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1 Disciplina: História da Educação de Surdos Autores: Esp. Liliane Assumpção Oliveira Revisão de Conteúdos: Esp. Murillo Hochuli Castex Revisão Ortográfica: Esp. Juliano de Paula Neitzki Ano: 2019 Copyright © - É expressamente proibida a reprodução do conteúdo deste material integral ou de suas páginas em qualquer meio de comunicação sem autorização escrita da equipe da Assessoria de Marketing da Faculdade São Braz (FSB). O não cumprimento destas solicitações poderá acarretar em cobrança de direitos autorais. 2 Liliane Assumpção Oliveira História da Educação de Surdos 1ª Edição 2019 Curitiba, PR Editora São Braz 3 Editora São Braz Rua Cláudio Chatagnier, 112 Curitiba – Paraná – 82520-590 Fone: (41) 3123-9000 Coordenador Técnico Editorial Marcelo Alvino da Silva Revisão de Conteúdos Murillo Hochuli Castex Revisão Ortográfica Juliano de Paula Neitzki Desenvolvimento Iconográfico Juliana Emy Akiyoshi Eleutério FICHA CATALOGRÁFICA OLIVEIRA, Liliane Assumpção. História da Educação de Surdos / Liliane Assumpção Oliveira. – Curitiba: Editora São Braz, 2019. 84 p. ISBN: 978-85-5475-360-3 1.Surdos. 2. Libras. 3. Protagonismo. Material didático da disciplina de História da Educação de Surdos – Faculdade São Braz (FSB), 2019. Natália Figueiredo Martins – CRB 9/1870 4 PALAVRA DA INSTITUIÇÃO Caro(a) aluno(a), Seja bem-vindo(a) à Faculdade São Braz! Nossa faculdade está localizada em Curitiba, na Rua Cláudio Chatagnier, nº 112, no Bairro Bacacheri, criada e credenciada pela Portaria nº 299 de 27 de dezembro 2012, oferece cursos de Graduação, Pós-Graduação e Extensão Universitária. A Faculdade assume o compromisso com seus alunos, professores e comunidade de estar sempre sintonizada no objetivo de participar do desenvolvimento do País e de formar não somente bons profissionais, mas também brasileiros conscientes de sua cidadania. Nossos cursos são desenvolvidos por uma equipe multidisciplinar comprometida com a qualidade do conteúdo oferecido, assim como com as ferramentas de aprendizagem: interatividades pedagógicas, avaliações, plantão de dúvidas via telefone, atendimento via internet, emprego de redes sociais e grupos de estudos, o que proporciona excelente integração entre professores e estudantes. Bons estudos e conte sempre conosco! Faculdade São Braz 5 Sumário Prefácio ................................................................................................................. 07 Aula 1 – Começo de conversa: conhecendo o passado ......................................... 08 Apresentação da Aula 1 ......................................................................................... 08 1.1 Registros Históricos .................................................................................. 08 1.2 Antiguidade ............................................................................................... 08 1.3 Idade Média e Idade Moderna .................................................................. 09 1.3.1 Mudança de paradigma – religião x razão .............................................. 10 1.3.2 O Século da Prosperidade ..................................................................... 12 1.4 Idade Contemporânea .............................................................................. 13 1.4.1 Congresso de Milão ............................................................................... 15 Conclusão da aula 1 .............................................................................................. 16 Aula 2 – Em frente: compreendendo o presente .................................................... 16 Apresentação da Aula 2 ......................................................................................... 16 2.1 Marcos históricos da surdez no Brasil ....................................................... 17 2.2 Avanços a partir de 1950 no mundo e no Brasil ......................................... 19 2.3 Avanços Sociais e Tecnológicos ............................................................... 22 Conclusão da aula 2 .............................................................................................. 24 Aula 3 – Ao alcance das mãos ............................................................................... 25 Apresentação da Aula 3 ......................................................................................... 25 3.1 Tempo de novas perspectivas .................................................................. 25 3.1.1 Protagonismo da Surdez ....................................................................... 25 3.1.2 Comunidade e Cultura Surda ................................................................. 28 3.2 O desenvolvimento tecnológico ................................................................ 30 3.3 A Libras diante de todos ............................................................................ 31 Conclusão da Aula 3 .............................................................................................. 34 Aula 4 – Políticas públicas e legislação para a Surdez ........................................... 34 Apresentação da Aula 4 ......................................................................................... 34 4.1 Fases da história dos surdos ..................................................................... 35 4.2 A importância das leis ............................................................................... 36 4.3 Conquistas legais da área da surdez ........................................................ 40 4.3.1 Lei da Libras – Lei 10.436/2002 ............................................................. 40 4.3.2 Decreto 5.626/2005 ............................................................................... 41 4.3.3 Lei 12.319/2010 ..................................................................................... 42 Conclusão da aula 4 .............................................................................................. 43 Aula 5 – Movimentos Surdos – educação, sociedade e cidadania ......................... 44 Apresentação da aula 5 ......................................................................................... 44 6 5.1 A busca por direitos .................................................................................. 44 5.1.1 A origem dos Movimentos Surdos .......................................................... 44 5.1.2 Movimentos Surdos no Brasil ................................................................ 46 5.1.3 Brasil – Mobilizações a partir de 1990 .................................................... 48 5.1.4 Difusão e oficialização da Libras ............................................................ 51 Conclusão da aula 5 .............................................................................................. 52 Aula 6 – História cultural dos surdos ...................................................................... 52 Apresentação da aula 6 ......................................................................................... 52 6.1 Historicismo, história crítica e história cultural ........................................... 53 6.1.1 Historicismo ........................................................................................... 53 6.1.2 História cultural ...................................................................................... 54 6.1.3 História crítica ........................................................................................55 6.2 Cultura Surda ............................................................................................ 56 6.3 Artefatos culturais dos surdos ................................................................... 57 6.3.1 Literatura surda ...................................................................................... 57 Conclusão da aula 6 .............................................................................................. 60 Aula 7 – Cultura Surda ........................................................................................... 60 Apresentação da aula 7 ......................................................................................... 60 7.1 Artes Plásticas .......................................................................................... 61 7.1.1 Jennifer Lescouët – França .................................................................... 61 7.1.2 Ellen Mansfield – Estados Unidos .......................................................... 62 7.1.3 Billy Saga – Brasil .................................................................................. 63 7.1.4 Lucas Ramon – Cartoon – Brasil ............................................................ 63 7.2 Teatro ....................................................................................................... 64 7.3 Cinema e Vídeo ........................................................................................ 65 7.4 Entretenimento ......................................................................................... 66 7.5 Produção Científica .................................................................................. 67 Conclusão da aula 7 .............................................................................................. 69 Aula 8 – Relações familiares .................................................................................. 69 Apresentação da aula 8 ......................................................................................... 69 8.1 Memórias .................................................................................................. 70 8.2 A família – primeira parte da história ......................................................... 70 8.2.1 A descoberta .......................................................................................... 71 8.2.2 A aceitação ............................................................................................ 72 8.3 Pais surdos e filhos ouvintes ..................................................................... 74 Conclusão da aula 8 .............................................................................................. 75 Índice Remissivo ................................................................................................... 77 Referências ........................................................................................................... 81 7 Prefácio Olá, aluno! Seja bem-vindo! A disciplina de História da Educação de Surdos tem o objetivo de contextualizar as fases, processos, dificuldades e avanços que acompanham a comunidade surda no decorrer dos tempos. Assim, nas primeiras aulas serão apresentadas as realidades das pessoas surdas, desde a Antiguidade até os dias atuais, seguindo uma sequência cronológica, com o intuito de estabelecer a relação entre as épocas e os acontecimentos, para que haja a compreensão de todo o cenário e das concepções próprias que eram disseminadas em cada momento. Na sequência, as aulas irão detalhar os avanços nas políticas públicas e na legislação em atenção às pessoas com deficiência e que, paralelamente, também foram importantes para os surdos, visto que estiveram por muito tempo à margem da sociedade. Você conhecerá os movimentos dos surdos que tomaram força para a busca da garantia de seus direitos civis, a composição de órgãos representativos que lutaram pelas causas do povo surdo e, ainda, verificar a influência direta desses movimentos nos principais marcos para o reconhecimento da surdez como diferença. Também serão apresentadas várias manifestações da cultura surda, nas diferentes áreas, sejam artísticas ou científicas, para que isso permita acompanhar grandes ativistas surdos que hoje em dia são nomes de destaque em nível nacional ou mundial. Acredita-se que por meio dessas informações haja a ampliação da possibilidade de formação de uma nova consciência a respeito dos surdos, com o enfoque no seu potencial e suas capacidades, deixando de considerá-las, como ocorreu por longos anos, apenas pela sua limitação. Finalmente, serão abordadas algumas questões familiares que influenciam a vida dos surdos e de seus parentes próximos, esclarecendo alguns pontos importantes da dinâmica familiar. Bons estudos! 8 Aula 1 – Começo de conversa: compreendendo o passado Apresentação da aula 1 Olá, aluno (a)! Iniciaremos a disciplina de História da Educação de Surdos com esta primeira aula, intitulada: Começo de conversa: compreendendo o passado, na qual você irá conhecer como foram os primeiros registros sobre a surdez e a educação de surdos, desde a Antiguidade até a Idade Contemporânea. Esse será o trajeto que seguiremos para compreender todos os processos e marcos históricos que contribuíram para as concepções existentes hoje, que norteiam a educação de surdos. 1.1 Registros Históricos A principal contribuição do estudo da história é que, a partir do passado, pode-se compreender o presente. Na educação de surdos, isso não é diferente. Dessa forma, apresentam-se a seguir os principais acontecimentos e episódios que constituem a história das pessoas surdas, bem como as consequências de cada fato e as transformações ocorridas a partir delas, que nos levam a compreender todo o processo que envolve a surdez, o indivíduo surdo, a educação destas pessoas e as implicações na sociedade nos dias atuais. 1.2 Antiguidade A história da educação de surdos mescla-se, na Antiguidade, com a história das pessoas com deficiência. Embora não haja muitos registros, sabe- se que todas as pessoas com características diferentes da maioria eram segregadas. As primeiras informações de que se tem conhecimento remetem às noções de que as pessoas com deficiência eram basicamente ligadas ao misticismo e ao ocultismo, sem nenhuma base científica para o desenvolvimento de conceitos reais. Nesse sentido, não se compreendia nem se respeitava a diferença individual. 9 Desde os primórdios da humanidade, houve atrocidades como a eliminação dessas pessoas, manifestada por práticas de assassinato de todos aqueles que eram considerados fora dos padrões da época. Obviamente, naquela época, havia muita limitação de informações e temor em relação às situações desconhecidas. Isso contribuiu para a marginalização das pessoas com qualquer tipo de deficiência e gerou sua exclusão social, pois eram tidas como inferiores e desqualificadas. As ações discriminatórias estavam presentes nas principais civilizações da Antiguidade e a eliminação dos surdos e das outras minorias acontecia de diferentes formas. Como exemplo, citamos os chineses, que os atiravam ao mar, os gauleses, que os sacrificavam aos deuses e os gregos, que os lançavam do alto de rochedos. Porém, outros povos, como os egípcios e persas, consideravam os surdos criaturas privilegiadas, enviadas dos deuses, pois, segundo suas crenças, acreditavam que eles podiam se comunicar em segredo com os deuses. Pregavam um forte sentimento humanitário e de respeito, sendo que protegiam e tributavam adoração aos surdos, que, no entanto, não tinham vida social ativa, tampouco direito à educação. A primeira referência escrita aos surdos encontra-sena Torá, que é a lei fundamental do judaísmo, em que se lê: “Quem dá a boca ao homem? Quem o torna mudo ou surdo, capaz de ver ou cego? Não sou Eu, Javé?” (Êxodo, 4:11), ou “[...] não amaldiçoes o mudo nem coloques obstáculos ao cego” (Levítico, 19:14). Por esta ótica, o indivíduo era surdo por vontade do Senhor e, por isso, nada os homens poderiam fazer. Assim, alguns eram aceitos, mas privados de direitos, continuando com sua sobrevivência comprometida. O filósofo Aristóteles afirmava que somente poderia haver raciocínio naqueles que desenvolviam linguagem e, naquele tempo, esse conceito estava estreitamente vinculado à fala. Assim, os surdos continuavam sofrendo com as práticas discriminatórias e segregacionistas. 1.3 Idade Média e Idade Moderna Houve um período muito escasso de referências sobre a surdez entre o ano 1 D.C. e o final da Idade Média, mas as sociedades acreditavam que as 10 pessoas com deficiência eram impuras e condenadas por Deus, sendo castigadas por Ele com o acometimento da diferença física ou de alguma doença. Contudo, com o advento do cristianismo, a teologia ocidental passou a considerar a todos como “filhos de Deus” e, assim, deveriam ser amados, não pelo que pudessem ter ou fazer, mas por sua condição de seres humanos. Ainda assim, as opiniões eram controversas. Santo Agostinho (354-430), filósofo e teólogo cristão muito influente, defendeu a ideia de que os pais de filhos surdos estariam pagando por algum pecado que haviam cometido. Por outro lado, aceitava que os surdos podiam se comunicar por meio de gestos, que substituiriam a fala e que, assim, poderiam apreender os ensinamentos cristãos e garantir a salvação de suas almas. Também há relatos de que monges beneditinos da Itália, por volta do ano de 530, na Idade Média, usavam uma forma de língua de sinais para se comunicarem entre si, já que viviam sob um rígido voto de silêncio. 