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LiteraturaMetodologia do Ensino de Ana Lucia de Souza Henriques2009 IESDE Brasil S.A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br Todos os direitos reservados. © 2009 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais. H519 Henriques, Ana Lucia de Souza. / Metodologia do Ensino de Literatura. / Ana Lucia de Souza Henriques. — Curitiba : IESDE Brasil S.A. , 2009. 240 p. ISBN: 978-85-387-0800-1 1. Literatura – Estudo e Ensino I.Título. CDD 807 Capa: IESDE Brasil S.A. Imagem da capa: Jupiter Images/DPI Images Pós-Doutora em Literatura Comparada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Doutora em Literatura Comparada pela Universidade Federal Flumi- nense (UFF). Mestre em Literatura Brasileira pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Graduada em Português, Inglês e respectivas Literaturas pelo Instituto de Letras da UERJ. Ana Lucia de Souza Henriques Sumário Metodologias no ensino e aprendizagem de literatura............................................... 11 Breve panorama da história do ensino de literatura no Brasil .................................. 11 Motivação para a leitura e para o conhecimento literário ......................................... 12 Adequação do estudo de literatura aos níveis de ensino ........................................... 19 A avaliação ................................................................................................................................... 21 A contextualização como método de abordagem ...... 29 A obra literária como produto do momento em que se insere ................................ 29 Contextualização da obra literária ...................................................................................... 31 Intertextualidade no texto literário: a paráfrase e a estilização ...................................................... 43 Breve conceituação de intertextualidade ........................................................................ 43 Paráfrase e estilização .............................................................................................................. 46 Estudos de casos de paráfrase e de estilização .............................................................. 49 Intertextualidade no texto literário: a paródia, a apropriação e o pastiche ............................... 59 Breve conceituação de intertextualidade ........................................................................ 59 Paródia, apropriação e pastiche ........................................................................................... 60 Estudos de casos de paródia, de apropriação e de pastiche ..................................... 69 Obras cinematográficas e sua relação com a literatura ... 77 Breves considerações sobre a relação entre obras cinematográficas e obras literárias ............................................................. 77 A obra cinematográfica como (re)leitura da literatura ................................................ 79 Estudos de casos de obras cinematográficas como (re)leituras de obras literárias ................................................................................... 83 A dramaturgia televisiva e sua relação com a literatura .............................................. 95 Breves considerações sobre a relação entre dramaturgia televisiva e obras literárias................................................................ 95 A dramaturgia televisiva como (re)leitura da literatura ............................................... 98 Estudo de caso de obra da dramaturgia televisiva como (re)leitura de obra literária ...................................102 Canções e sua relação com a literatura ..........................113 Breves considerações sobre canções e sua relação com a literatura ....................113 Letras de canções populares e o diálogo com poetas e poemas ..........................114 Estudos de casos de canções e a relação estabelecida com obras literárias .....119 Diálogos entre a literatura e a História ...........................129 Breves considerações sobre o discurso literário e o discurso histórico ...............129 A História no romance histórico ........................................................................................131 Estudo da relação entre discurso ficcional e discurso histórico em obras literárias ...........................................................................134 A periodização: o Barroco e o Neoclassicismo.............145 Breve conceituação de literatura e de história da literatura ....................................145 O ensino do Barroco e do Neoclassicismo .....................................................................147 Estudos de casos de obras barrocas e neoclássicas ....................................................155 A periodização: o Romantismo, o Realismo-Naturalismo e o Parnasianismo ...................165 Romantismo, Realismo-Naturalismo e Parnasianismo ..............................................165 O ensino da literatura a partir de obras românticas, realistas-naturalistas e parnasianas .............................................................166 Estudos de casos de obras românticas, realistas-naturalistas e parnasianas ....174 A periodização: o Simbolismo e o Modernismo .........185 Simbolismo e Modernismo ..................................................................................................185 O ensino da literatura a partir de obras simbolistas e modernistas......................186 Estudos de casos de obras simbolistas e modernistas ..............................................195 Metodologia de pesquisa: o projeto acadêmico ........203 O projeto acadêmico: conceituação, etapas e escolha do tema ............................203 A definição dos objetivos a serem alcançados .............................................................206 A apresentação e justificativa do trabalho a ser desenvolvido ..............................208 A elaboração da metodologia adequada ao tema selecionado ............................209 A inserção de citações e referências bibliográficas .....................................................212 Gabarito .....................................................................................221 Referências ................................................................................229 Anotações .................................................................................239 Apresentação Este livro pretende apresentar, de maneira clara e objetiva, metodologias para o ensino de literatura. Diferentes abordagens do texto literário são discutidas e exemplificadas. Contexto histórico, estilos literários, canções, filmes, documentá- rios, novelas e minisséries são alguns dos pontos de que partem as abordagens metodológicas propostas. A obra se divide em doze capítulos, sendo onze deles dedicados ao trabalho com a literatura em sala de aula. O último capítulo é voltado para uma detalhada ex- plicação sobre a elaboração de um projeto acadêmico e visa auxiliar o professor que planeja ingressar em um Programa de Pós-Graduação. Daí podermos enfati- zar que nossa principal intenção foi apresentar um trabalho inteiramente voltado para o professor. O foco maior do estudo da obra literária é o de estabelecer relações com o mo- mento em que ela se insere e com os diálogos intertextuais que ela estabelece. Essa maneira de trabalhar o texto literário em sala de aula está de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (2006) que orientam o ensino de língua e litera- tura de nívelmédio. Fazer conexões entre a literatura e outras artes ou disciplinas tem inúmeras vantagens, e essa maneira de trabalhar o texto literário, além de ampliar a visão de mundo do aluno, contribui para tornar ainda mais enriquece- dor e prazeroso o estudo da literatura. O trabalho docente com a literatura é, na verdade, uma fonte de descobertas e de rica troca de experiências entre professor e aluno. Contribuir para esse objetivo foi o que nos moveu na produção dos capítulos deste volume. Ana Lucia de Souza Henriques Metodologias no ensino e aprendizagem de literatura O objetivo deste capítulo é apresentar a relevância da escolha de me- todologia adequada no ensino e na aprendizagem de literatura. Breve panorama da história do ensino de literatura no Brasil No Brasil ainda colônia, o ensino esteve sob a responsabilidade da Igreja Católica, mais precisamente sob os cuidados da Ordem Jesuítica. Os padres jesuítas se orientavam por um conjunto de regras bastante rígido, a Ratio Studiorum, para que houvesse uniformização na educação recebi- da em seus colégios tanto na Europa quanto no Novo Mundo. Tratava-se de um ensino que oferecia uma formação humanística aos alunos, visando à formação integral do homem cristão. Vejamos a definição do termo humanismo, de acordo com a Enciclopé- dia de Literatura Brasileira, de Afrânio Coutinho e J. Galante de Sousa: Movimento intelectual que se espalhou pela Europa no final do século XVI, reunindo aspectos filosóficos e artísticos e pondo ênfase no desenvolvimento das qualidades do homem, que seria o centro da civilização (antropocentrismo). O método particular empregado pelos chamados “humanistas”, que deram a fisionomia especial ao Renascimento, foi a valorização dos estudos dos textos antigos, gregos e romanos, sobretudo estes últimos. (HUMANISMO, 2001, p. 840) Gramática, Humanidades e Retórica eram as disciplinas que figuravam no currículo dos colégios da Companhia de Jesus. E, em nível universitário, eram ministradas as disciplinas Filosofia, Matemática e Ciências