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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE GEOGRAFIA, HISTORIA E DOCUMENTAÇÃO DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA DISSERTAÇÃO DE MESTRADO Da Lei de Terras em 1850 à Constituição de 1934: Políticas de acesso à terra e efetiva ocupação no processo de consolidação da fronteira entre Mato Grosso e Bolívia. JOÃO BATISTA LOBO DOS SANTOS Cuiabá-MT 2017 JOAO BATISTA LOBO DOS SANTOS Da Lei de Terras em 1850 à Constituição de 1934: Políticas de acesso à terra e efetiva ocupação no processo de consolidação da fronteira entre Mato Grosso e Bolívia Dissertação apresentada à Banca Examinadora do Programa de Pós-Graduação em História, do Instituto de Geografia, História e Documentação – IGHD, da Universidade Federal de Mato Grosso, como requisito parcial à obtenção de título de Mestre em História. Orientadora: Profa. Dra. Tereza Cristina Cardoso de Souza Higa Cuiabá-MT 2017 TERMO DE APROVAÇÃO Aprovada em_____/______/______ Banca Examinadora ________________________________________________ Profa. Dra. Tereza Cristina Cardoso de Souza Higa (UFMT) Orientadora _______________________________________________ Prof. Dr. Flavio Gatti (UNIVAG) Examinador Externo _____________________________________ Profa. Dra. Leny Canzelli Anzai (UFMT) Examinador Interno ___________________________ Profa. Dra. Onélia Carmem Rosseto (UFMT) Suplente SANTOS, J.B.L. dos. Da Lei de Terras em 1850 à Constituição de 1934: Políticas de acesso à terra e efetiva ocupação no processo de consolidação da fronteira entre Mato Grosso e Bolívia. 2017. 143 p. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós- graduação em História, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2017. RESUMO A formação da grande propriedade na fronteira Oeste de Mato Grosso é o resultado de práticas políticas que se desenvolveram a partir da lei 601/1850, que criou a faixa de fronteira em sessenta e seis quilômetro do limite internacional, e tentou organizar e definir a propriedade privada no Brasil através da legitimação das antigas sesmarias. Esta organização territorial modificou-se em 1891, através da primeira Constituição republicana, que concedeu aos estados autonomia jurisdicional sobre suas terras devolutas. Em consequência dessa autorização Mato Grosso, através de edições de leis, decretos e resoluções do Legislativo passou a ocupar a faixa de fronteira com o capital estrangeiro, fosse através da venda ou arrendamento. As ocupações autorizadas pelo governo alcançaram a Constituição de 1934, que ampliou a faixa de fronteira em quarenta e quatro quilômetros criando uma faixa de segurança Nacional e retirou dos estados a autonomia sobre as terras devolutas dentro dessa região, sem, no entanto, alterar as celebrações anteriores, o que ocasionou imensas extensões de terra nas mãos de poucos proprietários. PALAVRAS CHAVE: Propriedade. Leis. Fronteira SANTOS, J.B.L. de. La Ley de la tierra en 1850 a la Constitución de 1934: las políticas de acceso a la tierra y la ocupación efectiva en el proceso de consolidación de la frontera entre Mato Grosso y Bolivia. 2017. 143 p. Disertación (master) - Programa de Posgrado en Historia, Universidad Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2017. RESUMEN La formación de gran propiedad en la frontera Mato Grosso West es el resultado de las prácticas políticas que se han desarrollado a partir de la ley 601/1850, que creó la línea fronteriza en el sesenta y de seis km frontera internacional, y trató de organizar y establecer la propiedad privada en Brasil sobre la legitimidad de las antiguas concesiones de tierras. Esta organización territorial fue cambiado en 1891, por la primera constitución republicana, que concedió los estados autonomía jurisdiccional en sus tierras públicas como resultado de esta autorización Mato Grosso, a través de emisiones leyes, decretos y resoluciones legislativas llegó a ocupar la pista frontera por el capital extranjero, ya sea por venta o arrendamiento. Las ocupaciones autorizadas por el gobierno llegaron a la Constitución de 1934, que amplió la línea fronteriza en cuarenta y de cuatro km crear una franja de seguridad nacional y tiró de los Estados autonomía sobre las tierras desocupadas dentro de esa región, sin embargo, el cambio de las celebraciones anterior, lo que causó enormes extensiones de tierra en manos de unos pocos propietarios. PALABRAS CLAVE: Propiedad. Leyes. frontera AGRADECIMENTOS Primeiramente agradeço a Deus, porque sem Ele eu nada teria feito. Acredito que toda conquista é resultado da bondade e do incentivo das pessoas que nos cercam. Meus sinceros e profundos agradecimentos a todos que colaboraram e me trouxeram luz durante o período de pesquisa e escrita deste trabalho. Sou grato a minha orientadora, Profa. Dra. Tereza Cardoso Higa, pela disponibilidade em me acompanhar nesta pesquisa, pelo seu respeito às minhas limitações, pelas conversas tranquilas e a grandeza de sua pessoa em me confiar parte de seu conhecimento. A minha mãe Anália, que sempre me incentivou, socorreu e ouviu minhas reclamações com paciência, e muitas vezes me apontou o caminho, meu muito obrigado. Ao meu pai, Dorival (in memoriam), foi o primeiro a me apontar a UFMT como caminho quando eu quis voar para longe, hoje sei que a proximidade com a família foi fundamental para a conclusão deste trabalho, e guardo os bons momentos e os conselhos que no decorrer da vida me deste. Onde estiver, meu obrigado. A minha esposa Carla Galbiati, que sempre me apoiou e me incentivou, e que através de seu companheirismo me ajudou a não desanimar diante dos desafios que o mestrado impõe. Aos meus filhos, Matheus e Bárbara, pela compreensão demonstrada quando a labuta da pesquisa me afastava do aconchego familiar, privando-os tantas vezes da minha presença e muitas vezes da minha atenção. Este título é dedicado a vocês. Aos meus irmãos Dorival, Sidney e Paulo, companheiros de incentivo nas dificuldades e compreensão nas faltas, vocês são importantes em todos os momentos. Aos professores do Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal de Mato Grosso, eu acredito ser injusto citar alguns nomes se todos tiveram sua importância em minha vida de aprendizado. O meu muito obrigado. Aos meus amigos de vida Carol Ramazotti e J. Rocha pelas noites agradáveis curtindo o melhor da noite cuiabana nos raros momentos de tranquilidade, aos meus colegas do mestrado e doutorado, com maior deferência a Leonice, Yasmani, Emerson, Cristiano, Cristiane, Debora, Fernanda, Marco Túlio, Ricardo Laub e Kátia. O meu carinho e votos de que todos terminem bem esta tarefa e sejam felizes. A sempre presente Alice, secretária do programa de Pós- graduação, que sempre foi mais que eficiente, foi amiga, e seus conselhos em nossos momentos de dúvida foram indispensáveis. A professora Paula Peña, Universidade Rene Moreno (Bolívia). Aos Doutores (as) e Mestres Domingos Sávio, Otavio Ribeiro Chaves, Maria do Socorro, Marli Auxiliadora, Elmar (Unemat) pelas dicas e apoio durante a pesquisa e escrita deste trabalho. A professora Doutora Wanda, diretora do APEMT, pelo carinho e atenção dedicado a mim durante minha estada no arquivo. A professora Doutora Leny Canzelli Anzai e ao professor Doutor Flavio Gatti pelas contribuições importantes para elaboração e conclusão deste trabalho. Meu reconhecimento. Ao Exército brasileiro, porque foram nas infindáveis andanças pela fronteira que nasceram os questionamentos que deram origem a este trabalho, e através da disciplina, ética, desprendimento, respeito, civilidade e companheirismo, tudo aprendido em suas fileiras, que durante as dificuldades me lembrava do lema “Missão dada, é missãocumprida”, e assim foi, mais uma missão cumprida. Ao Instituto Memoria da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, na pessoa de seus funcionários, pela atenção dispendida em me atender com as legislações solicitadas. Aos historiadores de Mato Grosso; Segundo Alcir Lenharo, a história não se isola, nem adormece na idade da Província em Mato Grosso. O fluxo histórico apenas muda de ritmo na passagem do estatuto colonial para o nacional. “De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto. ” Rui Barbosa. Obras Completas - V. 41, t. 3, 1914. p. 86 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 15 FRONTEIRAS E LIMITES: A ESTRATÉGIA DA POSSE ATRAVES DA OCUPAÇÃO ......... 24 1. Histórico expansionista .................................................................................. 24 1.1 Colonização da Capitania de Mato Grosso ................................................. 32 1.2 Política, Estratégia de Ocupação ................................................................ 37 1.2.1 A Jacobina como centro irradiador de ocupação ................................................ 41 1.3 Da independência a Lei de Terras - 1822-1850 .......................................... 44 LIMITES E FRONTEIRAS: A CONSTRUÇÃO DO TERRITÓRIO NACIONAL NA FRONTEIRA OESTE, 1850-1900 ................................................................................................. 49 2. Da Constituição a Lei de Terras ......................................................................... 49 2.1 A espera de organização na Lei 601 de 1850 ............................................. 55 2.2 Os limites são ocupados ............................................................................. 63 2.3 O coronelismo e o tempo de posseiros ...................................................... 