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NÚCLEO DE PÓS GRADUAÇÃO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO Coordenação Pedagógica – IBRA DISCIPLINA JUVENTUDE E CRIMINALIDADE https://encrypted- tbn3.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcTgO4I0g8aEyi8WKaCtI9eNIjNAf36e8PQmaQLlNDJDto 85o54N A problemática envolvendo a criminalidade e a juventude tem atingido e preocupado autoridades, bem como toda a sociedade brasileira. “De fato, um rápido exame das sondagens de opinião pública indica que o crime constitui, na atualidade, uma das principais preocupações na agenda dos mais urgentes problemas sociais com que se defronta o cidadão brasileiro.” (ADORNO, 1999, p.62). O Brasil tem registrado altos índices de violência, porém tais indicadores não afetam toda a população da mesma maneira. Adolescentes e jovens com idade entre 12 e 29 anos representam 35% da população brasileira e representam as principais vítimas e autores de crimes violentos. Embora a morte não expresse todas as formas de violência cotidiana, pode-se considerá- la como o mais alto grau de violência interpessoal. “(...) as taxas de mortalidade juvenil, e especificamente as atribuíveis a causas violentas, indicam os diversos modos de sociabilidade e as circunstâncias políticas e econômicas que exprimem mecanismos específicos de negação da cidadania.” (WAISELFISZ, 2010, p.7). Dados do Mapa da Violência 2010 – Anatomia dos Homicídios no Brasil revelam que a taxa de homicídios entre os jovens passou de 30 por 100.000 jovens em 1980 para 50,1 no ano 2007. Ao contrário, no restante da população (excluída a população jovem) esta taxa permaneceu relativamente constante, inclusive com leve queda: de 21,2 por 100.000 habitantes para 19,6 no mesmo período. Segundo o relatório, “Isso evidencia, de forma clara, que os avanços da violência homicida no Brasil nas últimas décadas tiveram como motor exclusivo e excludente a morte de jovens.” (WAISELFISZ, 2010, p.137). Levantamento estatístico da Subsecretaria de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente da Secretaria Especial dos Direitos Humanos realizado por Murad (2004) citado no SINASE (2006) – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – identificou que existiam no Brasil cerca de 39.578 adolescentes no sistema socioeducativo. Destes, 70%, ou seja, 27.763 se encontravam em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto (liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade). Segundo Rocha (2002) apud SINASE (2006, p.19), havia no país cerca de 9.555 adolescentes cumprindo medida privativa de liberdade – medida socioeducativa de internação e internação provisória. Dentre eles, 90% eram do sexo masculino; 76% tinham idade entre 16 e 18 anos; 63% não eram brancos e destes 97% eram afro descendentes; 51% não frequentavam a escola; 90% não concluíram o Ensino Fundamental; 49% não trabalhavam e 85,6% eram usuários de drogas. Conforme demonstra os dados acima algumas características são peculiares a estes adolescentes. Em sua maioria são: do sexo masculino, não são brancos (negros e pardos), apresentam baixa escolaridade, grande defasagem escolar, além de não frequentarem a escola, não trabalharem e apresentarem alta taxa de consumo de drogas. A Teoria do Controle Social define que a gênese da delinquência juvenil está relacionada a problemas na vinculação social do jovem às instituições sociais como família, escola, igrejas. Estas teriam função fundamental na formação ou adaptação do indivíduo às normas sociais. VIOLÊNCIA E CRIMINALIDADE JUVENIL NO BRASIL http://acritica.uol.com.br/manaus/politicas-voltadas-jovens-criminalidade- aumenta_ACRIMA20120812_0006_15.jpg “A delinquência pode ser a resultante de uma construção social cuja raiz está na própria violência familiar e social.” (LEVISKY, 2000, p.31). Dados do Mapa da Violência 2010 – Anatomia dos Homicídios no Brasil revelam que em 2007 18,6% (dezoito vírgula seis por cento) da população brasileira era constituída por jovens entre 15 e 24 anos de idade, representando 35 milhões do total de 189,3 milhões de habitantes do país naquele ano. Nesta faixa etária tem se concentrado os maiores índices de homicídio. Naquele ano, foram registrados 17.475 homicídios nesta faixa etária o que significa 36,6% (trinta e seis vírgula seis por cento) do total de homicídios do país. O que pode explicar http://acritica.uol.com.br/manaus/politicas-voltadas-jovens-criminalidade- a concentração de tão altos índices de violência entre os jovens? Quais seriam as razões e características que os predispõem, nesta fase da vida, à violência? Considerações acerca da adolescência A adolescência representa uma etapa do desenvolvimento humano marcada por transformações biológicas, psicológicas e sociais, localizada entre a infância e a fase adulta. Pode ser definida a partir de diversas perspectivas ou correntes teóricas, variando nas diferentes culturas e organizações sociais. O termo adolescente, etimologicamente, vem do latim adolescere que significa crescer, brotar, fazer-se grande, admitindo diferenças no momento de “despertar” para esta fase da vida entre pessoas de diferentes raças, culturas e gerações. Para o ordenamento jurídico brasileiro, este período é delimitando temporalmente, considerando-se adolescente a pessoa entre 12 (doze) e 18 (dezoito) anos de idade, conforme estabelecido no Art. 2º do ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente. Muitas vezes os termos “adolescência” e “juventude” são tidos como sinônimos ou entendidos como fases que se sobrepõem. O Minidicionário da Língua Portuguesa, Bueno (2000, p.28) define o adolescente como “aquele que está na adolescência, jovem”. A OMS – Organização Mundial da Saúde – define adolescente como o indivíduo que se encontra entre os 10 (dez) e 20 (vinte) anos de idade. Já a ONU – Organização da Nações Unidas – define juventude como a fase entre 15 (quinze) e 24 (vinte e quatro) anos de idade – sendo que deixa em aberto a possibilidade de diferentes nações definirem o termo de outra maneira. Do ponto de vista da psicologia do desenvolvimento, o início da adolescência é claramente marcado pelo início de transformações físicas e biológicas no corpo, que caracterizam a puberdade e geram o amadurecimento sexual. Por outro lado, o fim da adolescência se define sobretudo pela maturidade social, que abrange, entre outras coisas, a entrada no mercado de trabalho e a adoção do papel social de adulto. A adolescência não é uma fase homogênea, pelo contrário, é uma fase dinâmica. “Diferentes adolescências se configuram a partir de diferentes relações que os sujeitos desse ciclo de vida estabelecem com a família, a escola, o trabalho, a cultura, o esporte e o lazer, com o próprio corpo, entre tantas outras esferas da vida.” Enquanto tenta se acostumar com as mudanças corporais, o adolescente corta os laços com a infância. Essa ruptura é fundamental para que se torne um ser único, em busca de sua autonomia. Assim, busca estabelecer uma nova identidade (adulta). Apoiado nas suas relações com a família e o meio social, reformula os conceitos que possui a respeito de si mesmo, abandonando a autoimagem infantil para projetar-se no futuro de sua vida adulta. (Aberastury & Knobel, 1992). http://i45.servimg.com/u/f45/17/35/23/19/delinq10.jpg “É durante a adolescência que se tem uma segunda, e grande oportunidade, para se oferecer condições construtivas ou destrutivas ao desenvolvimento da estrutura da personalidade dos jovens, a partir da interação com a sociedade da qual fazem parte, e na qual vão buscar seus novos modelos identificatórios. Os jovens são vulneráveis e susceptíveis às influências oriundas do meio social. Buscam fora do núcleo familiar aspectos que desejamincorporar à sua realidade pessoal, ou outros, com os quais necessitam aprender a lidar e que constituem uma parte do seu eu, nem sempre bem integrada à personalidade” (LEVISKY, 200, p.22). http://i45.servimg.com/u/f45/17/35/23/19/delinq10.jpg VIOLAÇÕES DE DIREITOS E SUAS IMPLICAÇÕES SOCIAIS NA JUVENTUDE http://www.crato.org/chapadadoararipe/wp-content/uploads/2012/06/criminalidade.jpg A realidade atual, cada vez mais global e sem limites, reflete uma sociedade que se encontra em constante transformação dos parâmetros que regem hábitos, normas e valores repletos de contradições, mostrando-se por vezes cruel, injusta e desigual em oportunidades. Expostos a esta sociedade marcada por diversos tipos de violência em que os direitos são violados – precariedade do sistema de saúde e educacional, falhas na segurança pública, relações perversas entre cidadãos e as instituições públicas, atrocidades cometidas por órgãos governamentais e seus representantes tendo como pano de fundo os interesses próprios ou de minorias – os jovens incorporaram este elemento como modelo identificatório, como