-se uma parcela dos profissionais de serviço social pela preferência e adoção da teoria social crítica de Marx, na qual desvela os fundamentos da produção e reprodução da Questão Social. Assim, os assistentes sociais passaram a discutir seu papel na dinâmica contraditória da sociedade capitalista e a função social do Estado e da profissão. Acerca disto, Abreu (2008, p.151) explica que: [...] na sociedade brasileira, nos anos 80, criam-se condições concretas para o avanço do projeto profissional identificado com os interesses das classes subalternas, determinadas pelo referido movimento de redemocratização das relações sociais, em que avançam estratégias de politização dessas relações integradas as lutas sociais e a organização das referidas classes e, contraditoriamente, pelas estratégias no âmbito das políticas sociais a busca de legitimidade do sistema de poder em crise. Com a organização política da profissão e a ascensão das forças democráticas populares no cenário político brasileiro, os anos 1980 aprofunda a proposição de um novo projeto profissional para o Serviço social visando romper com o projeto conservador. Sob a defesa do capital mundial é defendida a ideologia neoliberal7 7 A ideologia neoliberal remete ao estado a intervenção na economia e na livre circulação de capitais, nesse contexto o papel do governo focaliza em adoção de medidas de redução de serviços públicos, como as privatizações de empresas estatais, controle de gastos públicos, menores investimentos em políticas assistencialistas (aposentadoria, seguro desemprego e pensionistas). Ou seja, o neoliberalismo significa uma doutrina político-econômica que corresponde a uma experiência de adaptar aos princípios do liberalismo econômico as condições do capitalismo moderno. FREITAS, Eduardo de. Neoliberalismo. Disponível em: <<https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/geografia/neoliberalismo-1.htm>> Acesso em 25 de maio de 2019. https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/geografia/neoliberalismo-1.htm 29 na entrada dos anos 1990, que advindas da lógica excludente do capitalismo tem diversas e profundas consequências, desde o conservadorismo na política ao moralismo nos estilos de vidas individuais. Assim, torna-se notório as implicações para os países do Terceiro Mundo, essencialmente diante da renovação teórica metodológica que emergia no Serviço Social e o acirramento das condições de desemprego e subemprego sob repressão das organizações de classe e dos movimentos sociais. Diante dos impactos e da estrutura social, Yazbec (2007, p.7-8), analisa os desafios da profissão: É inserido neste contexto, desafiado pelas mudanças em andamento, convivendo cotidianamente com a violência da pobreza e com as incontáveis faces de exclusão social, que o assistente social brasileiro trava o embate a que se propõe: o de avançar em seu projeto ético político na direção de uma sociabilidade mais justa, mais igualitária e onde direitos sociais sejam observados. Dessa forma e diante deste contexto, o projeto profissional do Serviço Social alcança sua maturidade e solidifica sua nova direção social associado as lutas da classe trabalhadora para além do modo de produção capitalista, isto é, em defesa de um novo projeto societário articulado a hegemonia no interior da luta de classes. Analisando as incursões nesse momento da profissão, Abramides (2017, p.383) discorre: Nos anos 1990 definimos o novo Código de Ética, a nova lei de regulamentação da profissão e as diretrizes curriculares, que se configuram nossos parâmetros do Projeto Ético-Político Profissional, o qual se encontra articulado a um projeto societário emancipatório. Esse movimento da categoria profissional desde a luta contra a ditadura, pela redemocratizaçãodo país, se espraia a partir de 1989, na luta contra o neoliberalismo, e reafirma o projeto profissional articulado com o projeto societário emancipatório. Com o Projeto ético-político do Serviço Social é perceptível as reflexões críticas e éticas no interior da profissão, em construir uma nova direção social pautada na orientação marxista e vinculada a uma categoria profissional aliada aos interesses da classe trabalhadora. Sobre a renúncia ao conservadorismo, Boschetti (2015, p.639) acrescenta: 30 Foi na história de resistência e luta contra esse conservadorismo, que sempre quis subordinar e colocar a profissão a serviço da reprodução do capital, que o Projeto Ético- Político — em suas dimensões