67 2.4. Quando a política legisla em causa própria: .................................................. 74 2.5 A legislação agrária no Estado de Mato Grosso .............................................. 77 MUDA-SE O SÉCULO, MAS NÃO OS PROBLEMAS: O SURGIMENTO DO LATIFÚNDIO DA FRONTEIRA OESTE ............................................................................................ 85 3. A política oitocentista e o início do século XX. .................................................. 85 3.1. As prorrogações da ilegalidade ...................................................................... 86 3.2 A Política através da terra ............................................................................... 91 3.2.1 A Legislação dos Coronéis .......................................................................................... 91 3.3 Fronteira: Território Do Mundo .................................................................... 102 3.4. Conselho de defesa Nacional (CDN) ............................................................ 123 3.4.1 A política de defesa nacional pós-guerra ............................................................. 123 3.4.2 O Nacionalismo e o fortalecimento do poder central ...................................... 126 3.4.3 Getúlio Vargas e a Constituição de 1934 ............................................................. 129 3. 5. Faixa de Fronteira e Faixa de Segurança Nacional ...................................... 131 3.5.1 A nova política territorial de fronteira: Dominialidade versus propriedade136 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 142 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 144 LISTA DE FIGURAS Figura 01: Capitanias Hereditárias – 1574................................................... 27 Figura 02: Entradas e bandeiras................................................................... 29 Figura 03 Sesmarias em Minas do Cuiabá - 1726-1728 .............................. 33 Figura 04: Localização das missões espanholas no século XVIII.................. 34 Figura 05: Fortificações Pombalinas............................................................ 36 Figura 06: Produção agropecuária de MT e Goiás....................................... 50 Figura 07: Limites imprecisos - 1850........................................................... 55 Figura 08: Carta XXIII do Atlas do Império do Brasil, de Cândido Mendes. 56 Figura 09: Mapa Ten. Cel. Antônio Pimenta Bueno -1880.......................... 57 Figura 10: Mapa de Descalvados................................................................. 65 Figura 11: Lagoa Uberaba a Bahia Negra..................................................... 95 Figura 12: Economia no Brasil/XIX-XX.......................................................... 99 Figura 13: Economia-Mato Grosso - XX........................................................ 99 Figura 14: Concessões feitas a Matte Laranjeira ao Sul de Mato Grosso…. 102 Figura 15: Empreendimentos na Fronteira Oeste até o século XIX............. 103 Figura 16: Empresas ao longo da fronteira Oeste, século XIX..................... 105 Figura 17: Tratado de Petrópolis-1903........................................................ 106 Figura 18: Área da Fomento argentino agropecuária.................................. 114 Figura 19: Fronteiras e Limites do Brasil - 1889........................................... 114 Figura 20: Regiões em litígio na Fronteira................................................... 114 Figura 21: Guajará Mirim/S. Antônio do Rio Madeira................................. 127 Figura 22: Faixa de Segurança Nacional de Fronteira – 1934..................... 128 LISTA DE TABELAS Tabela 01: Brasil: Totais de Imigrantes entre 1850 e 1930............................. 52 Tabela 02: Divisão Charqueada Descalvados.................................................. 66 Tabela 03: de Posses Jaime Cibils Buxareo.................................................... 77 Tabela 04: Número de títulos expedidos em 1925....................................... 111 Tabela 05: Estados limítrofes na fronteira do Brasil e seus Municípios - 2008................................................................................................................ 132 LISTA DE QUADROS Quadro 01: Posses da jacobina – 1813.......................................................... 40 Quadro 02: Usineiros na Assembleia Legislativa MT: 1883-1934................. 63 Quadro 03: Leis e Decretos de Mato Grosso-1892/1900.............................. 70 Quadro 04: Leis e Decretos de Mato Grosso-1900/1934.............................. 85 Quadro 05: Arrendamento de terras – Individual – 1902............................. 92 Quadro 06: Empresas instaladas em Mato Grosso-1895/1920.................... 102 Quadro: 07: Empresas Latifundiárias na Fronteira....................................... 103 LISTA DE ABREVIATURAS C.D.N.........................................................................Conselho de Defesa Nacional C.S.S.N .... ............................................Conselho Superior de Segurança Nacional 15 INTRODUÇÃO O presente trabalho intitulado “Da Lei de Terras em 1850 à Constituição de 1934: Políticas de acesso à terra e efetiva ocupação no processo de consolidação da fronteira entre Mato Grosso e Bolívia”, analisa, dentro do período proposto para estudo, a relação entre as práticas políticas no campo agrário estabelecidas em Mato Grosso frente à normatização definida pelaLei de Terras de 1850 e a Constituição de 1934. A fronteira Oeste aqui tratada abrange a faixa de terras ao longo da linha limítrofe do estado de Mato Grosso com a Bolívia. Possui mais de 750 Km1 de extensão formados por rios, pântanos, cerrados, regiões desérticas e fazendas. E ao atuar como militar da ativa do exército, experiência que instigou a pensar sobre a ocupação daquele espaço, e proporcionou questionar sobre até que ponto a fronteira, entre Mato Grosso e Bolívia, espaço hoje considerado área de segurança, fora tomado pela influência de interesses políticos e econômicos. As Áreas de Interesse da Segurança Nacional, foram estabelecidas pela Lei 5.449 de 19682, durante o governo do General Costa e Silva, com objetivo de apresentar uma política de defesa e de garantia de soberania, o que era considerado necessário frente às indefinições de limites com alguns países vizinhos. Nesta situação se encontravam áreas no Oeste de Mato Grosso, limítrofe com a Bolívia, o que proporcionava invasões e ocupações diversas do território brasileiro. Durante as andanças por estas áreas de segurança da “fronteira”, constantemente, percebia-se cercas de arame farpado de fazendas que possuíam início no Brasil e adentravam o território boliviano ignorando os marcos que delimitavam os limites entre os dois países. 1 LUCENA, Roberto de. Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. Requerimento. Disponível: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/852800.pdf>. Acessado em: 12 05 2017 2 Ver, a esse respeito, Lei 5.449 de 04 de junho de1968, alterado pelo Decreto –Lei 2.183 de 19 de dezembro de 1984. 16 Os marcos de fronteira representavam o “corpo físico” dos tratados. Do ponto de vista político e diplomático a retirada destes marcos de seu local de origem pelos fazendeiros que os utilizavam como esteio de cerca ou suporte para curral de gado, suprime a materialidade da fronteira. De forma que, nas fiscalizações dos marcos trabalhados podia se perceber as dificuldades acarretadas por conta das ausências dos mesmos. Alegando desconhecimento da lei erguiam-se cercas e os marcos eram utilizados de acordo com a conivência dos proprietários locais, que comumente não residiam nas fazendas, e seus funcionários muitas vezes tentavam impedir o trabalho dos militares nas fiscalizações. Em determinado percurso de reconhecimento realizado na região de Santa Rita em que o empregado nos questionava da autoridade para romper as cercas. Normalmente o policial federal, que nos acompanhava, acabava por notificá-lo e ameaçando-o de prisão, no entanto, sabíamos que seria inútil, e da mesma forma, inútil era romper as cercas, em 15 dias elas estariam erguidas novamente e cerceando o caminho entre os marcos, mas, fazíamos o nosso trabalho. Outra prática “comum” observada, estava relacionada às atividades criminosas. Muitas fazendas eram recortadas por estradas clandestinas, conhecidas como “cabriteiras”, nas quais o transporte de produtos ilícitos passava de um lado a outro. Além da prática ilícita, a criação de gado crescia dentro dessa região fronteiriça, o que desencadeava a busca de mais terras para o desenvolvimento de tal atividade, assim, se fortalecia as grandes propriedades voltadas para a pecuária, enquanto os pequenos produtores viam-se alijados da terra. A experiência empírica leva-nos a indagar tais práticas naquele espaço. O trabalho que é apresentado buscou nos documentos compreender a fronteira Mato Grosso com a Bolívia em um período distante deste, entre o império e a República. A partir das legislações agrárias promulgadas entre 1850 e 1934 17 buscamos perceber a relação entre as mesmas e as práticas políticas daquele momento. O processo de criação das leis agrarias do estado de Mato Grosso e sua aplicação, pode ter influenciado na ocupação e consolidação da faixa de fronteira entre Mato Grosso e Bolívia. De forma que, as edições de leis e sua aplicação poderiam esclarecer a visível imutabilidade