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LEGISLAÇÃO, EDUCAÇÃO E CULTURA SURDA Autoria: Marisa Fátima Padilha Giroletti 2ª Edição Indaial - 2020 UNIASSELVI-PÓS CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Carlos Fabiano Fistarol Ilana Gunilda Gerber Cavichioli Jóice Gadotti Consatti Norberto Siegel Julia dos Santos Ariana Monique Dalri Marcelo Bucci Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Copyright © UNIASSELVI 2020 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: G526l Giroletti, Marisa Fátima Padilha Legislação, educação e cultura surda. / Marisa Fátima Padilha Giroletti. – Indaial: UNIASSELVI, 2020. 128 p.; il. ISBN 978-85-7141-442-6 ISBN Digital 978-85-7141-443-3 1. Cultura surda. - Brasil. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. CDD 370 Sumário APRESENTAÇÃO ............................................................................5 CAPÍTULO 1 EDUCAÇÃO DE SURDOS ...............................................................7 CAPÍTULO 2 LEGISLAÇÃO .................................................................................43 CAPÍTULO 3 CULTURA SURDA ..........................................................................83 APRESENTAÇÃO Prezado acadêmico, iniciaremos nossos estudos sobre Legislação, Educação e Cultura Surda. No Capítulo 1, intitulado “Educação de surdos”, trataremos de toda a trajetória histórica educacional dos surdos ao longo dos anos, a qual fora sendo construída com muita influência e interferência de ouvintes, por outro lado, houve também muita luta e engajamento da comunidade surda para que houvesse as mudanças que hoje estamos vivendo. A educação dos sujeitos surdos não era formal e nem eram reconhecidos como pessoas merecedoras de instrução, assim como outras pessoas com deficiência, que por muitos anos continuaram no anonimato total. O Capítulo 1 apresenta uma rápida e curta trajetória educacional dos surdos: os abandonos completos, o surgimento de sistemas de ajuda por caridade e como, nos dias atuais, se implanta e se discute a Educação Bilíngue por todo o país. Apresentaremos também os quatro tipos de bilinguismo. Compreenderemos o contexto histórico-educacional dos surdos, o percurso social, as quedas e ascendências ocorridas e os processos formativos em cada filosofia vivida em todas as épocas. No Capítulo 2, entraremos no campo da Legislação, em que, de forma leve e bem clara, discutiremos sobre as Leis: a primeira Constituição, a Lei de Libras, de Acessibilidade (2000 a 2015) e o Decreto nº 5626, de dezembro de 2005. Como proposta, queremos fazer uma releitura da legislação brasileira, envolvendo não só a surdez e a Língua de Sinais, mas também os direitos das pessoas com outras deficiências, como a Lei da Acessibilidade (Lei n° 10.098, de dezembro de 2000), a qual veio revolucionar conceitos e direitos, estabelecendo normas gerais e os critérios básicos para promover a acessibilidade de todas as pessoas com deficiência, sendo uma lei que apresenta o direito de acessibilidade comunicacional. É comum não nos envolvermos em questões de legislação, ou negar a importância destas para que o direito educacional seja garantido, até porque, na maioria das vezes, somente a lei não garante que a inclusão e a acessibilidade aconteçam. Dois conceitos que serão estudados são o de “integração” e o de “inclusão”. Integração é estar no mesmo espaço sem qualquer compromisso maior com a aprendizagem e com o pensar no sujeito em si e suas especificidades na deficiência, todavia, na inclusão, os direitos estão voltados à inserção do aluno enquanto sujeito, visando à acessibilidade e à equidade. No Capítulo 3, estaremos voltados à pessoa surda, aos movimentos da comunidade surda, ao status da Língua, às características da cultura surda e ao envolvimento que se apresenta decorrendo deste contexto. Diferenciar cada elemento que envolve a pessoa surda, desde uma cultura própria e visual dos sujeitos surdos, nos faz crer que os ouvintes que não convivem com os surdos podem, muitas vezes, fazer prejulgamentos das atitudes e do jeito de ser surdo. Perceberemos que a Língua de Sinais adquiriu um status de Língua devido a muitas pesquisas, iniciadas em 1960 por Stokoe, o qual estudou por mais de 10 anos e fez a análise descritiva desta. Atualmente, a Língua Brasileira de Sinais, denominada como Libras, contribui para o desenvolvimento do surdo na aquisição do conhecimento, pois, assim, ele pode compreender o mundo que o cerca, tornando-se um indivíduo do processo. Ainda no Capítulo 3, apresentaremos conceitos voltados à cultura, à identidade e à comunidade surda, não estaremos reportando a surdez sob o olhar clínico e sim sob o olhar cultural e identitário do sujeito surdo. Convidamos você, acadêmico, que busca uma especialização, a se debruçar e compreender todos estes conceitos culturais, buscando a mudança de olhar, sair do clínico, da surdez, ver o surdo como um indivíduo capaz e pertencente a uma comunidade, a uma cultura e a uma Língua incluída neste mundo visual- espacial. CAPÍTULO 1 EDUCAÇÃO DE SURDOS A partir da perspectiva do saber-fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: Compreender o contexto histórico vivido pelo povo surdo desde a Idade Antiga até os tempos atuais. Relacionar fatos e acontecimentos na história sobre a educação dos surdos com o percurso atual perante a sociedade. Identifi car processos formativos ocorridos na educação dos surdos. Conhecer metodologias e estratégias usadas em cada fi losofi a direcionadas aos educandos surdos. 8 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA 9 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 1 CONTEXTUALIZAÇÃO Olá, prezado acadêmico. Buscaremos, neste primeiro capítulo, trazer de forma resumida a trajetória educacional da educação dos surdos, as fi losofi as educacionais pertinentes a cada época e as perspectivas e os retrocessos ocorridos com os surdos até os dias de hoje, em que se discute a Educação Bilíngue voltada a propiciar ambientes bilíngues. Faremos uma refl exão comentada sobre alguns pensadores, desde Aristóteles, Sócrates e Platão, trazendo o olhar clínico para cada tempo histórico, como a exemplo das curas que Jesus fazia quando a surdez era vista como uma doença, um defeito. Apresentaremos as fi losofi as educacionais, em que três se destacam: o oralismo, que permaneceu por mais de 100 anos massacrando os surdos, exigindo a igualdade do falar. Na sequência, a comunicação total, que vem mascarar o oralismo, pois no fundo, o que se quer é que o surdo oralize, porém, abre algumas brechas para que a comunicação comece a fl uir de forma mais espontânea. No estudo das fi losofi as, chegaremos aos estudos da Educação Bilíngue, que hoje é defendida e implantada aos poucos e algumas vezes ainda de forma distorcida, mas com muitos avanços no ensino da língua de sinais e no seu uso e fl uência entre surdos e comunidade. Dentro destas discussões, neste capítulo, apresentaremos o que os surdos esperam de uma educação de qualidade, que seja legitimado de fato o direito ao acesso a tudo através de sua Língua, mas, trazendo também, de forma superfi cial, os retrocessos, a abertura que traz o Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005, o teste da orelhinha, que de outra forma leva novamente à oralização através do implante coclear, que nem sempre dá certo e a criança volta a ouvir. No entanto, a discussão sobre a legislação ocorrerá no segundo capítulo, apresentaremos somente alguns retrocessos que poderão, de certaforma, afetar a aquisição da Língua de Sinais como L1. Esperamos que goste da forma como dissertaremos sobre o assunto, com o objetivo maior de trazer o contexto atual com base em acontecimentos passados. É importante, na sua especialização, conhecer e aprender para poder mudar seu olhar para a pessoa surda e para a língua de sinais e as metodologias usadas no decorrer desta trajetória. Bons estudos! 10 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA 2 EDUCAÇÃO DE SURDOS A educação dos surdos vem marcada por épocas difíceis, em que, no geral, se houvesse alguém com defi ciência, este não era nem visto e/ou considerado humano, muitos eram mortos no seu nascimento. Aos surdos existia o privilégio de não ser percebida a surdez no nascimento, os que cresciam surdos e, consequentemente, sem falar, acabavam sendo abandonados e sobreviviam nas ruas e becos, nos lugares longínquos, alguns, ainda mais tarde, nos palácios, eram companhias e serviçais de reis e rainhas. Veremos a seguir, de forma resumida, registros da trajetória histórico- educacional dos surdos. 