teórica, política, ética, legal e profissional — se constituiu como processo dinâmico e vivo, como expressão de luta contra o conservadorismo. Traçar o projeto ético-político profissional do Serviço Social, põe em destaque o Código de Ética Profissional do Assistente Social, aprovado em 13 de março de 1993, o qual destacou relação do exercício profissional sob a viabilização dos direitos sociais. Delineando os parâmetros para o exercício profissional, o Código de Ética busca a garantia da qualidade dos serviços prestados aos usuários, assim, realça organizadamente por meio de princípios fundamentais, sendo eles: o reconhecimento da liberdade, defesa dos Direitos Humanos, ampliação e consolidação da cidadania, democracia, favorecimento da equidade e justiça social, eliminação de todos os tipos de preconceito, garantia do pluralismo e a escolha por um projeto profissional que objetive a construção de uma sociedade sem exploração. Sob visão crítica e derivadas do agir ético político do profissional, a Lei 8.662/1993 regulamenta a profissão representando um marco importante na história da profissão no Brasil, principalmente pelo fato de oferecer atribuições privativas do assistente social, competências e representações da categoria perante o funcionamento do conjunto do Conselho Federal de Serviço Social – CFESS8 e do Conselho Regional do Serviço Social – CRESS. O Conselho Federal de Serviço Social – CFESS – principal entidade representativa da profissão, vem sendo também objeto de estudo, segundo teses e dissertações analisadas, devido importantes contribuições que este órgão vem oferecendo para compreender as potencialidades e efetividade do projeto. A partir dos estudos de Ramos (2005), que analisou o protagonismo do CFESS junto à reconstrução do projeto profissional, os resultados da pesquisa demonstraram que as propostas e ações dessa entidade, em parceira com outros segmentos coletivos, vêm ganhando materialidade através de duas frentes prioritárias: a primeira delas refere-se à dimensão 8 A contribuição do CFESS para o desenvolvimento da consciência política se dá segundo Mota (2011) a partir do pertencimento à classe trabalhadora dos profissionais, à aproximação madura com a teoria marxista, que expressam o processo de renovação da profissão, além de fomentar a vontade e intencionalidade dos sujeitos responsáveis pela construção da ação política profissional, assim, a ação dos sujeitos políticos organizados em torno da conformação do novo projeto profissional. 31 ética e ressalta a participação dentre outras atividades, na coordenação do processo de discussão para a aprovação do Código de Ética de 1993 e a atuação na área de direitos humanos. Na segunda dimensão, estão elencadas as ações referentes às contribuições para elaboração das políticas públicas e do controle social. (MOTA, 2011, p. 65). Por conseguinte, se faz necessário compreender o Código de ética de 1993, a Lei de Regulamentação da Profissão (1993) e as diretrizes curriculares da ABEPSS em 19969, visto que, em linhas gerais, a profissão possui sua composição na fundamentação da vida na sociedade e do trabalho profissional sob capacitação teórico-metodológica, ético-político e técnico-operativa como instrumentos legais para o exercício profissional perante a democratização e igualdade. Em vista dos instrumentos legais do Serviço Social sob as três dimensões constitutivas da profissão, tem-se a dimensão teórico metodológica, Ético-político e Técnico-operativa, que respectivamente segundo Pereira (2003) o profissional deve ter capacidade de apreensão do método e das teorias para poder entender a realidade e as demandas dos usuários segundo o seu contexto histórico e criando formas efetivas de transformar a realidade respeitando suas especificidades. A dimensão Ético-político, sob o desenvolvimento de capacidade de analisar a própria profissão e a sociedade como campo de forças contraditórias acerca da direção social, além de se posicionar politicamente diante da realidade e de sua intervenção profissional a favor da classe trabalhadora. E a dimensão Técnico-operativa, referindo aos elementos técnicos e instrumentais para o desenvolvimento da intervenção, ou seja, o conjunto de habilidades técnicas para atendimento da população usuárias e das exigências das instituições contratantes. Enquanto profissionais do Serviço Social subentende-se que possuem o dever de conhecer as três dimensões constitutivas da profissão, sendo importante evidenciar que as mesmas não se separam, se articulando entre teoria e prática, tão pouco se sobrepõe, isto é, todas possuem o mesmo 9 As diretrizes curriculares implicaram em uma capacitação no sentido de superar as defasagens teórico-metodológicas e as precariedades operativas na formação, isto é, na busca pela garantia da organização entre realidade brasileira e formação. 