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JUSTIÇA e DIÁLOGO SOCIAL - compacto(1)

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1
Estado Democrático
de Direito
Samuel Vasconcelos Marques
Justiça e 
diálogo sociaL
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação
J97 
Justiça e diálogo social / Cli� Villar (organizador); Gustavo Brígido 
(coordenador); Karlson Gracie (ilustrador). – Fortaleza: Fundação Demócrito Rocha, 
2020.
192 pg. 12 fascículos : il. color.
 
 
1. Direito. 2. Poder Judiciário. 3. Democracia. 4. Direitos sociais. 5. Cidadania. I. 
Título. II. Série.
 
CDD 340
Bibliotecário: Francisco Edvander Pires Santos (CRB-3/1212)
Este fascículo é parte integrante do projeto Justiça e Diálogo Social, em decorrência do contrato 
celebrado entre a Fundação Demócrito Rocha e o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará.
Sumário
1. Introdução.................................................................................................... 4
1.1. Tripartição dos Poderes .......................................................................... 5
1.2. Da Vontade do Rei à Vontade da Lei .................................................... 8
1.3. Democracia Indireta e Democracia Direta ..........................................11
1.4. O Estado Democrático de Direito e a Constituição de 1988. ........... 13
1.5. Referências. ............................................................................................15
FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE4
1.
Introdução
A utilização do termo “Estado Democrá-
tico de Direito”, embora reiteradamente 
reproduzido no convívio social, muitas 
vezes é compreendido equivocadamen-
te diante da di� cultosa conceituação e 
das várias facetas que esse representa. 
O fato de tal termo ter sido inserido no 
texto da Constituição da República Fe-
derativa do Brasil de 1988, em seu artigo 
1º, demonstra a importância e necessi-
dade de sua compreensão, levando em 
consideração todas as consequências 
que dela podem advir.
A concepção de Estado na con-
temporaneidade é caracterizada pelo 
protagonismo do poder público, que 
se encontra praticamente em todas as 
áreas de relacionamento humano, fa-
zendo, assim, com que a expressão 
“Estado Democrático de Direito” ganhe 
uma maior notoriedade. 
O fato de tal termo ter um status 
constitucional, previsto no artigo 1º da 
Constituição da República Federativa 
do Brasil de 1988, torna obrigatória a 
sua compreensão. Entretanto, tal status 
constitucional amplia a responsabilidade 
ao interpretar tal termo, uma vez consi-
derada a natureza dinâmica da interpre-
tação constitucional, diante compreen-
são evolutiva dos dispositivos consti-
tucionais principiológicos, eliminando a 
concepção de conceito estanque.
A � uidez do termo em análise está 
relacionada aos distintos tipos de Esta-
dos existentes que serviram de in� uência 
para sua de� nição, di� cultando, assim, a 
sua generalização. Além disso, impor-lhe 
de� nição única e estanque seria des-
considerar as formulações teóricas dos 
elementos “democracia” e “direito”, haja 
vista seus conceitos convergirem para 
fundamentação de um Estado democrá-
tico de direito. O estudo do “Estado De-
mocrático de Direito” deve ser realizado 
mediante abordagem histórica, quese 
pode entender a partir de sua evolução 
no tempo e também em relação aos fa-
tos que o in� uenciaram.
5JUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIAL
A análise da evolução do Estado 
Democrático de Direito é de fundamen-
tal importância para compreensão do 
sentido que se deve empregar nos dias 
de hoje para o termo que dá nome ao 
presente escrito. O caminho a ser per-
corrido, portanto, passará pela análise 
de fatos históricos que in� uenciaram a 
conceituação de Estado Democrático de 
Direito, em relação ao desenvolvimento 
do Direito.
1.1.
Tripartição dos 
Poderes
A gênese da discussão em torno da 
separação de poderes remonta, inicial-
mente, a Aristóteles (Século IV a.C), 
aprimora-se em Locke (Século XVII d.C) 
e se propaga com Montesquieu (Século 
XVIII d.C), cuja sistematização lhe confe-
riu fama que repercute até os dias atuais.
Aristóteles foi o primeiro � lósofo a 
catalogar as diferenças básicas e agru-
par as funções estatais em três catego-
rias distintas, delineadas como função 
deliberante, função executiva e função 
judiciária. Apesar disso, não se atribui 
ao pensamento aristotélico a concepção 
separatista dos poderes, uma vez que as 
diferentes funções de governo naque-
la época ainda não permitiam que seu 
exercício fosse realizado entre órgãos 
distintos.
Posteriormente tais ideias foram 
assimiladas por John Locke e, em se-
guida, aperfeiçoadas por Montesquieu, 
considerado como o primeiro � lósofo a 
defender que o exercício das diferentes 
funções estatais deve ser atribuído a ór-
gãos distintos.
Montesquieu defendeu que a divi-
são funcional do poder necessita de uma 
real divisão orgânica, por isso, sustentou 
que as funções legislativas, executivas e 
judiciais devem ser exercidas por órgãos 
distintos, independentes e autônomos.
A teoria racionalista de Montes-
quieu, que foi base ideológica para revo-
luções liberais, não serviu estritamente 
ao desenvolvimento de bases de uma 
teoria abstrata, mas cuidou também de 
aspectos objetivos ao associar a sepa-
ração funcional à existência de órgãos 
distintos a desempenhá-las, originando 
verdadeira técnica de contenção do po-
der pelo próprio poder, haja vista que ne-
nhum dos órgãos estatais seria detentor 
de estrutura e competências para sujei-
tar os outros.
A teoria separatista serviu também 
como contribuição ao advento do cons-
titucionalismo e do Estado de Direito, 
tendo como fator determinante para tal 
compreensão a inserção do artigo 16 da 
Declaração de Direitos do Homem e do 
Cidadão de 1789, através da a� rmação 
“qualquer sociedade em que não esteja 
assegurada a garantia dos direitos nem 
estabelecida a separação dos poderes 
não tem Constituição”.
FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE6
Contudo, a aplicação de rígida sepa-
ração das funções estatais demonstrou-
-se como inviável na prática, levando em 
consideração movimentos importantes 
como as Revoluções Americana e Fran-
cesa, sobretudo diante da necessidade de 
evitar que as funções estatais se tornas-
sem independentes a ponto de se afasta-
rem de uma vontade política central.
Aliás, Montesquieu, em sua teoria 
funcional separatista, já havia alertado 
sobre esse perigo ao sugerir a adoção de 
mecanismos de controle recíproco entre 
os poderes, objetivando uma convivên-
cia independente e harmoniosa entre as 
funções estatais, na qual a independên-
cia fosse exercida por suas funções típi-
cas e a harmonia pelos mecanismos de 
controle recíproco. 
Diante disso, a noção de divisão fun-
cional do poder absoluta sofreu revisões 
até ser completamente desmisti� ca-
da. De fato, a noção de poderes abso-
lutamente independentes não sujeitos 
a qualquer tipo de ingerência externa 
di� cilmente se ambientaria a um cená-
rio cheio de complexos problemas que 
pressupõem diálogo e interatividade.
A ampliação das atividades estatais 
impôs novas formas de relacionamento 
entre os órgãos do legislativo, do execu-
tivo e do judiciário, por isso, sucedeu-se a 
doutrina da teoria dos freios e contrape-
sos, também conhecida do inglês como 
teoria do checks and balances, cuja no-
ção parte da concepção de que cada ór-
gão do poder � scaliza a atuação do outro, 
principalmente no que diz respeito à ob-
servância das diretrizes constitucionais. 
O princípio da separação dos po-
deres está expresso na Constituição da 
República Federativa do Brasil de 1988, 
em seu artigo 2º, apresentando limitação 
ao poder estatal mediante a desconcen-
tração das funções estatais. Registra-se 
importante destacar que o princípio da 
separação dos poderes está também 
inserido no rol das chamadas cláusulas 
pétreas, no artigo 60, parágrafo 4º, inciso 
III, do texto constitucional brasileiro.
JUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIAL 7
Tanto a interatividade quanto o con-
trole recíproco entre os poderes (freios e 
contrapesos) podem ser percebidos em 
diversas passagens constitucionais, a 
exemplo da que permite a participação 
do Chefe do poder Executivo no proces-
so legislativo, ora como titular da inicia-
tiva de projetos, ora como responsável 
pela sanção ou veto de tais projetos. 
Por outro lado, também se veri� cou a 
conveniência constitucional de estabele-
cer excepcionalmente a um dado poder o 
exercício de funções atípicas que, a prin-
cípio, seria função típica de outro poder. 
Daí falar-se em funções típicas e atípicas, 
realidade que traduz a divisão mais � exí-
vel das funções entre os distintos órgãos.
De tal modo, tanto o Executivo, 
quanto o Legislativo podem exercer ex-
cepcionalmente, de forma atípica, as 
funções judiciais, que são funções típi-
cas do Judiciário. Exemplo de tal pos-
sibilidade na Constituição da República 
Federativa do Brasil de 1988, está no 
julgamento de infrações administrativas 
cometidas por seus servidores em pro-
cessos administrativos disciplinares.
Contudo, destaca-se aqui a impre-
cisão técnica do termo “separação dos 
poderes”, haja vista que todos os atos 
estatais são oriundos da atuação de um 
único poder. O poder, como sabido, é 
apenas um, daí a razão de não se falar 
em divisão de poderes, mas sim em de-
sempenho harmônico das funções esta-
tais por órgãos distintos, independentes 
e harmônicos. 
