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resenha o homem dos ratos

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Breve análise sobre o caso do “Homem dos Ratos”
Em outubro de 1907, Freud começa a análise do paciente que vem a ser chamado de “O Homem dos Ratos“. Ele vem ao seu encontro por diversos problemas, principalmente por sintomas obsessivos. A saber, ele é obcecado pelo pensamento de que acontecerá alguma coisa de desagradável, alguma coisa de dolorosa, às duas pessoas que ele ama - seu pai e uma dama. Freud observa isso bem, principalmente nas notas que existem correspondentes aos três primeiros meses e vinte dias, até o dia 20 de janeiro de 1908, naquilo que Freud chama “diário de uma análise”, onde ele, todas as noites, anotava o que era dito em cada sessão.
“O Homem dos ratos” é um caso de neurose obsessiva clássico, atendido por Freud, no qual, embora se possa encontrar temas imaginários comuns aos casos de neurose obsessiva, nota-se também uma particularidade bastante evidente. O fantasma ou argumento imaginário que levou o paciente a procurar análise foi o impacto causado pela narração de um tipo de tortura provocado pela penetração de ratos no reto de um indivíduo. Este fantasma não desencadeia a sua neurose, mas suscita a angústia, além de apontar para algo que pode ser encontrado em vários temas trazidos por este paciente. Logo, falar sobre ele me parece fundamental para discorrer a respeito do determinismo da neurose deste paciente, sem esquecer cada caso deve ser estudado na sua particularidade.
Sobre a história de vida do paciente
Sua pré-história ou as relações familiares fundamentais que estruturaram a união de seus pais tinha uma relação precisa, mas transformada, com o estado imaginário em que ele se encontrava, estado este que funcionava como uma resposta à angústia que desencadeou sua crise. Quanto a isto, o paciente descrevia seu pai como simpático e informou que ele havia sido suboficial do exército, o que lhe fez permanecer com certo tom de autoridade e ostentação, embora fosse desvalorizado entre os seus contemporâneos. Contou também que seu pai fizera um casamento por conveniência com sua mãe, que era mais rica do que ele, o que coloca o prestígio na relação conjugal com a mãe.
Por outro lado, a sua mãe costumava brincar com seu pai referindo-se a uma moça pobre e bela por quem ele parecia ter sido apaixonado antes de se casar. O marido protestava dizendo ter sido algo sem importância. Embora a repetição deste jogo mostre a possibilidade de uma parte de artifício ou fantasia por parte da mãe, isto não importa, pois o importante é que este jogo que referia à mulher pobre amada pelo pai impressionou profundamente o paciente. Ainda em relação ao pai, é preciso ressaltar um momento de sua vida considerado na família como importante e significativo. Quando era suboficial, ele perdeu no jogo todo o dinheiro do regimento a ele confiado. Um de seus amigos, contudo, emprestou-lhe o dinheiro para o pagamento da dívida, o que manteve sua imagem social, mas não a honra em sua carreira. Este amigo bondoso nunca mais foi encontrado, o que impediu que a dívida para com ele fosse paga. Esta figura do amigo que não foi reembolsado também causou grave desconforto no paciente.
Notas para uma análise
Apesar de o paciente narrar sua constituição familiar, ele não a relaciona com a sua atualidade, assim como afirma que não sabe por que está dizendo aquilo, já que não tem relação nenhuma com o que lhe vinha acontecendo. Para Freud, há relação entre a narrativa sobre a constituição familiar e o que levou este paciente a procurar análise.
Um fato importante da história clínica do “homem dos ratos” é que o conflito mulher rica/mulher pobre presente em sua história familiar reproduziu-se em sua vida no momento em que seu pai quis que ele se casasse com uma mulher rica. Isso, mais uma vez, aponta para o desenvolvimento da obsessão fantasmática que o levou a procurar tratamento com Freud. Esta obsessão caracterizava-se por um medo de que a tortura dos ratos fosse aplicada às pessoas que lhe eram queridas de alguma forma. Estas pessoas eram, especificamente, uma empregada a quem dedicava um amor idealizado e com quem havia se envolvido pouco antes de o pai impeli-lo a casar com a mulher rica, e o pai que, na época do início da análise, já havia falecido. Observa-se aqui o retorno de dois elementos da constelação familiar do sujeito: a mulher pobre, encarnada na empregada, e o pai, um pai imaginado no além depois de morto.
Além de sofrer por causa deste perigo fantasmático que ameaçava quem ele amava, o paciente encontrava-se, na época em que procurou Freud, em outra situação que o angustiava por demais: havia participado recentemente de manobras militares e foi nesta ocasião que um capitão com gostos cruéis havia lhe contado sobre o suplício dos ratos. Nesta mesma ocasião, ele perdeu seus óculos e os encomendou a seu oculista, o qual os enviou pelo correio. Este mesmo capitão disse-lhe, então, que ele deveria enviar o dinheiro do pagamento dos óculos para reembolsar o tenente “A”, que os havia pago por ele. Após um impulso inicial de não pagar, a questão do reembolso ao tenente “A” impôs-se de uma forma imperativa para o paciente, como um juramento. Contudo, o paciente notou que o capitão devia ter se enganado porque era o tenente “B” o responsável pelos assuntos de correio, não o tenente “A”. Descobriu, posteriormente, que era a uma senhora que trabalhava no correio que ele deveria reembolsar a soma.