1.3.1 Mudança de paradigma – religião x razão Os dados sobre os surdos tornam-se mais disponíveis no final da Idade Média, período no qual surgem os primeiros trabalhos voltados à educação de surdos e sua integração na sociedade. Assim, foi um marco importante pela mudança de paradigma, pois se abandonou a perspectiva religiosa para assumir a perspectiva da razão, ou seja, iniciou-se a análise das deficiências por uma concepção científica possibilitada pelos avanços das pesquisas médicas, oriundas principalmente da Europa. Um dos estudiosos que contribuiu para a ampliação dos conhecimentos em relação aos surdos foi o médico italiano Girolamo Cardano (1501-1576), que defendeu que a audição e a fala não eram indispensáveis para a compreensão das ideias, ou seja, a surdez não implicaria em diminuição da condição mental, apenas seria uma barreira para a comunicação. Na mesma época, Pedro Ponce de Leon (1520-1584), monge beneditino, fundou a Escola para Surdos em Madri, na Espanha, com um método que incluía a datilologia, a escrita e a fala. 11 Vocabulário Datilologia: soletração das letras do alfabeto manual; comunicação feita por meio de sinais feitos com os dedos. Um marco no campo jurídico foi a posição de Lasso, jurista espanhol, na defesa dos direitos hereditários aos surdos, após concluir que aqueles que aprendiam a falar deixariam de ser mudos e, dessa forma, deveriam usufruir dos mesmos direitos dos “falantes nativos”. Após a difusão dessas novas concepções, o padre e educador espanhol Juan Pablo Bonet (1579-1633) criou o alfabeto manual, desenvolvendo seu trabalho pela aprendizagem das letras do alfabeto manual, passando ao treino auditivo, à pronúncia dos sons das letras, depois às sílabas sem sentido, até chegar às palavras concretas e abstratas, finalizando com as estruturas gramaticais complexas. Alfabeto Manual Fonte: https://www.timetoast.com/timelines/historia-das-pessoas-surdas O médico inglês John Bulwer publicou, em 1644, sua obra em que descreveu centenas de gestos e defendeu que a única forma de comunicação natural para surdos era a língua de sinais. 12 1.3.2 O Século da Prosperidade O século XVIII foi um dos períodos mais prósperos da educação de surdos, pois nele foram fundadas várias escolas ao redor do mundo. Além disso, também houve grande evolução qualitativa no âmbito educacional, com a ascensão de métodos e grande difusão mundial. Na Alemanha, Samuel Heinicke (1729-1790), considerado o “Pai do Oralismo”, iniciou as bases desta filosofia de trabalho, que privilegiava exclusivamente a fala para a educação de surdos. Fundou, em 1778, a primeira escola de oralismo puro em seu país, atendendo cerca de 9 alunos. Paralelamente ao trabalho de Heinicke, destacou-se, na França, um dos principais nomes da educação de surdos, o abade Charles Michel de L’Epée (1712-1789), pioneiro na adoção de um método de educação coletiva. Defendeu o uso da língua de sinais na educação de surdos, acreditando no potencial desta língua para que os indivíduos pudessem participar da vida social ativa, dominando vários assuntos e podendo exercer diferentes profissões. Dessa forma, reuniu os surdos dos arredores de Paris e fundou a primeira escola pública para surdos, o Instituto Nacional de Surdos-Mudos, precursora no uso da língua de sinais. Dentre suas principais contribuições, estão: a) A tentativa de fazer todos os surdos aprenderem a ler e a escrever por meio da integração da gramática da língua francesa com a língua de sinais; b) Adoção de um método de educação coletiva; c) Reconhecimento e valorização do surdo como pessoa e de sua língua. Na Inglaterra, Thomas Braidwood (1715-1806) foi o educador que criou um método utilizando o alfabeto manual com as duas mãos, alfabeto este utilizado até hoje em seu país. 13 Alfabeto Manual Britânico Fonte: http://www.supercoloring.com/pt/desenhos-para-colorir/conjunto-do-alfabeto-da- linguagem-de-sinais-britanica 1.4 Idade Contemporânea Em 1779, o francês Pierre Desloges (1747-1799), que ensurdeceu aos sete anos, como sequela da Varíola, publicou um livro sem título oficial conhecido, no qual defendeu o uso da língua de sinais e posicionou-se contra as ideias oralistas que se fortaleciam naquele período. Seu livro foi considerado a primeira publicação de um surdo. Na América, uma grande contribuição para a educação de surdos veio por meio de Thomas Gallaudet (1787-1851), que se interessou pela surdez a partir da observação de crianças brincando no seu jardim e de uma pequena surda que ficava à margem, rejeitada pelas outras crianças. Tocado pelo isolamento causado pela surdez, pelo mutismo da menina e pelo fato de não haver nenhum trabalho específico nos Estados Unidos, dirigiu-se ao continente europeu para conhecer as escolas de surdos e seu trabalho educacional. Após ser recusado em Londres, seguiu para Paris, onde conheceu Laurent Clerc, surdo francês e educador que o acompanhou aos Estados Unidos para que fundassem juntos a primeira escola daquele país baseando o seu ensino na Língua Gestual, em 14 1817, em que era ensinada uma mescla do francês gestualizado com o inglês e que mais tarde estruturou-se como ASL (American Sign Language). A escola foi um sucesso imediato e isso impulsionou a abertura de outras escolas de surdos pelos Estados Unidos, sendo que quase todos os professores de surdos passaram a usuários fluentes de língua de sinais e muitos eram surdos também. Uma das instituições fundadas na época foi o Instituto de Colúmbia, que, graças a Edward Miner Gallaudet, filho de Thomas Gallaudet, deu origem à Universidade Gallaudet, em Washington, que é até hoje referência na educação de surdos. A Idade Contemporânea foi marcada pela disputa entre o método alemão, oralista, e o método francês, que utilizava a língua de sinais da educação de surdos. Porém, alguns fatores contribuírampara o fortalecimento da metodologia oralista no mundo todo. O primeiro fator foi o aumento de pesquisas relacionadas à origem e causas da surdez, juntamente com publicações referentes ao treinamento para uso dos resíduos auditivos. Outro marco importante foi a manufatura das primeiras próteses auditivas, ou seja, os primeiros aparelhos de amplificação sonora, impulsionados pela invenção da pilha eletrolítica, por Alessandro Volta, em 1800. No ano de 1823, foi fundado o Instituto de Surdos-Mudos e Cegos, em Portugal, por decisão do rei D. João VI, com a implementação do alfabeto manual e comunicação gestual. No ano de 1838, Jean-Marc Itard, médico do Instituto de Paris, obteve resultados significativos com o início das tentativas cirúrgicas para recuperação da audição. Anos mais tarde, na Inglaterra, foi publicado um tratado sobre cirurgia e patologia do ouvido, o que conferiu respeito clínico e científico à otologia. Vocabulário Otologia: ramo da medicina que estuda a anatomia, fisiologia e patologia da orelha ou ouvido. 15 Alexander Graham Bell (1847-1922) dedicou-se ao estudo da acústica e fonética, ficando conhecido por registrar a patente do telefone. Abriu, em Boston, no ano de 1872, uma escola oralista para professores de surdos. No ano de 1878, como consequência do avanço e da divulgação das pesquisas médicas e práticas pedagógicas com surdos no mundo inteiro, foi realizado, em 1878, em Paris, o I Congresso Internacional sobre a Instrução de Surdos, que foi cenário de intensos debates e dividiu opiniões em dois grandes grupos. Um deles defendia a importância do uso dos sinais do ambiente educacional e o outro acreditava que somente a fala poderia promover a integração social dos surdos. 1.4.1 Congresso de Milão O marco histórico de maior impacto para a surdez foi o II Congresso Internacional sobre a Educação de Surdos, que aconteceu na cidade de Milão, em 1880. Este evento pode ser considerado o mais obscuro de toda a história que acompanha os surdos em nível mundial, de modo que suas deliberações repercutiram por quase um século. Isso se deve ao fato de a organização ter sido feita por uma maioria de ouvintes, que defendiam o método oralista. Importante Neste congresso, o método oral foi votado como o único adequado na educação de surdos, sendo o uso da língua de sinais proibido nas escolas. As alegações eram de que a utilização dos “gestos” prejudicaria a aprendizagem da fala, da leitura labial e a organização das ideias. Também se definiu a separação dos alunos que já utilizavam a língua de sinais daqueles recém-admitidos, para que não houvesse a “contaminação” provocada pelo uso dessa língua, ou seja, os novos não deveriam ter contato e aprender os sinais. Havia neste evento a participação de poucos professores surdos, mas que tiveram seu direito de voto negado. Assim, dos 164 representantes ouvintes, apenas 5 da delegação americana votaram contra essas decisões. Com esta nova perspectiva, a educação formal ficou submetida à importância da aquisição da fala, resultando em um nível muito baixo de escolarização por parte dos surdos, já que os conteúdos foram suprimidos ou reduzidos, em detrimento da expressão oral. 16 Conclusão da aula 1 Nesta aula, você pôde refletir sobre alguns marcos da história da educação de surdos e suas consequências nos processos, tanto educacionais como sociais desses indivíduos. Assim, é de fundamental importância entender os contextos de cada período, suas limitações, inquietações e, também, os avanços. Buscou-se, por meio dessa cronologia, apresentar os fatos, desde o período da segregação na Antiguidade, até a tentativa de oralização de todos os surdos, por meio das deliberações do Congresso de Milão. Esta foi a primeira etapa para se chegar aos dias atuais e compreender todos os caminhos traçados, para que hoje os surdos possam ter sua língua oficializada, respeitada e difundida. Atividades de Aprendizagem A autora Nídia Regina Limeira de Sá, em seu livro Educação de Surdos: a caminho do bilinguismo, EDUFF, 1999, nos apresenta, em um dos capítulos, uma ponderação sobre a História dos surdos contada pelos ouvintes. Leia, reflita e produza um texto com a análise dos principais tópicos apontados pela autora, tentando colocar-se no lugar dos surdos diante da realidade apresentada. Aula 2 – Em frente: compreendendo o presente Apresentação da aula 2 Olá, caro (a) aluno (a)! Nesta aula iremos conhecer como ocorreu o processo histórico no Brasil, como foi o rompimento com os ideais defendidos no Congresso de Milão e acompanhar as inovações dos últimos anos. Essas informações serão a base para que possamos chegar à compreensão dos princípios filosóficos, políticos e sociais que hoje compõem as diretrizes da educação de surdos. Você também tomará ciência das lutas, das barreiras e mobilizações pelas quais os surdos passaram no transcorrer do tempo, para garantirem os direitos hoje conquistados. 17 2.1 Marcos históricos da surdez no Brasil A história da educação de surdos brasileira se inicia em 1855, com a chegada de Eduard Huet (1822- S/D), professor surdo francês, com o objetivo de ensinar crianças surdas beneficiadas com bolsas de estudo do governo. Seu trabalho baseava-se no método francês, ou seja, com o uso da língua de sinais e também com a escrita. Os alunos que apresentavam aptidões para desenvolver a oralidade também aprendiam por meio da estimulação da fala e da leitura labial, porém, esse trabalho era secundário. Em 26 de setembro de 1857, foi fundado o Imperial Instituto de Surdos- Mudos, no Rio de Janeiro, que contava inclusive com uma verba para auxílio orçamentário para a instituição. Além disso, a Lei 939 designou uma pensão anual para cada aluno admitido. A partir da chegada de Huet, os surdos do Brasil tiveram os primeiros contatos com a língua de sinais, por isso, a Libras tem em sua origem a influência e características híbridas com a língua francesa. Imperial Instituto de Surdos-Mudos Fonte: file:///C:/Users/Dell/Downloads/9998-39481-1-PB.pdf Por muitos anos, as meninas surdas brasileiras não tiveram acesso à educação, pois a admissão no Instituto Imperial era restrita para alunos do sexo masculino. Além disso, havia o argumento de que as meninas eram dóceis, calmas, tranquilas e obedientes às famílias e, por isso, não precisavam de nenhuma instrução. 18 Em 1862, a direção do Instituto passou para o Dr. Manuel de Magalhães, que, por não ser especialista na área, comprometeu o atendimento. O local foi considerado um asilo para surdos, até que foi demitido e substituído por Tobias Leite. Sob sua administração, o professor A. J. Moura e Silva relatou ao governo o fato de que nem todas as pessoas surdas estavam sendo beneficiadas pelo método oralista e, dessa forma, houve a permissão para que a escola utilizasse a língua de sinais. Portanto, a instituição serviu como centro de integração para o fortalecimento do desenvolvimento da Língua Brasileira de Sinais. Com o aumento no número de alunos, oriundos de diversas localidades, esses estudantes colaboraram muito com a difusão da Libras em suas cidades de origem, assim que deixavam o Instituto. Outro marco foi a publicação do primeiro dicionário de língua de sinais no Brasil, em 1875, por um ex-aluno do Instituto, chamado Flausino José da Gama, então com 18 anos. Apesar disso, em torno de 1911, devido à tendência determinada pelo Congresso de Milão, que se dissipou mundialmente, o atendimento do local passou a assumir exclusivamente o método do oralismo na educação dos surdos, restabelecendo a estimulação da fala e da leitura labial. Em 1957, o Instituto, sob a direção de Ana Rímola de Faria Dória, passou a ser denominado Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), nome quepersiste até hoje. Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES Fonte: http://www.libras.com.br/ines http://www.libras.com.br/ines 19 A partir de 1960, começam a surgir no país várias escolas para surdos. Como exemplo, é possível citar a Escola Concórdia em Porto Alegre (RS), o Instituto Santa Terezinha para Meninas, na cidade de São Paulo, a Escola de Surdos de Vitória (ES) e o Centro de Audição e Linguagem Ludovico Pavoni, na Capital Federal, Brasília. Curiosidade O dia 26 de setembro marca o Dia Nacional do Surdo. Esta data foi escolhida por remeter ao dia de fundação, em 1857, do INES – Instituto Nacional de Educação de Surdos. Tem o objetivo de relembrar o processo histórico da educação de surdos, de suas lutas, de comemorar as conquistas educacionais, culturais e os avanços legais. 2.2 Avanços a partir de 1950 no mundo e no Brasil As primeiras organizações de surdos em nível mundial surgiram na Europa. Em 1951, em Roma, foi fundada a WFD – World Federation of the Deaf – Federação Mundial de Surdos. No campo dos estudos médicos referentes à otologia, foram realizados diversos experimentos e, a partir de 1955, surgiram novos modelos de próteses auditivas, com o uso de moldes inseridos na orelha, conforme a figura abaixo: 20 Evolução das próteses auditivas Fonte: http://www.museudoaparelhoauditivo.com.br/publicacoes-a-evolucao-dos- aparelhos-auditivos.php Somente em 1958, em Manchester, na Inglaterra, é que se começa a verificar o início da ruptura com as práticas designadas em Milão, com o Congresso Internacional sobre o Moderno Tratamento Educativo da Surdez, no qual se extingue o método oral puro na maioria dos países europeus. Passa-se a assumir o método materno-reflexivo, também oralista, mas um pouco mais flexível. Contudo, o maior avanço se deu com a publicação, em 1960, do artigo Sign language structure: an outline of the usual communication system of the american deaf, por William Stokoe, o qual demonstrou que a língua de sinais tem uma estrutura semelhante às línguas orais e desenvolveu o conceito de querema, isto é, a unidade mínima da língua é o equivalente gestual de um fonema da língua oral. Este artigo foi a semente de todas as pesquisas que floresceram nos Estados Unidos e na Europa a respeito das línguas de sinais, a partir de então. Em 1961, Jorge Sérgio L. Guimarães, um surdo brasileiro publica um livro de crônicas, contando suas experiências, intitulado Até onde vai o Surdo. Partindo-se do insucesso da metodologia oralista e contando com a insatisfação de muitos professores, desenvolveram-se pesquisas sobre as línguas de sinais e sua aceitação. Assim, iniciou-se um período de surgimento 21 de uma nova proposta educacional, idealizada pelo americano Roy Holcomb, denominada de Comunicação Total, em 1968. A proposta baseava-se na utilização da língua de sinais, alfabeto manual, leitura labial e fala, dependendo da possibilidade do aluno. Esse método foi adotado a partir de 1969, pela Universidade Gallaudet, nos Estados Unidos. Nesse mesmo ano, foi publicado no Brasil o livro Linguagem das Mãos, de autoria do padre americano Eugênio Oates, que é composto por 1258 fotografias com os sinais. Linguagem das Mãos Fonte: https://eventos.set.edu.br/index.php/enfope/article/viewFile/1283/145 A FENEIDA – Federação Nacional de Educação e Integração dos Deficientes Auditivos – foi criada em 1977 e era composta somente por pessoas ouvintes envolvidas com a surdez. Com as pesquisas realizadas pela linguista Lucinda Ferreira Brito sobre a Língua Brasileira de Sinais (Libras) e as contribuições de outros estudiosos da área, iniciaram-se no Brasil, a partir de 1980, as primeiras propostas da filosofia do bilinguismo. Essa filosofia tem por base o ensino de duas línguas no contexto escolar, sendo a primeira língua a de sinais e a segunda língua o idioma falado no país, neste caso, o português. Em 1982, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) subsidia um projeto de pesquisa denominado de Levantamento Linguístico da Língua de Sinais dos Centros Urbanos Brasileiros e sua aplicação na educação, possibilitando vários estudos na área da surdez de forma sistematizada. A divulgação dos dados coletados com as pesquisas contribuiu para a popularização do interesse na educação de surdos. 