Por � m, pode-se destacar que o que 
existe expressamente no texto constitu-
cional é uma divisão horizontal funcional 
entre os poderes legislativo, executivo 
e judiciário, cuja caraterística da hori-
zontalidade é resultado da ausência de 
hierarquia entre os órgãos exercentes 
de tais funções estatais, o que permite 
a operacionalização de suas competên-
cias constitucionalmente estabelecida, 
assimilando a ideia de que o princípio da 
separação dos poderes possui íntima li-
gação com o regime de governo demo-
crático e com a forma de governo repu-
blicana. Constata-se que a separação 
dos poderes é fundamental para ma-
nutenção da ordem democrática, pois 
impede a atuação prepotente do Estado 
sobre os cidadãos, delimitando a atua-
ção das funções estatais.
FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE8
1.2.
Da Vontade do Rei
à Vontade da Lei
Pretende-se nesta seção dissertar sobre 
a evolução histórica do Estado, determi-
nando sobre a passagem do Estado Ab-
solutista ao que chamamos hoje de Es-
tado Democrático de Direito, o caminho 
a ser percorrido passará por uma análise 
histórica sobre a transição dos dois tipos 
de Estado. 
Até os séculos derradeiros dá con-
siderada Idade Média não existiam Esta-
dos com poder concentrando nas mãos 
de um rei, mas sim a formação de diver-
sos reinos com o poder político dividido 
entre os senhores dos grandes feudos, 
denominados como senhores feudais.
A noção de poder centralizado, 
como já subtendido no parágrafo acima, 
então, surgiu a partir do � nal da Idade 
Média, como consequência de numero-
sas crises ligadas ao feudalismo, como 
as revoltas camponesas e a ascensão da 
burguesia. Tal contraponto gerou a con-
cepção do Estado Moderno que rompeu 
com as peculiaridades da serventia feu-
dal e com o regionalismo político. 
Em decorrência da consolidaçãodo 
Estado Moderno, surge o Estado Abso-
lutista como sistema político de Estado 
que pressupõe a centralizacão de todo 
o poder político nas mãos de uma única 
pessoa, muitas vezes denominada como 
monarca, gerando a este a titularização 
de poder absoluto e ilimitado. 
Diferentemente do que acontecia 
da Idade Média, no Estado Absolutista, 
o monarca controlava todo o poder para 
tomada de decisões da nação, o que fa-
cilitou a implementação mais simpli� ca-
das de medidas governamentais e, até 
mesmo, de um exército, pois já não se-
ria mais necessário o auxílio dos nobres 
para sua composição.
O declínio do sistema político abso-
lutista teve seu início por volta do Século 
XIX com o surgimento dos ideais ilumi-
nistas que buscavam a descentralização 
do poder político, questionando a noção 
de poder absoluto titularizado e exercido 
por um monarca, que assim era conside-
rado pela adoção da teoria da vontade 
divina, haja vista que o iluminismo pre-
gava como princípio a racionalização do 
pensamento humano. 
Com o surgimento dos ideais ilumi-
nistas e o declínio do Estado Absolutista, 
surgiu uma nova ordem de poder exercida 
pelo Estado, inspirada em princípios oriun-
dos das Revoluções Americana e Francesa, 
conhecida como Estado Liberal, que com-
batia frontalmente os ideais absolutistas. 
Os princípios norteadores do Estado 
Liberal são os da liberdade e da igualdade, 
gerando, assim, a noção de intervenção 
reduzida do Estado nas relações sociais. 
O aspecto central da ordem liberal está 
na noção de mercado natural, cuja par-
ticipação de todos é realizada com base 
nos interesses individuais de cada um, 
em substituição ao mercado arti� cial.
A racionalidade da limitação do 
poder estatal é sustentada a partir da 
concepção doutrinária dos direitos hu-
manos, direitos que não podem ser 
suprimidos pelo Estado. De tal modo, 
pode-se compreender que o cerne do 
liberalismo está na limitação do poder e 
das funções estatais. 
A limitação das funções estatais 
pode ser compreendida a partir da se-
paração dos poderes, os quais exercem 
funções independentes e realizam � s-
calizações mútuas, balanceando, assim, 
a estrutura social das funções estatais. 
Como já delineado, não há preponde-
JUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIAL 9
rância de nenhuma das funções esta-
tais sobre qualquer outra, tendo essas a 
mesma relevância na dinâmica do poder 
público. 
Na posição clássica de Adam Smi-
th (Século XVIII), o Estado Liberal, que 
interfere minimamente nas relações so-
ciais do Estado, deve exercer tal inter-
ferência somente na promoção da se-
gurança interna e externa do país, assim 
como prover obras e serviços que não 
são de interesse dos particulares, con-
forme pode ser visualizado nas seguin-
tes passagens:
“O primeiro dever do soberano é 
o de proteger a sociedade contra 
a violência e a invasão de outros 
países independentes” (SMITH, 
1776, p. 689); 
“O segundo dever do soberano é 
o de proteger, na medida do pos-
sível, cada membro da sociedade 
da injustiça ou opressão de todos 
os outros membros da mesma, 
ou o dever de estabelecer uma 
administração judicial rigorosa” 
(SMITH, 1776, p. 708);
“O terceiro dever é de criar e 
manter essas instituições e 
obras públicas que, embora 
possam proporcionar a máxima 
vantagem para uma grande so-
ciedade, são de tal natureza que 
o lucro jamais conseguiria com-
pensar algum indivíduo ou um 
pequeno número de indivíduos, 
não se podendo, pois, esper-
ar que algum indivíduo ou um 
pequeno número de indivíduos 
as crie e mantenha.”(SMITH, 
1776, p. 723)
10
 
O controle da economia pode par-
tir de poucos, o aumento substancial da 
oferta de produtos e serviços e a diminui-
ção da procura, evidenciado no crack da 
Bolsa de Nova Iorque em 1929, acabaram 
gerando falta de credibilidade ao capita-
lismo liberal e ensejo ao crescimento de 
uma ordem socialista de Estado. 
Outro fator de colaboração ao de-
senvolvimento da ordem de Estado so-
cialista foi o advento da Revolução Rus-
sa, primeira experiência de aplicação 
dos ideais do marxismo, que, além do 
questionamento surgido ao sistema ca-
pitalista, desencadearam na decadência 
do Estado Liberal, gerando ascensão ao 
Estado Social.
O socialismo surgiu, principalmente, 
como consequência da Revolução Indus-
trial, re� etido através dos efeitos sobre a 
classe operária. A tecnologia industrial ge-
rou o aumento da produção e as relações 
existentes entre mestres e aprendizes fo-
ram modi� cadas e substituídas pela noção 
de livre contratação e demissão.
Tendo em vista a decadência econô-
mica do Estado Liberal, o Estado Socia-
lista surge como alternativa para o cres-
cimento econômico do país, ao mesmo 
tempo que também serviu para garantia 
da proteção individual dos cidadãos. A 
concepção de Estado Liberal foi apoiada 
também no plano doutrinário econômico, 
a partir da teoria de John Maynard Key-
nes, teoria keynesiana, que tem como 
princípio o papel interventor do Estado 
sobre a economia. A coletividade, e não o 
indivíduo, passou a ser interesse do Esta-
do Socialista, gerando a noção do Welfare 
State (Estado de Bem -Estar Social).
Por � m, em desenvolvimento ao 
papel do Estado, in� uenciado pela uni-
versalização dos Direitos Humanos, sur-
giram os ideais do Estado Democrático 
de Direito, em que o objetivo do Poder 
Público não estava mais voltado sim-
plesmente aos interesses da coletivida-
de, mas também aos interesses de cada 
um dos indivíduos, gerando um equilíbrio 
entre a coletividade e a individualidade. 
FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE
JUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIAL 11
O Estado Democrático de Direito 
pode ser de� nido como conjunto de re-
gras jurídicas, democraticamente e dis-
cursivamente adotadas, ou seja, é uma 
compreensão de Estado que garante 
uma igualdade inclusiva, na qual todos 
os direitos fundamentais da pessoa hu-
mana são relevantes. 
O nascimento do Estado Democrá-
tico de Direito serviu para possibilitar a 
ideia de que todos os homens, indistin-
tamente, possam eleger regras para de-
limitação do contorno social do Estado. 
As regras que moldam as relações so-
ciais são frutos do consenso e da vonta-
de humana.
Os princípios defendidos pelo Esta-
do Democrático de Direito são os da li-
berdade e da igualdade. A liberdade que 
deve ser garantida mediante um absen-
teísmo do Estado e a igualdade mediante 
uma postura de presença do Estado nas 
relações sociais. Todos são considerados 
como de igual importância, pois a vonta-
de do povo é considerada soberana. Por 
isso, o Estado Democrático de Direito 
garante sua solidez, pois ele rompe com 
toda a ordem arbitrária e tendenciosa, 
visando efetivamente a uma sociedade 
melhor, sociedade onde haja inclusão e 
desenvolvimento humano e social.
1.3.
Democracia
Indireta e Direta
 A soberania popular apresenta-se como 
elemento pelo qual o Estado é considera-
do como sujeito à vontade do povo, que 
é a fonte do poder político. Está indis-
sociavelmente relacionado aos nomes 
da Escola Contratualista, como Hobbes 
(1588-1679), Locke (1632-1704) e Rous-
seau (1712-1778). Todos clamavam que 
os indivíduos, ao escolherem � rmar um 
contrato social, abririam mão, de forma 
voluntária, de alguns direitos em troca de 
proteção contra os riscos possíveis de 
um estado natural.
