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225 REB Volume 7 (2): 225-240, 2014 ISSN 1983-7682 OS TEMAS TRANSVERSAIS COMO PROPOSTA PARA AS ATIVIDADES PEDAGÓGICAS DO PROFESSOR EVENTUAL NA ESCOLA PÚBLICA. TRANSVERSE THEMES AS PROPOSAL FOR EVENTUAL TEACHER’S PEDAGOGICAL ACTIVITIES IN PUBLIC SCHOOL Mariana Guilger¹ Prof. Dr. Heitor Zochio Fischer² 1. Graduanda em Ciências Biológicas, Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde. PUC-SP. Rua Hermínio Leroy, 44, Bambu, Porto Feliz, SP, Brasil. 18.540-000. Contato: marianaguilger26@hotmail.com. 2. Chefe do Departamento de Ciências do Ambiente na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Campus Sorocaba/SP. Contato: hfischer@pucsp.br RESUMO Este trabalho teve por objetivo investigar a frequência com que os professores eventuais, de uma escola pública, atuaram ao longo de um ano letivo e propor a utilização dos Temas Transversais como estratégia para a melhor qualidade de suas aulas. Por meio de entrevistas com professores que atuam ou já atuaram nessa condição, foi possível constatar que a maioria deles se sentiu despreparada ao entrar em sala de aula por vários fatores, sendo o principal, o fato de serem chamados de imediato, sem ter tempo para a elaboração das aulas. A partir da frequência de atuação dos professores eventuais e da análise das entrevistas, concluiu-se que uma intervenção nessas aulas seria algo positivamente significativo para a escola. Desse modo, foram elaboradas aulas, baseadas nos temas transversais, destinadas ao ensino fundamental ciclo II e ensino médio, as quais são modelos para que se possa dar continuidade ao projeto. Palavras-chave: temas transversais; professor eventual; escola pública. mailto:marianaguilger26@hotmail.com mailto:hfischer@pucsp.br 226 ABSTRACT This work aims to investigate the frequency in which eventual teachers from a public school worked during a scholar year and to propose the use of the transverse themes as a strategy for a better quality of their classes. Through interviews with teachers who work and already worked in this condition it was possible to realize that most of them felt unprepared when entering into the classroom because of many factors, being the main, the fact that they are called immediately, without having time to prepare the classes. Through the frequency of eventual teachers’ work and the analysis of the interviews it was concluded that an intervention in these classes would be something positively significant for the school. So some classes were prepared based on transversal themes destined to elementary school and high school which will be models to continue the project. Keywords: transverse themes; eventual teacher; public school. INTRODUÇÃO O presente projeto de pesquisa “Os Temas Transversais como proposta para as atividades pedagógicas do professor eventual na escola pública” surgiu a partir de minhas primeiras experiências como professora eventual em uma escola pública no município de Porto Feliz - SP. Nos primeiros dias de atuação na escola, já me ofereceram seis aulas, sendo essas em diferentes disciplinas, totalizando a carga didática que havia sido combinada. Além de mim, a escola contava com três professores eventuais, sendo que um fazia plantão na escola todos os dias e os outros dois compareciam alguns dias na semana. A frequência da atuação dos professores eventuais, devido à ausência dos professores titulares, me chamou bastante a atenção, o que não é uma crítica à escola, nem aos professores, os quais têm direito às faltas garantidas por lei, mas sim um importante fato a ser analisado visto que, em tal situação, o que está em jogo é a formação dos alunos. Como professora, passei por algumas situações bastante constrangedoras, nas quais os alunos fizeram perguntas que não fui capaz de responder com a exatidão desejada. Há quem diga que o professor eventual não tem obrigação de dominar todos os conteúdos. Realmente não tem, assim como nenhum ser humano comum tem, mas e os alunos? Como ficam nessa situação? Sem a resposta desejada? 