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DIREITO CONSTITUCIONAL 1 160SISTEMA TRIBUTÁRIO NAVCIONAL DIREITO CONSTITUCIONAL 2 SUMÁRIO 1. TEORIA DA CONSTITUIÇÃO .............................................................................................. 04 2. PODER CONSTITUINTE ...................................................................................................... 14 3. NACIONALIDADE E DIREITOS POLÍTICOS ......................................................................... 16 4. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ........................................................................... 41 5. ORGANIZAÇÃO DO ESTADO ............................................................................................. 54 6. PODER EXECUTIVO ........................................................................................................... 66 7. PODER LEGISLATIVO ......................................................................................................... 71 8. PROCESSO LEGISLATIVO ................................................................................................... 79 9. PODER JUDICIÁRIO ......................................................................................................... 124 10. FUNÇÕES ESSENCIAIS À JUSTIÇA .................................................................................. 149 11. DEFESA DO ESTADO E DAS INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS ........................................ 155 12. ORDEM ECONÔMICA .................................................................................................... 160 13. ORDEM SOCIAL ............................................................................................................. 170 14. DIREITO DE PROPRIEDADE ........................................................................................... 175 DIREITO CONSTITUCIONAL 3 DIREITO CONSTITUCIONAL 4 TEORIA DA CONSTITUIÇÃO CONSTITUCIONALISMO Com a intensificação dos movimentos políticos voltados à busca de limitações ao poder soberano, o Estado passou a ser estruturado em um sistema normativo fundamental. Os direitos humanos, tidos como fundamentais ao homem, passaram a ser assegurados, tais como alguns direitos políticos, como a participação popular nas políticas estatais, e outros, sociais, como a proteção do trabalho. Filósofos contratualistas como Locke, Rousseau e Kant, além de Montesquieu com seu Espíri- to das Leis, teorizaram limitações racionais ao absolutismo de então. Esses limites racionais ecoa- vam uma espécie de regramento fundamental continente de normas ligadas à separação de pode- res (Legislativo, Executivo e Judiciário), à proteção dos direitos fundamentais da pessoa humana e, inclusive, à possibilidade de destituição do governante em caso de descumprimento do contrato inicial que teria supremacia em relação a todas as outras regras. Dalmo de Abreu Dallari cita três objetivos que, conjugados, resultam o constitucionalismo ou o por ele denominado Estado de Direi- to: “a afirmação da supremacia do indivíduo, a necessidade de limitação do poder dos governantes e a crença quase religiosa nas virtudes da razão, apoiando a busca da racionalização do poder”.1 AFIRMAÇÃO DA SUPREMACIA DO INDIVÍDUO A supremacia do indivíduo pode ser analisada sob a ótica da própria fundamentação do que se entende por Estado Moderno desde o fim do absolutismo, ou seja, a vontade do indivíduo en- quanto parte de um povo, enquanto corresponsável pela legitimação do poder estatal, enquanto ator social ao qual se reconhece o poder de decidir acerca do futuro da nação em que habita. O vocábulo “democracia”, em seu significado original, cunhado na Grécia antiga, significa “governo do povo” (demos = povo + kratein = governo) que, na verdade, tinha por essência a parti- cipação dos governados no governo, o princípio da liberdade no sentido da autodeterminação polí- tica. Foi com esse sentido que a expressão se disseminou e chegou até os nossos dias, tendo sido adotada por quase toda a civilização ocidental. Norberto Bobbio entende a democracia como “uma das várias formas de governo, em particular aquelas em que o poder não está nas mãos de um só ou de poucos, mas de todos, ou melhor, da maior parte e como tal, se contrapondo às formas autocráticas, tais quais a monarquia e a oligarquia”. 2 Max Weber era cético quanto aos valores acrescentados na sociedade pela democracia e deixou isso claro ao afirmar que quaisquer mudanças técnicas que se promovam na forma de go- 1 DALLARI, Dalmo de Abreu. Teoria Geral do Estado. São Paulo: Saraiva, p. 168-173. 2 BOBBIO, Norberto. Liberalismo e Democracia. São Paulo: Brasiliense, 2000, p. 7. DIREITO CONSTITUCIONAL 5 verno em si mesmas não têm o condão de acarretar uma nação competente, nem feliz e, tampou- co, valorosa. Elas são apenas instrumentos para que determinado fim seja alcançado.3 Para Friedrich Muller, quando uma Constituição atribui todo poder ao povo, ela não formula esse enunciado com base na realidade. Na verdade, ela não fala sobre o poder do povo, mas atribui legitimidade através dele.4 A DEMOCRACIA GREGA A democracia – não como se a conhece na atualidade ocidental, mas como foi idealizada pe- los antigos – originou-se na Grécia, na Cidade-Estado de Atenas, onde o povo era chamado a se reunir para decidir sobre os assuntos de Estado como integrantes de um enorme parlamento, cuja casa legislativa era a Ágora, a praça pública. Essa forma de democracia passou a ser doutrinaria- mente conhecida como democracia direta, porque o povo, reunido em praça pública, discutia e decidia. A democracia grega assegurava a todos os cidadãos a igualdade perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, já que todos tinham o direito de falar nas assembleias públicas e debater todos os assuntos afetos à vida social e ao próprio governo do qual, dessa forma faziam parte. Porém, como escravos, mulheres e estrangeiros não detinham o direito de voto e o número de cidadãos era muito inferior à soma dessas categorias, a grande maioria da população ateniense ficava à margem das deliberações, o que, na prática, transformava a democracia grega numa aris- tocracia da classe dominante: a dos cidadãos. Segundo Paulo Bonavides: “A escura mancha que a crítica moderna viu na democracia dos antigos veio porém da presença da escravidão. A democracia, como direito de participação no ato criador da vontade política, era privilégio de ínfima minoria social de homens livres apoiados sobre a esmagadora maioria de homens escravos. De modo que os autores mais rigorosos as- severam que não houve na Grécia democracia verdadeira, mas aristocracia democrática, o que evidentemente constitui um paradoxo”. 5 A DEMOCRACIA MODERNA: SISTEMA REPRESENTATIVO A democracia representativa (indireta) derivou da dificuldade de se reunir o povo sempre que um assunto posto à decisão o reclamasse. Nesta modalidade de democracia, o povo continua a opinar, mas por intermédio de representantes eleitos periodicamente. Rousseau teceu ferrenhas críticas à democracia indireta. Afirmou que a democracia não pode ser representada e, ao se referir ao modelo então vigente na Inglaterra, disse: 3 WEBER, Max. Parlamento e governo na Alemanha reordenada. Petrópolis: Vozes, 1993, p. 27. 4 Povo, como salienta Friedrich Müller, não é um conceito unívoco e descritivo e, numa das acepções, pode ser considerado tão-somente como operacional à procura de determinado número de sujeitos para a atribuição de certas prerrogativas (MÜLLER, Friedrich. Quem é o povo? A questão fundamental da Democracia. São Paulo: Max Lemonad, 2003, p. 13-14). 5 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10 ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros,2003, p. 268. DIREITO CONSTITUCIONAL 6 “o povo inglês crê ser livre, mas está redondamente enganado, pois só o é durante a elei- ção dos membros do parlamento; assim que estes são eleitos, ele é escravo, não é na- da”. 