22 O primeiro grande passo no âmbito político das pessoas surdas foi pela composição da Comissão de Luta pelos Direitos dos Surdos, que possibilitou a participação nas decisões educacionais e políticas públicas para a área. No final da década de 80, em 1987, a FENEIDA passa a ser dirigida por surdos, que fazem uma reestruturação do estatuto e assumem a luta por direitos com credibilidade, passando a ser denominada de FENEIS – Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos, com sede no Rio de Janeiro. Atualmente, a FENEIS mantém regionais nos principais estados brasileiros, sendo uma instituição ativa, com todos os membros componentes de sua diretoria surdos. No início dos anos 1990, a filosofia do Bilinguismo começa a se projetar mundialmente e permeia até hoje os processos pedagógicos voltados à surdez, bem como a legislação promulgada a partir deste período, que trata da acessibilidade para todas as pessoas com deficiência e de aspectos específicos dos surdos, como a oficialização da Libras e a formação de profissionais da área. 2.3 Avanços Sociais e Tecnológicos Com a ampla difusão possibilitada pela evolução dos meios de comunicação e pela tecnologia, as questões relacionadas à surdez passaram a fazer parte, pouco a pouco, da rotina das pessoas e a terem espaço no âmbito das artes, dos esportes e da ciência. Um exemplo deste amplo alcance foi a premiação do Oscar de melhor atriz para a surda Marlee Matlin, pela sua atuação no filme Filhos do Silêncio, de 1986. Mídias O filme Filhos do Silêncio narra a história de James Leeds, um professor que usa a língua de sinais unida a métodos pouco convencionais. Na escola em que acaba de ser contratado, ele conhece Sarah Norman, uma mulher arredia e fechada, que continua na escola mesmo após ter se formado. Ao perceber o medo que a jovem tem do mundo, ele tenta se aproximar e ajudá-la, e o que era um desafio profissional, logo se transforma em paixão. Fonte: http://www.adorocinema.com/filmes/filme-1662/ http://www.adorocinema.com/filmes/filme-1662/ 23 Nos esportes, os surdos começam também a se mobilizar e fundam a Confederação Brasileira de Desportos de Surdos (CBDS), em São Paulo, no ano de 1994, com o intuito de promover competições entre cidades e/ou estados, além da participação em eventos internacionais, nas diversas modalidades. No Brasil, a partir da década de 1990, pôde-se constatar a ampliação da oferta de condições que contribuíram para a acessibilidade dos surdos e maior participação na sociedade, principalmente, por intermédio de novas tecnologias e da comunicação associadas à propagação da Libras. A partir desse período, acompanham, também, mudanças significativas na legislação, dispondo da inclusão dos surdos e de todas as pessoas com deficiência, nos âmbitos educacional, profissional, da saúde e social. Os principais marcos serão apresentados a seguir, por ordem cronológica, para facilitar a compreensão e a sequência de ideias. Um dos estados pioneiros com legislação específica para a surdez foi Minas Gerais, que, em 1991, oficializou a Libras pela Lei 10.397. Em 1995, é criada a Comissão Pró-oficialização da Libras, com o intuito de alcançar abrangência nacional para a língua de sinais. Entre os anos de 1994 e 1995, a TV Educativa exibiu o programa Vejo Vozes, o qual era apresentado em Libras. As primeiras pesquisas sobre a filosofia do Bilinguismoe sua aplicação nas escolas são iniciadas em 1996, pela Dra. Eulália Fernandes, com uma parceria do INES com a Universidade do Rio de Janeiro. Em relação ao acesso à informação, destaca-se o uso de Closed Caption (CC) ou Legenda Oculta, que é a exibição de legenda diretamente nos aparelhos de televisão. Em setembro de 1997, a Rede Globo utiliza pela primeira vez na transmissão do Jornal Nacional. Em 1998, são distribuídos pela TELERJ (Companhia Telefônica do Rio de Janeiro) os primeiros telefones públicos para surdos, conhecidos como TDDs, sigla da nomenclatura em inglês de Telecommunications Device for the Deaf. Por meio da central de atendimento 1402, foi possibilitada a comunicação entre surdos e ouvintes com o uso de telefones convencionais. Nesse mesmo ano, a Libras é oficializada também no estado do Paraná, pela Lei 12.095. 24 Em 1999, a FENEIS lança sua primeira revista, com ilustração de capa de autoria do desenhista surdo Silas Queirós. Ainda nesse período, o Telecurso 2000 passa a ser transmitido com legendas, na tentativa de permitir o acesso aos surdos. Conclusão da aula 2 Chegamos ao final de nossa segunda aula. Até aqui você acompanhou toda a cronologia que envolve a educação de surdos, os avanços legais, sociais, educacionais e tecnológicos que compõem a história até o final da década de 1990. A organização sequencial do conteúdo foi idealizada com fins didáticos, pois funciona como uma régua de tempo, favorecendo a você, aluno (a), a contextualização, primeiro, dos aspectos amplos para depois compreender as especificidades de cada momento, o que lhe permite uma visão completa de todos os aspectos abordados até aqui. Atividade de Aprendizagem “Somos notavelmente ignorantes a respeito da surdez, muito mais ignorantes do que um homem instruído teria sido em 1886 ou 1786. Ignorantes e indiferentes [...]. Eu nada sabia a respeito da situação dos surdos, nem imaginava que ela pudesse lançar luz sobre tantos domínios, sobretudo o domínio da língua. Fiquei pasmo com o que aprendi sobre a história das pessoas surdas e os extraordinários desafios (linguísticos) que elas enfrentam, e pasmo também ao tomar conhecimento de uma língua completamente visual, a língua de sinais, diferente em modo de minha própria língua, a falada”. SACKS, Oliver. Vendo Vozes: uma viagem ao mundo dos surdos. Rio de Janeiro, Imago, 1989, p. 15. Baseando-se na citação acima e no conteúdo desta aula, monte uma régua de tempo, apontando os fatos que mais lhe chamaram a atenção, explicando a relevância de cada item, bem como a contribuição deste estudo para a sua formação acadêmica. 25 Aula 3 – Ao alcance das mãos Apresentação da aula 3 Olá! Nesta aula, você terá a oportunidade de fazer parte da história. Perceberá que é, também, um personagem importante e ativo deste capítulo. A partir dos anos 2000, a surdez tornou-se não um aspecto físico que caracteriza indivíduos, mas uma identidade cultural manifestada, principalmente, pelo uso da língua de sinais e pela aceitação das diferenças no convívio social. Pelo seu fator recente e pelos acontecimentos vivenciados por muitos de nós, a história aqui contada não é apenas uma narração, mas uma experiência compartilhada. Vamos lá? 3.1 Tempo de novas perspectivas O período iniciado nos anos 2000 até hoje pode ser comparado à época histórica do Iluminismo, no século XVIII, também conhecido por Século das Luzes. Isso se deve ao fato de que, naquele tempo, surgiram novas ideias por meio da crítica ao passado, do resgate aos direitos individuais, da participação popular e pela ascensão da arte e das ciências. Na área da surdez, estes avanços foram concretizados a partir da valorização da língua de sinais, da aceitação de suas especificidades e de novos conceitos representativos dessa parcela da população. 3.1.1 Protagonismo da Surdez Em virtude das transformações sociais, das lutas das pessoas surdas e dos avanços educacionais, tanto de estudos a respeito da surdez como de estudos dos próprios surdos e de seu protagonismo, surgiram novos conceitos que representam essa minoria da população, que são: Identidade Surda, Povo Surdo, Comunidade Surda e Cultura Surda. O primeiro conceito é o de Identidade Surda, mas, para compreendê-lo, vamos primeiramente entender o que significa identidade. Esse termo indica o reconhecimento de que o indivíduo tem de si próprio, por meio do conjunto de 26 características que o compõem. Por essa definição, pode-se, em linhas gerais, compreender que a Identidade Surda é o reconhecimento do conjunto de características comuns a todos os indivíduos surdos. Aprofundando o assunto, deve-se esclarecer que para a aceitação e o reconhecimento da surdez, houve a necessidade de uma mudança na concepção de quem é esse indivíduo, que trouxe não somente uma mudança de nomenclatura, mas de conceito. Anteriormente, o termo deficiente auditivo era usado, pois a visão estava focada na patologia, naquilo que o tornava fora dos padrões estabelecidos. Hoje, o termo surdo passa a representar a pessoa segundo uma visão de respeito à sua diferença, na aceitação de sua condição, na valorização de sua especificidade comunicativa. Dessa forma, define-se que a maior diferença entre surdos e ouvintes está relacionada à forma de comunicação: gestual ou oral. Aceitar a língua de sinais como um idioma autônomo gerou repercussões linguísticas e cognitivas para os surdos, mas também repercussões sociais. A língua representa o pensamento, a aprendizagem e, portanto, demonstra a capacidade de atuação ativa e participação, da mesma forma que a Língua Portuguesa tem essa função para os ouvintes. Um grande marco na emancipação dos surdos e na aceitação de sua identidade foi a promulgação da Lei 10.436, de 24 de abril de 2002, que reconhece nacionalmente a Libras como a forma de comunicação e expressão, com estrutura gramatical própria, que constitui o sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas brasileiras. Portanto, relaciona-se a identidade surda ao uso da língua de sinais, o que, por intermédio da interação entre surdos, abre possibilidades de interação, de diálogo, e aprendizagens que não são viáveis por meio da oralidade. Assim, o reconhecimento da Libras, no Brasil, como natural aos surdos, credita a ela a capacidade única de oferecer a esse grupo uma identidade. Pelo prisma da língua, como fator aglutinador das pessoas surdas, surgiu outro conceito, o de Povo Surdo, que, por definição, é o grupo composto por surdos que compartilham os mesmos costumes, história, tradições e peculiaridades. Nesse aspecto, o conceito abrange, além da língua, também a forma de percepção do mundo, ou seja, no caso dos surdos, por meio da visão. 27 Importante Portanto, o povo surdo é composto por indivíduos que se comunicam pela língua de sinais e que, em virtude do impedimento auditivo, usam a visão como principal canal de acesso e apreensão do ambiente que o cerca. Estas definições foram acompanhadas por novos dispositivos tecnológicos e legais, no intuito de garantir o respeito à diferença e de proporcionar a inclusão social dos surdos, dando a eles a possibilidade de usufruírem dos mesmos direitos dos ouvintes, no que tange à informação, à educação e o exercício da cidadania. No ano de 2004, a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) lançou um software para todas as operadoras de telefonia móvel, o Projeto Rybená, com a finalidade de permitir a comunicação do surdo por meio de telefones celulares. Rybená Fonte: http://portal.rybena.com.br/site-rybena/sobre.html No decorrer dos anos, a filosofia do Bilinguismo vai se firmando como a mais adequada para atender as necessidades dos alunos surdos, cabendo o difícil papel deassegurar que os surdos mergulhem no universo cultural da surdez e da língua de sinais, aprendam os conteúdos curriculares e se desenvolvam plenamente. 28 O Decreto 5.626, de 22 de dezembro de 2005, inclui a Libras como disciplina curricular nos cursos de formação de professores, tanto de nível médio como superior e, também, dispõe da formação dos profissionais para ensino da Libras (instrutores e professores de Libras), bem como dos tradutores/intérpretes de Libras/Língua Portuguesa (TILS). Também traz a garantia do ensino bilíngue para surdos, em escolas de surdos ou classes regulares com a atuação de intérpretes. Por meio desse decreto, houve a materialização de ações, principalmente envolvendo as políticas públicas do MEC (Ministério de Educação) com a exigência de que as instituições de ensino incluíssem a Libras como disciplina obrigatória nos currículos, e também pela realização do Exame de Proficiência em Libras, para certificar os fluentes desta língua, tanto surdos como ouvintes, para que pudessem atuar profissionalmente no ensino e na interpretação. 3.1.2 Comunidade e Cultura Surda Com a difusão da Libras em território nacional, houve aumento do interesse e procura para aprender este novo idioma. Muitas pessoas que anteriormente tinham contato com a língua de sinais eram provenientes, em sua maioria, de famílias com surdos, ou atuavam em congregações religiosas que mantinham ministérios voltados às pessoas surdas. A atuação era muito mais em sentido assistencial do que profissional. Dessa forma, o grupo de pessoas surdas, mas também ouvintes, como familiares, intérpretes, professores e amigos que participam e compartilham os interesses comuns e a língua de sinais, foi designado como Comunidade Surda. Incluem-se também as associações de surdos, federações e igrejas às quais eles costumam frequentar. Assim, a partir das exigências legais e da divulgação de trabalhos na área, aqueles que já estavam no meio migraram suas funções de apoiadores da causa para profissionais. Os membros da comunidade surda passaram a atuar nos contextos sociais, principalmente na educação, como professores ou intérpretes, garantindo o acesso dos surdos ao nível de ensino superior e também abrindo um leque de cursos de pós-graduação na área para novos profissionais. 29 Houve a impulsão de surdos buscando formação acadêmica, por intermédio da atuação de intérpretes que mediavam a comunicação nas instituições de ensino superior, nas mais diversas áreas de formação. Por outro lado, também aumentou significativamente o número de ouvintes inscritos em cursos de Libras e de formação de intérpretes para assumir as funções tanto em escolas e universidades como em empresas e outros serviços. Devido a essa demanda, em 2006, iniciou-se o curso de Letras – Libras na Universidade Federal de Santa Catarina, com mais 9 polos em outros estados. Concomitantemente às novas possibilidades que foram surgindo, professores surdos passaram a estudar sua própria história e sua língua. Muitos publicaram livros, originados das pesquisas acadêmicas de graduação, mestrado e até doutorado, tratando de assuntos referentes à surdez e à língua de sinais. Uma dessas pesquisas trouxe à luz o conceito de Cultura Surda, expressa por autoras como Perlin e Strobel (2008), como sendo o jeito surdo de entender o mundo, de modificá-lo e torná-lo acessível e habitável, ajustado às suas percepções visuais, abrangendo a língua, as ideias, as crenças, os costumes e os hábitos do povo surdo. Entretanto, os surdos ainda se configuram como um grupo minoritário, que está lutando para que sua cultura seja incluída no contexto social como legítima. Diante disso, as manifestações da surdez por meio da chamada Pedagogia Visual ou Surda e das manifestações artísticas por diversos canais de divulgação se fazem instrumentos importantes para a representatividade social da surdez. Saiba mais Compreenda o que é Pedagogia Surda, com a leitura do artigo da professora Shirley Vilhalva, disponível em: https://docplayer.com.br/9388183-Pedagogia- surda-por-shirley-vilhalva-surda-professora-tecnica-do-cas-sed-ms-e-mail- svilhalva-brturbo-com-br.html Como está sendo possível acompanhar, houve a crescente demanda de profissionais para atuação na área da surdez e a regulamentação da profissão 30 de Tradutor/Intérprete de Libras foi conquistada pela promulgação da Lei 12.319/2010. Em seu texto, a lei traz as atribuições inerentes à função, a formação mínima exigida, bem como princípios éticos que devem nortear a atuação profissional. 3.2 O desenvolvimento tecnológico Estamos vivendo o ápice da influência tecnológica em nossas vidas, nunca antes vista na história. A comunicação ficou muito mais fácil, a transmissão de notícias e informações a apenas alguns toques na tela. Esses avanços refletiram diretamente na comunidade surda. Reflita A facilidade obtida pela tecnologia, com o uso, por exemplo, de smartphones, deixou o mundo explícito em imagens. Já pensou como isso se dá para quem, inevitavelmente, conhece e aprende tudo pelo canal visual? As inovações e aplicativos nos servem para as mais diferentes funções, desde apenas entretenimento até o controle de segurança residencial. Existem aplicativos que controlam o funcionamento de eletrodomésticos, das luzes de uma casa. Há aqueles que nos facilitam o acesso aos serviços públicos, eliminando a necessidade de deslocamento e outros, ainda, que nos mantém conectados a pessoas, estejam elas próximas ou distantes de nós. Visando facilitar a comunicação entre surdos e ouvintes, foram lançados dois aplicativos ou softwares que traduzem simultaneamente textos expressos na língua portuguesa, tanto orais como escritos, para a Libras. O Hand Talk surgiu em 2012 e, no ano seguinte, o ProDeaf. 31 Hand Talk Fonte: http://www.onacional.com.br/estado/66659/tce-rs+disponibiliza+ferramenta+de+ acessibilidade+hand+talk ProDeaf Fonte: https://www.windowsteam.com.br/prodeaf-e-o-melhor-tradutor-de-libras-para-o- seu-windows-phone/ 3.3 A Libras diante de todos De 2017 para cá, a surdez e a Libras tiveram espaço ampliado diante de todos nós, com uma visibilidade única após tantos anos de lutas para conquistar direitos básicos de cidadania. Embora já houvesse o avanço na legislação e na oportunidade de acesso às informações, os surdos ainda eram vistos como uma parcela paralela da sociedade. http://www.onacional.com.br/estado/66659/tce-rs+disponibiliza+ferramenta+de+acessibilidade+hand+talk http://www.onacional.com.br/estado/66659/tce-rs+disponibiliza+ferramenta+de+acessibilidade+hand+talk 32 Reflita Para exemplificar, de modo a ser de fácil compreensão, pense em uma rua ou via pública com três pistas, sendo que a da direita é reservada exclusivamente para a circulação de ônibus. Assim era a inserção das pessoas surdas na sociedade, ou seja, em uma via paralela, com certa facilidade para avançar, porém de forma restrita. Seguia no fluxo, na mesma direção, mas ao lado dos ouvintes e não entre eles. A partir do aumento da exposição da surdez é que houve realmente o estabelecimento de uma nova perspectiva, de que estas pessoas compõem a sociedade e não somente fazem parte dela. Assim, passaram a ser notadas e valorizadas, aceitas com suas características específicas, principalmente comunicativa, compreendidas como pessoas ativas e participativas. Nesse sentido, o primeiro grande marco atual foi no Enem 2017, no qual a proposta para o tema da redação foi: “Desafios para a formação educacional dos surdos no Brasil”. Contudo, os efeitos positivos não foram instantâneos. Muito se noticiou a respeito da escolha desse tema e do desconhecimento de todos em relação a ele. Além disso, muitos estudantes se manifestaram nas redes sociais de forma pejorativae preconceituosa, conforme o recorte abaixo: Leia-se: droga, porcaria Fonte: acervo do autor (2019). 