Para Rousseau (ROUSSEAU, 1999, 
p.51), a soberania popular é considerada 
como inalienável e indivisível, devendo 
esta ser exercida pela vontade de todos:
A soberania é inalienável (...) só 
a vontade geral pode dirigir as 
forças do Estado de acordo com 
a � nalidade de sua instituição 
que é o bem comum. Pois, se a 
oposição dos interesses partic-
ulares tornou necessário o esta-
belecimento das sociedades, foi 
o acordo desses mesmos inter-
esses que o possibilitou. É o que 
existe de comum nesses vários 
interesses que formam o víncu-
lo social e, se não houvesse um 
ponto em que todos os inter-
esses concordassem, nenhuma 
sociedade poderia existir. Ora, 
somente com base nesse inter-
esse comumé que a sociedade 
deve ser governada. 
Segundo Rousseau, não há socieda-
de se os interesses forem esparsos e não 
constituírem a vontade geral. Para o au-
tor, a restrição ao acatamento de ordens 
e leis faz com que o ser humano perca a 
sua característica, já que con� guraria a 
presença de um senhor que governa, mas 
não a de um soberano. A soberania está 
inexoravelmente relacionada ao exercício 
da vontade geral, apresentando-se como 
vontade de um corpo político. 
Porém, para Benjamim Constant 
(2005, p.16), torna-se necessário des-
tacar que a Democracia não pode ser 
considerada como um � m em si mesmo, 
haja vista que nem sempre a vontade da 
maioria é su� ciente para tornar qualquer 
ato como correto. Segundo o autor, o 
poder popular não pode ser considera-
12
do como ilimitado, haja vista que este é 
limitado frente ao direito dos indivíduos, 
bem como aos ideais de justiça. 
O princípio da soberania popular se 
manifesta tanto quando o povo, direta-
mente, faz as leis, assim como quando 
o povo elege aqueles que agem em seu 
nome e sob sua vigilância imediata. O en-
tendimento central apresenta-se como a 
ideia de que a legitimidade do governo 
deve estar fundada no consentimento 
dos governados. Tratando-se a sobe-
rania popular como elemento básico da 
maioria dos governos democráticos. 
Trata-se de noção elencada pelo 
ideal de Estado Democrático de Direi-
to, em contraposição ao absolutismo, a 
adoção de um regime de governo que 
permite ao povo a observância de sua 
vontade. Sendo notório perceber que 
quanto maior for o protagonismo do 
povo, mais fortalecido será o regime de-
mocrático, implicação esta que não en-
sejaria no enfraquecimento dos elemen-
tos de representação política. De acordo 
com essa realidade, apresentam-se os 
institutos de exercício da democracia 
direta, como expressão da democracia 
participativa.
Sobre tal aspecto, surge a neces-
sidade de pensar na representatividade 
e sua transformação, de modo que ga-
ranta a qualidade da democracia, apre-
sentando-se como recon� guração da 
representatividade política por meio de 
alguns institutos jurídicos permissivos da 
FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE
13JUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIAL
participação popular, elencando, assim, 
uma noção de representatividade assu-
mida pelos atores populares no exercício 
das funções políticas. 
No Brasil, a Constituição Federal de 
1988 consagra dentre os Fundamentos 
da República Federativa do Brasil (art. 
1º), o princípio da Soberania, elencada no 
parágrafo único do mesmo dispositivo 
constitucional como Soberania Popular, 
noção que atribui ao povo a titularidade 
do Poder. A soberania popular será exer-
cida pelo sufrágio universal e pelo voto 
direto e secreto, com valor igual para to-
dos, e, nos termos da lei, mediante ple-
biscito, referendo e iniciativa popular.
Além dos mecanismos tradicio-
nais de exercício da democracia direta, 
também se encontram na Constituição 
Federal de 1988 outras prerrogativas 
relacionadas ao exercício da cidada-
nia, que diz respeito à efetivação dos 
direitos políticos, como a Ação Popu-
lar, remédio constitucional que exige 
a comprovação da regularidade no 
exercício dos direitos políticos para sua 
impetração. Apresentando-se como 
instrumento que efetiva a noção de So-
berania Popular, inclusive sobre os atos 
administrativos praticados.
A participação popular, presente no 
ordenamento jurídico brasileiro e fomen-
tada pelas fontes teórico-doutrinárias 
sobre o assunto, tem sido desenvolvida 
por meio das experiências obtidas du-
rante o movimento de redemocratização 
do País. Tal percepção é delineada por 
Santos (2011, p. 90): “É por esse proces-
so de continuidade e rea� rmação que 
a vivência democrática de um Estado e 
sua comunidade deve ser analisada, de 
modo a veri� car a a� rmação sucessiva 
de direitos e garantias”.
Nesse sentido, percebe-se que o 
povo, como titular do poder político, en-
contra ao seu alcance a responsabilidade 
pelo exercício da democracia direta (par-
ticipativa) e democracia indireta (repre-
sentativa) na determinação da vontade 
geral da nação, bem como no exercício 
do controle sobre os atos praticados pela 
Administração Pública, que é exercida 
pelos agentes políticos eleitos e outros 
agentes administrativos. 
1.4.
O Estado 
Democrático 
de Direito e a 
Constituição 
de 1988
Com a consolidação da ordem constitu-
cional diante da promulgação da Consti-
tuição da República Federativa do Brasil 
de 1988, constituiu-se o Estado Demo-
crático de Direito no direito brasileiro, 
consagrando em seu artigo 1º os princí-
pios fundamentais da soberania, cidada-
nia, dignidade da pessoa humana, valo-
res sociais do trabalho e da livre iniciativa 
e o pluralismo político. 
A concepção de Estado Democrá-
tico de Direito na Constituição Fede-
ral brasileira, por sua vez, não signi� ca 
apenas a reunião dos princípios do Es-
tado de Direito e do Estado Democrá-
tico, mas também a realização de um 
conceito que quali� ca o Estado de “de-
mocrático”, irradiando esse valor sobre 
toda a estrutura organizacional dos en-
tes da federação brasileira.
A democracia que o Estado Demo-
crático de Direito realiza tem que ser 
considerada como processo de con-
vivência social fundamentada em uma 
sociedade livre, justa e solidária, como 
explicitada nos objetivos da República 
Federativa do Brasil (artigo 3º), em que 
o Poder emana do povo e deve ser exer-
cido com base nos anseios desse, como 
base à democracia.
FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE14
O princípio democrático então se re-
laciona com o direito de sufrágio, e este 
se conforma pelos princípios da univer-
salidade (em relação ao voto e à elegibi-
lidade), da imediaticidade (o cidadão dá a 
primeira e a última palavra), da liberdade 
de voto (que também se revela no princí-
pio do voto secreto), da igualdade de voto 
(mesmo peso e mesmo valor de resulta-
do), da periodicidade e da unicidade.
No Brasil, com a introdução da con-
cepção de Estado Democrático de Direi-
to, nos moldes das Constituições france-
sa e espanhola, em que o império da lei é 
fundamentado, a justiça social deve res-
peitar também a pluralidade do indivíduo, 
abrangendo as liberdades econômicas, 
sociais e culturais.
O Estado de Direito nos dias atuais 
tem um signi� cado mais amplo e de fun-
damental importância, presente no desen-
volvimento das sociedades, como um pilar 
de respeito à lei. Sendo um importante pa-
radigma para as bases da democracia oci-
dental. Os novos parâmetros substantivos 
que permeiam a conformação do Estado 
Democrático de Direito contemporâneo 
reintroduzem a consideração dos � ns e 
valores que a sociedade e o Estado devem 
promover para o bem de uma sociedade.
JUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIAL 15JUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIALJUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIALJUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIALJUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIALJUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIALJUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIALJUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIALJUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIALJUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIALJUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIALJUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIALJUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIALJUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIAL 1515
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15JUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIAL
FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE16
Apoio Realização
SAMUEL VASCONCELOS MARQUES (autor)
Mestre em Direito Constitucional nas Relações Públicas. Bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza. Professor de 
Direito Constitucional e Direitos Humanos. Advogado (OAB/CE nº 35.187) e consultor jurídico. Membro do Grupo de Pesquisa 
Relações Econômicas, Políticas e Jurídicas na América Latina (REPJAL).
KARLSON GRACIE (ilustrador)
Nasceu em Paulista, Pernambuco. Desenha desde criança. A arte e a leitura estiveram sempre presentes em sua vida. Filmes, 
desenhos animados, histórias em quadrinhos e videogames eram inspirações para desenhar. Integra o Núcleo de Design (NDE) 
da Fundação Demócrito Rocha, onde faz o que mais gosta: imaginar, criar e ilustrar.
Antônio Jorge Pereira Júnior
Justiça e 
diálogo sociaL 2
A importância 
da Justiça 
na Democracia
Sumário
 1. A importância da Justiça na Democracia ..........................................................20
 1.1 Duas acepções de Justiça e sua conexão com a democracia .......................20
 2. Acesso à justiça e desenvolvimento social .......................................................26
 2.1. Três categorias de Justiça: Comutativa, Distributiva e Legal .........................26
 3. Mecanismos de participação popular .................................................................28
 3.1. Mecanismos de participação popular no Poder Executivo .............................28
 4. Imparcialidade e efetividade na prestação jurisdicional ..................................29
 4.1. Os limites hermenêuticos do magistrado ..........................................................29
 Referências ..............................................................................................................31
1. 