padrão de conduta, e forma de autoafirmação dentro da sociedade. A literatura sobre violência estabelece uma forte ligação entre a violência sofrida e praticada por jovens e a condição de vulnerabilidade social em que se encontram. Para Abramovay et al. (2002) a vulnerabilidade pode ser entendida como o resultado negativo da relação entre a disponibilidade de recursos materiais ou simbólicos dos indivíduos ou grupos e o acesso à estrutura de oportunidades sociais, econômicas, culturais que provêm do Estado, do mercado e da sociedade. Esse resultado se traduz em debilidades ou http://www.crato.org/chapadadoararipe/wp-content/uploads/2012/06/criminalidade.jpg desvantagens para o desempenho e mobilidade social desses atores (VIGNOLI, 2001; FILGUEIRA, 2001 apud ABRAMOVAY et al., 2002). Vale ressaltar que a vulnerabilidade assim compreendida traduz a situação em que o conjunto de características, recursos e habilidades inerentes a um dado grupo social se revela insuficiente, inadequado ou difícil para lidar com o sistema de oportunidades oferecido pela sociedade, de forma a ascender a maiores níveis de bem-estar ou diminuir probabilidades de deteriorização das condições de vida de determinados atores sociais (ABRAMOVAY et al., 2002). A partir de dados estatísticos coletados por organismos internacionais na América Latina e analisados pela UNESCO pode-se concluir que o acesso negado aos jovens a bens e direitos básicos como saúde, educação, trabalho, cultura e lazer restringe a capacidade de formação, uso e reprodução dos recursos materiais e simbólicos; torna-se fonte de vulnerabilidade, contribuindo para a precária integração dos jovens às estruturas de oportunidades. Nesse sentido, a abordagem da vulnerabilidade social se presta à compreensão da situação de jovens, especialmente os de baixa renda, e de sua relação com a violência. De acordo com Eva Blay apud Levisky (2000 p.38) “o problema da classe social, das desigualdades econômicas e da total ausência de cidadania para os pobres responde pela forma como estes são violentados na sociedade e, dentre eles, muitos reagem com respostas violentas.” Os jovens, por sua vez, são frutos de dinâmicas sociais pautadas por desigualdades de oportunidades, segregações, ausência de formação ética e cultural em valores de solidariedade e de cultura de paz e do distanciamento dos modelos que vinculam esforços a êxitos. Entretanto, não se pode atribuir a violência à pobreza, estabelecendo aí uma consequência direta, ressalta-se aqui, porém, o fato das desigualdades sociais e negação de direitos fundamentais (moradia, transporte, saúde, educação, esporte, lazer) desencadearem comportamentos violentos. Segundo Pinheiro (1996) citado em Abramovay (2000, p.23): “haveria uma violência de caráter endêmico relacionada a assimetrias sociais que se traduzem em autoritarismos de várias ordens como: (...) impunidade, corrupção; abusos de forças policiais, principalmente contra os pobres e os não brancos; as violações dos direitos das pessoas presas-pobres; discriminação racial.” http://i.ytimg.com/vi/0Ev23bYXGmU/hqdefault.jpg Apesar da violência não estar limitada a estratos sociais, econômicos, raciais ou geográficos, levantamentos estatísticos demonstram que ela atinge com maior intensidade a grupos específicos, como por exemplo, jovens do sexo masculino. Uma das explicações desta incidência estaria associada à questão da vulnerabilidade social. Retomando as palavras sobre violência e crime proferidas pelo Prof. Evaristo de Morais durante o Fórum Nacional de Violência promovido pela Academia Nacional de Medicina em 1986 citado em Levisky (2000, p.45) nos leva a refletir: “Toda estrutura social se coloca por meio de dois pilares: as metas a serem alcançadas e os instrumentos legítimos para alcançá-las.” Este instrumento legítimo é o trabalho. Num país onde as condições de acesso a tal bem são tão desiguais, ou até mesmo subtraídas de determinada parcela da população, assistimos a busca de soluções através da violência e do crime. Os jovens sofrem os efeitos do déficit entre o sistema educacional e as novas imposições do mercado de trabalho. Fato este que promove a baixa autoestima e ausência de perspectivas de futuro os compelindo a lidar com as consequências de uma http://i.ytimg.com/vi/0Ev23bYXGmU/hqdefault.jpg inserção precária neste mercado ou a se deparar com o desemprego. As dificuldades econômicas advindas como resultados deste processo geram um clima de instabilidade que pressiona jovens e, algumas vezes, crianças a buscarem formas de contribuir na subsistência da família, acarretando uma inserção prematura no mercado de trabalho (informal, na maioria das vezes) ou busca de outras formas de ganho financeiro. Peralva (2000) apud Abramovay (2000, p.25) considera novas configurações que singularizam um cenário que potencializaria violências nos centros urbanos na virada do século como: 1) aumento do acesso às armas; 2) a juvenilização da criminalidade; 3) a maior visibilidade e também a reação da violência policial, em especial contra jovens em bairros periféricos; 4) a ampliação do mercado das drogas e o poder de fogo do crime organizado, principalmente do narcotráfico, em diversos centros urbanos; 5) a cultura individualista e por consumo – individualismo de massa – que derivaria em expectativas não satisfeitas potencializando violências. A combinação destes fatores tem colocado os jovens à margem da participação democrática. Em decorrência, muitos ficam relegados às influências advindas da convivência nas ruas com outros que sofrem das mesmas carências quando não são atraídos pelo mundo do crime e das drogas, inclusive por símbolos e práticas autoritárias de imposição de poder. De acordo com Aberastury (1992) citado em Levisky (2000, p.50) “o adolescente, cujo destino é a busca de ideais e de figuras ideais para identificar-se, se depara com a violência e o poder e também os usa.” A violência juvenil, nesse contexto, tem emergido sob diversas lógicas. Se por um lado, tem representado uma forma de os jovens romperem com a invisibilidade e mostrarem-se capazes de influir nos processos sociais, por outro a ausência de um Estado atuante e preocupado com o bem-estar e qualidade de vida da população é substituído por formas de governabilidade negativa, como o tráfico de drogas. Segundo Levisky (2000) os adolescentes por suas características biopsicossociais, tendem, naturalmente, a partir para a ação, com maior tendência a descarregar seus impulsos agressivos e sexuais diretamente. Através de vias de expressão rápidas buscam asatisfação imediata de seus desejos, sem passar pelos critérios de avaliação, simbolização e linguagem, frequentemente pensando depois da ação ter sido realizada. Zaluar (2002) destaca que apesar da enorme desigualdade existente no país, são poucos os jovens que se enveredam pela carreira criminosa. Isso exige que tenham um atendimento especial que considere o contexto social mais próximo de suas ações, tendo eles maior ou menor controle sobre estas. Segundo a autora, tal fato leva a um ponto crucial de discussão. Não se trata de optar pelos preceitos definidos pelo neoliberalismo, onde as escolhas ocorrem num ambiente independente de restrições sociais e de hábitos e aspirações exteriores aos indivíduos. Trata-se de tornar complexa a análise dos contextos sociais mais amplos e mais locais para entendermos os motivos pelos quais, cada vez um número maior de jovens (de todos os estratos sociais) comete crimes, o que nem significa a adoção de uma carreira criminosa, e por que alguns deles passam a exercer um poder paramilitar nas comunidades onde as instituições responsáveis pela implementação da lei estão ausentes, ou são ineficientes ou tornaram-se coniventes com a criminalidade. http://falandoserio.info/uploads/images/crime.jpg A vulnerabilidade social a qual estão expostos homens jovens e pobres resulta de um sistema escolar ineficaz, da ausência de capacitação profissional e da insuficiência dos postos de trabalho. Tais fatores aproxima-os das http://falandoserio.info/uploads/images/crime.jpg “soluções” ofertadas pelo crime-negócio. Além disso, boa parte das famílias encontram-se despreparadas ou são “incapazes de lidar com os conflitos surgidos na vida urbana mais multifacetada e imprevisível” (Zaluar, 2007). Ainda segundo Zaluar (2007) as armas trazem proteção e num país onde o dinheiro é capaz de garantir a impunidade, jovens imersos nesta estratégia de sobrevivência, logicamente, são impulsionados a cometerem cada vez mais crimes a fim de obter dinheiro e armas. Assim, conseguem o respeito da quadrilha e usufruem da sua proteção, já que estas fornecem segurança suplementar a seus integrantes. O sentimento de masculinidade é concebido nas relações de exibição de força, poder, dinheiro e armas de fogo, expressos