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Sexta-feira, 3 de julho de 2020 | Diário | Ano XVI | N.º 4277 | € 2.90 Diretor André Veríssimo | Diretor adjunto Celso Filipe FIM DE SEMANA www.ifthenpay.com para a sua Empresa Referências Multibanco Publicidade Publicidade Independentes vão poder trocar para apoio mais alto ECONOMIA 10 e 11 Trabalhadores que já fizeram descontos e estão a receber pela redução de atividade vão poder aderir ao apoio extraordinário. Saiba se compensa mudar. Poderemos caminhar para a imortalidade Entrevista a Joaquim Sampaio Cabral M ig ue l B al ta za r Epidemia chega em força ao emprego dos homens ECONOMIA 12 Boicote de marcas está a enfraquecer o Facebook EMPRESAS 18 e 19 José Manuel de Mello, o empresário que nunca desistiu As tensões do regulador com os governos e a sua influência na política EMPRESAS 14 a 16 SÉRIE 5 DIAS BANCO DE PORTUGAL Neeleman sai e Estado fica com 72,5% da TAP PRIMEIRA LINHA 4 a 7 Governo anunciou a compra da posição do empresário por 55 milhões, no mesmo dia em que nacionalizou participação de Isabel dos Santos no capital da Efacec. 2 | SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 HOME PAGE OPINIÃO HOME PAGE O presidente do go-verno espanhol, Pedro Sánchez, considera “inevitá-vel” uma reforma fiscal, com uma maior tributação nos escalões mais altos do IRPF (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Físicas, correspondente ao IRS em Portugal). O chefe do governo espanhol anunciou ainda, numa entrevista ao La Sexta, citada pelo El País, que será também “inevitável” uma subida dos impostos sobre as grandes empresas (IRC). O governo espanhol realiza hoje um Conselho de Ministros extraordinário – o ordinário seria na próxima terça-feira, 7 de julho – para debater estas medidas e também a injeção de fundos pú- blicos (pelo Instituto de Crédito Oficial) nas empresas num total de 50.000 milhões de euros. Esta foi a primeira entrevista de Sánchez desde o estado de emergência. O presidente do go- verno falou assim sobre as medi- das pensadas para reforçar a re- ceita e para destinar recursos às pessoas mais afetadas economi- camente pela crise da covid-19. Esta conversa aconteceu no dia em que o Executivo chegou a acor- do com as entidades patronais e sindicatos para reforçar o empre- go. Sánchez convocou para hoje um ato com os líderes da CEOE e Cepyme, CC OO e UGT, para as- sinar um “pacto para a revitaliza- ção económica e para o emprego”. Quanto ao Fundo de Recupe- ração europeu, no valor de 750 mil milhões de euros, o presidente do governo disse que nos próximos dias estará com os seus homólo- gos de Portugal (já na próxima se- gunda-feira, dia 6), Suécia e Ho- landa, para transmitir a posição de Espanha. Sánchez recordou que Espa- nha, nos termos do que está deli- neado, contribuirá para esse fun- do com 9% – acima dos 6% com que contribuirá a Holanda, que é uma das mais críticas do progra- ma e que faz parte do chamado grupo dos frugais (a par com a Áustria, Dinamarca e Suécia). O país vizinho foi um dos mais duramente atingidos pela pande- mia na Europa. Desde o início do surto, Espanha contabiliza 250 mil casos positivos de infeção pelo novo coronavírus e mais de 28 mil vítimas mortais. E Pedro Sanchéz assumiu que foram cometidos er- ros na gestão da crise sanitária. “Olhando agora, vemos que agi- mos tarde”, admitiu, advertindo que a pandemia ainda não desa- pareceu e que não se pode “baixar a guarda”. NEGÓCIOS Na primeira entrevista após o estado de emergência no país vizinho, o presidente do governo espanhol disse que será necessário aumentar impostos para obter receitas e poder acudir às pessoas mais afetadas pela pandemia. O líder do governo espanhol admitiu que foram cometidos erros na gestão da crise sanitária. Sanchéz considera “inevitável” subida de impostos em Espanha “António Costa enfrenta a maior crise económica com um elenco governativo muito fraco.” ARMANDO ESTEVES PEREIRA Pedro Sanchéz indica que será necessário subir impostos para classes mais altas e para as grandes empresas. PÁGINA 8 “É a evidência de que a sociedade e a economia estão ativamente a explorar alternativas.” BERNARDO RODO PÁGINA 26 “É neste país que vivemos. Um país onde o Governo não discute se não é melhor fechar a TAP.” CAMILO LOURENÇO PÁGINA 25 “Melhor do que um plano são bons objectivos; melhor ainda é fazer mesmo.” FERNANDO ILHARCO PÁGINA 25 Dani Duch/Reuters SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 | HOME PAGE | 3 DIA S im, a TAP é demasiado importante para cair, mas se resgatá-la a tornar demasiado pequena para resistir, será que vale o esforço? Vamos pa-gar até 1.200 milhões para ver. É bom que valha a pena. Dizer que há uma solução para resgatar a TAP talvez seja uma afirmação excessiva. Na verdade, nada garante que a intervenção do Estado possa assegurar à companhia uma vida diferente da que tem há demasiados anos: prejuízos atrás de prejuízos. A pandemia deixou a TAP insolvente. Na ausência de dinheiro privado, só podia entrar o do Estado, com o cor- respondente poder para intervir na gestão da companhia. A hostilidade entre Governo e David Neeleman impunha a saída do empresário como condição. O segundo nunca gos- tou da reversão que repôs 50% do capital nas mãos do Es- tado e o Governo nunca gostou da forma como era destra- tado, de que é exemplo o caso dos bónus. A montante está uma questão: devem os contribuintes salvar a companhia, quando há tantas outras necessidades a que acorrer? A TAP desempenha um papel estratégico, que só por romantismo se pode achar que seria assumido em pleno por outras companhias. Não é só a ligação aos ar- quipélagos, aos PALOP, aos principais destinos da emigra- ção. O desenvolvimento do turismo português tem benefi- ciado, e muito, com as novas rotas da companhia aérea, em particular para os Estados Unidos e o Brasil. A TAP transporta cerca de metade dos turistas que visi- tam o país, que vai precisar do turismo para a retoma, mes- mo que a recuperação do setor possa ser mais lenta. A com- panhia é um ativo valioso para a economia e a soberania. Isso não justifica tudo, nem qualquer preço. Para a TAP subsistir é preciso encontrar um modelo em que as rotas, como um todo, tenham rentabilidade. E isso só acontecerá se for liderada por um gestor privado, com experiência e uma visão para o setor, que possa gerir a empresa não se- gundo critérios políticos, mas de racionalidade financeira. David Neeleman e Antonoaldo Neves tinham essa vi- são, e mesmo falhando o regresso aos lucros, fizeram apos- tas estratégicas bem-sucedidas, modernizaram a frota e re- solveram o sumidouro de dinheiro que era a manutenção aeronáutica no Brasil. Qual será agora o plano? A TAP terá de emagrecer. Por força da pandemia e por força de Bruxelas. Mas tanto esforço só valerá a pena se pu- der manter uma dimensão que assegure a sua relevância. A companhia não recebe um coração novo, apenas um “bypass”. Quanto tempo será capaz de viver com ele? EDITORIAL Um “bypass” para a TAP 678 ANDRÉ VERÍSSIMO Diretor averissimo@negocios.pt EDP dispara mais de 4% em dia de ganhos no setor energético Variação este ano: 16,1% Valor em bolsa: 16.403,2 milhões de euros A EDP disparou num dia que foi de ganhos expressivos para o setor energético europeu. A empresa lide- rada por António Mexia ganhou 4,45% para os 4,486 euros por ação. Foi a sexta sessão consecutiva de ga- nhos para a elétrica portuguesa. Não foi, porém, a única empresa do se- tor a registar ganhos expressivos. Também a EDP Renováveis e a Galp Energia subiram mais de 2% na ses- são desta quinta-feira. AÇÃO FOTOFRASE NÚMERO 4,45% General apeado no estado da Virgínia A remoção de estátuas de figuras da História dos Estados Unidos ligadas à escravatura e à repressão das minorias continua. A do general Stonewall Jackson, do exército da Confederação, foi ontem retirada da cidade de Richmond,na Virgínia, depois de várias ações legais terem tentado evitar o derrube. “One down, more to go”, disse um espectador citado pela CBC. Fotografia: JULIA RENDLEMAN / REUTERS Sem uma gestão mais granular do risco por parte da política de saúde, podemos ter uma vaga de falências que pode levar a uma crise financeira. A farmacêutica suíça Novartis aceitou pagar 678 milhões de dólares para encerrar processo nos EUA por pagamentos ilícitos a médicos. “ JAMES BULLARD Presidente da Reserva Federal de Saint Louis António Mexia está à frente da comissão executiva da elétrica portuguesa EDP. PRIMEIRA LINHA O ESTADO NAS EMPRESAS O Governo de Passos Coelho aprova a venda de 61% da TAP ao consór- cio Atlantic Gateway, de Humberto Pedrosa e David Neeleman, que ti- nha sido acordada em junho. Os pri- vados pagaram 10 milhões de euros pela participação, tendo ficado de- terminada uma injeção imediata de 154 milhões de euros. A recapitali- zação da TAP SGPS ficou definida em 337,5 milhões de euros. Um mês depois, o Go- verno de António Costa entende abrir um pro- cesso negocial para re- configurar a participa- ção do Estado na TAP. O processo negocial, liderado por Diogo Lacerda Machado, culmina com a assinatura de um memoran- do de entendimento e com a re- compra das ações que deram ao Estado 50% da TAP. O Estado au- menta a sua participação de 34% para 50%, tendo a Atlantic Ga- teway diminuído de 61% para 45%. Os restantes 5% foram vendidos aos trabalhadores. A assembleia-geral da TAP aprova a emissão de um empréstimo obrigacionista de 120 milhões de euros, a 10 anos, convertível em ações da socie- dade, subscrevendo a companhia aérea brasilei- ra Azul, de que Neeleman é acionista, 90 milhões de euros e a Parpública 30 milhões. O Estado e a Atlantic Gateway assinam o acor- do para a reversão parcial da privatização de 2015, assegurando ao Estado 50%. O acordo define que o conselho de administração da TAP passa a ser composto por 12 