2.1 BREVE TRAJETÓRIA HISTÓRICA DA EDUCAÇÃO DOS SURDOS Os surdos, durante os diversos períodos da história, foram colocados à margem do mundo econômico, social, cultural, educacional e político, sendo considerados como defi cientes e incapazes, desapropriados de seus direitos e da possibilidade de escolhas. A partir do fi nal do último século, houve mudanças signifi cativas na forma de compreender suas características, que afetaram as propostas educacionais oferecidas a eles. 2.1.1 IDADE ANTiGA Este tempo foi marcado pelo que fazia o povo espartano: eles matavam os bebês com alguma defi ciência logo após o nascimento. Indicamos o fi lme “300”, com a participação do ator brasileiro Rodrigo Santoro. Logo no início do fi lme, há uma cena em que as crianças, logo depois do nascimento, têm o corpo todo revistado, para ver se há ou não uma defi ciência, as que tinham eram mortas, assim como algumas meninas quando havia muitos nascimentos do sexo feminino. Assista ao fi lme “300”, disponível no Youtube: https:// www.youtube.com/watch?v=YUenw00UzWg. 11 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 Já no Egito e na Pérsia, os surdos eram vistos como enviados pelos deuses, esses povos acreditavam que eles mantinham uma comunicação em segredo com os deuses, não eram educados nem recebiam instrução, porém, eram respeitados como escolhidos por Deus. Nas passagens bíblicas, encontramos algumas citações que Jesus fez de cura, nas quais ele citou o termo “surdo-mudo”. O termo “surdo-mudo há muito tempo deixou de ser usado, visto que é um termo pejorativo. “Não amaldiçoarás ao surdo... mas terá temor do teu Deus. Eu sou o senhor” (Levítico 19:14). Encontramos também no Evangelho de Marcos 7,31-37, uma passagem em que Jesus faz um surdo voltar a ouvir, dizendo “Efatá”, que quer dizer “abra-te”, os ouvidos se abriram, a língua soltou e o homem começou a ouvir e a falar com difi culdade (BÍBLIA, 2008). Em Roma e na Grécia, os registros mostram que os surdos eram eliminados e/ou colocados para serviço escravo, muitos eram mortos, jogados nos rios e nos penhascos, pois representavam perigo, sendo amaldiçoados pelos deuses. Temos na história o grande fi lósofo Sócrates, em 500 a.C., o qual perguntou ao seu discípulo Hermógenes: “Suponha que nós não tenhamos voz ou língua, e queiramos indicar objetos um ao outro. Não deveríamos nós, como os “surdos- mudos”, fazer sinais com as mãos, a cabeça e o resto do corpo?” Hermógenes respondeu: “Como poderia ser de outra maneira, Sócrates?” (CRATYLUS DE PLATO, discípulo e cronista, 368 a.C.) (VELOSO; MAIA FILHO, 2009, p. 27). Outro fi lósofo, Aristóteles, em 384 a.C., também cita os surdos-mudos na história, o qual pensava que se não havia fala, não poderia haver pensamento e linguagem, dizendo: “[...] de todas as sensações, é a audição que contribuiu mais para a inteligência e o conhecimento [...] (STROBEL, 2009, p. 18), assim, eram seres sem razão e não poderiam receber ensinamento algum. 2.1.2 IDADE MÉDiA Na continuidade do processo de existência humana e educacional dos surdos, observa-se que, na Idade Média, há mudança de visão para com esses sujeitos, não 12 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA são mais mortos e eliminados, porém, continuam à mercê da sociedade, sem serem reconhecidos como pessoas humanas. Os surdos viviam sem reconhecimento de um ser pensante, de ideias e opiniões, assim, não tinham nenhum direito. Em termos sociais e políticos, os surdos continuavam sem direitos, a exemplo: “nesta época existiam leis que proibiam os surdos de receber heranças e de votar e enfi m, de todos os direitos como cidadãos”, conforme afi rma Strobel (2009, p. 19). Todos estes direitos eram negados aos surdos e às pessoas com defi ciências no geral, assim como às mulheres. Na Itália, na Idade Média, com um grupo de monges beneditinos, houve a inicialização de uma forma de comunicação com os surdos através do alfabeto, pois acreditavam ser uma forma de se comunicar com Deus. Os monges pretendiam fazer com que eles falassem e assim tivessem pensamentos, pois acreditavam que só através da fala seriam capazes de expressar a própria consciência humana. Sacks (2010) afi rma que no período anterior a 1750, as pessoas que possuíam surdez pré-linguística eram percebidas pela ótica da incapacidade de desenvolver a fala, pela impossibilidade de comunicação e pelas especifi cidades no processo de aprendizagem e desenvolvimento. O contato com outros surdos era pouco valorizado formalmente como estratégia de desenvolvimento, o que atualmente é reconhecido. A surdez pré- linguística caracteriza-se pela ocorrência da perda auditiva antes que a criança tenha desenvolvido a linguagem oral (GOLDFELD, 2001 apud LUCHESE, 2017, p. 14). Havia a visão que somente através da fala as pessoas com surdez seriam capazes de pensar, de se comunicar e assim se relacionar com Deus, num período difícil de existência para os surdos, os quais viviam sem língua alguma. 2.1.3 IDADE MoDErNA A Idade Moderna foi um período específi co da história do Ocidente, que se inicia no fi nal da Idade Média, em 1453 d.C. Embora os limites cronológicos sejam objetos de debate, a linha temporal desse período estende-se do fi nal do século XV até a Idade das Revoluções, no século XVIII; muitos historiadores assinalam o início próximo a 1500 d.C. Na Idade Moderna encontramos algumas referências que apresentam o início efetivo da investigação voltada à pessoa com surdez. Na trajetória histórica há registros que mostram o surgimento do alfabeto para a comunicação e a ideia de 13 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 oralização, bem como surgem algumas escolas para surdos, como veremos a seguir. Faremos o acompanhamento histórico desta trajetória marcada por muita indiferença, totalmente relacionada à igreja e ao surdo para a oralização, além da visão clínica mais acentuada em experiências desastrosas nas ciências. Veremos agora uma lista com alguns nomes relevantes da Idade Moderna e explicaremos brevemente sobre cada um. É importante conhecer como as pessoas surdas eram vistas, como eram estudadas e observadas. • Girolamo Cardano (1500 a 1780): além de fi lósofo, como a maioria dos estudiosos da época, era também médico, reconhecia que os surdos poderiam aprender e indicava o caminho da escrita para o processo. • Mechor Sánchez de Yebra (1526-1586): um monge franciscano que publicou o alfabeto manual no livro chamado “Refugion Infi rmorum”, que fora publicado anos após a sua morte. Ensinava a religião aos surdos- mudos e a pronúncia de algumas palavras. FIGURA 1 – O ALFABETO BIMANUAL FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Dactilologia#/media/Ficheiro:Bimanual_alphabet.jpg>. Acesso em: 23 ago. 2019. 14 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA Observa-se na fi gura que há o movimento em si da confi guração de mãoe o uso das duas mãos para formar uma letra. • Pedro Ponce de Leon (1520-1584): conhecido como o primeiro professor para surdos, fundou uma escola no Monastério de San Salvador, em Oña Burgos. Educava crianças surdas, fi lhos de pais ricos da nobreza, os quais pagavam o monge como tutor dos ensinamentos. Ensinava a escrever, usava gestos simples e o alfabeto bimanual, também há registros que foi com ele que iniciou uma língua de sinais, sendo de grande importância sua participação, pois fora ele que comprovou que os surdos aprendiam, porém, morreu sem deixar nada escrito, nada foi publicado por haver um entendimento que os métodos eram segredos. • Juan Pablo Bonet (1579-1623): iniciou seus ensinamentos tendo como base seu irmão surdo, com foco no ensino da fala, o qual, para a época, foi muito honrado pelo mérito. Não esquecendo que o uso do alfabeto era a principal estratégia de ensino, Bonet fez mudança no uso do alfabeto com uma mão, que antes era bimanual. Foi Bonet que publicou o primeiro livro sobre a educação de surdos, que apresentava seu método oral “Reduccion de las letras y arte para enseñar a hablar a los mudos”, no ano de 1620, em Madrid, Espanha. Bonet defendia também o ensino precoce do alfabeto manual aos surdos (LUCHESE, 2017). FIGURA 2 – ALFABETO MANUAL AOS SURDOS FONTE: Lane (1992, p. 55 apud LUCHESE, 2017, p. 19) 15 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 • John Bulwer (1644-1684): a compreensão que se tinha é que os sinais representassem as fi guras e/ou objetos, no caso seriam todos icônicos e que a língua de sinais seria igual em todo o mundo. Nas suas publicações, afi rmava que a língua de sinais poderia ensinar tanto quanto as línguas orais. • Johan Conrad Amman (1669-1724): era um médico suíço, atuava na profi ssão em Amsterdã, Holanda. Foi um dos primeiros a escrever sobre um método para ensinar os surdos e os que tivessem problemas com a fala. Publicou “Surdus loquens” em 1692, que mais tarde tornou- se a base para a educação, através do qual fora construído o modelo alemão de ensino aos surdos. Recorria ao uso do paladar para ensinar os sons das letras através dos movimentos dos lábios até fazê-los repetir distintamente as letras, sílabas e palavras. • Jacob Rodrigues Pereire (1715-1780): há muitos registros que Jacob teria sido o professor de sua irmã sob forma oral. A Academia Francesa de Ciências reconheceu o grande progresso alcançado por Pereire: “não tem nenhuma difi culdade em admitir que a arte de leitura labial com suas reconhecidas limitações [...] será de grande utilidade para os outros surdos-mudos da mesma classe, [...] assim como o alfabeto manual que