especialmente na capacidade e disposição em destruir o adversário (Zaluar, 2007). Deste modo, adolescentes e jovens encontram nas turmas, gangues ou organizações criminosas uma forma de amenizar os efeitos da exclusão social, muitas vezes, pondo fim à invisibilidade social a qual são submetidos. Além de desenvolverem uma identidade individual e grupal são beneficiados pela proteção, reconhecimento, dinheiro e prestígio oferecidos por tais organizações. TEORIAS SOCIOLÓGICAS DA CRIMINALIDADE E VIOLÊNCIA http://ci.i.uol.com.br/album/3festival_cinema_latino_f_045.jpg Diferentes teorias sociológicas buscam esclarecer as razões que levam indivíduos a transgredir leis, cometendo crimes. Por meio da abordagem sociológica do crime e da violência são propostas explicações para o comportamento desviante, baseadas nas relações estabelecidas em sociedade e tendo como referência, em sua maioria, a chamada delinquência juvenil. Destas, algumas postulam interpretações macroestruturais para o crime, ou seja, suas explicações para a origem do crime se fundamentam no contexto social, relacionando a concentração de eventos criminosos a características de determinadas regiões, localidades ou grupos - exemplificadas através das teorias da Anomia Social e a Normalidade do Crime (Durkeim, 1995); Desorganização Social (Shaw e McKay, 1942; Sampson e Groves, 1989); Anomia (Merton, 1968); Subcultura (Wolfgang e Ferracuti, 1970) e a Criminologia Crítica (Young, 1980). Em contraposição, se apresentam as abordagens microestruturas que propõem interpretações individuais ou segundo MOLINA (2007) psicossociológicas, para as quais o crime é uma função das interações psicossociais do indivíduo e dos diversos processos da sociedade. Tendo como principais representantes: a teoria da Aprendizagem Social - Social Learning - (Sutherland, 1939; Cloward e Ohlin, 1970), a Teoria das http://ci.i.uol.com.br/album/3festival_cinema_latino_f_045.jpg Oportunidades (Wilson, J. Q. 1985); Escolha Racional (Wilson, 1985); Controle Social (Hirschi, 1969) e o Labelling Approach ou Rotulagem - Interacionismo Simbólico e Construtivismo Social. Desta forma, podemos agrupar as diferentes abordagens sociológicas sobre o crime em dois grandes programas de pesquisa: teorias macroestruturais ou estruturalistas e teorias microestruturas ou individualistas. As teorias que se agrupam no programa de pesquisa macroestrutural buscam analisar fatores que explicam a diferença entre taxas de criminalidade de diferentes localidades, populações ou grupos. Por outro lado, teorias que se enquadram dentro da linha adotada pelo segundo programa de pesquisa (teorias individuais), procuram responder à questão de por que, ainda que inseridos no mesmo contexto sócio-econômico-ambiental, alguns indivíduos cometem crimes e outros não. As teorias individualistas (teoria da “Associação Diferencial - Aprendizado Social”, teoria do “Controle Social” e a teoria do “Autocontrole”) partem do pressuposto fundamental de que a explicação para a prática de crimes deve ser conduzida pela análise de fatores cognitivos, psicossociais, motivacionais e interpessoais que interferem na conformação do comportamento individual. Ainda que haja variações entre as teorias individualistas quanto ao poder explicativo (alcance e limites) entre fatores psicossociais, interpessoais e relacionais para explicar a manifestação de comportamento desviante, há uma perspectiva que perpassa as diversas abordagens: a crença fundamental de que as causas do crime devem ser investigadas nas estruturas simbólicas que permeiam as relações dos indivíduos entre si e com a estrutura social. Dentro desse programa de pesquisa das teorias individualistas, vamos analisar neste trabalho a teoria do “Controle Social”. A Teoria do Controle Social http://s01.video.glbimg.com/x240/2179980.jpg A teoria do Controle Social tenta identificar a influência que fatores sociais, psicossociais, interpessoais e relacionais exercem na conformação do comportamento delinquente individual (forma de trabalho que a insere dentro do programa de pesquisa das teorias individualistas). No entanto, cabe observar que a Teoria do Controle Social trabalha de maneira inversa à maioria das teorias sociológicas do crime: ao invés de se perguntar por que as pessoas cometem crimes, a teoria do Controle Social questiona por que as pessoas não cometem crimes (questão que ela compartilha com outros estudos também inseridos no programa de pesquisa das teorias individualistas). Nesse sentido, a explicação que a teoria do controle oferece a essa pergunta é a de que o crime ocorre quando os indivíduos não se encontram devidamente controlados, seja por instâncias estruturais ou psicossociais, externas ou internas, sociais ou individuais (HIRSCHI, 1969 apud AKERS, 2000). Assim, a teoria selecionada para fundamentar este trabalho foi a Teoria do Controle Social formulada pelo sociólogo americano Travis Hirschi em 1969. Na proposição teórica mais específica da teoria do Controle Social o argumento central é que o crime ocorre quando os laços sociais que os indivíduos mantêm com a sociedade se encontram enfraquecidos ou mesmo rompidos. Consequentemente, o que explicaria a maior ou menor manifestação de comportamentos delinquentes seriam as variações apresentadas pela condição desses tipos de controle e nãoas variações motivacionais (HIRSCHI, 1969 apud AKERS, 2000). O foco de análise da teoria dos Laços Sociais, portanto, é http://s01.video.glbimg.com/x240/2179980.jpg direcionado para os mecanismos de controle social que atuam sobre o comportamento dos indivíduos. Para entender a criminalidade, o autor enfocou no papel dos laços sociais para fins da determinação do comportamento desviante. A proposição geral desta teoria é de que quanto mais fortes forem os laços entre um indivíduo e seus familiares, escola, igreja, clube, colegas de profissão, etc., maior a probabilidade de seu comportamento ser controlado ou direcionado a um comportamento conformista, convencional. Dentro dessa perspectiva, o comportamento delinquente seria resultante da quebra ou enfraquecimento dos laços sociais do indivíduo. Assim, são quatro os elementos principais que constituem os laços sociais: 1. Afeição (attachment to others); 2. Compromisso (commitment); 3. Envolvimento (involvement); 4. Crença (belief). A afeição representa a ligação e a consideração em relação a outras pessoas. Na medida em que há uma identificação e admiração com pessoas importantes para o convívio, sejam eles pais, irmãos, tios, avós, professores ou líderes religiosos, existe uma preocupação com a opinião e expectativas destes. Desta forma, qualquer atitude que possa abalar ou desapontar esta(s) pessoa(s) gera desconforto ou constrangimento para o indivíduo. Ao contrário, quando esta ligação ou afeição está enfraquecida ou até mesmo não existe, o sentimento de constrangimento diante da violação das normas é menor, aumentando assim a probabilidade da adoção ou manutenção do comportamento desviante. O compromisso diz respeito ao grau com que os indivíduos se identificam e se comprometem com valores convencionais. Através da participação em atividades escolares, trabalho, grupos sociais ou religiosos, o indivíduo mantém um comportamento convencional, desenvolvendo uma reputação positiva. O envolvimento em atividades criminosas prejudicaria o seu investimento, colocando em risco benefícios que foram alcançados durante uma vida (relação custo-benefício). Assim, o custo da perda de um investimento conformista funcionaria preventivamente para a ocorrência de comportamentos desviantes. O envolvimento está relacionado ao grau de participação e envolvimento em atividades sociais convencionais. O engajamento em atividades convencionais como escola, trabalho, cursos, esporte, artes, absorve o indivíduo impedindo-lhe ou contribuindo para que se mantenha afastado das atividades delituosas. A crença significa a convicção do indivíduo em valores convencionais. Quanto maior for à crença de uma pessoa nas normas convencionais, maior será o seu conformismo e obediência, evitando que cometa atos que violem as leis e regras estabelecidas socialmente. A teoria propõe que, através da mensuração dessas quatro dimensões, é possível dimensionar a intensidade dos laços sociais mantidos entre indivíduo e sociedade e, consequentemente, aferir a propensão que as pessoas têm de se envolver em comportamento delinquente. Quanto mais intensa for à manifestação dessas quatro dimensões nas relações que os indivíduos mantêm com as instituições sociais (família, pais, amigos, escolas, professores, igrejas, etc.), mais intensos serão os laços sociais e menores serão as chances de manifestação de comportamento delinquente (HIRSCHI, 1969 apud AKERS, 2000). As investigações sobre a evidência empírica da teoria do Controle Social são conduzidas em três