Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
BASES DE FARMACOLOGIA E COSMETOLOGIA Autoria: Roberta Nunes Indaial - 2020 UNIASSELVI-PÓS 1ª Edição CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Carlos Fabiano Fistarol Ilana Gunilda Gerber Cavichioli Cristiane Lisandra Danna Norberto Siegel Camila Roczanski Julia dos Santos Ariana Monique Dalri Bárbara Pricila Franz Marcelo Bucci Revisão de Conteúdo: Bárbara Pricila Franz Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Copyright © UNIASSELVI 2020 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. N972b Nunes, Roberta Bases de farmacologia e cosmetologia. / Roberta Nunes. – In- daial: UNIASSELVI, 2020. 121 p.; il. ISBN 978-65-5646-139-7 ISBN Digital 978-65-5646-140-3 1.Farmacologia. – Brasil. 2. Cosméticos - Indústria. – Brasil. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. CDD 650.1 Impresso por: Sumário APRESENTAÇÃO ............................................................................5 CAPÍTULO 1 Princípios Fundamentais de Farmacologia ................................ 7 CAPÍTULO 2 Princípios Fundamentais De Cosmetologia ............................. 45 CAPÍTULO 3 Cosmetologia Aplicada a Clínica ............................................... 85 APRESENTAÇÃO Caro acadêmico, este livro didático reúne informações e conteúdos sobre far- macologia e cosmetologia. Todavia, o que é farmacologia? Qual é sua correlação com a cosmetologia? A farmacologia pode ser definida como o estudo dos efeitos dos fármacos no funcionamento de sistemas vivos. Já a cosmetologia pode ser definida como sen- do uma ciência que estuda os cosméticos, desde a concepção de conceitos até a aplicação dos produtos elaborados. A correlação das duas áreas surge quando um produto cosmético afeta de maneira considerável a funcionalidade da pele, denominamos esse produto de cosmecêutico (junção das palavras cosmético mais farmacêutico). O produto final é primariamente um cosmético, mas com promissão de benefícios como um pro- duto farmacêutico. O cosmecêutico tem mecanismo de ação conhecido e eficácia comprovada. Para facilitar e organizar seus estudos, dividimos o conteúdo da disciplina em três capítulos. No Capítulo 1, você compreenderá como agem os fármacos em nosso organismo e quais mecanismos celulares estão envolvidos na absorção, distribuição, metabolismo e eliminação desses produtos. No Capítulo 2, será abordado os conceitos básicos para o entendimento da cosmetologia e os princípios e métodos utilizados na formulação de produtos cos- méticos. Por fim, no Capítulo 3, direcionaremos seu conhecimento para a aplica- ção clínica dos cosméticos. Ambas áreas estão em crescimento constante no mercado de trabalho. A far- macologia serve como sustentação para a formulação de cosméticos e o mercado dos cosméticos surge com o objetivo de proporcionar prazer e bem-estar, garan- tindo resultados satisfatórios, além de proporcionar qualidade de vida. Vamos começar essa leitura e adquirir muito conhecimento e informação? Bons estudos! Profa. Roberta Nunes CAPÍTULO 1 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes objetivos de aprendizagem: Conhecer os princípios da interação fármaco/receptor. Compreender os conceitos gerais sobre as ações dos fármacos no organismo e do organismo sobre os fármacos. Propiciar o entendimento dos mecanismos de ação farmacológica e interação dos fármacos no tratamento clínico. Identifi car os fatores intrínsecos e extrínsecos que determinam e/ou alteram as respostas farmacológicas dos fármacos. 8 Bases de Farmacologia e cosmetologia 9 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 1 CONTEXTUALIZAÇÃO Como o analgésico sabe qual lugar do seu corpo está doendo? Por que os antibióticos matam efetivamente as bactérias, porém raramente prejudicam o pa- ciente? Essas perguntas podem ser respondidas ao considerarmos que cada fár- maco atua em um alvo molecular específi co. Um dos princípios básicos da farmacologia afi rma que as moléculas dos fár- macos precisam exercer alguma infl uência química sobre um ou mais constituin- tes das células para produzir uma resposta farmacológica. Neste capítulo, compreenderemos como os fármacos interagem com o seu receptor-alvo e quais efeitos essa interação gera em nosso organismo. Para isso, é necessário relembrar alguns conceitos básicos da farmacologia. Em geral, os fármacos são moléculas que interagem com componentes moleculares especí- fi cos de um organismo, produzindo alterações bioquímicas e fi siológicas dentro desse organismo. Os receptores de fármacos são macromoléculas que, através de sua ligação a determinado fármaco, medeiam essas alterações bioquímicas e fi siológicas. Algumas propriedades fundamentais dos receptores são exemplifi cadas pela ação do hormônio epinefrina sobre o coração. A epinefrina liga-se ao receptor β-adrenérgico desencadeando uma série de reações que provocam aumento da força e da frequência dos batimentos cardíacos. Isso faz com que o corpo esteja preparado para uma reação, como reagir agressivamente ou fugir, por exemplo. Portanto, este capítulo tem como objetivo detalhar essas interações fármaco/ receptor e descrever os efeitos farmacológicos provenientes dessas ligações. 2 INTERAÇÕES FÁRMACO- RECEPTOR Para que um fármaco seja útil como instrumento terapêutico ou científi co, precisa agir de modo seletivo sobre as células e tecidos específi cos. Em outras palavras, precisa exibir alto grau de especifi cidade pelo ponto de ligação. Porém, nenhum fármaco é completamente específi co em sua ação. Em muitos casos, ao aumentar a dose do fármaco, a substância pode afetar outros alvos além do seu alvo principal e esse processo pode levar ao aparecimento de efeitos adversos. Por exemplo, os antidepressivos tricíclicos atuam bloqueando os transportado- res de monoaminas (norepinefrina, serotonina e dopamina), mas são famosos por 10 Bases de Farmacologia e cosmetologia produzirem efeitos adversos, como, por exemplo, boca seca, esse efeito está re- lacionado com a sua capacidade de bloquear, além dos transportadores de mono- aminas, outros diversos receptores como receptores muscarínicos, histamina tipo 1 e receptores serotoninérgicos (RANG et al., 2016). A maioria dos receptores são formados por proteínas. Cada proteína assume uma forma peculiar que determina sua função, a sua localização no corpo, a sua relação com as membranas celulares e as interações de ligação com fármacos e outras moléculas. Todo receptor possui um sítio de ligação, esse sítio refere-se ao local onde o fármaco liga-se ao receptor. Cada sítio de ligação possui caracterís- ticas químicas, que determinam a forma, a estrutura e a reatividade do fármaco com o receptor. Essas características estabelecem a intensidade de ligação entre essas moléculas (GOLAN et al., 2009). Para Golan et al. (2009), a ligação fármaco-receptor resulta de múltiplas inte- rações químicas entre as duas moléculas, algumas das quais são bastante fracas (como as forças de Van der Waals), enquanto outras são extremamente fortes (como a ligação covalente). A soma total dessas interações proporciona a especi- fi cidade da interação fármaco-receptor. As forças de Van der Waals resultam da polaridade induzida em uma molécula em consequência da mudança de densidade de seus elé- trons, proporcionando uma força fraca de atração para os fármacos e seus receptores. Já a ligação covalente resulta do compartilhamento de um par de elétrons entre dois átomosem diferentes moléculas, na maio- ria das vezes, essas ligações são irreversíveis (GOLAN et al., 2009). Embora a farmacodinâmica (o estudo dos efeitos dos fármacos so- bre o organismo) seja abordada com mais detalhes na próxima seção, é importante citar de modo sucinto os principais conceitos relacionados à interação dos fármacos com seus alvos. O termo especifi cidade de- signa a capacidade do fármaco de somente se ligar a um determinado receptor. No entanto, há fármacos que possuem afi nidade por mais de um receptor. A afi nidade defi ne a probabilidade de um fármaco ligar ao seu receptor. Uma vez ligado ao receptor, a capacidade de ativar esse receptor é indicada pela efi cácia desse fármaco. No entanto, não pode- mos dizer que um fármaco efi caz é um fármaco potente. A potência é defi nida pela capacidade do fármaco de gerar a maior efeito na menor dose (RANG et al., 2016). A ocupação de um receptor por uma molécula de um fármaco pode ou não resultar na ativação desse receptor. Quando falamos em ativa- ção, estamos querendo dizer que o receptor é afetado pela molécula liga- As forças de Van der Waals resultam da polaridade induzida em uma molécula em consequência da mudança de densidade de seus elétrons, proporcionando uma força fraca de atração para os fármacos e seus receptores. Já a ligação covalente resulta do compartilhamento de um par de elétrons entre dois átomos em diferentes moléculas, na maioria das vezes, essas ligações são irreversíveis (GOLAN et al., 2009). 11 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 da a ele, de tal modo que altera seu comportamento na célula e desencadeia uma resposta tecidual. O fármaco capaz de ativar o receptor é chamado de agonista. O fármaco que se liga a um receptor sem causar sua ativação e, em consequência, impede que um agonista se ligue a esse mesmo receptor recebe a denominação de antagonista do receptor (RANG et al., 2016). Entretanto, não se preocupe, mais adiante esses termos serão revistos e defi nidos com maiores detalhes. Além desses, outro conceito importante para este conteúdo é com relação à segurança dos fármacos. Cada fármaco possui uma margem de segurança e uma margem terapêutica, a margem de segurança é um indicador farmacodinâmico que expressa a diferença entre a dose tóxica (DL50) e a dose efetiva (DE50) do fármaco, enquanto a margem terapêutica é a relação entre a dose máxima tolera- da, ou também tóxica, e a dose terapêutica, parâmetro considerado equivalente a índice terapêutico (PIANETTI, 2016). Veja o esquema a seguir, em que exemplifi - camos através do fármaco morfi na. FIGURA 1 – MARGEM DE SEGURANÇA DOS FÁRMACOS FONTE: Adaptado de <https://bit.ly/3coMj6W>. Acesso em: 12 maio 2020. 