33 Esses fragmentos de uma rede social são apenas dois exemplos dos muitos compartilhados na época. Porém, embora as manifestações iniciais tenham sido negativas, a verdade é que a partir daquele dia o Brasil viu-se diante de um novo debate. Quem são os surdos? Por que há um desafio em sua formação educacional? O que acontece com essas pessoas de diferente? Todos os meios de comunicação, fossem eles impressos, digitais e de televisão, trouxeram novas informações a respeito dos surdos e sua língua. As manchetes se espalharam rapidamente, e, em consequência, novos paradigmas surgiram. Todos tiveram, a partir daquele momento, o contato e enfrentamento com realidade da surdez; foi um assunto de alcance nacional. Com isso, a surdez pôde ser exposta de uma maneira científica, na qual se apresentavam os aspectos da língua de sinais e das potencialidades das pessoas surdas e isso certamente foi positivo. Obviamente, ainda se tem muito a conquistar, mas este foi um grande passo dado e que se caracteriza hoje como um momento histórico a ser referenciado. Em 2018, com a campanha para eleições de presidente, senadores, governadores e deputados federais e estaduais, a surdez também alcançou visibilidade. Todos os partidos, em suas campanhas nos horários gratuitos e obrigatórios de televisão, usaram a janela de intérprete de Libras, além das legendas, para promover acessibilidade aos surdos. O recurso do uso de intérpretes também foi verificado nos debates televisionados com os candidatos. Outros dois momentos recentes nos quais a surdez foi protagonista foram observados na posse presidencial, em janeiro de 2019. Aqui, retrata-se a importância dada à Libras e à comunidade surda, sem nenhum enfoque partidário ou ideológico, apenas apresentando-se o fato como marco histórico e representativo. A Primeira Dama Michelle Bolsonaro fez um discurso no parlatório, em Libras, traduzido com voz pela intérprete Adriana Ramos. Essa homenagem aos surdos deve-se ao fato de que ela já atuava como voluntária na comunidade surda há vários anos. No atual governo, pela primeira vez, foram nomeadas duas surdas para cargos do segundo escalão. Priscilla Gaspar assume a Secretaria Nacional 34 sobre Direitos das Pessoas com Deficiência e Karin Strobel foi nomeada Diretora de Políticas de Educação Bilíngue de Surdos. Finalmente, o último grande acontecimento foi no Carnaval de 2019, no qual uma parceria de uma grande cervejaria com uma artista de reconhecimento nacional possibilitou a confecção inédita de uma mochila que reproduzia as vibrações das músicas tocadas. Pela primeira vez, essa tecnologia inovadora permitiu aos surdos sentir a música com o próprio corpo. Anteriormente, havia somente a atuação de intérpretes que traduziam as letras em shows, mas essa nova possibilidade significa o acesso à música de forma autônoma. Conclusão da aula 3 Com esta aula, encerra-se a narrativa cronológica sobre a história da educação de surdos no mundo e no Brasil. Você pode acompanhar cada momento relevante, que hoje se configura como um marco evolutivo para a aceitação da surdez como diferença, compreendendo os aspectos de maior influência e que contribuíram para a difusão da Libras como um idioma oficial e que permite à comunidade surda estar inserida socialmente. Atividades de Aprendizagem Elabore um material informativo, pode ser em formato de jornal ou apresentação em Power Point, com os principais acontecimentos recentes que envolvem a educação de surdos, explicando a importância de cada um. Se conseguir, selecione um local de trabalho ou educacional e apresente uma palestra usando o material elaborado. Aula 4 – Políticas públicas e legislação para a Surdez Apresentação da aula 4 Olá, aluno (a)! Iniciaremos esta aula apresentando os avanços que contribuíram para a inclusão dos surdos na sociedade e que permitiram a eles, hoje, serem ativos e participativos. Primeiramente, você conhecerá as fases da 35 história dos surdos por um prisma cultural da surdez, ou seja, pelo florescer de seu reconhecimento como diferente, na busca da conquista de seus direitos. A seguir, serão apresentadas detalhadamente as leis que promoveram gradativamente a inclusão dos surdos nas mais diversas áreas da sociedade, desde o âmbito educacional até o profissional. 4.1 Fases da história dos surdos Nos capítulos anteriores foram narrados cronologicamente os principais acontecimentos que marcaram as pessoas com surdez. Analisando os períodos passados, podem-se destacar três fases distintas na história que delimitam o aspecto cultural da surdez, ou seja, de que forma eram vistos socialmente e de que forma eles mesmos se posicionaram diante da realidade vivida. Essas fases são: Revelação Cultural, Isolamento Cultural e Despertar Cultural. Há evidências, nos registros históricos, de que antes do Congresso de Milão, os surdos não tinham problemas com a educação. Essa fase é conhecida por Revelação Cultural. Foi um período no qual os surdos viviam em harmonia com a sociedade de maneira geral. Embora uma parcela de estudiosos tentasse estabelecer a homogeneidade, havia a liberdade de escolarização dos surdos dentro de suas condições e os resultados foram satisfatórios, sendo que a maioria conseguia ter um bom desenvolvimento de leitura e escrita. Assim, havia muitos surdos escritores, artistas e professores. Vários muito bem-sucedidos. Porém, na tentativa de estabelecer um padrão, com a crença de que os surdos deveriam ser comparados aos ouvintes e deveriam tentar ser como eles, de forma mais próxima possível, veio a fase do Isolamento Cultural. Esse fato deu-se pela proibição do uso da língua de sinais, pela limitação da educação apenas com o método oralista, como consequência das deliberações do Congresso de Milão. Nesse período, os surdos se mantiveram unidos e com sua língua viva, numa clara resistência contra a imposição ouvintista. Obviamente, não podiam manifestar-se livremente, mas, entre eles, a língua de sinais foi mantida, mesmo que escondida e aparentemente segregada. Por fim, a terceira fase é a do Despertar Cultural, que se iniciou em torno de 1960, com as pesquisas sobre as línguas de sinais, o que possibilitou uma reflexão no sentido de aceitação como idioma completo e similar aos orais. Foi 36 o período de repensar a opressão dos ouvintes e reassumir publicamente a característica da surdez manifestada por sua língua. 4.2 A importância das leis O ponto alto no período da história da educação de surdos se mescla com a história da Educação Especial e está diretamente ligado à mudança na forma de visão das pessoas com deficiência, que passaram a ser vistas como cidadãs, com direitos e deveres de participação social. No Brasil, observaram-se as primeiras ações de atenção, com a previsão de leis e políticas públicas para as pessoas com deficiência a partir das mobilizações sociais que se tornaram eventos mundiais, em torno da década de 1960. Esse período foi marcado pela mobilização de famílias e profissionais que visavam a democratização da escola, para que abrangesse também as camadas menos favorecidas da sociedade. Paralelamente a esse movimento, surgiram as primeiras associações de pais e pessoas com deficiência, ou seja, as Apaes. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) nº 4024/61, de maneira inovadora, pela primeira vez, destinou um título à Educação Especial, mencionando a oferta de serviços educacionais às pessoas com deficiência, “dentro do possível no ensino regular”. O Estado tinha como meta políticas para essa camada da sociedade,e, embora a lei trouxesse novas possibilidades, não contemplava nenhum aporte financeiro às instituições. Em 1970, foi criado, no MEC, o Centro Nacional de Educação Especial – CENESP, responsável pela gerência da educação especial no Brasil, que, sob a luz do discurso de integração, impulsionou ações educacionais voltadas às pessoas com deficiência e às pessoas com superdotação. O conceito de integração se referia à necessidade de as pessoas com deficiência encontrarem uma maneira para se identificarem com os demais cidadãos, para, então, poderem ser inseridas à convivência dentro da sociedade. Porém, esse conceito remetia a uma noção de inferioridade. Outro apontamento às pessoas com deficiência veio por meio da Lei de Diretrizes e Bases para o ensino de 1º e 2º graus, nº 5.692/71, ao referir-se a “tratamento especial” para os alunos com “deficiências físicas, mentais e superdotados” como uma forma paralela à educação comum, partindo-se de um 37 entendimento de que estes alunos eram treináveis e, somente assim, poderiam integrar-se socialmente. A partir de 1980, muitos organismos internacionais sistematizaram documentos norteadores de políticas públicas, com vistas à igualdade de direitos e oportunidades para todos, independentemente de sua condição física, econômica, social ou cultural, o que propiciou a aprovação de inúmeras leis e instrumentos jurídicos. A Constituição Federal de 1988 tem seu fundamento na promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Traz, em seu artigo 205, a educação como um direito de todos, garantindo o pleno desenvolvimento da pessoa, o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho. No artigo 208, garante como dever do Estado o acesso aos níveis mais elevados do ensino, bem como a oferta do atendimento educacional especializado. A partir de então, se estabelecem novas políticas de inclusão, ou seja, capazes de assegurar a garantia de acesso, permanência e participação de todos, tanto nos ambientes educacionais como profissionais e em toda a abrangência social, respeitando-se as características individuais e fazendo com que a sociedade se adapte para recebê-los, sendo uma política de resgate da justiça social e acolhimento a todos. Na década de 1990, esses princípios foram reforçados e explicitados nos textos legais, que se inspiravam em documentos internacionais como a proposta de Educação para Todos (Jomtien-Tailândia) e a Declaração de Salamanca (Espanha, 1994), que abriram espaço para a ampla discussão sobre a necessidade de os governos contemplarem em suas políticas públicas o reconhecimento da diversidade dos alunos e o compromisso em atender às suas necessidades nos contextos escolares comuns. A Política Nacional de Educação Especial, publicada em 1994, condicionou o acesso às classes comuns do ensino regular àqueles que "(...) possuem condições de acompanhar e desenvolver as atividades curriculares programadas do ensino comum, no mesmo ritmo que os alunos ditos normais” (MEC/SEESP, 1994, p.19). Pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96, ficou definido, no artigo 58, que a educação especial é uma modalidade de educação escolar oferecida preferencialmente na rede regular de ensino para os alunos 38 com “necessidades especiais”. O artigo 59 determina que os sistemas de ensino deverão assegurar aos alunos: “currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específica para atender às suas necessidades”. Dessa forma, a LDB define como responsabilidade do poder público a efetivação da matrícula na rede regular de ensino e a oferta de serviços de apoio especializados. Porém, ainda manteve a concepção tradicional ao prever classes, escolas ou serviços especializados para alunos considerados sem possibilidade de serem integrados no ensino regular em razão de condições específicas. Em 1995, foram publicados os Parâmetros Curriculares Nacionais para a Educação Básica, porém, nestes documentos não houve sequer nenhuma referência ao atendimento dos alunos com deficiência. Apenas em 1999, o Governo Federal publicou um caderno intitulado “Adaptações Curriculares dos Parâmetros Curriculares Nacionais – Estratégias para a educação de alunos com necessidades educativas especiais”, com o objetivo de oferecer subsídios ao professor, considerando a inclusão desses alunos. Contudo, pode-se observar que esse material tratou o assunto de forma superficial e inconsistente. Como forma de complementar as orientações, ao final de 2002, foram publicados oito fascículos relativos ao Programa “Adaptações Curriculares em Ação”, dos quais quatro são específicos por área de atendimento: altas habilidades/superdotação, deficiência física/neuromotora, deficiência visual e surdez. Além das normas específicas de âmbito educacional, foi promulgada, paralelamente, a Lei n° 10.098, de Dezembro de 2000, conhecida como Lei da Acessibilidade, que estabeleceu as normas gerais e os critérios básicos para promover a acessibilidade de todas as pessoas com deficiência ou que apresentam mobilidade reduzida, independentemente de qual seja esta deficiência (visual, locomotora, auditiva etc.), mediante a eliminação dos obstáculos e barreiras existentes nas vias públicas, na reforma e construção de edificações, no mobiliário urbano e ainda nos meios de comunicação e transporte. Em 2006, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos, o Ministério da Educação, o Ministério da Justiça e a Unesco lançaram o Plano Nacional de 39 Educação em Direitos Humanos, com o objetivo de fomentar, no currículo da Educação Básica, as temáticas relativas às pessoas com deficiência e desenvolver ações afirmativas que possibilitem inclusão, acesso e permanência na Educação Superior. Em 2007, no contexto com o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), foi lançado o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), reafirmado pela Agenda Social de Inclusão das Pessoas com Deficiência, tendo como eixos a acessibilidade arquitetônica, a implantação de salas de recursos e a formação docente para o atendimento educacional especializado. A lei define a Educação Especial como um campo de conhecimento e tipo transversal de ensino que perpassa todos os níveis, etapas e modalidades, realizando o atendimento educacional especializado e disponibilizando um conjunto de serviços, recursos e estratégias específicas que favorecem o processo de escolarização dos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas turmas comuns do ensino regular e a sua interação no contexto educacional, familiar, social e cultural. Atualmente, o processo educacional é também regido pela Resolução 4, de 2 de outubro de 2009, a qual apresenta as diretrizes operacionais para o Atendimento Educacional Especializado (AEE) na Educação Básica, modalidade Educação Especial, prevendo na sua organização as salas de recursos multifuncionais: espaço físico, mobiliário, materiais didáticos, recursos pedagógicos e de acessibilidade e equipamentos específicos; matrícula no AEE de alunos matriculados no ensino regular da própria escola ou de outra escola; cronograma de atendimento aos alunos; plano do AEE: identificação das necessidades educacionais específicas dos alunos, definição dos recursos necessários e das atividades a serem desenvolvidas; professores para o exercício da docência do AEE; outros profissionais da educação: tradutor e intérprete de Língua Brasileira de Sinais, guia-intérprete e outros que atuem no apoio, principalmente às atividades de alimentação, higiene e locomoção; redes de apoio no âmbito da atuação profissional, da formação, do desenvolvimento da pesquisa, do acesso a recursos, serviços e equipamentos, entre outros que maximizem o AEE. Em 2011,instituiu-se o Decreto nº 7.612 com o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, conhecido como Plano Viver Sem Limite, que traz 40 em seu texto a regulamentação de: garantia de um sistema educacional inclusivo; garantia de que os equipamentos públicos de educação sejam acessíveis para as pessoas com deficiência, inclusive por meio de transporte adequado; ampliação da participação das pessoas com deficiência no mercado de trabalho, mediante sua capacitação e qualificação profissional; ampliação do acesso das pessoas com deficiência às políticas de assistência social e de combate à extrema pobreza; prevenção das causas de deficiência; ampliação e qualificação da rede de atenção à saúde da pessoa com deficiência, em especial os serviços de habilitação e reabilitação; ampliação do acesso das pessoas com deficiência à habitação adaptável e com recursos de acessibilidade e promoção do acesso, do desenvolvimento e da inovação em tecnologia assistiva. Vocabulário Tecnologia Assistiva: é uma área do conhecimento, de característica interdisciplinar, que engloba produtos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços que objetivam promover a funcionalidade, relacionada à atividade e participação de pessoas com deficiência, incapacidades ou mobilidade reduzida, visando sua autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social. 4.3 Conquistas legais da área da surdez Além das leis citadas até aqui, que englobam todas as pessoas com deficiência, nos capítulos anteriores você conheceu algumas leis específicas que beneficiam e garantem direitos dos surdos. Contudo, agora estes instrumentos serão detalhados, para que você possa compreender todas as implicações dessas conquistas para a aceitação da surdez como diferença e dos indivíduos surdos como cidadãos sem distinção com os ouvintes, no que tange aos direitos e deveres. 