na venda e na transmissão das terras localizadas nessa área de fronteira, da mesma forma proporcionar o entendimento da permanência de um grupo no domínio nestas terras. Este processo de criação das leis foi objeto de pesquisa de parte da historiografia, preocupada em estudar a questão da terra. As análises sobre a situação das terras no Brasil foram feitas, na sua maioria, em relação a outros objetos como a escravidão, migração, imigração e índios, e seus resultados mostraram a influência de determinados grupos da sociedade assim como na formação política nacional em diversos períodos históricos. Em Mato Grosso, a historiografia regional, a partir da mesma linha da historiografia brasileira, procurou analisar momentos históricos como tema principal, assim, as questões envolvendo a posse da terra aparecem em segundo plano ao momento pesquisado. Desta forma, ao se discutir o início das ocupações no pantanal em Mato Grosso, a partir do início do século XVIII, os índios Paiaguás são apresentados, por Corrêa Filho3, como a principal dificuldade para o avanço dos conquistadores e para sua política colonizadora. A “imensidão terrível”, citada pelo autor, possivelmente possa ter sido o que impulsionou os portugueses a fazerem a conquista e a aquisição daquelas terras que poderiam proporcionar novas minas e posteriormente o aumento na criação de gado, que entendemos estava voltada naquele momento, para a subsistência. 3 CORRÊA FILHO, Virgílio. Fazendas de gado no pantanal Mato-Grossense. Serviço de informação agrícola; Documentário da vida rural nº 10; Rio de Janeiro, RJ; 1955.Op. Cit. In. p.18. 18 O domínio dessas terras proporcionou, com o passar dos anos, o aumento significativo dos criadores de gado pelo vale do Paraguai e na anexação de terras as sesmarias concedidas pela Coroa. Com estas anexações ocorreram privatismos4 de terras, prática esta, que havia sido comum no período colonial e que subsistiu às mudanças ocorridas com a independência do Brasil, que proporcionou novos entendimentos sobre a posse da terra, e se consolidou com a promulgação da primeira lei agrária do Brasil. Segundo Ligia Osório Silva5, a Lei de Terras promulgada em 1850 visava proporcionar um ordenamento jurídico da propriedade da terra diante de uma situação confusa herdada do período colonial. Assim, pode-se entender que esta “situação confusa” esteja relacionada ao fim do ordenamento jurídico português, sistema de sesmarias, determinada por D. Pedro I em 1822, mas, sem um regramento que o substituísse o que deu continuidade ao processo de ocupação de terras que já ocorria, sem fiscalização, durante o fim do período colonial. A nova lei representava, em muitos aspectos, os ideais de uma classe escravista e de proprietários de terra que eram manifestas na necessidade do Império em consolidar seu território e ao mesmo tempo impedir o acesso à terra daqueles que não poderiam cultivá-la. A legislação de terras foi aplicada no Estado de Mato Grosso a partir da Constituição republicana de 1891, que alterou o termo província para Estado e delegou-lhe autonomia para gerir sobre suas próprias leis. Assim, editou-se a lei nº 20 de 1892, em consonância com a Constituição. De forma que, não se alterava a situação de dominialidade das terras já ocupadas na fronteira e mantinha sua expansão a necessidade do criador6. 4 Ver SILVA, Ligia Osório. Terras devolutas e latifúndio: efeito da lei de 1850. p. 12 5 SILVA, Ligia Osório. Terras devolutas e latifúndio: efeito da lei de 1850. Editora UNICAMP; Campinas, SP; 1996. p. 13 6 MORENO, Gislaene. Terra e poder em Mato Grosso: política e mecanismos de burla: 1892- 1992; Ed. Entrelinhas; Cuiabá, MT; 2007.p. 65 19 A lei agrária do Estado manteve o corpo da Lei de Terras. Assim, o processo de ocupação da faixa de fronteira região se igualava a das terras localizadas fora dessa região, mantinha as posses adquiridas anteriores a lei, regularizadas ou não e favorecia a manutenção da relação entre o poder político com o capital estrangeiro. Diversas pesquisas, como mencionado anteriormente, não proporcionam o entendimento quanto a relação entre as práticas políticas na elaboração das leis dentro do estado Mato Grosso, frente ao processo de consolidação do território brasileiro. Portanto, estas pesquisas, não respondem se a ocupação das terras na fronteira Oeste visava a manter a soberania territorial brasileira nessa região, ou seja, se a distribuição de terras realizada nos limites de Mato Grosso com a Bolívia poderia prover o reconhecimento futuro de áreas ainda em litigio nos limites pré- estabelecidos e sem acordos diplomáticos. A partir da constatação desta lacuna historiográfica, nos indagamos se a elaboração de leis, voltadas para a terra no estado de Mato Grosso, se ligavam a práticas políticas que haviam se iniciado na elaboração da Lei de Terras em 1850, que, favoreceram um longo caminho de ocupações e protelações de prazo até 1934, e se, efetivamente, se relacionavam a interpretações das constituições brasileiras. Para responder a tais indagações estabelecemos como marcos cronológicos desta pesquisa, 1850 como ponto inicial, ano da promulgação da lei 601 “ Lei de Terras” que definiu a faixa de fronteira e normatizou o acesso à terra bem como as formas de aquisição, e tornou-se base para a Constituição de 1891, que delegou competência aos estados legislar sobre todas as suas terras. Em Mato Grosso, ambas serviram como norteadoras para a elaboração da Lei 20/1892 que propiciaria a distribuição territorial do estado. Este conjunto de leis regulamentou a ocupação da área de fronteira entre 1892 a 1934, observando as conceptualizações jurídicas sobre a terra apresentadas na Lei 601/1850, o que proporcionou a ocupação das terras próximo 20 ao limite através de interpretação política sobre a conceptualização de terras devolutas7, apesar do distanciamento dos limites e os direcionamentos para a colonização informados na Carta Magna e na Lei de terras. Em 1934, segunda baliza temporal adotada neste trabalho, sobe ao poder Getúlio Dorneles Vargas e, através de uma nova constituição, retira dos estados a atribuição de gerir sobre as suas terras na fronteira. Foi crida uma zona de segurança, aumentando a área da faixa de fronteira8. Foi instituído, também, o Conselho de Defesa Nacional9, que viria mais tarde a se tornar o Conselho Superior de Segurança Nacional, e este tornar-se, na política de segurança nacional implantada por Vargas, o “administrador” das terras na fronteira. A análise aqui empreendida buscou relacionar as medidas adotadas na política de distribuição de terras a partir de 1850 e o processo de elaboração das leis agrárias do estado de Mato Grosso até o ano de 1934. Para tal, não analisamos apenas as leis do período proposto, mas, recuamos temporalmente e ampliamos o corpus documental, buscando entender a relação entre as sesmarias e a fronteira diante das áreas ainda indefinidas nos tratados. Entre os documentos pesquisados está o arquivo de leis da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, fonte importante para se ter acesso às leis do Estado publicadas desde 1892 e aos discursos dos governadores do Estado que apresentam o cenário político e econômico naquele período, bem como, os relatórios e decisões quanto aos arrendamentos de terras na fronteira, e, em especial, o discurso do Governador Pedro Celestino que apresentou a 7 BRASIL. Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850. Dispõem sobre terras devolutas do império. Artigo 3º; § 1 – 4. ” 8 BRASIL, Constituição (1934) Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil (16 de julho de 1934). “ Art 166 - Dentro de uma faixa de cem quilômetros ao longo das fronteiras, nenhuma concessão de terras ou de vias de comunicação e a abertura destas se efetuarão sem audiência do Conselho Superior da Segurança Nacional, estabelecendo este o predomínio de capitais e trabalhadores nacionais e determinando as ligações interiores necessárias à defesa das zonas servidas pelas estradas de penetração. ” 9 “Criado pelo decreto n. 17.999, de 29 de novembro de 1927, tinha por fim proporcionar ao Governo os elementos necessários para que este pudesse resolver do melhor modo as questões relativas à defesa nacional, cabendo-lhe principalmente resolver as questões que interessam ou exigem a ação de mais de um ministério” 21 preocupação política com o desvio de finalidade da terra no estado, onde pode-se perceber a ligação entre o poder executivo e legislativo diante da edição de leis. A documentação abrangeu, também, a Biblioteca Nacional e o Arquivo Público do Estado de Mato Grosso, nos quais foram colhidos alguns títulos de posses expedidos em fins do século XIX, que apresentam a situação de dominialidade da fronteira por grupos estrangeiros, principalmente os belgas e a Cia Mate Laranjeiras, podendo-se, a partir da análise destes documentos, criar ou dar forma a ocupação ocorrida e todo o seu desenvolvimento em relação as leis que vinham sendo publicadas. O portal da Câmara e do Senado federal, tornaram- se de grande valia pela facilidade de acesso as leis e suas modificações no decorrer do período. A leitura dessas leis permitiu entender que o estado interpretava as leis promulgadas de acordo com suas necessidades. Pode-se perceber, também, que a União seguia um determinado ritmo em relação às publicações, e este, somente foi quebrado com a chegada de Getúlio Vargas ao poder. Outras fontes se mostraram importantes no transcorrer da pesquisa, como mapas