o Pereire utiliza” (PERLIN; STROBEL, 2008, p. 22). • Samuel Heinicke (1729-1790): considerado o mais intenso e precursor do método alemão de oralização, em que todos tinham que aprender a falar, defendia a forma de o surdo aprender através da fala e pela fala. Assim, “em carta escrita à L’Épée, Heinicke narra: meus alunos são ensinados por meio de um processo fácil e lento de fala em sua língua pátria e língua estrangeira através da voz clara e com distintas entonações para habitações e compreensão” (PERLIN; STROBEL, 2008, p. 18). • Abade Charles Michel De L’Épée (1712-1789): considerado o pai da Língua de Sinais Francesa e praticamente do mundo todo e de todas as línguas surgidas depois de seus estudos e registros. Ensinava de forma gratuita, o que era difícil acontecer naqueles anos, pois quem tinha poder aquisitivo contratava um professor particular para atender seus fi lhos, sem esquecer ainda que o foco era o surdo falar para poder ter direito aos bens e à herança, para não fi car com a igreja. Assim, L’Épée observava nas ruas e nos becos, surdos peregrinos e abandonados, percebia que estes, entre si, se comunicavam com alguma forma de gestos e/ou mãos/corpo e se compreendiam. Assim, começou a conviver com eles e registrar os sinais que tinham fundamentos/signifi cados, usando estes sinais para ensinar e criar uma língua, que chamou de Língua Francesa de Sinais. L’Épée era fi lho de família muito rica e sempre foi muito estudioso, tanto que aos 17 anos se formou em Teologia, era pedagogo e logopedista (especialista na fala). Infl uenciado pelo pai, formou-se em 16 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA Direito e não seguiu a primeira formação para ser padre, outra formação foi em fi losofi a. Desde muito jovem, gostava de praticar o alfabeto manual e formar palavras e investia nos mais humildes para desenvolver seus métodos de ensino, por isso é reconhecido mundialmente como o “pai dos surdos/língua de sinais”. Um de seus maiores avanços na educação dos surdos fora o ensino de duas irmãs gêmeas, mais tarde ele fundou uma instituição para ensinar outras crianças carentes, fazia arrecadação de dinheiro e de alimentos para manter sua escola e atender aos menos favorecidos, os quais ele mesmo encontrava pelas ruas e becos e trazia para ensinar e dar comida. O professor L’Épée morreu na miséria e no frio de seu quarto para que as crianças tivessem luz e condições de sobrevivência. FIGURA 3 – IMAGEM DE L'ÉPÉE ENSINANDO A LÍNGUA FRANCESA FONTE: <https://brasil.elpais.com/brasil/2018/11/24/ cultura/1543042279_562860.html>. Acesso em: 18 ago. 2019. • Thomas Braidwood (1715-1806): foi o pioneiro na Inglaterra, abrindo uma escola para surdos, priorizava no seu método o signifi cado das palavras e como se pronunciava com leitura labial e expressão da face para decodifi car o que estava sendo dito. Muitos foram os precursores da educação de surdos, numa época marcada pela oralização e não valorização das pessoas com alguma defi ciência, sendo chamados de surdos-mudos no período da Idade Média e Moderna. Graças a 17 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 L’Épée, que observou os surdos e sua linguagem, deu-se início a língua de sinais, afi rmando que todos tinham uma linguagem e capacidade de aprendizagem. 2.1.3 IDADE CoNTEmPorÂNEA Destacaremos alguns nomes importantes até os dias atuais: • Jean Marc Gaspard Itard (1774-1838): um americano que propagava que os surdos poderiam ser treinados a ouvir e posteriormente a falar. Teve como base de estudos o garoto conhecido como “o garoto selvagem de Aveyron”. Ele afi rmava que a falta de socialização fazia com que os surdos tivessem um comportamento selvagem e sem aprendizagem da fala e do ouvir. Segundo Jean Marc: “será preciso admitir que os homens não são homens fora do ambiente social, visto que aquilo que consideramos ser próprio deles, como o riso ou o sorriso, jamais ilumina o rosto das crianças isoladas” (MALSON, 1988, p. 38). Assista ao fi lme “O garoto selvagem”, disponível neste endereço: https://vimeo.com/155385147. FIGURA 4 – IMAGEM DO FILME O GAROTO SELVAGEM FONTE: <http://12bnolimite.blogspot.com/2013/03/a-vida-de-uma- crianca-selvagem_14.html>. Acesso em: 20 ago. 2019. 18 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA • Thomas Hopkins Gallaudet (1787-1851): grande representante da comunidade surda para a época, o qual percebeu através de uma aluna que era surda e muda, a não socialização com os demais colegas em escola, onde era rejeitada. Tocado pela presença dessa aluna, começou a ensinar a menina pessoalmente, mais tarde, veio a fundar a “Gallaudet”, a qual é até os dias de hoje uma universidade respeitada e única no mundo todo, voltada aos ensinamentos somente para surdos. Leva seu sobrenome por ser o precursor nos Estados Unidos. Gallaudet procurava em todas as partes do mundo um método efi caz, porém, a maioria usava a oralização dos surdos. Foi na França que encontrou a metodologia que buscava, através do uso de sinais e gestos para fundar a escola. A primeira língua ofi cial de Gallaudet é a American Sign Language (ASL), a língua de sinais dos Estados Unidos (o inglês é a segunda). Ainda que se conceda prioridade aos estudantes surdos, a universidade admite, também, um pequeno númerode pessoas ouvintes a cada semestre. A estas se exige o domínio da ASL como requisito para permanecer na instituição. FIGURA 5 – UNIVERSIDADE GALLAUDET FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Universidade_Gallaudet#/media/ Ficheiro:Gallaudet_tower.jpg>. Acesso em: 24 ago. 2019. 19 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 • Louis Marie Laurent Clerc (1785-1869): fundou, com Gallaudet, uma escola para surdos na América seguindo o modelo francês, isto é, a profi ssionalização, a leitura, a escrita e a aritmética para os surdos, a maioria meninos. Clerc se tornou surdo com um ano de idade, após cair de uma cadeira no fogo, na lareira de sua casa, sofrendo uma queimadura grave e obtendo uma cicatriz permanente no lado direito da bochecha. Os pais de Clerc e os médicos acreditavam que a surdez e a mudez foram sequelas do acidente, nada que se comprove cientifi camente, uma suposição da época. • Alexander Melville Bell (1818-1905): Strobel (2009 apud LUCHESE, 2017, p. 35) salienta que Alexander Melville Bell, o pai do célebre inventor de telefone Alexander Graham Bell, começou seus estudos na Escola Superior de Edimburgo, sua cidade natal. Em seguida, passou por três universidades. Formado em Medicina, com o título de doutor Bell, abriu uma escola para diplomar instrutores de surdos-mudos, tornando-se, ele próprio, professor de fi siologia vocal. Realizava experiências de acústica, há registros de que sua esposa seria surda e ele investigava e tentava criar um aparelho que fi zesse os surdos ouvirem. O método de ensino era associar uma imagem/desenho ao som. Queria criar o que chamava de "fala visível". Era um conjunto de símbolos, cada qual representando a posição da boca na pronúncia das vogais e consoantes. Experimentou construir um instrumento capaz de receber um som e de desenhar uma fi gura que dependesse das características acústicas do som recebido, mas o aparelho não passou de um invento curioso. Graham Bell assistia a essas experiências realizadas pelo seu pai, levando depois para suas próprias vivências com os surdos-mudos. • Eduard Huet (1822-1882): chegamos no professor e diretor do INES – hoje Instituto Nacional dos Surdos, na época era Instituto dos Meninos Surdos do Brasil, fundado por Dom Pedro II, na cidade do Rio de Janeiro. Eduard Huet, que morava na França, foi convidado pelo Império a vir ao Brasil para estar à frente do Instituto, trazendo a Língua de Sinais Francesa e o modelo francês de profi ssionalização. O instituto nasce nesta concepção. Segundo pesquisas, o instituto começou a funcionar em 1856: […] escola para surdos começou a funcionar no Brasil em 1º de janeiro de 1856, junto ao Colégio M. de Vassimon, no modelo privado. Nessa data, Huet apresentou seu programa de ensino, organizado com as seguintes disciplinas: “Língua portuguesa, Aritmética, Geografi a e História do Brasil, Escrituração Mercantil, Linguagem Articulada (os que tivessem aptidão) e Doutrina Cristã” (ROCHA, 2008, p. 30 apud LUCHESE, 2017, p. 37). 20 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA A escola era destinada a meninos, livres, brancos e pobres, há poucos registros de meninas. Era um sistema de internato, a maioria vinha de muito longe, de todas as regiões do Brasil, trazendo a língua usada em cada região, que acabava se misturando à francesa, surgindo, assim, a língua de sinais brasileira. Huet, que era surdo e defensor da língua de sinais para o ensino de surdos, fi cou no Brasil, na direção da escola, até 1861. Nessa mesma época, o oralismo foi aprovado e regulamentado em todo o mundo como método de ensino aos surdos. Talvez esse tenha sido um dos motivos para Huet voltar com sua família para a França, tendo feito um trabalho com surdos no México. Traremos, ainda, no decorrer dos capítulos, nomes importantes de surdos e linguistas dedicados aos estudos nas línguas de sinais e na educação de surdos desde os anos 1960 até 2019, além da legislação e da cultura surda. Entraremos agora nas fi losofi as educacionais, para que possamos continuar compreendendo melhor toda a evolução e a trajetória histórica da educação dos surdos. 