4.3.1 Lei da Libras – Lei 10.436/2002 Após anos de luta, a comunidade surda comemorou uma grande conquista com a publicação da Lei 10.436, de 24 de abril de 2002, com o reconhecimento da Língua Brasileira de Sinais como meio legal de comunicação 41 e expressão, determinando que sejam garantidas formas institucionalizadas de apoiar seu uso e difusão, bem como a inclusão da disciplina de Libras nos cursos de formação de professores e parte integrante do currículo. A promulgação da Lei 10.436/2002 foi muito importante, pois reconhece a Libras como oficial em todo território nacional, fazendo com que o seu uso pelas comunidades surdas ganhasse respaldo do poder e dos serviços públicos e privados. Além disso, esse reconhecimento é uma forma de garantir atendimento e tratamento adequado aos surdos nas diferentes áreas sociais, ou seja, na educação, no comércio, nos prestadores de serviço, na saúde etc. 4.3.2 Decreto 5.626/2005 O Decreto 5.626/2005 regulamenta a Lei 10.436/2002 e dispõe sobre a inclusão da Libras como disciplina curricular, a formação do professor, instrutor e tradutor/intérprete de Libras, a certificação da proficiência em Libras, o ensino da língua portuguesa como segunda língua para alunos surdos e a inclusão de alunos surdos com a organização da educação bilíngue nos sistemas de ensino. Por este documento, a Libras deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória nos cursos de formação de professores para o exercício do magistério, em nível médio e superior e nos cursos de Fonoaudiologia, de instituições de ensino públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Assim, qualquer curso de licenciatura, nas diferentes áreas do conhecimento, o curso de formação de docentes de nível médio, o curso de Pedagogia e o curso de Educação Especial são considerados cursos de formação de professores e profissionais da educação para o exercício do magistério e, portanto, deverão incluir a Libras em sua grade curricular obrigatória. Além desses cursos, também se inclui o de Fonoaudiologia. Para os outros cursos de Educação Superior e Educação Profissional, a Libras pode ser ofertada como disciplina optativa. O decreto propõe também a viabilização da educação bilíngue, ou seja, do ensino para surdos ser ministrado em Libras como sua língua natural, também chamada neste processo de L1. Ao mesmo tempo, trabalha-se a Língua 42 Portuguesa, como segunda língua ou L2, que deve ser ensinada com métodos e técnicas sistematizadas e específicas. Para facilitar esse ensino bilíngue, pode-se comparar ao ensino de ouvintes nas escolas regulares e aos idiomas como inglês e espanhol. Para os ouvintes, o ensino é ofertado em Língua Portuguesa e paralelamente há a disciplina de inglês, por exemplo. Para os surdos, a Língua Portuguesa está no currículo como o inglês acima citado. É outro idioma, uma língua distinta. Mas, certamente, este assunto será aprofundado quando você estudar as filosofias educacionais na educação de surdos e as práticas de letramento. Também foram estipuladas no decreto a formação e certificação dos professores de Libras, bem como dos intérpretes/tradutores, ou seja, dos profissionais que atuam no ensino da Libras e nos que trabalham como mediadores de comunicação entre surdos e ouvintes. Por fim, a respeito das instituições escolares, o decreto define que as instituições responsáveis pela Educação Básica devem garantir a inclusão de alunos surdos, por meio da organização de escolas e classes de educação bilíngue, abertas a alunos surdos e ouvintes, com professores bilíngues, desde a Educação Infantil, passando pelo Ensino Fundamental e também com Ensino Médio ou Educação Profissional, com docentes cientes da singularidade linguística dos alunos surdos, bem como com a presença de tradutores e intérpretes de Libras-Língua Portuguesa. 4.3.3 Lei 12.319/2010 Essa lei regulamenta o exercício da profissão de Tradutor e Intérprete da Língua Brasileira de Sinais (Libras). Segundo a sua redação, o tradutor/intérprete terá competência para realizar interpretação das duas línguas de maneira simultânea ou consecutiva e proficiência em tradução e interpretação da Libras e da Língua Portuguesa. O intérprete constitui um elemento de importância primordial na educação dos surdos, na esfera de classes regulares, pois este profissional deve ser devidamente capacitado, fluente em Libras, proporcionando aos surdos receber informações, abrindo-lhes oportunidades para que possam construir competências e habilidades fundamentais para seu desenvolvimento. 43 Além dos ambientes educacionais, o intérprete pode, também, atuar nos processos seletivos para cursos nas instituições de ensino e nos concursos públicos; atuar no apoio à acessibilidade aos serviços e às atividades-fim das instituições e repartições públicas; prestar seus serviços em depoimentos em juízo, em órgãos administrativos ou policiais. Mídias Assista à entrevista com o Professor Dr. Fernando Capovilla à Globo News, abordando como tema a Libras e a educação bilíngue de surdos. Nele, você poderá conhecer as bases da educação bilíngue, verificar a importância da Libras nesse processo, entender as dúvidas dos pais em relação às opções educacionais para seus filhos surdos e ter um panorama de como estão os encaminhamentos no Brasil. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=uVbzA7fpJWE Conclusão da aula 4 Nesta aula, você pôde acompanhar não somente as políticas públicas para a área da surdez, mas um cenário amplo, que inclui todas as pessoas com deficiência. Nesse sentido, aprendeu que as mudanças ocorrem a partir da mobilização das camadas sociais, na busca por ter seus direitos garantidos. Ficou explícita a importância das leis específicas para o reconhecimento da Libras, para que o indivíduo surdo possa assumir sua identidade,não mais se comparando aos ouvintes, nem almejando ser como um, mas aceitando e vivendo a liberdade conquistada, valorizando-se como pessoa e como cidadão. Atividades de Aprendizagem Pesquise e elabore um quadro comparativo entre as conquistas e instrumentos legais dos surdos com os ouvintes, nas diferentes áreas de abrangência. Acrescente ao quadro quantos itens achar necessário: Ouvintes Surdos Área Educacional Área jurídica Saúde Profissional Esporte e lazer Etc.... 44 Aula 5 – Movimentos Surdos – educação, sociedade e cidadania Apresentação da aula 5 Olá, aluno! Nesta aula, você compreenderá todos os processos e lutas pelos quais a comunidade surda passou, na busca pela garantia de seus direitos e da oficialização da Libras. Irá verificar os principais aspectos que envolveram os movimentos surdos, com suas manifestações e reivindicações no cenário nacional brasileiro, basicamente pautados na resistência às imposições ouvintistas, nos diferentes espaços, sejam educacionais, sociais ou culturais. 5.1 A busca por direitos Historicamente, os indivíduos surdos foram e são, algumas vezes ainda, tratados como deficientes, segundo a perspectiva de que não têm a capacidade de viver normalmente em sociedade, sendo privados de direitos e tendo sua cidadania não respeitada, principalmente por não se comunicarem oralmente. Em virtude disso, os movimentos surdos começaram a partir dos espaços de convivência, como as associações e/ou clubes, em que os adultos e jovens estabeleceram um intercâmbio cultural e linguístico por meio do uso da Língua de Sinais. Vale ressaltar que a língua de sinais é um dos fatores importantes na reunião de surdos, pois com ela podem se expressar e compartilhar experiências. Contudo, outras questões surgiram, ampliando e diversificando as mobilizações, de acordo com as realidades locais ou nacionais. Algumas de suas manifestações representam inclusive os anseios dos surdos em nível mundial e são articuladas por meio da World Federation of the Deaf – WFD, sediada na Finlândia. 5.1.1 A origem dos Movimentos Surdos Pesquisadores e estudiosos das comunidades surdas apontam para o fato de que as primeiras reuniões de surdos ocorreram na França, em virtude dos festejos comemorativos que marcavam o aniversário do abade L’Epee, 45 nome importante da história desse país. Esses encontros inicialmente foram caracterizados por banquetes, em episódio que é narrado por Mottez (1992, p.7): Quero convidá-lo a registrar o ano de 1834 como uma das grandes datas da história dos surdos. Com o primeiro banquete comemorando seu nascimento (1834), começa o culto ao Abade L’Epée. Para mim, é a data de nascimento da nação surda. É o ano em que pela primeira vez os surdos-mudos se outorgam uma espécie de governo. Isto nunca havia acontecido. Os historiadores afirmam que nessas reuniões os surdos reproduziam suas experiências de vida por meio de performances e de anedotas, que foram sendo transmitidas de geração para geração. Os temas abordados relacionavam-se ao isolamento no qual viveram por longos períodos até a nova vida em comunidade e às ricas possibilidades que acompanharam o uso da língua de sinais. Outra referência feita na história sobre o surgimento de associações de surdos sugere que os objetivos dessas reuniões eram o lazer, a recreação, a assistência e o trabalho. Inclusive esse aspecto de trabalho foi importante, pois naquela época muitos surdos não tinham escolarização e as associações serviam também para prepará-los para o mercado de trabalho com treinamentos, visando uma melhor colocação. Assim, no caminho da busca de soluções para a garantia dos direitos dos surdos, tanto de acesso à sua língua, à educação, à saúde, ao lazer, como também ao trabalho, as associações de surdos dos diferentes continentes congregam-se na sua Federação Mundial de Surdos (WFD), permitindo, portanto, que os líderes começassem a se manifestar, fazer solicitações e até mesmo interferir nas políticas dos governos em seus países. A WFD teve papel fundamental diante dos órgãos das Nações Unidas, para o reconhecimento formal da língua de sinais como natural dos surdos. Foi em torno de 1981 que, por orientação da ONU, os governos começaram a se preocupar com a parcela da sociedade com algum tipo de deficiência. Dessa forma, os representantes dessas comunidades passaram a exigir procedimentos concretos, com vistas ao trabalho dessas pessoas, no sentido de promoção da autonomia e independência. As leis, apenas, já não eram suficientes para garantir o acesso; eram exigidas ações que as efetivassem. 46 A partir de então, houve o crescimento significativo nos movimentos engajados com as causas da surdez, por meio do ativismo oriundo das associações. Os líderes empunhavam bandeiras de igualdade de oportunidades, visando ao exercício pleno da cidadania pelos surdos, de modo que as principais reivindicações dos movimentos surdos estavam ligadas aos direitos sociais, à acessibilidade e à liberdade de comunicação. Reflita A Empatia atualmente é uma capacidade muito valorizada, pessoal e profissionalmente. Você já se imaginou sem seus direitos? Alguma vez, já tentou se colocar no lugar do outro, no caso, de um surdo, e não poder comunicar-se ou participar socialmente, por não se expressar no mesmo idioma, ou sofrer preconceito? 5.1.2 Movimentos Surdos no Brasil A história da educação de surdos no Brasil já foi apresentada cronologicamente na segunda aula, mas vamos ressaltar alguns aspectos relevantes para compreender os movimentos sociais dos surdos brasileiros. Com a fundação do INES, em 1857, muitos surdos oriundos de várias regiões do país mudaram-se para o Rio de Janeiro, em busca de uma formação educacional. Naquele tempo, o instituto funcionava como internato, ou seja, os alunos moravam na escola durante o período letivo e nas férias voltavam para suas famílias nas cidades de origem. Esses alunos foram de extrema importância, pois foram os primeiros líderes surdos a difundir a língua de sinais em todo o território nacional. Isso foi possível pelo uso da língua de sinais francesa e dos sinais já existentes aqui, ainda que não fossem sistematizados, serviam como uma língua brasileira. Após essa mescla, observou-se o início formal no uso dos sinais que culminou na Libras que usamos até hoje. As comunidades surdas no Brasil, seguindo a mesma tendência mundial, organizaram-se, principalmente, por meio de associações, federações e confederações. 47 A primeira associação de surdos brasileira foi formada por um pequeno grupo de ex-alunos do INES, que organizavam competições esportivas com escolas de ouvintes, em torno de 1930. Outra associação foi criada anos mais tarde, em 1953, com apoio da Professora Ivete Vasconcelos, que emprestava uma sala de seu prédio para as reuniões entre os membros e a presidência do órgão. Era composta por surdos da Congregação de Surdos Alvorada do Rio de Janeiro. Essa associação, mais tarde, uniu-se aos ex-alunos do INES para desenvolverem conjuntamente competições esportivas e lazer. Como já citado, os ex-alunos do INES voltavam para suas cidades, e, assim, os surdos dessas localidades começaram também, a exemplo do Rio de Janeiro, a unirem-se em associações. A partir daí, surgiram a Associação de Surdos-Mudos de São Paulo, em 1954, e a Associação de Surdos de Belo Horizonte, em 1956. A FENEIDA (Federação Nacional de Educação e Integração do Deficiente Auditivo) surgiu em 1977, mas era apenas composta por profissionais ligados à surdez. Em 1987, os surdos conseguiram ganhar espaço, força e legitimidade, ao vencerem a eleição para presidência do órgão. Dessa forma, assumiram o comando, mudando o nome para FENEIS (Federação Nacional de Educação de Surdos) e introduziramuma nova perspectiva de trabalho e atuação. Atualmente, existem em torno de noventa instituições organizadas entre Confederação, Federações e Associações de Surdos no Brasil. Além da FENEIS, as de maior expressividade representativa são a CBDS (Confederação Brasileira de Desportos de Surdos) com data oficial de fundação em 1984 e a CBS (Confederação Brasileira de Surdos), em 2004. Há também representatividade de surdos em outros âmbitos sociais, como Associações de Pais e Amigos dos Surdos, Associações de Intérpretes, Escolas para Surdos e Pastorais e Ministérios de Surdos em várias designações religiosas. 48 Curiosidade Brasileiros conquistaram 5 medalhas na 23ª edição da Surdolimpíada, que aconteceu na Turquia, em 2017. O nadador Guilherme Maia conquistou a inédita medalha de ouro, na prova de 200 metros livres e também a de bronze, nos 100 metros livres. As outras medalhas de bronze foram levadas por Heron Rodrigues, no caratê, Alexandre Fernandes, no judô e pela equipe de futebol feminino, que derrotou a equipe da Grã-Bretanha. Fonte: http://agenciabrasil.ebc.com.br/ 5.1.3 Brasil – Mobilizações a partir de 1990 A partir da década de 1990, as mobilizações e movimentos surdos convergiram na busca do reconhecimento da Libras, por meio da oficialização promovida por força da lei, garantindo suporte jurídico. Este período foi marcado pela reivindicação da igualdade de oportunidades entre surdos e ouvintes por meio de sua língua, com a finalidade de garantir direitos sociais e cidadania. O que se estava conquistando era o acesso e a participação em todas as esferas sociais, ou seja, saúde, educação, trabalho e lazer. Neste momento, ainda não estavam em pauta as demandas atuais, como educação bilíngue e respeito à cultura e identidade surda. O primeiro grande passo para a luta de reconhecimento legal da Libras aconteceu em 1993, por meio da divulgação do documento As comunidades surdas reivindicam seus direitos, elaborado pela FENEIS, que defendeu a tese de que as línguas de sinais são naturais, completas e equivalentes às línguas orais, sob a análise gramatical e linguística. Segundo essa perspectiva, os surdos compõem uma minoria que possui uma forma particular de comunicação por meio da língua de sinais e, portanto, devem ser reconhecidos e resguardados tanto pelo Estado como pela sociedade. Foi nesse documento que o termo Libras foi usado para fazer referência à Língua Brasileira de Sinais, ou seja, a língua usada pelos surdos brasileiros. Paralelamente, outro fator que muito contribuiu, foi a atuação do grupo de Estudos da Libras, Aquisição da Linguagem e Aplicação à Educação de Surdos, formado na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Sob a coordenação da professora linguista Lucinda Ferreira Brito, foi organizado o II Congresso Latino 49 Americano de Bilinguismo, no qual houve cursos sobre metodologias de ensino com línguas de sinais, ministrados por especialistas de vários países, tanto para surdos como para formação de intérpretes brasileiros. Dessa forma, as experiências estrangeiras contribuíram para a abertura de uma nova visão sobre a surdez, seus direitos, sua língua e sua formação acadêmica. No ano seguinte, o ator surdo Nelson Pimenta liderou o grupo “Surdos Venceremos”, em uma passeata histórica, que reuniu em torno de duas mil pessoas, surdas e ouvintes, na Praia de Copacabana, marcando um impulso importante no movimento surdo. Usando faixas, cartazes, slogans e símbolos de defesa aos direitos dos surdos e pela valorização e reconhecimento da Libras, este ato foi relevante pela visibilidade alcançada. Esses ideais, sendo veiculados e apropriados por vários surdos em diferentes cidades do país, transformaram-se gradativamente na principal base de alicerce para a identificação cultural e linguística dessa comunidade. Nesse ínterim, além da busca por direitos iguais e cidadania, que marcava não somente a área da surdez, mas os movimentos de todas as pessoas com deficiência, surgiu uma nova perspectiva de discurso que contemplava as especificidades linguísticas do povo surdo. A ideologia que passou a vigorar não era mais a da igualdade de oportunidades, mas sim, a valorização dos aspectos representativos de uma identidade surda, marcada pelo uso da língua de sinais, elemento que constitui os surdos como produtores de cultura própria. Identidade surda Fonte: http://agenciaalagoas.al.gov.br/media/k2/items/cache/33621aac65a59447f96b9d729eb 2fd6e_XL.jpg 50 A partir desse momento, surgiu a campanha pela oficialização da Libras no Congresso Nacional, visando à aprovação de uma lei que legitimasse todo o movimento surdo e suas lutas. Inicialmente, as tentativas foram infrutíferas, porém, com o apoio de alguns parlamentares, a causa finalmente chegou ao plenário do Senado Federal, em 1996, e toda a tramitação prolongou-se