e trabalhos historiográficos de autores que possuíam no seu corpo, de forma esparsa, informações acerca do objeto da pesquisa proposta, o que nos auxiliou a preencher muitas das lacunas deixadas pela falta de acesso a documentos nos arquivos dos Cartórios, INCRA e INTERMAT, fontes riquíssimas e de pouco ou nenhum acesso, e que por entraves burocráticos e pelo pouco tempo que o mestrado disponibiliza para a elaboração da dissertação, foram abandonados. Para realizar a análise da relação entre as práticas ocorridas nas edições das leis agrárias e a ocupação efetiva da fronteira, o trabalho foi dividido em três capítulos. O primeiro capítulo, intitulado “Fronteiras e Limites: A estratégia da posse através da ocupação”, procura apresentar, ainda que parcialmente, o processo de interiorização do regramento sesmarial através das entradas e 22 bandeiras, estas como parte de uma política estratégica adotada com o intuito de conquistar novas terras, ocupando-as para consolidar o domínio português. O expansionismo português, para as proximidades do limite Oeste, trouxe as sesmarias como forma de divisão territorial, estas foram elementos importantes para entender a relação entre a distribuição de posses e o posseiro, o que criou a base de um sistema privatista que adentraria o Império. A fazenda Jacobina, no município de Cáceres, por exemplo, foi uma das primeiras propriedades ocupadas na segunda metade do século XVIII (1769). Esta fazenda, localizada próxima à fronteira, em conformidade com a legislação vigente no período, teve sua área inicial bastante ampliada, tornando-se uma das maiores e mais produtivas fazendas da fronteira. Mais tarde, esta fazenda passou a atender aos interesses de grupos estrangeiros interessados no controle do criatório e na produção e comércio de charque. Percebe-se, na documentação, que existia uma constante mudança nas anexações de terras nas antigas sesmarias da Capitania de Mato Grosso, prática estaque entendemos não permaneceu restrita ao fim do período colonial em 1822. De forma que, entre o fim do domínio português e o início do Primeiro Império, as terras da Capitania eram mais anexadas às posses originais do que eram concedidas pela Coroa, e o fim do domínio português marcou o início das ocupações em torno das antigas posses, mas, com a mesma finalidade. No segundo capítulo, intitulado “Limites e Fronteiras: A Construção do Território Nacional na Fronteira Oeste, 1850-1934”, expomos a análise da Lei de Terras e das Constituições de 1824 e 1891. Acreditamos que houve, na passagem do Império à República, uma continuidade na política de “favores”, que se firmou com a ascensão dos coronéis e senhores de terra ao poder político dentro da Província. Estes mantiveram, mesmo com o advento da República, o comando sob o território devoluto ou não. Este domínio pode ser analisado também pelo acesso e permanência de usineiros e criadores nos cargos político dentro do Legislativo e do Executivo. 23 O último capítulo, “Muda-se o século, mas não os problemas: O surgimento do latifúndio da fronteira Oeste”, apresenta as considerações sobre as transformações da política agrária no Estado de Mato Grosso no início do século XX, tratando das decisões e mudanças ocorridas na política brasileira sob a influência da Grande Guerra e da quebra da bolsa de valores. Percebemos a continuidade do processo de favorecimento a grupos ligados ao capital estrangeiro e a indivíduos pertencentes ao círculo dos senhores de terra, de forma que, membros do legislativo, que desde o século XIX, permaneciam no poder, utilizavam-se da mesma prática centrada nas reedições dos prazos para legitimação e regularização das terras no estado. O fim destas práticas, acreditamos, veio a acontecer com a ascensão ao poder de Getúlio Dorneles Vargas, onde, por meio da Constituição de 1934 modificou as relações de dominialidade dos Estados em relação a terra e a faixa de fronteira, de forma a, implantar uma nova Política de Segurança Nacional que se efetivaria no Conselho Superior de Segurança Nacional. Neste trabalho não cabe apresentar novos conceitos sobre a fronteira ou explica-los à medida que as legislações são apresentadas. A fronteira deve ser, para este trabalho, o local de interesse capitalista e de aplicabilidade das leis agrárias do império a República através de práticas políticas oriundas no Primeiro Império. Estas práticas estavam ligadas a interesses que proporcionaram políticas de ocupação de terras, de forma que, indiretamente proporcionaram a consolidação da soberania territorial do Brasil nas áreas que ainda estavam indefinidas, no entanto, ao mesmo tempo, mantiveram uma política de exclusão social na terra que favoreceu, nos anos vindouros, a consolidação do grande latifúndio na fronteira Oeste. 24 CAPITULO I FRONTEIRAS E LIMITES: A ESTRATÉGIA DA POSSE ATRAVES DA OCUPAÇÃO A capitania de Mato Grosso foi criada em 1748 localizada no ponto mais avançado no Oeste da colônia. Com grande extensão de terras limítrofes com os domínios da Coroa espanhola, a ocupação10 desse espaço foi parte de uma estratégia expansionista que resultou mais tarde na consolidação dessas conquistas. Objetivamos neste capítulo demonstrar que tal estratégia teve como mecanismo principal a concessão de sesmarias nas proximidades dos limites coloniais. Serão feitas algumas considerações sobre o início da exploração da América Portuguesa a partir do litoral, enfatizando alguns aspectos da expansão territorial em direção ao Oeste. Especificamente em relação a Mato Grosso, serão apresentadas e discutidas as principais estratégias de conquistas territoriais adotadas que levaram à formação das primeiras vilas e núcleos populacionais da capitania. Por fim, será discutido o papel da questão agrária na consolidação territorial das fronteiras a partir da Independência do Brasil. 1. Histórico expansionista Quando exploradores europeus, principalmente portugueses e espanhóis, no século XV e XVI, iniciaram o desbravamento11 dos mares então desconhecidos12, buscam de uma nova rota comercial para as Índias, fugindo dos 10 Antes da promulgação da citada lei (de 1850) vigorava o costume de adquirirem-se por ocupação (posse era o termo consagrado) as terras devolutas, isto é, as terras públicas que não se achavam aplicadas a algum uso ou serviço do Estado, províncias ou municípios. 11 Ocorreu do século XV ao XVI e ficou conhecida como a “Era das Navegações e dos Descobrimentos Marítimos. ”Ver, a esse respeito, História Moderna e Contemporânea Osvaldo Rodrigues de Souza; in.: <http://urs.bira.nom.br/literatura/descobrimentos_maritimos.htm>. Acesso em: 14 05 2016 12 Oceano Atlântico, Pacífico e Índico 25 atravessadores na Itália, genoveses e venezianos, que cobravam alto valor pelas especiarias13, as quais eram muito consumidas na Europa. As Coroas portuguesa e espanhola agruparam a essa necessidade o interesse no descobrimento de novas terras e novos fiéis para a Igreja. Portugal tornara-se pioneiro na navegação marítima por diversos fatores e inventos que auxiliavam na navegação, como a escola na vila de Sagres14 formada pelo infante D. Henrique. Em 1493 a Bula papal Inter Coetera15 dividia o mundo conhecido, pela primeira vez, entre Espanha e Portugal. No entanto, como a referência de medida, fixada em “100 léguas de Cabo Verde” era imprecisa, pois só existia o Oceano Atlântico, tornou-se necessário uma desta divisão territorial, acertada com o Tratado de Tordesilhas, em 1494. Esta nova configuração dos limites permitiu, inicialmente, que Portugal tomasse posse de parte das terras do que viria a ser o Brasil. Quando a caravela de Cabral aportou na costa brasílica, em 1500, a falta de informações sobre a nova terra, suas dimensões e riquezas, fizeram com que fossem pouco exploradas nos anos iniciais, ficando a mercê de piratas e contrabandistas. A partir de 1534, a América portuguesa ocupou novo espaço na política da Coroa. Dom João III, com receio dos franceses que estimulados por Francisco I da França16 se entregavam a pirataria nos mares americanos e faziam incursões 13 Pimenta, açafrão, gengibre, canela e outros temperos. 14 A existência ou não da Escola de Sagres já foi amplamente debatida no panorama historiográfico português. Porém, desde o princípio do século XX que a ideia de uma escola náutica fundada pelo Infante D. Henrique se encontra ultrapassada. D. Henrique fundou uma vila no Algarve, em 1443, pelo pedido feito ao seu irmão, o regente D. Pedro, que lhe concedesse a região inóspita de Sagres, o pedido foi concedido e a vila foi fundada no lugar de Terçanabal. Durante o século XX desconstruiu-se a tese da escola científica, mas é importante perceber que a lenda da Escola de Sagres teve a sua grande expansão durante os séculos XVIII e XIX, ou seja, numa época em que as academias científicas proliferavam por todo o mundo. In. <http://cvc.instituto-camoes.pt/navegaport/g19.html>. Acesso em: 14 05 2016. 15 A Bula Inter Coetera foi definida como um tratado em maio de 1493, pelo Papa Alexandre VI, esta procurou acordar e assegurar os direitos de Portugal e de Espanha quanto as novas terras a serem descobertas. À Portugal foi determinado como sendo suas, as terras encontradas até 100 léguas à oeste do Arquipélago de Cabo Verde, já para a Espanha, todas as terras que fossem descobertas além desse limite. 