membros, dos quais seis indicados pelo Estado e seis indica- dos pela Atlantic Gateway. Por outro lado, o pre- sidente do conselho de administração seria in- dicado pelo Estado, enquanto a comissão exe- cutiva teria três membros indicados pela Atlan- tic Gateway. A presidência executiva da TAP muda de mãos. Fernando Pinto é subs- tituído no cargo por An- tonoaldo Neves, antigo número um da Azul. 31.1.201812.11.2015 9.12.2015 6.2.2016 8.3.2016 19.5.2016 CRONOLOGIA A TAP e os privados O Governo chegou a acordo com David Neeleman e com a companhia brasi-leira Azul, de forma a conseguir injetar 1.200 milhões de euros na TAP. O ministro das Finanças, João Leão, anunciou esta quinta-feira à noite que de forma a evitar o colapso da empre- sa o Estado chegou a um acordo que lhe permite assegurar 72,5% dos direitos de da TAP SGPS. Os 22,5% ficarão na Atlantic Ga- teway, que ficará a ser controlada por Humberto Pedrosa, cabendo ainda 5% para os trabalhadores. Apesar deste reforço do Esta- do na TAP, o ministro das Infraes- truturas, Pedro Nuno Santos, acrescentou que “não há razão para que o Estado não escolha uma equipa para gerir a TAP dife- rente de um privado”. O respon- sável garantiu que não será o Es- tado a gerir a TAP, mas que irá contratar uma empresa especiali- zada para procurar gestores pro- fissionais com competência na área da aviação. “É assim que o Es- tado se deve relacionar com as empresas da sua responsabilida- de”, disse, frisando ainda assim que o atual CEO, Antonoaldo Ne- ves deverá cessar funções no ime- diato mas que esse processo de se- leção “não produzirá resultados imediatos”. O ministro salientou que o Es- tado pagará 55 milhões de euros para David Neeleman sair da TAP, “comprando” com isso direi- tos de voto, direitos económicos e direitos de saída, evitando com O Estado chegou a acordo para ficar com uma posição maioritária na TAP. Pedrosa é o parceiro privado. A gestão ligada a Neeleman sai já. O Governo vai recrutar a equipa ao mercado internacional. A TAP está desde março com a frota praticamente parada. MARIA JOÃO BABO mbabo@negocios.pt Estado assume 72,5% da TAP e garante gestão profissional 4 | SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 A TAP SGPS anuncia ter al- cançado, em 2017, lucros pela primeira vez em 10 anos, reportando um resul- tado líquido de 21,2 milhões de euros. A TAP SA, que controla a companhia aé- rea, obtém um lucro de 100,4 milhões de euros no mesmo ano. A TAP anuncia prejuízos de 118 milhões de euros em 2018, regressando ao vermelho. A contribuir para es- ses resultados, justificou, estiveram problemas opera- cionais, que geraram atrasos e cancelamentos de voos, a que acresceram as greves. Só em indemnizações a pas- sageiros a TAP pagou 22 milhões de euros. 22.3.2019 Apesar dos prejuízos de 118 milhões, a TAP distribui pré- mios no valor de 1,17 mi- lhões de euros a 180 traba- lhadores, incluindo dois de 110 mil euros atribuídos a dois quadros superiores. A polémica estala, com o Go- verno a falar em quebra de confiança. MAIO DE 2019 Depois de denúncias de trabalhadores, a TAP confirma a existência de “casos pontuais de tripulantes com ligeiras indisposições” em al- guns voos dos seus novos aviões A330neo, mas garantindo ser uma situação “normal em aeronaves novas”. 25.6.2019 A TAP conclui uma emissão obrigacionis- ta a 5 anos de 375 mi- lhões de euros, pagan- do uma taxa de 5,75% pelo financiamento. 22.11.201916.4.2018 Com o mal-estar com o parceiro de consórcio, Hum- berto Pedrosa, e com o Estado, devido aos resultados negativos da TAP, é noticiado que David Neeleman está em contactos com várias companhias aéreas eu- ropeias para a aquisição da sua parte na Atlantic Ga- teway, designadamente com a Lufthansa e a United. 25.11. 2019 Miguel Baltazar isso “litigância futura, que garan- tisse paz à TAP”. Para Pedro Nuno Santos, desta forma é possível “desbloquear o empréstimo e evi- tar a falência” da companhia. O responsável salientou na confe- rência de imprensa que foram “al- gumas semanas largas “ de nego- ciação para “conseguirmos final- mente ter as condições que per- mitirão ao Estado auxiliar a TAP”. Segundo disse, o acordo foi conseguido, ainda que seja apenas “concretizado quando todos os documentos forem assinados”, apontando para os próximos dias a assinatura do acordo. Pedro Nuno Santos reconheceu que esta opção “não era a opção inicial do Estado, que fez ao acionista priva- do propostas que não foram acei- tes. “Tínhamos acordo com a Co- missão Europeia para a injeção até 1.200 milhões mas faltava o acordo com acionistas privados. Não poderíamos fazer interven- ção de um montante tão elevado sem ter garantidas condições mí- nimas”, recordou, explicando que a proposta para que os privados acompanhassem a conversão dos créditos “não foi aceite”. O Esta- do, acrescentou, pediu assim ao acionista privado que “abdicasse dos direitos de saída e no caso da Azul abdicasse do direito de con- versão, que seriam tratados como credores comuns e no momento certo seriam reembolsados”. Uma proposta que, disse, foi também recusada. Nesse contexto, o Esta- do fez então a proposta de paga- mento de 55 milhões de euros para a compra dos direitos de voto e de saída de David Neeleman, sa- lientou, acrescentando que “a na- cionalização felizmente não foi precisa”. “Chegámos a uma solu- ção acordada, a uma boa solução para a TAP. Agora iniciaremos a fase mais desafiante”, frisou Pedro Nuno Santos. O ministro garantiu ainda que a opção a que o Governo chegou com a Comissão Europeia para o cenário de emergência e reestru- turação “era a opção que estava disponível para a TAP tendo em conta a avaliação que Comissão Europeia fez para a TAP a 31 de dezembro de 2019”. “Foi feita por indicadores objetivos, e não por declarações de membro do Go- verno”, afirmou. “Estamos a falar de companhia com 580 milhões de capitais próprios negativos. Em nenhum canto do mundoé em- presa em boa situação financeira”. concluiu. A TAP SA enquadra-se em empresa de natureza mercantil e nesse sentido não tem de integrar o perímetro do Estado. JOÃO LEÃO Ministro das Finanças “ Solução acordada é uma boa solução para a TAP. Foi sempre esse o nosso objetivo. PEDRO NUNO SANTOS Ministro das Infraestruturas “ Nacionalização felizmente não chegou a ser necessária. Mas foi importante estar em cima da mesa para fecharmos o acordo. PEDRO NUNO SANTOS “ SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 | PRIMEIRA LINHA | 5 6 | SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 PRIMEIRA LINHA O ESTADO NAS EMPRESAS Ao Observador, David Neeleman diz que a TAP irá continuar a pa- gar prémios. Dias depois Pedro Nuno Santos diz que não o permi- tirá, lembrando que em 2019 a empresa voltou a apresentar pre- juízos de 105,6 milhões. A 10 de março, a comissão executiva vol- ta atrás nessa intenção justifican- do-a com o impacto da pandemia nas reservas. Com a covid-19, a TAP anuncia a primeira re- dução de atividade, devido às restrições im- postas ao transporte aéreo e a acentuada que- da da procura, cortando 98% dos voos pro- gramados. A 1 de abril, recorre ao lay-off abrangendo 90% dos trabalhadores. Medidas excecionais já prolongadas até 31 de julho. O primeiro-ministro admite a nacionalização da TAP, de- pois de o mesmo terem fei- tos os ministros das Finan- ças e da Economia. Os priva- dos defendem que apenas é precisa “uma garantia esta- tal” para se financiar. Pedro Nuno Santos recusa ceder e diz que “agora a música é outra”. Bruxelas aprova a injeção de emergência até 1,2 mil mi- lhões de euros na TAP, mas diz que, como já estava em di- ficuldade antes da covid-19, tem seis meses para devolver o empréstimo ou propor uma reestruturação. A TAP diz ser “óbvio” que não vai conseguir pagar. O Governo põe condições à ajuda, como o reforço do seu controlo e a con- versão de créditos dos privados em capital. O conselho de administra- ção da TAP chumba a pro- posta do Estado com as condições para o emprés- timo de até 1.200 mi- lhões, voltando a pairar a ameaça de nacionaliza- ção. No mesmo dia, a TAP anuncia prejuízos de 395 milhões de euros no pri- meiro trimestre. 10.6.2020 29.6.202014.2.2020 19.3.2020 14.4.2020 CRONOLOGIA A TAP e os privados David Neeleman aceita sair da TAP por 55 milhões de euros. A solução para a empresa fica ape- nas dependente de a Azul aceitar ceder o direito de converter em capital o empréstimo obrigacio- nista de 90 milhões. 