por mais seis anos. Ao mesmo tempo, os surdos começaram a ascender academicamente, ganhando espaço, produzindo pesquisas científicas, aliados a ouvintes que também militavam pela causa. Em 1999, pela parceria de instituições de ensino superior com a FENEIS do Rio Grande do Sul, foi organizado o V Congresso Latino Americano de Educação Bilíngue, que trouxe vários trabalhos já desenvolvidos também por pessoas surdas, com propostas sobre a formação de professores surdos e, também, de intérpretes de Libras. Juntamente com esse evento, aconteceu a passeata, em Porto Alegre, que culminou com a entrega do documento A educação que nós surdos queremos, tornando pública a luta e as reivindicações do povo surdo. No mesmo rumo, no ano de 2000, foi realizado em Brasília o I Festival de Arte e Cultura Surda e, em 2001, a primeira Conferência dos Direitos e Cidadania dos Surdos do Estado de São Paulo, com propostas na conquista de seus direitos e exercício pleno da cidadania relacionados à educação, à cultura, à família, à saúde, aos esportes, aos direitos e deveres, ao trabalho, à Língua de Sinais, às associações e ao movimento surdo. Saiba mais Acompanhe o trabalho da FENEIS no Brasil. Acesse o link abaixo, do site Acessibilidade Inclusiva – uma ação voluntária para ajudar o próximo – e encontre informações sobre as regionais em diversos estados, com endereços e contatos. Disponível em: http://www.acessibilidadeinclusiva.com.br/federacao-nacional- de-educacao-e-integracao-dos-surdos/ 51 5.1.4 Difusão e oficialização da Libras Com toda a pressão que estava sendo exercida nos órgãos governamentais na área da educação, em agosto de 2001 ocorreu um curso de capacitação de 80 surdos para serem instrutores de Libras, com o desenvolvimento de métodos e materiais didáticos visando uma formação de qualidade, para que pudessem atuar em suas regiões como multiplicadores, ensinando e difundindo a Libras em todo o país. Essa iniciativa foi do Ministério de Educação e Cultura (MEC), em parceria com a FENEIS, por meio do Programa Nacional de Apoio à Educação de Surdos. Além dessa formação, em 2001, por meio do mesmo programa, houve a capacitação de 54 professores/intérpretes de todo o Brasil, para atuarem em escolas com alunos surdos. Enquanto tais eventos se desenrolavam, o movimento surdo se empenhava diante dos parlamentares para agilizarem a votação e aprovação do projeto de lei que regulamentava a Libras. Assim, finalmente, diante de muitos ativistas surdos e ouvintes, a Lei da Libras, sob nº 10.436/2002, foi aprovada pelo Senado e sancionada pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. Além da oficialização da língua, essa lei também incluiu a disciplina de Libras nos currículos de Ensino Básico para Surdos, nas escolas inclusivas e /ou bilíngues, um ideal realizado após muitos anos de luta. Após reuniões técnicas e consultas públicas, em 2005 foi aprovado o Decreto 5.526, que regulamentaa Lei nº 10.436, com teor já apresentado em aulas anteriores. Ressalta-se que as escolas de surdos que adotam a metodologia do Bilinguismo puderam, a partir desse decreto, oferecer melhores condições de ensino e aprendizagem aos seus alunos surdos, com respaldo legal e políticas de atendimento. Todo esse processo veio com uma vitória conquistada por longas batalhas e que, obviamente, demarcam que a luta ainda não acabou. Há muito por se avançar na área da surdez, como em todos os âmbitos de lutas que marcam todo o povo brasileiro. Os efeitos de uma administração pública que não atua seriamente para a garantia de direitos para seus habitantes, seu povo, serão sentidos por todos. 52 Conclusão da aula 5 Nesta aula, você acompanhou todo o protagonismo dos ativistas surdos, primeiramente para garantirem a igualdade de direitos e oportunidades e, em seguida, para reconhecer legalmente a Libras em território nacional. Compreendeu que o movimento surdo surgiu das interações sociais e produções culturais que inspiraram esse povo a reivindicar seu merecido reconhecimento e, como consequência, sua valorização. Esse percurso foi marcado por ações coletivas expressivas, passeatas, manifestos, busca de apoio e documentos que representaram seus desejos e aspirações. Atividade de Aprendizagem Redija um texto, de pelo menos 20 linhas, apontando quais são as principais necessidades da comunidade surda diante da sociedade atual, baseando-se nos avanços já conquistados e analisando o que ainda é possível fazer para que seja ampliada a participação desse grupo de pessoas nas mais diversas áreas da coletividade. Aula 6 – História cultural dos surdos Apresentação da aula 6 Olá, aluno! Nesta aula, você irá compreender como foram feitos os registros da trajetória da educação de surdos, que basicamente ocorreram por dois prismas. O primeiro deles foi contado pelos ouvintes, e o segundo é a história contada pela própria comunidade surda. Em seguida, irá conhecer as principais manifestações culturais dos surdos, expressas nesta aula pela literatura. 53 6.1 Historicismo, história crítica e história cultural Um povo é constituído pela sua manifestação cultural, que funciona como meio integrador e de identificação de pertencimento, compartilhada entre os indivíduos que dividem os mesmos espaços sociais. 6.1.1 Historicismo Diante dos registros que trazem as narrações da história dos surdos ao longo do tempo, houve um período em que todas as informações eram apresentadas pelos ouvintes, ou seja, pela sua hegemonia, adquirida naturalmente por ser maioria. Assim, os estudiosos definem que o Historicismo no contexto da surdez é a história que foi concebida pelo colonizador, isto é, pelos ouvintes, que representam a dominância social e cultural em relação aos que não ouvem. Para esclarecer melhor esse conceito, define-se que o historicismo visa explicar a conduta, os valores e a sociedade, sempre de acordo com a visão da maioria, e, sendo assim, há uma relação direta com dominância e superioridade. Na área da surdez, houve uma evolução do pensamento e aceitação dessas pessoas no decorrer da história. Antigamente, os surdos foram considerados incapazes e até mesmo chegaram a ser eliminados. No período seguinte, a visão clínica foi preponderante, na qual os surdos precisavam ter como meta a “normalidade”, ou seja, ser como a maioria da sociedade e, para isso, era necessário investir nos aspectos que lhes faltavam, a fala e o aproveitamento da audição residual. Nesses panoramas, fica claro o conceito de Historicismo, pois coube aos ouvintes destacarem seu papel de amparo, assistência, proteção e até de responsabilidade pela “libertação” dos surdos, no sentido de tirá-los do isolamento social para que pudessem viver em comunidade com os ouvintes, desde que se adaptassem a eles. São narrativas carregadas de estigmas e preconceitos, como se a surdez tivesse relação direta com algum déficit cognitivo e problemas emocionais. Isso gerou nos surdos uma falta de identificação cultural, pois não se encaixava adequadamente naquelas narrativas, já que 54 estas não eram a sua representação diante da realidade, e sim a visão dos outros diante de si. 6.1.2 História cultural Recentemente é que a surdez foi aceita como “diferença”, marcada principalmente pelo uso da língua de sinais e aspectos específicos de contato com o mundo pelo canal visual e sua forma peculiar de apreensão do meio. Dessa forma, a nova forma de se registrar a história dos surdos é conhecida como História cultural, isto significa que não é mais contada sob a visão do ouvinte. Por meio desse registro cultural é que se refletiram os movimentos surdos, por meio de relatos e depoimentos das experiências vividas pelo próprio povo surdo. A cultura retrata de que forma os surdos vivem, seus diálogos cotidianos, as experiências que trocam entre si, suas artes e mitos compartilhados, seu jeito de ver, mudar e entender o mundo. A particularidade dos surdos em relação à forma que veem o mundo, de maneira diferente da maioria, se dá porque suas vidas se baseiam em experiências visuais e pelo fato de não contarem com a experiência auditiva, o que muda significativamente a maneira de interação com o meio. Conceituando, a cultura surda pode ser definida pelo padrão de comportamento compartilhado pelos indivíduos surdos, pela experiência trocada com os seus semelhantes nos diversos ambientes sociais, ou seja, na escola, nas associações de surdos ou encontros informais. É dessa forma que se origina a identificação como pertencente a um povo distinto, caracterizado por compartilhar língua de sinais, valores culturais, hábitos e modos de socialização, que demarcam a representação no interior de cada um e, assim, a identidade cultural. Nos dias de hoje, a história cultural dos surdos se manifesta pelas piadas e contação de histórias, artes surdas (literatura, teatro, poesia, artes plásticas), comportamentos, Pedagogia surda e artefatos tecnológicos em casas e escolas de surdos, como, por exemplo, os despertadores vibratórios, Closed Caption ou legenda oculta, campainhas luminosas e aplicativos para smartphones e tablets. A cultura surda pode ser definida por quatro formas de apresentação: 55 a) Audiológica, que não se refere aos graus de perda e, sim, à característica do uso predominante do canal visual; b) Social, que se manifesta pela participação na comunidade surda, por meio das associações, eventos esportivos, igrejas e festas; c) Política, marcada pelas lutas em relação aos direitos civis, educacionais e de comunicação; d) Linguística, pelo uso da Libras. Saiba mais De autoria de Silvia Andreis Witkoski, o livro Ser Surda, publicado em 2013, pela Editora Juruá, conta a história de vida da professora Rosani Suzin, e que certamente repete a de milhares de surdos. É um instrumento relevante para auxiliar pais, professores e surdos a reconhecerem e aceitarem a singularidade de cada pessoa e o respeito às diferenças. 6.1.3 História crítica A história crítica é, de acordo com estudiosos e pesquisadores, a mistura entre historicismo e história cultural, porém, com uma característica de tentar amenizar a história com discursos adaptados para omitir, esconder ou disfarçar a realidade. Essa forma dissimulada de apresentação da história nem sempre é consciente, e também se acredita que tem uma intenção sincera e genuína, porém, como algumas verdades são difíceis de serem assimiladas ou aceitas, acabam escondidas em debates acerca do politicamente correto, que configura um discurso que não se efetiva por ações. Na prática, observam-se situações nas quais o surdo é considerado como protagonista, mas que, na verdade, ficam apenas como coadjuvantes. Por exemplo,temos algumas escolas de surdos que assumem a metodologia bilíngue no ensino, mas, se forem analisadas a fundo, percebe-se que o bilinguismo não acontece além dos documentos oficiais, no caso, dos projetos pedagógicos. Provavelmente por força da lei, que garante a educação bilíngue, ou por estar em consonância com os anseios da comunidade surda, a escola assume 56 a postura “dita” bilíngue, mas, na prática pedagógica, ainda utiliza mecanismos baseados nos modelos orais, sem profissionais bilíngues, usando os sinais apenas como apoio para o ensino da língua portuguesa e alguns conceitos, mas sem a função de identificação, comunicação, produção e manifestação cultural. Dessa forma, a história crítica coloca o surdo em um patamar em que se sinta valorizado e aceito, mas age nos bastidores como se fosse dependente do ouvinte, como se ao surdo fosse dado o favor de estar presente, de permitir a comunicação por meio de sua língua natural, com a mediação de intérpretes quando necessário, sem que suas ideias e opiniões sejam realmente consideradas. 6.2 Cultura Surda A definição de Cultura pode ser variável, dependendo do enfoque a ser abordado, mas, em linhas gerais, entende-se por cultura o conjunto de valores por meio dos quais um grupo de pessoas pratica o mesmo modo de refletir sobre si e sobre o mundo, vivendo junto, partilhando crenças e costumes comuns. Também deve ser concebida como uma manifestação coletiva, como ferramenta de ação histórica, de crescimento e desenvolvimento de certa comunidade, no caso, os surdos. Cada pessoa possui uma identidade pessoal e cultural. Ao mesmo tempo em que cada pessoa é única, também está inserida em um grupo cultural em que absorve ideias, pensamentos, reflexões e constitui a sua representação do meio que a cerca. Observe que, ao longo dos anos, os surdos aos poucos formaram uma cultura própria, centrada principalmente em sua forma de comunicação como uma expressão cultural diferente dos ouvintes. Nesse sentido, há teóricos que afirmam que a cultura surda é o jeito do indivíduo entender o mundo, modificá-lo para torná-lo acessível e habitável, ajustando-o às suas percepções visuais e ao jeito surdo de se comunicar, sentir, pensar e viver. 57 6.3 Artefatos culturais dos surdos Até aqui já deve estar internalizada a compreensão de que a cultura e identidade surda estão diretamente relacionadas ao uso da língua de sinais. Portanto, o uso dessa língua é o que define as possibilidades de interação, diálogo, aprendizagem e, consequentemente, de produção cultural. Entende-se por artefatos culturais as produções materiais de determinado grupo cultural, que se compõem desde a maneira de vestir-se e comunicar-se até expressar ideias, crenças e valores. Assim, os artefatos culturais do povo surdo se expressam pela literatura, teatro, artes plásticas, produções acadêmicas e outros. 6.3.1 Literatura surda Não há registros antigos que se referem à literatura surda. Suas produções e histórias eram transmitidas de forma direta, de surdo para surdo, na língua de sinais. A tecnologia existente hoje abriu novas possibilidades de registros, seja por meio de escritos ou por vídeos, que garantem fielmente a transmissão dos textos surdos. Portanto, a literatura surda à qual se tem acesso é contemporânea, registrada após o avanço da tecnologia, que permite registros visuais gravados e que expõem livremente toda a riqueza da produção dos surdos. Como historicamente a comunidade surda foi reprimida, é por meio da literatura surda que os surdos difundem e defendem sua cultura na sociedade, apresentando suas tradições e divulgando suas histórias. A literatura surda se define como as histórias que são contadas em língua de sinais ou escritas, com temas relacionados aos surdos ou não, contada por e para surdos, carregando significados culturais relevantes, como a aprendizagem visual, o uso das mãos como meio de comunicação e sua forma de interagir no mundo. 58 Literatura surda Fonte: http://www.pplc.us/dlc/images/Rosa-and-Dae-read.jpg Os recursos mais usados pelos surdos para contar as suas histórias são os classificadores e as expressões faciais e corporais, que são recursos da língua de sinais com muito apelo visual. Essa literatura surda se compõe de histórias, contos, lendas, fábulas, anedotas, poesia, jogos, piadas e caricaturas, abrangendo vários estilos. Um dos meios mais utilizados e preferidos para a difusão da literatura surda é a gravação de vídeos, que são veiculados na internet ou, ainda, em DVDs. Esses materiais são extremamente ricos nas suas produções, já que por meio deles os surdos podem explorar toda a riqueza de sua língua, das expressões e de manifestações visuais. Em alguns casos, as produções são feitas exclusivamente em língua de sinais, para que não haja prejuízo na mensagem devido à tradução, haja vista que as informações visuais nem sempre podem ser expressas por palavras. Como exemplo comparativo, temos os filmes de Charles Chaplin, gênio do cinema mudo, que não precisou de palavras para tornar o seu personagem, Carlitos, um dos mais famosos de todos os tempos. Outro exemplo se apresenta sob a forma das piadas, que dependem muito do contexto cultural para terem significado e serem engraçadas, aliás, outra característica marcante na literatura surda é o humor, que compõe grande parte do acervo surdo. As principais obras de humor se referem à imitação de filmes, pessoas, animais, objetos que possam ser incorporados e retratados a partir de 59 expressões corporais e faciais; brincadeiras com configurações do alfabeto, dos números ou com o movimento dos sinais; brincadeiras com temas polêmicos e piadas. A literatura clássica universal e brasileira também faz parte das produções realizadas a partir da tradução de livros. Esses títulos envolvem tanto a literatura infantil como obras para jovens e adultos. Assim, também podemos compreender as manifestações da cultura surda, que refletem suas experiências, sua forma de ver e sentir. Para os ouvintes, é preciso entender a peculiaridade dos surdos e suas características. Embora nunca um ouvinte consiga sentir exatamente a experiência vivida por um surdo, quanto mais se aproximar de sua cultura, mais conhecer e participar dessa comunidade, melhor será a possibilidade de aprendizagem e, também, maior será a qualidade de suas experiências. Outro estilo que tem forte divulgação entre a literatura surda é a poesia em língua de sinais, que aborda, dentre suas principais temáticas, as lutas sociais relacionadas aos temas atuais do feminismo, racismo, diversidade sexual e de gênero e preconceito. As poesias podem ser gravadas ou ao vivo e os textos também podem ser previamente elaborados ou feitos de improviso. Além desses materiais em vídeo, há também materiais impressos e publicados com autoria de surdos, com temas sobre a surdez, a língua de sinais e ainda alguns clássicos mundiais adaptados para possibilitarem uma identificação com as personagens. Entre os títulos mais populares, temos: Tibi e Joca, uma história de dois mundos; Cinderela Surda; Patinho Surdo e o Kit Libras é Legal, composto de várias histórias. Além desses, há os livros autobiográficos e, ainda, os livros transcritos pelo sistema SignWriting, que é a escrita da língua de sinais. Mídias Um dos mais famosos representantes do humor surdo é Duc Hien Nguyen, conhecido como "Hii_een". Seu canal no Youtube conta com mais de 20.000, inscritos, sendo um grande sucesso, pois sua atuação é extremamente rica em expressões faciais e corporais, que o tornam um ícone do povo surdo. Faça sua inscrição e acompanhe sua carreira em: https://www.youtube.com/channel/UCnOqV3KupR-bPlS-F0jUwkw 60 Conclusão da aula 6 Nesta aula, você conheceu de que forma os registroshistóricos podem ser divulgados e como a interpretação dos fatos pode ser de certa forma manipulada, de acordo com a visão de quem conta ou transmite. Compreendeu que na visão dos surdos há um tipo próprio de expressão, resultado da sua formação cultural, com sua forma particular de se posicionar no mundo. Também conheceu algumas produções literárias da comunidade surda, que trazem consigo marcas de suas lutas, sua língua e suas aspirações. Atividades de Aprendizagem Pesquise na internet outros representantes da cultura surda que expressam literatura por meio de vídeos. Busque, principalmente, de estilos poéticos e outros, não apenas os de humor, para verificar as peculiaridades de cada um. Escolha o que mais gostou e redija um texto apresentando a obra e suas principais características. Aula 7 – Cultura Surda Apresentação da aula 7 Nesta aula será dada continuidade à apresentação das manifestações culturais dos surdos, por meio da expressão das artes plásticas, artes cênicas, entretenimento e produção científica. Assim, você irá compreender como as artes são usadas para interação social e meios de compartilhamento de experiências, crenças, valores e ideais sempre com enfoque de valorização da cultura surda, em suas produções. Além disso, será possível acompanhar como a surdez está presente nas artes, como tema central de obras diversas, o que ajuda não somente a divulgar a língua de sinais, como também para mostrar à maioria das pessoas toda a riqueza e potencialidade da comunidade surda. 