16 “Felipe I da França ficou irritado pela parcialidade pontifícia na divisão feita do mundo, entre Portugal e Espanha, ao ver seu país ser deixado de fora dessa divisão [...] e como não lhes 26 no litoral a fim de “explorar” o pau-brasil17, buscou alternativas para a defesa deste território que se tornara importante.Dom Diogo de Gouveia18 propôs, então, o primeiro projeto português de colonização, com a recomendação de implantação das Capitanias Hereditárias19, conforme figura 01 a seguir. As capitanias eram grandes extensões de terras recortadas na costa que seriam entregues a fidalgos da pequena nobreza, homens de negócios, funcionários burocratas e militares, enfim, homens de confiança da coroa. As capitanias tinham a função de servir como base militar e econômica e sua área seria dividida em lotes de terra, as sesmarias20, a serem distribuídas aos seus colonizadores21. Com a instituição das Capitanias Hereditárias a economia na América portuguesa voltou-se para o cultivo do o açúcar, produto consumido na Europa, e de alto valor no mercado. Tal projeto de colonização teve maior êxito nas capitanias de São Vicente e Pernambuco22, entretanto, outros espaços não atendessem os melindres incentivava os flibusteiros do mar do Norte a pilharem os mares americanos”. In. PORTO, Costa. O Sistema sesmarial no Brasil. 17 ABREU, Capistrano de. 1853-1924. Capítulos de história colonial: 1500-1800. Conselho Editorial do Senado Federal; Brasília- DF, 1998. p. 54. 18 “DIOGO DE GOUVEA em uma Cidade de Beja celebre solar da eruditíssima família onde teve por pai Antão de Gouvea Cavaleiro professo da Ordem de Cristo, e por irmãos Manoel de Gouvea Prior da Igreja de Nicolau de Lisboa e o Doutor Gonçalo de Gouvea Desembargador da Casa Providencia. Depois de estar mente instruído nas letras amenas passou a estudar na Universidade Paris e tal foi o progresso que fez que recebeu o título de Doutor na Faculdade de Teologia por aclamação geral de todos os Catedráticos, e pela sua prudência tornou-se Reitor da mesma Universidade”. Disponível: <https://books.google.com.br/>. Acesso em: 16 05 2016. 19 “[...] consistia em dividir a conquista em largos tratos territoriais, quinhoados a vassalos que os dirigissem e defendessem, defendendo o próprio domínio da coroa, o sistema “donatorial”. In. PORTO, Costa. O Sistema sesmarial no Brasil. Volume 1 da Coleção Temas brasileiros; Editora Universidade de Brasília; Brasília, 1979. 20 “O vocábulo sesmaria derivou-se do termo sesma, e significava 1/6 do valor estipulado para o terreno. Sesmo ou sesma também procedia do verbo sesmar (avaliar, estimar, calcular) ou, ainda, poderia significar um território que era repartido em seis lotes, nos quais, durante seis dias da semana, exceto no domingo, trabalhariam seis sesmeiros. ”In. PORTO, Costa. O Sistema sesmarial no Brasil. Volume 1 da Coleção Temas brasileiros; Editora Universidade de Brasília; Brasília, 1979.p. 05. 21PORTO, Costa. O Sistema sesmarial no Brasil. Volume 1 da Coleção Temas brasileiros; Editora Universidade de Brasília; Brasília, 1979.p. 03. 22 “As capitanias que obtiveram sucesso – São Vicente e Pernambuco – o fizeram a partir do plantio de cana-de-açúcar, do estabelecimento de engenhos e da aproximação com os indígenas, especialmente através da união de europeus com mulheres nativas. ” In. DORNELLES, Bruna Pasetti. A cidade colonial brasileira na união ibérica: base da expansão territorial e lugar de defesa; PUCRS – Dissertação; Porto Alegre, RS; 2011. p. 91-92 27 obtiveram o mesmo tornando o sistema de Capitanias Hereditárias pouco viável para a Coroa23. Figura 01: Capitanias Hereditárias 1574 *Fonte: Disponível em meio eletrônico24 23 Op. Cit. In. PORTO, Costa. O Sistema sesmarial no Brasil. p. 4. 24 ALONSO, Regina. <www.brasil500anos.ibge.gov.br>. Acesso em: 14 05 2017. 28 Segundo Dornelles durante a União Ibérica, período em que Portugal esteve sob o reinado dos reis espanhóis25, a administração portuguesa conseguiu melhorar o estabelecimento de suas fronteiras territoriais. Os primeiros trinta anos foram marcados por um governo equilibrado do ponto de vista do cumprimento dos compromissos assumidos pela Coroa portuguesa, no entanto, quando a armada espanhola foi derrota pelos ingleses em 155826, a coroa portuguesa sentiu sua primeira perda através dos navios e homens que foram cedidos a Espanha e novamente em 1618, quando a Espanha entra na Guerra dos Trinta Anos, Portugal e suas colônias passam a sentir os efeitos da guerra pelos ataques dos inimigos da Espanha, como a Holanda, Inglaterra e França, que antes eram seus aliados. O fechamento dos portos brasileiros aos Holandeses, que eram consumidores e parceiros comerciais de Portugal nos produtos de suas colônias, afastaram os portugueses do comercio e forçou“ uma reorientação das táticas holandesas para a obtenção daqueles produtos que lhes eram importantes na sua lógica mercantil, sendo esta reorientação a intensificação do contrabando e o projeto de invasão e conquista de territórios americanos”27. A União Ibérica teve seu fim em 1640, com a restauração portuguesa, chegando ao poder a dinastia Bragança, a América portuguesa recuperou, então, a sua importância comercial diante dos domínios portugueses d’além mar. No entanto, o comércio de açúcar já estava comprometido, uma vez que os holandeses produziam este produto nas Antilhas a um custo inferior. Com a queda do valor comercial do açúcar Portugal buscou outras formas de colonizar as terras americanas. Buscar novas terras, conforme figura 02 a seguir, tornou-se uma alternativa para a Coroa portuguesa, expedições de desbravamento territorial que 25 “Unidade política que regeu a península ibérica de 1580 a 1640, resultado da união dinástica entre as monarquias de Portugal e da Espanha após a Guerra da Sucessão Portuguesa.” 26 Armada invencível. Porto Editora, 2003-2017. [consult. 2017-02-13 12:16:16]. 27 DORNELLES, Bruna Pasetti. A cidade colonial brasileira na união ibérica: base da expansão territorial e lugar de defesa. PUCRS – Dissertação; Porto Alegre, RS; 2011. p. 114. 29 possuíam como missão o apressamento de indígenas para escravizar, foram também usadas por Portugal como justificativa para avançar sobre o limite do Tratado de Tordesilhas28 em direção a colônia espanhola. Deu-se início ao expansionismo português em terras brasílicas, com duas frentes de exploração, as entradas e as bandeiras. A primeira eram expedições oficiais da coroa e, portanto, eram compostas por soldados portugueses e brasileiros e deveriam realizar o mapeamento do território a medida que o adentrava, e estas informações eram enviadas a Portugal para através do conhecimento da terra realizar a sua colonização. A segunda frente era organizada por particulares, compostas, normalmente, por familiares, agregados, brancos, pobres e mamelucos. Estas expedições tinham o caráter mais comercial por que o interesse estava em buscar as minas de ouro, prata e pedras preciosas29, no entanto, ambas possuíam como missão comum o combate e o apressamento indígena. 28 Tratado de Tordesilhas foi assinado em 1494, e possuía, por princípio, uma divisão entre duas coroas Ibéricas, de forma que o mundo conhecido, e, ou aquele que seria descoberto seriam divididas por ambas as coroas. Esta linha imaginaria seria localizada a 370 léguas a oeste do arquipélago de Cabo Verde, de polo a polo, e caberia a Espanha as terras do lado ocidental, e a Portugal as do lado oriental. BACELA, Jonildo. Guia Geográfico-Informações e dados históricos do Brasil; UFPR. Disponível: <http://www.historia-brasil.com/colonia/tordesilhas.htm>. Acesso em: 16 05 2016. 29 Ver a esse respeito, VOLPATO, Luiza Rios Ricci. Entradas e Bandeiras. Editora Global. Disponível: <www.historiadobrasil.net/resumos/entradas_bandeiras.htm.>. Acesso em: 17 05 2016. 30 Figura 02: Entradas e bandeiras FONTE: Atlas histórico escolar.Rio de Janeiro: FAE, 1991. No final do século XVII estas expedições encontraram minas de ouro no sertão de Taubaté, o que impulsionou uma corrida em busca do metal precioso, favorecendo a política expansionista portuguesa. À medida que as minas eram descobertas, para além da linha do Tratado de Tordesilhas, as expedições mais adentravam ao território espanhol e deixavam vilas e povoados lusitanos pelas suas rotas. 31 Com o advento das descobertas das minas de ouro, a Coroa portuguesa entendeu que deveria tomar posse da região das minas e também das terras que ainda não haviam sido exploradas a fim de evitar a perda para quem o território pertencia de direito, a Espanha. As buscas pelos indígenas e pelo ouro, nesse período, já haviam se estendido para além dos limites das possessões portuguesas, mas, a partir da proposta do Marques de Pombal a Coroa portuguesa decidiu criar núcleos populacionais e montar um sistema administrativo30. Segundo Thais Cristina Innocentini31 foi a partir desta política que surgiu, através de um sítio antes ocupado por arraial de mineração, a Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá em 1727. Ao mesmo tempo, foram criadas “as Capitanias de Minas Gerais (1720), Goiás (1748) e Mato Grosso (1748) 32 ”. A fundação destas capitanias favoreceu a política estratégica de ocupação adotada por Portugal (1534 a 1750) favorecendo uma sucessão de eventos decisivos para a posse portuguesa do território que vinha sendo conquistado. A consolidação e defesa do território que Portugal já conquistara foi efetivada através das concessões de terras, as sesmarias, que constituíam “o regime jurídico básico acerca da terra, instituído no reinado de Fernando I como uma lei agrária de fomento da produção agrícola e do cultivo das terras ermas.” 