12 Bases de Farmacologia e cosmetologia 2.1 CLASSIFICAÇÃO DOS RECEPTORES A maioria das interações fármaco-receptor atualmente elucidadas podem ser classifi cadas, em sua maioria, em quatro grandes grupos. Esses grupos compre- endem: (A) canais iônicos transmembrana; (B) receptores transmembrana aco- plados à proteína G intracelulares; (C) receptores transmembrana com domínios citosólicos enzimáticos; (D) e receptores nucleares (GOLAN et al., 2009). FIGURA 2 – QUATRO TIPOS PRINCIPAIS DE RECEPTORES FONTE: Golan et al. (2009, p. 8) Receptor transmembrana refere-se a receptores que possuem estrutura que atravessa a membrana celular, ou seja, tem contato tanto com meio extracelular quanto intracelular. A seguir, estudaremos a estrutura, a regulação e os ativadores de cada um desses receptores. • Canais iônicos: Os canais iônicos são basicamente portões presentes nas membranas celulares que, de modo seletivo, permitem a pas- sagem de determinados íons, e que são induzidos a se abrir ou se fechar por uma variedade de mecanismos. Os canais controlados por ligantes e os canais controlados por voltagem são os dois tipos mais importantes. O primeiro abre apenas quando uma ou mais moléculas agonistas são ligadas, e, por isso, são propriamente classifi cados como receptores, já que é 13 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 necessário a ligação de um agonista para que sejam ativados. Os canais controlados por voltagem são regulados não por li- gação de um agonista, mas sim por alterações no potencial transmembrana (RANG et al., 2016, p. 81). A estrutura desses canais é constituída por macromoléculas semelhantes a tubos que possuem um certo número de subunidades proteicas que atravessam a membrana celular. O domínio de ligação do ligante pode ser extracelular ou intra- celular (GOLAN et al., 2009). Para maior compreensão dessa informação reveja a estrutura A da Figura 1. As funções dos canais iônicos são diversas, incluindo funções fundamentais na neurotransmissão, na condução cardíaca e na contração muscular. Entretanto, você sabe quais fármacos atuam através de canais iônicos? Um exemplo são os anestésicos locais como lidocaína e bupivacaína, eles atuam através do bloqueio da condutância dos íons sódio através dos canais de sódio regulados por volta- gem nos neurônios que transmitem a informação da dor da periferia para o siste- ma nervoso central impedindo a propagação do potencial de ação e, consequen- temente, a percepção da dor (GOLAN et al., 2009; SGARABOTTO et al., 2018). O que é um potencial de ação? Em condições normais, as células – neste caso os neurônios – permanecem em estado de repouso. O estado de repouso é caracterizado por concentrações elevadas do íon sódio (Na+) fora da célula, o que faz com que dentro das células tenha- mos cargas negativas e fora da célula cargas elétricas positivas. Após um estímulo (beliscão, picada de alfi nete, calor ou frio intenso, pH ex- tracelular baixo), há a despolarização da célula. Essa despolarização ocorre por meio da abertura dos canais de Na+ presentes nas células, permitindo que o Na+ abundante no meio extracelular entre na célula, levando a alteração da carga elétrica. O íon Na+ é responsável pela carga positiva, ou seja, a partir do momento que ele entra na célula, o meio extracelular fi ca mais negativo. Então, no processo de despola- rização, a célula fi ca com o meio intracelular positivo e meio extrace- lular negativo. Posteriormente, os canais de Na+ se fecharão e então os canais de potássio (K+) se abrirão e o K+ começará a sair da célula. Ao sair da célula, ele reduz a carga positiva no meio intracelular. Os canais de K+ se abrem depois dos de Na+ e permanecem por muito mais tempo abertos. A carga positiva será toda exportada para o meio exterior, isso fará com que o interior fi que negativo e o exterior positivo novamente, ou seja, há um processo de repolarização. A condução do impulso nervoso acontece pela entrada de Na+ e depois a repolariza- ção acontece com a saída de K+. 14 Bases de Farmacologia e cosmetologia • Receptores transmembrana acoplados à proteína G intracelulares (GPCRs): os GPCRs representam a classe mais abundante de recep- tores no organismo. Esses receptores estão expressos na superfície extracelular da membrana celular, atravessam a membrana e possuem regiões intracelulares que ativam uma classe de moléculas de sinaliza- ção, denominadas proteínas G. As proteínas G são assim designadas em virtude de sua ligação aos nucleotídeos de guanina, GTP e GDP. Os mecanismos de sinalização acoplados à proteína G estão envolvidos em numerosos processos importantes, incluindo visão, olfação e neurotrans- missão (GOLAN et al., 2009). Todos os receptores acoplados a proteína G possuem sete regi- ões transmembrana dentro de uma única cadeia polipeptídica. Cada região transmembrana consiste em uma única hélice α, e essas hélices α estão dispostas em um modelo estrutural ca- racterístico, que se assemelha em todos os membros classe de receptores. O domínio extracelular dessa classe de proteínas contém a região de ligação do ligante, apesar de alguns recep- tores acoplados à proteínaG ligarem ligantes dentro do domínio transmembrana do receptor (GOLAN et al., 2009, p. 10). FIGURA 3 – ESTRUTURA DO GPCRS FONTE: <https://bit.ly/2ZWeOX4>. Acesso em: 12 maio 2020. De que forma ocorre a ativação desses GPCRs? As proteínas G se classifi cam em três subunidades: α, β e γ. No estado de repouso, essas subunidades estão associadas entre si e o nucleotídeo de guanina GDP está ligado à subunidade α. Para facilitar o entendimento podemos associar o “D” do GDP com o termo desligado (estado de repouso) (GOLAN et al., 2009). 15 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 A ligação de um agonista ao receptor acoplado à proteína G determina a troca do nucleotídeo GDP por GTP na subunidade α. A subunidade α dissocia-se da subunidade βγ, e difunde-se para interagir com proteínas efetoras, essas pro- teínas efetoras podem ser enzimas ou até mesmo canais iônicos. A associação da subunidade α com as enzimas-alvo ou os canais pode causar ativação ou inibi- ção, dependendo do que a proteína G está envolvida (RANG et al., 2016). A subunidade α possui atividade intrínseca de GTPase, que resulta em hidró- lise do GTP a GDP. Isso leva à reassociação da subunidade α com a subunidade βγ, dando início a um novo ciclo (GOLAN et al., 2009). FIGURA 4 – A FUNÇÃO DA PROTEÍNA G FONTE: Golan et al. (2009, p. 10) A ativação da proteína G resulta em amplifi cação porque um único complexo agonista-receptor pode ativar várias proteínas G, e cada uma delas pode permanecer associada às enzimas efetoras por tempo sufi ciente para produzir muitas moléculas (RANG et al., 2016). • Receptores transmembrana com domínios citosólicos enzimáticos: são receptores transmembrana que transduzem uma interação de ligação com ligantes extracelulares numa ação intracelular através da ativação de um domínio enzimático ligado. É importante destacar que todos esses receptores consistem em proteínas que atravessam uma única vez a membrana, ao contrário do que vimos anteriormente em receptores acoplados a proteína G, que atravessam sete vezes a membrana (GOLAN et al., 2009). 16 Bases de Farmacologia e cosmetologia FIGURA 5 – ESTRUTURA DOS RECEPTORES TRANSMEMBRANA COM DOMÍNIOS CITOSÓLICOS ENZIMÁTICOS FONTE: <https://bit.ly/3gHsk6M>. Acesso em: 14 maio 2020. Esses receptores têm importante papel no controle da divisão, no crescimen- to e na diferenciação celular, assim como na infl amação, na reparação tecidual, na apoptose e nas respostas imunológicas. Boa parte desses receptores modifi cam proteínas pela adição ou remoção de grupos de fosfato de resíduos de aminoá- cidos específi cos, mecanismo denominado de fosforilação (GOLAN et al., 2009). A fosforilação é um mecanismo geral de sinalização de prote- ínas. A grande carga negativa dos grupos de fosfato pode alterar a estrutura tridimensional de uma proteína e, consequentemente, mo- difi car a atividade dessa proteína (GOLAN et al., 2009). Os receptores transmembrana com domínios citosólicos enzimáticos são divididos em três classes principais, essas classes são divididas de acordo com os resíduos que são fosforilados. As principais classes incluem: • Receptores tirosina quinase (RTKs): esses receptores transduzem sinais através da fosforilação de resíduos de tirosina. Estão relacionados com diversos fatores de crescimento, dentre eles o fator de crescimento epi- dérmico e o fator de crescimento neuronal. O receptor de insulina per- tence a esta classe e possui sua estrutura e função bem caracterizados (RANG et al., 2016; SILVA et al., 2009). 