32 nível de importância no âmbito da atuação profissional. Assim, cada dimensão possui sua diversidade, todavia, buscando direitos universais, sobretudo uma sociedade mais justa e igualitária. A complexa e necessária articulação dessas dimensões é um fator imperativo para a hegemonia do projeto profissional crítico, haja vista que reúnem o que se entende por “modo de pensar” e modo de ser” da profissão, por serem portadoras de mecanismos políticos, instrumentos legais e referenciais teóricos que colocam a prática profissional exigências compulsórias, como a graduação acadêmica, devidamente reconhecida pelo Ministério da Educação e em conformidade com padrões curriculares minimamente determinados; inscrição na respectiva organização profissional (CRESS) e indicações consensuadas sobre o ethos profissional, frente as condições objetivas que incidem sobre o “modo de ser”. É a relação entre essas exigências compulsórias e os consensos mínimos estabelecidos sobre a profissão que confere um perfil peculiar a prática profissional no quadro geral das profissões. (MENDONÇA, 2007, p. 74). Cada uma dessas dimensões que norteiam a prática profissional são os pressupostos e direcionamentos profissionais escolhidos pela categoria ao longo da construção sócio históricas da profissão, porém, enquanto profissão inserida dentro de um modo de produção capitalista existe uma contradição entre o modo de pensar e o de materializar o projeto ético político uma vez que possui uma relativa autonomia profissional10. Outro aspecto importante é a respeito do projeto ético político e os elementos e princípios constitutivos do Serviço social, como por exemplo a igualdade, liberdade e democracia, conforme a sociedade em que vivemos. A partir disso, o assistente social a partir das contradições de classes existentes na profissão, Menengueli (2013) explicita que podem escolher caminhos, construir estratégias político-profissionais, definir rumos para sua atuação e, com 10 A relativa autonomia profissional está associada as mudanças e reestruturações do mercado de trabalhoque afetam o exercício profissional do assistente social na medida em que este é um profissional assalariado e que também tem obtido a sua inserção no mundo do trabalho através da prestação de serviços, da terceirização e do trabalho em Ongs e fundações. No que tange a autonomia profissional neste mercado diversificado e reconfigurado, vê-se que embora ainda a maioria dos assistentes sociais advenha de empresas públicas, a estabilidade do vínculo empregatício não lhes confere maior autonomia. TABORDA, Elis. Mann, Lilian dos Santos. Pfeifer, Mariana. A Autonomia relativa no exercício profissional do assistente social. Disponível em: << http://seminarioservicosocial2017.ufsc.br/files/2017/05/Eixo_2_61.pdf>> Acesso em 25 de maio de 2019. http://seminarioservicosocial2017.ufsc.br/files/2017/05/Eixo_2_61.pdf 33 isso, projetar ações que demarquem claramente os compromissos éticos e políticos profissionais. Entende-se, dessa maneira, que o projeto ético-político da profissão está vinculado a um projeto de transformação da sociedade, isto é, pressupondo a construção de uma nova ordem social que não possua exploração e/ou dominação de classe, compromissado com a emancipação dos indivíduos sociais e reconhecendo a liberdade como valor ético central. Além disso, na perspectiva de universalização do acesso aos bens e serviços relativos e na consolidação da cidadania enquanto direitos civis, políticos e sociais. Com isso, Guerra (2007, p.15) expõe sobre a importância da prática profissional orientada no projeto crítico, na qual a compreensão do significado social orientado em projeto crítico possibilita ao profissional do Serviço Social a realizar uma intervenção profissional de qualidade, competência e comprometido com valores humanos. Em síntese, é o conjunto das dimensões que contornam o Projeto Profissional Crítico hegemônico do Serviço social, embasados na teoria social crítica marxiana até a organização política da categoria e seus instrumentais legais que legitima o projeto. Assim, segundo Iamamoto (2009) com o exercício profissional sendo reorganizado se torna possível desvelar a prática do serviço social apreendendo e articulando estratégias políticas de classes a fim de desvendar as necessidades, limites e possibilidades na vida social. Como já salientado, o Projeto profissional do Serviço social é vinculado a um projeto societário, porém, é antagônico ao projeto vigente. Contudo, pode-se perceber que este projeto está em constante construção. Ademais, iremos compreender a respeito dos espaços sócio ocupacionais do Assistente Social e as exigências da Profissão na contemporaneidade. 