1.7.2020 A 1 de fevereiro de 2017 iniciava o mandato na Parpública para o trié- nio até 2019 com quatro elemen- tos executivos. Miguel Cruz era o presidente executivo, e tinha como seu vice Carlos Durães da Concei- ção, e vogais Maria Amália Freire de Almeida e Mário Pinto Lobo. O mandato terminou e a Par- pública aguardava por novas no- meações. Miguel Cruz, entretan- to, foi chamado, em junho, para a pasta de secretário de Estado do Tesouro, com a promoção de João Leão a ministro das Finanças. Sem Miguel Cruz, a Parpública ficou com três elementos executi- vos. Mas, uns dias depois, a empre- sa de capitais públicos comunicou a saída de Maria Amália de Almei- da com efeitos a 16 de junho. E a 2 de julho novo comunicado. Mário Pinto Lobo renunciou ao cargo a 26 de junho, tendo a Parpública acres- centado que a sua saída, no entan- to, produzirá efeitos nos termos da lei, ou seja, no final do mês seguinte ao da renúncia. E é assim que Má- rio Pinto Lobo ainda se mantém na Parpública, acompanhando o úni- co elemento que não renunciou. Carlos Durães Guimarães foi para a Parpública em 2010, pela mão do então ministro das Finanças Teixei- ra dos Santos, que já tinha sido o res- ponsável pela sua nomeação para a direção-geral do Tesouro, cargo que ocupou a partir de 2007 e até sair para a “holding” pública. Neste momento em que a Par- pública está no centro de um dos casos polémicos – é através dela que o Estado detém a participação na TAP –, a empresa tem dois ele- mentos executivos, um deles de- missionário. Contactados pelo Ne- gócios, a Parpública e o Ministério das Finanças garantem que a co- missão executiva está em plenas funções. “A comissão executiva en- contra-se no efetivo exercício das suas funções”, diz fonte oficial da Parpública, lembrando que Mário Pinto Lobo só sairá no final de ju- lho. As Finanças sustentam que “o vogal que renunciou manter-se-á temporariamente em funções, tal como a lei estabelece, pelo que es- tão asseguradas as condições de gestão da empresa”, garantindo que “o Governo espera concluir em bre- ve o processo de eleição do novo conselho de administração para o mandato 2020-2022”. AM Miguel Cruz foi para o Governo e a presidência da Parpública ficou vazia. Ficaram apenas dois gestores executivos. E um deles até já pediu para sair. Fica até ao final do mês. Parpública está apenas com dois gestores e um já pediu para sair Poucos são os processos de na- cionalização depois da PREC (processo revolucionário em curso), que em março de 1975 tornou público muito do uni- verso empresarial português. Depois desse período, as na- cionalizações inscritas nos li- vros de História aconteceram nos tempos recentes. E com go- vernos socialistas. Teixeira dos Santos anunciou, em novembro de 2008, que iria propor a na- cionalização do BPN, justifi- cando-a com a situação “muito delicada”. O então ministro das Finanças falou de uma situação “anómala e extraordinária”. E assim a 11 de novembro de 2008 foi publicado em Diário da República o diploma que na- cionalizou todas as ações do Banco Português de Negócios, ao mesmo tempo que aprovou o regime jurídico de apropria- ção pública por via de naciona- lização. E é ao abrigo desse diploma que o Estado tem nas suas mãos o poder de “apropriação públi- ca, por via de nacionalização, no todo ou em parte, de participa- ções sociais de pessoas coletivas privadas, quando, por motivos excecionais e especialmente fundamentados, tal se revele ne- cessário para salvaguardar o in- teresse público”. Esses atos fica- ram à distância de um decreto- -lei, ou seja, de uma decisão do Governo, sem passagem pelo Parlamento. Este ano o Gover- no também do PS anuncia a na- cionalização da Efacec, amea- çando fazer o mesmo à TAP. O diploma que consagra es- ses atos diz que é devida indem- nização aos acionistas das em- presas nacionalizadas, “tendo por referência o valor dos respe- tivos direitos, avaliados à luz da situação patrimonial e financei- ra” à data da nacionalização. Para determinar o valor, que tem de ter em conta o patrimó- nio líquido, “o Governo promo- ve a realização de uma avaliação a efetuar, pelo menos, por duas entidades independentes”. Ava- liação que tem 30 dias para ser realizada, prorrogável uma vez pelo mesmo período. Findo este processo, o Governo tem 15 dias para fixar a indemnização. AM Nacionalizações obrigam a avaliação independente Miguel Cruz saiu da Parpública para a Secretaria de Estado. Tiago Petinga/Lusa SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 | PRIMEIRA LINHA | 7 PRIMEIRA LINHA O ESTADO NA ECONOMIA U ma nacionalização--relâmpago para evi-tar o colapso da Efa-cec, com o Governo a prometer “a sua imediata repriva- tização, a executar no mais curto prazo possível”. Em causa está a participação de controlo (71,73%) da empresa detida pela empresá- ria angolana Isabel dos Santos, cuja passagem para a esfera do Es- tado português contou com o apoio dos acionistas minoritários, o Grupo José de Mello e a Têxtil Manuel Gonçalves (TMG). O Governo já tinha avisado que estava disponível para fazer tudo o que fosse necessário para viabilizar a Efacec. Esta quinta- -feira, 2 de julho, o Conselho de Ministros aprovou a nacionaliza- ção da posição de Isabel dos San- tos, alegando que a situação da empresa era insustentável. “Impõe-se uma intervenção do Estado que viabilize a sua con- tinuidade de forma a garantira es- tabilidade do valor financeiro e operacional da empresa, que gera um volume de negócios na ordem dos 400 milhões de euros, e per- mitindo, assim, a salvaguarda dos cerca de 2.500 postos de trabalho, da valia industrial, do conheci- mento técnico e da excelência em áreas estratégicas”, justifica-se no comunicado do Conselho de Mi- nistros. Nacionalização a que preço? A nacionalização acaba com a in- definição acionista na Efacec, mas o que é que se passou com o pro- cesso de venda dessa mesma po- sição de controlo da empresa, que tinha recebido cerca de 10 propos- tas de compra? O Negócios ques- tionou o Ministério da Economia, mas não obteve resposta até ao fe- cho desta edição. E face ao imbróglio judicial em que se encontram as empresas de- tidas por Isabel dos Santos, quan- to é que o Estado vai desembolsar e a quem vai pagar? O ministro Siza Vieira apenas reconheceu que “tem de haver uma discussão para saber quem tem direito a re- ceber a indemnização”. Os grupos José de Mello e TMG, que se mantêm na estrutu- ra acionista da Efacec, detendo a meias os restantes 28%, aplaudi- ram publicamente a nacionaliza- ção da empresa. Em comunicado conjunto, manifestaram “a sua sa- tisfação por ter sido encontrada uma solução que permite desblo- quear a situação de impasse em que a empresa se encontrava”. “Face à importância e relevân- cia da Efacec no panorama indus- trial em Portugal, face à elevada qualificação dos seus colaborado- res e face à necessidade de prote- ger os interesses de clientes e for- necedores, era urgente encontrar uma via para a empresa prosseguir a sua atividade e materializar o seu potencial de desenvolvimento”, defendem os acionistas minoritá- rios da empresa. Esta mesma quinta-feira, o Presidente da República promul- gou o diploma do Governo “desti- nado a salvar a Efacec”, como o classificou. Marcelo Rebelo de Sousa justificou a decisão tendo em conta “o acordo dos restantes acionistas privados”, a “natureza transitória da intervenção” e a “abertura simultânea de processo de reprivatização da posição ago- ra objeto de intervenção pública”. Aliás, ressalvou, “não se pode nem deve entender este passo como nacionalização duradoura, antes como solução indispensável de passagem entre soluções dura- douras de mercado”. Mas, admi- tiu, “o passo dado é crucial e impe- rioso para impedir o esvaziamen- to irreversível de uma empresa com grande relevância para a eco- nomia portuguesa, quer externa, quer internamente, quer em ter- mos de emprego, quer em termos de inovação e produção industrial nacional” . Isabel, salvadora e carrasca A Efacec estava em falência téc- nica em 2013, com prejuízos su- periores a 90 milhões de euros, a que se somaram mais de 20 milhões em 2015. E foi em no- vembro desse ano que Isabel dos Santos passou a controlar a em- presa, convertendo prejuízos em lucros logo no ano seguinte. De acordo com os últimos re- sultados conhecidos, a Efacec fe- chou 2018 com lucros de 14,1 mi- lhões de euros e vendas de 433,2 milhões. Em 31 de maio passado, tinha uma dívida bancária de 80 milhões de euros e uma emissão obrigacionista de 58 milhões, tendo-se agravado a sua dívida a fornecedores. *Com ABO e PC Governo decidiu nacionalizar a posição de controlo de Isabel dos Santos na Efacec. Governo põe a Efacec em sentido de Estado Financeiramente bloqueada há já seis meses, refém de uma acionista maioritária judicialmente cercada e de um processo de venda a passo de caracol, a Efacec acaba de ser nacionalizada, com o Governo a prometer a sua “imediata” reprivatização. Ricardo Castelo RUI NEVES* ruineves@negocios.pt “ A excecionalidade da intervenção do Estado [na Efacec] deve ser feita por período restrito no tempo (...), estando prevista a sua imediata reprivatização, a executar no mais curto prazo possível. GOVERNO Comunicado do Conselho de Ministros “ 71,7 NACIONALIZAÇÃO O Estado português fica temporariamente com 71,73% do capital da Efacec, a participação da empresária angolana Isabel dos Santos. 8 | SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 que acontece no futebol, o desporto mais popular e mediatizado, acaba por ser uma metáfora da vida. E o que su- cedeu com Bruno Lage, um treinador que pegou no Benfica em crise e con- seguiu ser campeão com um registo no- tável, valorizando ainda jovens jogado- res, mas que poucos meses depois da glória é despedido por causa de uma sé- rie negra de jogos, mostra-nos que tudo é transitório. Quem deve olhar com atenção para a história de Lage é Antó- nio Costa, que ainda nem tem rival para o cargo de primeiro-ministro, mas que tal como o ex-treinador dos encarna- dos pode rapidamente ser vítima dos resultados. Também Costa com Centeno nas Finanças conseguiu um registo inédi- to na democracia. Os ventos favoráveis da política do BCE e a explosão do tu- rismo aceleraram a economia e permi- tiram saldos inéditos nas contas públi- cas e estabilidade social. Mas tudo a pandemia levou. Os nú- meros mais recentes do desemprego mostram apenas uma pequena parte da tragédia económica que vivemos. O confinamento provocou uma destrui- ção massiva de postos de trabalho e ar- rasou negócios que até fevereiro tinham expectativas francamente positivas. A queda do PIB nos últimos quatro meses foi a mais acelerada desde 1928. Do impacto real do novo coronavírus só vamos poder ter uma ideia nos pró- ximos meses. O apoio da rede lançada pela Segurança Social, como o paga- mento de parte dos salários aos traba- lhadores do lay-off, permitiu mitigar o primeiro impacto do vírus na econo- mia, mas quando esses apoios desapa- recerem há empresas que não vão aguentar o quadro de pessoal que ti- nham antes da crise. E há negócios que pura e simplesmente desapareceram com a crise e não vão regressar. A evolução dos contágios na Área Metropolitana de Lisboa também dei- xa mais a nu as faltas de resposta