frentes institucionais: (1) laços dos indivíduos com religião, (2) laços dos indivíduos com a família e (3) laços dos indivíduos com a escola. Dentro da análise sobre as relações entre indivíduos e instituições sociais, pesquisadores se encarregam de mensurar a intensidade dos laços estabelecidos entre uma instância e outra, através das quatro dimensões observadas anteriormente (AKERS, 2000). A Teoria do Controle Social e a Criminalidade Juvenil http://4.bp.blogspot.com/-ohg_qTeatNI/TfZlXMPJMsI/AAAAAAAAA4s/6orH- JLM770/s1600/violencia_infancia.jpg Relacionando os pressupostos teóricos definidos por Hirschi à criminalidade juvenil pode-se considerar a importância das instituições sociais na prevenção aos comportamentos infracionais. Dentre elas, mais do que a escola, ou qualquer outra instituição social, a família figura como a principal responsável pela transmissão social de valores, promovendo em crianças e adolescentes o desenvolvimento de capacidades morais e cognitivas. “A família é a primeira, a menor e a mais importante escola.” (LEVISKY, 2000 p.29). O constante processo de transformação social e tecnológica a qual a sociedade encontra-se submetida traz consequências para as interações sociais dos indivíduos, especialmente de crianças e adolescentes. Nas últimas décadas, as novas organizações familiares e suas necessidades suscitam situações propícias para o comportamento desviante. As consequências da emancipação feminina, a formação de famílias monoparentais, as exigências do mercado de trabalho e os apelos de uma sociedade de consumo, enfim, todos estes fatores podem contribuir para a redução da qualidade e ocorrência do vínculo estabelecido entre pais e filhos. Evitando generalizações, já que o comportamento criminoso se trata da exceção e não da regra, nestas situações onde os pais passam grande parte do tempo longe dos filhos, pode se manifestar a ocorrência do prejuízo no http://4.bp.blogspot.com/-ohg_qTeatNI/TfZlXMPJMsI/AAAAAAAAA4s/6orH- exercício efetivo do papel de educador e responsável por acompanhar o desenvolvimento das crianças e adolescentes, interferindo na capacidade de controle exercido pelos pais. Segundo Torisu (2008), para a Teoria do Controle Social, o que faz com que alguns indivíduos cometam ações desviantes é o fato desses não possuírem auto-controle devido a alguma deficiência em seu processo de socialização durante a infância. A ação delinquente pode ser considerada uma consequência de uma conduta educacional ineficaz dos pais, que não foram firmes o suficiente ao impor limites em relação às más condutas. Consequentemente, o indivíduo passa a agir de acordo com seus próprios interesses, não levando em conta ou desconsiderando as consequências de seus atos sobre terceiros ou situações futuras. Para crianças e adolescentes a participação em atividades através da inserção em grupos, programas ou entidades é fundamental para o desenvolvimento adequado e sadio, tanto físico, mental quanto cognitivo. A vinculação em atividades escolares, profissionalizantes, religiosas, artísticas, culturais, esportivas ou de lazer, além de proporcionar o desenvolvimento de habilidades intelectuais e motoras, estimula crianças e adolescentes a aprimorar sua capacidade de comunicação e socialização. Os benefícios alcançados não se restringem à saúde e bem-estar. Estes momentos proporcionam o aprendizado e assimilação de valores e hábitos que podem atuar preventivamente ao envolvimento com a prática infracional. O tempo dispensado à realização de tais atividades ou a participação em grupos ou programas pode impedir que adolescentes e jovens estivessem susceptíveis às atividades ilícitas. Parte-se do princípio, é claro, de que nestes locais não lhes sejam proporcionadas oportunidades de contato com tais práticas ou estas ocorram em menor intensidade. Na medida em que se integram e se envolvem com as atividades ou grupos passam a absorver os conhecimentos transmitidos, podendo despertar no adolescente o sentimento de pertencimento. Esse pertencimento pode ser responsável por desencadear o compromisso do adolescente e a crença nos valores e conhecimentospraticados por aquele grupo ou pertencente à determinada atividade. Baseado nos pressupostos propostos por Hirschi através da Teoria do Controle Social a vinculação social de crianças e adolescentes pode neutralizar o potencial delitivo por meio da adoção de condutas conformistas. Ao contrário, quando fracassam tais mecanismos de controle, há um processo de desenvolvimento de uma identidade não conformista que se traduz em comportamentos desviantes e no aumento da criminalidade juvenil (MOLINA, 2007). A "DELINQÜÊNCIA JUVENIL" http://www.pucrs.br/mail_mkt/pucnot/404/f-51.jpg A problemática da inimputabilidade penal em face da idade O emprego da expressão delinquência juvenil tem suscitado interminável discussão teórica, quanto à impropriedade técnica dessa terminologia. A discussão está centrada no conceito analítico do delito, que, como se sabe, consiste na ação ou omissão típica, antijurídica e culpável. Ora, sustenta-se, desde que inexista um, dentre os três elementos, integrantes do conceito analítico do delito - tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade -, não se configura a hipótese de prática delituosa. No caso, o cerne da questão gira em torno da culpabilidade, que constitui http://www.pucrs.br/mail_mkt/pucnot/404/f-51.jpg o elemento subjetivo do delito, isto é, o nexo moral que liga o agente ao fato criminoso que lhe é imputado. Na linha desse raciocínio, a culpabilidade pressupõe a imputabilidade, ou seja, a capacidade moral atribuída ao homem, pelo fato que lhe é imputado - imputatio facti -, como sua obra e a forma dessa imputação - dolo ou culpa -, imputatio juris, isto é, a atribuição de um fato a um indivíduo para fazê-Io sofrer as consequências e torná-Io responsável por isso. Em outras palavras, o imputável é o penalmente responsável; o inimputável é o irresponsável. Em geral, os Códigos Penais não definem a imputabilidade, mas esta- belecem as condições de inimputabilidade, ou seja, as dirimentes, como é o caso de nosso Código Penal de 1940, em cujos artigos 22 a 24 adotou o cha- mado critério biopsicológico normativo, segundo o qual o agente é isento de pena ou esta é reduzida, em determinadas circunstâncias, que o próprio Código prevê. Nos casos concretos, isto é, quando houver dúvida sobre a integridade mental do agente, este será submetido a exame médico-legal, de natureza psiquiátrica, na forma prevista pelo artigo 149, do Código de Processo Penal de 1941. Adotou o legislador de nosso Código Penal de 1940 o princípio da chamada responsabilidade moral, que se baseia na consciência e vontade do agente, responsabilidade essa sobre a qual a pena deve atuar, para a rea- lização de sua finalidade inerente à sua natureza aflitiva, expiatória, retributiva e também tendente a plasmar uma nova consciência no delinquente. Conceito de responsabilidade ou imputabilidade penal http://blogues.cyberpresse.ca/boisvert/files/2012/01/images-12.jpeg Segundo Nélson Hungria, o Código Penal de 1940, não dá uma definição positiva da responsabilidade, sob o ponto de vista jurídico-penal, limitando-se a declarar os casos em que está se considera excluída, assim se expressando: "Por dedução a contrário do texto legal, verifica-se que a responsabilidade pressupõe no agente, contemporaneamente à ação ou omissão, a capacidade de entender o caráter criminoso do fato e a capacidade de: Determinar-se de acordo com esse entendimento. Pode, então, definir- se a responsabilidade como a existência dos pressupostos psíquicos pelos quais alguém é chamado a responder penalmente pelo crime que praticou. Se- gundo um critério tradicional, que o Código rejeitou, haveria que distinguir entre responsabilidade e imputabilidade, significando esta a capacidade de direito penal ou abstrata condição psíquica da punibi1idade, enquanto. Aquela designaria a obrigação de responder penalmente in concreto ou de sofrer a pena por um fato determinado, pressupostos da imputabilidade. A distinção é bizantina e inútil. Responsabilidade e imputabilidade representam conceitos que de tal modo se entrosam, que são equivalentes, podendo, com idêntico sentido, ser consideradas in abstrato ou in concreto, a priori ou a posteriori. Na terminologia jurídica, ambos os vocábulos podem ser indiferentemente empregados, para exprimir tanto a capacidade penal in generis, quanto à obrigação de responder penalmente pelo fato concreto, pois uma e outra são http://blogues.cyberpresse.ca/boisvert/files/2012/01/images-12.jpeg aspectos da mesma noção" (Comentários ao Código Penal, voI. I, Tomo 2°, p. 314). Entretanto, esse entendimento não é pacífico, do ponto de vista teórico, dele discordando, por exemplo, Aníbal Bruno (Direito Penal, I, Tomo U, p. 27), José Frederico Marques (cf. Euclides Custódio da Silveira, in Notas ao Direito Penal, 10 voI., p. 242), autores esses que distinguem responsabilidade e imputabilidade. Capacidade de entendimento ético-jurídico do agente do delito Como se sabe, segundo a sistemática adotada pelo nosso Código Penal de 1940, a responsabilidade só deixa de existir quando inteiramente suprimidas no agente, ao tempo da ação ou omissão, a capacidade de entendimento ético- jurídico ou a capacidade de adequada determinação da vontade ou de autogoverno. Tal supressão, porém, está indeclinavelmente condicionada a certas causas biológicas: "doença mental", "desenvolvimento mental incompleto ou retardado" e "embriaguez fortuita e completa". Foi, assim, adotado o método chamado misto ou biopsicológico, devendo notar-se, entretanto, que o Código faz uma exceção a essa regra quando trata dos menores de 18 anos, pois, nesta hipótese a causa biológica (imaturidade) basta, por si só, irrestritamente, sem qualquer indagação psicológica, para excluir a responsabilidade penal, como sustenta Nélson Hungria (Comentários ao Código Penal, voI. I, Tomo 2°, ps. 314 e segs.). As reações psíquicas do embrião e do feto e seus reflexos no comportamento futuro do ser humano https://encrypted-tbn0.