2.2 FILOSOFIAS EDUCACIONAIS NA EDUCAÇÃO DOS SURDOS Como já vimos com os precursores da educação de surdos, a oralização perdura por muito tempo como tentativa de ensino, porém, encontramos em pesquisas três grandes fi losofi as educacionais, que são o Oralismo, a Comunicação Total e o Bilinguismo. 2.2.1 FiLoSoFiA Do orALiSmo O oralismo sempre existiu e continua de certa forma nas entrelinhas do clínico e dos encaminhamentos dos implantes cocleares, porém, vivemos um período de mais de 100 anos de oralismo praticamente incutido em todas as concepções pedagógicas e declarado como medida fi losófi ca ofi cial no Congresso de Milão. O Congresso de Milão foi uma conferência internacional de educadores de surdos, (ouvintes) realizado no dia 6 de setembro de 1880, na cidade de Milão, Itália. Os registros mostram que havia representantes de vários países, sendo que os poucos surdos presentes foram impedidos de votar. Não houve, de fato, 21 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 uma discussão de qual seria a melhor metodologia para o ensino e sim que a oralização seria a melhor indicação. Assim, a língua de sinais era ofi cialmente proibida em todas as escolas e instituições existentes por todo o mundo. A surdez era vista como anormal, se os surdos oralizassem, fi cariam à altura das demais pessoas ouvintes normais. Os surdos com famílias de poderes aquisitivos maiores, conseguiam as terapias de falas e treinos com aparelhos, os surdos pobres viviam nas periferias de forma clandestina, sinalizando às escondidas com outros que mendigavam da mesma forma. Os surdos que frequentavam as escolas, poucas instruções educacionais recebiam, pois ocupavam todo o tempo com os treinamentos da fala e da oralização. Apesar da proibição e do tempo ofi cial do oralismo perdurar por mais de 100 anos, como já fora dito, era visível o declínio educacional dos surdos e a evasão total das escolas. No fi m do túnel surge uma luz, por volta de 1960, que é S tokoe, que estuda as línguas de sinais por mais de 10 anos e comprova que podem ser consideradas Línguas, pela sua estrutura gramatical própria, comparadas a outras línguas orais. Inicia uma nova fase, esta, por sua vez, duvidosa, sendo que há evidências do fracasso do oralismo na educação e mais as novas pesquisas que comprovam e dão status à língua de sinais pelo mundo. Veremos com mais detalhes as pesquisas de Stokoe sobre a gramática das línguas de sinais e suas pesquisas. 2.3 PERSPECTIVAS E RETROCESSOS COM O ORALISMO E A FILOSOFIA DA COMUNICAÇÃO TOTAL Com o fracasso do oralismo, havia uma corrente que foi surgindo com o processo da oralização, a comunicação total, que foi, de certa forma, uma admissão que a oralização teria sido uma tentativa que não deu certo. Como a maioria dos surdos nunca deixou de sinalizar, mesmo sendo proibido e às escondidas, além do fato de não ter atingido o objetivo principal, que era desenvolver a fala nas pessoas surdas, inicia uma abertura e valorização de uma fi losofi a/metodologia de comunicação total, na qual poderia usar sinais 22 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA (mais ainda não vista como uma língua própria), que poderia ser: gestos, língua de sinais, desenhos, escrita, fala, teatro e expressões. Mascarando a estratégia, havia a oralização, que nunca deixou de se fazer, porém, com menos pressão para que os surdos falassem. Freeman, Carbin e Boese (1999 apud LUCHESE, 2017, p. 127) trazem uma defi nição sobre a Comunicação Total: A Comunicação Total inclui todo o espectro dos modos linguísticos: gestos criados pelas crianças, língua de sinais, fala, leitura orofacial, alfabeto manual, leitura e escrita. A Comunicação Total incorpora o desenvolvimento de quaisquer restos de audição para a melhoriadas habilidades de fala ou de leitura orofacial, através de uso constante, por um longo período de tempo, de aparelhos auditivos individuais e/ou sistemas de alta fi delidade para amplifi cação em grupo. Na comunicação total, acreditavam que os gestos, os sinais, poderiam ser realizados como um bimodalismo e usadas as duas línguas ao mesmo tempo. Os estudos linguísticos das línguas de sinais iniciaram com Stokoe no ano de 1960. Em relatos de alguns professores que passaram pelo processo da fi losofi a da comunicação total, muitos colocaram que a língua de sinais era como um recurso pedagógico e não uma língua de instrução, isto é, muitos usavam um caderno de vocabulário em português, com desenhos, onomatopeias, sinais desenhados e a partir daí treinavam os vocabulários, com implantação de fonemas, leitura labial e pistas sinestésicas para leitura e reconhecimento das palavras. No entanto, as evidências entre os surdos era de que entre eles continuava a comunicação com língua de sinais, gestos e não oralizavam entre eles, porém, na comunicação total, não era proibido o uso de “gestos”, como era chamada a forma de comunicação que não fosse a oral. Por outro lado, não se tinha o entendimento ainda de que era uma Língua e que poderia ter a estrutura de Língua. Assim, na fi losofi a da comunicação total, não se descartava a possibilidade da oralização. Nessa refl exão sobre a comunicação total, Perlin e Strobel (2008 apud LUCHESE, 2017, p. 129) apresentam o seguinte: […] sobre esta modalidade mista, para elas e outros autores da área, o maior problema é a mistura das duas línguas, a língua portuguesa e a língua de sinais, resultando numa terceira modalidade, que é o ‘português sinalizado’, essa prática recebe também o nome de ‘bimodalismo’, que encoraja o uso inadequado da língua de sinais, já que tem a gramática diferente da língua portuguesa. 23 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 De certa forma, hoje encontramos muitos surdos e professores de surdos que vivenciaram a comunicação total e carregam traços na sua identidade, como falar e sinalizar ao mesmo tempo, sendo muito comum esta prática. Nem tudo fora ruim nessa fi losofi a, pois de certa forma, o incentivo à leitura labial ajudava os surdos no processo de alfabetização e estrutura das palavras na Língua Portuguesa. Também, a língua de sinais começou a ser aos poucos incluída nas estratégias de ensino, e mais tarde se tornou a língua de instrução, como veremos na fi losofi a do bilinguismo. Alguns exemplos de exercícios e atividades realizados na comunicação total no seu auge de aplicação. FIGURA 6 – QUADRO DE TREINO DAS VOGAIS FONTE: <http://www.scielo.br/img/revistas/ep/v44//1517-9702- ep-44-e179339-gf01.jpg>. Acesso em: 20 ago. 2019. 24 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA Nas escolas e consultórios de fonoaudiólogas, era comum ver os aparelhos de amplifi cação sonora e fones de ouvidos para os treinamentos de implantação de fonemas. Usavam batons na boca para destacar a articulação e assim fazer a leitura labial, também escreviam no espelho as vogais com as consoantes para leitura e oralização. Por muitos anos foram realizados esses exercícios, além de um caderno de vocabulário para estudar em casa a implantação de fonemas. Muitos surdos apresentavam progressos, outros não. Alguns que viveram essa época odeiam as fonoaudiólogas e os professores que realizavam tal prática. 2.4 FILOSOFIA DO BILINGUISMO – PROCESSOS E AMBIENTES BILÍNGUES Com as tentativas de oralização e comunicação total, o movimento pelo uso e a disseminação da língua de sinais cresce dos anos 1980 em diante em todo o mundo. No Brasil e em grandes centros há mais fl uência e compreensão da importância e do uso da língua de sinais. Em 1980, o Bilinguismo no Brasil começa a despontar, tendo como pressuposto básico de que surdo precisa ser bilíngue ou deve adquirir como língua materna a língua de sinais, sendo essa considerada a língua natural dos surdos, e como segunda língua, a língua ofi cial do seu país. Já no fi nal dos anos 1980, no Brasil, os surdos começaram a liderar o movimento de ofi cialização da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS (FESTA; OLIVEIRA, 2012, p. 7). As línguas de sinais são línguas naturais, que utilizam o canal viso- manual, criadas por comunidades surdas através de gerações. Essas línguas, sendo diferentes em cada comunidade, têm estruturas gramaticais próprias, independentemente das línguas orais dos países em que são utilizadas. Assim, o Bilinguismo vem enfatizar a língua de sinais como língua de instrução, que só se tornou real no Brasil a partir da aprovação. O Bilinguismo tem sido muito discutido na área da surdez devido à inclusão dos alunos surdos nas escolas regulares, assim como as políticas públicas desenvolvidas no Brasil nos últimos 10 anos. Lacerda (1998) defende que o Bilinguismo na área da surdez propõe um espaço efetivo para que a língua de sinais