na luta contra a pandemia. Há abundantes si- nais de fraca resposta das autoridades, desde o caos dos transportes, a proble- mas de coordenação que revelam a in- capacidade em monitorizar todos os in- fetados para poder travar o surto, o que levou até o próprio presidente da Câ- mara de Lisboa a dizer que “há muitos chefes” e “poucos operacionais” no ter- reno. António Costa enfrenta a maior cri- se económica com um elenco governa- tivo muito fraco. Enquanto Lage no Benfica tinha o melhor plantel dispo- nível da liga portuguesa, Costa conta com alguns ministros e ministras que nem numa liga política distrital tinham lugar. Costa e a síndrome de Lage Em poucos meses, Bruno Lage passou de campeão a despedido. De herói de uma narrativa inédita a vilão das derrotas. Mas não é só no futebol que as coisas mudam rapidamente. Na política, pode acontecer o mesmo. António Costa ainda goza de gran- de popularidade, mas se não tiver cuidado pode ser vítima da mesma síndrome por causa dos maus resultados da economia. ARMANDO ESTEVES PEREIRA CONTAS CORRENTES O Nuno Veiga/Lusa REABERTURA DE FRONTEIRAS Durante séculos os dois vizinhos ibéricos viveram de costas voltas. Em 1986, tudo mudou com a adesão de ambos à en- tão Comunidade Europeia. A raia que antigamente separa- va transformou-se em ponto de reunião. Aumentou a inter- dependência económica. Subitamente em meados de mar- ço, a pandemia provocou um encerramento das fronteiras, causando grande prejuízo aos dois países, particularmente às cidades e vilas raianas. Esta semana voltaram a reabrir, com direito a cimeira de chefes de Estado e de Governo. Os contribuintes portugueses, que já são banqueiros forçados, são de novo os acionistas maioritários da TAP. É fundamental salvar uma em- presa estratégica, por isso a mão vi- sível do Governo era quase inevitá- vel. A companhia é decisiva para a economia portuguesa, mas é impor- tante que mantenha o seu papel de ligação intercontinental e cabe à ges- tão cuidar que o bilhete paraos con- tribuintes não seja demasiado eleva- do. Há que salvar a empresa, mas respeitando o nosso dinheiro. Os portugueses são donos da TAP Algo completamente diferente PODER DA CHINA EM HONG KONG A entrada em vigor da nova lei de segurança nacional em Hong Kong é um reforço do poder central do império chinês no antigo território administrado pelos britâni- cos. A mão pesada de Pequim sobre os manifestantes é uma ameaça para a democracia neste oásis de liberda- de. No regime chinês não há coincidências, por isso não deixa de ser simbólico que a entrada em vigor da nova le- gislação tenha sido a 1 de julho, aniversário da devolução desta antiga joia do império britânico à China. SALDO NEGATIVO SALDO POSITIVO SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 | SEMANA | 9 A TAP é estratégica, a Efacec é estratégica. Com esta palavra mágica os decisores públicos dispensam-se de apresentar o custo e o benefício das opções possíveis para as empresas em apuros, cujos problemas nunca são indissociáveis da influência política. Já aqui estivemos – e aqui continuaremos a estar. MODERADO RADICAL BRUNO FARIA LOPES Gráfico da semana Na política está a montar-se um pas- sa-culpas entre António Costa e o melhor amigo Lacerda Machado – que supostamente acompanhou a gestão da TAP – e o ministro Pedro Nuno Santos. O ministro tem um es- tilo demasiado irascível, mas é difí- cil argumentar que a Comissão Eu- ropeia não considerou a TAP viável por causa daquilo que Pedro Nuno Santos diz no Parlamento português – em Bruxelas olha-se mais para os números. E os números mostram uma companhia numa situação mui- to frágil. A TAP estava em transfor- mação e expansão quando a pande- mia chegou, aumentando a dívida para investir, mas isso não chega para deixar passar a gestão de fininho, nem as acções de Neeleman desde que chegou à empresa. Artigo em conformidade com o antigo Acordo Ortográfico qui estamos, de novo, neste lugar: uma empresa, desta vez pública e privada, que toda a gente diz ser “estratégica”, com uma gestão privada que teve um suposto acompanhamento por parte do Estado e que, perante um choque eco- nómico, precisa de dinheiro público para sobreviver, num cenário em que Bruxelas considera a empresa inviável e carente de uma reestruturação pro- funda. O resultado expectável será, por isso, um esforço financeiro dos contri- buintes em quem ninguém nesta altu- ra consegue pôr um tecto – contribuin- tes que têm uma série de perguntas a que ninguém ainda deu uma resposta. O parágrafo anterior diz respeito à TAP, mas precisamente quando termi- nei de o escrever saíram as notícias so- bre a nacionalização da Efacec, o que me leva à primeira pergunta sem res- posta. O que justifica o envolvimento de recursos públicos avultados nestas empresas? Sei que dirão que a TAP é estratégica, e que a Efacec é estratégi- ca, mas essa não é a forma de fazer po- lítica pública – não sou eu que o digo, é a OCDE, por exemplo, no seu guia de boas prá- ticas sobre compra de empresas com recursos públicos, no qual fala em análise custo-benefício. Sobre a TAP, por exemplo, eu posso intuir que o seu carácter estra- tégico tem a ver com o papel da transportadora para a indústria do turis- mo num país periférico no qual esse tu- rismo valia 14% do PIB antes da pan- demia. Mas nem essa intuição, nem a conversa emocional da companhia de bandeira que serve “a diáspora” e “a CPLP” e afins servem por si só para jus- tificar o investimento de largas cente- nas de milhões na TAP. A política prepara-se para repetir o erro do Novo Banco, no sentido em que não apresenta uma análise quantitati- va sobre os cenários possíveis para as empresas – cenários todos eles maus, que levam à escolha da hipótese menos desfavorável para o Estado e o interes- se colectivo. Este pode ser um argumento algo inocente, uma vez que as análises quantitativas podem ser dobráveis à vontade da política. Mas, ainda assim, é um mínimo olímpico de transparência e de res- peito mostrar quais eram as opções, que cus- tos tinham, o que moti- vou a escolha. O Parlamento poderia fazer mais nesta frente, já para não fa- lar no poder da palavra que o Presiden- te da República tem, mas que infeliz- mente desbarata. Este erro não é só importante pela opacidade na afectação de grandes re- cursos públicos num país em que o cus- to de oportunidade de não aplicar esse dinheiro noutro lado é enorme (com- pare-se estes valores com os que o Go- verno planeia gastar em saúde e educa- ção em plena pandemia). O erro é es- pecialmente relevante porque, quer na TAP quer na Efacec, a situação das em- presas não é separável da influência da política. Na TAP, a política teve a ver com a privatização da empresa e a escolha destes accionistas privados, com a far- sa que foi a recompra das acções em 2016 (que, para fazer a “figura” de que o Estado tinha controlo estratégico da TAP tornou mais cara a saída de Nee- leman da empresa em caso de naciona- lização), com o acompanhamento que o Estado fez dessa gestão privada e, por fim, com o fracasso em demonstrar em Bruxelas a viabilidade da empresa. Na Efacec, tem a ver com o acolhimento totalmente acrítico que a política deu à entrada de dinheiro angolano de ori- gem altamente incerta, neste caso di- nheiro de Isabel dos Santos. No final ninguém se responsabili- za, ninguém responde e ninguém escla- rece qual o custo-benefício das opções tomadas. A pandemia terá as costas lar- gas. Os contribuintes também. Artigo em conformidade com o antigo Acordo Ortográfico A Dói muito? É “estratégico”, sr. contribuinte Quer na TAP quer na Efacec, a situação das empresas não é separável da influência da política. SEMPRE NO VERMELHO PROFUNDO Capitais próprios da TAP, em milhões de euros A situação financeira da TAP foi sempre extremamente frágil e não melhorou depois da privatização. A autópsia à gestão privada da TAP Fonte: Tribunal de Contas, TAP 10 | SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 ECONOMIA O s trabalhadores in-dependentes que já fizeram descontos para a Segurança Social e que estão a receber o apoio à redução de atividade (que tem o valor míni- mo de 219,4 euros) vão poder aderir ao novo apoio extraordi- nário de 438,81 euros que será pago de julho a dezembro, escla- receram ao Negócios deputados do PS. No entanto, a proposta implicará também novas obriga- ções contributivas durante até três anos, pelo que deverão ava- liar se a adesão compensa. Em causa está o apoio ex- traordinário para trabalhadores independentes e da economia informal, que foi aprovado na vo- tação da especialidade no âmbi- to do Orçamento suplementar. Estão abrangidos os trabalhado- res “que estejam em situação de desproteção económica e social e em situação de cessação de ati- vidade, como trabalhadores por conta de outrem ou como traba- lhador independente, por moti- vo de paragem, redução ou sus- pensão da atividade laboral ou quebra de, pelo menos, 40% dos serviços habitualmente presta- dos”. A questão não tem sido clara porque o apoio se dirige, em pri- meiro lugar, a quem não tem apoio nenhum. Por outro lado, numa entrevista ao Eco publica- da na segunda-feira o vice-pre- sidente da bancada do PS João Paulo Correia disse que este apoio não se aplicaria aos inde- pendentes já cobertos pelo apoio em vigor. No entanto, a proposta apro- vada na especialidade prevê ex- pressamente que o novo apoio (de 438,81 euros) possa ser atri- buído “em alternativa” aos apoios extraordinários que já existem, como os dos indepen- dentes ou o dos informais. Questionado pelo Negócios sobre o sentido da norma que foi aprovada, o deputado João Pau- lo Correia referiu esta quinta- -feira que o sentido da proposta se foi consolidando durante o trabalho na especialidade e que o texto aprovado pressupõe “a migração” para o novo apoio. Também a deputada do PS Marina Gonçalves, que acompa- nhou a votação na especialidade,responde que “um trabalhador com apoio no âmbito do artigo 26.