33 Tal concessão teria o objetivo de marcar a presença da coroa portuguesa dentro do território ocupado impedindo a expansão territorial espanhola ao mesmo tempo que retirava da coroa portuguesa a administração direta das terras 30SENA, Divino Marcos de. Camaradas: livres e pobres em Mato Grosso (1808-1850). Dourados. MS. UFGD. 2010.p. 23. 31 INNOCENTINI, Thaís Cristina. Capitanias Hereditárias: Herança colonial sobre desigualdade e instituições; Escola de Economia de São Paulo, FGV; 2009.p.15. 32 CHAVES. Op. Cit. p. 24. 33 Disponível: <http://www.geomatica.ufpr.br/portal/wp-content/uploads/2015/03/Sesmarias- Apossamento-Terras.pdf.>. Acesso em: 17 06 2016. 32 ocupadas, uma vez que, transferia para o sesmeiro a incumbência de a própria custa colonizar aquelas terras34. Não se pode concluir, portanto, que as distribuições de sesmarias fossem apenas concessões no sentido único de ocupar as conquistas, pois possuíam uma política própria em dois sentidos. Primeiro o estratégico, que era realizado pelo avanço dos desbravadores e a criação de povoados e segundo o administrativo, que era materializado na adoção de um regime jurídico colonizador, ambos viriam a ser colocados em prática mais tarde através do Uti possidetis35 na ratificação do Tratado de Madri (1750). 1.1 Colonização da Capitania de Mato Grosso No bojo da expansão portuguesa, em 1718, a bandeira de Pascoal Moreira Cabral chegou às terras que viriam a formar a capitania de Mato Grosso, com o intuito de apressar indígenas e também encontrar metais preciosos. Assim com a descoberta de ouro, em 1719, foi fundado um pequeno arraial as margens do rio Coxipó, no local conhecido como Forquilha. Este primeiro núcleo populacional tornou-se a Vila Real do Senhor Bom Jesus de Cuiabá, em 1727, com a chegada do Governador e capitão General da Capitania de São Paulo, Rodrigo Cesar de Menezes, que levantou um pelourinho e estabeleceu a primeira vereança da vila36. A partir da Vila do Cuiabá outros dois núcleos surgiram no decorrer do século XVIII, e se tornaram importantes na política de consolidação portuguesa na Capitania de Mato Grosso. Vila Bela da Santíssima Trindade (1752) fundada por D. Antônio Rolim de Moura, com o intento de torná-la capital e Vila Maria do Paraguai (Cáceres) fundada por Luiz de Albuquerque de Melo e Pereira e Cáceres (1778). 34INNOCENTINI, Thaís Cristina. Capitanias Hereditárias: Herança colonial sobre desigualdade e instituições: Escola de Economia de São Paulo, FGV; 2009.p. 17. 35 Tradução: “Como possuis continuai possuindo” 36 CHAVES, Otavio Ribeiro. ARRUDA. Elmar Figueiredo de. História e Memória de Cáceres. Editora Unemat; Cáceres; Mato Grosso, 2011. p. 80 33 A criação das vilas do Cuiabá e de Vila Bela da Santíssima Trindade teriam tido, também, a função de manter os limites, até então conquistados, demonstrando que a terra fora ocupada por Portugal, o que nas negociações diplomáticas recorrer-se-ia no princípio do Uti possidetis, como o proposto no Tratado de Madri (1750). Vila Maria do Paraguai fundada em 1778, possuía o mesmo objetivo que as outras vilas da capitania de Mato Grosso, que era a consolidação da conquista. Ao mesmo tempo, funcionava como entreposto dos caminhos entre os centros mineradores. Somente mais tarde sua função passou a de ocupação como parte da política da Coroa portuguesa para a de defesa de fronteira37 contra uma possível expansão dos espanhóis. Entre as primeiras medidas administrativas tomadas pelo capitão- general Rodrigo Cesar de Menezes, ainda em 1727, destacam-se a doação e regulamentação de várias sesmarias no entorno da Vila do Cuiabá, conforme figura 03, dividindo-as em dois tipos, conforme o regramento sesmarial, em lavras e de uso agropastoril38, com isso efetivava-se então a ocupação e a colonização das terras mais a Oeste de Tordesilhas. 37 CHAVES, Otavio Ribeiro. ARRUDA. Elmar Figueiredo de. História e Memória de Cáceres. Editora Unemat; Cáceres; Mato Grosso, 2011. p. 81. 38LIMA, André Nicacio. Caminhos da integração, fronteiras da política: a formação das províncias de Goiás e Mato Grosso; Dissertação; USP; 2010. p. 44. 34 Figura 03: Sesmarias em Minas do Cuiabá - 1726-1728 Fonte: Disponível em meio eletrônico39 Estas sesmarias serviam como base irradiadora de ocupação e colonização diante da vastidão e das dificuldades de avanço e conquista que a 39 Fonte. Disponível: <www.scielo.br/img/revistas/rh/n173//2316-9141-rh-173-00211-gf5.jpg>. 35 capitania de Mato Grosso apresentava. O povoamento era a melhor forma de colonização destas terras, talvez, por isso a coroa portuguesa tenha dado aos colonos o máximo possível de autonomia na administração das terras40. A doação destas sesmarias demonstrava a preocupação da coroa na vigilância contra a possível entrada de espanhóis, assim estas serviriam como barreira a este possível avanço. Tal preocupação fundamentava-se na ocupação de terras por parte da Coroa espanhola desde o século XVII no entorno das posses portuguesas, através da “ação missionária jesuítica (1691-1767)41, conforme figura 04, nas ‘terras baixas’ bolivianas”42 com o intento de evangelizar os indígenas. 40 COSTA, Wanderley Messias da. O estado e as políticas territoriais no Brasil. Editora Contexto; São Paulo, SP; 2000. p. 29 41 “A Companhia de Jesus controlou todo o Norte do atual Uruguai, as Missões Orientais, o Alto Uruguai e as missões guaraníticas do Paraguai. Construindo um amplo círculo em torno das possessões portuguesas. Chiquitos e Moxos na Bolívia e as missões Maynas na Amazônia. Os jesuítas atuaram, na prática, como um contraforte capaz de parar o avanço lusitano.”In. PEREGALLI, Enrique. Como o Brasil ficou assim. Formação das fronteiras e tratados de limites. 2 ed. SãoPaulo: Global Editora, 1982 (História Popular; 9). p. 24. 42 SILVA, Giovani José da. A Bolívia, a Chiquitania e as populações indígenas em um mosaico étnico e cultural. Revista de Estudos e Pesquisas sobre as Américas, vol.6, Nº 2/ 2012; Universidade Federal do Mato Grosso do Sul; Campo Grande, MS. p. 114. 36 Figura 04 Localização das missões espanholas no século XVIII Fonte Nogueira C. E. Blanchetti (2005) Desde 1732, o Conselho Ultramarino alertava quanto aos perigos externos e internos que eram alimentados pela “cobiça que a América portuguesa suscitava nas outras nações pelas suas riquezas”43. Essa cobiça ater-se-ia a “dois gêneros de perigos que estão sujeitos todos os estados, uns externos, outros internos. De forma que os externos são os da força e os internos são o que poderão causar os naturais do país, e os mesmos vassalos”44. Tais perigos eram 43 NOVAIS, Fernando A. Portugal e Brasil na Crise do Antigo Sistema Colonial (1777-1808). Editora Ucitec; São Paulo, SP; 1995. p. 141. 44 NOVAIS. Op. Cit. p. 30. 37 minimizados com as concessões das sesmarias e na autonomia administrativa dispensada pela Coroa, ocupava-se a terra o que se traduzia na posse portuguesa daqueles limites. 1.2 Política, Estratégia de Ocupação Ao longo do século XVIII a preocupação com a posse das terras da capitania de Mato Grosso materializou-se em alguns dispositivos de proteção das mesmas. A política proposta por Sebastião José Carvalho Melo, o Conde de Oeiras, buscava guarnecer a fronteira através da construção de fortes militares, conforme figura 05 a seguir, os principais foram erigidos na administração de Luís de Albuquerque de Melo e Pereira Cáceres que construiu em 1775 o Forte de Coimbra e deu início a construção do Príncipe da Beira em 1776. Os fortes desempenhavam papel importante, uma vez que estavam posicionados em locais estratégicos dentro da colônia, e exerciam principalmente três funções: a defesa externa, a coibição do contrabando e a criação de vilas. 38 Figura 05: Fortificações Pombalinas Fonte: Disponível em meio eletrônico45 A política administrativa pombalina fora eficaz na defesa da fronteira, mas o mesmo não visualizava uma legislação agrária que proporcionasse a colonização das terras ocupadas, assim permanecia válido o regramento sesmarial como forma de colonização através da distribuição de terras. 45 Fonte: Disponível. <fortificaçoespomalinas/images/slideplayer.com.br>. Acesso: 16 06 2016 39 Mesmo com a construção dos fortes na fronteira Oeste, o contrabando ainda era prática corrente e a apreensão da Coroa estava vinculada as minas da capitania que traziam especial preocupação pela proximidade com os domínios hispânicos46. Ao mesmo tempo“ a Espanha tentava impedir o contrabando de prata e ouro de Potosí e do alto Peru através do porto franco de Buenos Aires”47. A prática do descaminho na capitania de Mato Grosso era feita de forma abrangente, contrabandeava-se “ouro lavrado, laços, bretanhas, lenços, louças da Índia, vidros, instrumentos, ferramentas [...]” 