227 Por que não procurar por uma estratégia pela qual se possa enriquecer o conhecimento dos alunos e facilitar o trabalho do professor eventual? Pensando nessa direção, os temas transversais podem ser uma estratégia para a melhoria da qualidade das atividades pedagógicas do professor eventual? O objetivo principal desta investigação foi verificar se a utilização dos Temas Transversais, como conteúdo, poderia contribuir para a melhoria das atividades pedagógicas do professor eventual da escola pública. 1 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA A ausência dos professores titulares das disciplinas é algo muito comum no cotidiano das escolas pública do estado de São Paulo. O Estatuto dos Funcionários Públicos Civis dispõe,mediante a Lei complementar 883/00, que o encontro entre professor titular e alunos, em situações legais, pode deixar de ocorrer por um dia ou por uma sequência de dias. Além disso, existem também resoluções, decretos, emendas, portarias e pareceres estaduais e federais que possibilitam o afastamento do professor da sala de aula. É nesse momento de absenteísmo dos professores titulares e consequente desorganização da rotina escolar que surge uma personagem que muitas vezes é ignorada por grande parte do alunado e que soluciona, ao menos momentaneamente, tal situação, o professor eventual. O professor eventual geralmente é um profissional recém-formado ou até mesmo estudante dos últimos anos de um curso de licenciatura, que ingressa na escola, na maioria das vezes, selecionado pelo próprio diretor (BASÍLIO, 2010), fazendo um cadastramento, sem ter sua aptidão avaliada. A função do professor eventual é assumir salas de aula na ausência dos professores titulares e dar continuidade ao conteúdo; porém nem sempre isso é possível. Conforme explicitado no trabalho de Passos et. al. (2005), há certa polêmica sobre a atuação de professores recém-formados e estudantes de licenciatura como eventuais. Estariam esses preparados? Teriam todo o conhecimento necessário? E quanto à experiência? Essas perguntas poderiam ser respondidas com outras perguntas: Como exigir experiência se é algo que só se atinge com a prática? Mas ao mesmo tempo, como confiar? 228 Conforme o determinado, o professor eventual deve lecionar apenas em sua área de atuação, entretanto, ainda segundo Passos et. al. (2005), cumprir com esse requisito é difícil, devido à frequência com que os professores titulares se ausentam. Desse modo, por exemplo, o mesmo profissional que dá aulas de Matemática no 3º ano do Ensino Médio, dá aulas de Educação Física no 6º ano do Ensino Fundamental. Na maioria das vezes, o educador que leciona em caráter eventual é tido como um meio de manter os alunos em sala de aula e evitar o descumprimento dos dias letivos (GUESQUI, 2008). Daí a importância de apoiar e estimular esse profissional. Uma proposta para a melhoria da qualidade das aulas do professor eventual seria a utilização dos Temas Transversais da Educação em suas aulas, os quais muitas vezes são deixados de lado por professores adeptos aos métodos tradicionalistas. Segundo Araújo (2003), os Temas Transversais da Educação são um conjunto de assuntos pertinentes à realidade dos estudantes, que devem ser trabalhados de forma conjunta às disciplinas curriculares de modo que os alunos sejam preparados tanto para a vida profissional como social. Em nosso país, os temas estipulados pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC),integrados nos Parâmetros Curriculares Nacionais da Educação (PCNs), são Ética, Saúde, Meio Ambiente, Orientação Sexual, Pluralidade Cultural e Trabalho e Consumo. Porém, nada impede que outros assuntos também sejam trabalhados, tudo dependente da realidade da escola e da comunidade na qual está inserida. Os Temas Transversais poderiam ser umrecurso para facilitar a atuação do professor eventual e proporcionar aos alunos o contato e a compreensão de assuntos que, além de envolverem as disciplinas do currículo de forma geral, estão presentes em sua vivência e necessidades cotidianas. É evidente que para por em prática tal ideia seria necessário um processo de capacitação para os eventuais. O trabalho com questões sociais exige que os educadores estejam preparados para lidar com ocorrências inesperadas do cotidiano (BRASIL, 1997); porém, isso seria bem mais simples que submetê-los a lecionar todas as disciplinas em todos os ciclos. 