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcSpI7fyQOjSacPUyVm16dxSW - atajDYKt2Y2jj_4o72Et6UNGJ2 Na realidade, o critério adotado pelo nosso Código Penal de 1940 tem origens e explicações de natureza psicológicas, eis que, qualquer que seja o momento em que surpreendemos o germe humano, desde a sua fecundação, até adquirir o caráter de embrião (aos dez dias) ou de feto (aos dois meses), nele podem obter-se experimentalmente dois tipos de reação: locais e globais, reações essas que, progressivamente, adquirem um caráter unitário e intelectual, base das reações psíquicas, cujo aparecimento se dá incon- testavelmente pelo sexto mês do desenvolvimento intrauterino, coincidindo com a viabilidade do feto. Em suma, há portanto uma psicologia pré-natal (Emília Mira y Lopez) Daí os efeitos nocivos, nos casos das gestantes que rejeitam a materni- dade, isto é, não desejam procriar, maldizem o feto, que se encontra em suas entranhas, utilizam-se de substâncias para tentar abortar, por não disporem de recursos financeiros para realizar o aborto, por meio de um médico. Após a passagem migratória do feto para o mundo exterior, inicia-se a / I evolução extrauterina do recém-nascido, que atravessa diversas fases, até atingir a primeira e segunda infâncias, daí passando à adolescência (do latim adolescere, que significa crescer), que constitui um breve espaço de tempo, que precede a puberdade, correspondendo aproximadamente ao período entre os 11 e os 13 anos nas meninas e os 12 e 14 anos nos meninos. Nesse período, como ressalta Emilio Mira y Lopez, observam-se, a par de notáveis transformações anatômicas e psicológicas, alterações de conduta e mudanças morfológicas sensíveis. É o momento evolutivo do chamado"estirón", ou seja, de um crescimento estatural acelerado. À medida que a Psicologia vai progredindo, acentua-se a importância do estudo da problemática existencial dos adolescentes, ampliando-se a duração admitida para esse período, até compreender não somente a puberdade, mais também grande parte da juventude, isto é, o segundo decênio da vida. De sorte que, já não é a adolescência intercalada entre a meninice e a puberdade, mas sim entre a meninice e a maioridade, variando em consequência os critérios legislativos de cada país, no tocante à concessão dos direito sociais e responsabilidade civil e penal do indivíduo (Psicologia Evolutiva da Criança e do Adolescente, ps. 23, 24 e 157). Reflexos da problemática capitalista sobre o comportamento da criança e do adolescente Como é notório, o sistema capitalista vive inexoravelmente sujeito a crises cíc1icas, crises essas de natureza complexa, isto é, social, política, econômica, familiar, devido a diversas causas e múltiplos fatores, inerentes ao próprio capitalismo, e que se manifestam através do desemprego, recessão, especulação desenfreada, fome, miséria, impunidade da corrupção ad- ministrativa, ambição de lucros, utilização nociva dos meios de comunicação social (rádio, televisão, filmes, jornais, revistas, escritos e impressos pornográficos), exploração sexual, erotização, tráfico de drogas e de armas, bem como numerosos outros aspectos. Ora, tudo isso se reflete sobre a estrutura familiar, sobre o comportamento humano, a moralidade pública, os costumes. Em consequência disso: "A sociedade familiar decai. Crianças de oito, dez e doze anos se dedicam à prostituição na Inglaterra. Jamais presenciei um comércio de sexo infantil como agora", disse Arthur Nixon, delegado à Reunião Anual da Associação Britânica de Diretores de Colégio em 1981. Hungria sentenciou: "O delinquente juvenil é, na grande maioria dos casos, um corolário do menor socialmente abandonado, e a sociedade, per- dendo-o e procurando, no mesmo passo, reabilitá-Io para a vida, resgata o que é, em elevada proporção, sua própria culpa" (Comentários ao Código Penal, voI. I, Tomo 2°, ps. 353 e 354). Note-se que a Lei n° 8.069/1990, assim considera e distingue a criança do adolescente, para os efeitos legais. "Art. 2° - Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade." Cabe lembrar que a adolescência é o período de vida caracterizado por amplas e profundas modificações psicossomáticas, em que se completa o desenvolvimento morfológico-funcional do ser humano. Durante essa fase da existência humana, definem-se os caracteres se- xuais secundários, avivam-se os processos intelectuais, a sensibilidade, e toda uma nova problemática, de ordem biopsicológica, sócio-cultural e político- econômica, situação essa que repercute na esfera jurídica, daí por exemplo o fato de que aos dezoito anos completos o indivíduo está sujeito à convocação para efeito de prestação do serviço militar, direito de voto e ser votado (arts. 14, § 1°, I, e 143, da Constituição de 1988), assim como o homem contrair matrimônio, mediante consentimento dos pais ou de representante legal (arts. 183, XII, e 185 e segs. do Código Civil de 1916). Quanto à mulher, pode a mesma consorciar-se após completar dezesseis anos, observadas as formalidades para o consentimento, acima referidas. Terminologia adequada acerca dos desvios de comportamento da criança e do adolescente http://thumbs.web.sapo.io/?epic=hFvCDmFsRVxYmKeScC5cKeyri5lRAp+LS16WI8s3rdWrcQTMfG nJ7B4xjDDVRFDguDKIbMI2J4eL05sSAGlYN5ebKnn44lFvMdSJ5220ndHcrKA=&W=596&H=335&crop=c enter&errorpic=transparent&delay_optim=1&tv=2 A expressão delinquência juvenil foi usada pela primeira vez na Inglaterra, em 1815, por ocasião do julgamento de cinco meninos de 8 a 12 anos de idade. Atualmente, essa expressão tem suscitado várias críticas, como assi- nalamos acima, sendo empregada com diferentes sentidos, conforme a opinião dos autores, para exprimir os seguintes conceitos, principalmente: a) a delinquência juvenil compreende os comportamentos antissociais praticados por menores e que sejam tipificados nas leis penais; b) a delinquência juvenil não deve ser encarada sob uma perspectiva meramente jurídica, devendo incluir também os comportamentos anormais, irregulares ou indesejáveis; c) a delinquência juvenil abrange, além do que foi assinalado nas teorias anteriores, aqueles menores que, por força de certas circunstâncias ou condutas, necessitam de reeducação, cuidado, proteção. Das três posições acima, a mais aceita é a primeira. Salienta ainda César Barros Leal que, por ocasião do Segundo Con- gresso das Nações Unidas sobre Prevenção do Delito e Tratamento do http://thumbs.web.sapo.io/ Delinquente, realizado em Londres, em 1960, foi aprovada recomendação no sentido de que o significado da expressão delinquência juvenil deve restringir- se o mais possível às infrações do Direito Penal. Em muitos países confunde-se delinquência juvenil com inadaptação, cujo conceito não apenas compreende menores autores de infrações penais, como também retardados, neuróticos, desequilibrados, abandonados, órfãos, vagabundos etc. (A Delinquência Juvenil: Seus Fatores Exógenos e Prevenção, ps. 43 e segs.). Aliás, o. Segundo Seminário dos Estados Árabes sobre Prevenção e Tratamento do Delinquente, realizado sob os auspícios das Nações Unidas, em Copenhague, em 1959 já havia concluído que os termos delinquência e inadaptação não são equivalentes, pois, os dois problemas são diversos, eis que a delinquência de menores abrange somente os atos que, praticados por adultos, seriam considerados delitos. Por sua vez, o Seminário Latino-Americano sobre Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente, realizado no Rio de Janeiro, em 1953, embora concluísse que a expressão delinquência juvenil "era tecnicamente inadequada" ("por não reunir os