seja utilizada no trabalho educacional, propondo que sejam ensinadas duas línguas à criança surda: a língua de sinais, 25 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 por ser sua língua natural e a língua ofi cial do país (no caso do Brasil, a LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais e o Português). Nesse sentido, ao sinalizar, a criança poderá desenvolver sua competência e capacidade linguística em uma língua que lhe auxiliará na aprendizagem da segunda língua, tornando-se bilíngue (FESTA; OLIVEIRA, 2012, p. 2). O processo do bilinguismo está se implementando aqui no Brasil, há sim uma discussão muito grande por parte de pesquisadores e educadores da área da surdez, mas sua real consolidação está acontecendo aos poucos, havendo ainda uma luta por escolas bilíngues. A abordagem bilíngue parte do pressuposto que a educação para surdos acontece em duas línguas: L1 – Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) e L2 – Língua Portuguesa (a escrita obrigatória e oral possivelmente, já que nem todos os surdos têm a oportunidade de desenvolver a oralidade como segunda língua). Dessa maneira, o Bilinguismo é uma proposta de ensino usada por escolas que se propõem a tornar acessível à criança surda as duas línguas no contexto escolar. Atualmente, essa é uma das abordagens com grande repercussão no Brasil (STROBEL, 2009). Há um movimento muito acirrado por parte de pesquisadores surdos e da comunidade surda para que não haja a inclusão nas escolas, mas, sim, escolas bilíngues, onde surdos estudam com outros surdos e com professores também surdos. Com relação às escolas bilíngues, na Região Sul do Brasil, destaca-se o estado do Rio Grande do Sul como pioneiro com a escola Concórdia e mais tarde no Paraná, na capital Curitiba. Em Santa Catarina, porém, as mudanças começaram em torno dos anos 1990 e depois em 2003, com a proposta de educação de surdos, na qual incluía turmas de surdos em escolas polos, as quais funcionaram por pouco tempo, em torno de cinco anos. Após todos esses anos de luta e de retrocessos, em 1960, alguns historiadores e outros estudiosos perceberam que o método oralista não estava obtendo o resultado esperado, então foi criada a Comunicação Total. A publicação de Stokoe trouxe o status à Língua de Sinais, a transformação e o respeito, comprovando e a legitimando como língua, a qual apresentava uma sintaxe e gramática independentes, funcionais e poderosas como qualquer língua falada no mundo. É importante conhecer um pouco do que fez e se tornou William C. Stokoe, referência nas pesquisas sobre a linguística da língua de sinais no mundo. Um grande pesquisador e linguista foi o Dr. William C. Stokoe 26 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA (1919-2000), o qual pesquisou por mais de dez anos as línguas de sinais em comparação com as línguas orais. Seus estudos focaram a ASL – Língua de Sinais Americana, fazia suas pesquisas e trabalhava na Universidadede Gallaudet nos anos de 1955 a 1970, era professor e chefe do departamento de inglês, onde conseguiu publicar um livro: a “Estrutura da Língua de Sinais” e foi coautor de um dicionário da língua de sinais americana sobre princípios linguísticos, no ano de 1965 (GIROLETTI, 2017, p. 48). Suas pesquisas foram fundamentais para que as Línguas de Sinais se tornassem Línguas, as quais comprovaram que as Línguas de Sinais eram Línguas completas, com gramática própria e com o mesmo prestígio de uma Língua oral. A partir dessa publicação e comprovação, começa a mudar a visão sobre as Línguas de Sinais e se estruturar programas e leis para legalizar e reconhecer a Língua de Sinais de cada país. Veremos sobre a leis em outra unidade. Sobre o bilinguismo, podemos destacar que há o entendimento de que seja o uso e o envolvimento de duas Línguas. Na Educação de Surdos, seria a Língua de Sinais como L1 – Língua materna, no Brasil, a Libras, e a L2, o Português escrito e/ ou oral. O bilinguismo, segundo registros, teve início na França, Estados Unidos e Suécia. Um dos precursores dessa educação foi o abade L’Épée, que viveu na França, e em 1760 fundou uma escola pública para surdos, o Institut National de Juenes Sourds de Paris – INJS, sendo pioneiro nesse trabalho. Em pesquisa sobre a realidade da abordagem bilíngue na França, Stumpf (2006) relata suas observações sobre o ensino bilíngue em diferentes práticas educacionais em duas cidades francesas: Toulouse e Poitiers. O início do bilinguismo nos Estados Unidos está ligado à história da educação dos surdos na França, pois em 1816 o norte-americano Thomas Gallaudet visita o Instituto de surdos em Paris e conhece Laurent Clerc, professor surdo que fora aluno de L’Épée, aprendendo com ele como ensinar alunos surdos e a língua de sinais francesa (LSF). Então, Thomas convida Laurent para ir aos Estados Unidos a fi m de abrir escolas para surdos na América, visto não existir ainda esse tipo de trabalho por lá (GOLDFELD, 2002). A Suécia também participou do processo para a implantação do bilinguismo, pesquisas são realizadas na Suécia e Dinamarca na mesma época, em 1981. Essas pesquisas buscavam introduzir o enfoque bilíngue na educação do indivíduo surdo. O primeiro currículo bilíngue para as escolas de surdos foi introduzido na Suécia em 1983 (KOZLOWSKI, 1995). Na Suécia, a Língua de Sinais é realidade, 27 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 aprovada e ensinada desde a década de 1980. Como a história nos mostra em seus registros, assim como nos registros de muitos pesquisadores, o bilinguismo surge aos arredores do movimento para o oralismo e começa a respingar antes mesmo da aprovação no Congresso de Milão, porém, caminha lentamente no sistema educacional devido aos entraves sociais vigentes da época, entre eles, o oralismo, como mola principal na educação dos surdos. No Brasil, há poucas escolas para surdos onde o ensino é bilíngue, visto que no país, a proposta bilíngue praticamente não se efetivou. Temos alguns exemplos na cidade de São Paulo, visto que a prefeitura ainda mantém algumas escolas com o ensino para surdos e uma proposta bilíngue. Em Santa Catarina houve tentativas de uma política voltada a turmas com ensino em Libras, mas geografi camente não foi possível sua efetivação. Há algumas escolas no Rio Grande do Sul e outras em cidades do Distrito Federal, porém, não é possível afi rmar que a educação em nosso país é bilíngue para o ensino dos surdos. Para que o indivíduo surdo seja aceito como bilíngue, é preciso que ocorra primeiro a aceitação da Libras pela sociedade, que ainda não considera a língua de sinais como uma língua, e sim como “gestos” e “mímicas”, e por isso acabam por desconhecer sua estrutura linguística, bem como seus constituintes fonológicos, morfológicos e sintáticos. O bilinguismo possibilita ao surdo adquirir/aprender a língua que faz parte da comunidade surda. O trabalho bilíngue educacional respeita as particularidades da criança surda, estabelecendo suas capacidades como meio para essa criança realizar seu aprendizado. Segundo Goldfeld (1997), o bilinguismo baseia-se no fato de que o surdo deve ser bilíngue, adquirindo a língua materna, a Língua de Sinais, como Primeira Língua (L1) e como Segunda Língua (L2) a língua ofi cial escrita do país em que reside. Na fi losofi a bilíngue, o surdo assume a surdez e não necessariamente almeja uma vida de ouvinte. Um dos grandes benefícios do bilinguismo para o surdo é a oportunidade de utilizar concomitantemente os recursos das duas línguas adquiridas, mas é importante entendermos a ressalva de Góes (1999), ao referir-se à limitação da surdez para o aprendizado da língua oral. Perlin e Strobel (2008) explicam que o bilinguismo pode apresentar diferentes versões, sendo quatro as indicadas: o bilinguismo com aspecto tradicional, o bilinguismo com aspecto humanista liberal, o bilinguismo progressista e o 28 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA bilinguismo crítico na educação de surdos. Conceituando cada um desses bilinguismos, Perlin e Strobel (2008, p. 16- 17 apud GIROLETTI, 2017, p. 19, grifos nossos) nos apresentam as seguintes explicações: O bilinguismo com aspecto tradicional: apresenta uma visão colonialista sobre a surdez. Impera o ouvintismo e a identidade incompleta dos surdos. Os professores continuam com sua formação nos modelos da educação com ideias clínicas. Esse tipo de bilinguismo tende à globalização da cultura. O bilinguismo com aspecto humanista e liberal: considera a existência de uma igualdade natural entre ouvintes e surdos. A desigualdade, no entanto, mostra a existência de uma limitação de oportunidade social aos surdos. Isso se constitui numa pressão para aqueles que vivem a situação de desigualdade histórica e são forçados a alcançar uma certa igualdade. O bilinguismo progressista: tende a aproximar-se e a enfatizar a noção de diferença cultural que caracteriza a surdez, porém essencializa e ignora a história e a cultura. Assim, seriam surdos (com S maiúsculo), porém não comprometidos com seus aspectos políticos. O bilinguismo crítico na educação de surdos: sublinha o papel que ‘desempeña la lengua y las representaciones en la construcción de signifi cados y de identidades sordas’. Na realidade, esta modalidade tem seus pontos positivos e negativos, tem escolas que usam a língua de sinais como mediação com o oral e não como a produção cultural linguística, treinam o oralismo como sendo a primeira língua, usando o método tradicional, esforçando para adquirir os equipamentos tecnológicos que possibilitem mostrar a capacidade de o surdo aproximar-se a um modelo ouvinte e dizem que fazem trabalho bilíngue com os surdos, mas na prática não é feita corretamente. Como vimos nesses quatro tipos de bilinguismo, nenhum contempla de fato o que os surdos almejam para uma educação de qualidade e com respeito à cultura, identidade e língua. Assim, vimos que esses quatro conceitos de bilinguismo nos remetem à refl exão e a estudos de casos voltados à realidade local, em que se vê muito desse bilinguismo sendo trabalhado nas escolas e instituições. Estamos com certeza vivendo um processo que está sendo construído com o movimento surdo que se mobiliza em incansáveis lutas por seus direitos garantidos, quanto a escolas bilíngues e ao ensino em Libras. 