º do DL 10-A/2020, de 13 de março pode, por via do apoio que aprovamos, transitar para este novo regime”. E será que compensa? O apoio que já existe para os in- dependentes termina em setem- bro, não se sabendo ainda se será estendido, enquanto o novo ter- mina em dezembro. No entanto, é preciso ter em conta que quem aderir ao novo subsídio de 438,81 euros cria novas obriga- ções contributivas por um prazo de 30 meses além do apoio. É que a proposta também diz que “a atribuição do apoio pres- supõe a integração no sistema de Segurança Social, pelo menos, durante 30 meses findo o prazo de concessão do apoio”. A con- tribuição equivale à do trabalha- dor independente (21,4%) “com base, pelo menos, no valor de in- cidência do apoio” (438,81 eu- ros), o que dá cerca de 94 euros por mês. De julho a dezembro só se paga um terço deste valor, mas o remanescente deve ser pago ao longo dos doze meses de 2021, sem juros. A proposta inicial do PS pre- SEGURANÇA SOCIAL Os independentes que já estão a receber apoio podem aderir à nova prestação de 439 euros, se esta for mais alta do que o que recebem, esclarecem os deputados do PS. Ficam, no entanto, com novas obrigações contributivas durante três anos, pelo que devem avaliar se compensa essa troca. Independentes podem trocar de apoio mas têm de ver se compensa O orçamento retificativo foi votado na especialidade esta semana. Esta sexta-feira vai a votação final global. Um trabalhador com apoio [pode] transitar para este novo regime. MARINA GONÇALVES Deputada do PS “ CATARINA ALMEIDA PEREIRA catarinapereira@negocios.pt via que a estes 30 meses de obri- gação contributiva que come- çam a contar em janeiro fossem subtraídos os meses de descon- to que os independentes já têm. No entanto, a proposta que aca- bou por ser corrigida durante a votação na especialidade é me- nos favorável neste ponto, uma vez que limita a dedução, sendo apenas considerados os 12 me- ses anteriores à data de conces- são do apoio. Assim, um independente SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 | ECONOMIA | 11 pode receber 2.632,86 euros de julho a dezembro. No entan- to, numa situação limite, pode não ter rendimentos a partir de janeiro mas terá ainda de pagar a maior parte das contribui- ções que ao longo de 36 meses totalizam 3.380 euros, caso não tenha tido descontos para a Segurança Social, ou 2.254 euros, caso tenha tido descon- tos nos doze meses anteriores ao apoio. Tudo depende das contri- buições que tenha e das futuras perspetivas de trabalho, que nalguns casos a esta distância podem ser difíceis de avaliar. O deputado José Soeiro, do Blo- co de Esquerda, que tinha uma proposta sem “período de fide- lização”, tem vindo a alertar para o facto de a troca poder não compensar. “Contas feitas, as pessoas que entretanto não encontra- rem um emprego poderão vir a pagar em contribuições um va- lor superior ao apoio a receber, mesmo se, ao manter contri- buições, estão a constituir di- reitos futuros (acesso a subsí- dio de desemprego, pensão de reforma, entre outros)”, lê-se num texto divulgado pelo Blo- co de Esquerda. Também é possível a inscri- ção no regime dos trabalhado- res por conta de outrem ou no serviço doméstico com remu- neração mensal, que têm re- gras próprias. Além de se dirigir a traba- lhadores informais, indepen- dentes, e do serviço doméstico, a proposta abre a porta à inte- gração de advogados e solicita- dores, ao estabelecer que os trabalhadores abrangidos por sistema de proteção social di- ferente do da Segurança Social também beneficiam do apoio, que é pago pelo respetivo siste- ma. O Bloco de Esquerda viu aprovada uma proposta que al- tera o próprio regulamento da Caixa de Previdência dos Ad- vogados e Solicitadores. A proposta também revela que o Governo ainda vai regu- lamentar o apoio. Pedro Simões O novo apoio de 438 euros que será pago entre julho e dezem- bro também se dirige a trabalha- dores informais e a versão final da proposta do PS que acabou por ser aprovada na especialida- de, no âmbito do Orçamento re- tificativo, cria uma nova via para que estes trabalhadores denun- ciem os empregadores respon- sáveis pelo trabalho não decla- rado. O novo apoio pode ser re- querido mediante apresentação de documento comprovativo do trabalhador de rendimentos de trabalho (de 40% ou mais) ou através de uma declaração sob compromisso de honra. “Sempre que a declaração sob compromisso de honra indi- que a existência de trabalho por conta de outrem não declarado, o serviço competente da Segu- rança Social, além da ação de fis- calização a que houver lugar, re- mete a informação à Autorida- de para as Condições do Traba- lho para os devidos efeitos”, lê- -se na proposta aprovada. A ideia é que a inspeção do trabalho possa responsabilizar o empregador pela situação de trabalho irregular e reclamar o pagamento integral dos salários e as contribuições para a Segu- rança Social. O processo não será, no entanto, automático. De acordo com o deputado José Soeiro foi o Bloco de Es- querda que propôs o aditamen- to desta norma, que não consta- va da proposta original do Parti- do Socialista (PS). A ideia deste novo apoio foi apresentada em linhas gerais no âmbito do Programa de Estabi- lização Económico e Social (PESS), em junho. A proposta que foi aprovada na especialidade, no Orçamen- to suplementar, que é votado esta sexta-feira em votação final global, também prevê que o apoio seja regulamentado pelos membros do Governo responsá- veis pelas áreas das finanças, Se- gurança Social e justiça. A vinculação de trabalhado- res não declarados tem como contrapartida a obrigatoriedade de descontos durante um perío- do de 36 meses (ver texto à di- reita), o que implica o pagamen- to das respetivas contribuições. NISS na hora já teve 80 mil adesões Esta quinta-feira a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godi- nho, afirmou em entrevista ao Público e à Rádio Renascença que o número de Segurança So- cial na Hora (NISS na hora), criado em janeiro, abrangeu até ao momento 80.700 pessoas que estavam “fora do sistema de Segurança Social e que entra- ram no sistema”. O programa “NISS na hora” dirige-se a cidadãos estrangei- ros que queiram exercer ativida- de profissional por conta de ou- trem, como trabalhadores do serviço doméstico ou como in- dependentes. Também pode ser pedido pelas entidades empre- gadoras. CATARINA ALMEIDA PEREIRA Parlamento cria nova via para denunciar trabalho informal Os trabalhadores informais que percam rendimento vão poder denunciar o empregador quando pedem o novo apoio de 438 euros. Informação segue para a ACT. A Autoridade para as Condições do Trabalho poderá verificar a denúncia e reclamar dívidas ao empregador. PSD e Bloco viabilizam hoje o retificativo A proposta de Orçamento re- tificativo do Governo, que so- freu algumas alterações no Parlamento, será aprovada esta sexta-feira com a absten- ção do PSD e do Bloco de Es- querda. Quanto ao PCP, vota- rá contra a proposta, o que acontece pela primeira vez desde que António Costa é pri- meiro-ministro. Depois da votação na espe- cialidade que decorreu na quar- ta e quinta-feira, os deputados reúnem-se esta sexta para a vo- tação final. Tendo o PS 108 dos 230 deputados, basta a absten- ção do Bloco de Esquerda para que o diploma seja aprovado. Ainda assim, o PS conta com o conforto da abstenção do se- gundo maior grupo parlamen- tar, o PSD, sabe o Negócios. As declarações de Rui Rio e as vi- tórias alcançadas pelo partido nas votações na especialidade apontam para que o partido via- bilize o documento, confirmou fonte do partido ao Negócios. “Nós deixámos passar o Orça- mento suplementar na genera- lidade e provavelmente na vo- tação global final por uma ques- tão de interesse nacional. Era gravíssimo que oOrçamento suplementar chumbasse e o país ficasse sem meios finan- ceiros para responder àquilo que é necessário”, afirmou o presidente do PSD no sábado passado. O Bloco de Esquerda ain- da não se pronunciou sobre a votação final, mas a posição as- sumida inicialmente não deixa margem para um chumbo. “A Mesa Nacional do Bloco de Es- querda, esperando a inscrição dos avanços negociais (...) de- cide viabilizar o Orçamento do Estado suplementar, fazendo depender o sentido de voto fi- nal do aprofundamento do al- cance das medidas relativas ao SNS, lay-off, subsídio de de- semprego e proteção da habi- tação”, lê-se na resolução de 7 de junho. ME 12 | SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 ECONOMIA À medida que vai au-mentando o rasto de destruição da pande-mia de covid-19 no mercado de trabalho, este ganha também novas matizes. Se no iní- cio, as vítimas foram sobretudo as mulheres, a situação inverteu-se em maio e junho, com os homens a ganharem uma posição destaca- da nos empregos destruídos. Sete em cada dez empregos perdidos no trimestre centrado em maio eram detidos por homens. De acordo com as estimativas do Instituto Nacional de Estatísti- ca (INE), entre o trimestre centra- do em fevereiro e o centrado em maio foram destruídos 88 mil em- pregos (sem ajustamento da sazo- nalidade), dos quais 66 mil eram detidos por homens. Estes dados representam uma inversão com- pleta face ao que se verificou nos primeiros meses da crise em que a esmagadora maioria dos empre- gos eliminados pertenciam a mu- lheres, tal como o Negócios escre- veu há cerca de duas semanas. Com efeito, até abril, nove em cada dez empregos destruídos eram de mulheres, mostram os dados do INE, que reiterou ao Ne- gócios que as estimativas sobre a desagregação dos empregos por sexo têm enorme segurança. Se recuarmos a março, a tendência era a mesma: 88% dos empregos desaparecidos eram femininos. Embora o INE confirme esta tendência de