elementos essenciais do conceito doutrinário do delito"), reconheceu, contudo, que pela inexistência de expressões substitutivas apropriadas, poderia continuar a ser utilizada. Casas dos desvios de comportamento da criança e do adolescente. As associações em bandos para fins criminosos Da mesma forma que em relação aos adultos, diversas causas - endó- genas e exógenas - influem sobre a conduta delituosa do menor. Essas causas podem ser de natureza genética, psicológica, patológica, econômica, sociológica, familiar. As condições de vida miseráveis dos pais, fome, subnutrição, alcoo- lismo, consumo de drogas, falta de condições mínimas de higiene, ausência de qualquer exame pré-natal e hábito de fumar da gestante, enfermidades crônicas e outros aspectos, marcam a vida do novo ser antes do seu nascimento. No período de zero a sete anos, em que a criança mais necessita de as- sistência sanitária e de nutrição, ocorrendo à falta desta, os neurônios (células nervosas com os seus prolongamentos) do menor serão fatalmente atingidos, e o trabalho de recuperação, mesmo usando-se os mais sofisticados métodos, não surte efeito, como salientou Antônio Alfredo Fernandes (Jornal do Brasil, 14.04.1978). Segundo o relatório da FAO (Organização para a Alimentação e Agri- cultura, órgão da ONU), divulgado em 1978, o consumo médio de calorias nos países ricos subiu para 3.380, contra 2 mil calorias consumidas em média nos países subdesenvolvidos. Essas disparidades, segundo a F AO, provocam males, sob um duplo aspecto, isto é, tanto ocasionam doenças por subnutrição como pelo consumoexcessivo de alimentos ou a adoção de dietas inadequadas nos países ricos. Está fora de dúvida, porém, que os males resultantes da fome são des- proporcionalmente maiores para os pobres, até porque estas condições lhes são impostas, como consequência das desigualdades internacionais e da exploração exercida pelas potências imperialistas, através do controle de preço, açambarcamento e distribuição de alimentos, nos diversos países capitalistas. A subnutrição não é apenas um mal em si: todos os anos cem mil cri- anças ficam cegas por causa daquela; 40% das mulheres adultas dos países subdesenvolvidos são anêmicas. Na América Latina, mais da metade das mortes entre as crianças de menos de dois anos é atribuída à alimentação deficiente. De acordo com as previsões de Luan Pablo Terra, consultor da UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância), se persistirem as condições atuais na América Latina, morrerão nos próximos 20 anos, cerca de 30 milhões de crianças e outras tantas sofrerão desnutrição grave (Rev. Bras. de Ciênc. Jurídicas, n° 1, ps. 76 e segs.). Na década de 1980, a UNICEF divulgou um relatório específico acerca da situação da criança no Brasil, registrando elevados índices de mortalidade infantil, devido, entre outras causas, à falta de assistência pré-natal e cuidados médicos, durante o parto; dito relatório salientou também aspectos relacionados à deficiência mental da criança, em razão da subnutrição das mães, bem como do próprio menor, nos primeiros meses de vida, com a consequente atrofia das células cerebrais, insuficiência de peso, propensão a doenças etc. (Jornal Nacional, Brasília, 07.06.1984). Ora, esse conjunto de causas e fatores enseja inexoravelmente a formação de crianças deficientes e futuros adultos débeis mentais, por conseguinte, uma porta larga para os desvios de comportamento, inclusive condutas delituosas, tomando tais seres humanos um peso morto, uma carga inútil e nociva ao meio social em que vivem. Paradoxalmente, esse mesmo meio social - através de seus órgãos punitivos - acaba de liquidai-os, moral e fisicamente, nos seus estabelecimentos prisionais: as mundialmente conhecidas "casas de horrores". Fatores criminógenos que atuam sobre a criança e o adolescente Quanto aos fatores criminógenos, de natureza exógena, relacionados ao meio social, aos aspectos psicológicos e psiquiátricos, que atuam negativamente sobre a criança e ao adolescente, destacam os autores os seguintes: a) disciplina mais rígida ou descontínua da parte do pai; b) supervisão não adequada da parte da mãe; c) pai delinquente e hostil; d) mãe indiferente e hostil; e) família sem coesão; f) desejo marcante de afirmação pessoal na sociedade; g) atitude marcante de desprezo e desafio; h) marcante destrutividade; i) aventureirismo; j) instabilidade emotiva; k) procedentes familiares de vício ou delinquência; m) falta de ocupação; l) influências extrafamiliares, más companhias; m) famílias numerosas com problemas econômicos etc. Segundo estudos realizados na extinta Alemanha Federal, cerca de metade das crianças estava crescendo em meio a um ambiente em que devem contar, a cada instante, com uma surra ou bofetada, ou seja, hábitos violentos por parte dos pais. O relatório publicado a respeito informa que grande número de ocorrências permaneciam ocultas, pois havia interesse em disfarçá-Ias, dificultando-se as sindicâncias. Apesar disso, suponha-se como realista a cifra de 15.000 a 18.000 casos anuais de maus tratos físicos a crianças, com reflexos negativos sobre a sua personalidade, conduta e reação emotiva. No Brasil, embora não existam estudos a respeito, há indícios do mesmo fenômeno, resultando inclusive, em alguns casos, fraturas em crianças, sob o disfarce de quedas, acidentes. No que tange às associações em bandos juvenis, elas existem de forma mais estruturada e em maior número nos EUA, onde, por coincidência, é também maior o índice de crime organizado (organized crime), embora ditas associações sejam universalmente conhecidas, inclusive no Brasil, como salientamos noutra parte deste trabalho. As denominações dessas associações variam nos diferentes países, a saber: gamberros (Espanha), vitelloni (Itália), teddy-boys (Inglaterra), blousons noirs (França), Halbstarker (Alemanha), nosem (Holanda), anderujmer (Dinamarca), pasek (Tchecoslováquia), hooligans (URSS e Polônia), pavitos (Venezuela), zazous (África), bodgies (Austrália), taizo-zoke (Japão) e Tai-Pao (China), como assinala César Barros Leal (ob. cit., p. 39). No Brasil, inexistem estudos específicos, a respeito das associações em bandos juvenis, com o objetivo de práticas delituosas; contudo, são flagrantes e exuberantes os indícios e provas, quanto à existência desses bandos, sendo os menores denominados, individualmente, de "trombadinhas" (São Paulo) e "pivetes" (Rio de Janeiro). Mutatis mutandis, da mesma forma que em relação aos adultos, existem cifras douradas (em relação aos menores pertencentes às classes sociais privilegiadas), cifras negras (práticas delituosas não detectadas, ou que escapam ao controle oficial) e as práticas delituosas reprimidas, em conformidade com a legislação aplicável em cada país. IMATURIDADE PENAL http://www.jornaldamadeira.pt/sites/default/files/delinquenciainfantil_0.jpg Estabeleceu o art. 23, do nosso Código Penal de 1940 que, os menores de dezoito anos são penalmente irresponsáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial, preceito esse reproduzido no art. 228 da Constituição de 1988. A legislação especial em causa consistiu em diplomas legais específicos, que se sucederam até a vigência da Lei n° 8.069, de 13.07.1990-Estatuto da Criança e do Adolescente -, que dispõe, dentre outras medidas, sobre a assistência, proteção, vigilância, vida e saúde dos mesmos. Como se vê, pelos princípios acima expostos, a imaturidade individual e individual-social do psiquismo das crianças e adolescentes constitui causa de exclusão ou atenuação da imputabilidade, matéria essa que tem recebido as soluções mais diversas através dos tempos: a equiparação penal do menor ao adulto, a exclusão da pena para as primeiras idades, ou a sua atenuação http://www.jornaldamadeira.pt/sites/default/files/delinquenciainfantil_0.jpg subordinada ou não ao critério dos discernimentos. "Hoje, o pensamento fundamental em referência à chamada criminalidade dos menores, é que ela não constitui matéria do Direito punitivo, mas de um regime tutelar" (Aníbal Bruno - Direito Penal, I, Tomo 2°, ps. 163 e segs.). Critérios legislativos distintos sobre a incapacidade civil e penal dos menores de dezoito anos http://1.bp.blogspot.com/_vTGju0yQDfU/TABGbHQyunI/AAAAAAAAAA0/slpn6Jm93sE/s 400/Sem+t%C3%ADtulodxxx.jpg A incapacidade do indivíduo, segundo a lei civil, é de fato, e não de direito, quer dizer, as pessoas consideradas incapazes, II-° sentido jurídico, têm direitos, mas não os podem exercer, ou então, não 10 podem fazer de modo absoluto (art. 5°, I a IV, do Código Civil de 1916, ou relativamente a certo número de atos (art. 6°, I a III, do referido Código). Todavia, isso implica dizer, dentre outros aspectos, que a incapacidade civil não isenta o agente incapaz, quanto à obrigação de reparação do dano por ele causado, o que ocorre por