2.3 A Reconfiguração dos Espaços Sócio Ocupacionais dos Assistentes Sociais e as Exigências da Profissão na Contemporaneidade O Serviço Social é uma profissão, que tem como objeto de intervenção as expressões da questão social, lutando pelas pessoas que de alguma forma não tem o total acesso à cidadania e aos direitos garantidos por 34 lei. Se faz necessário que o profissional busque conhecer e analisar a realidade, para poder intervir apostar em propostas criativas, críticas e construtivas a fim de contribuir para a efetivação dos direitos. O enfrentamento da questão social no neoliberalismo, estruturado ainda na década de 1970, entendido como um conjunto de ideias e ações no campo político e econômico e bem ajustado aos interesses do capitalismo. A ideia central do Neoliberalismo baseia-se no individualismo, visão do sujeito enquanto portador da liberdade para seu desenvolvimento, onde a consequência da questão social é observada como uma responsabilidade do próprio indivíduo, sendo este culpabilizado pela circunstância vulnerável em que se está. A estratégia do neoliberalismo é criar políticas sociais de cunho emergencial, assistenciais, precarizadas e focalizadas. Com as crises do capital no Brasil11 e as transformações entre o Estado e a sociedade na década 1990, tem-se alterações na vida econômica, política e social da sociedade. Assim sendo, ocorre uma desresponsabilização do Estado no trato com a questão social e a transferência dessa responsabilidade para outros setores, na qual IAMAMOTO (2009, p. 30) expressa que: Constata-se uma progressiva mercantilização do atendimento às necessidades sociais, decorrente da privatização das políticas sociais. Nesse quadro, os serviços sociais deixam de expressar direitos, metamorfoseando-se em atividade de outra natureza, inscrita no circuito de compra e venda de mercadorias. Estas substituem os direitos de cidadania, que, em sua necessária dimensão de universalidade, requerem a ingerência do Estado. Com o mercado sob a perspectiva liberal ocorre uma informalização das relações de trabalho e aumento das políticas focalistas com gasto público, favorecendo o grande capital em detrimento da economia política do trabalho. Dessa forma, Iamamoto (2007) expressa que a complexidade do contexto histórico remete às novas mediações históricas na gênese e expressões da 11 A crise de acumulação do capital tem sua expressão fenomênica com a crise do modelo de acumulação fordista-keynesiano e a consequente reestruturação do capital, cujos impactos não se restringem à esfera produtiva, incidindo fortemente sobre o conjunto da vida social. (CEOLIN, 2014, p. 249). 35 questão social, assim como nas formas até então vigentes, de seu enfrentamento, seja por parte da sociedade civil organizada ou do Estado. Os campos sócio-ocupacionais dos assistentes sociais foram reorganizados pelas reformas no país, principalmente no sistema previdenciários e nas políticas sociais. Com isso, se exigiu uma maior especialização das atividades uma vez que implicou na ampliação do mercado de trabalho devido a formação de um conjunto amplo de políticas sociais. Em geral, os assistentes sociais segundo Pereira (2003) encontram alocados em campos sócio ocupacionais que dão materialidade as políticas sociais. Vale ressaltar que a consolidação do mercado para os assistentes sociais se dá devido ao desenvolvimento da industrialização e pela necessidade das condições sociopolíticas e controle da força de trabalho na produção, assim, exigiu do profissional de serviço social estratégias para a ampliação do mercado de trabalho no que tange o âmbito do Estado, empresas e organizações filantrópicas privadas. Dessa forma, as transformações sociais históricas resultam para o Serviço Social uma reconfiguração nos espaços sócio ocupacionais e novas formas de atuação para o Serviço Social. Iamamoto (2007, p.7) salienta a respeito: O atual quadro sócio-histórico não se