61 7.1 Artes Plásticas Um dos artefatos culturais dos surdos é a expressão artística, que se manifesta por vários meios de veiculação. As artes plásticas representam um desses canais de demonstração da arte surda, que tem como principal aspecto constitutivo a visualidade, ou seja, a ênfase naquilo que pode ser percebido por meio da visão. Diante disso, há muita riqueza de detalhes, formas e cores. Os temas abordados nas obras, assim como na literatura, também refletem questões inerentes à surdez, ao seu modo de vida, às línguas, lutas e comportamentos. Além desses, incluem-se obras de resistência ao ouvintismo, que marcam a discriminação e preconceito vivido por muitos surdos e a opressão sofrida na imposição da língua oral. A seguir, serão apresentados alguns artistas surdos prestigiados e reconhecidos no mundo e no Brasil. 7.1.1 Jennifer Lescouët – França É fotógrafa, com surdez profunda bilateral. Na adolescência, fotografar era seu passatempo favorito e, assim, mais tarde formou-se na Escola Superior de Fotografia e Audiovisual em Paris. Em sua obra, verifica-se a preferência por retratar humanos, notabilizando-se a série de fotografias chamada As Palavras do Silêncio, nas quais os retratos reproduzem palavras na língua de sinais francesa. As Palavras do Silêncio Fonte: http://www.jlescouet.com/fr/portfolio-33291-0-40-serie-les-mots-du-silence.html http://www.jlescouet.com/fr/portfolio-33291-0-40-serie-les-mots-du-silence.html 62 7.1.2 Ellen Mansfield – Estados Unidos É uma artista surda, nascida em Nova Iorque, formada na Escola de Artes Visuais, reconhecida pelo seu trabalho com pintura e cerâmica. Sua obra em cerâmica usa muitos espelhos, pois, segundo a autora, “é a ferramenta ideal para reflexões sobre identidade e arte surda”. Nas pinturas, representa a cultura surda principalmente por imagens de olhos e mãos. Resistance artwork, acrylic on canvas Fonte: https://www.facebook.com/pg/EllenTileStrokeStudio/photos/?ref=page_internal Needleye and Watchful eyes Fonte: https://www.facebook.com/pg/EllenTileStrokeStudio/photos/?ref=page_internal https://www.facebook.com/pg/EllenTileStrokeStudio/photos/?ref=page_internal https://www.facebook.com/pg/EllenTileStrokeStudio/photos/?ref=page_internal 63 7.1.3 Billy Saga – Brasil É cadeirante e ativista pelas causas das pessoas com deficiência e direitos humanos. Embora não seja surdo, é um grande nome da Arte Surda, pois tem muita aproximação com a cultura surda, acreditando que a união é uma força transformadora. Nas suas obras, apresenta a luta contra as práticas discriminatórias e impositivas do oralismo, que por muito tempo imperaram entre os surdos. Além disso, também aborda a valorização da Libras e respeito à identidade surda. A sua arte é representada por vários suportes, principalmente fotografia e escultura. Efeito Borboleta Fonte: http://eucurtoartesurda.blogspot.com/ Librascídio Fonte: http://eucurtoartesurda.blogspot.com/ 7.1.4 Lucas Ramon – Cartoon – Brasil As produções culturais surdas também incluem obras impressas como histórias em quadrinhos. Por esse viés, temos o cartunista Lucas Ramos Alves, 64 mais conhecido por Tikinho, com dois livros famosos: Três Patetas Surdos e Surdo em Vitória. Já expôs seus trabalhos em vários espaços, como a Gibiteca, em Curitiba, e Bienal em Minas Gerais e está lançando, neste ano de 2019, o livro Os Dinossauros Sobrevivem. Três Patetas Surdos Fonte: http://www.emcartaz.net/literatura/tres-patetas-surdos/ 7.2 Teatro Todos conhecem uma expressão popular que diz: “o corpo fala”. Realmente, percebemos que por meio do corpo podem-se comunicar muitas coisas. Essa máxima é válida para todos, então para os surdos, com sua forma de comunicação peculiar, a frase é ainda mais significativa. Fundada em 2003, a Cia. Arte e Silêncio iniciou seu trabalho desenvolvendo pesquisas sobre a arte e cultura surda. Utilizam técnicas de mímica junto à língua de sinais, para abordarem assuntos referentes à inclusão de surdos e suas particularidades de vida. Sob o comando dos irmãos Rimar Romano Segala e Sueli Ramalho, apresentam-se em instituições educacionais, empresas e eventos, promovendo o respeito às diferenças. A companhia também tem um canal no Youtube com esquetes variadas. Mídias Assita alguns vídeos da Cia Arte e Silêncio pelo seu canal no Youtube, pelo link: https://www.youtube.com/playlist?list=PL3DB52722ACAE5F88 65 7.3 Cinema e Vídeo A chamada sétima arte, o cinema, também nos brinda com várias produções que trazem como tema central a surdez. Os filmes envolvem assuntos diversificados, e, no melhor estilo Hollywood, sempre há conflitos, amores não correspondidos e drama. Dentre os mais populares títulos estão: Mídias E seu nome é Jonas (1979) Um menino surdo passa anos em uma instituição para crianças com deficiência intelectual, até que sua família descobre o engano e leva-o para casa. Na família ouvinte há grande dificuldade para aceitar a diferença e também para encontrar os caminhos de sua educação. Sua mãe, muito persistente, acaba conhecendo outros surdos e é apresentada a um mundo da língua de sinais e da cultura surda. O filme demarca claramente a visão divergente entre os métodos de ensino para surdos. Trailer disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ZqPA9g-YerE Mr. Holland – Adorável Professor (1995) Um músico decide tornar-se professor para aumentar sua renda, e, paralelamente, dedica-se a compor uma sinfonia. Passa por grandes dificuldades no trabalho e na família, pois o nascimento do filho exige maior atenção como provedor. Depois de trinta anos lecionando no mesmo colégio, há o momento da despedida. Uma cena importante do filme pode ser assistida em: https://www.youtube.com/watch?v=MJ384eYV70k A família Bélier (2014) Nascida em uma família de surdos, Paula, a única ouvinte, enfrenta as questões próprias da adolescência como problemas na escola, o primeiro amor e crises familiares. Apesar da idade, já tem grande responsabilidade, pois é quem administra a fazenda da família, além de ser intérprete entre o irmão e pais surdos com as outras pessoas da vizinhança. Porém, sua vida chega a uma encruzilhada, quando precisa decidir seguir seu sonho de vida, longe dafamília, ou permanecer em casa e deixar a oportunidade passar. Uma cena emocionante do filme pode ser acessada em: https://www.youtube.com/watch?v=MZLmpWV_T_E Switched at Birth – Trocadas no nascimento (2011) É uma série de televisão produzida pela emissora ABC Family, na qual duas adolescentes descobrem que foram trocadas na maternidade. Uma delas cresceu em uma família rica, junto com o irmão e os pais, e a outra, que ensurdeceu na infância, como consequência de Meningite, vive com a mãe em https://www.youtube.com/watch?v=ZqPA9g-YerE https://culturasurda.net/2016/03/25/mr-holland-adoravel-professor/ 66 um bairro pobre. Suas famílias resolvem, então, aproximar-se e conviverem juntas, mas muitas emoções as acompanham neste processo. Min e as Mãozinhas (2018) Desenho animado criado por Paulo Henrique dos Santos, que trabalha com animação há sete anos. Após ter tido dificuldade para se comunicar com uma pessoa surda, o autor decidiu criar um desenho usando a Libras, sendo que em cada episódio serão ensinados cinco sinais. Seu objetivo, além de divertir crianças surdas, é divulgar a língua de sinais entre as crianças ouvintes, aproveitando para ensiná-las sobre as diferenças e, consequentemente, ajudar para a eliminação do preconceito. O episódio piloto foi lançado no Youtube e está disponível no canal Min e as Mãozinhas, no link abaixo: https://www.youtube.com/channel/UCJtOTvG4EvBGkvtTVVv8Lpg Min e as Mãozinhas Fonte: https://www.portalecoera.com.br/setor-impacte-positivamente/lancado-o- primeiro-desenho-animado-em-libras/ 7.4 Entretenimento A surdez também vem ganhando espaço no entretenimento, principalmente fora do Brasil, em que há uma variedade de programas como caça talentos. Nyle DiMarco é um surdo americano, ator e modelo nascido em Nova Iorque, no ano de 1989. Sua família é praticamente toda de surdos. Formado em Matemática pela Universidade Gallaudet, foi vencedor do reality America’s Next Top Model, temporada 22, em 2015, obtendo muito sucesso com o público e também com os grandes nomes de moda, estampando campanhas para grifes como Giorgio Armani e Dolce & Gabbana. Em 2016, Nyle venceu outra competição da televisão americana, o Dancing with the Stars, sendo o primeiro surdo a vencer esse programa. Anos antes, a atriz surda Marlee Matlin também havia participado. Ele dançou ritmos como cha-cha-cha, tango, samba, quickstep, paso doble e outros. 67 Nyle DiMarco Fonte: https://twitter.com/nyledimarco/status/636700135846715392 Outro momento muito emocionante da televisão americana aconteceu em 2017, no programa America’s Got Talent, com a apresentação de Mandy Harvey, uma cantora de 29 anos, que perdeu a audição aos 18. Contra todas as tendências, Mandy canta de forma brilhante e afinada, levando a plateia e jurados ao delírio, chegando ao final da temporada e conquistando a quarta colocação no programa. Mídias Acompanhe a primeira apresentação de Mandy Harvey em: https://www.youtube.com/watch?v=3xALzrB4Sjs 7.5 Produção Científica No Brasil, com o avanço da escolarização dos surdos, muitos ingressaram no ensino superior, e, dessa forma, foi possível termos acesso a documentos sobre fatos e estudos em relação à língua de sinais, à história da educação de surdos e assuntos pertinentes a essa comunidade. Assim, surgiram os novos pesquisadores surdos, que, após a graduação, avançaram seus estudos além da especialização, para o mestrado e doutorado. Obviamente, é de extrema importância a presença de surdos nas instituições de ensino superior, para garantir a diversidade no ensino, a efetivação da inclusão e uma educação de qualidade, por meio da valorização de suas produções e da relevância social que as acompanha, visto que, para a 68 comunidade surda, esses representantes significam avanços linguísticos, educacionais e socioculturais. A seguir, serão elencados grandes representantes da surdez nos meios acadêmicos brasileiros: Pós-Doutorado – total de 3: Marianne Rossi Stumpf – Educação com ênfase em Informática – Universidade Católica Portuguesa em Lisboa; Silvia Andreis Witkosky – Educação – Universidade Federal do Paraná; Gladis Teresinha T. Perlin – Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Doutorado – total de 21: Mariana de Lima Isaac L. Campos – Doutorado em Educação – Universidade Federal de São Carlos; Flaviane Reis – Doutorado em Educação – Universidade Federal de Uberlândia; Carolina Hessel – Doutorado em Educação – Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Janaina Pereira Claudio – Doutorado em Educação – Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Ana Regina de Souza e Campello – Doutorado em Educação – Universidade Federal de Santa Catarina; Gláucio Castro Junior – Doutorado em Linguística – Universidade de Brasília; Armando Nembri – Doutorado em Hist. das Ciências e das Téc. e Epistemologia – Universidade Federal do Rio de Janeiro; Cláudio H. Nunes Mourão – Doutorado em Estudos Culturais – Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Rodrigo Rosso Marques – Doutorado em Educação – Universidade Federal de Santa Catarina; André Ribeiro Reichert – Doutorado em Linguística Aplicada – Universidade do Vale do Rio dos Sinos. 69 E 127 surdos com Mestrado nas diferentes regiões do país, computados até o ano de 2018. Conclusão da aula 7 Nesta aula, você acompanhou todo o potencial do povo surdo nas mais diferentes áreas. Acredita-se que este conhecimento contribua para ampliar a percepção da capacidade, competência e participação ativa dos surdos na sociedade. Muitas vezes se fala em avanços, sucesso e representatividade, mas não se apresentam os resultados reais. Assim, aprofundando o tema da cultura surda e suas mais diversas formas de manifestação, abrem-se novas perspectivas de inclusão, por meio da mudança de paradigma, não com enfoque na falta de audição, mas, sim, nas expressões bem-sucedidas da surdez. Atividades de Aprendizagem Nesta aula foram citados alguns exemplos de filmes sobre a surdez, que marcaram época quando lançados e que contam com diferentes abordagens sobre o tema. Para esta atividade, selecione um dos filmes apresentados ou pesquise outros títulos, assista e faça um texto apontando os principais aspectos da surdez representados, bem como quais as contribuições do filme para sua formação acadêmica. Aula 8 – Relações familiares Apresentação da aula 8 Olá! Nesta aula, você terá a oportunidade de compreender como se dá a relação do surdo com a família, normalmente ouvinte e de que forma isso exerce papel fundamental na formação individual de cada um. Quais as barreiras enfrentadas, como pode se dar a referência linguística e qual a importância do convívio com outros surdos para a formação de uma identidade saudável são algumas das questões que serão abordadas. Se já é sabido que há uma cultura 70 surda, deve-se também ser entendido como é a influência da cultura geral e ouvinte no desenvolvimento dessa comunidade. 8.1 Memórias Ao analisarmos a história geral, podemos observar a rica quantidade de fontes para serem consultadas, que comprovam os acontecimentos passados. No que se refere à surdez, essas fontes são bem escassas, visto que não se têm muitos registros. Isso se deve ao fato de que a história cultural dos surdos foi narrada de geração em geração, não de forma escrita, mas sim, por meio da língua de sinais. Os surdos de antigamente colaboraram muito com a formação histórica, deixando depoimentos e testemunhos que foram reproduzidos no decorrer do tempo. Muitos fatos não puderam ser preservados em documentos, mas compõem a memória daqueles que a viveram. Por sorte, essa história sobreviveu a séculos, para que hoje possa ser conhecida e divulgada. Atualmente, os registros são feitos por meio da tecnologiaexistente, que grava em filmes e fotos todas as manifestações e acontecimentos da comunidade surda, que, além de fornecer o conhecimento, também permite a compreensão fiel do que se quis dizer. Tudo que é transmitido pela memória dos surdos pode ser comprovado pelos registros feitos por jornais, cartas, mensagens, filmes e fotos, sejam impressos ou virtuais. 8.2 A família – primeira parte da história A família é o primeiro meio social ao qual estamos ligados, desde o nascimento. É no convívio familiar que se começa a entender a si próprio, um ao outro, aprender, respeitar, partilhar, a ter disciplina e administrar conflitos. Tudo isso permanece conosco por toda vida como experiência, aprendizado e lembrança. A família é a referência de cada um. Pesquisas apontam que a maioria dos surdos é oriunda de famílias ouvintes. Sendo assim, como acontece essa referência? Como ocorrem as experiências e aprendizados, se há uma grande barreira na comunicação? É 71 certo também que poucas famílias de surdos conhecem e usam a Libras para a comunicação. Dessa forma, muda-se o curso da história. Para compreensão dessas questões, vamos seguir conhecendo como é a dinâmica familiar no cotidiano do surdo. 