17 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 • Receptores de serina/treonina quinases: são similares à estrutura dos RTKs, porém, como o próprio nome já diz, fosforila resíduos de serina e/ou treonina em vez de tirosina. São membros da superfamília de re- ceptores do fator de transformação do crescimento β (TGF-β) e estão relacionados com crescimento e diferenciação celular e, por isso, já fo- ram implicados na progressão do câncer e na ocorrência de metástases (GOLAN et al., 2009). • Receptores de citocinas: esses receptores carecem de atividade enzimá- tica intrínseca. Quando ocupados, ativam várias tirosinas quinases, tal como as Jak (Janus-quinase). Os ligantes para esses receptores incluem citocinas como interferons e fatores estimulantes de colônia, envolvidos nas respostas imunológicas (RANG et al., 2016). Você sabe o que são citocinas? Qual a importância delas em um processo infl amatório ou doloroso, por exemplo? Para melhor entendimento deste tema, recomendo a leitura do artigo de revisão: Citocinas e Dor de Oliveira et al. (2011), no link: https://www.scielo.br/ pdf/rba/v61n2/v61n2a14.pdf. • Receptores nucleares: os receptores nucleares são fatores de transcrição ativados por ligantes, que modulam a expressão de diferentes genes envolvidos na diferenciação, apoptose, crescimento, metabolismo, entre outros. A expressão desses tipos de receptores depende do tipo de tecido e do contexto celular, e a desregulação de sua expressão está envolvida em várias doenças, como câncer, distúrbios cardiovasculares e diabetes (DOMÍNGUEZ et al., 2015). A via de sinalização clássica ou genômica dos receptores nucleares inicia quando o ligante se liga ao domínio de ligação ao ligante (LBD) de seu receptor nuclear específi co. Como resultado dessa interação, ocorre uma mudança conformacional nos receptores nucleares, que permite a dissociação de proteínas que as mantêm inativas no citoplasma, como é o caso da chaperona e favorece o acúmulo no núcleo celular. No núcleo, os receptores nucleares podem se ligar a sequências específi cas do DNA e recrutar proteínas corregulatórias para direcionar a expressão gênica (GOLAN et al., 2009). 18 Bases de Farmacologia e cosmetologia FIGURA 6 – MECANISMO DE SINALIZAÇÃO DOS RECEPTORES NUCLEARES FONTE: Golan et al. (2009, p. 14) Você pode observar, na Figura 6, que um grupo de destaque dos receptores nucleares são os receptores para hormônios esteroides, além deste, receptores para hormônios tireoidianos também fazem parte desta família (DOMÍNGUEZ et al., 2015). Atividade de Estudos 1 Agora que você já conhece os principais tipos de receptores, identifi que, na fi gura a seguir, através das características estruturais, a qual grupo cada receptor pertente e quais suas principais funções. 19 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 FONTE: A autora 3 FARMACODINÂMICA Utiliza-se o termo “farmacodinâmica” para descrever os efeitos de um fármaco no corpo. Geralmente, esses efeitos são descritos em termos quantitativos. É importante descrever os efeitos de um fármaco em termos quantitativos, para estabelecer as faixas de doses apropriadas para os pacientes, bem como para comparar a potência, a efi cácia e a segurança de um fármaco com o outro (GOLAN et al., 2009). Embora, na seção anterior, tenhamos visto de forma sucinta os principais conceitos da farmacodinâmica, nesta seção, você verá de forma mais detalhada cada termo. De forma simples, a farmacodinâmica é “o que o fármaco faz com o organismo”, onde os efeitos são mediados pela ligação do fármaco a um receptor. Essa ligação poderá ou não gerar uma resposta biológica, a capacidade de gerar ou não conceitua os fármacos em agonista e antagonista, respectivamente. A potência dos agonistas depende de dois parâmetros: afi nidade (a tendência do agonista de se ligar aos receptores) e efi cácia (a capacidade de uma vez ligado a um receptor, dar início a alterações que provocam efeitos farmacológicos). Da 20 Bases de Farmacologia e cosmetologia mesma maneira, pensando nesses conceitos, qual seria a efi cácia dos fármacos antagonistas? A efi cácia dos antagonistas é zero, pois ele não gera nenhuma resposta farmacológica (RANG et al., 2016). Atividade de Estudo 1 Para fi xar o conteúdo e dar sequência aos estudos, interprete o gráfi co a seguire indique quais dos fármacos é o mais potente e o mais efi caz. FONTE: A autora FIGURA 7 – REPRESENTAÇÃO DA DIFERENÇA DO PROCESSO DE LIGAÇÃO DO FÁRMACO AGONISTA E ANTAGONISTA FONTE: <https://bit.ly/2XOkAHr>. Acesso em: 12 maio 2020. 21 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 Contudo, a capacidade da molécula de um fármaco de ativar um receptor é, na verdade, uma característica que se manifesta de modo gradual, e não como um processo tudo ou nada. Quando um grupo de fármacos agonistas quimicamente afi ns que atuam sobre os mesmos receptores é testado em determinado sistema biológico, constata-se, que a maior resposta que pode ser produzida difere de um fármaco para outro. Alguns compostos, conhecidos como agonistas plenos ou totais, são capazes de produzir uma reposta máxima (a maior reposta que o tecido é capaz de dar), enquanto outros, chamados de agonista parciais, produzem apenas uma resposta submáxima (RANG et al., 2016, p. 53). GRÁFICO 1 – REPRESENTAÇÃO DA REPOSTA DE FÁRMACOS AGONISTA TOTAL E PARCIAL FONTE: <https://siteantigo.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/ farmacia/farmacodinamica/12191>. Acesso em: 20 fev. 2020. No antagonismo, outros mecanismos também podem ser responsáveis por interações inibitórias entre os fármacos. Os antagonistas podem ser divididos em antagonistas de receptores e antagonistas sem receptores (GOLAN et al., 2009). O antagonista sem receptor não se liga ao receptor do agonista; entretanto, inibe a capacidade do agonista de iniciar uma resposta. Em nível molecular, essa resposta pode ocorrer através da inibição direta do agonista (por exemplo, utilizando anticorpos), através da inibição de uma molécula localizada distalmente na via de ativação, ou através da ativação de uma via que se opõe à ação do agonista (GOLAN et al., 2009). Os antagonistas sem receptores também podem ser classifi cados em antagonistas químicos e antagonistas fi siológicos. Os antagonistas químicos inativam o agonista antes de ele ter a oportunidade de atuar (por exemplo, através da neutralização química). Esse tipo de antagonismo tem um papel importante 22 Bases de Farmacologia e cosmetologia no tratamento de intoxicações. Por exemplo, agentes quelantes como EDTA e penicilamina possuem a capacidade de sequestrar metais como mercúrio e chumbo, permitindo a diminuição das suas ações tóxicas (GOLAN et al., 2009; JAMESON et al., 2020). A quelação é um tipo de ligação de íons e moléculas a íons me- tálicos. No tratamento de intoxicação por metais pesados, agentes quelantes são administrados para “sequestrar” os íons metálicos, formando compostos quelatos que possibilitam sua eliminação pelo organismo (JAMESON et al., 2020). Os antagonistas fi siológicos produzem um efeito fi siológico oposto àquele induzido pelo agonista. Por exemplo, as células cardíacas possuem receptores adrenérgicos beta 1 que são ativados pelo seu agonista noradrenalina, essa ati- vação é responsável pelas ações do coração, como aumento do débito cardíaco. Nessas mesmas células, há receptores muscarínicos que, quando ativados pelo seu agonista acetilcolina, diminuem do débito cardíaco. Cada um dos recepto- res é constantemente ativado, antagonizando um o efeito do outro e mantendo o equilíbrio do organismo (GOLAN et al., 2009). Embora um fármaco possa inibir a reposta de outro por diversos mecanis- mos, a competição em nível de receptor é particularmente importante, tanto no laboratório quanto na clínica, devido às características de potência e especifi cida- de que podem ser alcançadas (RANG et al., 2016). Os antagonistas podem ser classifi cados em antagonistas reversíveis e irreversíveis, isto é, antagonistas que que se ligam aos seus receptores de modo reversível e antagonistas que se ligam irreversivelmente, além disso, podem competir ou não pela ligação ao receptor (GOLAN et al., 2009). • Antagonistas competitivos dos receptores: os antagonistas competi- tivos reversíveis competem com os agonistas pelo mesmo sítio ativo do receptor. Por exemplo, a adrenalina (agonista) se liga aos receptores β1 no coração, levando ao aumento dos batimentos cardíacos, já o propra- nolol (antagonista) se liga neste mesmo receptor, no entanto, é respon- sável por diminuir a frequência cardíaca. Ambos competem pelo mesmo receptor e exercem efeitos opostos (RANG et al., 2016). Os antagonistas competitivos irreversíveis se ligam no sítio ativo do receptor de forma ir- 23 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 reversível. Mesmo aumentando a dose do agonista, o efeito máximo não é atingido (RANG et al., 2016). • Antagonistas não competitivos dos receptores: no caso dos antago- nistas não competitivos, não há competição do agonista pelo receptor, o antagonista bloqueia a cascata bioquímica de eventos celulares induzida pelo agonista (RANG et al., 2016). Por exemplo, o cloridrato de verapa- mil é um fármaco responsável por baixar a pressão arterial induzida, na maioria das vezes, pela secreção do hormônio adrenalina. O verapamil é um antagonista dos canais de cálcio, sendo que o íon cálcio é um impor- tante mensageiro intracelular nos mecanismos de excitação e contração da musculatura lisa do miocárdio e dos vasos. Logo, se não há entrada de cálcio, há diminuição da contração da musculatura do miocárdio e consequentemente diminuição da pressão sanguínea. A aspirina também é um exemplo de antagonista não competitivo. Esse agente acetila irreversivelmente a ciclooxigenase, a enzima responsável pela produção de tromboxano A2 nas plaquetas. Na ausência de geração de tromboxano A2 ocorre inibição da agregação plaquetária. Como a inibição é irreversível e as plaquetas são incapazes de sintetizar novas moléculas de ciclooxigenase, os efeitos de uma dose única de aspirina persistem por sete a dez dias (o tempo necessário para a produção de novas plaquetas pela medula óssea), embora o fármaco livre seja depurado muito mais rapidamente do organismo (GOLAN et al., 2009). Atividade de Estudo 1 Para descrever os efeitos de um fármaco no corpo, bem como es- tabelecer as faixas de doses apropriadas para os pacientes, utiliza- -se termos específi cos da área de farmacologia. Diante disso, cor- relacione os conceitos a seguir e assinale a alternativa CORRETA. I- Efi cácia. II- Potência. III- Afi nidade. IV- Atividade intrínseca. ( ) Capacidade da droga de se ligar ao receptor. ( ) Indica o efeito biológico produzido por uma substância devido a sua ligação ao receptor e é dada pelo efeito máximo a uma determinada substância. 