intermédio de seu representante legal (arts. 84 e 1.521, I e II, do predito Código), como decorrência do princípio da responsabilidade por fato de terceiro, como lembramos noutro trabalho http://1.bp.blogspot.com/_vTGju0yQDfU/TABGbHQyunI/AAAAAAAAAA0/slpn6Jm93sE/s (Responsabilidade Civil no Direito Brasileiro, ps. 271 e segs.). Nesse sentido, preleciona ClóvisBeviláqua, ao comentar o art. 155 do mencionado Código, que dispõe sobre a obrigação de o menor, entre de- zesseis e vinte e um anos, responder pelo seu ato, quando agir deso1amente, assim se manifestando: "A malícia supre a idade malitia supplet octatem. O menor que, do10- samente, esconde a sua idade consegue convencer a outrem, de que é capaz, não pode invocar, depois a proteção da lei em favor de sua debilidade mental. A malícia não deve aproveitar a ninguém, diz outro brocardo, nem, ainda, aos menores" (Código Civil, p. 340, vol. I, 1956). Versando sobre o tema, salienta Ga1dino Siqueira que, "no homem a noção do justo surge mais cedo do que a noção do útil", aduzindo o seguinte: "A lei civil mesmo tem em tanta conta este fato de observação, que declara o menor responsável pelos seus delitos ou quase-delitos civis, ainda que lhe seja permitido anular suas obrigações convencionais, desde que prove ter sido lesado. Daí por que a maioridade penal é fixada antes da maioridade civil nas diferentes legislações" (cf. Direito Penal Brasileiro, p. 354, vaI. I, 1932). Contudo, cumpre lembrar que a experiência legislativa brasileira adotou, no passado, o critério de responsabilidade penal aquém dos dezoito anos, como veremos adiante. Experiência legislativa brasileira, acerca da responsabilidade penal, em função da idade O nosso Código Penal de 1890 estabeleceu em seu art. 27, que não são criminosos, dentre outros, os menores de nove anos completos, e os maiores de nove e menores de 14, "que obrarem sem discernimento" (§§ 1° e 2°). Por sua vez, o art. 30, do mesmo diploma legal, dispôs que "os maiores de nove anos e menores de 14, que tiverem obrado com discernimento, serão recolhidos a estabelecimentos disciplinares industriais, pelo tempo que ao juiz parecer, contanto que o recolhimento não exceda à idade de 17 anos". Comentando o citado art. 27, do Código Penal brasileiro de 1890, sa- lientou Oscar de Macedo Soares que o critério de idade, adotado pelo Código Criminal do Império (1830) e pelo referido Código de 1890, teve como fonte de inspiração o direito romano, que distinguia as três classes: infantes (até os 7 anos), impuberes (dos 7 aos 14 anos), minores (dos 14 aos 18 ou aos 21 anos). Em suma, segundo o referido Código, em se tratando de menores de 9 a 14 anos, que obrarem sem discernimento, a irresponsabilidade é plena; quanto àqueles, da mesma idade, que obrarem com discernimento, a irresponsabilidade é semiplena, e por isso determinava o Código fossem recolhidos a estabelecimentos industriais, disciplinares, pelo tempo que o juiz determinasse, contanto que dito recolhimento não excedesse a idade de 17 anos (Código Penal da República dos Estados Unidos do Brasil, 3a ed., p. 34). Por seu turno, a Consolidação das Leis Penais (Decreto n° 22.213, de 14.12.1933), que vigorou até a entrada em vigor do Código Penal de 1940, dispôs em seu art. 27 que não são criminosos, dentre outros, os menores de 14 anos (§ 1°), enquanto o art. 30, do mesmo diploma punitivo, estabeleceu que "os menores de 18 anos, abandonados e delinquentes, ficam submetidos ao regime estabelecido pelo Decreto n° l7.943-A, de 12.10.1927" (Código de Menores). . Versando sobre a matéria, escreveu Francisco Pereira de Bulhões Carvalho, que em relação aos menores infratores da lei penal de 14 a 18 anos, o Código de Menores, de 1927, determinou "um verdadeiro sistema penal próprio, isto é, aplicação de sanção penal relativamente indeterminada, correspondente à prática do delito e a ser cumprida em reformatório ou estabelecimento anexo a penitenciária de adulto" (Direito do Menor, p. 34). O fato é que a fixação da idade, para efeito de responsabilidade penal, varia de acordo com os Código Penais dos diversos países, atendendo natu- ralmente a critérios relacionados às tradições jurídicas, condições sociais, situação econômica e outros, variando a idade de 14 a 21 anos, como veremos oportunamente. Por sua vez, o legislador de 1940 não cuidou da maior ou menor pre- cocidade psíquica dos menores de dezoito anos: "declarou-os por presunção absoluta, desprovidos das condições da responsabilidade penal, isto é, o entendimento ético-jurídico e a faculdade de auto governo" (cf. Nélson Hungria, Comentários ao Código Penal, art. 23, vol. I, tomo 2°, 1955). Em outras palavras, em virtude de mera presunção legal, de natureza biopsicológica, os menores de dezoito anos são considerados imaturos, si- tuação essa que basta, por si só, irrestritamente, sem qualquer indagação psicológica, para excluir a responsabilidade penal, deixando-os "fora do Direito Penal (00')' sujeitos apenas à pedagogia corretiva de legislação especial" (cf. Exposição de Motivos ao Código Penal de 1940, n° 19, infine). Por seu turno, a Lei n° 7.209, de 11.07.1984, que alterou dispositivos do Código Penal de 1940, manteve o mesmo critério sobre a inimputabilidade penal dos menores de dezoito anos (art. 27 da Parte Geral). Em outras palavras, não foram levados em conta os fundamentos de or- dem psicológica, concernentes ao discernimento e inteligência, para efeito da fixação da idade para a responsabilidade penal, como veremos adiante. Discernimento e inteligência em função da idade do ser humano http://jornalf8.net/wp-content/uploads/2014/10/aaa45.jpg Como seres humanos, embora com tenra idade, as crianças são também suscetíveis de degenerescência, seja por fatores ou causas hereditárias, genéticas, biológicas, sociais, econômicas, psicológicas, familiares, que podem exercer influência maléfica sobre aquelas, a ponto de transformá-Ias em verdadeiros monstros, entes perversos, insensíveis, cruéis, torpes, assassinos, http://jornalf8.net/wp-content/uploads/2014/10/aaa45.jpg sanguinários. Daí a expressão criança-monstro, cujos casos concretos são conhecidos desde a Antiguidade, constituindo objeto de estudos psiquiátricos (cr. Philip Solomon e Vemon D. Patch, Manual de Psiquiatria, ps.530 e segs.; Arthur Ramos, A Criança Problema, ps. 31 e segs.). Seja como for, o tema em apreço relaciona-se à problemática de natureza psicológica, concernente ao discernimento e inteligência, que devem servir de fundamento para a fixação da idade de responsabilidade penal. Em síntese, discernimento é a faculdade que tem o indivíduo de distinguir perfeitamente os atos que pratica, assim como calcular os seus efeitos. Por sua vez, J. Alves Garcia assim conceitua a inteligência: "Chamamos inteligência ao conjunto constituído por todos os dons, talentos ou instrumentos que nos permitem adaptar às circunstâncias e desincumbir das tarefas que nos propõe a existência. Enquanto o desenvolvimento do corpo se opera até aos 20 ou mais anos, o da inteligência detém-se aos 15 anos, ou mais geralmente nos 13 anos, após o que crescem a experiência e a educação, somente" (Psicopatologia Forense, ps. 91 e segs.). Concluindo, a problemática em apreço está intimamente relacionada ao fator decisivo à afirmação individual, ou seja, o quociente da inteligência (QI) focalizado noutra parte da presente obra. Agora, a problemática da inteligência interessa como fundamento e critério para a fixação da idade, para efeito de responsabilidade penal do in- divíduo, como veremos adiante. Cabe lembrar ainda que, de acordo com os estudos sobre o assunto, o menor ou maior quociente de inteligência, assim como o fenômeno do indivíduo superdotado não resultam da hereditariedade, constituindo sim características individuais, da mesma forma, por exemplo, como os dotes vocais, a bela voz, o talento artístico. Direito Comparado acerca da fixação da idade para efeito de responsabilidade civil De acordo comos dados coligidos por César Barros Leal, a idade fixada para efeito de responsabilidade penal, nos diversos países, dentre outros selecionados, é a seguinte: Haiti - 14 anos; Índia, Paquistão, Honduras, EI Salvador, Iraque-15 anos; Birmânia, Filipinas, Ceilão, Hong-Hong, Bélgica, Nicarágua, Israel- 16 anos; Malásia, Polônia, Grécia, Costa Rica - 17 anos; Brasil, Tailândia, Áustria, Luxemburgo, Dinamarca, Finlândia, França, Suíça, Iugoslávia, Peru, Uruguai, Turquia - 18 anos; EUA - há variação de critérios nos diversos Estados-Membros da Federação, entre 16,17,18,19 e 21 anos (ob. e loco cits.). Percentualmente, a variação de idade, nos diferentes países, é a se- guinte: 14 anos (0,5%),15 anos (8,0%),16 anos (13,0%),17 anos (19,0%), 18 anos (55,0%), 19 anos (0,5%) e 21 anos (4,0%). Fundamento psicológico para afixação da idade, para efeito de responsabilidade penal, aos