6 Entretanto, apesar das críticas, Rousseau estava convencido de que uma verdadeira demo- cracia jamais existiu e “jamais existirá”, por demandar “um Estado muito pequeno em que seja fácil reunir o povo e onde cada cidadão possa conhecer facilmente todos os outros”; por pressupor “uma grande simplicidade de costumes”; por demandar “muita igualdade nas classes e nas fortunas”; e por exigir “pouco ou nenhum de luxo”. Com essas considerações, Rousseau concluiu que, se existis- se um povo de deuses, esse povo seria governado democraticamente. Contudo, “um governo tão perfeito não convém aos homens”.7 Sobre as críticas do desvirtuamento da democracia grega por essa forma de democracia mo- derna, Norberto Bobbio afirmou que, embora tenham transcorrido muitos séculos e apesar de to- das as discussões acerca da diversidade da democracia dos antigos com respeito à democracia dos modernos, seu significado descritivo não se alterou, ainda que tenha se alterado, o seu significado valorativo. O que se deve considerar como alterado, ao menos no julgamento dos que vêem como útil essa contraposição, não é o titular do poder político – que continua sendo o povo, entendido como o conjunto de cidadãos a quem cabe em última instância o direito de tomar decisões coleti- vas –, mas o modo, mais ou menos amplo, de exercer esse direito.8 José Afonso da Silva entende a democracia como um processo dialético que, a cada etapa de sua evolução, incorpora conteúdos novos, nunca se realizando em plenitude.9 Em razão de tantas divergências a respeito da democracia ideal, surgiu uma terceira modali- dade, chamada democracia semidireta, na qual convive predominantemente a maioria dos aspec- tos da democracia indireta com alguns da direta, pela inserção, no ordenamento jurídico dos Esta- dos que a adotam, de alguns mecanismos de participação direta do povo. É esse o modelo adotado pela Constituição Federal, ao inserir, no seio do exercício da soberania popular, institutos como o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular.10 LIMITAÇÃO DO PODER Para que o exercício do poder do Estado não se torne abusivo, ele tem de ser dividido e dis- tribuído, impedindo-se, assim, despotismo e opressão.11 Montesquieu entendia ser a liberdade política do cidadão resultado da “opinião que cada um tem de sua própria segurança” e, para que essa liberdade exista, é necessário que o governo seja exercido de forma que um cidadão não possa temer o outro. Afirmou que quando, numa mesma pessoa ou num mesmo grupo, os Poderes Legislativo e Executivo estão reunidos não existe liberda- de. Da mesma forma, inexistirá liberdade se o poder de julgar estiver atrelado ao Poder Legislativo ou ao Poder Executivo: a par do Legislativo exerceria poder arbitrário sobre a vida e a liberdade dos 6 ROUSSEAU, Jean-Jaques. O contrato social. Trad. Antônio de Pádua Danesi. 3 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 114. 7 ROUSSEAU, Jean-Jaques. O contrato social. Trad. Antônio de Pádua Danesi. 3 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 82-84. 8 BOBBIO, Norberto. Liberalismo e Democracia. São Paulo: Brasiliense, 2000, p. 31-32. 9 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2001, p.129. 10 Art. 14. “A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I – plebiscito; II – referendo; III – iniciativa popular.” 11 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Do Processo Legislativo. São Paulo: Saraiva, 1995, p.107. DIREITO CONSTITUCIONAL 7 cidadãos, “pois o juiz seria legislador”; junto ao Executivo, “o juiz poderia ter a força de um opres- sor”.12 Montesquieu foi enfático ao afirmar que se os três Poderes estivessem reunidos em um só homem, num mesmo corpo de príncipes ou de nobres, ou mesmo do povo, “tudo estaria perdido”, pois essa máxima concentração de poderes redundaria no despotismo, com a total abolição da liberdade política, conforme sucedia, à época, na Turquia, onde o sultão, tendo enfeixado em si os três poderes, converteu-se em um déspota atroz.13 O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES A teorização sobre a necessidade da tríade de poderes foi esboçada pela primeira vez por A- ristóteles, na obra A Política, detalhada, posteriormente, por John Locke, no Segundo Tratado do Governo Civil, que também reconheceu três funções distintas”.14 Todavia, segundo Paulo Bonavides, nem Aristóteles e nem Locke sugeriram independência ou separação dos poderes, o que somente ocorreu com Montesquieu, em O Espírito das Leis, “a quem devemos a divisão e distribuição clássicas, tornando-se princípio fundamental da organização política liberal e transformando-se em dogma pelo art. 16 da Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789”. 15 O princípio da separação dos poderes foi esquematizado na Europa Continental do Século XVIII como técnica refratária ao poder absoluto. Com a separação dos poderes retirava-se a possibi- lidade de os monarcas editarem leis e constituía-se um ramo autônomo de poder, dotado de parce- la de soberania porque fundamentado no discurso da participação popular, com a específica prer- rogativa de elaborar leis. Esse ramo de poder era o Parlamento, órgão representativo pelo qual governados poderiam exercer alguma colaboração nos atos de governo.16 A estruturação da limitação do poder do Estado só se tornou possível com a aplicação desse princípio, já que o Poder Executivo, antes absoluto e ilimitado, passa a ser exercido dentro de limi- tes estabelecidos pela Constituição. Aponta-se que na Europa, após a Revolução Francesa e a inauguração do conceito de Estado Moderno, o discurso da participação popular na direção dos destinos das nações atribuía mais legi- timidade ao Parlamento do que ao próprio Executivo. Difundiu-se a figura do Parlamento como a mais pura conformação do governo do povo, pelo povo e para o povo.17 Segundo Paulo Bonavides, “Todo o prestígio que o princípio da separação dos poderes auferiu na doutrina constitu- cional do liberalismo decorre da crença no seu emprego como garantia das liberdades 12 MONTESQUIEU. Charles de Seconcat, Baron de. O espírito das Leis. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p. 168. 13 MONTESQUIEU. Charles de Seconcat, Baron de. O espírito das Leis. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p. 168. 14 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 7 ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Atlas, 2000, p. 355. 15 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 7 ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Atlas, 2000, p. 355. 16 BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado. 4. ed. rev. ampl. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 265-266. 17 BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado. 4. ed. rev. ampl. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 266. DIREITO CONSTITUCIONAL 8 individuais ou mais precisamente como penhor dos recém-adquiridos direitos políticos da burguesia frente ao antigo poder das realezas absolutas”. 18 CRÍTICAS AO MODELO DE MONTESQUIEU Dalmo de Abreu Dallari apresenta algumas das principais críticas ao princípio da separação dos poderes de Montesquieu, afirmando que é meramente formalista, não tendo sido efetivamen- te praticado, que “jamais conseguiu assegurar a liberdade dos indivíduos ou o caráter democrático do Estado”, que “não raro, também o legislativo, dentro do sistema de separação dos poderes, não tem a mínima representatividade”.19 Para o autor: “A separação de poderes foi concebida num momento histórico em que se pretendia limi- tar o poder do Estado e reduzir ao mínimo sua atuação. Mas a evolução da sociedade criou exigênciasnovas, que atingiram profundamente o Estado. Este passou a ser cada vez mais solicitado a agir, ampliando sua esfera de atuação e intensificando sua partici- pação nas áreas tradicionais. Tudo isso impôs a necessidade de uma legislação muito mais numerosa e mais técnica, incompatível com os modelos da separação de pode- res”. 20 Ao desempenhar essas críticas, afirma ser necessário reconhecer que “o dogma está supera- do”, sendo necessária uma completa reorganização do Estado, “de modo a conciliar a necessidade de eficiência com os princípios democráticos”.21 Paulo Bonavides leciona que a separação dos poderes foi necessária num momento histórico no qual o poder pendia entre governantes, que recobravam prerrogativas absolutas, e o povo, que intentava dilatar sua esfera de mando e participação nos negócios públicos. No entanto, o Estado atual atraiu responsabilidades que o liberalismo jamais conheceu. Daí não haver espaço para a prá- tica de um princípio rigoroso de separação, que “decaiu de vigor e prestígio”, ainda presente “na doutrina e nas Constituições, mas amparado com raro proselitismo, constituindo um desses pontos mortos do pensamento político, incompatíveis com as formas mais adiantadas do progresso demo- crático contemporâneo, quando, erroneamente interpretado, conduz a uma separação extrema, rigorosa e absurda”.22 Afirma que “o princípio vale unicamente por técnica distributiva de funções distintas entre órgãos re- lativamente separados, nunca, porém, valerá em termos de incomunicabilidade, antes sim de íntima cooperação, harmonia e equilíbrio, sem nenhuma linha que marque sepa- ração absoluta ou intransponível”. 23 CONTROLE RECÍPROCO E INTERPENETRAÇÃO 18 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10. ed. rev. ampl. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 142. 19 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 185. 20 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 186. 21 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 187. 22 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política, op. cit, p. 146-147. 23 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10. ed. rev. ampl. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 146-147. DIREITO CONSTITUCIONAL 9 José Afonso da Silva afirma que, atualmente, o princípio da separação dos poderes não se configura mais com a rigidez que norteou a sua elaboração. Para ele, a ampliação das atividades do Estado contemporâneo impõe nova visão, admitindo-se outras formas de relacionamento entre o Legislativo e o Executivo e destes com o Judiciário; fala-se agora não mais em “separação de pode- res”, mas em “colaboração de poderes” no parlamentarismo e em “técnicas de interdependência orgânica” e “harmonia de poderes” no sistema presidencialista.24 Com efeito, no constitucionalismo moderno surgiram técnicas de controle com o nítido obje- tivo de correção do rigorismo de uma rígida separação de poderes, implantada pela doutrina libera- lista a partir de Montesquieu. As mais conhecidas e eficazes técnicas emergem da teoria de pesos e contrapesos. O emprego dessas técnicas resulta presença do Executivo no Legislativo por meio do veto e da mensagem e, segundo alguns, da delegação. Pelo veto, o Executivo dispõe da possibilidade de impedir resoluções legislativas e, por intermédio da mensagem, pode propor ou iniciar a lei, princi- palmente nos sistemas constitucionais que conferem ao Executivo toda a iniciativa em questões orçamentárias e financeiras; a presença do Executivo no Judiciário pode ocorrer pelo indulto (quando o Presidente da República modifica os efeitos de ato próprio desse poder) e pela nomea- ção de membros do Poder Judiciário.25 Ao alcance do Poder Legislativo são colocados mecanismos capazes de vincular tanto o Exe- cutivo quanto o Judiciário à dependência dos parlamentos. No tocante ao Executivo, institutos co- mo rejeição de veto, processo de impeachment, apreciação de tratados, aprovação de indicações do Chefe do Executivo para o desempenho de cargos relevantes na Administração Pública; com respeito ao Judiciário, o controle legislativo em distintos sistemas constitucionais, o Legislativo po- de determinar o número de membros desse Poder, limitar-lhe a jurisdição, bem como proceder a julgamentos políticos (tomando assim o lugar dos tribunais no desempenho de funções de caráter judiciário). O Judiciário também pode exercer atribuições fora do centro normal de sua competência quando, à maneira legislativa, estatui regras do seu próprio funcionamento ou, à maneira executi- va, organiza seu quadro de servidores. A faculdade de impedir manifesta-se no Judiciário, quando, frente ao Legislativo, decide so- bre a inconstitucionalidade de atos normativos ou quando, frente ao Executivo, profere decisão sobre a ilegitimidade de certas medidas administrativas. A CF/88 E O MECANISMO DE PESOS E CONTRAPESOS No caso brasileiro, ao lado da independência, propugnou-se a harmonia entre os três pode- res. Evidentemente que não bastaria a mera afirmação feita no artigo 2º, CF, para que os poderes, independentes, fossem exercidos de forma harmônica. Por esta razão foram previstos, de maneira fluida em grande parte do texto constitucional, diversos dispositivos capazes de balizar todo o me- canismo de pesos e contrapesos idealizado pela Assembleia Nacional Constituinte. 24 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 113-114. 25 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10. ed. rev. ampl. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 140-141. DIREITO CONSTITUCIONAL 10 O Presidente da República é julgado pelo Senado Federal nos crimes de responsabilidade (art. 52, I, CF), depois de aprovado o processo pela Câmara dos Deputados (art. 51, I, CF), funcio- nando como Presidente do procedimento o do Supremo Tribunal Federal (art. 52, parágrafo único, CF). O Presidente do Supremo Tribunal Federal, por sua vez e assim como todos os demais Minis- tros daquela corte é julgado, nos crimes de responsabilidade, pelo Senado Federal (art. 52, II, CF). Os Ministros do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores, o Procurador-Geral da República, o presidente e os diretores do banco Central somente são nomeados pelo Presidente da República após prévia aprovação pelo Senado Federal (art. 84, XIV, CF). O controle externo das finanças do Poder Executivo e do Poder Judiciário é realizado pelo Congresso Nacional, auxiliado pelo Tribunal de Contas da União (arts. 70 e 71, CF). O Presidente detém o poder de veto a projeto de lei ordinária se o considerar inconstitucio- nal ou contrário ao interesse público (art. 66, § 1º, CF). Todavia ao Legislativo restou atribuída a possibilidade de, por voto secreto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão conjunta, providenciar à derrubada do veto (art. 66, § 4º, CF). Medidas provisórias são pas- síveis de edição pelo Presidente da República, que deverá submetê-las de imediato ao Congresso Nacional (art. 62, caput, CF). CONCEPÇÕES DE CONSTITUIÇÃO Tradicionalmente os manuais de Direito Constitucio- nal apontam três concepções acerca do que se deve ser entendido como Constituição: a sociológica, a política e a jurídica. A concepção sociológica é apresentada por Ferdi- nand Lassale, para quem a Constituição de um país expres- sa os vetores reais de poder nele dominantes e, em caso de eventual incongruência entre tais vetores e a Constitui- ção escrita, fatalmente o texto escrito cederia às pressões do poder e não passaria de uma folha de papel. 26 A concepção política é defendida por Carl Schmitt. Para ele a Constituição, como norma fun- damental de um Estado, somente poderia dispor a respeito de normas fundamentais, como a es- trutura do próprioEstado e o reconhecimento de direitos fundamentais. Assim, todas as demais normas que fugissem a esse estrito rol não seriam normas constitucionais, mas simples leis consti- tucionais.27 26 Lassalle, Ferdinand. ¿Qué es una Constitución? 11. ed. Trad. W. Roces. México, Ediciones Coyoacán, 2004. 27 Veja-se, adiante, a distinção entre regras materialmente constitucionais e normas formalmente constitucionais. DIREITO CONSTITUCIONAL 11 A concepção jurídica amolda-se ao discurso da supremacia das regras constitucionais. A Constituição ocupa o vértice da pirâmide hierárquica normativa e tem superioridade jurídica no tocante às demais leis e atos normativos.28 CLASSIFICAÇÃO DAS ESPÉCIES DE CONSTITUIÇÃO QUANTO AO CONTEÚDO Na verdade, esta classificação tem em foco as regras contidas na Constituição. Regras materialmente constitucionais seriam somente aquelas concernentes à ideia preco- nizada por Carl Schmitt: a de que a Constituição deveria dispor apenas sobre os aspectos funda- mentais de um Estado e os direitos e garantias individuais. Costuma-se citar como exemplo desta espécie a Constituição Norte Americana, embora as várias emendas subsequentes possam ter des- virtuado tal característica. Ao contrário, regras formalmente constitucionais seriam aquelas que poderiam perfeita- mente ter sido dispostas por intermédio do legislador ordinário. Exemplo interessante é o do art. 242, § 2º, CF, relacionado à manutenção do Colégio Dom Pedro II na órbita federal. QUANTO À FORMA Quanto à forma as Constituições podem ser escritas ou não escritas. No tocante às não escri- tas, não há um texto unificado: as regras resultam tanto de produção normativa esparsa quanto de entendimentos jurisprudenciais solidificados. QUANTO AO MODO DE ELABORAÇÃO As Constituições dogmáticas são aquelas elaboradas por um Poder Constituinte, seja ele legí- timo (Constituições promulgadas) ou ilegítimo (Constituições outorgadas). Dogma significa o ponto fundamental e indiscutível de qualquer doutrina ou sistema. “A expressão ‘dogmática’ vem de dogma, que se traduz em uma rede inquebrantável de conceitos. O positivismo jurídico marca o início da dogmática...”. 29 Já as Constituições históricas são as decorrentes de costumes, de práticas reiteradas por de- terminado povo. É de se notar que as Constituições não escritas, como a Inglesa, serão sempre históricas, ao passo que as escritas jamais deixarão de ser dogmáticas. QUANTO À ORIGEM As Constituições promulgadas, também chamadas de populares, democráticas e votadas, são as Constituições elaboradas de forma legítima por representantes do povo eleitos com a possi- 28 KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 6 ed. Trad. João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 2003. 29 BUSATO, Paulo César; HUAPAYA, Sandro Montes. Introdução ao Direito Penal. Fundamentos para um Sistema Penal Democrático. 1 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003, p. 06. DIREITO CONSTITUCIONAL 12 bilidade de exercer o Poder Constituinte Originário. No Brasil tivemos as seguintes: 1891, 1934, 1946 e 1988. As Constituições outorgadas são as impostas ao povo pelos detentores das reais fontes de poder na época (lembrar da concepção de Ferdinand Lassale), independentemente e até mesmo de forma contrária à vontade popular. Tivemos as seguintes: 1824, 1937, 1967 e 1969. Alexandre de Moraes cita, ainda, as Constituições cesaristas, que seriam aquelas que, a des- peito de outorgadas, dependeriam da ratificação popular mediante referendo.30 QUANTO À EXTENSÃO Há Constituições sintéticas, cujo clássico exemplo é a Constituição norte-americana pelo fato de dispor basicamente a respeito de normas fundamentais à organização do Estado e aos direitos e garantias individuais. Por outro lado, existem Constituições analíticas. É o caso da Constituição de 1988 que, ao “constitucionalizar” regras que poderiam ter sido objeto de simples leis ordinárias (normas for- malmente constitucionais), acabou por se tornar uma carta política prolixa e sujeita a fortes ten- dências reformadoras. Importante ressaltar que não há hierarquia entre normas materialmente e norma formalmente constitucionais. QUANTO À DOGMÁTICA. As Constituições influenciadas somente pela maior fonte de poder à época de sua elaboração são chamadas de ortodoxas. A antiga Constituição Soviética é um bom exemplo. Desaconselhável por não respeitar outras fontes ideológicas e, em razão disso, fadada a perder toda a força norma- tiva31 em caso de ruptura do poder anterior. As Constituições que buscam harmonizar todas as influências ideológicas existentes em uma nação em determinado momento histórico, como a Constituição de 1988, são denominadas ecléti- cas. QUANTO À ESTABILIDADE CONSTITUIÇÕES FLEXÍVEIS Nelas não há previsão alguma a respeito de eventual procedimento diferenciado para fins de alteração do texto constitucional. Para alterar o texto de tais Constituições bastaria um simples procedimento relativo às leis ordinárias, por exemplo. CONSTITUIÇÕES SEMIFLEXÍVEIS OU SEMIRRÍGIDAS As pertencentes a esta espécie contentar-se-iam com um procedimento diferenciado para fins de alteração de seus textos. Um exemplo capaz de distanciá-las das constituições flexíveis seria o seguinte: enquanto os textos das Constituições flexíveis poderiam ser alterados mediante proce- 30 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 7 ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 37. 