24 Bases de Farmacologia e cosmetologia ( ) Descreve a força de ligação entre uma substância e o receptor, in- dica a concentração necessária para produzir determinado efeito. ( ) Capacidade da substância após se ligar ao receptor provocar efeito farmacológico. a) ( ) III, II, I, IV. b) ( ) II, III, IV, I. c) ( ) I, IV, II, III. d) ( ) III, I, II, IV. Além dois vários tipos de agonista e antagonista que vimos anteriormente, há mais uma infromação importante a ser estudada. Além do local de ligação do agonista, no qual os antagonistas competitivos também se ligam, as proteínas dos receptores possuem muitos outros locais de ligação através dos quais os fármacos podem infl uenciar a função do receptor de várias maneiras: aumentando ou diminuindo a afi nidade dos agonistas pelo local de ligação do agonista, modifi cando a efi cácia, ou produzindo eles mesmo uma resposta. Esse mecanismo é conhecido como modulação alostérica (RANG et al., 2016). 25 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 FIGURA 8 – MODULAÇÃO ALOSTÉRICA FONTE: Adaptado de Rang et al. (2016) 26 Bases de Farmacologia e cosmetologia Fármacos alostéricos se ligam a um local do receptor diferente dos agonistas “tradicionais” (A). Estes podem modifi car a atividade do receptor por alteração da afi nidade do agonista (B e C), alteraçãoda efi cácia do agonista (D e E) ou desencadeando eles mesmos uma resposta (A) (RANG et al., 2016). Atividade de Estudo 1 Com base na interação fármaco-receptor sabemos que a ocupa- ção de um receptor por uma molécula de um fármaco pode ou não resultar na ativação desse receptor. Com base nessas intera- ções, julgue as afi rmativas e marque a alternativa CORRETA. a) ( ) O antagonismo competitivo reversível é aquele, no qual, dois antagonistas competem pelo mesmo sítio de ativação. b) ( ) Além do sítio de ligação ao agonista, no qual os antagonistas competitivos se ligam, as proteínas receptores possuem muitos outros sítios de ligação através dos quais fármacos podem infl uenciar a função do receptor de várias maneiras, aumentando ou diminuindo a afi nidade dos agonistas pelo sítio de ligação do agonista ou modifi cando a efi cácia. c) ( ) Os antagonistas competitivos irreversíveis se ligam no sítio ativo do receptor de forma irreversível. No entanto, ao aumentar a dose do agonista, o efeito máximo é atingido. d) ( ) Os antagonistas fi siológicos produzem um efeito fi siológico que aumenta a potência do fármaco agonista. 4 FARMACOCINÉTICA A farmacocinética pode ser defi nida como alterações temporais nas concen- trações de um fármaco em uma ou mais regiões do organismo em relação à dose administrada, em palavras mais simples seria “o que o organismo faz com o fár- maco”. Na prática, a farmacocinética geralmente tem como foco as concentrações do fármaco no plasma sanguíneo, pois aceita-se que as concentrações plasmáti- cas apresentam relação clara com as concentrações do fármaco no líquido extra- celular que envolve as células que expressam receptores e outros alvos com os quais as moléculas dos fármacos interagem (RANG et al., 2016). 27 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 Um fármaco precisa passar por certas barreiras físicas, químicas e biológi- cas para alcançar seus locais de ação moleculares e celulares. O revestimento epitelial do trato gastrointestinal, túbulo renal e outras membranas mucosas re- presentam um tipo de barreira; são também encontradas outras barreiras após a penetração do fármaco no sangue e nos vasos linfáticos. Geralmente, os fárma- cos atravessam o compartimento intravascular nos vasos sanguíneos, onde há lacunas maiores entre as células endoteliais através dos quais o fármaco pode passar. As fendas entre a células endoteliais estão preenchidas com uma matriz proteica frouxa que atua como um fi ltro, retendo moléculas grandes e possibilitan- do a passagem de moléculas menores (GOLAN et al., 2009). A maioria dos fármacos que circulam no sangue deve distribuir-se para os tecidos locais, um processo que pode ser impedido por determinadas estruturas como a barreira hematoencefálica (estrutura de permeabilidade altamente seleti- va que protege o SNC (sistema nervoso central) de substâncias potencialmente neurotóxicas presentes no sangue). Além disso, em alguns órgãos, como SNC e placenta, existem junções oclusivas entre as células, e o endotélio está envolto por uma camada impermeável de células periendoteliais (pericitos). Essas carac- terísticas evitam que moléculas potencialmente perigosas penetrem no cérebro ou no feto, e levem a consequências importantes para a distribuição e atividade dos fármacos (RANG et al., 2016). A barreira hematoencefálica (BHE) pode ser comparada a uma barreira alfan- degária, no sentido de que só passam pelas fronteiras aquilo que não afetará nega- tivamente o país, do mesmo modo, só passará pela BHE aquilo que não prejudicar a homeostase do SNC, mais ainda, passará majoritariamente aquilo que for contri- buir para o bom funcionamento deste sistema. No entanto, todos sabemos que a efi ciência da barreira alfandegária não é total, existe fl uxo ilegal e pessoas, como também de drogas. Do mesmo modo é a BHE, por maior que seja sua proteção, ela possui falhas, e são por essas falhas que passam os fármacos e drogas. Segundo Rang et al. (2016), as moléculas atravessam a membrana celulares de quatro maneiras principais: • Por difusão direta através de lipídios: as moléculas apolares dissolvem- -se livremente na camada lipídica da membrana, difundindo-se prontamen- te através das membranas celulares. Exemplos: oxigênio e esteroides. • Transporte mediado por transportadores: são divididos de modo am- plo em transportadores carreadores solúveis e transportadores cassetes de ligação. Os primeiros facilitam a movimentação passiva de solutos a favor de seus gradientes eletroquímico, enquanto os últimos são bombas ativas movidas por ATP. Exemplo: bomba de sódio e potássio responsá- vel pelo potencial de ação. 28 Bases de Farmacologia e cosmetologia • Por difusão através de poros aquosos formados por proteínas espe- ciais (aquaporinas) que atravessam os lipídeos: importante na trans- ferência de gases, pois os poros têm um diâmetro muito pequeno (em torno de 0,4 nm). No entanto, impossibilita a passagem da maioria das moléculas de fármacos (que geralmente excedem 1 nm de diâmetro). Exemplo: transporte de dióxido de carbono. • Por pinocitose: envolve a invaginação de parte da membrana celular e a captação, dentro da célula, de uma pequena vesícula contendo cons- tituintes extracelulares. O conteúdo da vesícula pode então ser liberado dentro da célula. Exemplo: a insulina cruza a barreira hematoencefálica por este mecanismo. FIGURA 9 – VIAS PELAS QUAIS OS FÁRMACOS PODEM ATRAVESSAR AS MEMBRANAS CELULARES FONTE: Rang et al. (2016, p. 263) Além dos processos descritos até aqui, que regulam o transporte de moléculas dos fármacos através das barreiras, três fatores adicionais têm infl uência importante na distribuição e eliminação de fármacos: • pH e ionização: um fator complicador importante com relação à permea- ção da membrana é o fato de que muitos fármacos são ácidos ou bases fracas, existindo, portanto, tanto na forma não ionizada quanto na ioniza- da; a razão entre as duas formas varia com o pH. A ionização afeta não apenas a velocidade com a qual os fármacos atravessam as membra- nas, mas também a distribuição de equilíbrio das moléculas dos fárma- cos entre compartimentos aquosos, se houver diferença de pH entre eles (RANG et al., 2016). 29 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 A fi gura a seguir mostra como um ácido fraco (ex.: aspirina, pKa de 3,5) e uma base fraca (ex.: petidina, pKa de 8,6) estariam distribuídos, no equilíbrio, entre três compartimentos do organismo, quais sejam: plasma (pH de 7,4), urina alcalina (pH de 8) e suco gástrico (pH de 3). Em cada compartimento, a razão entre as formas ionizada e não ionizada de um fármaco é determinada pelo seu pKa e o pH do compartimento. FIGURA 10 – PARTIÇÃO TEÓRICA DE UM ÁCIDO FRACO (ASPIRINA) E UMA BASE FRACA (PETIDINA) ENTRE COMPARTIMENTOS AQUOSOS (URINA, PLASMA E SUCO GÁSTRICO) DE ACORDO COM A DIFERENÇA DE PH ENTRE ELES FONTE: Adaptado de Rang et al. (2016) 30 Bases de Farmacologia e cosmetologia pKa e pH são utilizados para quantifi car a acidez e basicidade de uma molécula/solução. Com relação ao pKa, quanto maior o pKa mais fraco é o ácido. Quando o pKa é menor que 1 se tem um ácido muito forte, quando o pKa vai de 1 a 5 se tem um ácido forte, com pKa entre 5 e 15 sem tem um ácido fraco e quando o pKa é maior que 15 o ácido é muito fraco. O pH corresponde ao potencial hidrogeniônico de uma solução. Ele é determinado pela concentração de íons de hidrogênio (H+) e ser- ve para medir o grau de acidez, neutralidade ou alcalinidade de deter- minada solução. O pH é representado numa escala que varia de 0 a 14. Ela mede a acidez e basicidade de uma solução. Sendo assim, o pH 7 representa uma solução neutra (por exemplo, a água pura). Já os que estão antes dele são consideradas soluções ácidas (pH ácido), e os que estão após o 7 são as soluções básicas (pH alcalino). Presume-se que a forma não ionizada possaatravessar a membrana e con- sequentemente alcançar concentrações iguais em cada compartimento, e que a forma ionizada não consegue atravessá-la. O resultado é que, no equilíbrio, a concentração total (ionizada + não ionizada) do fármaco será diferente em cada compartimento, com um fármaco ácido sendo concentrado no compartimento com um pH alto (“aprisionamento iônico”) e vice-versa. Os gradientes de concentração produzidos pelo aprisionamento iônico podem, em teoria, ser muito grandes se houver grande diferença de pH entre os compartimentos (RANG et al., 2016). Assim, a aspirina apresentaria concentração quatro vezes maior no túbulo renal alcalino que no plasma, e cerca de 6.000 vezes maior no plasma que no meio ácido do estômago. No entanto, é improvável que, na realidade, gradientes tão grandes sejam alcançados, sendo duas as razões: em primeiro lugar, a pre- sunção de impermeabilidade total das formas polares não é realista, e até mesmo uma pequena permeabilidade atenuaria consideravelmente a diferença de con- centração que pode ser alcançada; em segundo lugar, os compartimentos do or- ganismo raramente chegam ao equilíbrio. Nem o conteúdo gástrico nem o fl uido tubular renal fi cam estáticos, e o fl uxo de moléculas de fármacos resultante reduz os gradientes de concentração bem abaixo das condições teóricas de equilíbrio. Contudo, o mecanismo de partição pelo pH explica corretamente alguns dos efei- tos qualitativos das alterações de pH em diferentes compartimentos do organismo sobre a farmacocinética de fármacos que são ácidos fracos ou bases fracas, es- pecialmente com relação à eliminação renal e à penetração pela barreira hemato- encefálica (RANG et al., 2016). 