Naturais. Ao discutir o papel do ensino da área de Letras no Brasil, Roberto Acízelo de Souza, em o Império da Eloquência (1999), ressalta que durante o período colonial e o século XIX as Letras ocuparam um lugar de destaque no ensino básico. Souza (1999, p. 21-30) lembra ainda que a inexistência de um curso superior nessa área fizera com que o ensino de Letras no antigo curso se- cundário atingisse um perfil universitário, tendo sido esse o caso do ensino de Letras no Colégio Pedro II, onde predominavam as disciplinas humanís- 12 Metodologia do Ensino de Literatura ticas nas séries mais elevadas. Essa instituição de ensino tornou-se a principal re- ferência na área de Letras. Aos alunos formados por ela, era concedido o título de bacharel em Letras. A implantação das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras só viria acontecer na década de 1930, marcando o início da profissionalização de nível universitário nessa área. O relevante papel para o ensino de Letras no Brasil desempenhado pelo Co- légio Pedro II e a questão relativa ao fato de que as aulas tinham de ser ministra- das por um profissional de uma outra área, devido à inexistência de curso supe- rior que formasse professores em Letras, podem ser observados no que afirma Haroldo Lisboa da Cunha (1981, p. 63-65), no ensaio intitulado “Ramiz Galvão, de Aluno a Mestre do Colégio Pedro II”: Ramiz Galvão (Benjamin Franklin, Barão de Ramiz Galvão), gaúcho de Rio Pardo, ainda mal saído da primeira infância, ingressou no Colégio Pedro II, isto nos idos de 1855. E, de uma turma com cerca de trinta alunos, foi dos três que conseguiram, ao cabo de sete anos de curso, o almejado título de Bacharel em Ciências e Letras. [...] Foi, em 1861, um dos sete fundadores do Instituto de Bacharéis em Letras, depois, Instituto Brasileiro de Ciências e Letras, centro cultural estudantil que, por longo tempo, despertou vocações entre alunos do Colégio Pedro II. E, como acadêmico de Medicina, escreveu para o primeiro número da revista da entidade que ajudara a fundar um pequeno ensaio [...]. Regeu com brilho e projeção a cátedra de Literatura Nacional e a de Grego, no Colégio onde fizera seu curso médio; e a de Botânica, na Faculdade que lhe dera o diploma de médico. O exemplo apresentado ilustra o fato de que o ensino de literatura, por não haver cursos de habilitação nessa área específica, esteve nas mãos de profissio- nais de outras áreas, cuja excelente formação humanística recebida no ensino secundário lhes permitia assumir o papel de professores de letras. Motivação para a leitura e para o conhecimento literário Muitos são os caminhos que podem ser trilhados pelo professor de literatura com vistas a obter êxito na motivação de seus alunos para a leitura prazerosa do texto literário. Sabemos que esses caminhos são vias de mão dupla, que o sucesso dependerá do empenho e da dedicação de professores e alunos. Nessa jornada, o desempenho do professor em sala de aula será fundamental para des- pertar ou aumentar a motivação para o conhecimento literário. Comecemos pela ideia de que nossos objetivos serão alcançados com êxito se nos lembrarmos de que nossos cursos são formados por uma sucessão de unidades a que chamamos de aula, e que cada uma delas cumpre um papel único. Daí que cada uma dessas unidades deve ser tomada como a aula, pois Metodologias no ensino e aprendizagem de literatura 13 toda aula deve ser bem preparada. Estarmos conscientes dessa nossa responsa- bilidade constitui o primeiro, e talvez o mais importante, passo para que tenha- mos resultados positivos no que diz respeito à motivação de nossos alunos. Mas como fazer para que os alunos sintam prazer em ler obras literárias? A res- posta apresentada a seguir mostra alguns dos passos que consideramos funda- mentais para que nossos alunos possam se conscientizar de que a literatura nos oferece universos a serem explorados, verdadeiras redes que se entrelaçam, am- pliando nossos horizontes e nos oferecendo novas visões de mundo. Do presente em que se inserem, obras literárias (re)escrevem o passado e profetizam o futuro. Nesse sentido, leituras literárias devem ser encaradas como descobertas a serem feitas nas malhas do texto, seja ele em prosa ou verso. Por isso, o estudo de textos literários pode e deve seguir caminhos variados. As obras que selecionarmos para leitura nos indicam quais as nossas possibi- lidades de escolha. O esquema abaixo apresenta duas dessas possibilidades: Descobrindo relações, entrelaçando mundos: DA � obra literária PARA o contexto DO � contexto PARA a obra literária Selecionamos uma passagem do roman- ce O Cortiço (publicado em 1890), de Aluísio Azevedo, para exemplificar a preparação de uma aula segundo as abordagens sugeridas acima. Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas. Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada de sete horas de chumbo. Como que se sentia ainda na indolência da neblina as derradeiras notas da última guitarra da noite antecedente, dissolvendo-se à luz loira e tenra da Aurora, que nem um suspiro de saudade perdido em terra alheia. [...] Entretanto, das portas surgiam cabeças congestio- nadas de sono; ouviam-se amplos bocejos, fortes como o marulhar ondas; pigarreava-se grosso por toda a parte; começavam as xícaras a tilintar; o cheiro quente de café aquecia, suplantando todos os outros; trocavam-se de janela para janela as primeiras pala- vras, os bons-dias; [...] O Cortiço é um dos romances mais im- portantes do estilo realista-naturalista. D iv ul ga çã o Ed ito ra A br il. 14 Metodologia do Ensino de Literatura Daí a pouco, em volta das bicas era um zunzumcrescente; uma aglomeração tumultuosa de machos e fêmeas. Uns, após outros, lavavam a cara, incomodamente, debaixo do fio d´água que escorria da altura de uns cinco palmos. [...] O rumor crescia, condensando-se; o zunzum de todos os dias acentuava-se; já se não destacavam vozes dispersas, mas um só ruído compacto que enchia todo o cortiço. Começavam a fazer compras na venda; ensarilhavam-se discussões e rezingas; ouviam-se gargalhadas e pragas; já não se falava, gritava-se. Sentia-se naquela fermentação sanguínea, naquela gula viçosa de plantas rasteiras que mergulham os pés vigorosos na lama preta e nutriente da vida, o prazer animal de existir, a triunfante satisfação de respirar sobre a terra. [...] E, durante muito tempo, fez-se um vaivém de mercadores. Apareceram os tabuleiros de carne fresca e outros de tripas e fatos de boi [...]. Vieram os ruidosos mascates, com suas latas de quinquilharia, com as suas caixas de candeeiros e objetos de vidro e com o seu fornecimento de caçarolas e chocolateiras de folha-de-flandres. [...] (AZEVEDO, 1997, p. 30-31) Vejamos a seguir os passos sugeridos para a abordagem: Texto Contexto Leitura do texto: os alunos leem em silêncio o texto selecionado sem � que nenhuma informação sobre ele seja fornecida; a seguir, pelo me- nos, duas leituras em voz alta devem ser realizadas, de preferência, por voluntários. É importante que a leitura em voz alta seja incentivada. A leitura não deve ser interrompida, nem para a explicação de vocabu- lário. O objetivo, nesse momento, não consiste em compreender cada palavra, mas a formação de uma ideia geral do texto. Conversando sobre o texto lido: cada aluno escreve até cinco palavras � que expressem o assunto de que trata o texto; a seguir, de preferên- cia em pares, comparam as palavras que escreveram justificando suas escolhas para o(s) colega(s); depois disso, o professor pede a cada um dos grupos que leia e justifique as palavras por eles selecionadas, en- quanto o professor as anota no quadro. A partir da listagem elaborada pela turma, o professor irá trabalhar, por � meio de perguntas, o assunto de que trata o texto selecionado. Se ne- cessário, incentivando o acréscimo de novas palavras à listagem inicial. Uma outra leitura é feita pelo professor: ritmo, sons e imagens presen- � tes na narrativa devem ser motivo de perguntas que agucem a atenção dos alunos para a riqueza de detalhes na descrição da vida no cortiço, procurando mostrar os recursos linguísticos utilizados pelo escritor para compor a descrição tanto do ambiente quanto dos personagens. Metodologias no ensino e aprendizagem de literatura 15 A seguir, o professor situa o período da história brasileira a que a nar- � rativa se reporta. A partir daí, a feição realista-naturalista do romance em questão deve � ser focalizada pelo professor, que auxilia os alunos para que eles tam- bém possam fazer suas próprias descobertas nas malhas do texto. Sugerir aos alunos que tracem um paralelo entre o comportamento � dos moradores do cortiço e o ambiente em que vivem os persona- gens. A seguir, partindo da relação estabelecida pelos alunos, o profes- sor chamará a atenção para características desse tipo de obra literária, ressaltando, dentre outros aspectos, que: o autor observa a vida social no momento histórico em que ele se � insere, reproduzindo o mais fielmente possível a sociedade; o meio em que vivem os personagens determina seu comporta- � mento; os personagens muitas vezes agem de forma quase animalesca, � sendo movidos mais por instinto do que pela razão. Para finalizar, após revelar o título da obra, seu ano de publicação, o � nome do autor e o estilo de época, o professor deve incentivar seus alunos a estabelecer relações com a história do período em questão, lembrando e discutindo com eles principalmente a relevância das cor- rentes filosóficas do evolucionismo, do determinismo e do positivismo no contexto da segunda metade do século XIX. A partir daí, já com o embasamento adquirido sobre a obra e o contex- � to em que ela se insere, os alunos iniciam a leitura do romance. Como atividades complementares, podem ser desenvolvidas pesqui- � sas dentro de recortes variados sobre temas motivadores, tais como: a vida e a obra do escritor; � o estilo realista-naturalista e o contexto sócio-histórico-cultural; � a obra literária e suas possíveis versões para o cinema e/ou para a � televisão. 