O paciente chegou ao consultório de Freud em um estado de angústia máxima, pois, como jurou inicialmente reembolsar o dinheiro ao tenente “A” (uma defesa ao impulso de não pagar), pensa que, se não o fizesse, algo ruim poderia acontecer às pessoas que ele amava, mais especificamente, a tortura dos ratos seria aplicada à mulher desejada e ao pai morto. Sua obsessão o levou a montar o seguinte esquema para resolver o impasse da devolução do dinheiro: ele deveria enviá-lo ao tenente “A”, que o entregaria para a senhora do correio, a qual, na frente do tenente “A”, o entregaria ao tenente “B”, que, por fim, o devolveria ao tenente “A”.
O esquema montado para a devolução do dinheiro aponta para seu mito individual. Este esquema é equivalente, com algumas transformações, à situação originária do mito familiar do paciente que envolve, basicamente, a mulher rica/mulher pobre e o pai devedor/amigo salvador. Este quarteto determinará as relações do paciente com as outras pessoas, pois estas ocuparão de maneira transformada uma destas quatro posições possíveis. É isto que caracteriza o neurótico: ele retoma em suas relações e/ou produções esta estrutura básica que advém da constelação familiar e é por ele transformada. O que dá o caráter mítico a este cenário fantasmático é o fato de esta apreensão modificar, no sentido de uma certa tendência, a relação inaugural.
Por Ana Paula Noronha Zucatti
Referências:
Freud, S. (1909). Notas sobre um Caso de Neurose Obsessiva. Em J. Strachey. (org.). (1975). Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud (vol. X, pp. 159-325). Rio de Janeiro: Imago Editora Ltda.
Resenha do livro FREUD E O HOMEM DOS RATOS de Patrick Mahony - Editora Escuta, 1991, 234 páginas
Sérgio Telles *
psicanalista e escritor
            Apesar de ter inúmeras vinhetas clínicas espalhadas abundantemente por toda sua obra, Freud escreveu mais extensivamente sobre cinco pacientes que ficaram conhecidos como o caso Dora (Fragmento da análise de um caso de histeria - 1905), o caso Joãozinho (Pequeno Hans - Análise de uma fobia em um menino de cinco anos - 1909), o"Homem dos Ratos" (Notas sobre um caso de neurose obsessiva - 1909), o caso Schreber (Notas psicanalíticas sobre um relato autobiográfico de um caso de paranóia - 1911) e o"Homem dos Lobos" (História de uma Neurose infantil - 1918).
            Magníficas exposições do evoluir da cura (excetuando-se o caso Schreber) , do progressivo desvendar da sintomatologia inconsciente, num integrado desdobramento em formulações teóricas, são eles paradigmas do trabalho teórico-clínico em psicanálise.
Desde que foram escritos, estes casosforam revisitados muitas vezes por analistas que procuravam rever os critérios de Freud, discutir o diagnóstico, as inferências transferênciais e contra-transferênciais, ampliando hipóteses, rejeitando outras tantas, pesquisando material histórico sobre os pacientes, numa atitude onde o desejo edipiano de sobrepujar o pai da psicaná1ise não estaria de todo ausente.
O “Homem dos ratos” deriva seu nome de seu sintoma principal: uma idéia obcidente que o atormentava, uma história de tortura que tinha ouvido durante seu serviço militar. Ratos famintos eram colocados dentro de um recipiente que seria, por sua vez, acoplado às nádegas de uma pessoa devidamente acorrentada e manietada e colocada em posição adequada, de modo que os ratos, fustigados através de uma abertura determinada, tentariam fugir, para tanto penetrando no ânus do torturado.
O Homem dos Ratos imaginava que tal tortura seria aplicada a seu pai (já falecido) e à sua "dama" (maneira como chamava a mulher que amava), aplicação esta que dependeria de determinadas circunstâncias sobre as quais era responsável. Com este ponto de partida, Freud estabelece a estrutura básica da neurose obsessiva, desvendando seus vários mecanismos - a ambivalência afetiva, a onipotência do pensamento mágico, a dúvida, a anulação, o isolamento, as idéias de morte.
Patrick Mahony faz sua peregrinação ao Homem dos Ratos, como tantos outros antes dele, o que se verifica na extensa bibliografia por ele citada. Sendo, além de analista, professor de literatura inglesa na Universidade de Montreal, faz interessantes abordagens sobre o estilo literário e posição
retórica de Freud. Revela a identidade do Homem dos Ratos, o advogado Dr. Ernst Lanzer, morto na Primeira Guerra Mundial, onze anos após o final  de sua análise, aos 35 anos. Elabora uma hipótese na qual afirma que Freud se deixa contaminar pelos mecanismos obsessivos do paciente, o que se evidenciaria na própria construção do texto.