31 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 • Ligação a proteínas plasmáticas: em concentrações terapêuticas no plasma, muitos fármacos encontram-se associados/ligados às proteínas plasmáticas. Essa informação é importante pois, a porção livre do fárma- co é que constitui a forma farmacologicamente ativa, o fármaco precisa estar livre para se ligar ao receptor e desencadear a resposta farmaco- lógica. Lembrou do conteúdo fármaco/receptor da Seção 2? A albumina, que se liga a muitos fármacos ácidos (por exemplo: varfarina, anti-infl a- matórios não esteroidais, sulfonamidas) e um pequeno número de fár- macos básicos (por exemplo: antidepressivos tricíclicos e clorpromazi- na), é a proteína plasmática mais importante no que se refere à ligação de fármacos (RANG et al., 2016). É importante estar atento ao estado nutricional do paciente, pois indivíduos desnutridos possuem menos albumina no sangue. Nesse caso, a dose do fármaco deve ser menor para não causar efeito tóxico no indivíduo, já que haverá uma maior concentração livre do fármaco. Você sabia que a ligação dos fármacos às proteínas plasmáticas pode desencadear interações medicamentosas? A albumina plasmática, por exemplo, se liga a muitos fármacos diferentes, podendo, assim, haver competição entre eles. Se dois fármacos (A e B) assim competirem, a administração do fár- maco B pode reduzir a ligação proteica do fármaco A, aumentan- do a concentração plasmática da sua forma livre. Para que isso ocorra, o fármaco B precisa ocupar uma fração considerável dos pontos de ligação. Poucos fármacos terapêuticos afetam a li- gação de outros fármacos, pois, em concentrações plasmáticas terapêuticas, ocupam apenas uma pequena fração dos pontos de ligação disponíveis (RANG et al., 2016, p. 103). • Partição na gordura corporal e outros tecidos: alguns fármacos po- dem acumular-se no tecido adiposo e levar a consequências importan- tes, por exemplo: o tiopental (anestésico geral) acumula-se substancial- mente no tecido adiposo, essa característica limita sua utilidade como um anestésico intravenoso para início imediato. Além disso, o baixo su- primento sanguíneo nesse tipo de tecido pode afetar/diminuir a distribui- ção dos fármacos (RANG et al., 2016). 32 Bases de Farmacologia e cosmetologia Além das barreiras físicas como tecido epitelial e a BHE, alguns mecanismos biológicos também precisam ser superados pelos fármacos, como a depuração mucociliar na traqueia, a secreção de lisozima dos ductos lacrimais, o ácido no estômago e a base no duodeno. Caso contrário, a quantidade do fármaco dispo- nível para determinado órgão-alvo, designada como biodisponibilidade (também conhecida como fração absorvida), nunca será alta o sufi ciente para que o fárma- co seja efi caz. A via de administração do fármaco, a sua forma química e certos fatores específi cos do paciente combinam-se para determinar a biodisponibilidade de um fármaco (GOLAN et al., 2009). Conforme descrito por Rang et al. (2016), a disponibilização do fármaco é dividida em quatro estágios denominados “ADME”: Absorção a partir do local de administração. Distribuição pelo organismo. Metabolização. Eliminação. FIGURA 11 – OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DA FARMACOCINÉTICA, REPRESENTADOS PELA SIGLA ADME FONTE: <https://bit.ly/2BkR0Sw>. Acesso em: 12 maio 2020. 33 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 A partir de agora você verá cada um desses estágios de forma detalhada. Iniciamos com a absorção e as formas de administração de um fármaco, além das vantagens e desvantagens da aplicação dessas vias. 4.1 VIAS DE ADMINISTRAÇÃO E ABSORÇÃO Cada novo fármaco é planejado e testado em uma forma posológica que administrada por uma via específi ca. As vias de administração são escolhidas para que o fármaco seja capaz de ultrapassar as barreiras presentes no organismo, tirando proveito das moléculas de transporte e de outros mecanismos que permitem a entrada do fármaco nos tecidos corporais. É através da via de administração que o fármaco será absorvido pelo organismo (GOLAN et al., 2009). • Via enteral (oral): constitui a via de administração mais simples. Apesar de simples, ela expõe o fármaco a ambientes ácidos (estômago) e básicos (duodeno), podendo limitar a absorção dos fármacos. Essa via oferece muitas vantagens ao paciente: é de fácil administração, além do mais, essas formas posológicas têm menos tendência do que outros fármacos a introduzir infecções sistêmicas (GOLAN et al., 2009). Um fármaco administrado por via oral deve permanecer estável durante a sua absorção pelo epitélio do trato gastrointestinal. Após ultrapassar o trato gastrointestinal, os fármacos são transportados pelo sistema porta até o fígado antes de passar pela circulação sistêmica (RANG et al., 2016). Embora a circulação porta tenha como função proteger o corpo dos efeitos sistêmicos das toxinas ingeridas, entregando essas substâncias ao fígado para destoxifi cação, esse sistema pode complicar a liberação dos fármacos (RANG et al., 2016). Todos os fármacos administrados por via oral estão sujeitos ao metabolismo de primeira passagem no fígado. Nesse proces- so, as enzimas hepáticas podem inativar uma fração do fár- 34 Bases de Farmacologia e cosmetologia maco ingerido. Qualquer fármaco que sofra metabolismo de primeira passagem signifi cativo precisa ser administrado em quantidade sufi ciente para assegurar a presença de uma con- centração efetiva do fármaco ativo na circulação sistêmica, a partir do qual pode alcançar o órgão-alvo (GOLAN et al., 2009). • Parenteral: consiste na administração direta de um fármaco através das barreiras de defesa do corpo na circulação sistêmica ou em algum outro espaço tecidual, supera imediatamente as barreiras capazes de limitar a efi cácia dos fármacos administrados por via oral (GOLAN et al., 2009). O quadro a seguir indica as formas de administração parenteral, bem como as vantagens e desvantagens da utilização dessa via de administração. QUADRO 1 – VIAS DE ADMINISTRAÇÃO PARENTERAL DE FÁRMACOS VIA PARENTERAL VANTAGENS DESVANTAGENS Subcutânea Início lento, pode ser uti- lizada para administração a base de óleo Início lento, pequenos volumes IntramuscularInício intermediário, pode ser utilizada para adminis- tração de fármacos à base de óleo Pode afetar exames laboratori- ais (creatinocinase), hemorragia intramuscular, dolorosa Intravenosa Início rápido, liberação con- trolada do fármaco Toxicidade do fármaco relacio- nada com o seu nível máximo Intratecal ou raquidiana (Aplicação no canal espinhal) Evita a barreira hemato- encefálica Risco de infecção, necessidade de um profi ssional altamente experiente FONTE: Adaptado de Golan et al. (2009) Embora as vias anteriores descritas sejam bastante utilizadas na prática clí- nica, alguns cuidados importantes devem tomados. Por exemplo, a administração subcutânea de um fármaco no tecido adiposo pouco vascularizado resulta em iní- cio de ação mais lento do que a sua injeção em espaços intramusculares bem vascularizados. A introdução direta do fármaco na circulação venosa, arterial ou no líquido cefalorraquidiano faz com que o fármaco alcance mais rapidamente o seu órgão-alvo, no entanto, possui maior risco de infecção e necessidade de ad- ministração por um profi ssional da área da saúde (RANG et al., 2016). 