229 2 MARCO TEÓRICO 2.1 Professor Eventual A ausência de professores da rede pública do estado de São Paulo em relação a suas atividades no magistério tem sido algo bastante frequente. Não se sabe ao certo a causa de tantas faltas, mas está claro que a realidade desses profissionais não é animadora, tanto em termos de condições de trabalho, como de remuneração. Em tal situação, faz-se necessária a atuação de um substituto, que pode ser qualquer um dos professores inseridos na categoria de “não habilitados”. Essa categoria engloba professores com diferentes níveis de formação, graduados ou graduandos em licenciatura, ou profissionais de outras áreas com nível superior sem nenhum curso que envolva educação. Essa categoria envolve os professores eventuais, objeto de estudo e análise da presente pesquisa. O professor eventual, de acordo com Aranha (2007), é aquele profissional que por algum motivo não está apto a ministrar aulas continuamente, devido ao fato de ser iniciante ou não ter atingido a pontuação necessária em concurso ou processo seletivo. O professor eventual, por vezes valorizado e por outras vezes ignorado pela escola, foi legalmente aceito por meio do artigo 10 do decreto 24.948 de 03 de abril de 1986, que diz: Para a regência de classe ou ministração de aulas nos impedimentos eventuais de titular de cargo ou de ocupante de função-atividade da série de classes de docentes, por período de 01 (um) até 15 (quinze) dias, inocorrendo a substituição de que trata o artigo 3.º ou inexistindo estagiários, poderá haver admissão de docente, nos termos do artigo 1.º, inciso I, da Lei nº 500, de 13 de novembro de 1974, através de Portaria Especial de Admissão. SÃO PAULO (Estado), Artigo 10, Decreto 24948/1986) Desse modo, os professores eventuais são responsáveis pela regência das aulas quando os professores se ausentam por um ou poucos dias, fato que muitas vezes é entendido, pelos alunos, como um período de liberdade no qual é desnecessário cumprir com as obrigações. 230 O Estatuto do Magistério Paulista dispõe que os professores titulares de disciplinas das escolas públicas têm direito a dar 6 faltas abonadas, 12 faltas justificadas nas escolas, 12 faltas justificadas nas Diretorias de Ensino e 12 faltas justificadas em última instância na Secretaria Estadual de Educação (SEE), anualmente. Os professores em início de carreira estão cada vez mais desmotivados e despreparados. Devido a uma hierarquia bastante antiga no sistema educacional, os professores recém-formados são submetidos às mais difíceis condições de trabalho. Um exemplo dessa realidade é o fato de que nos processos seletivos realizados pela Secretaria Estadual de Educação (SEE), mesmo que o professor recém-formado obtenha uma boa pontuação em relação ao professor efetivo, não é admitido porque não tem tempo de experiência. Na maioria das vezes, quando ocorrem situações como essa, o profissional acaba se registrando em alguma unidade escolar para atuar como professor eventual, tendo dessa forma, sua primeira experiência com a educação. Em 2003, a SEE, no parágrafo 17, artigo décimo da Resolução 134, determinou que professores eventuais podem ser admitidos para ministrar disciplinas para as quais não há professor titular, desde que terminado o processo inicial de atribuição de aulas: Ao término do processo inicial, a Comissão de Atribuição de classes e aulas divulgará e coordenará a atribuição de vagas para admissões em caráter eventual, aos inscritos no