quatorze anos Como vimos anteriormente, de acordo com Nélson Hungria, nosso legislador não "cuidou da maior ou menor precocidade psíquica" dos menores de dezoito anos, simplesmente "declarou-os por presunção absoluta, desprovidos das condições da responsabilidade penal, isto é, o entendimento ético-jurídico e a faculdade de auto governo" (Comentários ao Código Penal, art. 23, voI. 2°, 1955). Acontece que, de acordo com os estudos e as conclusões da Psicologia, o desenvolvimento da inteligência no indivíduo se desenrola até aos 15 anos, ou mais geralmente aos 13 Y2 anos, após o que conta somente o crescimento da experiência e da educação (cf. J. Alves Garcia, Psicopatologia Forense, ps. 91 e 93). Quer dizer, aos 15 anos o indivíduo já se encontra com suficientes dis- cernimento e inteligência para se desincumbir das tarefas lhe propõe a exis- tência, inclusive o entendimento ético-jurídico, a faculdade de autogoverno, enfim a capacidade para entendimento acerca dos atos ilícitos penais. Em face das considerações acima expostas e da realidade brasileira, toma-se imperiosa a reflexão acerca da fixação da idade em quatorze anos, para efeito de responsabilidade penal, como ressaltamos na Indicação n° 187/1995, oferecida ao Instituto dos Advogados Brasileiros. Isso se justifica em face da incontrolável violência, por parte dos menores de 15 anos no Brasil, e dos elevados índices de infrações penais por eles praticadas; por outro lado, os mesmos competem ombro a ombro, em matéria de ferocidade, com os delinquentes adultos, no que diz respeito aos sangrentos motins e rebeliões, ocorridos nos estabelecimentos correcionais, conforme o noticiário divulgado pelos meios de comunicação social, frequentemente, resultando daí várias mortes. ARTIGO PARA REFLEXÃO Juventude, Violência e Maioridade Penal Mário Felizardo* Vivemos momentos cruciais em relação aos direitos da infância e da juventude. A partir do brutal crime que vitimou uma criança no Rio de Janeiro, Juventude e Violência passou a ser tema de intensos debates na Sociedade. Se por um lado, há perigo quanto ao retrocesso na conquista de direitos e, de forma especial, no processo civilizatório de nossa sociedade, fruto de opiniões desqualificadas e que se afastam da realidade e, por vezes, escondem interesses adversos ao centro da questão, como o da exploração comercial de presídios e do sistema sócio-educativo. Por outro, é uma grande oportunidade para agregar-se valor ao debate, através do esclarecimento técnico. Vivemos um momento de Caos Social, no que tange violência e Juventude. A violência fazendo de nossos jovens vítimas e algozes já vem de décadas, fruto de inúmeros fatores. Porém o latrocínio de um inocente menino, branco e de classe média, no qual os editores dos grandes meios de comunicação viram espelhados a imagem de seus filhos, deu ao Brasil a sensação da chegada ao fundo do poço. Mas, um olhar com o devido distanciamento, não aponta que haja neste início de ano nenhuma catástrofe, nem mesmo uma tendência para isso. Qual é nossa realidade? O Brasil, por sua grande extensão, difere-se em cada região. O estado do Rio Grande do Sul, que é modelo quanto ao atendimento aos jovens infratores - aponta recuo no número de internações nos dois últimos anos. No último ano houve recuo, em média, de 5%. São Leopoldo, comarca em que exerço minha atividade profissional, chegou a representar 47% dos jovens internos do ICS – casa que recebia jovens de Porto Alegre, Grande Porto Alegre e Vale dos Sinos. Hoje representa 25% do CASE – casa que recebe jovens do Vale dos Sinos e região, um universo muito menor. Consequência de políticas públicas que atravessaram duas gestões de governo estadual, criação de PPJ’s (políticas públicas para a juventude em nível federal, e investimentos nas medidas sócio-educativas de semiliberdade e em meio aberto). E essa sensação de impunidade dos jovens infratores e da falência do sistema. A partir da Lei 8069, O Estatuto da Criança e do Adolescente, de 1990, passamos de uma legislação que tratava especialmente do jovem irregular e passamos para um modelo de proteção integral. Fruto de uma má interpretação deste princípio, responsabilidade, em parte, dos próprios operadores da infância e da juventude que ansiavam por avanços na área, confundiu-se proteção integral de INDIVÍDUOS, as crianças e os adolescentes, com proteção integral de DIREITOS. Daí a cristalização do ECA como uma lei paternalista, não punitiva, complacente em relação às leis de outros países. Ainda que necessários ajustamentos na lei, há que reconhecer que o Brasil possui um DIREITO PENAL JUVENIL, implícito no ECA, sendo imprescindível a quebra de paradigmas enraizados na opinião pública que, tanto levam o jovem para o crime, na certeza de que “não dá nada”, como dá a população a sensação de insegurança. Vamos a eles. 1. No Brasil, menores não são responsabilizados pelos seus atos! Mentira. Crianças efetivamente não estão sob o poder coercitivo do Estado. A responsabilidade penal, na prática, começa aos doze anos, quando poderão ser “forçados” pelo Estado a cumprir determinação da justiça. Dizer dos jovens, inimputáveis, trata-se de uma correção no uso do termo jurídico, pois a eles não é atribuída a responsabilidade dos crimes. A eles são atribuídos ATOS INFRACIONAIS. Assim como não se pode dizer que menores são RÉUS em processos e sim REPRESENTADOS, pois contra eles há uma representação do Ministério Público. 2. Jovens no Brasil não podem presos! O termo utilizado é APREENSÃO. Na prática não há nenhuma diferença. 3. Para os menores “não dá nada”! Dá. E dá bem mais rápido. O processo de Apuração de ato infracional é extremamente célere. 4. Não há punição para os jovens! Aqui o ponto mais importante. A medida socioeducativa não é um bem para o jovem, - ainda que o resultado deva o ser – e tem caráter de PUNIÇÃO. O jovem é OBRIGADO, assim como os adultos a cumpri-la. Portanto o jovem é PUNIDO por suas condutas antissociais, para pagar sua DÍVIDA com a sociedade. 5. Menores ficam pouco tempo presos! “Meia-verdade”. Em comparação aos adultos, em razão da possibilidade da progressão de regime destes, a diferença no tempo recluso acaba não sendo tão significativa. Porém, pela necessidade da proporcionalidade da pena com o crime, efetivamente o aumento do prazo máximo de internação de 3 anos tem consenso no meio. 6. É um absurdo dizer que o jovem não tem discernimento quanto ao cometimento de um crime. Realmente é. Segundo Piaget Entre dez e doze anos é quando o jovem passa a respeitar as regras por elas próprias e por seus valores e respeito ao outro, em detrimento ao simples controle social. Um tratamento diferenciado ao jovem não tem como motivo ele “não saber que é errado cometer um crime” e sim por suas condições biopsicossociaisque são absolutamente diversas de um adulto. Trata-se de tratar de forma diferente, indivíduos diferentes, isso é a base da IGUALDADE. 7. Em outros países é diferente! Dados da ONU demonstram que são minoria os países que consideram penalmente adultos os menores de 18 anos. Sabe- se que de um total de 57 legislações estrangeiras analisadas, apenas 17% adotam idade menor do que 18 anos como critério para definição legal de adulto. Sendo que somente 2 países, Estados Unidos e Inglaterra, são considerados desenvolvidos. 8. O endurecimento das penas diminui a violência! A lei dos crimes hediondos que vigorou por quinze anos até ser considerada inconstitucional, representou um grande endurecimento das penas e não houve nenhum sinal de recuo na violência. 9. Redução da maioridade penal vai diminuir a violência! Não. Vai aumentar a violência, pois submeteremos um maior número de pessoas a um sistema que não funciona. *Oficial do Juizado da Infância e da Juventude do Poder Judiciário do RS. Coordenador do Projeto Diga Não ao Bullying Fonte: Pauta Social (www.pautasocial.com.br) BIBLIOGRAFIA ABERASTURY, Arminda & KNOBEL, Maurício. Adolescência Normal. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992. 10ª Ed. ABRAMO, Helena Wendel; BRANCO, Pedro Paulo Martoni. Retratos da Juventude Brasileira. ABRAMOVAY, Miriam et al. Juventude, violência e vulnerabilidade social na América Latina: desafios para políticas públicas. Brasília: UNESCO, BID, 2002. http://www.pautasocial.com.br/ ADORNO, Sérgio; BORDINI, Eliana B. T.; LIMA, Renato Sérgio de. O adolescente e as mudanças na criminalidade urbana. São Paulo Perspectiva. [online]. 1999, vol.13, n.4, pp. 62-74. ISSN 0102-8839. Disponível em www.scielo.org, acesso em 28/08/10. AKERS, Ronald L. Criminological Theories. Los Angeles: Roxbury Publishing, 2000, 3rd Edition. ATHAYDE, Celso; BILL, Mv; SOARES, Luiz Eduardo. Cabeça de Porco. Rio de Janeiro: Objetiva, 2005. BLAY, Eva. Adolescência: uma questão de classe social e gênero. 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