Mahony salienta uma especificação deste caso. Ao contrário do Homem dos Lobos e do Caso Dora, que estão basicamente centrados em torno de sonhos, ou seja, acontecimentos visuais, todo o caso do Homem dos Ratos gira em torno dos atos e frases obsessivas, ou seja, na  linguagem verbal, nas palavras.
De fato, este é um caso onde a importância da linguagem se evidencia de imediato, desde que tudo se organiza em função da descoberta de um significante principal na história do paciente - Ratten (ratos), Spielratten (joqador de baralho), raten (supor, suposiçäo), Heilraten (casamento, acasalamento), Raten (prestação, pagamento) - significante este por onde circula incessantemente a complicada trama associativa que aprisiona expressa a estrutura conflitiva do paciente.
Mahony mostra várias outras reiterações do significante observadas claramente na versão original alemã, cuja riqueza está totalmente perdida na tradução de Strachey, que recebe novamente uma saraivada de críticas, ela que há tão.pouco tempo era louvada irrestritamente....
            Mahony revela as discrepâncias entre o relato do caso como foi publicado e as anotações privadas de Freud, sendo as mais importantes - a seu ver - as incongruências cronológicas na seqüência de fatos tal como relatado por Freud, assim como a própria duração do tratamento, que teria sido bem mais curto do que o afirmado por Freud. Aponta o total descuido que Freud revela quanto a transferência, preocupado que estava em construir o passado e preencher as lacunas de memória do paciente, sem atentar para o aqui e agora da relação terapêutica, o que fica gritantemente ilustrado após três intervenções feitas por Freud durante o tratamento – quando pede ao paciente para ver o retrato da “dama”, quando enviou um cartão postal para ele e quando o convidou para uma refeição em sua casa. Com facilidade, Mahony mostra a repercussão imediata destas atuações de Freud nas associações livres do paciente, que evidencia tê-las vivenciado como intrusiva penetração anal por parte de Freud.
            Determinados progressos técnicos ainda estavam por vir, especialmente o manejo massivo da transferência, embora Mahony mencione a eficácia terapêutica de Freud (via sugestão?) e compare sua atitude com a robotização da postura que muitos analistas atualmente julgam correta.
Mahony faz interessantes observações sobre a qualidade essencialmente oral da psicanálise, a estranheza que isso provoca num mundo científico onde a escrita predomina. Tal oralidade essencial da psicanálise gera inúmeros problemas em sua transmissão escrita, localizando nisto a especial aridez e falta de fluência na maioria dos trabalhos analíticos, critica não aplicável a Freud, teria superado os impasses próprios desta transcrição.
Neste sentido, Mahony afirma que na formação do analista falta estudar e atentar para a "cena da comunicação profissional pública”, a comunicação de trabalhos entre colegas, que ele contrapõe à "cena ele comunicação terapêutica", o estudo da prática entre analista e paciente, esta sim, bem estudada.
A respeito das divergentes leituras de Freud, problema tão atual, diz Mahony: "A leitura de Freud em oposição à leitura de outros colegas é uma questão especialmente complicada dadas as transferências que possamos ter com ele, com os temas de seus escritos, com seus interlocutores imaginários e com a instituição psicanalítica. Quem sabe, com o tempo, as diversas leituras de Freud passarão a ser classificadas por século ou nação, como tem acontecido com a Bíblia e Shakespeare (o Shakespeare espanhol, o Shakespeare do século XVIII e assim por diante). Talvez a rivalidade ressentida que se vê entre as interpretações do “Freud francês” e do Freud anglo-americano" servirá. para futura reflexão das psicopatologias possíveis da leitura de Freud, permitindo distinguir-se, entre outros tipos, as leituras hitéricas, obsessivas, narcisistas, fetichistas e de outras espécies”
Com isso Mahony assinala a importante e inevitável presença da transferência pessoal e institucional que marca a leitura de Freud, obstaculizando-a , transformando-a num sintoma, ao mesmo tempo que atribui, corretamente, ao texto freudiano uma grandeza e uma profundidade inesgotáveis, uma atemporalidade (como a do inconsciente) que no correr da História possibilitaria divergentes leituras, enfoques diferentes, em perpétuo reflorescer, como o grande Bardo, de quem Freud era grande admirador.
"Freud e o Homem dos Ratos”, de Patrick Mahony é de grande interesse não só para analistas mas para todos aqueles interessados na cultura e na aventura humana. Pena que num livro onde a linguagem e o estilo são tão importantes, a tradução - apesar de muito esforçada - não tem a inspiração e o brilho que seriam desejáveis no caso.

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