referido processo, que tenham interesse e condições de suprir as unidades escolares com carência de professores para iniciar o ano letivo, atribuição esta, cuja admissão não caracterizará vínculo empregatício e se fará pelos Diretores de Escola, observando o campo de atuação relativo à vaga, a habilitação/qualificação dos inscritos, bem como a ordem de classificação em nível de Diretoria de Ensino. Quando atua sob essa condição, o professor eventual tem a vantagem de poder se programar para as aulas. Porém, o convívio com os mesmos alunos torna-se mais frequente e, caso não se tenha boas estratégias didáticas, os alunos podem tornar-se intolerantes. 231 Assim como evidenciado no estudo de Zanardi (2009), é grande a dificuldade dos professores eventuais em dominar todo o conteúdo de todas as séries e ao mesmo tempo é frustrante não saber dar respostas ao ser questionado. Desse modo, é atribuição das políticas públicas rever essa situação de desmotivação, evitando o afastamento dos jovens interessados em seguir o magistério. A relação entre professores eventuais e titulares também é algo a ser analisado. Apesar da diferença evidente na própria legislação, o envolvimento entre os professores de forma igualitária, independente da função, é importante não só para que o professor eventual esteja melhor inserido no cotidiano da unidade escolar, bem como em beneficio dos alunos, que terão um ensino de melhor qualidade, o qual pode ser interdisciplinar. Segundo Aranha (2007), o professor eventual atua como “plantonista” ou “delivery”, quando não tem apoio pedagógico da equipe escolar. Acaba por realizar apenas tarefas de um ajudante geral polivalente e multifuncional. 2.2 Os Temas Transversais Os Temas Transversais foram criados como uma estratégia paraintegrar os conteúdos curriculares a assuntos de necessidade e interesse geral da sociedade(Araújo 2003). Desse modo, devem ser trabalhados juntamente com as disciplinas do currículo, para que essas possam ser associadas ao cotidiano e melhor desenvolvidas. Além de contribuir para a melhor compreensão das disciplinas curriculares, os Temas Transversais também têm como funçãodespertar a capacidade de expressar seu senso crítico, essencial para a formação de cidadãos conscientes em relação às questões sociais. Os critérios de escolha dos Temas Transversais pelo MEC (Ministério de Educação e Cultura) foram aanálise geral das condições de vida e das necessidades essenciais de conhecimento de todo o alunado nacional. Porém, existem situações específicas, por isso pode-se criar novos temas transversais de acordo com a realidade dos alunos (ARAUJO, 2003). Ao se tratar dos Temas Transversais fala-se também em cidadania devido ao fato da mesma estar diretamente ligado ao conceito de obtenção de conhecimento e participação nas causas relacionadas à humanidade como um todo. Além disso, para a prática da cidadania, designada como cumprimento de deveres e recebimento de 232 direitos, é preciso que se esteja inserido na realidade social, caso contrário, que Deveres cumprir e por quais Direitos cobrar? A educação, como processo de formação e transformação do cidadão e, conseqüentemente da sociedade, não deve se ater apenas aos conteúdos curriculares. De acordo com Araújo (2003), os Temas Transversais dão essa capacidade de transformação, principalmente se forem oferecidas possibilidades da união dos conhecimentos formais com os necessários. 2.3 O Professor Eventual e os Temas Transversais No geralas escolas não conseguem trabalhar os temas transversais ao longo do ano letivo, pois se detêm às disciplinas tradicionais (ARAÚJO, 2003), não se utilizandoda interdisciplinaridadecomo umaestratégia eficiente a ser utilizada na aprendizagem (BRASIL, 1997). Segundo Araújo (2003), a aprendizagem é despertada no aluno quando este sabe quando o conteúdo poderá seraplicado e, preferencialmente, se faz parte do seu cotidiano, e é transmitido numa linguagem familiar. Devido ao aspecto “facilitador e interessante” dos Temas Transversais, esses poderiam ser um instrumento adequado para as aulas do professor eventual. Sabe-se que para isso é exigidodo Professor Eventual um processo autodidata de pesquisa e leitura, além do apoio dos professores titulares e da Coordenação da escola, que estão mais envolvidos com os requerimentos e novidades da SEE, mas sabemos também que tal atitude poderiaenriquecer a ação do professor eventual, ao mesmo tempo que cumpre o papel de trabalhar os Temas Transversais. 