35 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 Em resumo, a administração por via enteral passa pelo sistema digestivo, já administração parenteral é absorvida por outros meios, na maioria das vezes, pela circulação sistêmica. • Transdérmica: os fármacos administrados por via transcutânea são absor- vidos a partir da pele e dos tecidos subcutâneos diretamente no sangue. Essa via de administração é ideal para um fármaco que precisa ser admi- nistrado lentamente e de modo contínuo por um longo período (GOLAN et al., 2009). A incorporação de um fármaco em um adesivo para ser aplicado na pele, são de uso cada vez mais frequente e diversos fármacos como estrógeno e testosterona (utilizados para reposição hormonal), nicotina (utili- zados para abstinência dessa substância) e fentanil (dor intermitente) estão disponíveis nessa formulação (GOLAN et al., 2009; RANG et al., 2016). • Sublingual: a absorção diretamente da cavidade oral às vezes é útil quando se deseja um efeito rápido, especialmente quando o fármaco é instável no pH gástrico ou rapidamente metabolizado pelo fígado. Em- bora não exista muitos fármacos com essa formulação, a buprenorfi na, indicada para o tratamento da dor, é um exemplo de fármaco comumente administrado pela via sublingual (RANG et al., 2016). • Administração retal: é utilizada para fármacos que devem produzir um efeito local ou sistêmico, embora possua uma absorção irregular. Exemplos dessa via de administração na prática clínica incluem, administração de an- ti-infl amatórios no tratamento de colite ulcerativa e diazepam em crianças em estado epiléptico. Além disso, essa via de administração pode ser útil em pacientes com quadro de vômitos ou incapazes de tomar medicamentos por via oral (por exemplo, no pós-operatório) (RANG et al., 2016). Nesta seção, foi apresentado para você as principais vias de administração utilizadas. No entanto, há administração de fármacos através de sprays nasais, colírios e administração por inalação (ge- ralmente utilizada para anestésicos). Para aprofundar seu conheci- mento sobre essas vias, sugerimos a leitura do Capítulo 3 do livro Princípios de Farmacologia: GOLAN, D. E. et al. Princípios de farmacologia: a base fi siopatoló- gica da farmacoterapia. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009. 36 Bases de Farmacologia e cosmetologia Atividade de Estudo 1 É hora de fi xar o conteúdo! A partir do que foi estudado até o momento, cite as vantagens e desvantagens de cada via de administração abordada nesta seção. 4.2 DISTRIBUIÇÃO Embora a absorção do fármaco constitua um pré-requisito para atingir níveis plasmáticos adequados desse fármaco, ele também precisa alcançar seu órgão ou órgãos-alvo em con- centrações terapêuticas para exercer o efeito desejado sobre determinado processo fi siopatológico. A distribuição de um fármaco ocorre primariamente através do sistema circulatório, enquanto o sistema linfático contribui com um componente me- nor. Uma vez absorvido na circulação sistêmica, o fármaco é então capaz de alcançar qualquer órgão-alvo. A concentração do fármaco no plasma é frequentemente utilizada para defi nir os níveis terapêuticos do fármaco e monitorá-los, visto que é difícil medir a quantidade de fármaco que realmente captada pelo órgão-alvo. Em alguns casos, a concentração plasmática de um fármaco pode representar uma medida relativamente precária de sua verdadeira concentração tecidual. Entretanto, na maioria dos casos, o efeito do fármaco no tecido-alvo corre- laciona-se bem com a sua concentração plasmática (GOLAN et al., 2009, p. 33). Alguns conceitos do processo de distribuição também já foram abordados no início desta seção e, por isso, alguns pontos devem ser relembrados: • Um fármaco pode alterar a distribuição de outro por competição por um local de ligação comum na albumina plasmática. • A absorção dos fármacos pode ser afetada pelas barreiras celulares (por exemplo: mucosa gastrointestinal, túbulo renal, barreira hematoencefáli- ca e placenta). • Alguns fármacos podem acumular-se no tecido adiposo e levar a conse- quências importantes. 37 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 4.3 METABOLIZAÇÃO Os fármacos são metabolizados através de reações enzimáticas, essas reações consistem em anabolismo e catabolismo, isto é, de construção e degradação de substâncias, respectivamente. Assim, os rins, o trato gastrointestinal, os pulmões, a pele e outros órgãos contribuem para o metabolismo sistêmico dos fármacos. Entretanto, o fígado contém a maior diversidade e quantidade de enzimas metabólicas, de modo que a maior parte do metabolismo dos fármacos ocorre nesse órgão. A capacidade do fígado de modifi car os fármacos depende da quantidade fármaco que penetra nos hepatócitos (células encontradas no fígado) (GOLAN et al., 2009; RANG et al., 2016). As enzimas hepáticas têm a propriedade de modifi car quimica- mente uma variedade de substituintes nas moléculas dos fár- macos, tornando os fármacos inativos ou facilitando sua elimi- nação. Essas modifi cações são designadas, em seu conjunto, como biotransformação. As reações de biotransformação são classifi cadas em dois tipos: as reações de oxidação/redução (fase I) e as reações de conjugação/hidrólise (fase II) (GOLAN et al., 2009, p. 36). • Reações de oxidação/redução: essa fase envolve reações de catabo- lismo, ou seja, de degradação de substâncias. Os produtos dessa degra- dação geralmente são quimicamente mais reativos, por isso, às vezes se apresentam mais tóxicos ou carcinogênicos que o fármaco original (RANG et al., 2016). O fígado é fundamental nas reações de fase 1, especialmente por conter o sistema do citocromo P450 (enzimas CYPs). Essas enzimas estão inseridas no retículo endoplasmático liso. Para chegarem a essas enzimas, os fármacos devem atravessar a membrana plasmática. Moléculas polares o fazem mais lentamente que as moléculas lipossolúveis, exceto onde existem mecanismos específi cos de transporte, e, por isso, o metabolismo intracelular é importante para fármacos lipossolúveis (RANG et al., 2016). • Reações de conjugação/hidrólise: essa fase envolve reações de anabolismo, ou seja, de construção de substâncias. As enzimas de conjugação e de hidrólise localizam-se tanto no citosol quanto no retículo endoplasmático dos hepatócitos. Na maioria dos casos, o processo de conjugação torna o fármaco mais polar. Praticamente todos os produtos conjugados são farmacologicamente inativos (GOLAN et al., 2009). Os fármacos polares são excretados em maior proporção pela urina, de for- ma inalterada. Enquanto os fármacos lipossolúveis (ou lipofílicos ou não polares) 38 Bases de Farmacologia e cosmetologia não são excretados de modo efi ciente pelo rim, pois, a maioria é reabsorvidapelo túbulo distal voltando à circulação sistêmica (RANG et al., 2016). É importante destacar que as reações de conjugação e de hidrólise não constituem, necessariamente, à última fase de biotransformação. Como a conju- gação desses componentes altamente polares ocorre no interior da célula, eles frequentemente precisam atravessar as membranas celulares por transporte ativo para serem excretados (GOLAN et al., 2009). 4.4 ELIMINAÇÃO Da mesma forma que acontece com alimentos e líquidos que, ao serem inge- ridos, são eliminados pelo organismo, também uma parte do medicamento é absor- vida e outra é eliminada. Existe um padrão de eliminação de medicamentos pelo or- ganismo, algumas substâncias são eliminadas mais rapidamente que outras e essa velocidade de eliminação depende da meia-vida de cada medicamento. Todavia, o que é meia-vida, afi nal? A meia-vida é o tempo gasto necessário para que a quantidade de uma substância se reduza a metade. Mais especifi ca- damente, quando falamos de medicamentos, dizemos que a meia-vida é o tempo gasto para que a concentração plasmática de um fármaco no organismo se redu- za à metade. A meia-vida possibilita que se obtenha uma boa estimativa do tempo gasto para que o fármaco seja removido do organismo e é dada em unidade de tempo. Por exemplo, se a quantidade que encontramos do fármaco A no orga- nismo é 100 mg e que sejam necessários 45 minutos para que essa quantidade chegue a 50 mg, a meia-vida do fármaco A é de 45 minutos. A maior parte dos fármacos deixa o organismo pela urina, inalterados ou na forma de metabólitos polares. Alguns fármacos são secretados na bile através do fígado, mas a maioria deles é reabsorvida no intestino. A eliminação pelas fe- zes também pode ocorrer, principalmente, em indivíduos com insufi ciência renal em evolução. A eliminação pelos pulmões ocorre apenas com agentes altamente voláteis ou gasosos (por exemplo: anestésicos gerais). Alguns fármacos também são eliminados em pequenas quantidades em secreções como leite (nas lactan- tes) ou suor (RANG et al., 2016). Tendo em vista que a excreção renal é a forma mais comum de excreção dos fármacos, abordaremos um tópico falando especialmente dessa via de eliminação. • EXCREÇÃO RENAL: o fl uxo sanguíneo renal representa cerca de 25% do fl uxo sistêmico total, assegurando uma contínua exposição de 39 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 qualquer fármaco presente no sangue aos rins. A taxa de eliminação dos fármacos através dos rins depende do equilíbrio das taxas de fi ltração, secreção e reabsorção de um fármaco (GOLAN et al., 2009). Conforme descrito por Golan et al. (2009), os fármacos podem ser: (1) fi ltrados no glomérulo renal; (2) secretados no túbulo proximal; (3) reabsorvidos a partir da luz tubular e transportados de volta ao sangue; e (4) excretados na urina. O equilíbrio relativo das taxas de fi ltração, secreção e reabsor- ção é o que determina a cinética de eliminação dos fármacos pelos rins. O aumento do fl uxo sanguíneo, o aumento da taxa de fi ltração glomerular e a diminuição de ligação às proteínas plasmáticas causam uma excreção mais rápida do fármaco, visto que todas essas alterações resultam em aumento da fi l- tração do fármaco no glomérulo (GOLAN et al., 2009, p. 38). FIGURA 12 – FILTRAÇÃO, SECREÇÃO E REABSORÇÃO DOS FÁRMACOS NO RIM FONTE: Golan et al. (2009, p. 38) 40 Bases de Farmacologia e cosmetologia Atividade de Estudo 1 Agora que você sabe todo o processo que o fármaco faz quando administrado, descreva brevemente sobre cada um dos proces- sos farmacocinéticos “ADME”. 