31 Hesse, Konrad. A Força Normativa da Constituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre, Sergio Antonio Fabris Editor, 1991. DIREITO CONSTITUCIONAL 13 dimento legislativo ordinário (votação da maioria simples em cada casa do Congresso Nacional), os referentes às Constituições semiflexíveis somente admitiriam alteração mediante o respeito a um procedimento um pouco mais dificultoso, como aquele previsto às leis complementares (maioria absoluta dos membros das casas legislativas). CONSTITUIÇÕES RÍGIDAS Aqui o procedimento a ser observado em qualquer proposta de alteração ao texto constitu- cional é mais dificultoso ainda, pois, como no caso da CF/88, o art. 60 dispõe acerca do intrincado processo legislativo relativo às emendas à Constituição: votação em dois turnos em cada casa legis- lativa, aprovação por dois terços do total dos membros de cada casa. Ademais, não se pode olvidar que são poucos aqueles que detêm o poder de apresentar proposta de emenda à Constituição, como se pode ver no artigo 60 da Constituição Federal.32 CONSTITUIÇÕES SUPER-RÍGIDAS Alexandre de Moraes atribui à CF/88 a classificação de super-rígida porque, além de o proce- dimento a ser observado quando da pretensa alteração, há uma parte, segundo ele, imutável: o art. 60, § 4º. Entretanto, sem deixar de concordar com esta subespécie, devemos lembrar que as “cláusu- las pétreas” do art. 60, § 4º, não são imutáveis. O que essas normas, pertencentes ao que os ale- mães chamam de “núcleo duro” da Constituição, não podem é ser abolidas. Por isso, parte da dou- trina, ao se referir ao art. 60, § 4º, prefere a expressão “cláusulas de barreira”. CONSTITUIÇÕES IMUTÁVEIS Não podem ser reformadas sob qualquer pretexto. Diante de tal peculiaridade logo perdem sua imprescindível força normativa, pois, segundo Konrad Hesse, “as constituições não podem ser impostas aos homens tal como se enxertam rebentos em árvores. Se o tempo e a natureza não atu- aram previamente, é como se se pretendesse coser pétalas com linhas. O primeiro sol do meio-dia haveria de chamuscá-las”.33 Fácil perceber que a ruptura, em tais casos, mostra-se inevitável, pois uma Constituição deve retratar o presente com vistas a regular o futuro. 32Mais informações a respeito do procedimento na elaboração de Emendas à Constituição encontram-se no capítulo destinado à análise do Processo Legislativo. 33 Hesse, Konrad. A Força Normativa da Constituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre, Sergio Antonio Fabris Editor, 1991. DIREITO CONSTITUCIONAL 14 PODER CONSTITUINTE Poder constituinte é o poder de elaborar uma constituição, inaugurando uma nova ordem jurídico-constitucional. O poder constituinte originário traz consigo uma ideia de ruptura em face da ordem jurídica anterior. Essa ruptura, entretanto, não ignora os atos legislativos de um ordenamento anterior, por- quanto vai recepcionar os atos normativos antecedentes, desde que compatíveis com a nova Cons- tituição. Ao contrário, tudo o que se mostrar incompatível com as novas normas constitucionais será considerado não recepcionado e, em consequência, revogado. Em nosso sistema não se admi- te a inconstitucionalidade superveniente, ou seja, a norma anterior é considerada revogada e não inconstitucional. Titularidade do poder constituinte originário: a titularidade do poder constituinte é do po- vo, que o exerce, em regra, da forma representativa, através de representantes eleitos, que vão reunir-se em uma Assembleia Geral Constituinte. Também há formas de manifestação direta desse poder constituinte, como o plebiscito e o referendo. CARACTERÍSTICAS DO PODER CONSTITUINTE ORIGINÁRIO O poder constituinte originário possui as seguintes características: a) inicial: pois instaura uma nova ordem jurídica; b) autônomo: pois quem exerce o poder constituinte vai dispor sobre o novo ordenamen- to jurídico, estabelecendo a nova estrutura estatal e normas de regência; c) ilimitado: pois não lhe são impostas formas de manifestação; d) incondicionado: porquanto não há direito ou norma anterior lhe impondo limites ou restrições, embora limitado por valores sociais, econômicos e culturais. Em face dessas características, uma nova constituição não contém normas inconstitucionais. Se não há norma anterior lhe servindo de fundamento, um poder constituinte originário não pro- duz normas viciadas ou inconstitucionais. Desde já se alerte que as emendas constitucionais podem ser inconstitucionais, como adiante será demonstrado. O poder constituinte originário também será permanente, porquanto permanece apto a se manifestar quando assim entender seu titular, qual seja, o povo. PODER CONSTITUINTE REFORMADOR Também denominado de poder constituído, instituído ou de segundo grau, porquanto insti- tuído ou previsto pelo constituinte originário, que estabelece limites e condições para reforma da constituição, bem como aponta quem poderá revisar o texto constitucional. Em nossa atual Consti- DIREITO CONSTITUCIONAL 15 tuição, em face de sua rigidez, o processo legislativo de reforma constitucional se dá através das emendas constitucionais, disciplinadas no art. 60.34 O poder de reforma é, contudo, limitado por natureza, mostra várias ordens de limitações. As limitações processuais ou formais dizem respeito ao processo legislativo de reforma da Constituição. Por exemplo, a exigência de dois turnos de votação, maioria qualificada de 3/5 para aprovação, iniciativas legislativas especiais, proibição de ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa em que rejeitada ou tida por prejudicada. Por limitações circunstanciais entendem-se aquelas que impedem a reforma da Constituição na vigência de estado de sítio, estado de defesa ou intervenção federal. Limitações temporais ocorrem quando se impede a reforma constitucional durante um perí- odo de tempo. A atual Constituição não contém essa espécie de limite, porquanto pode ser altera- da a qualquer momento. Limitações materiais - determinadas matérias ou núcleos temáticos da Constituição – as cláusulas pétreas – que não admitem qualquer possibilidade de alteração. Impede que sejam obje- to de reforma as decisões políticas fundamentais do legislador constituinte originário, assim consi- deradas aquelas que dão identidade à Constituição. Exatamente por isso, veda-se qualquer emen- da, porquanto alterar essas matérias constitucionais será retirar sua própria identidade. Com essa imutabilidade preserva-se a identidade e a continuidade de um sistema constitucional. O art. 60, § 4º, CF, elenca como cláusulas pétreas a forma federativa de estado, o voto direto secreto, universal e periódico, a separação dos poderes e os direitos e garantias individuais. PODER CONSTITUINTE DERIVADO REVISOR Denomina-se de revisão constitucional o poder constituinte, também derivado do constitu- inte originário, que se manifesta de forma extraordinária e transitória. Difere da reforma constitu- cional que é via permanente de alteração da constituição. 34Da Emenda à Constituição Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal; II - do Presidente da República; III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros. § 1º A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio. § 2º A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros. § 3º A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem. § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais. § 5º A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa. DIREITO CONSTITUCIONAL 16 Exemplo disso é o art. 3º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que determina que a revisão constitucional será realizada após cinco anos, contados da promulgação da Constitui- ção, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral. PODER CONSTITUINTE DERIVADO DECORRENTE É a parcela de poder constituinte atribuída aos Estados-membros, permitindo-lhes dotar-se de uma constituição própria. Os Estados-membros e o Distrito Federal se auto-organizam através de constituições locais, no Distrito Federal denominada de Lei Orgânica. É também derivado, por- quanto estabelecido pelo legislador constituinte originário. Sua limitação está nos princípios da Constituição Federal. São os princípios constitucionais sensíveis, estabelecidos e extensíveis. Os princípios sensíveis encontram-se previstos no art. 34, VII35, CF, e sua inobservância per- mite a intervenção da União. Já os princípios estabelecidos designam normas de observância obri- gatória encontradas em todo o texto constitucional, que estabelecem preceitos de observância compulsória pelos Estados-membros. Por fim, os princípios extensíveis constituem normas que regulam determinadas matérias concernentes à União e que devem também (de forma extensiva) ser observadas pelos Estados. NACIONALIDADE E DIREITOS POLÍTICOS NACIONALIDADE Nacionalidade é o vínculo jurídico que se estabelece entre o indivíduo e determinado Estado, fazendo deste indivíduo um componente do povo, capacitando-o a exigir sua proteção e sujeitando-o ao cumprimento dos deveres impostos. Cada Estado diz livremente quem são os seus nacionais. Compete, pois, ao direito interno de cada Estado definir quem são seus nacionais. O conceito de estrangeiro, portanto, fica por exclusão: quemnão for considerado nacional de um país é considerado estrangeiro. 35Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para: *…+ VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais: a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático; b) direitos da pessoa humana; c) autonomia municipal; d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta. e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde. DIREITO CONSTITUCIONAL 17 A população de um país é formada por todas as pessoas que são juridicamente36 reconheci- das como nacionais (e, por isso, integram o povo desse país) e por todos os estrangeiros residen- tes.37 Segundo Francisco Rezek: “Nacionalidade é um vínculo político entre o Estado soberano e o indivíduo, que faz deste um membro da comunidade constitutiva da dimensão pessoal do Estado. Importante no âmbito do direito das gentes, esse vínculo político recebe, entretanto, uma disciplina ju- rídica de direito interno: a cada Estado incumbe legislar sobre sua própria nacionalidade, desde que respeitadas, no direito internacional, as regras gerais, assim como as regras particulares com que acaso tenha se comprometido.” 38 A Declaração Universal dos Direitos do Homem, em seu artigo 15, dispõe que o Estado não pode arbitrariamente privar o indivíduo de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de naciona- lidade. A nacionalidade, enquanto categoria jurídica, divide-se doutrinariamente em primária e se- cundária: “Nacionalidade primária, ou originária, é aquela que o indivíduo adquire por força do nascimento. Portanto, o vinculo jurídico estabelecido emana de uma atribuição unilateral do Estado, fazendo com que o indivíduo adquira a qualidade de nacional junto àquele, independentemente de sua vontade. Nacionalidade secundária, ou adquirida, diferente- mente, é aquela que provém de uma manifestação híbrida, ou seja, de um lado, o indiví- duo, apátrida ou estrangeiro, que solicita ou opta por essa nova nacionalidade e, de ou- tro, o Estado, que assente nessa escolha, formalizando a naturalização.” 39 Assim, para fazermos a correlação com o texto constitucional, a nacionalidade originária se- ria a dos brasileiros natos, enquanto que a nacionalidade secundária seria a dos brasileiros natura- lizados. BRASILEIROS NATOS De acordo com o artigo 12, inciso I da CF, são brasileiros natos: a) os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país. A regra geral adotada nesta alínea é de origem territorial (jus soli), pois o que importa para determinação da nacionalidade é o local, o território no qual se dá o nascimento, mesmo em se tratando de pais estrangeiros. 36 Celso Ribeiro Bastos leciona que “povo é o conjunto de pessoas que fazem parte de um Estado. Se o território é o elemento material do Estado, o povo é o seu substrato humano. Não pode, obviamente, haver Estado sem povo. O que determina se alguém faz ou não parte do povo de um Estado é o direito. Daí porque ser a nacionalidade um vínculo jurídico. É por ela que o Estado considera alguém como seu membro” (BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Teoria do Estado e Ciência Política. 2 ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 18). 37 ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 251. 38 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 170. 39 ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 252- 253. DIREITO CONSTITUCIONAL 18 Contudo, o próprio dispositivo acaba por acolher, com a utilização da expressão “desde que estes não estejam a serviço de seu país”, o critério sanguíneo (jus sanguinis), como exceção à re- gra.40 Assim, se qualquer um dos pais estrangeiros de uma pessoa que nasça no Brasil estiver a ser- viço de seu país, o que vale é a exceção á regra, ou seja: trata-se de estrangeiro. b) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil. Esta alínea “empalma o critério sanguíneo condicionado, pois, independentemente de qual- quer outro aspecto, atribui a nacionalidade originária àquele que, nascido em outro país, seja filho de pai ou de mãe brasileiros (ambos ou apenas um), sob a condição de que o genitor brasileiro lá esteja a serviço da República Federativa do Brasil”.41 A condição a que se referem Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior é domi- nada por Uadi Lamêgo Bulos como “critério funcional”, significando que “além do vínculo de san- gue é necessário que os pais brasileiros – sejam eles natos ou naturalizados – estejam cumprindo missão oficial em nome do Brasil”.42 Assim, por exemplo, o filho de um diplomata brasileiro que esteja acreditado no Japão é con- siderado brasileiro nato, ainda que lá ocorra o nascimento. c) os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam regis- trados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira. A EC nº 54/2007 alterou a redação original da alínea “c”, trazendo a possibilidade de o filho de pai ou mãe brasileira, quando nascido no estrangeiro e registrado em repartição brasileira com- petente, optar pela nacionalidade brasileira mesmo sem no Brasil fixar residência. A EC nº 54/2007 também alterou a redação original da alínea “c” no tocante ao momento em que se admite a opção pela nacionalidade brasileira. Com efeito, antes da alteração era comum o ajuizamento de demandas para opção de nacionalidade em nome quem ainda não havia atingido a maioridade. A EC 54/2007 nada mais fez, neste ponto, do que reconhecer jurisprudência pacífica no sentido de que opção somente poderia ser feita após a maioridade, forte no argumento de a opção consubstanciar-se direito personalíssimo e de natureza política.43 Assim, no caso dos nascidos no estrangeiro de pai ou mãe brasileira que não estão a serviço do país, são duas as possibilidades, sendo em, em ambas, deve-se aguardar a maioridade civil. A primeira decorre de registro em repartição brasileira competente e opção pela nacionalidade bra- 40 “A advertência contida na Segunda parte da alínea – ´desde que estes não estejam a serviço de seu país´- abriu campo para a adoção mitigada do critério jus sanguinis, ou seja, atribui-se ao indivíduo o status de nacional de acordo com a nacionalidade do genitor ou da genitora” (BULOS, Uadi Lamêgo. Constituição Federal anotada. 8 ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 478. 41 ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 255. 42 BULOS, Uadi Lamêgo. Constituição Federal anotada. 8 ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 479. 43 “A opção de nacionalidade é um direito personalíssimo e, como tal, só pode ser exercitado após o titular completar a maioridade” (Apelação Cível n° 97.04.21723-4/PR; Terceira Turma; Relator Juíza Luíza Dias Cassales. DJ 27-05-1998). DIREITO CONSTITUCIONAL 19 sileira. A se- gunda decorre de fixação de residência na República Federativa do Brasil e opção pela nacionalidade brasileira. Por se tratar de direito político, não se admite a representação na escolha da nacionalidade. Deve-se aguardar a maioridade para poder fazer a opção.Trata-se de ato personalíssimo. A competência jurisdicional para análise da pretensão de opção pela nacionalidade brasileira é da Justiça Federal de Primeiro Grau (CF, artigo 109, inciso I).44 Atendidos os pressupostos constitucionais para deferimento da pretensão (nascimento no estrangeiro + filho de pai ou mãe brasileira + residência no Brasil ou registro em repartição brasilei- ra competente + opção pela nacionalidade brasileira), ao Juiz Federal cabe simplesmente o reco- nhecimento da nacionalidade brasileira e, após o trânsito em julgado da sentença, a expedição de ofício ao Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais a fim de que a opção seja inscrita no Livro "E" daquele órgão (artigo 32, § 4.