16 Metodologia do Ensino de Literatura Vejamos os passos sugeridos para a segunda abordagem: Contexto Texto A partir de imagens e frases ou textos curtos, introduzir a discussão, sempre por meio de perguntas, sobre aspectos marcantes do contexto histó- rico em que o escritor e a obra se inserem. Como nosso exemplo é o romance O Cortiço, o período a ser focalizado é o da segunda metade do século XIX. IE SD E Br as il S. A . A Evolução Humana, teoria proposta por Charles Darwin. Apresentar a imagem da evolu- � ção humana, guiando a discus- são para o nome do naturalista Charles Darwin. Ilustrar a discussão com a foto � do naturalista e do navio em que ele viajou durante suas pesquisas. Charles Darwin (1809-1882), naturalista inglês, autor do livro Origem das Espécies. D om ín io p úb lic o. Metodologias no ensino e aprendizagem de literatura 17 D om ín io p úb lic o. O Beagle, navio em que Charles Darwin viajou de 1831 a 1836 coletando dados para sua pesquisa. Escrever ou projetar texto curto com informação básica sobre o natu- � ralista, comentar de forma breve o impacto causado pela publicação do livro A Origem das Espécies. Charles Darwin – naturalista inglês que formulou a teoria da evolução pela seleção natural. O livro, A Origem das Espécies, que apresenta o re- sultado de sua pesquisa, foi publicado em 1859. O professor deve ressaltar que pesquisas científicas realizadas nessa � época partiam da observação para a teoria. Apresentar a influência da teoria da evolução pela seleção natural nos � estudos dos fenômenos humanos e sociais, conduzindo a discussão para o conceito de darwinismo social. Escrever ou projetar texto curto com informação básica sobre � darwi- nismo social. Darwinismo social – Herbert Spencer foi o principal teórico dessa escola de pensamento, tendo aplicado o modelo biológico da evolução das espécies às sociedades humanas, defendendo a ideia de que só os mais fortes sobrevivem. 18 Metodologia do Ensino de Literatura Ressaltar a relevância da corrente filosófica conhecida como Positivis- � mo dentro do contexto sócio-histórico-cultural dos oitocentos. Escrever ou projetar texto curto com informação básica sobre o Positi- � vismo. Positivismo – corrente filosófica surgida no século XIX, que se caracte- riza por considerar como único tipo de conhecimento legítimo o que se encontra nas ciências naturais, baseado na observação, experimen- tação e matematização. Os positivistas criticam como falso e enganoso o pensamento religioso e metafísico [...]. Com relação às ciências hu- manas, advogam a tese de que elas somente podem se desenvolver como verdadeiras disciplinas científicas na medida em que adotem a metodologia das ciências naturais. (CIVITA, 1977, p. 1.031) A seguir, o professor relaciona o contexto à literatura do período rea- � lista-naturalista. Para tal, chama a atenção dos alunos para o fato de que, por influência do contexto em que se insere, a literatura do pe- ríodo focaliza a realidade social ou biológica do homem, sendo que este é apresentado como produto do meio em que vive. Isso se deve à influência das ciências naturais (Física, Química e Biologia). O homem é visto como um ser sujeito às leis da natureza, e por elas condiciona- do. Da mesma forma que a pesquisa científica parte da observação dosfenômenos para chegar à teoria, a literatura do período, que se pretende fiel aos fatos, procura, através da observação, apresentar, da forma mais detalhada possível, o homem no ambiente em que vive (JOBIM; SOUZA, 1987, p. 174). Após mostrar a influência do contexto na literatura, o professor pede � aos alunos que leiam silenciosamente a passagem selecionada do ro- mance O Cortiço. A seguir, são feitas, pelo menos, duas leituras em voz alta. Como afir- � mamos anteriormente, essas leituras devem ser realizadas, de prefe- rência, por alunos voluntários. O próximo passo consiste em pedir aos alunos que trabalhem em gru- � pos pequenos, de dois ou três membros, para realizarem a tarefa de Metodologias no ensino e aprendizagem de literatura 19 traçar paralelos entre o contexto estudado e o texto literário, procu- rando destacar passagens do romance que justifiquem suas afirma- tivas. Para isso, devem seguir os tópicos determinados pelo professor (por exemplo, “o comportamento animalesco do homem”, “a descrição minuciosa” etc.). A etapa seguinte diz respeito ao debate sobre o texto, com base nas � observações anotadas por cada grupo de alunos. Com o embasamento adquirido, os alunos iniciam a leitura do roman- � ce na íntegra. Em relação a algumas das atividades complementares que motivem � o aluno a aprofundar seus conhecimentos sobre o assunto estudado, sugerimos, por exemplo, que sejam desenvolvidas pesquisas sobre temas motivadores relacionados ao contexto, tais como: a Revolução Industrial, o cientificismo, o determinismo. Além dessa, também são possíveis as atividades já sugeridas para o primeiro tipo de aborda- gem apresentada. Adequação do estudo de literatura aos níveis de ensino Acreditamos que a sensata adequação do estudo de literatura em qualquer que seja o nível de ensino dependerá principalmente da escolha feita pelo professor quanto às obras a serem lidas, ao volume de leitura e, obviamente, às abordagens a serem adotadas em sala de aula para cada autor/obra a trabalhar. Lembramos que defendemos o estudo prazeroso da literatura, pois gostar do que estudamos é fundamental. Geralmente, gostamos do que entendemos, do que faz sentido para nós, e, quando isso acontece, nosso estudo passa a ser um grande compa- nheiro, aquele que vai apontando caminhos e iluminando a nossa jornada. Mas que aspectos considerar para que, ao prepararmos nossas aulas, possa- mos fazer escolhas mais acertadas? As reflexões aqui sugeridas devem ser nor- teadas pelo programa da disciplina ministrada. 20 Metodologia do Ensino de Literatura Como decidir quais e quantas obras literárias devem ser estudadas? A escolha das obras literárias é uma etapa muito importante na preparação de uma aula de literatura. As obras escolhidas devem ser bastante representativas para o estudo de � cada período literário, pois isso permitirá ao professor traçar relações que contribuam para que seus alunos possam formar uma visão mais sólida e profunda do assunto estudado, estreitando e fortalecendo a rede de seu conhecimento literário. Ler obras em sua íntegra é o ideal. Contudo, a so- lidez do estudo literário desenvolvido em sala de aula não está necessa- riamente ligada a um elevado número de obras lidas, mas sim a estudos conduzidos com critério e bom senso. Ressaltamos que, em alguns casos, só é possível a escolha de uma obra, � principalmente quando se trata de romances. Isso pode ser causado muitas vezes pelo tempo escasso, quer seja devido a um programa apertado, quer seja pelo fato de a maioria dos alunos em sala ser forma- da por estudantes que trabalham. Professores e alunos devem caminhar sempre juntos. Daí que essa escolha � precisa ser a mais cuidadosa possível, pois muitas vezes é mais produtivo selecionar para análise não obras em sua íntegra, mas capítulos represen- tativos dessas obras, que nos permitam discutir aspectos fundamentais do assunto tratado. Daí que um estudo literário de qualidade não depende necessariamente de uma longa lista de obras como leitura obrigatória. Capítulo de romances, contos, poemas ou atos de uma peça de teatro � bem analisados (lidos, declamados, encenados) valem muito mais do que leituras de obras inteiras que não serão discutidas devidamente. O acervo precário de muitas das bibliotecas das escolas de nosso país � pode dificultar a escolha de obras. É certo que a compra de livros por parte dos alunos deve ser incentivada, mas não se pode esquecer que eles nem sempre têm condições financeiras para fazê-lo. Decisões sensatas, que partam de um planejamento organizado, certamen- � te contribuirão para o sucesso do estudo do texto literário, de acordo com Metodologias no ensino e aprendizagem de literatura 21 o que estabelecem os programas das disciplinas, e em consonância com as condições de trabalho nas escolas onde a disciplina será ministrada. A avaliação A avaliação de literatura deve estar voltada para o que efetivamente foi discu- tido em relação às obras trabalhadas e também, sempre que possível, funcionar como um elemento motivador de pesquisa, de estudo, de novas descobertas. O objetivo é fazer com que exista uma expectativa positiva em relação a provas e trabalhos realizados em sala ou em casa, individualmente ou em grupo. Provas escritas devem incluir questões com suportes elaborados com clareza sobre obras estudadas e/ou leituras extras recomendadas pelo professor. Devem ser evitadas questões cujas respostas dependam apenas de memorização, pois não revelam a compreensão do texto estudado. As perguntas elaboradas devem dar aos alunos a oportunidade de mostrar que estão aptos a discutir aspectos relativos às obras estudadas com argumentos bem fundamentados, baseados no conhecimento por eles construído durante todo um processo de trabalho com a literatura, no qual cada uma das etapas – apresentação, leitura, debate e pesquisa – exerce papel de destaque. A atividade de pesquisa deve ser tomada como uma ferramenta a mais a ser utilizada pelo professor para motivar seus alunos a fazerem suas descobertas. Para isso, é fundamental que seja bem orientada e que os objetivos estejam bem definidos. É preciso deixar claro qual recorte do assunto estudado o aluno deve pesquisar. É necessário também auxiliar o aluno informando-o a respeito de obras críticas ou teóricas que ele poderá utilizar para iniciar a sua pesqui- sa. Convém alertar o aluno para a pesquisa feita na internet. Ela é válida desde que as páginas consultadas sejam escolhidas com cuidado. Em caso de dúvida, convém recorrer a endereços de instituições sérias, como, por exemplo, a Aca- demia Brasileira de Letras (ABL), que disponibilizam textos informativos confiá- veis, escritos por especialistas nos assuntos consultados. Além disso, os alunos devem ser informados da importância de indicarem corretamente as fontes pes- quisadas em seus trabalhos. Há excelentes manuais de redação acadêmica que podem ser recomendados para orientá-los nesse sentido. 