8.2.1 A descoberta A família que tem alguma criança com deficiência passa, via de regra, pelos mesmos processos, desde a descoberta até a aceitação da nova realidade. Assim, a família do surdo passa por etapas, até que se adapte e aceite a diferença do tão esperado filho. O primeiro grande sentimento da família é o choque, o luto. Ter que enfrentar que o bebê sonhado não é, naquele momento, o bebê real. Isso pode parecer forte, mas não tem nenhum caráter de julgamento. É uma constatação feita por pesquisadores que afirmam que, no momento da descoberta, a família passa por um período de buscar justificativas, visto que no espaço de tempo que envolve o anúncio da gravidez até a chegada do bebê, os pais fazem uma série de planos para o futuro do seu filho. No entanto, é preciso que a família encontre algum meio de refazer o seu plano inicial e permitir à criança que vem chegando ou que já está no convívio familiar, um lugar especial. Ao saber que o filho é surdo, para os pais, inicialmente, a sensação é de morte, não real, mas simbólica. É a morte dos planos, sonhos e projetos concebidos para essa criança. Isso pode acarretar duas situações distintas e que, da mesma forma, são prejudiciais; a superproteção dos pais em relação ao filho ou um afastamento emocional. Os pais veem um grande futuro na vida de seus filhos e, de repente, essas expectativas são rompidas por um diagnóstico. Enquanto é bebê, a mãe se disponibiliza a acolher as necessidades e demandas do filho, dar um sentido e significado às manifestações que ocorrem por meio do choro, principalmente. Porém, na medida em que o filho cresce, as demandas comunicativas começam a ser mais exigidas. Assim, o filho surdo tenta se comunicar, a família deseja entender, mas há efetivamente uma barreira. Devido à dificuldade, os pais começam a decidir pela criança, agir por ela, numa relação de pouco diálogo e muita imposição. Desse modo, a criança, embora convivendo com a família, fica impedida de 72 desenvolver-se plenamente, sem referência de identidade e, muitas vezes, sem convívio com pares surdos. Essa realidade é compartilhada por muitos surdos. Isso não significa que não haja amor e que a família não tente protegê-lo da melhor forma. Contudo, é preciso achar um equilíbrio para que a criança possa desenvolver-se em toda a sua plenitude. 8.2.2 A aceitação Esse processo se dá quando os pais e familiares buscam criar, estimular e potencializar as capacidades da criança. Até que isso se estabeleça na família, o surdo já esteve privado de muitas informações, pois não compartilha com os pais a mesma linguagem. A aceitação compreende o período em que se integram as necessidades do filho ao resto da vida e a família deve tentar promover um equilíbrio no sentido de estabilidade e harmonia, que envolva todos os membros. Reconhece-se que a diferença existe, mas esse fato não limita a vida, a integração e as demandas familiares. Para que haja uma boa formação dos surdos por parte da família, há a necessidade de participação efetiva dos pais, visto que o apoio da família constitui a base para a socialização do surdo, sua compreensão do mundo e o entendimento de suas especificidades. Assim, a forma como a pessoa surda é tratada em casa irá determinar a imagem que ela terá de si mesma e isso tem influência direta no processo de maturidade, autoimagem e estima. Há ainda, nas famílias, uma dicotomia nas relações que envolvem a comunicação. Em muitos casos, fica evidente o despreparo da maioria das famílias para lidarem com a surdez e apenas uma pequena parte das famílias tem interesse em aprender e usar a língua de sinais com o filho, acarretando em uma comunicação de baixa qualidade. 73 Vocabulário Dicotomia: divisão de algo em duas partes contrárias. Dois pontos de vista alternativos e divergentes. Ainda referente à comunicação, compreende-se que a família que se envolve na comunicação do surdo por meio dos sinais possibilita a ele a interação com o mundo e promove o convívio mais agradável e feliz. Porém, estudos mostram que a expectativa da família ouvinte é geralmente a de que seu filho possa usar a Língua de Sinais entre os surdos e a Língua Portuguesa na modalidade oral com os ouvintes. A fala possibilitaria a integração dos filhos no mundo dos ouvintes e os sinais, por outro lado, a melhor compreensão e o estabelecimento de relações sociais entre iguais. Hoje, os pais, ao tomarem conhecimento da surdez do filho, têm uma vasta fonte de informações, que podem mostrar caminhos para o desenvolvimento da comunicação, da escolha da escola e métodos de ensino para surdos e de procedimentos a serem tomados para viabilizar o quanto antes o acesso aos bens socioculturais por parte da criança. A mudança nos paradigmas familiares seguiu acompanhando o movimento surdo na busca de seus direitos e avançou, na medida em que a surdez e a língua de sinais foram sendo popularizadas. Importante Com a mudança na concepção de pessoa surda, passando a ter um enfoque sobre o seu potencial, sua diferença e sua capacidade, as famílias superaram possíveis resquícios do passado. O surdo deixou de ser um membro passivo, para assumir sua condição atuante na família. Para que seja possível a construção de uma identidade surda aos filhos de ouvintes, é essencial o convívio com outros surdos, para que, partilhando a experiência visual, possam apropriar-se de todas as formas de compreender o mundo, sendo, para eles, diferente da experiência auditiva. É essa diferença que separa a identidade surda da identidade ouvinte, mas que é imprescindível para o pleno desenvolvimento do surdo. 74 Além disso, participar da comunidade de surdos permitirá a identificação, despertará os mesmos interesses e pontos de vista, fazendo-o sentir-se pertencente e aceito, ciente do direito de circular e ter as mesmas oportunidades no mundo dos ouvintes, caracterizando-se pela única diferença preponderante, que é a de pertencer a uma minoria linguística. Os surdos mais velhos relatam que suas vidas mudaram de forma significativa a partir do momento em que a Libras passou a fazer parte de seu dia a dia. Muitos dos nascidos até a década de 1980 só vieram a ter liberdade de comunicação e fluência na Libras já adultos. Afirmam, também, que foi a partir do uso da Libras que evoluíram na leitura e escrita da língua portuguesa e isso se deu a partir do momento em que a família finalmente entendeu suas reais necessidades e passou a respeitá-las. 8.3 Pais surdos e filhos ouvintes Os filhos ouvintes de pais surdos, conhecidos pelo termoCoda (Children of Deaf Adults), possuem também uma peculiaridade cultural e linguística, pois pertencem à maioria ouvinte, mas também à minoria surda. O primeiro aspecto importante para esses indivíduos é o fato de viverem em um ambiente naturalmente bilíngue. Alguns estudos consideram que os Codas têm duas línguas maternas: a língua de sinais e a língua oral de seu país. Já outros estudos consideram que, para eles, a sua língua materna é a língua de sinais. Porém, todos concordam que as experiências de vida dessas crianças possibilitam um crescimento linguístico e cultural, que molda a sua identidade. Ainda hoje, pode-se observar, por parte de algumas pessoas, a falsa ideia de que pais surdos sejam incapazes de assumir o seu papel com autonomia e autoridade. Isso é comprovado pelo relato de vários familiares de surdos, que, muitas vezes, se posicionam afirmando que os filhos ouvintes assumem responsabilidades precocemente, passando a cuidar dos pais. Esse processo ocorre quase que inconscientemente, pois diante dessas duas realidades, o Coda transmite as informações sonoras ou falas de outras pessoas para seus pais surdos e também, em sentido inverso, estabelece a mediação de seus pais com os ouvintes. Devido a isso, se atribui aos Codas como sendo os primeiros intérpretes das línguas de sinais, já que desde o berço 75 ou da mais tenra idade, ao estarem em contato com as duas línguas distintas, tenham sido a ponte de comunicação entre surdos e ouvintes. Para os Codas, é muito importante também o convívio com outros familiares ouvintes, que possam ser a referência da língua oral, permitindo o desenvolvimento global da criança, para que esta cresça saudável linguística e emocionalmente. Estudos sobre os Codas apontam que eles manifestam uma série de reivindicações, para que seus pais considerem, pois a característica bilíngue não lhes é intencional e, assim, não os agrada assumir funções na família, principalmente de suprir as carências comunicativas de seus pais. São elas: a) não fazer do filho um intérprete; b) que não lhes seja dada responsabilidade além da ideal para a faixa etária; c) que respeitem a infância e fases da vida do filho; d) tenham orgulho de sua comunidade e sua língua, sem comparar com os ouvintes; e) que compartilhem valores e informações da cultura surda, mas respeitem a diversidade de possibilidades e a mescla à qual os Codas estão submetidos. Dessa forma, ser Coda é crescer em meio a essa diferença, é viver em um contexto visual e linguístico que não é vivenciado por crianças ouvintes, filhas de pais ouvintes. É, ao mesmo tempo, uma dádiva e um peso. O importante é compreender que ser intérprete pode ser uma opção profissional, mas não uma obrigação. Suas escolhas dependerão de muitas variantes, mas, com certeza, são influenciadas pela familiarização com a língua de sinais, com a cultura surda, com a constituição de sua identidade e, finalmente, de sua história de vida. Saiba mais O livro Tibi e Joca – uma história de dois mundos, de Cláudia Bisol conta a trajetória de vida de um menino surdo, Joca, desde o nascimento, em uma família ouvinte, até o descobrimento de sua identidade junto à comunidade surda, o que muda sua vida e de seu amigo Tibi. Conclusão da aula 8 Nesta aula verificou-se que a surdez desperta efeitos tanto no indivíduo como na sua família. A maneira de reagir diante dessa realidade é fundamental 76 para que os rumos das relações familiares sejam tranquilos e, apesar dos obstáculos, todos possam transpor as dificuldades e conviver em harmonia. O equilíbrio na busca e manutenção de relações sadias é um fator relevante, pois, tanto para os surdos se adaptarem ao mundo ouvinte, como para os ouvintes se adaptarem ao mundo dos surdos, são necessários: empatia, disponibilidade, compreensão, aceitação e respeito às diferenças. Atividade de Aprendizagem Como última atividade desta disciplina, realize uma entrevista com um surdo, verificando os pontos abordados na aula, como as dificuldades no âmbito familiar, as reações da família diante da pessoa surda, como é o relacionamento e quais as maiores lições que eles podem lhe dar como incentivo na busca de sua formação profissional. 77 Índice Remissivo A aceitação ................................................................................................ (Informações; dicotomia; linguagem) 72 A busca por direitos .................................................................................... (Associações; convivência; experiências) 44 A descoberta .............................................................................................. (Aceitação; amor; etapas) 71 A família – primeira parte da história .......................................................... (Aprendizado; cotidiano; família) 70 A importância das leis ................................................................................ (Ações; educação; integração) 36 A Libras diante de todos ............................................................................. (Desafios; efeitos; formação) 31 A origem dos Movimentos Surdos .............................................................. (Autonomia; comunidades; independência) 44 Antiguidade ................................................................................................ (Conceitos; direitos; discriminação) 08 Ao alcance das mãos ................................................................................. (Aceitação; diferenças; identidade) 25 Artefatos culturais dos surdos .................................................................... (Aprendizagem; diálogo; interação) 57 Artes Plásticas ........................................................................................... (Cores; formas; visão) 61 Avanços a partir de 1950 no mundo e no Brasil .......................................... (Experimentos; modelos; otologia) 19 Avanços Sociais e Tecnológicos ................................................................ (Acessibilidade; comunicação; mudanças) 22 Billy Saga – Brasil ...................................................................................... (Esculturas; lutas; união) 63 Brasil – Mobilizações a partir de 1990 ........................................................ (Igualdade; oportunidades; respeito) 48 Cinema e Vídeo ......................................................................................... (Filmes; produções; surdez) 65 Começo de conversa: conhecendo o passado ........................................... (História; processos; registros) 08 78 Comunidade e Cultura Surda ..................................................................... (Cultura; hábitos; ideias) 28 Congresso de Milão ................................................................................... (Evento; imposição; oralismo) 15 Conquistas legais da área da surdez .......................................................... (Conquistas; implicações; instrumentos) 40 Cultura Surda ............................................................................................. (Ação histórica; crescimento; desenvolvimento) 56 Cultura Surda ............................................................................................. (Artes; entretenimento; pesquisa) 60 Decreto 5.626/2005 ................................................................................... (Educação bilíngue; formação; magistério) 41 Difusão e oficialização da Libras ................................................................ (Ensino; formação; multiplicadores) 51 Ellen Mansfield – Estados Unidos .............................................................. (Imagens; mãos; olhos) 62Em frente: compreendendo o presente ...................................................... (Ideais; direitos; lutas) 16 Entretenimento .......................................................................................... (Caça talentos; programas; televisão) 66 Fases da história dos surdos ...................................................................... (Despertar; isolamento; revelação) 35 História crítica ............................................................................................ (Anseios; escola; protagonismo) 55 História cultural .......................................................................................... (Canal visual; hábitos; valores) 54 História cultural dos surdos ........................................................................ (Educação; registros; trajetória) 52 Historicismo ............................................................................................... (Colonizador; dominância; ouvintes) 53 Historicismo, história crítica e história cultural ............................................ (Integração; meios; pertencimento) 53 Idade Contemporânea ............................................................................... (Alfabeto manual; contribuições; otologia) 13 Idade Média e Idade Moderna .................................................................... (Diferenças; fala; gestos) 09 79 Jennifer Lescouët – França ........................................................................ (Fotografia; palavras; silêncio) 61 Lei 12.319/2010 ......................................................................................... (Interpretação; proficiência; tradução) 42 Lei da Libras – Lei 10.436/2002 ................................................................. (Comunidades; poder; respaldo) 40 Literatura surda .......................................................................................... (Cultura; histórias; tradições) 57 Lucas Ramon – Cartoon – Brasil ................................................................ (Cartunista; livros; narrativas) 63 Marcos históricos da surdez no Brasil ........................................................ (Desenvolvimento; fortalecimento; integração) 17 Memórias ................................................................................................... (Barreira; história; narrativas) 70 Movimentos Surdos – educação, sociedade e cidadania ........................... (Direitos; lutas; resistência) 44 Movimentos Surdos no Brasil ..................................................................... (Associações; confederações; federações) 46 Mudança de paradigma – religião x razão .................................................. (Avanços; mudança; pesquisa) 10 O desenvolvimento tecnológico ................................................................. (Acessibilidade; aplicativos; comunicação) 30 O Século da Prosperidade ......................................................................... (Evolução; filosofia; métodos) 12 Pais surdos e filhos ouvintes ...................................................................... (Autonomia; bilinguismo; Codas) 74 Políticas públicas e legislação para a Surdez ............................................. (Avanços; conquistas; reconhecimento) 34 Produção Científica .................................................................................... (Academia; instituições; valorização) 67 Protagonismo da Surdez ............................................................................ (Comunidade; cultura; identidade) 25 Registros Históricos ................................................................................... (Educação; história; presente) 08 Relações familiares .................................................................................... (Convívio; identidade; saúde) 69 80 Teatro ........................................................................................................ (Corpo; expressão; mímica) 64 Tempo de novas perspectivas ................................................................... (Crítica; participação popular; valorização) 25 81 Referências ASSIS SILVA, C. A. Cultura surda: agentes religiosos e a construção de uma identidade. São Paulo: Terceiro Nome, 2012. BARBOZA, Heloisa Helena e MELLO, Ana Cláudia P.Teixeira. 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