destruição de em- pregos por género – primeiro nas mulheres e agora nos homens –, não cabe ao organismo oficial de estatísticas avançar explicações para o fenómeno. No entanto, é provável que a justificação resida sobretudo num fator que distin- gue esta crise das precedentes: o encerramento das escolas. O Governo mandou encerrar todas as escolas do país a partir de 16 de março. Sem terem onde dei- xar as crianças, é provável que al- gumas famílias tenham sido obri- gadas a prescindir de um dos em- pregos. Tendo as mulheres ainda hoje um papel mais relevante no cuidado às crianças e tendo mui- tas vezes empregos mais mal re- munerados, é possível que tenham sido estas a sacrificar primeiro o seu emprego, sobretudo nos seto- res com mais informalidade, que acaba por impedir o acesso aos apoios da Segurança Social. Curiosamente, os dados do Instituto do Emprego e Formação Profissional não denotam estas di- ferenças por género na destruição do emprego. Ao longo de março, abril e maio, as inscrições de ho- mens e mulheres nos centros de emprego caminharam lado a lado, numa proporção idêntica. No entanto, vale a pena lem- brar que os dados do IEFP têm uma natureza distinta dos do INE. Além de serem registos adminis- trativos, estes números do IEFP revelam o número de pessoas que se inscreveram nos centros de em- prego para poderem receber o subsídio de emprego e/ou porque ambicionam encontrar novo em- prego. Já os dados do INE, além de resultarem de inquéritos a amostras representativas da po- pulação empregadas, dizem res- peito à variação do número de em- pregos, desagregados, neste caso, por sexo. Mulheres prestes a tornarem-se maioritárias Os homens continuam a ser uma posição maioritária na população empregada, mas a diferença é, nes- te momento, muito pequena. O di- ferencial era enorme até à crise fi- nanceira mas depois disso redu- ziu-se de forma substancial, man- tendo a distância estável ao longo dos últimos anos em que o merca- do de trabalho foi recuperando. Resta saber agora como ficará a distribuição do emprego com esta nova crise. Neste momento, e depois da forte destruição de em- pregos masculinos em maio, a di- ferença é de apenas 68 mil num to- tal de 4,66 milhões de empregos. MERCADO DE TRABALHO Epidemia chegou em força ao emprego dos homens em maio As mulheres foram as primeiras a sentir as ondas de choque da epidemia no mercado de trabalho, mas a situação inverteu-se rapidamente. Sete em cada dez empregos destruídos no trimestre centrado em maio eram de homens. MANUEL ESTEVES mesteves@negocios.pt PRIMEIRO AS MULHERES, DEPOIS OS HOMENS Número de empregos destruídos, desagregados entre homens e mulheres (em milhares) A crise no mercado de trabalho provocada pela pandemia sentiu-se primei- ro nas mulheres. Em março, mas também em abril, 90% dos empregos des- truídos eram de mulheres. No trimestre centrado em maio, 70% eram mas- culinos e, por serem muitos, isso equilibrou a distribuição por sexo. Fonte: INE. MULHERES PESAM CADA VEZ MAIS NO EMPREGO Número de empregos detidos por mulheres e homens (em milhares) O diferencial entre homens e mulheres na população empregada reduziu- -se de forma muito significativa na crise financeira cujos efeitos no mer- cado de trabalho se prolongaram até 2013. Depois, a distância estabilizou e resta saber o que acontecerá após a atual crise. Fonte: INE. 68 DIFERENCIAL Neste momento, há apenas mais 68 mil homens do que mulheres na população empregada. Publicidade CÉU ABERTO UNIÃO EUROPEIA Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional SÉRIE 5 DIAS GOVERNAÇÃO DO BANCO DE PORTUGAL A lei diz que o governa-dor do Banco de Por-tugal é “inamovível”, que só em circunstân- cias muito específicas, que nun- ca foram aplicadas, pode ser exo- nerado pelo Governo. E diz tam- bém que a instituição goza de “autonomia”. Mas no terreno contam-se histórias um pouco diferentes. Ao longo da vida da instituição, muitos foram os epi- sódios de tensão entre o banco central e o Executivo que mos- tram as consequências de rela- ções demasiado próximas – ou excessivamente frias – entre os dois centros de poder. Muitos dos episódios de dis- cordância ou de tentativa (frus- trada ou conseguida) de influen- ciar as decisões do regulador sur- giram com a resolução do Ban- co Espírito Santo (BES) e a cria- ção do Novo Banco. E os proble- mas começaram ainda antes da queda da instituição financeira. Conta uma fonte, que pediu para não ser identificada, que o valor da injeção de 4,9 mil milhões de euros feita no Novo Banco, aquando da divisão do BES em banco bom e banco mau, teve in- terferência direta do Governo e da então ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque. Apesar de o ónus do montan- te ser assumido pelo BdP, a mi- nistra terá pressionado para que a injeção não fosse mais avulta- da, desde logo, pela perceção da restrição financeira que existia ainda em 2014. Portugal tinha decidido sair do programa de resgate da troika sem apoio cau- telar apenas uns meses antes, em maio, e tinha uma pressão enor- me para mostrar credibilidade perante os mercados. Contactada, Maria Luís Albu- querque recusou fazer quaisquer comentários sobre o assunto, fri- sando que já disse tudo o que ti- nha a dizer no âmbito da comis- são de inquérito parlamentar. Mas as divergências no caso BES não ficaram por ali. Tam- bém no desenho do plano sobre o que fazer com o Novo Banco, várias fontes contam ao Negó- cios que o BdP tinha inicialmen- te uma ideia diferente. Por exemplo, não estaria nas inten- ções do supervisor fazer uma venda rápida do Novo Banco – isso não foi abordado no fim de semana de 2 e 3 de agosto, quan- do a resolução foi decidida, ga- rante uma fonte próxima do pro- cesso. A ideia da venda rápida terá sido do governo de Passos Coelho e acabou por vingar. Tensão continua com Costa Mais tarde, no primeiro manda- to de António Costa, o Novo BdP é independente na lei, mas não selivra de tensões Na lei a independência está consagrada, mas no terreno as interferências e as pressões vão surgindo ao sabor da gravidade dos acontecimentos. MARGARIDA PEIXOTO margaridapeixoto@negocios.pt Ainda ministro das Finanças, Mário Centeno acusou o governador do Banco de Portugal Carlos Costa – a quem deve suceder – de falha de informação grave no caso Banif. 14 | SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 3.ª feira As propostas no Parlamento 5.ª feira Os bancos centrais 6.ª feira Independência 2.ª feira Os casos 4.ª feira Os governadores e os administradores Banco volta a ser motivo de for- tes atritos. No final de 2015, o banco estava descapitalizado e só se vislumbravam duas opções: ou reforçar a instituição finan- ceira, com nova intervenção do Fundo de Resolução, ou passar dívida do banco bom para o mau. A solução, adotada em de- zembro, de passar algumas obri- gações do perímetro do Novo Banco para o BES foi ideia do Banco de Portugal, mas muito controversa. O Governo de An- tónio Costa sofreu com ela: no arranque do seu mandato, num momento em que precisou de conquistar a confiança dos in- vestidores, Portugal comprou uma guerra com fundos de inves- timento como a Pimco e a BlackRock. Apesar de só ter tomado pos- se em novembro, este era já o se- gundo tropeção do Executivo do PS com Carlos Costa, o governa- dor que foi escolhido por José Sócrates, mas reconduzido con- tra a vontade dos socialistas pou- co antes de o Executivo de Pas- sos Coelho e Paulo Portas termi- nar o mandato. O primeiro embate tinha sido também em dezembro, a propó- sito da resolução do Banif. Na quarta-feira seguinte à notícia da TVI que põe em causa o futuro do banco, o Banco Central Europeu retirou ao Banif o acesso a linhas de liquidez, uma informação que o Governo diz não ter recebido por parte do Banco de Portugal. Mais tarde, quando veio a pú- blico que a iniciativa tinha parti- do do próprio BdP, Ricardo Mourinho Félix, então secretá- rio de Estado Adjunto, do Tesou- ro e das Finanças, acusou o go- vernador de “falha de informa- ção grave”, uma expressão pró- xima da “falta grave”, o único motivo que pode justificar a exo- neração. O então ministro das Finanças, Mário Centeno, rea- firmou a acusação de que Carlos Costa tinha cometido uma “fa- lha grave de transmissão de in- formação”, o que deu gás ao PCP e ao BE para pedirem a demis- são de Carlos Costa. A saga dos dividendos Outro motivo de discórdia fre- quente tem a ver com a entrega de dividendos por parte do Ban- co de Portugal ao Estado. Duas fontes contam ao Negócios que desde o primeiro orçamento de Mário Centeno que a pressão para aumentar os montantes foi sempre muito forte. As entregas referentes a 2016, 2017 e 2018 foram sempre em crescendo até atingirem 645 milhões de euros. Em maio des- te ano, o banco central liquidou 607 milhões de euros a favor do Estado, referentes a 2019. Os va- lores foram preciosos para cum- prir o objetivo de baixar o défice orçamental. Mas uma terceira fonte asse- gura que a pressão não foi um ex- clusivo do Governo de António Costa. Já no tempo de Passos Coelho existia, “a diferença é que no anterior governo o BdP não aceitou”, diz. A demissão de um vice Mas na história do BdP, ainda antes de a independência estar tão consagrada na lei como atualmente, há um episódio co- nhecido de alta tensão. Passou- -se em 1993, era Miguel Beleza governador do Banco de Portu- gal, António Borges o seu vice, Braga de Macedo o ministro das Finanças. O governo pedia uma política de desvalorização do es- cudo, mas António Borges pros- seguia com a tese do “escudo for- te”. Um dia, na cerimónia da to- mada de posse de um novo ges- tor do BdP, Braga de Macedo acusa o regulador de ignorar a economia real. António Borges sentiu as palavras do ministro como uma tentativa de ingerên- cia e demitiu-se, em conflito com o Executivo. Miguel Beleza permaneceu ainda