22 Metodologia do Ensino de Literatura Texto complementar O Cortiço: um romance-clímax (PROENÇA FILHO, 1999, p. 259-262) A plenitude da realização do ficcionista vem com O Cortiço. São vinte e três capítulos que colocam em confronto dois conjuntos anta- gônicos: o cortiço, uma habitação coletiva povoada de uma população pro- letária, e o espaço menor do sobrado, habitado por uma família burguesa bem-sucedida. Esses conglomerados culminam por funcionar como blocos- -síntese, aglutinadores. Nessa aglutinação, entretanto, os indivíduos não aparecem confundidos. Seguem presos ao seu grupo social, mas são nomeados e vivem seus dramas particulares na promiscuidade e na identificação dos problemas que lhes marcam a vida em comum. São esses liames comuns que os impessoalizam. No cortiço, move-se uma população numerosae ativa que, com poucas exceções, permanece em ação naquela coletividade. Nela predominam pretos e mestiços, empregados, e assalariados, imigrantes de várias origens, com destaque para os portugueses. Com regras de convívio próprias, à luz da pobreza e da miséria como elementos niveladores. Nele, um personagem sobreposto aos demais: o português João Romão. No sobrado, o grupo familiar chefiado por Miranda, negociante portu- guês de fazendas por atacado: sua mulher, Dona Estela, “senhora pretensio- sa e com fumaças de nobreza”, a filha Zulmirinha, dolorosa interrogação em termos de paternidade, Henrique, filho de um fazendeiro mineiro, freguês do Miranda, a criadagem: o protegido moleque Valentim, a mulata Isaura, a Leonor, virgem e obscena, e um parasita, o Botelho. Normas de convivências ditadas pelos costumes portugueses da época. Entre os dois espaços, o muro, concreto e simbólico. No curso da trama, o jogo de ações num e noutro conglomerado, o fio condutor central identificado no percurso social do cortiço e, em paralelo, do personagem João Romão. Na linha do progresso. A qualquer custo ético. Metodologias no ensino e aprendizagem de literatura 23 Simultaneamente, o percurso do Miranda. No desfecho, a ultrapassagem do muro por João Romão, a leve ascensão de Miranda, o fim do cortiço. O texto evidencia equilíbrio entre retrato de coletividade e estudo de tem- peramentos. O primeiro centrado no personagem coletivo dominante, o se- gundo centralizado na figura de João Romão. São instâncias rigorosamente integradas na estrutura romanesca: o cortiço ganha destaque como titular da narrativa. João Romão emerge do cortiço e ganha relevo como titular na ação. O romance constitui um vasto painel em que predomina a bipolaridade. A dimensão duplicada paraleliza-se e multiplica-se nos conflitos que emergem das reentrâncias dos blocos-síntese. Confrontos e interações se dão no âmbito de cada um e se fazem também entre eles. No cortiço, ressaltam as duplas João Romão e a negra Bertoleza; um casal de portugueses, Jerônimo e Piedade, tem sua contrapartida no casal mestiço brasileiro, Firmo e Rita; juntos caminham Alexandre, o guarda, mulato e a branca Augusta Carne-Mole; Bruno, o ferreiro, se liga a Leocádia, portuguesa. Esse jogo vai além da singularidade dos personagens e se configura ainda em nível de grupos dentro do grupo, com o confronto entre os Carapicus e os Cabeças de Gato. A numerosa galeria abriga ainda a prostituta Leonie, Leandra, a macho- na feroz, e suas duas filhas, Ana das Dores, casada e separada do marido, Neném, a donzela, e mais Agostinho, o filho; Paula, cabocla velha, meio idiota, rezadeira e “bruxa”; Marciana, mulata asseada e sensual, e filha Flo- rinda, virgem resistente, de “olhos luxuriosos de macaca”; dona Isabel, velha senhora comida de desgostosos, mãe de Pombinha, Albino, o lavadeiro efeminado, os mascates italianos, sempre marginalizados da ação central: Delporto, Pompeo, Francesco, Andrea; os garções da venda de João Romão, Domingos e Manuel. Nos rumos da interação destacam-se movimentos dentro do cortiço, como, por exemplo, o envolvimento do português Jerônimo com Rita Baiana e a relação homossexual entre Leonie e Pombinha, e nuclear, a ascensão de João Romão. Nos rumos da interação, o sobrado figura como contraponto do cortiço, o Miranda como contraponto de João Romão. Por outro lado, as dissensões polarizadoras terminam por substituir-se 24 Metodologia do Ensino de Literatura por congraçamentos integradores, sobretudo diante da ameaça comum, ex- terna, caso da união dos dois cortiços, inicialmente antagônicos. A trama acompanha a evolução da habitação coletiva em destaque que segue paralela à biografia de João Romão. E todos os personagens são envolvidos. [...] Em termos de linguagem ficcional, O Cortiço é um romance altamente representativo, sobretudo no âmbito da realidade em que é produzido. O texto traduz equilíbrio entre a dimensão documentária, a dimensão imaginária e a intenção naturalista de retrato social e denúncia. Configura um microcosmo convincente e personagens-tipo significativos do quadro social que pretende representar: o português ambicioso que pretende as- cender na escala social, o seu conterrâneo, já absorvido socialmente, mas ainda movido pela ambição, o português trabalhador que resiste à absorção e acaba absorvido, a escrava falsamente livre, a mulata emergente, os grupos “marginais” na realidade econômica de então, levados à proletarização, o es- pírito de solidariedade e a estagnação dos grupos menos favorecidos. Vale dizer: instâncias de segmentos sociais importantes no processo de constru- ção da sociedade brasileira. Dicas de estudo A Redação de Trabalhos Acadêmicos � : teoria e prática, organizado por Clau- dio Cezar Henriques e Darcília Marindir P. Simões, Editora da UERJ. A obra orienta de maneira clara e objetiva a escrita de trabalhos acadêmicos. Filme: � O Cortiço, baseado na obra de Aluísio Azevedo, roteirizado por Fran- cisco Ramalho Jr., com Betty Faria, Armando Bogus e Beatriz Segall, tendo sido produzido pela Argos Filmes. O filme é uma luxuosa adaptação do romance para as telas do cinema. Metodologias no ensino e aprendizagem de literatura 25 Atividades 1. Elabore uma atividade de pesquisa cujo objetivo principal é o de fazer com que os alunos comentem aspectos do Realismo-Naturalismo presentes numa versão cinematográfica de um romance representativo desse estilo literário. 2. Selecione uma passagem de um romance realista-naturalista e prepare uma atividade de leitura anotada que focalize a “fidelidade ao real”. 26 Metodologia do Ensino de Literatura 3. Prepare uma questão dissertativa que tenha por objetivo fazer com que o aluno escreva sobre o ensino das Letras no Brasil Colônia. Metodologias no ensino e aprendizagem de literatura 27 28 Metodologia do Ensino de Literatura A contextualização como método de abordagem O objetivo deste capítulo é apresentar a contextualização como método de abordagem no ensino de literatura. A obra literária como produto do momento em que se insere O estudo de uma obra literária deve estabelecer relações com os qua- dros de referência que contextualizam o momento em que ela se insere. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) que orientam o ensino de língua e literatura de nível médio reconhecem a relevância da contextuali- zação como método de abordagem para textos a serem estudados e des- tacam que estes são produtos únicos da história social e cultural de cada contexto em que se inserem, são construções que dialogam com outros textos que os compõem. O estudo do dialogismo entre textos propicia uma abertura para a construção de múltiplas significações. O esquema abaixo destaca competências e habilidades relativas à in- vestigação e à compreensão para o estudo de língua e literatura apresen- tadas nos PCN (BRASIL, 1999, p. 145): Investigação e compreensão Analisar os recursos expressivos da linguagem verbal, relacionan- � do textos/contextos, mediante a natureza, função, organização, estrutura, de acordo com as condições de produção, recepção (intenção, época, local, interlocutores participantes da criação e propagação das ideias e escolhas, tecnologias disponíveis). Recuperar, pelo estudo do texto literário, as formas instituídas � de construção do imaginário coletivo, o patrimônio represen- tativo da cultura e as classificações preservadas e divulgadas, no eixo temporal e espacial. Em um dos itens que apresenta a objetivação das competências e ha- bilidades relativas ao ensino de língua e literatura dos PCN, vemos a mul- tiplicidade de enfoques relevantes que a contextualização como método de abordagem do ensino de literatura pode proporcionar aos estudos de- senvolvidos pelo professorem sala de aula. Também podemos observar 30 Metodologia do Ensino de Literatura que a ponderação apresentada a seguir ressalta o papel de uma obra literária