A importância 
da Justiça na 
Democracia
1.1. 
Duas acepções 
de Justiça e sua 
conexão com a 
democracia
“Justiça” é termo equívoco, tendo diver-
sas conotações. Vale examinar dois de-
les. Enquanto virtude, justiça é o hábito 
de dar a cada pessoa o que lhe é devido. 
Uma predisposição da vontade que pau-
ta a conduta e aperfeiçoa o seu autor, in-
clinando-o a agir conforme a dignidade 
humana. O ato de justiça se manifesta 
como um ato livre, ou seja, de autodeter-
minação ao bem.
A justiça é a virtude social por ex-
celência. Por ela, cada pessoa respeita a 
ordem da divisão dos bens entre os indi-
víduos, garantindo-lhes o gozo pacífico 
do que lhes pertence, sejam as coisas 
dispostas pela natureza ou repartidas 
mediante pactos condizentes com a dig-
nidade humana. 
FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE20
Assim, quando uma pessoa contra-
ta com outra, se o acordo está dentro de 
parâmetros razoáveis e conforme à digni-
dade humana, é justo que o compactua-
do seja cumprido. Esse procedimento de 
respeito ao que cabe a cada um está na 
base de todas as relações sociais, a partir 
das quais surgem direitos e deveres.
Justiça natural 
e lei positiva
Muitas vezes as divisões e atribui-
ções de deveres decorrem de situações 
derivadas da natureza dos acontecimen-
tos. Por exemplo, é de justiça natural que 
o pai ou mãe cuidem do filho; mas tam-
bém é justo por lei positiva, uma vez que 
se fez constar assim do direito posto; 
também é de justiça natural que o Esta-
do zele pelo bem comum, que igualmen-
te é prescrito pela lei. O direito positivo 
torna mais fácil a realização daquilo que 
é devido, na medida em que esclarece as 
regras de convivência consideradas es-
senciais à viabilidade e sustentabilidade 
da vida social.
JUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIAL 21
Também é próprio do direito positivo 
definir, mediante lei — que é sobretudo 
ferramenta política, ou seja, para gover-
nar —, regras para situações indiferentes 
e estabelecer critérios para casos de la-
cuna ou de conflitos entre normas. Tal é 
a importância do direito positivo, que sua 
própria existência responde a uma ne-
cessidade de direito natural.
É um erro, conceitual e filosófi-
co, estabelecer uma oposição de raiz 
entre o direito natural e o direito posi-
tivo 1. Já Aristóteles e Tomás de Aqui-
no explicavam a plena harmonização e 
1 “Para Aristóteles, as duas fontes do di-
reito: direito natural e positivo, são com-
plementares. Aristóteles é um defensor 
das leis positivas, reconheceu sua ne-
cessidade, descreveu suas fontes e ava-
liou sua autoridade.
“O justo natural é incapaz de nos con-
duzir a soluções concretas, seu estudo 
compreende o primeiro estágio da elabo-
ração do direito (especulativo), nos pro-
porciona apenas matéria que nos resta 
informar. Os princípios vagos e gerais que 
podem ser extraídos do justo natural não 
são suficientes para nos dar soluções 
concretas, é preciso decidir um determi-
nado pedido, para determinado autor, em 
determinado Estado, com determinada 
cultura, fatos que exigem a intervenção 
do legislador e do juiz. (...)
“Em “Retórica”, Aristóteles nos fornece 
dois motivos para confeccionar leis es-
critas e para preferir sua solução ao justo 
natural, que é vago e impreciso. A primei-
ra razão é que não se poderia deixar toda 
a tarefa ao juiz (observar o justo natural e 
dele extrair leis que se amoldem ao justo 
particular), visto que seria mais fácil em 
uma pólis encontrar alguns legisladores 
filósofos, mais cultos que guiem a socie-
dade, do que uma grande quantidade de 
juízes com as mesmas qualidades. Em 
segundo, porque é preciso desconfiar da 
imparcialidade dos juízes, cujo julgamen-
to pode ser levado pela simpatia ou pelo 
temor. A lei constitui inteligência sem 
paixão.
“Assim, o direito positivo ocupa um lu-
gar fundamental nas fontes do direito tal 
como disposta pelo estagirita. 
“As leis positivas são necessárias em 
razão da própria natureza do homem: 
homem social destinado à ordem políti-
ca. Além do seu conteúdo repressivo e 
permissivo, é responsável por criar novas 
obrigações entre homens na pólis.
“O direito positivo é um prolongamento 
dodireito natural, fruto da razão nesse 
sentido, mas também, da vontade huma-
na, na medida em que o poder legislati-
vo apresenta-lhe concretude, conteúdo 
fixo, objetivo e preciso”. Cf. ZAKIA, Maria 
Lucia Perez Ferres. Equidade como pa-
râmetro do justo: a passagem do logos 
teórico ao logos prático no raciocínio 
jurídico. Dissertação em Filosofia do 
Direito. Pontifícia Universidade Católica 
de São Paulo - PUC-SP, 2016 p. 39-40.
complementariedade de ambos. Surge 
oposição apenas quando acontece de 
se pretender usar do aparato legislativo 
para manipular o poder estatal e criar lei 
em benefício de alguns, ao tempo em 
que prejudica outros. Por isso, o exame 
de conformidade da lei à “justiça mate-
rial”, comumente passa por seu contras-
te com o “justo natural”, ao qual nunca 
deveria contrariar. Isso foi recordado e 
reforçado ao fim da Segunda Grande 
Guerra, quando réus nazistas tentavam 
defender-se nos Tribunais internacionais 
alegando estrito cumprimento da lei ale-
mã. Os julgadores afirmaram existir uma 
lei e um direito que estariam acima do 
direito positivo dos alemães, e que os re-
feridos réus poderiam reconhecer como 
de valor universal, ao qual seu direito po-
sitivo deveria estar conforme. 
FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE22
 
Justiça material e 
Justiça institucional
Desde tempos remotos também se 
chama de “Justiça” a estrutura do po-
der estatal especializada na função de 
prevenir ou remediar situações em que 
a justiça concreta é ameaçada ou rom-
pida. Nesse sentido, a “Justiça” está en-
carregada de administrar as colisões de 
direito, reais ou aparentes, e de se pro-
nunciar sobre o direito dos envolvidos – 
de onde “dizer o direito” ou “jurisdictio” 
—, bem como determinar que sua deci-
são seja cumprida, mediante coerção, se 
necessário, uma vez que o Estado exerce 
o monopólio do uso da força a ser em-
pregada para que suas determinações 
sejam obedecidas.
O descumprimento da “justiça” 
concreta ou material, se não corrigido, 
inviabiliza a vida em sociedade. A injus-
tiça é desagregadora, sendo ela mesma 
fruto de um abuso ou violência, que por 
sua vez se irradia no meio social. “Sem 
justiça, não há paz social. Logo, não ha-
veria convivência e nem mesmo o Esta-
do Democrático de Direito que, no fim, 
nada mais é do que um Estado regido e 
garantidor da justiça”. 
Em sentido amplo, “a despeito da 
especialização funcional atribuída ao 
Poder Judiciário, tanto o Executivo, me-
diante políticas públicas, como o Legisla-
tivo, por meio da viabilização normativa, 
trabalham para a Justiça” (PEREIRA JÚ-
NIOR; BRITO, 2017).
 
Conexões da justiça 
com a democracia
A democracia tem relação com a 
justiça por várias conexões. 
Entre os diversos elementos consti-
tuintes do conceito de “democracia”, ao 
longo da história, comumente se evocam 
três: a participação popular nos assuntos 
do Estado mediante voto, desde a Grécia 
antiga; a limitação do poder absoluto dos 
governantes e a proteção dos cidadãos 
JUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIAL 23
contra a ingerência abusiva das 
autoridades públicas em sua vida 
privada, em geral desde a Magna 
Carta inglesa até o estabeleci-
mento de direitos fundamentais 
nas Constituições; a repartição, 
atribuição ou reconhecimento 
de novas competências ao cidadão, em 
âmbitos outrora reservados ao Estado e 
seus agentes. Esses três elementos se 
alinham no protagonismo progressivo 
da participação do cidadão na gestão 
do bem comum. Deve-se notar que es-
tão vinculados à repartição de poderes, 
de bens e ao gerenciamento do interes-
se público. Tudo isso precisa acontecer 
“conforme a justiça” para que haja de-
mocracia e não demagogia.
Com relação às três situações acima 
descritas, é possível associá-las ainda às 
notas mais relevantes que a “democracia” 
assumiu em cada uma das Constituições 
do Brasil durante sua respectiva vigência. 
Pode-se dizer que o conceito de de-
mocracia busca traduzir um status de or-
ganização da vida social mediante o qual 
se garante a máxima liberdade de ação 
individual para realização de interesses 
particulares e participação do cidadão 
na definição e gestão de interesses pú-
blicos. Naturalmente, em cada época 
e período haverá uma democracia 
possível, vinculada mesmo à maturi-
dade do povo que a vivencia. “A De-
mocracia ... não se resume 
num quadro institucional 
rígido, universalmente vá-
lido, para todas as épocas 
e para todos os povos [...]. 