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS O presente estudo foi realizado em uma escola estadual inserida na Coordenadoria de Ensino do Interior do Estado de São Paulo, na Diretoria de Ensino Regional de Itu. Trata-se de uma escola antiga, pela qual já passaram várias gerações de alunos. Sua fundação deu-se por meio do decreto 05, publicado em 07 de março de 1953.Quanto às modalidades de ensino, a escola oferece o Ensino Fundamental Ciclo II e o Ensino Médio, cujas aulas são distribuídas nos períodos manhã, tarde e noite. O corpo discente é composto por alunos dos mais diferentes níveis sócio econômicos, provenientes do próprio bairro e vindos da zona rural. A parcela de 233 crianças e jovens provenientes da zona rural são, geralmente, filhos de pessoas de assentamento, empregados de fazendas, sítios, haras e chácaras da redondeza e os alunos do próprio bairro são de nível socioeconômico predominantemente baixo, sendo a maioria dos pais assalariados, de baixo poder aquisitivo. Alguns alunos apresentam carência afetiva e material, o que influencia no processo ensino-aprendizagem. Além destes, também são atendidos alunos interessados, alguns com dificuldades e outros não. O corpo docente é composto em sua maioria por professores efetivos de formação específica na área em que lecionam, com licenciatura plena. Além desses docentes, a escola também tem em seu quadro 4 professores eventuais que atuam na ausência dos professores titulares distribuídos nos três períodos. Os professores dessa unidade escolar são delineados pelos próprios gestores da escola como “profissionais da educação, em sua maioria, compromissados, responsáveis e ainda idealistas, por serem agentes de transformação social”. Quanto ao corpo administrativo e técnico-pedagógico, a escola possui uma diretora e uma vice-diretora, uma secretária, dez agentes de organização escolar, dentre os quais cinco trabalham na secretaria e cinco na inspetoria, e quatro agentes de serviços escolares. Além disso, tem uma professora-coordenadora para o ensino fundamental e um professor-coordenador para o ensino médio. São atendidas 27 classes nos três períodos de funcionamento da escola. Entre as ações da escola, está a capacitação profissional dos docentes, que é realizada por meio de palestras, dinâmicas de grupo e troca de experiências, projeto de recuperação e de reforço, reuniões de pais e mestres, eventos envolvendo a comunidade e projetos como: Ler é viver, Prevenção também se ensina, Fanfarra, Prevenção do Meio Ambiente, Escola da Família etc. Apesar de apresentar um corpo docente bastante esforçado e compromissado com a escola, assim como na maioria das escolas públicas os professores se ausentam com certa frequência. Essas ausências variam entre um dia, ou um período, por falta médica, e até mesmo vários dias ou meses. Nessas ocasiões é que se faz necessária a atuação do professor eventual, tema principal do presente estudo, cujo objetivo foi analisar as atividades pedagógicas realizadas por este professor, conhecer suas experiências nesse cargo e propor estratégias para solucionar possíveis dificuldades. 