como fonte de legitimação de acordos e condutas sociais e como representação simbólica de experiências humanas: Dar espaço para verbalização da representação social e cultural é um grande passo para a sistematização da identidade de grupos que sofrem processos de deslegitimação social. Aprender a conviver com as diferenças, reconhecê-las como legítimas e saber defendê-las em espaço público fará com que o aluno reconstrua a autoestima. A literatura é um bom exemplo do simbólico verbalizado. Guimarães Rosa procurou no interior de Minas Gerais a matéria-prima de sua obra: cenários, modos de pensar, sentir, agir, de ver o mundo, uma bagagem brasileira que resgata a brasilidade. Indo às raízes, devastando imagens pré-conceituosas, legitimou acordos e condutas sociais, por meio da criação estética. (BRASIL, 1999, p. 142) Apresentar Guimarães Rosa e sua obra em sala de aula, valorizando os aspec- tos mencionados acima, implica trabalhar com a contextualização no que ela tem de melhor a nos oferecer, que é a possibilidade de estabelecermos relações entre elementos diversos, com o objetivo de auxiliar o aluno a estreitar os elos de sua rede de leituras, tanto literárias quanto de mundo. Dentre as diversas maneiras com as quais o professor pode contar para tra- balhar com a contextualização como método de abordagem do ensino de lite- ratura, focalizaremos a que privilegia a escolha de temas, que podem ser des- membrados em subtemas, que, por sua vez, servem para mostrar o enfoque do assunto a ser contextualizado a partir da relação estabelecida entre fontes diver- sas, tais como: obras literárias; � obras teóricas; � obras críticas; � textos relativos a aspectos sócio-histórico-culturais; � outros tipos de produções artísticas do/sobre o período em questão. � O contato com fontes variadas contribui para que o aluno desenvolva seu senso crítico, sua capacidade de tirar conclusões próprias tomando como base diferentes pontos de vista. A partir do tema selecionado, o professor decide com quais fontes irá tra- balhar, sempre adequando sua escolha ao programa da disciplina. O material utilizado para a contextualização deverá, portanto, ilustrar alguns dos aspectos relevantes do tema a serem abordados em sala de aula. É importante frisar que estamos tratando de contextualização. Daí o nosso objetivo ser o de traçar um A contextualização como método de abordagem 31 panorama do contexto em que o assunto estudado se insere. Cada uma das peças que compõe esse panorama deve ser apresentada numa sequência lógica que permita que haja um encadeamento entre as partes. Esse encadeamento é fun- damental para que o professor desenvolva o assunto e para que os alunos sejam levados, não apenas a estabelecer relações entre os textos, mas também a cons- truir seu conhecimento acerca do tópico a partir de perspectivas diferentes. Contextualização da obra literária “A independência do Brasil e o nacionalismo literário no Romantismo” O tema “A independência do Brasil e o nacionalismo literário no Romantismo” foi selecionado para ilustrar a organização de uma aula que siga o tipo de con- textualização sugerido anteriormente. Em primeiro lugar, lembramos que o tema com qual escolhemos trabalhar é apenas um dos possíveis recortes que o professor pode fazer para focalizar de maneira didática o Romantismo no Brasil. Vejamos os passos a serem seguidos: O professor inicia a aula com a apresentação do tópico a ser discutido: � A independência do Brasil e o nacionalismo literário no Romantismo Para introduzir o assunto a ser estudado a partir do tema escolhido, o pro- � fessor inicia a contextualização, relacionando o período do início do movi- mento romântico no Brasil à independência do país. É preciso lembrar que o professor deve se certificar, por meio de perguntas � ou de alguma atividade lúdica, de que os alunos se lembram de determina- dos dados históricos aos quais ele venha a se referir, pois a desinformação ou o esquecimento por parte dos alunos funciona como um obstáculo, o que faz com que eles não consigam estabelecer relações, comprometen- do o trabalho do professor. Se necessário, o professor deverá fornecer as devidas informações. 32 Metodologia do Ensino de Literatura A partir daí, o professor desenvolve a apresentação do tema, tomando � como base fragmentos de textos selecionados ou outras obras, tais como pinturas e esculturas, que possam ilustrar o assunto em questão. Esse ma- terial ilustrativo deve ser apresentado dentro de uma sequência lógica que permita o desenvolvimento do estudo. Após ter situado os alunos em relação ao tema a ser discutido, o professor � apresenta recortes de textos que focalizem a construção da identidade nacional na literatura romântica. Esses textos devem ser agrupados de acordo com o encadeamento lógico de que falamos anteriormente. O professor pode optar por acrescentar subtítulos que servem para melhor orientar os alunos em relação ao enfoques dados ao tema por cada frag- mento a ser lido. Vejamos exemplos desse procedimento: 1. Independência literária e construção da nacionalidade: a visão dos teóricos Texto 1 [...] o Romantismo, no Brasil, assumiu um feitio particular, com caracteres especiais e traços próprios, ao lado dos elementos gerais, que o filiam ao mo- vimento europeu. De qualquer modo, tem uma importância extraordinária, porquanto foi a ele que deveu o país a sua independência literária, conquis- tando uma liberdade de pensamento e de expressão sem precedentes [...]. (COUTINHO, 1969, v. 2, p. 11-12) Texto 2 A literatura tomou parte nesse projeto de construção da nacionalida- de e desempenhou, aí, uma função efetiva. Escrever o que quer que fosse – poesia ou história, teatro ou levantamentos topográficos, romances ou descrições geográficas, crônicas ou dissertações sobre etnografia – podia ser instrumento para se atingir o objetivo visado. Com uma condição: era preci- so que o que se escrevesse fosse considerado “útil e precisoso” para a “pátria”. (ROUANET, 1999, p. 17) A contextualização como método de abordagem 33 Texto 3 No momento em que a maioria dos homens das letras do Brasil recém- -independente procurava contribuir para a construção da literatura nacio- nal, a figura de José de Alencar é merecedora de nossa atenção especial. Em textos afirmativos/doutrinários, o escritor revela quais as diretrizes que, se- gundo ele, deveriam nortear a literatura que se queria brasileira, enfatizan- do sempre que deveria ser privilegiado em nossa literatura tudo aquilo que fosse característico do país. [...] Do passado pré-colonial, Alencar resgata tradições para apresentá-las em uma nova forma de romance, que julga mais apropriada para cantar a raça e as belezas naturais brasileiras. Tomando a questão da busca de uma identida- de nacional, Alencar volta ao passado pré-colonial, dando destaque à figura do índio, que ele acreditava ser um símbolo verdadeiro de liberdade e pureza. Seu romance Iracema é, então, escrito nessa nova forma por ele sugerida, e Alencar, servindo-se da temática do indianismo, participa conscientemente da fundação de uma literatura nacional que retrata o país, fazendo-o de uma forma original e valendo-se de uma linguagem que acredita ser bem próxima ao português falado no Brasil. (HENRIQUES, 1996, p. 454. Adaptado) O professor escreve o subtema no quadro e, em seguida, pede aos alunos que � façam a leitura silenciosa dos fragmentos de textos por ele selecionados. Em seguida, o professor inicia a discussão, pedindo que os alunos desta- � quem as ideias principais de cada um dos textos lidos, enquanto as anota no quadro. Convémlembrar que a participação dos alunos nesse momen- to deve ser motivada por meio de perguntas que orientem o desenvolvi- mento do debate de acordo com o objetivo a ser atingido na aula. As informações fornecidas pelos alunos devem servir como ponto de par- � tida para comentários, cabendo ao professor ressaltar aspectos relevantes que não tenham sido observados pelos alunos. A seguir, o professor introduz um novo subtema, que dá continuidade ao � encadeamento do assunto, pedindo aos alunos que leiam silenciosamen- te os textos correspondentes. 34 Metodologia do Ensino de Literatura 2. Fundação da literatura nacional e indianismo: a visão de José de Alencar Texto 1 [...] se algum dia fosse poeta, e quisesse cantar a minha terra e as suas be- lezas, se quisesse compor um poema nacional, pediria a Deus que me fizesse esquecer por um momento as minhas ideias de homem civilizado. Filho da natureza embrenhar-me-ia por essas matas seculares; contemplaria as natu- rezas de Deus, veria o sol erguer-se no seu mar de ouro, a lua deslizar-se no azul do céu; ouviria o murmúrio das ondas e o eco profundo e solene das florestas. (ALENCAR, 1960, p. 865) Texto 2 As tradições dos indígenas dão matéria para um grande poema que talvez um dia alguém apresente sem ruído nem aparato [...]. (ALENCAR, 1958, p. 129) Texto 3 Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte, nasceu Ira- cema. Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna e mais longos que seu talhe de palmeira. O favo da jati não era tão doce como seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado. Mais rápida que a ema selvagem, a morena virgem corria o sertão e as matas do Ipu, onde campeava sua guerreira tribo, da grande nação tabajara. (ALENCAR, 1958, p. 239) Após a leitura silenciosa dos textos, o professor reinicia a discussão, seguin- � do o mesmo procedimento adotado para a apresentação do primeiro grupo de fragmentos, pedindo mais uma vez aos alunos que destaquem as ideias principais de cada um dos textos lidos, enquanto as anota no quadro. As informações fornecidas pelos alunos devem servir como ponto de par- � tida para comentários, cabendo ao professor ressaltar aspectos relevantes que não tenham sido observados pelos alunos. A contextualização como método de abordagem 35 A partir desse momento, o estabelecimento de relações entre todos os � textos lidos deve ser motivado e, para que isso aconteça, o professor deve orientar o desenvolvimento do debate. O debate baseado no encadeamento lógico do assunto apresentado pela � sucessão de fragmentos e no diálogo que se estabelece entre eles permite que, juntos, professor e alunos construam oralmente uma narrativa sobre o tema em questão. A organização de recortes de textos ou obras para o desenvolvimento do � tema escolhido deve procurar ilustrar a contextualização partindo do ge- ral para o particular. Vejamos as ideias principais de cada um dos fragmentos dos textos apresen- tados que mapeiam o tema estudado: Subtema 1 � Texto 1 � – destaca o importante papel desempenhado pelo Romantis- mo no Brasil em relação à independência literária do país; Texto 2 � – focaliza a participação efetiva da literatura na construção na- cional; Texto 3 � – fecha o foco da questão em José de Alencar, o principal ro- mancista do indianismo, que muito se dedicou à questão da fundação de uma literatura nacional que retratasse o Brasil e sua gente. Seu ro- mance Iracema constitui um marco na história da literatura brasileira. Subtema 2 � Texto 1 � – destaca a importância da natureza como fonte de inspiração; Texto 2 � – apresenta as tradições indígenas como tema para uma gran- de obra poética; Texto 3 � – descreve a beleza da índia Iracema através de comparações com outros elementos da natureza brasileira, ressaltando que a jovem da tribo tabajara os supera em todos os aspectos. Após essa contextualização, o professor deve pedir a seus alunos que � leiam Iracema, a obra completa ou capítulos selecionados. Essa escolha dependerá principalmente do programa da disciplina lecionada. 36 Metodologia do Ensino de Literatura Para estimular a participação dos alunos na discussão do romance de � Alencar, o professor deve preparar atividades que os levem a perceber o colorido, a beleza, o ritmo dessa narrativa poética. Uma dentre diversas atividades possíveis é pedir aos alunos que de- � senhem uma cena ou simplesmente imaginem um quadro que ilustre uma das paisagens descritas no romance, observando, por exemplo, como através de cores e perfumes Alencar pinta a natureza brasileira. Uma outra atividade possível consiste em pedir aos alunos que obser- � vem um cartaz ou foto projetada que mostre uma praia do Ceará, se- melhante à que Alencar descreve na abertura do romance Iracema. Du- rante os comentários sobre a foto da praia cearense, o professor deve chamar a atenção dos alunos para os contrastes de cores e de lumino- sidade na composição da imagem. A seguir, o professor faz a leitura do trecho selecionado do romance de Alencar: “Verdes mares que brilhais como líquida esmeralda aos raios do sol nascente, perlongando as al- vas praias ensombradas de coqueiros [...]” (ALENCAR, 1958, p. 237). Após a leitura, o professor convida os alunos a uma viagem poética ao � Ceará através das páginas de Iracema. “O imperialismo e a identidade nacional no Modernismo” O Modernismo pode ser definido como um movimento de grande dinamis- mo, de tendências e características diversas, mais simultâneas do que sucessivas (cf. JOBIM; SOUZA, 1987, p. 248). Por essa razão, escolhemos o tema “O imperialismo e a identidade nacional no Modernismo” para apresentar uma das possíveis maneiras de contextualizar o movimento modernista. Dessa maneira, nossa proposta de estudo parte do tema sugerido e consiste em apresentar uma atividade de pesquisa a ser realizada pelos alunos. A contextualização do movimento modernista é iniciada pelo professor � em sala de aula. Ao apresentar o tema da proposta, o professor dirige o foco, por exemplo, � para duas das possíveis questões a serem discutidas: a crítica à hegemonia estrangeira e à visão de identidade nacional do Romantismo. A contextualização como método de abordagem 37 A seleção do material a ser trabalhado (obras modernistas ou sobre o Mo- � dernismo) deve ser bem planejada para que, ao final do estudo, possam ter sido mapeados os aspectos mais relevantes sobre o recorte do assun- to a ser pesquisado pelos alunos e, posteriormente, discutido em sala de aula. Ou seja, ao lançar a proposta de trabalho, o professor inicia a contex- tualização do tema escolhido, ilustrando suas explicações com exemplos de obras modernistas. A seguir, apresenta os textos e/ou obras de outras artes por ele seleciona- � das para servirem de objeto de pesquisa dos alunos, cujos resultados se- rão levados para a sala de aula em forma de tópicos ou parágrafos curtos para que possam ser lidos, comparados e discutidos. O professor deve estimular e orientar o debate em sala de aula a partir � dos dados pesquisados, pois essa discussão contribuirá para aprofundar a contextualização do assunto e iniciar o trabalho de leitura e análise de obras literárias modernistas. Vejamos algumas sugestões de obras que muito contribuíram para a popularização de ideias modernistas. Desta- camos para o tema em questão algumas que partem de contribuições da literatura e da pintura. Dessa maneira, sugerimos: Da literatura: � Manifesto Antropófago (1928), de Oswald de Andrade; “Na Maré das Reformas” (1921), artigo de Menotti del Picchia; “O Movimen- to Modernista” (1942), depoimento de Mário de Andrade. Da pintura: Anita Malfatti; Di Cavalcanti. � A seguir, o professor apresenta a propostade pesquisa com base em � exemplos – um fragmento de texto e um quadro – para orientar os alunos acerca do trabalho a ser realizado. Os alunos fazem a leitura do texto e observam o quadro, ambos represen- � tativos do Modernismo. Professor e alunos tecem comentários sobre o texto e a pintura. Esses co- � mentários são importantes, pois a partir deles o professor contextualiza o tema, apresentando também os aspectos que devem ser observados pelos alunos em suas pesquisas. Para exemplificar esse procedimento, su- gerimos um fragmento do Manifesto Antropófago, de Oswald de Andrade, e o quadro Antropofagia, de Tarsila do Amaral. O professor escreve no quadro informações básicas sobre o texto a ser lido, � tais como título, ano de publicação e nome do autor. Em seguida, são feitas duas leituras do texto em voz alta, de preferência por alunos voluntários. 38 Metodologia do Ensino de Literatura Manifesto Antropófago (1928) Nunca fomos catequizados. Fizemos o carnaval. O índio vestido de sena- dor do Império. Fingindo de Pitt. Ou figurando nas óperas de Alencar cheio de bons sentimentos portugueses. Contra a realidade social, vestida e opres- sora, cadastrada por Freud – a realidade sem complexos, sem loucura, sem prostituições e sem penitenciárias do matriarcado de Pindorama. (ANDRADE, 1980, p. 82) Terminada a leitura, o professor mostra ou projeta uma foto com o quadro � Antropofagia (1929), da pintora modernista Tarsila do Amaral, e apresenta informações básicas sobre a pintura. Os alunos tecem comentários a respeito de suas impressões sobre o frag- � mento e a pintura apresentados, o professor conduz a discussão destacan- do alguns dos pontos fundamentais acerca do tema a ser pesquisado nas obras indicadas. A seguir, apresenta o detalhamento da atividade de pesquisa a ser realiza- � da, indicando algumas referências bibliográficas e páginas da internet que podem servir de fontes de pesquisa. Texto complementar A hipótese do Brasil: Romantismo e solidão (HELENA, 2000, p. 18-19) Numa leitura do Brasil, em 1929, Mário de Andrade escreve: “Eu sou tre- zentos”, poema que abre o livro Remate de Males. Impossível não lembrar, na vertente das dificuldades com que o país se deparava, da muita saúva e pouca saúde que espantam o herói de nossa gente na “pauliceia desvairada”. Na versão modernista, Macunaíma volta ao Uraricoera, perde a consci- ência na Ilha de Marapatá e, qual saci melancólico, alquebrado e num pé só, vira constelação. Nosso herói perde a perna, a vida e a voz, pois sua história é contada por um papagaio tagarela. Duplo desse homem coletivo perdido, o indivíduo tematizado no poema vive o caos da identidade. A contextualização como método de abordagem 39 Metáfora de uma urna híbrida, que só por seus cacos pode ser referida, no remate de nossos males, a solução encontrada para um rosto que nos inte- grasse, passa pelos trezentos, trezentos-e-cincoenta eus na problematização maioandradina. [...] Se o Modernismo contempla a identidade individual e nacional como resíduos em permanente hibridismo, ao revisitar a mata virgem das nossas memórias, faz alusão a um outro momento decisivo na postulação da hipó- tese Brasil e de sua constituição como entidade e identidade. Ao fazer José de Alencar, o “Pai do mutum” na dedicatória-homenagem que afinal não publica na primeira edição de Macunaíma, Mário de Andrade assinala com quantos eus se faz o Brasil no Romantismo. Três eus se encontram nesse lugar-cristalizado do imaginário cultural. Um deles, solitário, pergunta por si mesmo na angústia de uma individualida- de que desse conta de existir. O outro, social e abstrato, pergunta por seu espaço na figuração do Estado que, no modelo-padrão internacional (a atin- gir) deveria substituir o absolutismo e o despotismo. Por fim, um terceiro eu, o nacional, a peculiaridade. A tarefa que se atribuíam os românticos e, em especial, José de Alencar, que entre nós tomou-a por missão, era estabelecer os nós e deslindar os qui- procós dessa tríplice aliança de eus desconcertantes e