Ela pode e deve ser ajustada para cada 
caso, para cada nação, para cada tem-
po” (FERREIRA FILHO, p. 133).
Há atores e fatores de ordem polí-
tica, jurídica, social, econômica, históri-
ca e cultural que influenciam os hábitos 
democráticos, individuais e coletivos, em 
cada época e lugar. Em cada meio viceja 
um determinado tipo de vivência da de-
mocracia. Em razão disso, ao olhar para 
a História é possível reconhecer que o 
conceito de democracia tende a assumir 
um determinado viés como nota prepon-
derante em cada etapa e lugar, segundo 
as circunstâncias de seu tempo e am-
biente. De modo geral, ela tende a ma-
nifestar um papel principal de natureza 
política, jurídica ou principiológica.
Segundo Jaqueline Saiter (2005), 
sob as Constituições de 1824, 1891, 1934 
e 1937, a democracia no Brasil foi enten-
dida como “modalidade de regime po-
lítico”, tendo preponderado assim uma 
perspectiva “política”. Nas Constituições 
de 1946, 1967, e na Emenda Constitucio-
nal de 1969, ela teria sido ampliada, as-
sumindo a nota de “direito fundamental”; 
ou seja, teria adotado um caráter jurídi-
co como elemento configurador princi-
pal, sem perder sua referência anterior. 
Na Constituição de 1988, por sua vez, a 
democracia avançaria para uma pers-
pectiva maior, sem deixar de exprimir as 
concepções antecedentes. Ela alcança-
ria um matiz principiológico, sendo con-
siderada “princípio constitucional” que 
se subdividiria em outros: no princípio 
democrático representativo e no princí-
pio democrático participativo 2. Isso fa-
cilitaria chegar ao quadro de maior atua-
ção do cidadão na gestão do poder e dos 
interesses públicos, com protagonismo, 
para além da democracia representativa.
Dentro da perspectiva do “princípio 
democrático participativo”, a partir de 
1988 se vislumbra o crescimento paula-
tino da participação do cidadão nos três 
níveis de Poder do Estado: executivo ou 
administrativo; legislativo e judiciário. 
Dizia Franco Montoro em 1974 que 
“A condição humana não permite que os 
membros da comunidade sejam consi-
derados e tratados simplesmente como 
“objeto” passivo das atenções dos gru-
pos dirigentes, como se fossem mer-
cadoria, ficha ou peça na vida social”. 
Completava o saudoso professor com 
uma exortação que ganharia corpo na 
Constituição de 1988, ao sublinhar que 
sua “dignidade de pessoa exige outro 
tratamento”. 
2 “O primeiro limita-se a estabelecer os 
métodos clássicos de participação po-
pular, que envolve o exercício do direito 
de voto. Nesse tópico, são estudados 
os princípios da soberania popular, da 
representação popular, assim como o 
direito de sufrágio e o sistema eleitoral. 
Pode-se, assim, verificar que a acepção 
clássica do princípio democrático pro-
move uma participação popular, mas 
ainda muito restrita diante da promovida 
pela sua nova acepção.
“O segundo permite vislumbrar exata-
mente a ampliação que a democracia 
sofreu ao assumir uma dimensão prin-
cipiológica. Nesse momento, a análise 
do principio democrático exige uma as-
sociação ao princípio da participação 
popular. Afinal, trata-se do princípio de-
mocrático participativo e, portanto, ele 
estabelece uma ampliação na participa-
ção popular.
“A associação entre os referidos prin-
cípios acaba por construir outros três 
subprincípios: o princípio da participação 
legislativa, o princípio da participação ad-
ministrativa e o princípio da participação 
jurisdicional. Trata-se de extensão da 
participação popular às divers as áreas 
de atuação desenvolvidas pelo Estado: 
legislativa, executiva ejurisdicional. Ao 
se permitirem essas novas modalidades 
de participação, implementa-se uma 
ampliação do instituto democrático”. 
(SATIER, p.17)
Em razão disso, concluía que “de-
senvolvimento propriamente humano só 
é aquele que é feito com a “participação” 
consciente e responsável das pessoas 
e grupos que integram a comunidade 
(MONTORO, 1974. p. 43). 
FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE24
 
Redemocratização e 
valorização do cida-
dão na Constituição 
de 1988
No Brasil, a presença maior do cida-
dão no exercício de poderes outrora re-
servados com exclusividade aos agentes 
públicos é resultado da redemocratização 
da segunda metade dos anos 1980, que 
culminou na Constituição Federal de 1988. 
A Constituição de 1988 trazia em 
seu bojo um programa de descentraliza-
ção do poder estatal e de repartição dele 
com o cidadão. Por isso, na década de 
1990 se observará a primeira etapa da 
construção dos fundamentos necessá-
rios para implementar a ordem consti-
tucional inaugurada em 1988, e viabilizar 
maior ação do cidadão no cenário polí-
tico, em sentido amplo. Nesse período 
estabeleceram-se bases doutrinárias e 
legais para consolidar o Estado Demo-
crático de Direito projetado na Norma 
Fundamental, para que se traduzisse 
em maior poder ao cidadão para a ges-
tão dos interesses públicos. Também se 
assistiu à sedimentação dos “interesses 
difusos e coletivos”; à difusão da “co-
gestão de interesses públicos com os 
cidadãos”, em colaboração com agentes 
estatais, mediante delegação ou com-
partilhamento de poderes com “leigos”. 
Produtos dessa nova etapa de-
mocrática seriam, ainda, na década de 
1990, por exemplo, o Código de Defesa 
do Consumidor, o Estatuto da Criança 
e do Adolescente, ambos de 1990, a Lei 
de Arbitragem e a Lei que criou os Jui-
zados Especiais Estaduais, ambas de 
1996. Nessas leis é possível reconhecer 
o fortalecimento do cidadão, tanto por 
sua maior proteção, quanto pelo cha-
mado a estar presente sob novas formas 
na gestão e administração estatal, bem 
como na resolução de conflitos jurídicos 
(PEREIRA JÚNIOR, 2019). 
Em paralelo, após a promulgação 
da Constituição, majorou a quantidade 
de organizações não-governamentais e 
de entidades públicas mistas – conse-
lhos -, compostas simultaneamente por 
cidadãos e agentes estatais. Por meio 
delas, entidades civis e cidadãos atuam 
com poder consultivo ou deliberativo 
dentro de órgãos estatais, assim como 
por meio de entidades de pressão que 
detêm competências concorrentes com 
as do Estado. Tudo isso vai redundar em 
maior acesso à justiça, nos dois sentidos 
expressos, formal e material, em razão 
de maior difusão de direitos e multiplica-
ção de meios para protegê-los. 
Vale chamar especial atenção ao 
fato de que, a partir de 1996, com a Lei 
da Arbitragem e a Lei dos Juizados Es-
peciais, com juízes leigos, começaria 
também a democratização do poder 
jurisdicional, marcos da evolução da 
democracia que sinaliza e favorece o 
desenvolvimento social de um povo. A 
cultura e o progresso dos meios alter-
nativos de resolução de conflitos, como 
arbitragem, conciliação e mediação te-
riam aqui seu nascedouro institucional 
(PEREIRA JÚNIOR, 2019, p. 658-667).
Naturalmente Estados centraliza-
dores tendem a reservar para si exces-
so de atribuições e, logo, dificilmente 
JUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIAL 25
conseguem sustentar-se de modo con-
veniente e perdurável, sem um siste-
ma fiscal e de controle que termine por 
reduzir a liberdade dos cidadãos. Isso 
afetará a elasticidade da democracia, 
posto que reduz a autonomia do cida-
dão, e a reserva legal de competências 
excessivas ao Estado tende a infirmar o 
papel das entidades intermediárias e a 
atuação mais livre por parte do cidadão. 
Por outro lado, ao não atender satisfato-
riamente as competências assumidas e 
não permitir que cidadãos ou sociedades 
menores atuem, o Estado se torna fonte 
de injustiças. Logo, ele termina por invia-
bilizar a própria democracia em alguma 
de suas virtualidades, ao reduzir a ação 
do cidadão em prol do bem comum.
Nesse sentido, o movimento de re-
conhecimento ou atribuição de pode-
res ao cidadão na gestão de interesses 
públicos e na resolução de conflitos 
é fenômeno corretivo da concentra-
ção de competências pelo ente esta-
tal, quando tal circunstância se mostra 
fonte de injustiças. 
O princípio da subsi-
diariedade na redemo-
cratização
Por trás do movimento de descen-
tralização do poder e de fortalecimento 
do cidadão é possível reconhecer, assim, 
a atualização de um princípio de ordem 
social que permeia inúmeros dispositi-
vos da Constituição de 1988: o princí-
pio da subsidiariedade. O conceito 
foi propalado de modo especial 
pela doutrina social católica e 
pode ser lido na encíclica Quadra-
gesimo anno, de Pio XI, de 1931 3. 
O excesso de competências para o 
Estado gera desequilíbrio nas contas e 
prestações estatais, com consequências 
gravosas para a vida em sociedade. Aqui 
se compreende de modo preclaro a má-
xima da subsidiariedade: aquilo que os 
indivíduos ou sociedades menores têm 
aptidão para realizar por conta e inicia-
tiva próprias, que eles possam fazê-lo, 
sendo-lhes reconhecida e respeitada 
a competência preferencial, pois são a 
fonte e os protagonistas dos poderes 
estatais, e não o contrário 4. 