234 Os dados foram coletados por meio de entrevistas semi-estruturadas e relatos de caso de quatro professores eventuais que estavam registrados e atuando na unidade escolar no período de desenvolvimento do projeto e quatro professores titulares, que iniciaram suas carreiras como eventuais. Obtendo as informações por meio das entrevistas semi-estruturadas, foi possível fazer comparações com os resultados dos trabalhos de ARANHA (2007), ARAÚJO (2003) e BASILIO (2010), autores referenciados ao longo deste projeto. Desse modo, foram obtidos relatos semelhantes aos apresentados pelos autores e foi possível propor a utilização dos temas transversais nas aulas dos professores eventuais da escola aqui evidenciada. A proposta foi aceita, e então, foi preparado um acervo de materiais baseado nos Temas Transversais. Os professores foram convidados a contribuir semanalmente com materiais relacionados à sua disciplina tais como revistas, jornais, músicas, filmes, apresentações de slides, jogos, entre outros, e os pais também puderam participar da escolha dos temas considerados importantes. Além disso, os professores eventuais passaram a se preparar para ministrar tais aulas estudando assuntos da importância da comunidade escolar, auxiliados pelos professores titulares. Esperava-se, como resultado deste projeto, conhecer as possíveis dificuldades enfrentadas pelos professores eventuais, e contribuir, por meio das ideias aqui apresentadas, para que estas fossem solucionadas. Esperava-se também uma aceitação e contribuição dos professores titulares quanto aos conteúdos dos temas transversais a serem ministrados, bem como na elaboração e atualização de um arquivo de materiais diferenciados aqui já citados. Ao término do desenvolvimento deste projeto, concluiu-se que a utilização de temas transversais é, como proposto, uma solução adequada que leva a promoção de aulas de melhor qualidade ministradas pelos professores eventuais. 4 RESULTADOS E ANÁLISE 4.1 Entrevistas Os professores eventuais da escola aqui estudada atuam nessa função por um período que varia entre 3 meses e 13 anos, sendo que 50% deles começaram a atuar após sua formação e 50% ainda estudantes. 235 A análise das entrevistas permite constatar, que atuar como professor eventual, sem nenhuma metodologia específica para isso, devido a diversos fatores, é uma tarefa considerada difícil pelos professores. Ao serem questionados sobre sua primeira experiência lecionando a caráter eventual, a grande maioria (86,15%), tanto os professores eventuais como os titulares que iniciaram suas carreiras como eventuais, declararam ter enfrentado alguma dificuldade, enfatizando a questão do despreparo, principalmente ao lecionar disciplina que não a de sua formação. Em relação à falta de tempo para o preparo das aulas, devido a serem informados sobre as substituições e entrarem na sala de imediato, os professores dizem procurar um conteúdo qualquer naquele exato momento, recorrendo a recursos como o livro didático, e transmitir aos alunos sem nenhuma análise prévia. Informou-se também que essa situação ocorre frequentemente. Ao contrário da maioria, uma professora fez o seguinte relato: “Ficava calma, pois trazia comigo os Temas Transversais”. De acordo com Guesqui (2008), tal situação, que resulta em uma sequência de atividades não planejadas, leva a uma educação cuja função é apenas a manutenção do aluno na escola, de modo que o tempo disponível para o encontro entre professor e alunos é utilizado de maneira inadequada, levando à desorganização da vida escolar. Entre as metodologias utilizadas em situações de despreparo, os professores citaram dinâmicas, curiosidades, conteúdos da internet, textos que abrangessem o maior número de disciplinas, o que indica a inexistência de algum método padronizado a ser utilizado nessas ocasiões. Outros disseram não ter nenhum tipo de metodologia,sendo que um dos professores declarou ficar “totalmente perdido” nessas situações. A maioria dos professores disse que uma metodologia padronizada para essas aulas contribuiria muito. Todos os professores eventuais declararam ter se sentido despreparados para explicar algum assunto em alguma ocasião, principalmente ao tratar-se de questão referente à aula do professor titular o qual estavam substituindo. Em seu estudo, Zanardi (2009), põe em