29 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 2.4.1 PROCESSOS DE ENSINO E APRENDIZAGEM EM AMBIENTES BILÍNGUES Estamos discutindo processos de aquisição, ensino e aprendizagem, sendo que nas crianças ouvintes a exposição aos espaços que proporcionam a aquisição de uma Língua é mais comum e se dá de forma natural; as crianças surdas, na maioria, não estão expostas a ambientes bilíngues. A maioria das crianças nascidas e/ou que se tornam surdas na infância são fi lhas de pais ouvintes. Não ter acesso a locais onde a Língua de Sinais seja a L1, como associações, escolas,amigos e familiares fl uentes em Libras, acarreta o atraso na aquisição da linguagem e, consequentemente, de uma Língua. Entre os ouvintes, os pais geralmente procuram uma escola para que os fi lhos aprendam outra língua, os pais podem não saber o inglês, por exemplo, mais querem que seus fi lhos aprendam. Precisamos chamar a atenção para o que acontece com as crianças surdas. Faremos a seguinte análise: crianças surdas nascidas em famílias de ouvintes, em que naturalmente a língua será a falada, os pais não compreendem a língua de sinais, culturalmente, ensinarão a língua da família, que não é de sinais. Essas crianças não estarão expostas a um ambiente bilíngue, o que decorre é que elas não aprenderão nenhuma língua, ocorrendo atraso linguístico e, consequentemente, atraso na aprendizagem. Muitas pesquisas apontam que os surdos só terão atrasos na aprendizagem e no desenvolvimento se não estiverem em ambientes apropriados para a aquisição de sua língua desde o nascimento. Ainda bebês são vulneráveis aos adultos nesse processo, quanto mais cedo for inserida a língua de sinais melhores serão as conexões neurais na atividade cerebral. Assim, crianças surdas nascidas em ambientes com a língua de sinais terão outro desenvolvimento e não atrasos, comparadas a crianças ouvintes. Algumas teorias explicam esse fator determinante, demonstrando que crianças surdas não nascem menos ou mais inteligentes que crianças ouvintes, mas que estão desfavorecidas devido ao ambiente que não lhes proporciona o processo de aprendizagem desde o seu nascimento. Uma das teorias que explica o que expusemos anteriormente é a gerativista, vejamos: 30 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA De acordo com a teoria gerativa, os seres humanos são, então, dotados de uma capacidade inata para a linguagem, e possuem um conhecimento sobre o sistema linguístico, chamado de “competência”. Isso explica como uma criança, exposta a tão poucos dados no seu ambiente, consegue desenvolver um sistema tão complexo em tão pouco tempo (QUADROS; PERLIN, 2007, p. 28). As capacidades dos bebês surdos ou não são inatas para a linguagem, já comprovado em estudos e pesquisas, precisamos mudar algumas concepções colocadas pela sociedade que exclui e cria preconceitos, é preciso oferecer ambientes propícios à aprendizagem. Quadros e P erlin (2007) apontam para estágios/fases da criança no que se refere à aquisição da linguagem e da L1. “Os estágios da aquisição de linguagem são divididos em quatro: período pré-linguístico, estágio de uma palavra, estágio das primeiras combinações e estágio das múltiplas combinações” (GIROLETTI, 2017, p. 126). • Período pré-linguístico: a criança ouvinte também produz alguns gestos na fase inicial da comunicação. O período pré-linguístico compreende o período desde o nascimento até aproximadamente os 14 meses de idade. Quadros (1997) aponta que os bebês surdos apresentam dois tipos de balbucio: o silábico (oral) e a gesticulação (manual). A autora mostra que os bebês surdos, durante o estágio pré-linguístico, manifestam o balbucio silábico, ou seja, “combinações que fazem parte do sistema fonético da língua de sinais. [...] a gesticulação não apresenta organização interna” (QUADROS, 1997, p. 70). • Estágio de um sinal: este estágio abrange a criança surda desde os 12 meses até por volta dos dois anos. Essa idade é relativa, pois cada bebê se desenvolve de forma única, em especial, as mãos e o trato vocal. As crianças surdas com menos de um ano de idade, assim como as crianças ouvintes, apontam frequentemente para indicar objetos e pessoas; no entanto, quando a criança entra no estágio de um sinal, o uso do apontar desaparece. Petitto (1987, p. 51-52) sugere que “nesse período parece ocorrer uma reorganização básica em que a criança muda o conceito da apontação inicialmente gestual (pré-linguística) para visualizá-la como elemento do sistema gramatical da língua de sinais (linguístico)”. • Estágio das primeiras combinações: este estágio abarca as crianças surdas com aproximadamente dois anos de idade. As relações gramaticais são marcadas por meio de duas estratégias: a incorporação dos indicadores (que inclui a concordância verbal e a aquisição do sistema pronominal) e a ordem das palavras. Nesse período, “as crianças começam a usar o sistema pronominal, mas de forma inconsistente” (QUADROS, 1997, p. 31 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 72). É um período crítico para a aquisição de linguagem. Nesse estágio das primeiras combinações, cabe aqui destacar o trabalho de Lenneberg (1967), que defende a existência de um período crítico para a aquisição da linguagem, que é inata. Para o autor, o período crítico contempla o período da criança por volta dos dois anos e a acompanha até a puberdade. Esse período é chamado de crítico porque é considerado o mais propício/ adequado para a aquisição da linguagem. • Estágio de múltiplas combinações: por volta dos dois anos e meio e três anos ocorre o estágio de múltiplas combinações ou a explosão de vocabulário nas crianças surdas. Quadros (1997) explica que a partir desse estágio a criança começa a distinguir as derivações, usa formas idiossincráticas para discriminar nomes de verbos. Na utilização do sistema pronominal apresenta difi culdades em identifi car os pronomes de forma espacial, por isso utiliza como estratégia o substantivo não associado com o ponto no espaço. A partir dos três anos de idade começa a usar alguns pronomes com alguns erros ainda. Por exemplo, sinaliza banheiro, pedido de ir ao banheiro, não sinaliza “Eu” vou ao banheiro, sinaliza banheiro muitas vezes usando uma mão inteira ou três dedos sob a outra mão para identifi car o sinal de banheiro, é comum sinalizar e sair correndo em direção ao que se quer. Para observar os estágios de aquisição e desenvolvimento da L1 – Língua de Sinais – nas crianças surdas, é necessário que estejamos envolvidos no processo, sendo pais e familiares e/ou trabalhando com crianças surdas nas escolas com estimulação. Quadros (1997, p. 80) afi rma que: A Língua de Sinais é a língua natural da criança surda, fi lha de pais surdos, pelo fato de o processo de aquisição da língua ocorrer de forma natural como acontece com as crianças ouvintes na aquisição da língua oral, pela interação com o meio social. Já as crianças surdas, fi lhas de pais ouvintes não adquirem a L1 (Língua de Sinais) espontaneamente, pois os pais, ao se dirigirem ao fi lho surdo, usam algum de tipo de gesticulação para suprir a necessidade da criança surda. Para adquirir a L1, este segundo grupo precisaria conviver com seus pais. Sob forma natural se a língua for materna, isto é, desde o nascimento. Já adquirida se for ensinada à criança e não é o que geralmente acontece com crianças surdas fi lhas de pais ouvintes, é o que explica a teoria gerativista sobre a aquisição. O processo de aprendizagem de uma língua não está na incapacidade da criança surda, sendo que todos nascem com capacidade, mas aos surdos falta o input para aprender a língua oral, porém na de sinais falta a fl uência da família 32 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA ouvinte, na qual geralmente a criança surda nasce. Foi a Teoria Gerativista que trouxe