A correção do excesso de poder 
estatal, programado pela Constituição 
Federal de 1988, atualiza-se nos princí-
pios de descentralização do poder, de 
valorização da livre iniciativa e de con-
vocatória do cidadão para a cogestão do 
poder público. Isso se expressa, dentre 
outros exemplos, na revalorização das 
organizações não governamentais; nos 
conselhos públicos políticos com pre-
sença paritária de cidadãos; nos conse-
lhos gestores compostos por cidadãos 
eleitos; na liberdade de constituição de 
árbitros em substituição aos juízes; na 
possibilidade de negociação processual 
em qualquer etapa; no estímulo estatal 
à mediação e conciliação; nas parce-
rias público-privadas, etc. Dessa forma, 
poderá o Estado melhor aplicar recur-
sos públicos nas situações em que haja 
efetivamente maior necessidade de sua 
ação, compartilhando tarefas com os ci-
dadãos 5. Sem isso, ou seja, sem contar 
com o cidadão e a sociedade civil para a 
realização de inúmeras tarefas, o Estado 
centralizador será artífice de injustiças, 
pois não entregará o que assumiu, ou o 
fará com demora, o que equivale tam-
bém à omissão.
2.
Acesso à justiça e 
desenvolvimento 
social
A justiça é requisito do desenvolvi-
mento social. A injustiça, por sua vez, 
quebra a coesão social e gera instabi-
lidade, elementos necessários para o 
progresso. Assim, a justiça é elemento 
3 No trecho que segue é possível vislum-
brar um diagnóstico e uma proposta de 
solução para o que se passaria ainda na-
quele quadrante histórico no Brasil e em 
outros Estados: “Ao falarmos na reforma 
das instituições temos em vista sobre-
tudo o Estado; não porque dele só deva 
esperar-se todo o remédio, mas porque o 
vício do já referido «individualismo» levou 
as coisas a tal extremo, que enfraquecida 
e quase extinta aquela vida social outrora 
rica e harmonicamente manifestada em 
diversos gêneros de agremiações, quase 
só restam os indivíduos e o Estado. Esta 
deformação do regime social não deixa 
de prejudicar o próprio Estado, sobre o 
qual recaem todos os serviços das agre-
miações suprimidas e que verga ao peso 
de negócios e encargos quase infinitos”. 
(PIO XI).
4 “Verdade é, e a história o demonstra 
abundantemente, que, devido à mudan-
ça de condições, só as grandes socieda-
des podem hoje levar a efeito o que antes 
podiam até mesmo as pequenas; per-
manece contudo imutável aquele solene 
princípio da filosofia social: assim como é 
injusto subtrair aos indivíduos o que eles 
podem efetuar com a própria iniciativa e 
indústria, para o confiar à coletividade, 
do mesmo modo passar para uma socie-
dade maior e mais elevada o que socie-
dades menores e inferiores podiam con-seguir, é uma injustiça, um grave dano e 
perturbação da boa ordem social. O fim 
natural da sociedade e da sua ação é co-
adjuvar os seus membros, não destruí-
-los nem absorvê-los”. Cf. PIO XI
5 Deixe pois a autoridade pública ao cui-
dado de associações inferiores aqueles 
negócios de menor importância, que a 
absorveriam demasiado; poderá então 
desempenhar mais livre, enérgica e efi-
cazmente o que só a ela compete, porque 
só ela o pode fazer: dirigir, vigiar, urgir e 
reprimir, conforme os casos e a neces-
sidade requeiram. Persuadam-se todos 
os que governam: quanto mais perfeita 
ordem hierárquica reinar entre as varias 
agremiações, segundo este princípio da 
função « supletiva » dos poderes públi-
cos, tanto maior influência e autoridade 
terão estes, tanto mais feliz e lisonjeiro 
será o estado da nação.” (PIO XI)
FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE26
básico para viabilizar tanto a democra-
cia quanto o desenvolvimento social 
sustentável. Por isso deve ser garanti-
da e protegida.
2.1. 
Três categorias de 
Justiça: Comutativa, 
Distributiva e Legal
O desenvolvimento social se consolida 
quando as relações sociais fluem con-
forme a dignidade e a natureza social e 
individual do ser humano, em conformi-
dade com o que é próprio de sua condi-
ção. Nesse contexto, há três acepções 
clássicas para as relações de justiça se-
gundo as peculiaridades das situações 
por elas criadas: justiça comutativa, jus-
tiça distributiva e justiça legal.
A Justiça Comutativa e a Justi-
ça Distributiva abrangem relações nas 
quais importam algumas particularidades 
e subjetividade das partes envolvidas. 
Por isso se diz que são modalidades de 
“justiça particular”. Enquanto isso, há si-
tuações nas quais interessam menos as 
especificidades das partes e há prepon-
derância do ente estatal como sujeito na 
relação. Neste sentido, as relações se 
destacam pelo dever dos cidadãos co-
laborarem com o Estado, para que este 
possa agir em prol do bem comum. As 
relações que envolvem prestação do ci-
dadão perante o Estado estão classifica-
das como de “Justiça legal”.
A “Justiça distributiva” é aquela na 
qual o ente estatal deve, tal como sugere 
o termo, “distribuir” bens conforme uma 
proporcionalidade razoável, orientada 
pelas necessidades dos cidadãos, a par-
tir do montante arrecadado pelo esforço 
colaborativo dos cidadãos, mormente 
por meio de impostos, taxas e demais 
modalidades tributárias. 
O Estado deve primeiro atender às 
demandas gerais e comuns de todos 
para depois servir às necessidades pe-
culiares de cada um, sem sacrificar o 
“mínimo necessário” da maioria, para 
salvaguardar direitos excepcionais de 
minorias. É fato que nem sempre há bens 
suficientes para todas as demandas. 
Disso nasce o dever de a autoridade 
avaliar com prudência a quem, como e 
quando atender em face da escassez, e 
saber lançar mão, quando oportuno, do 
conceito de “reserva do possível”, invo-
cado quando o magistrado precisa de-
cidir uma lide em face de necessidades 
prementes e preterir interesses em ra-
zão do conflito inconciliável entre tais. 
Em razão da limitação de recursos, 
nem todos os interesses poderão ser 
igualmente contemplados ou aprecia-
dos na mesma medida. 
É comum de ocorrer quando alguém 
pleiteia do ente federativo, por exemplo, 
em nome do direito à saúde, medica-
mento cujo valor ultrapassa limites de 
gastos previstos no orçamento público 
de Saúde da respectiva circunscrição, 
que contempla despesas com remédios 
variados para atender necessidades de 
grande contingente populacional. As-
sim, ao determinar o magistrado que se 
dê atenção e se direcionem recursos ao 
tratamento mais caro para atender de-
terminado interesse, pode ele gerar ris-
co de deixar a descoberto maior grupo 
de cidadãos, que gozam igualmente do 
direito à saúde. A insuficiência dos re-
cursos impõe, nesses casos, um duro e 
difícil juízo. Portanto, a justiça distributiva 
deve ser aplicada com vistas ao que seja 
possível, para atender a quem precisa, 
sem prejudicar, por isso, maiores contin-
gentes populacionais.
Por Justiça legal, por fim, tem-se 
aquela de natureza geral, que impõe 
deveres na relação dos cidadãos com o 
Estado, permanecendo todos igualmen-
te obrigados a colaborar, segundo pa-
drões objetivos e comuns, em razão de 
incidência legal tributária. Mas também 
os deveres perante o Estado assumem 
natureza diversa, mediante prestação 
de serviços, como o alistamento militar, 
a convocatória para atuar como jura-
do no Tribunal do Júri, para ser mesário 
nas eleições, etc. Pela Justiça legal, im-
põem-se deveres aos cidadãos para a 
manutenção do Estado e dos serviços 
estatais, em favor do bem comum.
 
A hermenêutica 
adequada a cada 
categoria de Justiça
Nesse sentido, cabe compreen-
der que há critérios hermenêuticos em 
cada categoria de relação de justiça – 
comutativa, distributiva e legal - de acor-
do com as particularidades das situações 
descritas, que também devem pautar a 
atividade jurisdicional realizada em cada 
âmbito, conforme o contexto dos interes-
ses particulares e públicos envolvidos nas 
diversas circunstâncias, sob risco de se 
provocar injustiça mediante interferência 
antidemocrática. 
JUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIAL 27
Em todas as relações, quando surge 
um conflito, deve-se preservar ao má-
ximo a dignidade de todas as pessoas, 
tanto as envolvidas diretamente quanto 
aquelas que, de modo mediato, podem 
sofrer efeitos da decisão. É oportuno re-
cordar isso porque por vezes se notam 
magistrados a invocar o princípio da dig-
nidade humana em determinado caso, 
deitando o olhar exclusivamente 
em um dos lados do conflito, ol-
vidando-se que do outro lado 
há uma pessoa humana 
com igual dignidade. 
Também não é raro 
importa compreender a natureza das re-
lações de justiça e dos bens envolvidos 
em cada uma, de modo a dar o trata-
mento hermenêutico adequado a cada 
categoria de justiça: comutativa, distri-
butiva ou legal.