2 Com o intuito de fi xar o conteúdo referente à metabolização dos fármacos, observe as sentenças a seguir e identifi que a alternati- va INCORRETA: a) ( ) O fígado é o órgão que contém a maior diversidade e quan- tidade de enzimas metabólicas, de modo que a maior parte do metabolismo dos fármacos ocorre nesse órgão. b) ( ) A enzima P450 está presente no reticulo endoplasmático liso e é fundamental nas reações de fase I. c) ( ) A fase oxidação/redução envolve reações que levam a cons- trução de substâncias. d) ( ) As enzimas hepáticas têm a propriedade de modifi car quimica- mente uma variedade de substituintes nas moléculas dos fárma- cos, tornando os fármacos inativos ou facilitando sua eliminação. Essas modifi cações são designadas como biotransformação e são classifi cadas em reações de fase I e II. O que são interações medicamentosas? Interações medicamentosas é um evento clínico em que os efeitos de um fár- maco são alterados pela presença de outro fármaco, alimento, bebida ou algum agente químico ambiental. Constitui causa comum de efeitos adversos. Quando dois medicamentos são administrados, concomitantemente, a um paciente, eles po- dem agir de forma independente ou interagirem entre si, com aumento ou diminui- ção de efeito terapêutico ou tóxico de um ou de outro. O desfecho de uma interação medicamentosa pode ser perigoso quando promove aumento da toxicidade de um fármaco. Por exemplo, pacientes que fazem uso de varfarina podem ter sangra- mentos se passarem a usar um anti-infl amatório não esteroide (AINE) sem redu- 41 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 zir a dose do anticoagulante. Algumas vezes, a interação medicamentosa reduz a efi cácia de um fármaco, podendo ser tão nociva quanto o aumento. Por exemplo, tetraciclina sofre quelação por antiácidos e alimentos lácteos, sendo excretada nas fezes, sem produzir o efeito antimicrobiano desejado. Há interações que podem ser benéfi cas e muito úteis, como na co-prescrição deliberada de anti-hipertensivos e diuréticos, em que esses aumentam o efeito dos primeiros por diminuírem a pseu- dotolerância dos primeiros. Supostamente, a incidência de problemas é mais alta nos idosos porque a idade afeta o funcionamento de rins e fígado, de modo que muitos fármacos são eliminados muito mais lentamente do organismo. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Caro acadêmico, chegamos ao fi nal do primeiro capítulo da disciplina de Bases de Farmacologia e Cosmetologia. Neste capítulo, tratamos dos principais conteúdos relacionados a farmacologia. Esperamos que você tenha aproveitado ao máximo esse conteúdo, pois ele será base de estudo para os próximos capítulos. Para facilitar seus estudos, vamos recapitular os principais conceitos que foram discutidos neste capítulo? • Para que haja uma resposta farmacológica no tecido-alvo é necessário a ligação do fármaco ao seu respectivo receptor. • Os receptores de fármacos são divididos em grupos e possuem diferentes formas estruturais que estão relacionadas com o mecanismo pelo qual o fármaco se liga a esse receptor. • Farmacodinâmica é o que o fármaco faz com o organismo. • Fármacos agonistas se ligam aos receptores e desencadeiam a resposta farmacológica. • Fármacos antagonistas se ligam ao receptor, mas não o ativam e ainda impedem a ligação do fármaco agonista. • Dentro da classe dos antagonistas, há fármacos antagonistas competitivos (reversíveis e irreversíveis) e fármacos antagonistas não competitivos. • A potência dos fármacos depende de dois parâmetros: afi nidade (a tendência do agonista de se ligar aos receptores) e efi cácia (a capacidade de uma vez ligado a um receptor, dar início a alterações que provocam efeitos farmacológicos). • Farmacocinética é o que o organismo faz com o fármaco. • Os princípios fundamentais da farmacocinética incluem: absorção, distribuição, metabolismo e excreção. 42 Bases de Farmacologia e cosmetologia • Um fármaco precisa passar por barreiras físicas, químicas e biológicas para alcançar seus locais de ação, como variações de pH do trato gastrointestinal e barreira hematoencefálica. Além disso, essas barreiras dependerão da via de administração de cada fármaco. • A absorção dos medicamentos pode ser afetada pela ligação desses fármacos a proteínas plasmáticas e acúmulo na gorduracorporal. • Os fármacos são metabolizados através de reações enzimáticas, essas reações consistem em anabolismo (reações de conjugação/hidrólise) e catabolismo (reações de oxidação/redução). • A meia-vida é o tempo gasto necessário para que a quantidade de uma substância se reduza à metade, ou seja, é o tempo gasto para que a concentração plasmática de um fármaco no organismo se reduza à metade. • Os fármacos podem ser eliminados pela urina, bile, fezes, pulmões, secreções (leite ou suor). No entanto, a excreção renal é a via mais comum. Lembre-se: a farmacologia é primordial para a formulação e aplicação de cosméticos. Bons estudos! REFERÊNCIAS DOMÍNGUEZ, B. O.; RAMÍREZ, M. H.; TECALCO-CRUZ, A. C. Receptores nucleares: del núcleo ao citoplasma. Revista especializada em Ciências Químico-Biológicas, Ciudad de México, v. 18, n. 2, p. 131-145, 2015. GOLAN, D. E. et al. Princípios de farmacologia: a base fi siopatológica da farmacoterapia. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009. JAMESON, J. L. et al. Medicina Interna de Harrison. 20. ed. Porto Alegre: McGraw, 2020. PIANETTI, G. A. Registro e autorização: atendimento aos requisitos mínimos de qualidade, efi cácia e segurança. Organização Pan-Americana na Saúde, Brasília, v. 1, n. 6, p. 1-8, 2016. Disponível em: https://bit.ly/2MePoM7. Acesso em: 12 maio 2020. RANG, H. et al. Farmacologia. 8. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016. SGARABOTTO, A. R. et al. Anestésicos locais e suas aplicações nas diferentes áreas da medicina. 2018. Disponível em: http://docs.bvsalud.org/ 43 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE FARMACOLOGIA Capítulo 1 biblioref/2018/02/879924/anestesicos-locais-e-suas-aplicacoes-nas-diferentes- areas-da-medicina.pdf. Acesso em: 12 maio 2020. SILVA, B. V. et al. Proteínas quinases: características estruturais e inibidores químicos. Química Nova, São Paulo, v. 32, n. 2, p. 453- 462, 2009. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100- 40422009000200032&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso em: 12 maio 2020. 44 Bases de Farmacologia e cosmetologia CAPÍTULO 2 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE COSMETOLOGIA A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes objetivos de aprendizagem: Compreender as principais matérias-primas e técnicas de preparo das formulações. Conhecer os ensaios realizados com os produtos cosméticos para avaliar a efi cácia, qualidade e aceitação desses produtos pelo consumidor. Realizar a análise teórica das rotulagens cosméticas a partir das propriedades intrínsecas das matérias-primas. Habilitar o aluno a entender as formulações, regulamentação, indicações e reações dos cosméticos. 46 Bases de Farmacologia e cosmetologia 47 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE COSMETOLOGIA Capítulo 2 1 CONTEXTUALIZAÇÃO Quantos fármacos e cosméticos você usa em um dia? Observe esta narração: “Ana acorda, depois de repousar a noite em seu tra- vesseiro, ainda com o aroma do amaciante de fl ores do campo na fronha. Levanta- -se e segue para o banho matinal, com seu sabonete e xampu, e sem esquecer de depois escovar os dentes com o creme dental com fl úor. Então, abre uma gaveta do seu armário, de onde retira uma cartela de anticoncepcional e vai para a cozi- nha tomar o seu café da manhã. Se delicia com uma fatia de bolo, vindo fresquinho da padaria, e o suco e pêssego em caixa e então bebe o comprimido com água. Em seguida, volta ao quarto para se vestir e se maquiar: base, rímel, batom... E, antes de sair, ainda vê na TV uma propaganda de protetor solar”. Percebeu a infi nidade de fármacos, produtos cosméticos e de higiene pesso- al que utilizamos em nosso dia a dia? Pois bem, os cosméticos apresentam um mercado com importantes avanços tecnológicos, além de despertar o interesse de milhares de consumidores, sejam eles do sexo feminino ou masculino. O mercado de cosméticos e da beleza surge com o objetivo de proporcionar prazer e bem-estar, garantindo resultados palpá- veis e, consequentemente, melhor qualidade de vida. O Brasil é o terceiro maior mercado de produtos de higiene pessoal, perfu- maria e cosméticos, atrás apenas dos Estados Unidos (1º) e Japão (2º), o que nos permite inferir que nosso país possui um grande espaço para profi ssionais da estética e também para profi ssionais que elaboram estes produtos, como farma- cêuticos, químicos, entre outros profi ssionais. Neste capítulo, veremos os conceitos básicos da área de cosmetologia; os procedimentos para declarar um cosmético efi caz e seguro; as regulamentações vigentes e as principais matérias-primas e metodologias utilizadas para a formula- ção desses produtos. 2 COSMÉTICOS Cosméticos são substâncias, misturas ou formulações usadas para melhorar ou para proteger a aparência ou odor do corpo humano (GALEMBECK; CSOR- DAS, 2009). Nesta seção inicial, compreenderemos os aspectos gerais dos cos- méticos, bem como seu surgimento e seu desenvolvimento histórico. 48 Bases de Farmacologia e cosmetologia 2.1 HISTÓRICO DOS COSMÉTICOS Existem muitos relatos históricos dos povos primitivos sobre substâncias usadas para maquiagem e embelezamento, demonstrando que, já na pré-história, existia a preocupação com a aparência. Desde aquela época, os rostos eram pintados e os corpos tatuados para agradar os deuses e afugentar os maus espíritos (GOMES; GABRIEL, 2013). A história dos cosméticos acompanhou, através dos tempos, a própria história do homem e esteve sempre ligada a sua evolução científi ca e cultural. No Egito, em tumbas com cerca de 5.000 anos, foram encontrados recipientes com materiais usados para fi ns cosméticos. Das folhas de henna os egípcios extraíam os corantes usados para colorir as palmas das mãos, as plantas dos pés, as unhas e o cabelo (HEEMANN et al., 2010). Em sarcófagos e tumbas datadas de cerca de 1400 a.C. também foram encontrados recipientes contendo preparações, segundo os historiadores, semelhantes aos cremes, incensos, óleos diversos e equipamentos para a decoração e tratamento do corpo. Cleópatra, a última rainha do Egito, representou o símbolo da cosmetologia pelos seus cuidados cosméticos (VIGLIOGLIA; RUBIN, 1991, p. 26). Os cosméticos estiveram presentes durante todas as épocas e civilizações, no Renascimento, por exemplo, os cosméticos deram ênfase a beleza da mulher, fatos que foram evidenciados em quadros de pintores famosos como o de Leonardo da Vinci. A obra Gioconda, tão referenciada e destacada na UNIASSELVI, tem como objetivo destacar a beleza das mulheres daquela época (HEEMANN et al., 2010). FIGURA 1 – OBRA GIOCONDA DE LEONARDO DA VINCI FONTE: <https://bit.ly/3h1eqg7>. Acesso em: 20 mar. 2020. 