até 1994, chegando a tra- balhar com Eduardo Catroga, mas por pouco tempo. O ex-mi- nistro das Finanças nega ao Ne- gócios que a saída de Beleza te- nha acontecido por divergências de política. “Não houve grandes tensões, houve uma coordena- ção na política monetária”, asse- gura Catroga. “Desvalorizar o es- cudo era uma decisão partilha- da”, frisa, lembrando que foi pre- ciso procurar a estabilidade cambial para o processo de ade- são ao euro. Catroga diz que Beleza colo- cou o lugar à disposição por mo- tivos pessoais e lembra que na- quela altura, ainda antes das al- terações à lei orgânica do BdP que viriam a conferir mais auto- nomia ao governador e ao banco central, era suposto haver uma coordenação próxima com o Executivo. Miguel Beleza, então governador, e o vice António Borges tiveram momentos de tensão com Braga de Macedo. É de facto surpreendente que [a informação] não tenha sido transmitida na altura devida. (...) É uma falha grave que nós reputamos de falha grave de transmissão de informação. MÁRIO CENTENO Ex-ministro das Finanças, em 2016 Não houve grandes tensões, houve uma coordenação na política monetária. EDUARDO CATROGA Ex-ministro das Finanças, sobre a sua relação com Miguel Beleza, ex- -governador do Banco de Portugal. “ Ainda ministro das Finanças, Mário Centeno acusou o governador do Banco de Portugal Carlos Costa – a quem deve suceder – de falha de informação grave no caso Banif. Miguel Baltazar Jorge Paula SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 | EMPRESAS | 15 16 | SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 SÉRIE 5 DIAS GOVERNAÇÃO DO BANCO DE PORTUGAL N ão é só o Governo que pode exercer pressão sobre as decisões do Banco de Portugal (BdP). Também o banco central tem ferramentas que interferem de forma quase direta no desem- penho do Executivo – mesmo ten- do em conta que as políticas cam- bial e monetária já estão centrali- zadas a nível europeu. Desde logo, a credibilidade que o banco foi construindo con- fere um poder valioso ao seu de- partamento de “research” econó- mico. “O Banco de Portugal pode ter um papel de oposição pela pa- lavra”, lembra um economista, que já lidou de perto com o banco central, ao Negócios. A análise económica e as projeções que o banco vai publicando são uma for- ma de ancorar ou tirar o tapete às medidas de política que estejam a ser decididas pelo Executivo. Por exemplo, em junho, o BdP publicou projeções para a reces- são esperada este ano que põem em causa o cenário macroeconó- mico subjacente ao Orçamento do Estado (OE) suplementar. Isso alimentou as críticas da oposição, que questionou o novo ministro das Finanças, João Leão, sobre se poderia garantir que a retificação à lei do OE será suficiente para as- segurar as necessidades de finan- ciamento esperadas até ao final de 2020. É que o Governo projetou uma recessão de 6,9% para o PIB, en- quanto o BdP diz que a contração será, pelo menos, de 9,5%, a pior desde 1928. Num cenário mais ad- verso, que admite uma nova vaga da pandemia no outono, com ne- cessidade de reintroduzir medi- das de confinamento, a recessão poderá atingir os 13,1%. Com o mandato a chegar ao fim (termina agora a 10 de julho), os custos de Carlos Costa assumir uma projeção bastante mais nega- tiva que o Executivo são diminu- tos, lembra o mesmo economista. A política macroprudencial é outra forma que o BdP tem de in- terferir no sistema financeiro com uma ligação direta à economia. Por exemplo, o banco central pode impor medidas que restringem a concessão de crédito por parte da banca, limitando o crescimento do consumo. Também pode pressio- nar diretamente os bancos a resol- ver problemas de grandes empre- sas, sob pena de lhes exigir a cons- tituição de mais provisões para co- brir riscos dos ativos. Já os governos não podem pressionar a banca nos mesmos moldes, ficando mais limitados se o banco central for avesso às suas ideias, ou beneficiados se o enten- dimento fluir. “Aindependência do BdP foi uma das condições, ainda antes dos critérios de Maastricht, para Portugal aderir ao euro”, frisa Pe- dro Braz Teixeira, economista e diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade, sublinhando a importância de a política monetária ser indepen- dente do Governo. “O poder da palavra que os bancos centrais têm pode ser mui- to construtivo”, reforça, lamentan- do que o BdP tenha sido demasia- das vezes “omisso” nesta forma de poder, nomeadamente no que diz respeito às reformas necessárias para promover o crescimento eco- nómico. As projeções do Banco de Portugal para a economia colocam pressão sobre João Leão, novo ministro das Finanças. Manuel de Almeida/Lusa BdP também pode afetar política do Governo O “poder da palavra” do Banco de Portugal é uma forma de interferir diretamente na economia, nomeadamente no momento de fazer projeções económicas. Mas há mais. MARGARIDA PEIXOTO margaridapeixoto@negocios.pt O poder da palavra que os bancos centrais têm pode ser muito construtivo. PEDRO BRAZ TEIXEIRA Economista e coordenador do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade “ O BdP opôs-se a vários pontos da re- forma da supervisão financeira de- sejada por Mário Centeno. Nomea- damente, à sujeição do banco à fis- calização da Inspeção-Geral de Fi- nanças, um serviço na dependência do Ministério das Finanças. O Exe- cutivo garantia que era uma mera clarificação da lei, mas os peritos do BdP entendiam que seria uma por- ta aberta à ingerência do Executivo nas matérias do Banco. A reforma demorou muito e acabou por cair. A oposição forte e a reforma que caiu 3.ª feira As propostas no Parlamento 5.ª feira Os bancos centrais 6.ª feira Independência 2.ª feira Os casos 4.ª feira Os governadores e os administradores Publicidade OS NOSSOS SOLDADOS TEM APENAS UMA ARMA: Apoie o comércio local em jornalemcasa.pt e receba o jornal do dia à sua porta. Sem assinatura ou compromissos. Receba as suas publicações favoritas no conforto do seu lar. A entrega é gratuita durante 6 semanas. Aproveite. O mundo bate à sua porta. 18 | SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 EMPRESAS C omeçou discreto e com poucas partilhas, mas rapidamente se tornou viral. Até esta quinta- -feira, pelo menos 530 empresas já tinham “desamigado” o Face- book da sua lista de gastos com pu- blicidade. A marcas como a Coca- -Cola, a Adidas ou a Ford junta- ram-se nas últimas horas a Lego, a Sony e a Target. O golpe de Estado virtual e temporário, patrocinado pelo grande capital, pretende que Mark Zuckerberg tome medidas contra a maré de ódio e desinfor- mação que passou a inundar a rede social mais popular do mun- do. Dois anos depois do escânda- lo com a Cambridge Analytica, conseguirá o Facebook sobreviver intacto a mais uma polémica? Para Rita Figueiras, este é mais um capítulo da já longa crise repu- tacional em que o Facebook mer- gulhou nos últimos anos. “Não dá para comparar a situação atual com a da Cambridge Analytica, ainda que sejam manifestações di- ferentes do mesmo problema”, aponta a investigadora em Comu- nicação Política e professora da Universidade Católica. Se com a Cambridge Analyti- ca esteve em causa a privacidade e a recolha de dados sem o consen- timento dos utilizadores, “ e a cul- pa pôde ser diretamente atribuí- da ao Facebook”, desta vez a bom- ba rebentou no seio da sociedade norte-americana, e levou a rede por arrasto. A morte de George Floyd às mãos da polícia acendeu o rasti- lho do movimento “Stop Profit for Hate” (chega de dar lucro ao ódio), mas o facto de haver elei- ções nos EUA dentro de poucos meses não será alheio à proporção que o manifesto “antiódio” tomou, consideram os especialistas. “O Facebook não pode ser res- ponsabilizado pelos problemas sociais dos EUA nem pela polari- zação crescente, a meses das pre- sidenciais”, diz Rita Figueiras, mas “é claro que a forma como a rede gere os fluxos de informação con- tribui para acentuar tendências que já existem na sociedade. Não há uma causa-efeito, é uma rela- ção dinâmica”. Anunciantes “vão regressar” O algoritmo volta a ser o inimigo a abater. “O que está aqui em cau- sa é o facto de, supostamente, o al- goritmo do Facebook dar prima- zia a conteúdos polémicos, por- que geram mais partilhas, mais in- teração e, consequentemente, mais publicidade”, explica Fer- nando Batista, presidente da As- sociação de Marketing Digital. Apesar da pressão para agir, à semelhança do que fez o Twitter, que passou a sinalizar possíveis notícias falsas, Zuckerberg tem- -se mantido irredutível. “Não mu- daremos as nossas políticas pelo facto de uma pequena parte da nossa receita ou qualquer percen- tagem da nossa receita estar ameaçada. Acredito que todos os anunciantes vão regressar breve- mente à plataforma”, disse esta se- mana o fundador da rede social aos funcionários do Facebook, se- gundo o site especializado em tec- nologia “The Information”. Uma posição que se coaduna, diz Rita Figueiras, com o poder desmesurado que a plataforma conquistou na última década e meia, “graças a vazios legais, por- que as nossas leis estavam feitas para uma sociedade analógica”. “Os grandes anunciantes, como estes que agora aderiram ao boicote, sempre tiveram um gran- de poder negocial face aos meios de comunicação. E com as tecno- lógicas não têm. A dificuldade que a Europa e os EUA têm sentido em produzir legislação que regu- le a ação destas empresas espelha bem o poder que elas têm.” Para a docente, só com legislação será possível “ter algum controlo sobre o comportamento destas empre- sas, e responsabilizá-las”. O sentimento de impunidade conquistado por Zuckerberg está também espelhado na declaração que proferiu aos trabalhadores, re- ferem os especialistas. É que, ape- sar do boicote de 530 grandes marcas, o Facebook conta com mais de oito milhões de anuncian- tes, e são os pequenos e