A democratização do 
Judiciário nos anos 
1990
Quanto à democratização do Poder 
Judiciário, vale recordar que a partir da 
década de 1990 começou a se articular a 
“Reforma do Judiciário”, para fazer fren-
te à “Crise do Judiciário”. 
Como resposta à “crise”, então, fo-
ram tomadas medidas que visavam a 
“democratização do Judiciário”. Essas 
medidas convergiram para a melhoria do 
acesso à Justiça e para o aprimoramento 
da prestação jurisdicional. O “processo 
de democratização da Justiça” concen-
trou-se no âmbito da administração e 
gestão da Justiça, visando a eficiência e 
celeridade da prestação jurisdicional. 
Nesse sentido, além de modifica-
ções no direito processual para acelerar 
a resposta judicial, ocorreu a institucio-
nalização da Arbitragem (Lei no. 9.307, 
de 23 de setembro de 1996) que teve sua 
constitucionalidade questionada, sendo 
confirmada pelo STF somente em 2001; 
a criação dos Juizados Especiais (Lei 
no 9.099, de 26 de setembro de 1996), 
dos Juizados Especiais Federais (Lei no 
10.259 de 12 de julho de 2001) e a Emen-
da Constitucional no 45/2004 (EC 45), 
conhecida como “Reforma do Judiciá-
rio”, que criaria ainda o Conselho Nacio-
nal de Justiça que, entre outras funções, 
teria um papel de controle e aprimora-
mento do Judiciário.
Para além da democratização da 
prestação jurisdicional, cabe chamar a 
atenção a outros mecanismos de partici-
pação popular na gestão do poder e dos 
interesses públicos, que redundam tam-
bém em favor da justiça, por outros canais.
a lógica de reciprocidade típica das re-
lações comutativas, e projetará efeitos 
deletérios para toda a coletividade, ao 
usar critério próprio da justiça distributiva 
onde não caberia.
Para exemplificar, pense-se nos 
planos de saúde individuais. Quando o 
magistrado estabelece deveres que ex-
trapolam o plano-base contratado entre 
consumidor e prestadora, para além do 
que a própria Agência Nacional de Saúde 
tenha estabelecido, essa decisão pode 
levar à revisão de toda a matriz da lógica 
negocialdos planos de saúde, e provo-
car aumento global das mensalidades 
para todos os cidadãos, como precaução 
dos fornecedores desse serviço. Nesse 
caso, em razão do desejo do magistrado 
de auxiliar um determinado consumidor, 
premido pela situação, pode fazer que as 
empresas desse mercado majorem as 
mensalidades de todos, como efei-
to de “seguro” em face de eventuais 
decisões similares. Esse resultado 
— aumento de mensalidade — pode 
inviabilizar, assim, a contratação de 
muitos outros cidadãos que ficarão de-
sassistidos.
O caso serve para mostrar como 
as relações comutativas devem ser tra-
tadas pelo magistrado dentro de sua 
lógica, segundo o princípio da boa-fé 
objetiva, subjacente às relações de reci-
procidade. Ou seja, a “Justiça” (aparato 
judicial) teria feito uma “injustiça maior”, 
enquanto acreditava o magistrado que 
teria sido “mais justo”. Esse cuidado, 
na verdade, além de preservar a justiça 
própria da situação, salvaguarda a auto-
nomia privada e resguarda a dignidade 
humana de todas as pessoas envolvidas, 
sendo a sociedade tão ou mais impor-
tante do que uma única pessoa isolada 
e conjunturalmente beneficiada naquela 
decisão, sendo que ela mesma, depois 
fará parte do conjunto dos prejudicados 
pela majoração da mensalidade. 
Julgar sem tal perspectiva leva a 
promover um prejuízo maior do que o 
bem que se imaginava propiciar. Por isso 
que o julgador ainda se 
esqueça da dignidade 
de todos que não estão 
diretamente envolvidos na 
demanda, mas podem ser pre-
judicados por uma disposição 
sua que venha, a despeito de be-
neficiar um sujeito que é parte, impor 
perdas à coletividade.
Por exemplo, uma decisão em uma 
dada relação comutativa na qual o ma-
gistrado aplique critérios de justiça distri-
butiva – erroneamente - e atribua maior 
dever do que caberia a uma das partes, 
pelo fato de ser economicamen-
te mais forte na relação. Em 
situações assim, o magistra-
do trata o sujeito particular, e 
seus bens, como se estivesse 
diante de bens do próprio Es-
tado, que pode ser demandado 
na lógica distributiva, até à re-
serva do possível. Estará assim 
a autoridade judiciária rompendo 
FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE28
3. 
Mecanismos de 
participação popular
Dizia-se acima que pelo princípio da sub-
sidiariedade cabe às sociedades inter-
mediárias menores que o Estado e aos 
indivíduos assumirem competências que 
lhes são próprias. Também se esboçou 
um conceito amplo de democracia, que 
diz com a liberdade de atuação e interfe-
rência nas decisões que envolvam inte-
resse particulares e públicos. Nesse sen-
tido, é possível listar alguns mecanismos 
de participação popular nos três âmbitos 
de exercício do poder público, que exem-
plificam exercício de democracia 6.
3.1. 
Mecanismos de 
participação popular 
no Poder Executivo
No que se refere ao Poder Executivo, sem 
prejuízo de outras situações nas quais se 
pode identificar a ação do cidadão na 
conformação da vontade política do Es-
tado, contam-se o voto nas eleições de 
prefeitos, governadores e presidente da 
República (CF, art. 14); a presença ativa e 
deliberativa de cidadãos nos conselhos 7 
de natureza política em todas as esferas 
de governo, bem como nas agências re-
guladoras 8; a presença intensa em con-
selhos de caráter administrativo, como o 
“conselho tutelar”, de âmbito municipal, 
na área dos direitos da criança e do ado-
lescente; a participação em órgãos de 
controle e direcionamento do orçamento 
público, etc.
Mecanismos de 
participação popular 
no Poder Legislativo
Relativamente ao Poder Legislativo, 
podem ser apontados como instrumen-
tos de democracia a disponibilidade de 
concorrer, inclusive por sua associação 
aos partidos políticos; o exercício do su-
frágio universal pelo voto direto e secre-
to (no caso do Legislativo, para eleger 
vereadores, deputados estaduais, fede-
rais e senadores), bem como participar 
do processo deliberativo em matéria le-
gal por meio de plebiscito, referendo 9 e 
iniciativa popular (CF, art. 14). Também 
se poderiam elencar o veto popular 10 e 
a participação em audiências públicas 
nas casas legislativas como instâncias 
de participação popular que afetam a 
tarefa legislativa.
Mecanismos de par-
ticipação popular no 
Poder Judiciário
Por fim, quanto ao Poder Judiciário, 
há abertura para a participação, substi-
tutiva, complementar ou auxiliar na ta-
refa jurisdicional, mediante a ação do 
cidadão no júri popular, na arbitragem, 
na conciliação por juízes leigos, na me-
diação junto a particulares, vinculado ou 
não a órgãos jurisdicionais e, ainda a par-
ticipação em audiência pública 11 ou na 
posição de amicus curiae.
Mediante audiência pública no Ju-
diciário, oferece-se aos magistrados a 
possibilidade de escutar a população ou 
a sociedade civil organizada para decidir 
sobre temas de relevante apelo social. 
De rigor, em qualquer esfera judicial se-
ria possível realizarem-se escutas po-
pulares. Mas o mais comum ainda são 
audiências no âmbito do STF. Há quem 
critique o modo como se tem empregado 
essa ferramenta de participação popular, 
pela restrição de convite a expertos que 
6 “Vislumbra-se assim um novo modelo 
de democracia lastreado nos princípios 
representativo e participativo com a re-
estruturação do espaço público, no qual 
possam coexistir a ordem institucional 
já estabelecida e a participação direta da 
sociedade civil”. CARVALHO, Kátia de. Da 
democracia representativa à democracia 
participativa: a auto-convocação popu-
lar, um mecanismo de aperfeiçoamento 
da representação política. Dissertação de 
mestrado. Universidade Federal de San-
ta Catarina, Centro de Ciências Jurídicas, 
Programa de Pós-Graduação em Direito, 
Florianópolis, 2011.
7 “Os primeiros Conselhos de Direitos da 
Criança e Adolescente foram criados há 
vinte e cinco anos como instâncias pari-
tárias, em que representantes do Estado 
e da sociedade civil deliberariam a res-
peito da elaboração e concretização de 
políticas públicas para o segmento”. 
Cf. TOSI, Matilde Alba Tumbiolo Gioia. O 
Conselho de Direitos da Criança e do 
Adolescente como mecanismo de par-
ticipação popular: análise de sua inci-
dência na implementação de políticas 
públicas. Dissertação de Mestrado. Uni-
versidade de São Paulo: Escola de Artes, 
Ciências e Humanidades. Programa de 
Mestrado em Análise de Políticas Públi-
cas. 2016.
8 “Acredita-se que as agências regula-
doras representam um avanço na con-
cretização da democracia participativa, 
mesmo que não tenham ainda consegui-
do alcançar um nível desejável de parti-
cipação efetiva”. RODRIGUES, Cristiana 
Espírito Santo. Participação popular 
no âmbito das agências reguladoras 
brasileiras. Dissertação de Mestrado. 
Universidade de Fortaleza: Programa de 
Pós-graduação em Direito Constitucio-
nal, 2011.
JUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIAL 29
4.1. 