estas discussões para as pesquisas, que foram apresentadas pelo linguista Noam Chomsky, na década de 1950. O ano de 1957 foi considerado o nascimento da Linguística Gerativista, quando Chomsky publicou o livro “Estruturas sintáticas”. A teoria apresentada, inicialmente, foi uma resposta e recusa ao Behaviorismo, que caracterizava os indivíduos como tábuas rasas, afi rmando que não nasciam com capacidade para a linguagem. Para os behavioristas, a linguagem era adquirida apenas a partir da interação, assumindo caráter externo e social. O Gerativismo defende que a linguagem é uma capacidade inata – a capacidade do ser humano falar e entender uma língua se dá por um dispositivo inato, umacapacidade biológica (ORLANDI, 2011). A fala de uma criança não é mera repetição de algo que já foi dito, a criança é capaz de criar sentenças inéditas. O Gerativismo trabalha com dois princípios: a competência e o desempenho linguístico. A competência é considerada como a nossa habilidade e capacidade de produzir sentenças, é o saber que está em um módulo da nossa mente. O desempenho é defi nido como as escolhas que fazemos para nossa fala, o emprego concreto que o ser humano faz da sua língua. As crianças surdas devem ser expostas aos ambientes que lhes favoreçam a aprendizagem desde bebês, sinalizando tudo com ela, fazendo interações como se faz com o bebê ouvinte. As mães costumam conversar e contar o que está a sua volta, mesmo que os seus fi lhos não falem ainda, porém com os fi lhos surdos geralmente deixam de conversar, essas mães poderiam já sinalizar e fazer gestos, mostrar o que está acontecendo para o bebê. Os pais podem e devem expor e proporcionar aos fi lhos surdos ambientes que eles possam interagir, as crianças surdas devem participar das conversas em família, ter histórias contadas pelos familiares em Língua de Sinais, infelizmente não é o que vemos e encontramos na maioria das famílias. É importante estar sempre buscando mais informações, um jeito descontraído e interessante de aprender é assistindo fi lmes. Por isso indicamos este site: http://www.libras.com.br/fi lmes, que traz nomes de fi lmes para que você conheça e busque on-line. Sugerimos que assista ao fi lme: “E Seu nome é Jonas”, o qual mostra uma história baseada em fatos de uma família cujo o fi lho é surdo. Disponível no 33 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 YouTube em: https://www.youtube.com/watch?v=ezwoNRdKgEI. Aproveite, junte a família, os amigos, os profi ssionais da área da surdez e de Libras para assistir e discutir o fi lme. FIGURA 7 – IMAGEM DO MENINO DO FILME “E SEU NOME É JONAS” FONTE: <http://www.libras.com.br/fi lmes>. Acesso em: 28 ago. 2019. A seguir, traremos alguns depoimentos e relatos de famílias de crianças e jovens surdos. Nos depoimentos existe aceitação e não aceitação da Língua de Sinais e do fi lho com surdez. 2.4.2 DEPoimENTo DE mÃES DE SurDoS A FAVor Do BiLiNGuiSmo Relataremos três histórias de famílias de surdos sobre a possibilidade de ambientes bilíngues na família: 1ª família Casal de primos ouvintes e por consequência do grau de parentesco, tem 34 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA três fi lhos surdos, sendo duas meninas e um menino. Em relatos, a mãe expõe a difi culdade do primeiro diagnóstico. A primeira fi lha nasceu surda, mas só foi diagnosticada após os três anos de idade, quando já tinha a segunda fi lha com dois anos de idade, que também nasceu surda. Em comparação a outras crianças no desenvolvimento, principalmente da fala e da não resposta a ruídos através da audição, elas foram levadas ao médico, que encaminhou um exame BERA para as duas em outra cidade, longe daquela que residiam. Explicou que era uma época difícil para conseguir exames e para o atendimento. As fi lhas frequentaram durante dois anos as terapias de fala com a fonoaudióloga, mas depois não quiseram mais ir. Quando uma fi lha tinha quatro anos (hoje está com 21) e a outra tinha três anos (hoje está com 20), foi procurada por alguns professores de um atendimento educacional especializado que trabalhava com surdos, o qual funcionava três vezes por semana, chamado nos anos 1999 a 2001 de Sala de Recursos – SR. O ensino estava em mudança de fi losofi a, saindo da comunicação total e iniciando um ensino bilíngue. Em 2004, no estado de Santa Catarina, com a aprovação e o reconhecimento da Libras como Língua, com a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, houve uma proposta de ensino com formação de turmas para surdos, em que as fi lhas foram incluídas nestas turmas, as quais ingressaram um ano na Educação Infantil e mais um ano na alfabetização, com mais dois outros alunos surdos. A professora era bilíngue ouvinte e a prioridade de ensino era em Libras. Nesta fase, a mãe, com pouco conhecimento em Libras, aceitava o ensino bilíngue. As fi lhas eram muito tímidas e bravas, choravam muito, tinham atraso no desenvolvimento, chupavam bico e tomavam mamadeira, ainda não controlavam os esfíncteres, tinham pouco entendimento do contexto no qual estavam envolvidas. O projeto de turmas bilíngues nesse Estado e escola durou apenas dois anos. As fi lhas foram encaminhadas para uma turma com um segundo professor que sabia Libras, elas estudaram até o 3º ano em turma de ensino regular, mas junto havia uma outra aluna com síndrome de Down. Por motivos de trabalho do pai das meninas, a família mudou para uma cidade no Mato Grosso e lá não tinha nenhum programa e nem profi ssionais que compreendiam Libras, fi caram dois anos sem acesso aos conhecimentos na língua de sinais, o qual foi um retrocesso para elas. Voltando para Santa Catarina, retornaram ao 4º ano (com atrasos na Língua), porém desse período em diante até o 9º ano estudaram com acesso à língua 35 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 de sinais. Houve mudança na lei e veio o Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005, que acabou dando mais respaldo, sendo aprovado o professor bilíngue nos demais anos de estudos. No Ensino Médio, tinham professor intérprete, já dominavam Libras e assim concluíram a Educação Básica. Em Português também já escrevem bem e se esforçam para aprender a cada dia mais a segunda língua. O uso do celular e das tecnologias em geral contribuiu para que desse funcionalidade à Língua Portuguesa escrita, apesar de as meninas terem fi cado com atraso na aprendizagem e no desenvolvimento e isso também se direciona à segunda língua, o Português. Em 2009 nasceu o 3º fi lho surdo, agora um menino, demorou até o oitavo mês para fechar o diagnóstico de surdez. Quando as irmãs souberam, fi caram muito felizes e a mais velha assumiu o irmão, ensinando tudo em Libras. Mesmo com um encaminhamento para implante coclear, as irmãs não deixaram de dar continuidade ao procedimento em São Paulo. Com o nascimento do 3º fi lho surdo, a língua de sinais se tornou a primeira língua na família, nada mais era difícil, segundo relatos da mãe. Hoje a família tem mais cinco fi lhos, sendo os cinco ouvintes, o pai é falecido, a mãe educa e cuida de todos os oito fi lhos, a língua de sinais é a língua ofi cial da família, desde a irmã menor a todos na casa. A mãe relata que são muito felizes por serem assim e assumem o ambiente bilíngue, nada é falado e se tiver visitas ouvintes, tudo é interpretado em Libras, pois todos da casa são fl uentes em língua de sinais. O 3º fi lho surdo está com 10 anos, ela acredita que por ele ter nascido em um ambiente bilíngue, o processo de aprendizagem está ocorrendo de forma natural. 2ª família A narração da segunda família está relacionada ao processo de aceitação e das tentativas de fazer este fi lho surdo falar. Se vivemos um tempo da fi losofi a do oralismo declarada como a metodologia mais adequada, hoje vivemos um processo de bilinguismo, porém, sob muitas facetas, uma delas é o implante coclear. Não entraremos na questão de clínicas de implante coclear, mas vamos expor o que houve nesse contexto. Quando o fi lho estava com quatro anos de idade, já fl uente para a idade em Libras, a família fez o implante coclear e esse menino passou mais de oito anos sem contato com qualquer pessoa que pudesse usar a língua de sinais. 36 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA Com a proibição total do uso de sinais pela equipe clínica onde fez a cirurgia e fonoaudióloga que atendia na região, o surdo passa muitos anos revoltado, perdendo muito tempo de sua vida escolar. Após mais de oito anos afastado, ele retorna para a escola, onde há muitos surdos de todas as idades e aí eram nítidos a alegria e o brilho nos olhos no encontro com a língua de sinais. Neste períodohouve sim muitas barreiras impostas (pelos próprios pais) ao desejo pela fala, mas após esses dois anos de retorno, a língua de sinais tornou-se novamente uma L1. Atualmente, a mãe relata que o uso dos sinais veio dar signifi cado às palavras que eram soltas e desconectadas, a fala parece ser natural, a audição é em torno de 51%, por isso há compreensão e o uso das duas formas de comunicação. Nesse caso, o surdo envolvido aprendeu a Libras e melhorou a fala, isto é, tornou-se bilíngue, o qual continua a aprender, mas o uso da língua de sinais não é mais para somente aprender palavras, agora é a L1. Viver o bilinguismo é proporcionar um ambiente com possibilidades de superação do indivíduo por ele só, é deixar um legado para a história, porém, quando há radicalidade nas ações, em que somente um lado decide, há perdas que muitas vezes nem o tempo devolve. Voltaremos a discutir sobre o implante coclear, os prós e os contras e as visões de clínicos e de famílias que tiveram fi lhos implantados. No próximo capítulo, sobre legislação, voltaremos a falar sobre o teste da orelhinha no Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. 