desconcertados. [...] Suas obras, que surpreendem pela perspicácia disfarçada de histórias pala- táveis, dão forma e conteúdo à representação do país nascente, buscando cons- truir a “memória” do cidadão que ocuparia o lugar das mitologias da origem. Preside esta empresa a intenção de dizer o que era ser brasileiro no século XIX. A colônia em que se era o outro, dera lugar ao país que não sabia o que era. Entre esses dois momentos, gente nascera, trabalhara e morrera, com um mal-estar semelhante a uma doença crônica. A sensação de solidão se avo- luma. E vem tematizada na imagem da ilha deserta em que o homem, por si mesmo, há de reconstruir o mundo. A nação travava “luta terrível, espantosa, louca, desvairada” como a que se propõe Peri, em busca de Ceci, despren- dendo do seio da terra um tronco de palmeira, que “resvalou pela flor d´água 40 Metodologia do Ensino de Literatura como um ninho de garças ou alguma ilha flutuante”. Sobreviventes das águas turvas das revoluções identitárias, a construção de Peri e sua parceira Ceci, sob o ícone das águas do mito de Tamandaré e de Noé, são figurações român- ticas do dilúvio de incertezas diante do futuro da nova nação. [...] Dicas de estudo Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio � , Ministério da Educação, 1999. Publicação que orienta o ensino de língua e literatura. Iniciação à Literatura Brasileira � , de José Luís Jobim e Roberto Acízelo de Souza, Editora Ao Livro Técnico. A obra discute a literatura brasileira de maneira clara e objetiva, incluindo exercícios. Atividades 1. O estudo de uma obra literária deve estabelecer relações com os quadros de referência que contextualizam o momento em que ela se insere. Elabore uma atividade de pesquisa cujo objetivo principal é o de fazer com que os alunos discutam a contribuição prestada por um(a) escritor(a) na populariza- ção de ideias modernistas. A contextualização como método de abordagem 41 2. Prepare uma atividade que apresente a contextualização, partindo de um tema selecionado e que tenha por objetivo fazer com que o aluno comente o papel da literatura romântica na construção da identidade nacional brasileira. 42 Metodologia do Ensino de Literatura Intertextualidade no texto literário: a paráfrase e a estilização O objetivo deste capítulo é apresentar a intertextualidade como método de abordagem de literatura através de estudos de paráfrase e de estilização em textos literários. Breve conceituação de intertextualidade A escolha da intertextualidade literária como método de abordagem no ensino de literatura permite ao professor preparar aulas motivadoras que poderão despertar no aluno o interesse em descobrir ou desvendar diálogos existentes entre obras literárias. O debate sobre possíveis rela- ções intertextuais leva o aluno a entrelaçar com mais firmeza os fios de sua rede de leitura, tornando o tecido mais forte porque mais bem trabalhado. O estímulo para esse tipo de leitura deve ser encorajado. Através dele, o aluno poderá observar que as obras podem e devem ser lidas não como unidades isoladas, mas como partes essenciais de um grande mosaico, para usar uma expressão de Julia Kristeva. Ao trabalhar a intertextualidade como método de abordagem do texto literário, o professor deve estar consciente de que para percebermos a existência da intertextualidade será necessário recorrer à nossa rede de leituras, isto é, ao conhecimento textual que é peculiar a cada um de nós. Vejamos a definição de intertextualidade sugerida por José Luiz Fiorin (2006, p. 52): Intertextualidade deveria ser a denominação de um tipo composicional de dialogismo: aquele em que há no interior do texto o encontro de duas materialidades linguísticas, de dois textos.Para que isso ocorra, é preciso que um texto tenha a existência independente do texto com que dialoga. Assim, quando falamos aqui em intertextualidade na literatura, pen- samos em um diálogo que se estabelece entre obras literárias, e pode ser caracterizado como externo ou interno. Isso significa que uma obra pode fazer referência a outra ou a outras obras, de escritores diferentes, o que configura um caso de intertextualidade externa. Quando um escritor es- 44 Metodologia do Ensino de Literatura tabelece um diálogo intertextual com sua própria obra, estamos diante do que chamamos de intertextualidade interna ou intratextualidade. “Antologia”, de Manuel Bandeira, serve como exemplo desse tipo de diálogo intratextual, pois o poeta reescreve seus próprios versos. Vejamos um fragmento do poema: Antologia Manuel Bandeira A vida Não vale a pena e a dor de ser vivida. Os corpos se entendem, mas as almas não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino. Vou-me embora pra Pasárgada! Aqui eu não sou feliz. [...] Uma obra pode fazer referência ou estabelecer uma relação, um diálogo, com outra ou outras já existentes de diversas maneiras. Essas maneiras variam, por exemplo, desde diálogos mais fracos como a citação de uma frase ou nome de um personagem, chegando por vezes a diálogos mais fortes, que podem ser exemplificados com reescrituras de obras inteiras. Contudo, nós, leitores, só podemos perceber a presença desses diálogos inter- textuais quando conhecemos e, obviamente, nos lembramos da obra ou das obras com que o texto que estamos lendo dialoga. Isto é, dependemos de nosso repertó- rio textual. Se um romance menciona em sua narrativa o nome de um personagem de uma outra obra, esse diálogo intertextual, mesmo sendo explícito por causa da citação do nome, só produzirá efeito se o leitor tiver lido a obra original em que aquele personagem aparece ou se possuir algum conhecimento sobre ele. Concluímos então que quanto mais obras literárias conhecermos, maior e mais espessa será a nossa rede de leituras, e, consequentemente, maiores serão também nossas chances de perceber diálogos literários, que podem acontecer entre obras de escritores de um mesmo país e/ou de países diferentes. Vejamos um dos muitos exemplos de intertextualidade presente no romance Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis (1971, p. 521-522). No capítulo de número sete, intitulado “O delírio”, Brás Cubas relata seu encontro com Pandora. Intertextualidade no texto literário: a paráfrase e a estilização 45 Caiu do ar? destacou-se da terra? não sei; sei que um vulto imenso, uma figura de mulher me pareceu então, fitando-me uns olhos rutilantes como o sol. Tudo nessa figura tinha a vastidão das formas selváticas, e tudo escapava à compreensão do olhar humano, porque os contornos perdiam-se no ambiente, e o que parecia espesso era muita vez diáfano. Estupefato, não disse nada, não cheguei sequer a soltar um grito; mas, ao cabo de algum tempo, que foi breve, perguntei quem era e como se chamava: curiosidade de delírio. – Chama-me Natureza ou Pandora; sou tua mãe e tua inimiga. Ao ouvir esta última palavra, recuei um pouco, tomado de susto. A figura soltou uma gargalhada, que produziu em torno de nós o efeito de um tufão; as plantas torceram-se e um longo gemido quebrou a mudez das coisas externas. [...] – Entendeste-me? disse ela, no fim de algum tempo de mútua contemplação. – Não, respondi; nem quero entender-te; tu és absurda, tu és uma fábula. Estou sonhando, decerto, ou, se é verdade que enlouqueci, tu não passas de uma concepção de alienado, isto é, uma coisa vã, que a razão ausente não pode reger nem palpar. Natureza, tu? a Natureza que eu conheço é só mãe e não inimiga; não faz da vida um flagelo, nem, como tu, traz esse rosto indiferente, como o sepulcro. E por que Pandora? – Porque levo na minha bolsa os bens e os males, e o maior de todos, a esperança, consolação dos homens. Tremes? – Sim; o teu olhar fascina-me. – Creio; eu não sou somente a vida; sou também a morte, e tu estás prestes a devolver-me o que te emprestei. Grande lascivo, espera-te a voluptuosidade do nada. Brás Cubas, ao relatar seu encontro com Pandora, estabelece uma intertex- tualidade explícita entre o romance de Machado e o poema Os Trabalhos e os Dias, de Hesíodo, um poeta grego dos fins do século VIII a.C. A figura de Pandora e o poeta Hesíodo estão assim registrados por Pierre Grimal no Dicionário de Mitologia Grega e Romana (1993, p. 353-354): Pandora é, num mito hesiódico, a primeira mulher. [...] No poema Os Trabalhos e os Dias, Hesíodo conta que Zeus enviou Pandora a Epimeteu. Seduzido pela beleza, este tomou-a por esposa, esquecendo os conselhos de seu irmão Prometeu, que o advertira no sentido de jamais aceitar um presente de Zeus. Ora havia um vaso (Hesíodo não nos diz que vaso era esse) que continha todos os males. Estava coberto por uma tampa que impedia o conteúdo de se extravasar. Mal chegou à Terra, Pandora movida por uma imensa curiosidade, levantou a tampa do recipiente, e todos os males se espalharam sobre a humanidade. Apenas a esperança, que estava no fundo, ficou, por não conseguir sair antes de Pandora voltar a colocar a tampa no vaso. Segundo outra versão, este vaso conteria não os males, mas tudo o que de bom existe, e Pandora tê-lo-ia levado a Epimeteu como presente de núpcias, a mando de Zeus. Abrindo imponderadamente o recipiente, ela deixou escapar os bens, que voltaram para a morada dos deuses em vez de permanecerem entre os mortais. Os homens foram assim condenados a sofrer toda a casta de males; só a esperança, pobre consolação, lhes restava. O leitor que porventura desconhecer o mito de Pandora irá se basear apenas nas informações presentes na narrativa machadiana, que ressalta o poder dessa mulher que carrega em sua bolsa os bens e os males. Nessa hipótese, não há como aprofundar a leitura estabelecendo novos elos entre as obras. Contudo, para aquele que conhece