Os limites 
hermenêuticos do 
magistrado
Quanto aos limites hermenêuticos, o 
desvirtuamento costuma ser chamado 
de “ativismo judicial”. Há perspectivas 
analíticas positivas e negativas da ação 
exorbitante do magistrado, que não deve 
ser confundida com o caso de interpre-
tação por lacunas na lei.
Em geral, o ativismo decorre da apa-
rente ou real invasão em competência do 
poder legislativo ou de outra esfera de 
poder estatal. O caso da criminalização 
da homofobia pelo STF em 2019 é em-
blemático 12. Todavia, dada a limitação 
de espaço, não será aqui analisado.
Os limites éticos do 
magistrado
Quanto aos limites éticos, a palavra 
de ordem é a “imparcialidade”. O magis-
trado não pode tomar partido em uma 
dada causa, que seria papel do advoga-
do. Isso não significa neutralidade, até 
porque deve ele assumir a vontade da 
lei e os valores do sistema jurídico. Se o 
magistrado nota que sua isenção pode 
correr risco por relação prévia com al-
guma das partes, espera-se que ele se 
afaste do juízo, declarando-se suspeito. 
Também a lei previu situações de impe-
dimento, em que não seria necessário o 
magistrado declarar-sesuspeito, porque 
há um dispositivo legal que impede que 
ele atue, como acontece em casos nos 
quais haja um vínculo ostensivo dele 
com alguma das partes 13. 
9 Cf. PINTO, Érica Maria Garcia. Instru-
mentos de participação democrática 
direta: o plebiscito e o referendo. Uni-
versidade de São Paulo: Faculdade de 
Direito. Programa de Pós-Graduação em 
Direito, 2013.
10 Há um trabalho recente dedicado ao 
instituto do veto popular, a partir de sua 
previsão na Lei Orgânica do Município de 
Fortaleza. “Objetivo da presente disser-
tação é analisar, sob uma perspectiva, 
principalmente jurídica, política e social, 
a constitucionalidade do instrumento 
de participação popular característico 
de democracias que embora estrutu-
radas sob um regime representativo 
possuam mecanismos de participação 
direita. Dentre os diversos instrumentos 
existentes, será apresentado e estuda-
do o veto popular previsto no artigo 59, 
inciso V da Lei orgânica do município de 
Fortaleza/CE” Cf. ACIOLY FILHO, Evaldo 
Ferreira. Análise do veto popular como 
mecanismo de aperfeiçoamento da 
democracia brasileira. Dissertação de 
Mestrado. Universidade de Fortaleza: 
Programa de Pós-Graduação em Direito 
Constitucional, 2019.
11 Para melhor análise desse tema, suge-
re-se ler A participação popular nas au-
diências públicas judiciais: verdade ou 
engodo?, de Robson Louzada Lopes. 
Segundo o autor, seu trabalho “busca 
estabelecer a importância de se concre-
tizar a democracia e a cidadania, enquan-
to regime político e direito fundamental, 
junto ao poder judiciário, analisando 
centralmente se as aberturas operadas 
pelos tribunais por meio das audiências 
públicas se constituem método eficaz ou 
se trata de engodo. A linha de pesquisa 
abarcada é denominada no programa de 
pós-graduação strictu sensu da Faculda-
de de Direito de Vitória como “Jurisdição 
constitucional e concretização dos direi-
tos e garantias fundamentais” e se resu-
me em pesquisar “o papel da sociedade 
e os caminhos não estritamente estatais 
para a efetivação dos direitos fundamen-
tais da população em geral”. As referên-
cias completas de acesso estão ao final 
desse texto.
desenvolvem sua opinião sobre os temas 
(LOPES, 2012). Ao se operar tal redução, 
estaria se desvirtuando o espírito da au-
diência pública, pois não mais haveria es-
paço para pessoas simples participarem. 
Além disso, para a participação de exper-
tos como auxiliares, haveria a ferramenta 
do “amicus curiae” pelo qual podem cola-
borar com a Corte no julgamento.
4. 
Imparcialidade e 
efetividade na pres-
tação jurisdicional
Como se dizia, nos anos 1990 houve am-
plo debate sobre a “crise do Judiciário”, 
que redundou em uma “Reforma do Ju-
diciário”, por meio de alteração de legis-
lação processual, abertura para novos 
atores participarem das tarefas jurisdi-
cionais (arbitragem, juízes leigos, con-
ciliadores e mediadores) e a criação do 
Conselho Nacional de Justiça, por meio 
de emenda constitucional. A ideia era 
aprimorar a efetividade do Judiciário. 
Ao final de 2019, assiste-se à nova 
onda de reforma, desta vez para blindar 
o sistema judiciário em face de estraté-
gias procrastinatórias empreendidas por 
réus que se aproveitam da amplitude re-
cursal para ocupar o Judiciário até pres-
crever a aplicação da lei penal antes de 
se consumar a “coisa julgada”.
Outro desafio ou oportunidade de 
aprimoramento diz com a conduta do 
magistrado na realização de sua tarefa. 
Aqui entra o tema dos limites hermenêu-
ticos e éticos do juiz. 
FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA | UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE30
Quando o magistrado não se afasta 
de causas nas quais há elementos para 
pensar que deveria, ainda que não ve-
nha a se beneficiar ou lesar alguma das 
partes, ele favorece a desconfiança para 
com a Justiça, pois inevitavelmente sur-
gem conjecturas quanto à sua parciali-
dade. Caberia aos juízes serem muito 
mais cautelosos nesse tema. Diz o di-
tado que “à mulher de Cesar não basta 
ser honesta; deve parecê-lo”. Em se tra-
tando de Poder Judiciário vale o mesmo. 
Em razão de fatos assim, senadores da 
República trabalham para a instalação 
de uma Comissão Parlamentar de In-
quérito que avalie casos chamativos, de 
modo a se propor mudanças legais que 
impeçam tais situações. Tal Comissão 
foi denominada pela mídia como “CPI da 
Lava Toga” 14.
Também se reconhece desvio da 
atuação do Judiciário quando magistra-
dos usam de sua posição para ultrapas-
sar limites de sua competência técnica. 
Situações como essas terminam por 
macular o exercício exemplar de tantos 
outros que agem conforme a dignidade 
de sua tarefa, dentro dos limites éticos e 
técnicos da função.
12 Veja-se a respeito PEREIRA JUNIOR, 
Antonio Jorge; MOREAU, Caio. O des-
pótico STF e a desarmonia na República. 
21/02/2019 Jornal: O Estado de São Paulo.
13 Causa escândalo, especialmente nas 
Cortes Superiores, quando ministros ju-
diciais atuam como julgadores em casos 
nos quais parente próximo seja advo-
gado de uma das partes, em situações 
nas quais tenham recebido valores de 
uma das partes para palestras, ou quan-
do eles mesmos tenham atuado como 
advogado em favor de umas das partes 
antes de chegarem à posição de magis-
trados. Nessas situações, mais sensato 
seria o juiz alegar suspeição, por prudên-
cia. Mas essa decisão é discricionária: ou 
seja, cabe ao próprio implicado avaliar e 
decidir, como regra, sem que isso impe-
ça eventual ação contra os seus atos no 
processo, por quem tenha interesse, de-
monstrando-se o favorecimento ou pre-
juízo que possa ser comprovado.
14 Cf. PEREIRA JÚNIOR, Antonio Jorge. 
Quem teme a CPI da Toga no Senado?
Jornal: O Povo, 25/03/2019.
JUSTIÇA E DIÁLOGO SOCIAL 31
Referências
ACIOLY FILHO, Evaldo Ferreira. Análise do 
veto popular como mecanismo de aper-
feiçoamento da democracia brasileira. 
Dissertação de Mestrado. Universidade 
de Fortaleza: Programa de Pós-Graduação 
em Direito em Direito Constitucional, 2019. 
BONALDO, Frederico. Prestação juris-
dicional e caráter: a interdependência 
das virtudes do juiz [recurso eletrônico] 
Porto Alegre, RS: Editora Fi, 2019.
CARVALHO, Kátia de. Da democracia re-
presentativa à democracia participa-
tiva: a auto-convocação popular, um 
mecanismo de aperfeiçoamento da 
representação política. Dissertação de 
mestrado. Universidade Federal de San-
ta Catarina, Centro de Ciências Jurídicas, 
Programa de Pós-Graduação em Direito, 
Florianópolis, 2011. 
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. A 
democracia possível. São Paulo: Saraiva, 
1972.
LOPES, Robson Louzada. A participação 
popular nas audiências públicas judi-
ciais: verdade ou engodo?. 2012. 153 f. 
Dissertação. (Mestrado em Direitos e Ga-
rantias Fundamentais) - Programa de Pós-
-Graduação em Direitos e Garantias Fun-
damentais, Faculdade de Direito de Vitória, 
Vitória, 2012. 
MONTORO, Franco. Da democracia que 
temos para a democracia que quere-
mos. Rio Janeiro: Paz e Terra, 1974.
PEDRON, Ronaldo Araújo. Democrati-
zação do Poder Judiciário: a Ouvidoria 
do Conselho Nacional de Justiça como 
Instrumento de Participação Popular. 
Dissertação de Mestrado do Programa de 
Pós-Graduação da Faculdade de Direito da 
Universidade Federal de Minas Gerais, 2017. 
PEREIRA JÚNIOR, Antonio Jorge. Des-
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