49 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE COSMETOLOGIA Capítulo 2 A Gioconda, também conhecida como Mona Lisa, é a mais notável e conhecida obra de Leonardo da Vinci, um dos mais importantes homens do Renascimento italiano. A pintura a óleo sobre madeira de álamo encontra-se exposta no Museu do Louvre, em Paris, e é uma das suas maiores atrações. Contudo, apesar dos extremos cuidados dedicados à aparência, persistia a falta de higiene e, como resultado, o odor desagradável era exalado pelas pessoas. Destacava-se, então, a grande preocupação com o preparo de perfumes. A produção de perfumes iniciou em Paris, onde até os dias atuais constitui importante fator para a economia francesa (HEEMANN et al., 2010). Já na Idade Contemporânea, a liberação feminina caracterizou maior consumo de cosméticos e a busca pela maior diversidade de produtos de beleza. Para suprir essa necessidade mercado, surgiram as indústrias fornecedoras de novas matérias-primas para cosméticos e, mundialmente, as indústrias de cosméticos fabricavam uma grande variedade de produtos, que, ao fi nal do Século XIX, consolidaram-se no mercado (VIGLIOGLIA; RUBIN, 1991, p. 29). A partir de então, modernas tecnologias em matérias-primas, embalagens, equipamentos industriais,entre outros, foram incorporados no setor. Também foi necessário aprimorar os conhecimentos sobre tecidos cutâneos, técnicas de ab- sorção, fotoproteção, bem como emulsões e nanopartículas; ainda foi necessário adquirir conhecimento técnico sobre testes de estabilidade, segurança e efi cácia (HEEMANN et al., 2010). 2.2 PRINCIPAIS DEFINIÇÕES NA COSMETOLOGIA A palavra “cosméticos” vem do grego kosméticos, relativo a adorno, prática ou habilidade de adornar. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), na Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 211, de 14 de julho de 2005, defi ne produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes como sendo: Preparações constituídas por substâncias naturais ou sinté- ticas, de uso externo nas diversas partes do corpo humano, 50 Bases de Farmacologia e cosmetologia pele, sistema capilar, unhas, lábios, órgãos genitais externos, dentes e membranas mucosas da cavidade oral, com o objeti- vo exclusivo ou principal de limpá-los, perfuma-los, alterar sua aparência e ou corrigir odores corporais e ou protege-los ou mantê-los em bom estado. Os cosméticos são produtos que não alteram as condições fi siológicas agin- do somente na epiderme (camada superfi cial da pele). Exemplos de cosméticos incluem maquiagens em geral, perfumes e hidratantes. No entanto, é comum, na área da cosmetologia, o uso de outros produtos além dos cosméticos, esses pro- dutos denominamos de cosmecêutico, nutracêutico e nutricosmético. FIGURA 2 – PRODUTOS COSMECÊUTICO, NUTRACÊUTICO E NUTRICOSMÉTICO FONTE: Pereira (2013, p. 23) 2.2.1 Cosmecêutico Quando um produto cosmético afeta de maneira considerável a funcionalidade da pele, denominamos esse produto como cosmecêutico (mistura das palavras cosmético e farmacêutico). São produtos ativos que possuem a capacidade de alterar estruturalmente a pele, ou seja, agem na camada profunda da pele – a derme. Nesse caso, o produto fi nal é um cosmético, mas com promessas de benefícios como um produto farmacêutico. O cosmecêutico tem mecanismo de ação conhecido, efi cácia comprovada e muitas vezes utilizam os mesmos 51 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE COSMETOLOGIA Capítulo 2 princípios ativos utilizados em medicamentos com ação terapêutica, porém em menores concentrações (GOMES; GABRIEL, 2013; RIBEIRO, 2010). Observe que o mecanismo de ação seria o conhecimento de onde esse cosmecêutico atua, em qual receptor ele se liga e qual a resposta desencadeada. O termo efi cácia já vimos no capítulo anterior, lembram? A efi cácia de um cosmecêutico seria a capacidade desse produto se ligar ao seu receptor. Segundo Pereira (2013, p. 23), “os cosmecêuticos enquadram-se entre os segmentos de cosméticos e farmacêuticos. Apresentam como característica serem de uso tópico, com propriedades biológicas devido à capacidade de alterar a estrutura da pele, diferentemente de cosméticos que apenas adornam a pele, mas não agem como um medicamento”. Esses produtos podem ser vendidos e manipulados prontos e não necessitam de receita médica para serem comprados. Contudo, é necessário que haja orientação de um profi ssional qualifi cado (biomédicos, farmacêuticos, entre outros profi ssionais com pós-graduação em estética), visto que cada produto/princípio ativo se adequa melhor a cada tipo de pele. Exemplos de cosmecêutico incluem: fi ltros solares, produtos utilizados para clareamento da pele (pellings), tratamento de acne, estrias, entre outros (PEREIRA, 2013). Embora vejamos esse conteúdo mais detalhado no próximo capítulo, para melhorar entendimento de onde o produto atua, veja os seguintes conceitos sobre as camadas da pele: Epiderme (camada superfi cial da pele); Derme (camada intermediária da pele); Hipoderme (camada interna da pele). 2.2.2 Nutracêutico Este segmento está atrelado às indústrias de alimentos e farmacêuticas e são defi nidos como produtos que possuem propriedades terapêuticas, incluindo prevenção ou tratamento de doenças, e, fundamentalmente, devem auxiliar na promoção da saúde e melhora do estado nutricional. Esses produtos incluem desde nutrientes isolados, suplementos dietéticos, produtos herbais até cápsulas contendo misturas de vitaminas, minerais e proteínas (PEREIRA, 2013). 52 Bases de Farmacologia e cosmetologia Todavia, é necessário ter cuidado pois, muitas vezes, o termo “Nutracêutico” é confundido com o termo alimento funcional. Veja, alimento funcional seria aquele alimento que promove mais do que uma simples nutrição, ele promove também efeitos fi siológicos benéfi cos aos consumidores (FRANCO, 2006). Já os produtos nutracêuticos são constituintes bioativos comercializados na forma de produtos farmacêuticos, como cápsulas, soluções, géis, pós e granulados. Essa variedade de produtos não pode ser verdadeiramente classifi cada como alimentos, então surgiu este termo eletivo chamado nutracêutico (LIRA et al., 2009). 2.2.3 Nutricosmético Estes produtos surgem da união das indústrias de cosméticos e alimentos. São caracterizados por possuírem propriedades antioxidantes e antienvelheci- mento e, geralmente, são formulados em forma de alimento ou suplementos (PE- REIRA, 2013). Então, qual a diferença entre produto nutracêutico e nutricosmético? O nutra- cêutico possui mais caráter terapêutico, já o produto nutricosmético é voltado para benefício da aparência. QUADRO 1 – DIFERENÇAS ENTRE COSMECÊUTICO, NUTRACÊUTICO E NUTRICOSMÉTICO COSMECÊUTICO NUTRACÊUTICO NUTRICOSMÉTICO Forma farmacêutica Formulações cosméticas (cremes e loções). Suplementos ou cápsulas, bebidas, balas, pós e granulados. Suplementos ou cápsulas, bebidas e balas. Vias de administração Tópica Oral Oral Principais aplicações Tratamento antirrugas, acne, machas, celulite, antiqueda capilar. Antioxidante, redução de colesterol, energizantes, prevenção de doenças. Antienvelhecimento, anticelulite, proteção solar, drenante, nutrição capilar, fortalecimento de unhas, cabelo e pele. FONTE: Adaptado de Pereira (2013) Embora a literatura destaque os três produtos (cosmecêutico, nutracêutico e nutricosmético) a gama de produtos dentro da classe dos cosméticos inclui várias 53 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE COSMETOLOGIA Capítulo 2 outras formulações como a fi tocosmética, em que há aplicação dos princípios ativos extraídos dos vegetais e a aromaterapia, que é baseada na inalação ou massagem de óleos essenciais (GOMES; GABRIEL, 2013). 2.3 COSMÉTICOS ECOLOGICAMENTOS CORRETOS O mercado de cosméticos orgânicos tem crescido nos últimos anos devido ao interesse de um grupo de consumidores que buscam produtos “mais verdes”, que não causem danos ao meio ambiente, além de minimizar os impactos danosos à saúde. Cosméticos orgânicos são feitos à base de produtos naturais, produzidos de forma sustentável, sem agrotóxicos ou aditivos químicos, devendo utilizar embalagens recicláveis e ecologicamente corretas (PEREIRA, 2013). Entretanto, qual a diferença de um cosmético natural e de um cosmético orgânico? O cosmético natural deve apresentar ao menos um ingrediente derivado de substância natural, extraído diretamente de uma planta, não produzido por síntese (exemplos: esfoliantes obtidos de cascas e sementes, óleos vegetais e corantes minerais). Existem também cosméticos naturais com percentuais de ingredientes orgânicos. No entanto, preste atenção! Um produto orgânico é um produto natural, mas o contrário não necessariamente é verdadeiro. O cosmético orgânico deve ter sua produção, utilização e eliminação com o menor impacto possível ao meio ambiente. Um cosmético dessa categoria pode não ser natural ou orgânico, mais do que isso, é possível que seja totalmente sintético e continuar sendo vegano. Exemplos de ingredientes veganos são a parafi na e vaselina, utilizadas para substituir a cera de abelha (ROMERO et al., 2018). No Brasil, bem como na maioria dos países, não há uma regulamentação ofi cial para produtos
Compartilhar