o mito hesiódico, um grande leque se abre para que novos laços sejam estabelecidos, pois seu conhecimento acerca dessa figura 46 Metodologia do Ensino de Literatura mítica permitirá o enriquecimento da leitura do romance Brás Cubas. Convém observar também que o reconhecimento da intertextualidade multiplica senti- dos nas duas obras em diálogo, na medida em que a leitura de uma provoca a releitura da outra sob novas perspectivas. Ao escolher a intertextualidade como método de abordagem do texto literá- rio, o professor deverá definir os tipos de diálogos intertextuais com os quais irá trabalhar. Definições devem ser acompanhadas de exemplos e vice-versa, pois formam uma dupla indispensável para a compreensão das obras estudadas. A ordem em que serão apresentadas é uma decisão que cabe ao professor tomar, a partir de suas observações e objetivos em sala de aula. Paráfrase e estilização Paráfrase Ao apresentar a paráfrase em sala de aula, o professor deve lembrar aos alunos que ela se faz presente em nosso cotidiano e que a ela recorremos com frequência em situações variadas. Mas o que significa o termo paráfrase? Paráfrase: em sentido amplo, estamos nos referindo a um texto que retoma um outro, a que chamamos de texto-base ou original, procurando não alte- rar-lhe o sentido. A paráfrase deixa clara a sua ligação com o texto original e não quer para si a autoria desse texto. Como se trata de um termo de sentido bastante amplo, convém ao professor re- correr também a definições oficiais, ou seja, aquelas encontradas em dicionários, de preferência, de termos literários. Vejamos então duas definições de fontes distintas. A primeira obra, de Harry Shaw (1973, p. 341-342), assim define o termo paráfrase: Reexposição de um texto, mantendo-lhe o significado, mas dando-lhe uma nova forma. O termoderiva de palavras gregas que significam “ao lado” e “discurso”, e a paráfrase implica, geralmente, um desenvolvimento do texto com o fim de torná-lo claro. Muitos críticos modernos discordam de que se parafraseiem textos, mas o exercício dessa atividade é essencial a todos aqueles que desejem entender bem aquilo que leem. Na segunda obra, de Karl Beckson e Arthur Ganz (1965, p. 391), lemos que a pa- ráfrase é “a reafirmação, em palavras diferentes, do mesmo sentido de uma obra Intertextualidade no texto literário: a paráfrase e a estilização 47 escrita. Uma paráfrase pode ser uma afirmação geral da ideia de uma obra como explicação de um trecho difícil”. Tomando como base as duas definições apresentadas, observamos que ambas mencionam que a paráfrase também pode ser a reescrita de um texto a fim de torná-lo mais compreensível. É interessante acrescentar que nos dois dicionários citados a definição do termo em questão é ilustrada com paráfrases de poemas. O professor poderá sugerir uma atividade desse tipo em sua sala de aula. Após a leitura de um poema selecionado, alunos e professor constroem uma paráfrase do poema lido. Cabe lembrar que esse é um exercício válido ao qual o professor pode recorrer também quando desejar verificar se seus alunos enten- deram um determinado texto, poético ou não, que esteja sendo estudado, pois só conseguimos contar com nossas palavras o que um texto quer dizer quando compreendemos o sentido desse texto. A seguir, convém complementar as definições de paráfrase apontando para o uso frequente que fazemos dela em nosso cotidiano, dentro e fora de nossa sala de aula de literatura. Como possíveis exemplos de atividades a serem apresenta- das pelo professor, sugerimos: O resumo de uma história � – o professor pede aos alunos que façam o resumo de um livro, de um filme ou até mesmo de uma novela que este- ja em cartaz. Deve ser escolhida, de preferência, a opção que permita o maior número de participantes possível. Ao construírem o resumo de uma obra, que é do conhecimento de todos, os alunos se policiarão e corrigirão uns aos outros caso alguma informação inadequada, que fuja ao texto ori- ginal, seja sugerida. O professor deve retomar as definições apresentadas, ressaltando que a paráfrase se aproxima ao máximo do sentido do texto- -base. Ela quer ser fiel a esse texto e não rebelar-se contra ele. A explicação de um texto teórico � – o professor pede aos alunos que leiam, individualmente ou em pares, um fragmento de um texto teórico relativo à literatura. Esse texto deve discutir um assunto já estudado pelos alunos. Após a leitura, o professor pede aos alunos que expliquem com suas próprias palavras o que está sendo afirmado no texto selecionado. Após a construção da paráfrase pelos alunos, o professor pede que identi- fiquem a atividade que acabaram de realizar dentre as definições de pará- frase estudadas. Para finalizar, o professor pede aos alunos que escrevam o texto elaborado, deixando claro que a paráfrase não faz deles autores do ensaio crítico que serviu como texto-base. Parafrasear uma história não 48 Metodologia do Ensino de Literatura nos dá o direito de nos julgarmos autores ou coautores dela. Essa obser- vação é importantíssima para que desde cedo os alunos aprendam a re- conhecer e a respeitar a autoria de textos, inclusive os de cunho crítico e/ ou teórico. Uma paráfrase que esconda a sua ligação com o texto original deixa de ser uma paráfrase e passa a ser um plágio. Estilização O professor deve estabelecer comparações com a paráfrase ao introduzir a definição de estilização, pois ambas trabalham no viés das semelhanças. Estilização: como a paráfrase, a estilização também não nega sua ligação com o texto-base ou original. Ela imita o texto-base ou um determinado estilo sem o objetivo de subverter o seu sentido ou de ironizá-lo. Após essa primeira definição, o professor pode recorrer à noção de desvio su- gerida por Affonso Romano de Sant’Anna, pois acreditamos que ela seja bastante esclarecedora, principalmente para aqueles que iniciam seus estudos sobre diálo- gos intertextuais. Em Paródia, Paráfrase & Cia., Sant’Anna (2004, p. 38-42) afirma: Trabalhemos com a noção de desvio. Consideremos que os jogos estabelecidos nas relações intra e intertextuais são desvios maiores ou menores em relação a um original. Desse modo, a paráfrase surge como um desvio mínimo, a estilização como um desvio tolerável [...]. Vejamos a estilização como um desvio tolerável. Por um desvio tolerável, estou significando algo quantitativamente verificável, sem me envolver em problemas qualitativos. Ou seja: esse desvio tolerável seria o máximo de inovação que um texto poderia admitir sem que lhe subverta, perverta ou inverta o sentido. Seria a quantidade de transformações que o texto pode tolerar mantendo-se fiel ao paradigma inicial. Isto me permite dizer que o escritor que produz esse tipo de efeito trabalha numa área de pouca diferença em relação ao original. E esse tipo de desvio mais do que tolerável é também um desvio desejável, sem o que ele pode cair na paráfrase pura e simples e perder o sentido da autoria. Para auxiliar a visualização dessa questão de variação de desvio em relação ao texto original, o professor pode representá-la comparando-a com a ideia de apro- ximação e de distanciamento, que pode ser visualizada da seguinte maneira: texto original paráfrase texto original estilização Em seguida, o professor deve explicar que o desvio mínimo a que se refere Sant’Anna significa que o texto da paráfrase está bem próximo, "colado", ao texto- Intertextualidade no texto literário: a paráfrase e a estilização 49 base. Daí o desvio na paráfrase ser considerado mínimo. Quanto à estilização, o pro- fessor deve mostrar aos alunos que a distância entre o texto original e o estilizado é maior. Esse desvio tolerável acontece porque o texto estilizado lembra o texto-base. Nele podemos perceber ecos do texto original. Por essa razão, seu desvio também é chamado de desejável porque se ele se aproximar demais do texto-base acabará se tornando uma paráfrase e não uma estilização. A estilização também pode ser verificada quando um escritor imita o estilo de outro. Nesse momento, o professor deve conceituar o termo estilo, do qual deriva a palavra estilização, destacando alguns dos seus significados mais relevantes: Estilo: a maneira como pensamentos são traduzidos em palavras; modo ca- racterístico de construção e de expressão na linguagem escrita e oral; ca- racterísticas de uma obra literária, mais no que diz respeito à sua forma de expressão do que às suas ideias (cf. SHAW, 1973, p. 187). Essa palavra pode estar acompanhada de diversas referências: estilo romântico, estilo clássico, estilo pomposo, estilo machadiano etc. Estilo deriva do termo latino stilus, que significa um “instrumento pontiagudo de escrita”. Como se pode observar, as definições do vocábulo estilo complementam a explicação de estilização e oferecem argumentos para que os alunos possam melhor compreender os casos a serem estudados. Estudos de casos de paráfrase e de estilização A intertextualidade como método de abordagem no ensino de literatura ofe- rece ao professor a oportunidade de trabalhar textos literários a partir de com- parações que motivam a participação dos alunos para a descoberta de diálogos intertextuais, que fazem com que as obras literárias possam ser entendidas como os fios de uma grande rede formada de textos: textos que constantemente reto- mam uns aos outros; textos que se inserem numa tradição, dialogando entre si e com o mundo que os cerca. Estudo de caso de paráfrase Vejamos então um estudo de paráfrase. O primeiro passo a ser dado pelo professor será o da escolha do texto original, � que será comparado a textos que o tomam como base, que
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