médios a base das suas receitas. “E estes não vão aderir ao boicote, porque, de todas as redes, o Facebook é a que tem a maior taxa de conversão para as marcas”, refere Fernando Batista. No ano passado, a empresa fa- turou 62 mil milhões de euros em publicidade, o que tem levado os analistas a classificar o protesto como simbólico, pelo menos ao nível do impacto financeiro. “Isto está longe de ser uma questão financeira”, corrobora Carlos Coelho, presidente da Ivity O fundador do Facebook, Mark Zuckerberk, afirma que a rede não mudará a sua política. REDES SOCIAIS Boicote de marcas enfraquece Facebook mas só a lei o pode travar Centenas de marcas estão a suspender a publicidade no Facebook, em protesto contra a disseminação de conteúdos de ódio e notícias falsas. Especialistas acreditam que a maior rede social do mundo só poderá ser responsabilizada através de legislação. ANA SANLEZ anasanlez@negocios.pt 530 BOICOTE NOS EUA Já são mais de meio milhar as marcas que se juntaram ao movimento #StopHateforProfit, que contesta as políticas de moderação do Facebook. SEXTA-FEIRA | 3 JUL 2020 | EMPRESAS | 19 De um lado a Coca-Cola, a Mi- crosoft e a Starbucks. Do outro, uma rede social que chega a qua- se metade da população mun- dial. Um embate de Golias con- tra Golias, que ainda agora co- meçou. O que leva, afinal, algu- mas das maiores marcas do mundo a unirem-se em torno de um inimigo virtual comum? “Uma das características deste movimento é o facto de ser liderado por marcas que têm opinião própria, quando a maior parte delas não tem. A maioria das marcas limita-se a vender coisas. Mas cada vez mais os consumidores exigem saber o que as marcas defendem, e não só, o que vendem”, resume Car- los Coelho, presidente da Ivity Brand Corp e especialista em marcas. Quando começou a ver os primeiros sinais do movimento contra o Facebook, o responsá- vel percebeu que a história esta- va a ser feita. Pela primeira vez, ummovimento organizado de gigantes da publicidade decide dizer não à segunda maior mon- tra de anúncios do mundo (a pri- meira é o Google). A polarização de opiniões nas redes tornou-se demasiado forte, considera Rita Figueiras, professora da Universidade Ca- tólica, e fez soar os alertas. “As grandes marcas não têm interes- se em ver os seus produtos asso- ciados a conteúdos divisivos. Até podem ter preocupações sociais genuínas mas, no fundo, interes- sa-lhes estar numa plataforma que as aproxime do maior nú- mero possível de pessoas, não que as aproxime de umas e afas- te de outras”. E não é pela falta de publici- dade que as marcas vão deixar de vender, sustentam. “A Coca- -Cola ou a Starbucks não ven- dem bebidas no Facebook, ven- dem estilos de vida. Não acredi- to que terão um decréscimo nas vendas por desaparecerem tem- porariamente das redes. Pelo contrário, isto pode funcionar como uma campanha de rela- ções públicas muito forte, que pode trazer mais reconhecimen- to do que muitos anúncios. As empresas estão a passar uma ideia de responsabilidade so- cial”, destaca Fernando Batista, presidente da Associação de Marketing Digital. É essa a mensagem que as marcas têm tentado passar. A Volkswagen anunciou a suspen- são dos anúncios no Facebook e no Instagram, que também per- tence a Mark Zuckerberg, du- rante o mês de julho, argumen- tando que “o ódio e a desinfor- mação perigosa não devem pas- sar incólumes”. Uma ideia se- melhante foi transmitida pela Adidas e a Reebok, segundo as quais, “conteúdos racistas, dis- criminatórios e de ódio não têm lugar na nossa marca nem na nossa sociedade”. A Unilever, uma das maiores anunciantes do mundo e dona de marcas como a Dove ou a Lipton, foi mais longe, ao cortar a publicidade das redes até ao fim do ano, por considerar que as plataformas digitais “não es- tão a acrescentar valor às pes- soas nem à sociedade”. Fernando Batista acredita que o movimento não vai ficar por aqui, e que ao longo dos pró- ximos dias é provável que se tor- ne global, e não apenas centrali- zado nos Estados Unidos. “Acre- dito que até em Portugal há mar- cas que facilmente poderiam juntar-se ao protesto”, atira, sem dar exemplos. Apesar de não duvidar da in- tenção legítima de algumas mar- cas, e das suas preocupações so- ciais, Fernando Batista não tem dúvidas de que, em alguns casos, o boicote “não passa de uma es- tratégia de marketing”. Para ou- tras, “é a pressão de pares “, que é “muito forte nos EUA”, que está a criar o efeito bola de neve. “Se a Apple aderisse ao movimento, outras tecnológicas iriam atrás.” Mas na maior parte dos ca- sos, os especialistas creem que a adesão em massa tem que ver com o facto “de as marcas terem percebido que o consumo é cada vez mais ideológico e que, por isso, têm de assumir posições, caso contrário, não têm razão de existir”, considera o líder da Ivity. Para Carlos Coelho, “as marcas globais são demasiado importantes para estarem cala- das e a publicidade não pode ser apenas entretenimento”. ANA SANLEZ “Há marcas portuguesas que poderiam juntar-se ao protesto” A Unilever suspendeu os anúncios no Facebook até ao fim do ano. O fundador do Facebook, Mark Zuckerberk, afirma que a rede não mudará a sua política. Afolabi Sotunde/Reuters Stephen Lam/Reuters “ Cada vez mais os consumidores exigem saber o que as marcas defendem, e não apenas o que vendem. CARLOS COELHO Presidente da Ivity Brand Corp A Coca-Cola ou a Starbucks não vendem bebidas, vendem estilos de vida. Não terão um decréscimo nas vendas por desaparecerem temporariamente das redes. FERNANDO BATISTA Presidente da Associação de Marketing Digital “ Brand Corp e especialista em marcas. “Mark Zuckerberg tem- -se comportado como a camisa branca da internet, que vai bem com tudo e agrada a toda a gente. Mas chegámos a um momento em que vai ter de tomar uma po- sição”, aponta o especialista. Para Carlos Coelho, o poder que o fundador do Facebook con- quistou “confere-lhe uma enorme responsabilidade, e não basta con- tinuar a advogar eternamente a defesa da liberdade de expressão”. Caso contrário, conclui o especia- lista, aquele que é o homem com mais amigos do mundo “corre o sério risco de perder a sua confian- ça”. Fechar a torneira da publicidade foi a forma que as marcas encontraram para pressionar o Facebook a mudar de política. Especialistas em marketing defendem que a adesão ao boicote pode beneficiar imagem das empresas. E ntre 1 de julho de 2020 e 20 de setembro estão abertas as candidatu-ras à 9.ª edição do Pré- mio Saúde Sustentável, uma ini- ciativa do Negócios e da Sanofi, orientada para a divulgação e in- centivo de boas práticas da sus- tentabilidade da saúde em Portu- gal, que conta com metodologia de avaliação desenvolvida pela Everis. A edição deste ano, por deci- são unânime do júri, será dedica- da à partilha das boas práticas em contexto de covid-19, com o obje- tivo de reconhecer e distinguir projetos ou instituições que se te- nham destacado na luta contra a pandemia que desde março inva- diu Portugal. É a primeira vez que o Prémio Saúde Sustentável, que teve a sua primeira edição em 2012, é dedi- cado a um tema. Como diz Fran- cisco del Val, general manager da Sanofi, “a expectativa em relação a esta edição especial é elevada e acreditamos que seremos agrada- velmente surpreendidos com can- didaturas de excelência. Existem muitas instituições com projetos altamente diferenciadores e equi- pas dedicadas que têm sido certa- mente determinantes no comba- te à pandemia”. Este ano, o Prémio Saúde Sus- tentável reparte-se por cinco ca- tegorias: Prevenção e Promoção da Saúde, Cuidados de Saúde Centrados no Cidadão, Promoção e Sustentabilidade Económica, Integração de Cuidados e Inova- ção e Transformação Digital. É ainda atribuído por decisão do júri, o Prémio Personalidade, que distinguirá quem se tenha desta- cado na promoção de práticas sus- tentáveis na área da saúde, em contexto covid-19. 69 prémios em oito edições O prémio tem divulgado e incen- tivado as melhores práticas para a sustentabilidade da saúde em Por- tugal e premiado anualmente ins- tituições prestadoras de cuidados de saúde. Ao longo destas oito edi- ções premiaram-se personalida- des relevantes na área dos cuida- dos de saúde, da investigação e da prática da medicina como José Pereira Miguel, Odete Santos- -Ferreira, João Lobo Antunes, Manuel Sobrinho Simões, João Rodrigues Pena, Francisco Geor- ge, Fernando Pádua e Cristina Re- sende de Oliveira. Nas suas várias categorias, que foram sofrendo evoluções ao longo do tempo, foram distingui- das 56 instituições de vários pon- tos do país. Entre vencedores (35) e menções honrosas (34) já foram entregues 69 prémios. Destacam- -se o Centro Hospitalar de Gaia/Espinho e a USF Marginal com três distinções, depois, com duas distinções, o Centro Hospi- talar do Porto, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, Hos- pital CUF Descobertas, Hospital de Braga, Hospital da Figueira da Foz, IPO do Porto, Santa Casa da Misericórdia de Arcos de Valde- vez, ULS de Matosinhos, USF de Valongo, e ULS do Litoral Alen- tejano. Apenas por uma vez, na edição de 2013 houve uma parti- lha de prémio entre o Centro Hospitalar de São João e a ULS Matosinhos na categoria de Cui- dados Hospitalares. Estas oito edições ajudam a compreender e mostram a evo- lução da saúde em Portugal, em particular do Serviço Nacional de Saúde. Como referia Cristina Resende de Oliveira, a persona- lidade eleita em 2019, “a saúde é um dos fatores mais importan- tes para a estabilidade social e económica de qualquer país. Uma população com saúde é fundamental para o trabalho e para o progresso da sociedade”. Acrescentava que “a existência de um SNS como o nosso, que permite que o indivíduo inde- pendentemente da sua condição de nascimento tenha iguais pers- petivas de atendimento
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