48, além disso, havia o comércio ilegal de negros escravizados que eram vendidos para as minas do Alto Peru cujo pagamento era feito em prata. Desta forma, “as fronteiras mato- grossenses eram constantemente envolvidas pela política oficial numa guerra intensa de incentivo ao contrabando”.49 Esta prática tornara-se um problema para ambas as Coroas, uma vez que deixava claro a ausência de controle na inspeção da circulação de mercadorias e na demarcação dos limites das terras pertencentes a cada monarquia. Assim a busca pela definição dos limites e pelo controle comercial possuíam motivos concretos e imediatos50. Ainda indefinidos os limites, a coroa portuguesa passou a incentivar, como forma de fixação da população na fronteira, a criação de gado. Segundo Luíza Rios Ricci Volpato “a exploração do ouro era um fator negativo, cheio de 46 Segundo Nauk Maria de Jesus, “[...] os castelhanos, sabedores da existência das minas cuiabanas, tinham interesse em obter o ouro e os Payaguá poderiam ser importantes peças na formação de alianças que visassem ao contrabando do metal e demais produtos levados nas monções, bem como no tráfico de escravos. ” NAUK, Maria de Jesus. O governo local na fronteira Oeste. A rivalidade entre Cuiabá e Vila Bela no século XVIII; Ed. UFGD; Dourados, MS; 2011. p. 98 47 MACHADO, Lia Osório. Limites e Fronteiras: Da alta diplomacia aos circuitos da ilegalidade; Congresso Brasil-Portugal; Academia de Marinha; Lisboa, Portugal; 1999. Revista Território, Rio de Janeiro, ano V, n" 8, pp. 7-23, jan. jun., 2000. p. 13. 48SOARES, Maria do Socorro Castro. Marcos que limitam, espaços que agregam: Os reflexos das lutas emancipatórias das colônias hispânicas e a fronteira Oeste de Mato Grosso; Tese; UFMT- Universidade Federal de Mato Grosso; Cuiabá; 2015. p.38. 49 LENHARO, Alcir. Crise e mudança na frente Oeste de colonização. Ensaios; Imprensa Universitária, UFMT; Cuiabá, 1982. p. 37. 50 MACHADO. Op. Cit. p. 45. 40 riscos e que a própria coroa portuguesa teria insistido no incremento da agricultura criatória para permitir o guarnecimento da fronteira em condição permanente”51. Houve, como em outras capitanias, uma crescente aquisição de terras mais a Oeste, “entre Cuiabá e Vila Maria, acaudilhada por decididos desbravadores”52. A fronteira foi sendo aos poucos ocupada, como já exposto, através da concessão de terras de sesmarias, que nesta região adquiria contornos específicos, diversos daqueles adotados em outras partes da América Portuguesa com o regimento sesmarial53. Nas capitanias de Goiás e São Paulo apresentava-se incentivo a agricultura e inexistia problemas relacionados a limites externos, e no Norte a colonização ainda se desenvolvia. Desta forma, o regimento sesmarial acabava por ceder as peculiaridades de cada capitania. Na capitania de Mato Grosso, para a criação de gado havia necessidade de mais terras do que apenas uma sesmaria, desta forma, ocupava-se mais terras que a estipulada pelo regimento, esta prática não contrariava de todo ao que estipulava alguns artigos do regramento sesmarial. Em Alvará de 05 de outubro de 1795, regulamentava-se os lotes de sesmarias, afirmando que os sesmeiros poderiam “possuir duas, ou mais sesmarias, contanto que tenham possibilidades, e número de escravos, que inteiramente cultivem umas, e outras terras54.” Assim, a falta de fiscalização proporcionou o aumento significativo de terras nas mãos de apenas um sesmeiro. Segundo José da Costa Porto “uma das principais distorções do nosso sesmarialismo ocorreria de respeito a estrutura fundiária”55, possivelmente pela 51 VOLPATO, Luíza Rios Ricci. Mato Grosso: ouro e miséria no antemural da Colônia: (1751-1819); Dissertação; Universidade de São Paulo-USP; 1981. 52 CORRÊA FILHO, Virgílio. Fazendas de gado no pantanal Mato-Grossense. Serviço de informação agrícola; Documentário da vida rural nº 10; Rio de Janeiro, RJ; 1955.Op. Cit. In. p.18. 53 Legislação reguladora do acesso à terra até sua extinção em 1822. In.: MOTTA, Marcia Maria Mendes. Direito a terra no Brasil: a gestação do conflito, 1795-1824. Editora Alameda, São Paulo: 2009. p. 18. 54 Alvara de 05 de outubro de 1795. 55 PORTO, José da Costa. O sistema sesmarial no Brasil. Editora Universidade de Brasília; UNB; Brasília, DF; 1979 p. 48. 41 falta dessas observações quanto as condições impostas pelo regramento e aliadas a preocupação portuguesa em consolidar as suas conquistas. As sesmarias solicitadas para criação de gado próximas ao limite dos domíniosespanhóis foram sendo ampliadas e ofereciam a possibilidade de guardar a fronteira ao ocupar aquelas terras. Na região próxima à São Luiz do Paraguai56, por exemplo, o número de fazendas não poderia servir como indicativo de fixação do homem no campo ou de guarnecimento, por que o grande vulto populacional se encontrava próximo a região das minas que eram Vila Real do Bom Jesus do Cuiabá e Vila Bela da Santíssima Trindade. Tomaremos a sesmaria Jacobina como caso ilustrativo da posse da terra na capitania de Mato Grosso nas proximidades da fronteira Oeste. 1.2.1 A Jacobina como centro irradiador de ocupação Esta sesmaria ficava no caminho que ligava Vila Maria a Vila Real do Bom Jesus do Cuyabá e estava localizada a seis léguas de Vila Maria e próximo ao limite da colônia portuguesa com a coroa espanhola57. Havia pertencido, em 1769, ao português Leonardo Soares de Souza58, e era destinada a produção de rapadura, açúcar mascavo, agua ardente, etc., estava destinada também ao criatório de gado. Em 1813, a partir da assumpção do coronel Pereira Leite, suas terras se estenderam por um vasto território dentro da capitania de Mato Grosso 56 Em 1779 Vila Maria do Paraguai teve seu nome alterado para São luís do Paraguai. Disponivel: <http://www2.unemat.br/atlascaceres/index.php?pasta=historia>. Acesso em: 17 06 2016. 57 Segundo Corrêa Filho foi da Jacobina que “saíram aventureiros que tomaram conta de grande porção do Pantanal” CORRÊA FILHO, Virgílio. Fazendas de gado no pantanal Mato-Grossense; Serviço de informação agrícola; Documentário da vida rural nº 10; Rio de Janeiro, RJ; 1955.Op. Cit. In. p.22. 58 Ver a esse respeito, GARCIA, Domingos Sávio da Cunha. Território e negócios na "Era dos Impérios”: os belgas na fronteira Oeste do Brasil; Fundação Alexandre de Gusmão; Brasília; 2009. p. 86. 42 indo até o Pantanal Norte na fronteira com a Bolívia e chegando a ultrapassar o rio Paraguai no sentido Leste-Oeste59. Segundo Romyr Conde Garcia, a Jacobina “possuía dezoito sesmarias, das quais a menor de três léguas em quadra, sem formação e só em seis ou sete delas, as quais ele chamava fazendas”60, conforme quadro 01 a seguir. A sua área total foi tão extensa que poderia ter influenciado na delimitação do limite Oeste, uma vez que possuía duas “sesmarias” – Salma e Santa Fé – em terras espanholas e próximo ao limite com a América Portuguesa. Este fato demonstra a inexistência de um limite jurídico preciso, entendendo-se que estas sesmarias poderiam configurar uma continuidade do território português em solo espanhol. Quadro 01: Posses da jacobina – 1813 Fonte: DA SILVA, Leila Castro62/Adaptado pelo autor/2017 Outros proprietários de terras próximo ao limite com a colônia espanhola seguiram o exemplo da Jacobina e passaram a ocupar terras de forma indiscriminada e em desobediência aos Alvarás e ao próprio regramento 59 GARCIA, Domingos Sávio. Território e negócios na "Era dos Impérios”: os belgas na fronteira Oeste do Brasil. Op. Cit. p. 87. 60 GARCIA, Romyr Conde. Mato Grosso 1800 – 1840: Crise e estagnação do projeto colonial; Tese; USP; 2003. p. 142. 61 “Teve o nome alterado de Vila Maria do Paraguai para São Luiz do Paraguai-1779”. Disponível: <www2.unemat.br/atlascaceres/index.php?pasta=historia>. Acesso em: 17 06 2016. 62 DA SILVA, Leila Castro. O processo de nomeação das fazendas-engenhos de Cáceres –MT; Rev. Digital do curso de Letras-AVE PALAVRA nº 11; Universidade do Estado de Mato Grosso- UNEMAT; Alto Araguaia, MT; 2011. Site: ˂http://www2.unemat.br/avepalavra/EDICOES/11/artigos/O%20processo%20de%20nomeacao %20das%20fazendas%20engenhos%20de%20Caceres%20%20MT.pdf˃ Acesso em: 12 06. 2016. SE SM A R IA JACOBINA 1800-1822 São Luiz do Paraguai61-1813 Leonardo Soares 1. Parte de outras sesmarias 2. Sesmarias Joao Criolo 3. Posse da Criminosa 4. São Luis Caetes 5. Pastos de Carvalhos 6. Guanandy 43 sesmarial63, tornando-se prática comum na ocupação de novas terras no pantanal a dentro ou próximo ao limite. Na Jacobina, o incentivo dado pela coroa portuguesa à criação de gado proporcionou uma infiltração forasteira e aumento dos estabelecimentos agropastoris pelo vale do Paraguai64. No entanto, raramente, “cada proprietário rural contentar-se-ia com uma única indicativa de comedidas aspirações”65, de forma que os proprietários das sesmarias passaram a adquirir mais terras e a anexa-las a inicial. Segundo Corrêa Filho normalmente o sesmeiro solicitava “a primeira sesmaria que servisse de núcleo, e em torno dela seriam requeridas as terras contíguas, até que perfizessem conjunto grandioso”66. Mesmo existindo exceções no regramento sesmarial e nos Alvarás que permitissem aos sesmeiros possuir duas ou mais Sesmarias, este número não era averiguado, primeiro por que as menções sobre produtividade eram relatadas sobre uma única posse, a principal, e segundo por que não havia observações quanto as particularidades ou localizações na posse das terras.67 A partir desta lacuna de informações, as sesmarias eram demarcadas conforme os “olhos” do proprietário, segundo Corrêa Filho “raras [demarcações] possuíam o seu respectivo título de sesmaria”68, e quando as tinham estavam firmadas por algum Capitão-General e sem validação dos títulos pela coroa. A Jacobina foi um centro de irradiação populacional na fronteira, a partir do governo do Capitão-General Luís Albuquerque de Melo e Pereira e Cáceres o qual muito auxiliou na consolidação dessa parte do território. Este governador possuía uma política estratégica de ocupação desta parte do limite 63“[...] proibido que cada Sesmeiro possua mais de uma Data, ainda que seja por Título de Herança, ou compra”. In. LEITÃO, José Alberto. Alvara de 5 de outubro de 1795. Publicado na Chancelaria Mor da Corte, e Reino. Lisboa 22 de setembro de 1796. p. 05 Disponível: ˂www. Camarafederal.gov.br/˃ Acesso em: 12 06 2016. 