º da Lei nº 6.015/73). Portanto, o provimento jurisdicional, no caso da opção pela nacionalidade brasileira, é decla- ratório. Existem dois posicionamentos doutrinários a respeito da necessidade de se ingressar em juí- zo, após a maioridade, para se fazer a opção pela nacionalidade brasileira no caso de registro em repartição brasileira competente logo após o nascimento. Para Uadi Lamêgo Bulos “o sujeito pode vir a residir no Brasil a qualquer tempo, mesmo depois de completar 18 anos, que será tido, auto- maticamente, como nacional, sem a necessidade de chancela nacional”.45 Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior argumentam que “com o nascimento, lavrado o respectivo termo, este deve ser transcrito na repartição competente, servindo, pois, como opção provisória, a ser confirmada por ocasião da maioridade”.46 A nosso ver a opção pela nacionalidade, seja no caso de residência no país ou no caso de re- gistro em repartição brasileira competente, por se tratar de direito personalíssimo, deve ser exerci- do apenas pelo titular, após a maioridade. Assim, em ambos os casos, persistiria a necessidade de ação perante a Justiça Federal. Em ambas as situações da alínea “c” (registro em repartição brasileira competente e fixação de residência no Brasil), enquanto persistir a menoridade – e, consequentemente, a impossibilida- de de se optar pela nacionalidade brasileira –, a situação jurídica é diversa daquela relativa a quem já atingiu a maioridade. Segundo entendimento do STF: “A partir da maioridade, que a torna possível, a nacionalidade do filho brasileiro, nascido no estrangeiro, mas residente no País, fica sujeita à condição suspensiva da homologação judicial da opção. Esse condicionamento suspensivo, só vigora a partir da maioridade; antes, desde que residente no País, o menor - mediante o registro provisório previsto no art. 32, § 2º, da Lei dos Registros Públicos - se considera brasileiro nato, para todos os efeitos” (RE 415957. Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, DJ 16-09-2005). 44 CF, Art. 109. “Aos juízes federais compete processar e julgar: I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho”. Sob a ótica do STJ: “Na linha de precedente da Segunda Seção, a Justiça Federal é competente para apreciar "pedido de transcrição do termo de nascimento de menor nascida no estrangeiro, filha de mãe brasileira que não estava a serviço do Brasil” (Conflito de Competência 18.074-DF, Rel. Min. César Asfor Rocha, 2ª Seção, 10/09/1997). 45 BULOS, Uadi Lamêgo. Constituição Federal anotada. 8 ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 482. 46 ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 257. http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28re%2B418096%29&base=baseAcordaos DIREITO CONSTITUCIONAL 20 Portanto, durante todo o período da menoridade civil, o indivíduo é considerado brasileiro nato, desde que seja feito o registro provisório previsto no artigo 32, § 2º da Lei de Registros Públi- cos (Lei nº 6.015/73). A partir da maioridade, a nacionalidade permanece suspensa até que se im- plemente a condição da efetiva opção pela nacionalidade brasileira. BRASILEIROS NATURALIZADOS De acordo com o artigo 12, inciso II da CF, são brasileiros naturalizados: a) os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade mo- ral. b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a naciona- lidade brasileira. PROIBIÇÃO DE DISTINÇÃO A lei não pode estabelecer distinção entre brasileiros natos e naturalizados, salvo casos previs- tos na Constituição (CF, artigo 12, § 2º). CARGOS PRIVATIVOS DE BRASILEIROS NATOS Dentre as distinções que a CF prevê está a reserva de alguns cargos a brasileiros natos (CF, artigo 12, § 3º). São privativos de brasileiro nato os cargos: de Presidente e Vice-Presidente da Re- pública; de Presidente da Câmara dos Deputados; de Presidente do Senado Federal; de Ministro do Supremo Tri- bunal Federal; de carreira diplomática; de oficial das forças armadas e de Ministro de Estado da De- fesa. Observe-se que o naturalizado não está impedido de ser Ministro de Estado, Deputado Federal ou Senador (só não pode presidir nenhuma das Casas), Procurador Geral da República e de pertencer a qualquer nível do Ministério Público. Quanto à magistratura, só não pode integrar o Supremo Tribunal Federal. Nas Forças Armadas pode chegar a sargento. FUNÇÃO PRIVATIVA DE BRASILEIROS NATOS Outra distinção constitucionalmente prevista: o artigo 89, inciso VII da CF prevê a participação, no Conselho da República (órgão superior de consulta do Presidente da República), de seis cidadãos brasileiros natos, com mais de trinta e cinco anos de idade, sendo dois nomeados pelo Presidente da República, dois eleitos pelo Senado Federal e dois eleitos pela Câmara dos Deputados. EXTRADIÇÃO Nenhum brasileiro nato pode ser extraditado, ao passo que o naturalizado, em caso de crime comum praticado antes da naturalização ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de en- torpecentes e drogas afins pode ser submetido a processo de extradição (CF, art. 5º, inciso LI). DIREITO CONSTITUCIONAL 21 EMPRESAS JORNALÍSTICAS E DE RADIOFUSÃO Segundo o artigo 222, caput, CF, a propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens é privativa de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, ou de pes- soas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede no País. Como se percebe, embora haja certa diferenciação entre brasileiros natos e naturalizados, não se pode afirmar que a propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens esteja fora do alcance de brasileiros naturalizados. O artigo 222 da CF também faz distinção entre brasileiros natos e naturalizados. Contudo, é importante destacar que brasileiros naturalizados podem ser proprietários de tais empresas, bas- tando que tenham sido naturalizados há mais de dez anos. Note-se também que pessoas jurídicas podem ser proprietárias de empresa jornalística e de ra- diodifusão sonora e de sons e imagens, desde que implementem dois requisitos: sejam constituí- das sob as leis brasileiras e tenham sede no País. Seja como for, o § 1º do artigo 222 dispõe que, em qualquer caso (propriedade de brasileiro na- to, de brasileiro naturalizado ou de pessoa jurídica constituída sob as leis brasileiras e com sede no Brasil), pelo menos setenta por cento do capital total e do capital votante das empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens deverá pertencer, direta ou indiretamente, a brasileiros natos ou naturalizadoshá mais de dez anos, que exercerão obrigatoriamente a gestão das ativida- des e estabelecerão o conteúdo da programação. E o § 2º, por sua vez, prevê que a responsabilidade editorial e as atividades de seleção e direção da programação veiculada são privativas de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez a- nos, em qualquer meio de comunicação social. PERDA DA NACIONALIDADE O artigo 12, § 4º da CF arrola as duas hipóteses de perda da nacionalidade brasileira. A primeira está relacionada única e exclusivamente com o brasileiro naturalizado, porquanto decorre de cancelamento da naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional. A segunda é aplicável a brasileiros natos e naturalizados, sendo aplicável quando houver a aqui- sição de outra nacionalidade (regra geral), salvo em dois contextos (exceções). As exceções à regra de perda da nacionalidade brasileira quando da aquisição de outra nacio- nalidade acarretam a possibilidade jurídica da dupla nacionalidade e são as seguintes: a) Reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira. Trata-se de benefí- cio obtido pelo nacional brasileiro no exterior, situação comum em se tratando de brasilei- ros descen- dentes de italianos, pois a Itália toma por base o jus sanguinis para determinar a na- cionalidade. b) Imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em Estado es- DIREITO CONSTITUCIONAL 22 trangeiro, como condição para a permanência em seu território ou para o exercício de di- reitos civis. Quando o brasileiro, nato ou naturalizado, tiver de, para implementar condição de permanência no estrangeiro ou de exercício de direitos civis, naturalizar-se em país es- trangeiro, não há falar em perda da nacionalidade brasileira.47 As disposições constitucionais de perda da nacionalidade estão em consonância com o artigo 15 da Declaração Universal dos Direitos do Homem: “O Estado não pode arbitrariamente privar o indi- víduo de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade”. PORTUGUÊS EQUIPARADO Aos portugueses com residência permanente no País, se houver reciprocidade em favor de brasi- leiros, são atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro, salvo os casos previstos na Constituição (CF, artigo 12, § 4º). Os portugueses equiparados não perdem a condição de estrangeiros. Ele não são nem brasileiros natos, nem brasileiros naturalizados. Entretanto, o Constituinte Originário assegurou-lhes os mesmos direitos dos brasileiros naturalizados, desde que haja reciprocidade prevista na Constituição ou na legislação lusitanas. Assim, além de direitos civis, é possível a obtenção de direitos políticos. Para a obtenção da igualdade de direitos prevista no artigo 12, § 4º da CF, além da residência permanente no Brasil, é necessário já se ter atingido a maioridade civil e o pedido é feito ao Ministro da Justiça. APÁTRIDAS A Declaração Universal dos Direitos do Homem, em seu artigo 15, dispõe que “O Estado não po- de arbitrariamente privar o indivíduo de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalida- de”. Segundo José Francisco Rezek “esse duplo preceito sucede, no contexto do artigo, à afirmação de que todo indivíduo tem direito a uma nacionalidade – regra que recolhe unânime simpatia, mas que carece de eficácia garantida, por não ter um destinatário identificável”.48 Além da declaração do direito a nacionalidade e das proibições às arbitrárias privação da nacio- nalidade e do direito à mudança de nacionalidade (artigo 15 da Declaração Universal dos Direitos do Homem), aponta-se uma inovação prevista no artigo 20 da Convenção Americana sobre Direitos Hu- manos (Pacto de São José da Costa Rica): “Toda pessoa tem direito à nacionalidade do Estado em cujo território houver nascido, se não tiver direito a outra”.49 Assim, ao menos com relação aos Estados signatários do Pacto de São José da Costa Rica, mos- tra-se extremamente improvável a situação do apátrida, ou seja, do indivíduo que não é nacional de país algum. 