reduz, portanto, a um pano de fundo que se possa, depois, discutir o trabalho profissional. Ele atravessa e conforma o cotidiano do exercício profissional do assistente social afetando as suas condições e as relações em que se realiza o exercício profissional, assim como a vida da população usuária dos serviços sociais. Pode-se afirmar que as novas questões são colocadas no serviço social em relação a intervenção profissional, especialmente com a lógica do capitalismo fundamentado em mudanças o mundo do trabalho e consequentemente da desestruturação do sistema de proteção social e das políticas sociais. A partir disso, o profissional de serviço social está incluído nos desafios expostos pela tendência neoconservadora e focalistas das questões sociais, com uma conjuntura limitadora dos direitos legitimamente conquistados. Acerca dos desafios, Guerra (2005, p. 22) argumenta: 36 [...] o atendimento passa a ser realizado por meio de um mecanismo denominado por alguns autores como “refilantropização”, pelas instituições públicas não estatais (pelas ONG’s como formas privilegiadas de objetivação do chamado “Terceiro Setor”), as quais em muitos casos contemplamno seu interior o exercício profissional como atividade voluntaria. Desta forma, estabelece uma nova relação entre as instituições prestadoras de serviço, os agentes prestadores de serviço e os usuários. Mais uma vez o pensamento conservador articula as perspectivas público- privadas e as refrações da questão social. Aquilo que se mantém no atendimento da questão social é: sua reconversão em problemática de natureza individual, a prestação de serviços de maneira assistemática, assistencialista e como prática de favor, mesclada por uma política de repasse das responsabilidades estatais quanto a intervenção nas sequelas da questão social para sociedade civil. Convém mencionar que esse contexto social constrói uma tendência de ajuste estrutural não somente para os usuários como também para a desqualificação profissional uma vez que enquanto trabalhadores assalariados os assistentes sociais são afetados por relações de trabalho precarizadas. Com a constituição de 1988 tem-se o estabelecimento ao direito das políticas sociais por meio da criação de importantes programas de atendimento à população, como por exemplo: saúde, educação, proteção à maternidade e à infância, assistência aos desamparados. Além disso, institui-se o Sistema Único de Saúde – SUS por meio de políticas públicas e por meio de um sistema público que garante acesso universal, igualitário e gratuito às ações de serviços de saúde. Da mesma maneira, constata-se uma expansão do mercado de trabalho dos assistentes sociais, fazendo emergir O espaço ocupacional ampliou-se também com atividades voltadas para implementação, orientação e representação em Conselhos de Políticas Sociais e de direitos, organização e mobilização popular, elaboração de planos de assistência social, acompanhamento e avaliação de programas e projetos, ampliação e interiorização dos cursos de Serviço Social; além de assessoria e consultoria e requisições no campo da pesquisa. (DELGADO, 2013, p.133) Outro elemento que merece destaque são as novas atribuições, requisitos e habilidades inerentes ao mercado de trabalho do Assistente social, principalmente depois da regulamentação da profissão com a Lei 8.662/1993, 37 estabelecendo qualificações e atribuições, na qual o artigo 5º da citada lei expressa as 13 atribuições privativas que preservam o espaço ocupacional: Art. 5º Constituem atribuições privativas do Assistente Social: I - coordenar, elaborar, executar, supervisionar e avaliar estudos, pesquisas, planos, programas e projetos na área de Serviço Social; II - planejar, organizar e administrar programas e projetos em Unidade de Serviço Social; III - assessoria e consultoria e órgãos da Administração Pública direta e indireta, empresas privadas e outras entidades, em matéria de Serviço Social; IV - realizar vistorias, perícias técnicas, laudos periciais, informações e pareceres sobre a matéria de Serviço Social; V - assumir, no magistério de Serviço Social tanto a nível de graduação como pós graduação, disciplinas e funções que exijam conhecimentos próprios e adquiridos em curso de formação regular; VI - treinamento, avaliação e supervisão direta de estagiários de Serviço Social; VII - dirigir e coordenar Unidades de Ensino e Cursos de Serviço Social, de graduação e pós-graduação; VIII - dirigir e coordenar associações, núcleos, centros de