64 Ibid. p. 59. 65 CORRÊA FILHO, Virgílio. Fazendas de gado no pantanal Mato-Grossense. Op. Cit. p. 60 66 CORRÊA FILHO, Virgílio. Fazendas de gado no pantanal Mato-Grossense. Serviço de informação agrícola; Documentário da vida rural nº 10; Rio de Janeiro, RJ; 1955.Op. Cit. In. p. 64 67 CORRÊA FILHO, Virgílio. Fazendas de gado no pantanal Mato-Grossense. Op. Cit. p. 23 68 CORRÊA FILHO, Virgílio. Fazendas de gado no pantanal Mato-Grossense .Op. Cit. p. 22 44 Oeste, tendo proposto que as sesmarias que estivessem dentro dos limites69 estipulados para São Luiz do Paraguai70 passariam a fazer parte da vila, que necessitava para sua oficialização de um maior número de almas. Com este intuito, foi enviada uma solicitação ao Prelado de Cuiabá e à Diocese do Rio de Janeiro71, onde constava o pedido de criação de uma igreja ou paroquia em São Luiz do Paraguai. Pode-se concluir que, a Jacobina como outras sesmarias tornaram-se importantes núcleos populacionais na ocupação e consolidação da capitania próximo ao limite Oeste. Com o advento da Independência do Brasil, as questões ligadas a posse da terra ganham outros contornos. 1.3 Da independência a Lei de terras - 1822-1850 Em 1822, o Brasil tentava renascer como nação independente, mas isso não seria feito de forma simples, pois, os problemas fundiários que o Império possuía neste momento, percorriam toda a sua extensão geográfica e alguns desses não poderiam ser resolvidos de forma independente, uma vez que, muitas das questões que envolviam a posse da terra estavam ligados ao litígio dos limites. No ano da Independência, as sesmarias foram suspensas72. As terras que haviam sido herdadas do regramento sesmarial, no Brasil colônia, necessitavam se69 “Norte o rio Jauru; a Leste o Sangrador do Melo; ao Sul localizamos Albuquerque”. In. MORAES, Maria de Fátima Mendes Lima de. Dissertação de Mestrado em História. Cuiabá/MT: UFMT, 2002. Disponível: ˂h�p://www.ppghis.com/site/dissertacao/arquivos/2003_mest_ufmt_ma ria_de_fatima_mendes.zip˃ A. p. 40. Acesso em: 17 06 2016. 70Disponível: ˂http://www2.unemat.br/atlascaceres/index.php?pasta=historia˃. Acesso em: 17 06 2016/ 14:30 h. 71“Tendo eu de pôr na presença de V. Exa. que em execução do ofício que me foi dirigido, fiz o Tratado de cessão do território, que há do Sangrador do Melo até o rio Paraguai, e que mando autuar o documento dessa cessão com o que havia feito o Reverendo vigário dessa Capital, e carta de V. Exa, em que assim me determinava, procedi a criação da nova freguesia de São Luiz de Vila Maria do Paraguai [...] erigindo nesses territórios adidos a nova Freguesia, debaixo porém da condição de dever ser aprovada e confirmada por S. Exa. Reverendíssima, a quem unicamente compete o erigir Igrejas curadas ou Paróquias. ” In. MORAES. 2003. 72 A resolução 76/1822 foi a base usada por D. Pedro I para a suspensão da distribuição de sesmarias. Sua decisão teve como base a petição de um posseiro de nome Manoel Jose dos Reis. 45 adequar à nova ordem política que caminhava naquele momento, e ficou acordado entre os políticos que, para isso, deveriam ser criadas leis que norteassem sua definição e regularização. Durante os vinte e oito anos posteriores à independência (1822-1850), configurou-se uma fase da ocupação de terras, que pode ser considerada como período de posseiros. Estes, eram os possuidores de terras sem a propriedade dessas, de forma que, o laço jurídico que os prendia às terras era unicamente o de posse73, pois inexistia uma lei agrária que norteasse e direcionasse, tanto a regularização da terra como sua forma de distribuição. Segundo Ligia Osório Silva a elaboração da Lei de Terras “veio no bojo das grandes transformações que nesse período começaram a propelir a sociedade brasileira, ainda escravista e arcaica”74, uma vez que, a regulamentação da terra estava ligada à questão da escravidão. Dois grupos antagônicos apresentaram projetos distintos para a elaboração de uma nova legislação agraria. O primeiro grupo, os escravistas, lutavam para manter o sistema de escravidão dentro das leis agrárias que estavam em discussão naquele momento, mas, a necessidade de reconhecimento de independência do Brasil por nações estrangeiras os obrigava a realizar mudanças que as agradassem a fim de obter o aval para a sua soberania. De outro lado, os antiescravistas, que tinham como representante mais ilustre José Bonifácio, entendiam que este momento seria propicio para inserir no corpo da lei que estava em discussão a extinção da escravidão no Brasil e o acesso à terra ao pequeno produtor, libertos e imigrantes.75 As discordâncias políticas, entre os escravistas e os antiescravistas, foram marcantes durante boa parte do século XIX, e longe delas o Brasil 73 Ver a esse respeito, TRECCANI, Girolamo Domenico. O título de posse e a legitimação de posse como formas de aquisição da propriedade. Universidade Federal do Pará – UFPA. 74 SILVA, Ligia Osorio. Terras devolutas e latifúndio: efeitos da lei de 1850; Editora da UNICAMP; São Paulo, SP; 1996. p.11. 75 CÔRTES, Geraldo de Menezes. Migração e colonização no Brasil - 1911-1962. Livraria J. Olympio; Rio de Janeiro, 1958. p. 50. 46 necessitava de uma legislação agraria que substituísse o regramento sesmarial que havia sido suspenso por D. Pedro I (1822)76. A dificuldade que se apresentava dentro desse panorama político era que parte dos políticos que votariam os projetos eram senhores de escravos. Possivelmente não foi apenas o medo da perda da mão de obra e do lucro fácil que tenham exercido força nos pensamentos dessa classe para protelar por anos a promulgação da lei, uma vez que esta poderia ser mais danosa a esta classe. Segundo Maria Josephina Mathilde Durocher77 a liberdade total e repentina traria “queda completa da lavoura que fonte de riqueza do país, traria assassinatos por vingança contra antigos senhores, crimes para as quais não haveria tribunais suficientes, nem polícia numerosa e enérgica para conter as desordens.78 José Bonifácio, em 1821, já havia proposto um projeto onde se previa a colonização do território a partir da venda da terra, pondo fim ao processo de doação de terra. Este projeto teve forte influência nas discussões da política agrária, no entanto, o espírito ideológico estava sempre presente em suas propostas, onde insistia em articular o fim da escravidão com a nova Lei de Terras. José Luís Cavalcante ao se utilizar do pensamento de José Bonifácio, considerava fundamental uma nova legislação sobre as sesmarias, prevendo que as terras concedidas, mas não cultivadas, deveriam retornar ao patrimônio nacional, “deixando-se aos donos meia légua quadrada, quando muito, sob a condição de logo cultivá-las” 79. 76 “A resolução 76/1822 foi a base usada por D. Pedro I para a suspensão da distribuição de sesmarias. Sua decisão teve como base a petição de um posseiro de nome Manoel Jose dos Reis. ” 77 “Parteira pela faculdade de medicina do Rio de Janeiro, parteira da casa imperial, ex-parteira de Sua Alteza a finada princesa D. Leopoldina, Duquesa de Saxe Coburgo e Golba, e membro honorário da academia imperial de medicina do Rio 11e Janeiro”. 78 DUROCHER, Maria Josephina Mathilde. Ideias por coordenar a respeito da emancipação. Tipografia do Diário do Rio de Janeiro; Rio de Janeiro, RJ, 1871. p. 5. Disponível: ˂ www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/174468/000119430.pdf?sequence=1 ˃ Acesso em: 14 05 2016/14:30 h. 79 CAVALCANTE, José Luís. A lei de terras de 1850 e a reafirmação do poder básico do estado sobre a terra. 2005. Disponível: 47 Cavalcante defendia, também, a regularização das terras adquiridas por posse onde seus donos deveriam ter o cultivo da terra como condição para sua a efetivação e deveriam perdê-las caso não as cultivassem dentro de um prazo determinado. A medida que os projetos foram sendo apresentados pelos favoráveis ao fim da escravidão, eram colocados de lado pela bancada dos senhores de escravo. O fim desta disputa ideológica, que havia se iniciado no reinado de D. Pedro I somente teve conclusão no segundo Reinado – D. Pedro II - em 1850, com a publicação da Lei de autoria do ministro da Justiça do Brasil Eusébio de Queirós Coutinho Matoso80, que havia sido decretada em 4 de setembro e não atendia totalmente aos anseios dos antiescravistas, mas, poderia ser considerado um sinal de mudança. Em 18 de setembro de 1850, a lei 601 – Lei de Terras – foi promulgada e tratava, exclusivamente, sobre revalidação e legitimação81, regularização, venda e dava outras definições sobre a terra e sua posse. Assim, a nova lei estabeleceu quatro formas para se possuir o reconhecimento da posse territorial: a revalidação das cartas de sesmaria que, apesar de não terem observados as demais exigências legais comprovassem o cultivo da terra; a legitimação das posses, a compra das terras devolutas82 e doação (este último instituto aplicável só na faixa de fronteira). ˂www.historica.arquivoestado.sp.gov.br/materias/anteriores/edicao02/materia02/˃ Acesso em: 10 06 2016/14:30 h. 80 Lei Eusébio de Queiróz - “Foi considerada inicialmente sob o pejorativo de “lei para inglês ver” em relação as exigências da Grã-Bretanha para reconhecer a independência que o Brasil fosse adepto da lei inglesa -“Bill Aberdeen” (1845) ” Disponível: ˂http://funag.gov.br/loja/download/1048-Manual_de_Historia_do_Brasil.pdf˃ Acesso em: 15 07 2016/ 15:20 h. 81 A revalidação e
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