47 “Para que acarrete a perda da nossa nacionalidade, a naturalização voluntária, no exterior, deve necessariamente envolver uma conduta ativa e específica” (REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 180). 48 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 172. 49 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 174-175. DIREITO CONSTITUCIONAL 23 DIREITOS POLÍTICOS SOBERANIA POPULAR Os direitos políticos constituem um desdobramento do princípio democrático inscrito no artigo 1º, parágrafo único da CF, que afirma todo o poder emanar do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente. Assim, os direitos políticos constituem-se num conjunto de regras disciplinadoras da atuação da soberania popular, permitindo ao cidadão o exercício concreto da liberdade de participação nos negócios políticos do Estado, de maneira a conferir os atributos da cidadania. De acordo com o artigo 14 da CF, a soberania popular é exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante plebiscito, referendo e iniciativa popular. SUFRÁGIO O direito de sufrágio é a essência do direito político, expressando-se pela capacidade de eleger e de ser eleito. Dessa forma, o direito de sufrágio se apresenta em duas grandes dimensões: o direito de votar e o direito de ser votado. As palavras sufrágio e voto têm sido, ao longo do tempo, utilizadas como sinônimas, quando, na verdade, não o são. A própria redação do artigo 14 da CF, ao dizer que o sufrágio é universal e o voto é direto, secreto e tem valor igual, confere-lhes significados diferentes. Sufrágio é direito público subjetivo de natureza política, que tem o cidadão de eleger, de ser eleito e de participar da organização e da atividade do poder estatal. No Brasil, por imposição da própria CF, o sufrágio é universal. Vale dizer: o direito de votar e ser votado é concedido a todos os nacionais, independentemente de fixação de condições de nascimento, econômicas, culturais ou outras características especiais. A existência, no direito brasileiro, de requisitos de forma, como necessidade de alistamento eleitoral e de fundo, como nacionalidade e idade mínima, não retiram a universalidade do sufrágio. Na democracia, o povo, com mais ou com menos requinte, governa-se a si mesmo e decide o seu destino. Faz-se representar, sendo o voto o instrumento da representação. O voto é, o instrumento da democracia formal, procedimental. O povo é a fonte de todo o poder, mas não é o poder. O povo vota em representantes, que são seus delegados e que agem em seu nome. Nas democracias o povo é a única fonte de poder, que o transmite, em eleições periódicas, aos seus representantes. O direito de sufrágio, no tocante ao direito de eleger, ou seja, a capacidade eleitoral ativa, é exercido por meio do direito do voto, que é o instrumento de exercício do direito de sufrágio. DIREITO CONSTITUCIONAL 24 O voto é direito público subjetivo, sem, contudo, deixar de ser uma função política e social de soberania popular na democracia representativa, mesmo porque, no Brasil, ele é obrigatório para maiores de 18 e menores de 70 anos de idade. Por disposição do artigo 7º da Lei n˚ 6.091/74, o eleitor que deixar de votar e não se justificar perante o Juiz Eleitoral até sessenta dias após a realização da eleição incorre na multa de três a dez por cento sobre o salário mínimo da região, imposta pelo Juiz Eleitoral e cobrada na forma prevista no artigo 367 da Lei n˚ 4.737, de 15 de julho de 1965. Pelo artigo 16 daquela mesma lei, o eleitor que deixar de votar por se encontrar ausentede seu domicílio eleitoral deverá justificar a falta, no prazo de 60 (sessenta) dias, por meio de requerimento dirigido ao Juiz Eleitoral de sua Zona de inscrição, que mandará anotar o fato na respectiva folha individual de votação. Estando no Exterior no dia em que se realizarem eleições, o eleitor terá o prazo de 30 (trinta) dias, a contar de sua volta ao País, para a justificação. No Brasil, entre 1891 e 1930 e de 1946 a 1964, a prática foi a da eleição direta, ou seja, a eleição de representantes pelo voto direto de cada eleitor. Depois de 1964, com o regime autoritário estabelecido, adotou-se a eleição indireta: somente por meio do voto dos membros do Poder Legislativo eram eleitos o Presidente da República o Vice-Presidente da República, os Governadores de Estados Federados e os respectivos Vice-Governadores. Foi com o advento da Emenda constitucional nº 15/1980 que se restabeleceu a eleição direta para Governadores e Vice-Governadores. Mais tarde, com a promulgação da Emenda Constitucional nº 25, já em 1985, restou novamente implantada a eleição direta para Presidente e Vice-Presidente da República. A eleição direta, assim como a indireta, convive bem em qualquer regime democrático, desde que, à toda evidência, assegure-se a liberdade do voto sem intimidação ou coação, sem a edição de um regime de exceção, que é a mutilação do Estado de Direito. O artigo 14, ora em comento, contém a expressão “voto direto e secreto”. Com isso, não houve recepção de parte do artigo 2.º do Código Eleitoral que, por ter sido editado em 1965, em pleno regime autoritário, permitia a eleição indireta. PLEBISCITO, REFERENDO E INICIATIVA POPULAR Além do voto direto e secreto, os incisos do artigo 14 da CF estatuem que a soberania popular também é também exercida por meio de plebiscito, de referendo e de iniciativa popular. Essa disposição constitucional é repetida pelo artigo 1º da Lei n˚ 9.709/98, que é a lei reguladora destas três dimensões do exercício da soberania popular no Brasil. Plebiscito e referendo são consultas formuladas ao povo para que delibere sobre matéria de acentuada relevância, de natureza constitucional, legislativa ou administrativa. O plebiscito é convocado com anterioridade a ato legislativo ou administrativo, cabendo ao povo, pelo voto, aprovar ou não o que lhe tenha sido submetido. DIREITO CONSTITUCIONAL 25 Convocado o plebiscito em relação a projeto legislativo ou medida administrativa, evidentemente ainda não efetivados, têm suas tramitações suspensas até a proclamação do resultado das urnas. O referendo é convocado em momento posterior a ato legislativo ou administrativo, cumprindo ao povo a respectiva ratificação ou rejeição. O referendo pode ser convocado no prazo de trinta dias, a contar da promulgação de lei ou adoção de medida administrativa que se relacione de maneira direta com a consulta popular (Lei n˚ 9.709/98). Nas questões de relevância nacional, de competência do Poder Legislativo ou do Poder Executivo, o plebiscito e o referendo são convocados mediante decreto legislativo, por proposta de, no mínimo, um terço dos membros que compõem qualquer uma das Casas do Congresso Nacional (artigo 3º da Lei n˚ 9.709/98). Qualquer assunto, desde que relevante e de interesse nacional, pode ser levado à consulta direta do povo, quer anteriormente ao ato, mediante plebiscito, quer posteriormente, por meio de referendo. Com respeito ao plebiscito, ele é obrigatório para decidir a respeito dos assuntos previstos nos §§ 3º e 4˚ do artigo 18 da CF.50 A iniciativa popular consiste na apresentação de projeto de lei à Câmara dos Deputados, subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles (CF, artigo 61, § 2˚). Tendo em vista tratar-se de projeto de lei elaborado por pessoas do povo, o artigo 13, § 2º da Lei n˚ 9.709/98 veda a rejeição de projeto de lei de iniciativa popular por vício de forma, cabendo à Câmara dos Deputados, por seu órgão competente, providenciar a correção de eventuais impropriedades de técnica legislativa ou de redação. PROCESSO ELEITORAL ALISTAMENTO ELEITORAL O alistamento antecede o voto, como um processo eleitoral afim ou secundário. O alistamento é realizado com a qualificação e a inscrição do eleitor. Por qualificação entende-se a prova de que o cidadão satisfaz às exigências legais para exercer o direito de voto. Por inscrição entende-se a inclusão do nome do eleitor qualificado no rol dos eleitores. 