estudo e de pesquisa em Serviço Social; IX - elaborar provas, presidir e compor bancas de exames e comissões julgadoras de concursos ou outras formas de seleção para Assistentes Sociais, ou onde sejam aferidos conhecimentos inerentes ao Serviço Social; X - coordenar seminários, encontros, congressos e eventos assemelhados sobre assuntos de Serviço Social; XI - fiscalizar o exercício profissional através dos Conselhos Federal e Regionais; XII - dirigir serviços técnicos de Serviço Social em entidades públicas ou privadas; XIII - ocupar cargos e funções de direção e fiscalização da gestão financeira em órgãos e entidades representativas da categoria profissional. (BRASIL, 2011, p.45.46). A partir disso percebe-se a luta da categoria em garantir os espaços sócio ocupacionais da profissão, atribuindo e diversificando os espaços por meio de novas requisições, demandas, habilidades e atribuições a esse profissional. Os (as) assistentes sociais trabalham com as mais diversas expressões da questão social, esclarecendo à população seus direitos sociais e os meios de ter acesso aos mesmos. O significado desse trabalho muda radicalmente ao voltar-se aos direitos e deveres referentes às operações de compra e da venda. Se os direitos sociais são frutos de lutas sociais, e de negociações com o bloco do poder para o seu reconhecimento legal, a compra e venda de serviços no atendimento a necessidades sociais de educação, saúde, renda, habitação, assistência social, entre outras pertencem a outro domínio – o do mercado –, mediação necessária à realização do valor e, eventualmente, da mais valia decorrentes da industrialização dos serviços. (IAMAMOTO, 2009, p. 31) 38 Mesmo com as novas áreas de atuação citadas por Iamamoto (2009), o serviço social enquanto profissão especializada na divisão sócio técnica do trabalho e após a reestruturação produtiva do capital, tem os processos de trabalho alterados e flexibilizados, tornando o trabalho ainda mais precarizado para as classes populares. Por consequência, a precarização acontece nos variados âmbitos, haja vista que no setor público se tem o desmonte dos direitos da classe trabalhadora, no setor privado há o aumento dos contratos temporários e nas organizações não governamentais, por meio do enfraquecimento das políticas públicas enquanto perspectivas de direito. O projeto neoliberal12 sob a visão de Silva (2008) encontrou no terceiro setor um modo de responder as necessidade e carências que o Estado deixou quanto ao atendimento de políticas básicas, isto é, atendendo a população de forma paliativa – atendimento com baixa qualidade e sem resolução do problema, nota-se ainda que o critério para prestar o atendimento torna-se cada vez menos universal e mais seletivo, tirando todo o sentido do direito que deve ser garantido ao cidadão. Assim, o Estado está passando a servir às empresas privadas, como financiador das próprias, injetando capital para que elas possam se movimentar no mercado. De outro lado, as empresas dizem assumir um outro papel: essas “servem” à população, via filantropia empresarial ou responsabilidade social. Claro que o grande financiador do “terceiro setor” o Estado, como veremos na pesquisa, mas, da forma como tudo isso é apresentado, a opinião pública não consegue ver de forma clara quais são os papéis pertencentes a cada setor, visto que a estrutura da relação entre setor público e privado se mostra de forma confusa e obscura (SILVA, 2008 p.55). Segundo essa ótica, o Governo articula-se a iniciativa privada e as organizações do Terceiro Setor, minando o caráter público da assistência em benefício da privatização. Diante dessas questões, torna-se notório que enquanto a orientação prestada a população requisita do profissional um perfil bastante crítico a fim de apoiar a democratização das relações sociais tem-se a estimulação da participação dos sujeitos no que se refere a defesa das decisões 12 O projeto neoliberal tem como principal ideia políticas e econômicas a defesa da não participação do estado na economia, devendo haver total liberdade de comércio para garantir o crescimento econômico e o desenvolvimento social de um país. 39 e dos direitos sociais. Segundo Iamamoto (2009) exige-se, para tanto, compromisso ético-político com os valores democráticos e competência teórico- metodológica na teoria crítica, em sua lógica de explicação da vida social. É o conhecimento adquirido pelo profissional do serviço
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