3ª família Relataremos uma história que está na pesquisa/paper das acadêmicas do Polo da Uniasselvi de Xaxim – SC, a qual relata a experiência vivida por um aluno surdo que fora descoberto tardiamente pela comunidade local e pela escola. Contaremos um pouco da trajetória desse aluno tanto na escola quanto na vida em comunidade e familiar. O aluno surdo é fi lho de pais humildes e nasceu na cidade de Irani no ano de 2000. A família não tinha conhecimento de sua defi ciência, ele passava os dias em casa em uma situação desconfortável até que a assistência social do município onde morava e reside até o momento ofereceu ajuda à família para incluir o menino na sociedade. Foi incluído na sociedade (APAE) com uma nova rotina (higiene, alimentação, comportamento etc.), com o tempo foi para o ensino regular, onde teve difi culdades na aprendizagem. 37 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 A partir do 5º ano do Ensino Fundamental teve seu diagnóstico de Defi ciência Auditiva e Mental Moderado, iniciando o ensino de libras e português. Muitos professores não acreditavam que ele pudesse vir a aprender, visto que, por muito tempo, fi cou isolado de tudo e de todos. “Os professores de hoje, portanto, precisam estar comprometidos e permanentemente engajados na busca, no aprimoramento, no autoacompanhamento e na análise de sua própria aprendizagem profi ssional” (HARGREAVES, 2004, p. 410-411). Sua comunicação era através de desenhos que não eram entendidos pelo professor, que buscou a família para auxiliar. A situação não era nada agradável para o aluno, que hoje conhece uma parte de Libras e de Português, se identifi ca com os colegas e a comunidade, anda sozinho na rua, prestando muita atenção em tudo a sua volta. A família praticamente o isolou em sua própria casa, vivia sozinho em um quarto, dentro de um caixote. Gritava muito e se debatia para expressar dor, tristeza e muita angústia por não poder se comunicar. Os pais foram denunciados por maus tratos, eles não tinham conhecimento de sua defi ciência, o menino passava os dias em casa em uma situação desconfortável até que a assistência social do município ofereceu ajuda à família. A história é conhecida em toda a região. Encaminhado para exames e avaliação também na escola especial, foi constatado grande atraso neuropsicomotor, o aluno pouco andava e tinha difi culdades motoras. Foi encaminhado para a escola regular numa turma de 3º ano devido a sua idade, com o objetivo maior de conviver com os demais colegas e ver pessoas, se alimentar, andar, enfi m, estar inserido em locais educacionais. A escola aceitou e abraçou a causa do aluno, visto que fora na escola seu primeiro contato com o mundo, conhecendo pessoas diferentes. Hoje o aluno concluiu o Ensino Médio e voltou a frequentar a APAE, já que no município pequeno onde mora, é a única opção para não fi car somente em casa. 1 Descreva sobre os quatro estágios de aquisição da linguagem. R.: ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 38 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ________________________. 2 Com o olhar voltado para os surdos, disserte sobre a Teoria Gerativista. R.: ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ __________________________________________________. 3 O Gerativismo trabalha com dois princípios: a competência e o desempenho linguístico. Explique cada um deles e os relacione com a aquisição de uma língua pelos surdos. R.: ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ _________________________________________________. 39 EDUCAÇÃO DE SURDOS Capítulo 1 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Nesse primeiro capítulo, trouxemos uma resumida história da educação dos surdos, foi realizada uma breve retrospectiva histórica desde a Antiguidade aos dias atuais sobre os principais pensadores e fi guras importantes, como os surdos eram vistos e compreendidos em cada época. Trouxemos as fi losofi as educacionais pelas quais os surdos foram submetidos, os mais de 100 anos de oralismo, a comunicação total e o processo de bilinguismo pelo qual estamos em implementação. Segundo o oralismo, “[…] o pensamento não podia se desenvolver sem a linguagem e a fala não se desenvolvia sem a audição: quem não ouvia, portanto, não falava e não pensava” (STREIECHEN, 2012, p. 13). Assim, eram vistos como sujeitos não pensantes e sem opinião própria. O oralismo foi sendo substituído pela comunicação total, que continuava com as terapias de fala, porém com menos pressão. “[...] a Comunicação Total não está em oposição à utilização da língua oral, mas apresenta-se como um sistema de comunicação complementar” (MARCHESI, 1995, p. 59). No bilinguismo está havendo uma retratação da pessoa surda como um sujeito dono de suas próprias escolhas e de seu destino. “O surdo não precisa almejar uma vida semelhante ao ouvinte, podendo assumir a sua surdez” (GOLDFELD, 1997, p. 138). Nessa fi losofi a, o surdo tem orgulho de ser surdo, a surdez não é mais um defeito, e sim, um jeito de ser de uma cultura e de uma Língua. Também relatamos acontecimentos reais, histórias de vidas com depoimentos de mães sobre o bilinguismo, como chegaram a um diagnóstico com atrasos na aprendizagem e desenvolvimento devido à privação social. No decorrer dos textosdo Capítulo 1, observamos os processos formativos ocorridos na educação dos surdos. Nos próximos capítulos, estudaremos na legislação as conquistas da comunidade surda quanto à Língua de Sinais. 40 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA REFERÊNCIAS BIALISTOK, E. Bilingualism in development: language, literacy, and cognition. New York: Cambridge University Press, 2001. BÍBLIA. Sagrada Bíblia Católica: Antigo e Novo Testamentos. Tradução: José Simão. São Paulo: Sociedade Bíblica de Aparecida, 2008. CAMERLENGO, V. Libras. [s.d.]. Disponível em: http://www.allcet.com.br/ LibrasAllcet.pdf. Acesso em: 23 ago. 2019. FERNANDES, S. 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O processo de aquisição de direitos, de integração e de inclusão das pessoas com defi ciências está voltado às leis que amparam e que de certa forma trazem a obrigatoriedade no cumprimento das matrículas, na acessibilidade e nas condições da frequência com qualidade na escola regular. Assim, neste capítulo, faremos a contextualização da legislação, realizando, dessa forma, uma releitura das leis dentro do âmbito educacional. Trataremos, dentro da legislação, dos conceitos de integração e inclusão, trazendo, assim, os direitos voltados à inserção do aluno enquanto sujeito, visando à acessibilidade e à equidade. Conheceremos a Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas e a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, que reconhece a Libras como uma língua nacional, sendo que a partir dessas houve decretos e desdobramentos que dão direitos aos cidadãos surdos, trazendo o conceito de sujeito e de usuário da língua de sinais e o português como segunda língua, de forma escrita ou oral. A discussão se dará desde as primeiras constituições até as atuais, nas leis que vieram assegurar os direitos das pessoas com defi ciência e a inserção da Língua de Sinais em todas as esferas da sociedade. 2 LEGISLAÇÃO A educação brasileira quase sempre seguiu alguns modelos vindos de outros países, mais precisamente da França e da Alemanha. Da concepção francesa, o foco na profi ssionalização, e da alemã, a formação humanística na Filosofi a, Ciências e Letras. 46 LEGiSLAÇÃo, EDuCAÇÃo E CuLTurA SurDA 2.1 A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA PARA A EDUCAÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA Nos Estados Unidos, o movimento pelos direitos das pessoas com defi ciência iniciou em 1962, em que foram criados centros de atendimento visando à autonomia e à independência. No Brasil, esse movimento refl etiu na Constituição de 1967, através da Emenda Constitucional nº 1/1969, que introduziu o uso do termo “defi ciente”. Alguns anos mais tarde, é feita a Emenda Constitucional nº 12/1978, como garantia de acesso aos espaços públicos, além de proibir os preconceitos e as discriminações para a pessoa com defi ciência. Mais tarde, o termo “defi ciente” foi alterado para “pessoa portadora de defi ciência”. A Emenda Constitucional nº 12, de 17
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