50 CF, Art. 18. “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição. § 3º - Os Estados podem incorporar-se entre si, subdividir-se ou desmembrar-se para se anexarem a outros, ou formarem novos Estados ou Territórios Federais, mediante aprovação da população diretamente interessada, através de plebiscito, e do Congresso Nacional, por lei complementar. § 4º A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios, far-se-ão por lei estadual, dentro do período determinado por Lei Complementar Federal, e depen- derão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei.” DIREITO CONSTITUCIONAL 26 Assim, o alistamento é um processo eleitoral que consiste na composição da identidade, da idade, da filiação, da nacionalidade, do estado civil, da profissão e da residência do eleitor, habilitando-o à inclusão na lista de eleitores para fins de voto, de elegibilidade e de filiação partidária, após a expedição do respectivo título eleitoral. O alistamento eleitoral e o voto são obrigatórios para os maiores de 18 anos e facultativos para os analfabetos, os maiores de 70 anos e os maiores de 16 anos e menores de 18 anos (CF, artigo 14, § 1º). Não podem alistar-se como eleitores os estrangeiros e, durante o período do serviço militar obrigatório, os conscritos (CF, artigo 14, § 2º). Os §§ 1º e 2º do artigo 14 da CF tratam da chamada capacidade eleitoral ativa, ou seja, da possibilidade de votar. É o exercício do direito de sufrágio. A partir do advento da Constituição de 1988 o exercício da capacidade eleitoral ativa se opera pelas disposições nela previstas. Assim, como o Constituinte Originário ampliou o universo daqueles que votam – pois incluídos, como facultativamente alistáveis e detentores do direito de voto, os analfabetos e aqueles que têm idades entre dezesseis e dezoito anos – não há falar em recepção dos artigos 4º a 6º do Código Eleitoral. Observe-se que os estrangeiros não detêm capacidade eleitoral ativa, motivo pelo qual não podem votar nas eleições brasileiras. Assim, a primeira conclusão é a de que somente os brasileiros natos e naturalizados estariam aptos a eleger representantes no Brasil (CF, art. 14, § 2º). Contudo, conforme mencionado no capítulo em que tratamos da nacionalidade, existe ainda o caso do português equiparado, ao qual, se houver reciprocidade em favor de brasileiros, são atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro naturalizado (civis e, inclusive, políticos). Portanto, o português equiparado, enquanto houver reciprocidade por parte de Portugal com relação aos brasileiros lá residentes, tem capacidade eleitoral ativa. CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE São condições de elegibilidade: nacionalidade brasileira; pleno exercício dos direitos políticos; alistamento eleitoral; domicílio eleitoral na circunscrição; filiação partidária; e idade mínima (CF, artigo 14, § 3º). O artigo 14, § 3º, ao dispor sobre as condições de elegibilidade, trata da chamada capacidade eleitoral passiva, ou seja, da possibilidadede ser votado. NACIONALIDADE BRASILEIRA A condição da nacionalidade brasileira apresenta-se em relação a todos os cargos eletivos. ‘ PLENO EXERCÍCIO DOS DIREITOS POLÍTICOS Este requisito deve ser analisado em conjunto com as regras do artigo 15 da CF, segundo o qual é vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado; incapacidade civil absoluta; DIREITO CONSTITUCIONAL 27 condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos; recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do artigo 5º, inciso VIII da CF;51 improbidade administrativa, nos termos do artigo 37, § 4º da CF.52 Preliminarmente, lembremos que é expressamente vedada a cassação de direitos políticos. Somente os brasileiros natos, naturalizados e os portugueses equiparados que possuem capacidade eleitoral ativa. Portanto, o brasileiro naturalizado que tiver cancelada a respectiva naturalização, por sentença transitada em julgado, perde os direitos políticos no Brasil. A incapacidade civil absoluta: não acarreta perda, mas suspensão de direitos políticos. Outra hipótese de suspensão – e não de perda – de direitos políticos decorre de condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos. Os efeitos da condenação perduram enquanto não extinta a pretensão executória estatal, seja pelo cumprimento da pena ou pela prescrição. Já a recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do artigo 5º, inciso VIII da CF ocasiona a perda dos direitos políticos. Por fim a improbidade administrativa, nos termos do artigo 37, § 4º: a CF prevê a suspensão dos direitos políticos. ALISTAMENTO ELEITORAL Conforme mencionado acima, o alistamento antecede o voto, como um processo eleitoral afim ou secundário. O alistamento é um processo eleitoral que consiste na composição da identidade, da idade, da filiação, da nacionalidade, do estado civil, da profissão e da residência do eleitor, habilitando-o à inclusão na lista de eleitores para fins de voto, de elegibilidade e de filiação partidária, após a expedição do respectivo título eleitoral. DOMICÍLIO ELEITORAL NA CIRCUNSCRIÇÃO Domicílio, residência e habitação são coisas diferentes, pela sua graduação e importância. Uma pessoa pode habitar em um local sem nele residir, pois pode estar apenas de passagem; pode, ainda, ter a residência em um local, sem nela fixar domicílio porque este decorre da fixação de residência com ânimo definitivo. O Código Eleitoral é expresso quanto à determinação do domicílio eleitoral. Este é importante não somente para o efeito da inscrição, a fim de se obter o título eleitoral, mas ainda como condição de elegibilidade. 51 Art. 5º. “VIII - Ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei”. 52 Art. 37. “§ 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.” DIREITO CONSTITUCIONAL 28 Código Eleitoral, em seu artigo 42, parágrafo único, dispõe que, para o efeito da inscrição, é domicílio eleitoral o lugar de residência ou moradia do requerente e, verificando-se ter o alistado mais de uma, considerar-se-á domicílio qualquer delas. Percebe-se, assim, que o Código Eleitoral não fez coincidir o domicílio eleitoral com o domicílio civil. Justifica-se: o domicílio eleitoral prescinde da análise do ânimo de fixação em determinado lugar de forma definitiva. De acordo com o art. 9º da Lei das Eleições (alterado pela Lei 13.488/17), para concorrer às eleições, o candidato deverá possuir domicílio eleitoral na respectiva circunscrição pelo prazo de seis meses e estar com a filiação deferida pelo partido no mesmo prazo. FILIAÇÃO PARTIDÁRIA A filiação partidária é precedida do alistamento eleitoral. Depois de expedido o título eleitoral o interessado poderá buscar sua filiação a partido político que consinta com seu ingresso na qualidade de membro. O eleitor para poder filiar-se a partido político deve estar em pleno gozo de seus direitos políticos. Considera-se deferida a filiação partidária com o atendimento das regras estatutárias do partido. O eleitor só pode estar filiado a um único partido político. Se desejar filiar-se a outro, não necessita fazer comunicação prévia, mas após a segunda filiação no dia imediato à ocorrência, deve fazer comunicação ao partido e ao Juiz de sua respectiva Zona Eleitoral, para cancelar sua filiação; se não o fizer nesse prazo, fica configurada dupla filiação, sendo ambas consideradas nulas. Partido político não pode ser coagido a admitir o ingresso de pretenso membro, afinal, aos partidos políticos é constitucionalmente assegurada autonomia para definir sua estrutura interna e estabelecer regras sobre escolha, formação e duração de seus órgãos permanentes e provisórios e sobre sua organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações nas eleições majoritárias, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária (CF, art. 17, § 1º). Vide EC nº 97/2017. Assim, desde que a negativa seja feita com base em previsões estatutárias, não há falar em ilegalidade nas hipóteses em que o partido rejeita o ingresso de alguém à agremiação. O art. 9º da Lei 9.504/97 diz que, para concorrer às eleições, o candidato deverá possuir domicílio eleitoral na respectiva circunscrição pelo prazo de seis meses e estar com a filiação deferida pelo partido no mesmo prazo (Redação dada pela Lei nº 13.488, de 2017). IDADE MÍNIMA A idade mínima depende do cargo almejado pelo pretenso candidato: 35 anos para Presidente e Vice-Presidente da República e Senador; 30 anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal; 21 anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz; 18 anos para Vereador. DIREITO CONSTITUCIONAL 29 A idade mínima constitucionalmente estabelecida como condição de elegibilidade é verificada tendo por referência a data da posse, salvo quando fixada em dezoito anos, hipótese em que será aferida na data-limite para o pedido de registro. (Lei n˚ 9.504/97, artigo 11, § 2º, com redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015). INELEGIBILIDADES Obviamente, quem não pode se alistar como eleitor (e, a partir do alistamento, exercer capacidade eleitoral ativa) não pode se candidatar (capacidade eleitoral passiva). Esta é a razão de o § 4º do artigo 14 da CF mencionar que são inelegíveis os inalistáveis. As inelegibilidades são também conhecidas por direitos políticos negativos. Somente podem ser eleitos os alistáveis, isto é, os que possuem capacidade eleitoral ativa. Dessa forma os conscritos (durante o período de serviço militar obrigatório) e os estrangeiros também não podem se alistar como candidatos. Os analfabetos, embora possam exercer de forma facultativa o direito de alistamento eleitoral e o direito de voto não possuem capacidade eleitoral passiva (CF, art. 14 § 4º). As inelegibilidades, por se consubstanciarem em impedimentos ao exercício da capacidade eleitoral passiva, classificam-se, quanto à abrangência, em inelegibilidades absolutas e inelegibilidades relativas. INELEGIBILIDADES ABSOLUTAS Inelegibilidades absolutas são as que impedem aos que nelas se enquadrarem de se candidatar a quaisquer cargos eletivos. Quem se encontrar em tal situação não pode ser candidato
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