questão a possibilidade de que essa situação de despreparo, que resulta em inquietações, insegurança e desânimo, venha a afastar os potenciais professores da carreira docente, além de inviabilizar a aquisição de conhecimento profissional dos iniciantes. Quando questionados sobre os Temas Transversais, todos os professores declararam conhece-los, sendo que a maioria os considera importantes, porém alguns 236 acreditam que apesar de tratar-se de algo bem elaborado na teoria, na prática os resultados podem não ser tão satisfatórios. Além disso, também se relata a questão de que nem sempre sobra tempo para que estes sejam aplicados nas aulas dos professores titulares: “Conheço um pouco, nada aprofundado. Acho que são ótimos temas para serem trabalhados na escola, só que como os professores sempre estão no limite para vencer a proposta seria uma ótima ideia que os professores eventuais, enquanto não estão lecionando, substituindo, preparem projetos com esses temas [...]”. Entre os pontos positivos de se atuar como eventual, os mais citados foram a possibilidade de se adquirir experiência quando ainda não se pode lecionar como titular e o contato com os alunos. Entre os pontos negativos foram colocados a falta de tempo para preparar as aulas, o desrespeito dos alunos e de alguns professores titulares, e a impossibilidade de dar continuidade ao conteúdo. Os episódios da carreira considerados marcantes pelos professores foram diversos, a maioria deles relacionados aos alunos, alguns positivos e outros negativos. Em um dos relatos, um professor falou sobre como se sentia quando atuava como professor eventual, apontando sua opinião em relação à realidade da escola: “É uma experiência de parar em algum momento e refletir muito, tem hora que dá vontade de largar tudo e tomar outro rumo, optar por outro serviço, não temos respaldo algum, é desanimador, os alunos não querem nada com nada, muita falta de respeito, falta de família presente na escola, principalmente nas reuniões, principalmente os pais que mais precisam referente aos seus filhos que não se adequam à responsabilidade com o comprometimento e a responsabilidade com os estudos”. 4.2 Levantamento da atuação dos professores eventuais A presença dos professores eventuais em sala de aula é uma realidade e compreendeu, na escola onde esse estudo foi realizado, em média 7,06% das aulas dadas no ano de 2011. No Ensino Fundamental a porcentagem de atuação desse profissional foi em média de 8,04% das aulas, com porcentagens que variaram de 3,83 a 14,8% das aulas. No Ensino Médio a atuação desse profissional foi um pouco menos requisitada, sendo em média 6,17% das aulas, com porcentagens que variaram de 4,39 a 9,70% das aulas. De forma geral os professores eventuais foram mais atuantes entre março e maio e entre agosto e outubro. 237 Figura 1. Atuação do professor eventual no ano letivo de 2011 – Ensino Fundamental Fonte: Dados da pesquisa. Autoria dos pesquisadores. Figura 2. Atuação do professor eventual no ano letivo de 2011 – Ensino Médio Fonte: Dados da pesquisa. Autoria dos pesquisadores. Os resultados encontrados representam muito bem a situação da escola no período de estudos; porém estamos cientes de que este estudo necessita de mais informações, de forma a representar as várias realidades, tanto do estado quanto do país. 4.3 Aulas baseadas nos Temas Transversais Foram elaborados 5 modelos de aulas para cada série, do 6º ano do ensino fundamental ao 3º ano do ensino médio, totalizando 35 aulas. As aulas foram 0 20 40 60 80 100 120 140 F ev Mar Abr Mai J un J ul Ago S et Out Nov Dez Meses A u la s /M ê s Total de Aulas /Mês Aulas E ventual 6º Ano Aulas E ventual 7º Ano Aulas E ventual 8º Ano Aulas E ventual 9º Ano 0 20 40 60 80 100 120 140 160 F ev Mar Abr Mai J un J ul Ago S et Out Nov Dez Meses A u la s /M ê s Total de Aulas /Mês Aulas E ventual Iº Ano Aulas E ventual II.º Ano Aulas E ventual IIIº Ano 238 organizadas em fichas, algumas das quais podem estar acompanhadas de anexos, e apresentam os seguintes itens: Tema Transversal, sub-tema, objetivo, conteúdos, metodologia e avaliação, conforme modelo da Tabela 1. Tabela 1. Modelo de ficha de aula Nome da Escola Série: 9º ano Tema Transversal: Ética Sub-Tema: Declaração Universal dos Direitos Humanos Objetivo: Comparar os dizeres da declaração universal dos direitos humanos com a realidade de nossa sociedade nos dias atuais Conteúdos: 1. Artigos da “Declaração Universal dos Direitos Humanos” Metodologia: 1. Ler os artigos junto com os alunos; 2. Orientar os alunos para que se dividam em 8 grupos de modo que cada grupo discuta um dos artigos e faça uma dissertação sobre ele, fazendo comparações entre o que é proposto e a realidade atual. 3. Terminadas as dissertações, cada grupo deve ler a sua. Avaliação: Os alunos serão avaliados durante a apresentação de suas dissertações. Fonte: Autoria dos próprios pesquisadores Procurou-se elaborar as aulas de modo que estas se tornassem diferenciadas em relação às aulas do dia-a-dia, abordando assuntos de interesse dos alunos e da comunidade de uma maneira dinâmica e crítica. A Tabela 2 apresenta as diferentes formas de composição das aulas. É importante salientar que as aulas que foram preparadas são apenas sugestões para que a escola de continuidade no projeto, de modo que a composição das aulas poderá variar de acordo com a realidade de cada sala de aula. 239 Tabela 2. Composição das aulas propostas Texto Dinâmica Exercício Multimídia E n si n o F u n d am en ta l 6° Ano x x x 7º Ano x x x 8º Ano x x x x 9º Ano x x x x E n si n o M éd io Iº Ano x x x x IIº Ano x x IIIº Ano x x x x Fonte: Autoria dos próprios pesquisadores. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho demonstrou que a atuação dos professores eventuais na escola onde foi realizado ocorre com certa frequência, e que na maioria das vezes esses profissionais não se encontram preparados, pelo fato de não saberem com antecedência para que série e disciplina irão lecionar. Tal resultado nos permitiu concluir que nossa proposta inicial, os temas transversais, pode contribuir para a melhor qualidade dessas aulas. Assim, propõe-se que, com base nas aulas já preparadas, não só os professores eventuais, mas também os titulares de cargo, deem continuidade nas ideias aqui apresentadas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ARANHA, W.L.A. Professores eventuais nas escolas estaduais paulistas: ajudantes de serviço geral da educação? 2007. 102f. Dissertação (Mestrado em Educação) Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2007. 240 2. ARAUJO, U. F. Temas Transversais e a Estratégia de Projetos. São Paulo: Moderna, 2003. 3. BASILIO, J. R. Professor Eventual: Bico e Desemprego na Escola Pública Paulista. In:VII SEMINÁRIO DO TRABALHO: TRABALHO, EDUCAÇÃO E SOCIABILIDADE, 2010, Marília. Anais...Marília, 2010. Disponível em:www.estudosdotrabalho.org/anais-vii-7-seminario-trabalho- ret2010/juliana_regina_basilio_professor_eventual_bico_e_desemprego_escola_pub lica_paulista.pdf. Acesso em 22 mar. 2011. 4. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: apresentação dos Temas Transversais: Ética.Brasília:MEC/SEF, 1997. 5. BRASIL. Lei deDiretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBN). Lei 9394/96. 6. GUESQUI, L. C. Formação e Condições de Professores Eventuais Atuantes na Rede Pública Estadual. 2008. In: 32ª REUNIÃO ANUAL DA ANPED. SOCIEDADE, CULTURA E EDUCAÇÃO: NOVAS REGULAÇÕES. Caxambu, 2009. Disponível em: www.anped.org.br/reunioes/32ra/arquivos/trabalhos/GT08-5304-- Int.pdf. Acesso em 17 mar. 2011. 7. PASSOS, C. L. B. Os Dilemas vividos pelos Professores Eventuais de Matemática. Revista de Educação PUC-Campinas, Campinas, n.18, p.53-59, 2005. 8. ZANARDI, G. S. Professor Eventual e Desprofissionalização da Carreira Docente. UNESP. Disponível em: <www.simposioestadopoliticas.ufu.br/imagens/anais/pdf/DC41.pdf> Acesso em: 02 abr. 2011.
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