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MATERIAL DIDÁTICO RELIGIÕES MUNDIAIS CREDENCIADA JUNTO AO MEC PELA PORTARIA Nº 1.282 DO DIA 26/10/2010 0800 283 8380 www.ucamprominas.com.br Impressão e Editoração 2 SUMÁRIO UNIDADE 1 – INTRODUÇÃO ................................................................................ 3 UNIDADE 2 – RELIGIÃO ....................................................................................... 5 2.1 O QUE É E PORQUE ESTUDAR RELIGIÃO ............................................................. 5 2.2 VÁRIOS OLHARES PARA A RELIGIÃO: DA SOCIOLOGIA À TEOLOGIA, DO PSICOLÓGICO AO ANTROPOLÓGICO .............................................................................................. 7 UNIDADE 3 – RELIGIÃO NO MUNDO ANTIGO ................................................. 14 3.1 O CRISTIANISMO NA ANTIGUIDADE ................................................................... 18 3.2 CULTURAS PAGÃS – A PLURALIDADE DESDE O TEMPO ANTIGO ............................ 23 UNIDADE 4 – RELIGIÕES COM BERÇO NO ORIENTE EXTREMO ................. 31 4.1 BUDISMO ...................................................................................................... 31 4.2 HINDUÍSMO ................................................................................................... 31 4.3 TAOÍSMO ...................................................................................................... 32 4.4 XINTOÍSMO.................................................................................................... 33 4.5 CONFUCIONISMO ........................................................................................... 34 UNIDADE 5 – RELIGIÕES COM BERÇO NO ORIENTE MÉDIO ....................... 36 5.1 A REGIÃO ...................................................................................................... 36 5.2 O JUDAISMO ................................................................................................. 36 5.3 O CRISTIANISMO ........................................................................................... 37 5.4 O ISLAMISMO ................................................................................................ 39 UNIDADE 6 – RELIGIÕES DE MATRIZES AFRICANAS E AFRO-BRASILEIRAS ............................................................................................................................. 41 UNIDADE 7 – OUTRAS RELIGIÕES .................................................................. 46 7.1 MEDIUNISMO E ANIMISMO ............................................................................... 46 7.2 ZOROASTRISMO ............................................................................................ 47 UNIDADE 8 – HIERARQUIA ECLESIÁSTICA .................................................... 49 UNIDADE 9 – O MUNDO É PLURAL .................................................................. 63 REFERÊNCIAS .................................................................................................... 66 3 UNIDADE 1 – INTRODUÇÃO Sabemos que a religiosidade é uma das nossas características peculiares. Até mesmo aqueles que se consideram ateus e agnósticos também tem suas justificativas e defesas para o serem, portanto, a religião nos lhes passa desapercebida. Dos primeiros símbolos que nos colocavam em contato com o ser supremo até os dias atuais muita coisa mudou e hoje desenvolvemos uma capacidade mais racional de analisar, refletir e respeitar as diversas crenças que existem ao longo do Planeta Terra. Segundo Domezi (2011), as tradições religiosas antigas estão muito vivas em nosso quotidiano. Basta que pousemos um olhar mais minucioso e analítico sobre a nossa sociedade para que elementos peculiares das religiões possam ser identificados. Uma primeira destas características é facilmente notada no culto aos mortos, pois o mistério inerente ao fim da vida é sem dúvida uma das maiores realidades que causam até hoje perplexidade nas pessoas. É em outras palavras o limite intransponível do ser humano nessa questão que o impulsiona a encontrar sentido para isso no “além”. Outra característica é o animismo que se resume em uma forma antiga de religião que acredita em uma força maior, uma energia sobrenatural que parte de alguém ou de algo que não o próprio crente. Algo que extrapola a realidade visível, mas que está presente em tudo e em todos. Não se pode também deixar de citar aqui, a crença em um “pai” comum e criador, a qual é observada em muitas culturas, e que na qual o ser humano sempre tem um tratamento especial no momento da criação, por meio do qual o criador modela o ser humano lhe conferindo alma, vida e pensamento. É interessante perceber por meio das narrativas de diversos povos que as ideias de justiça e bondade são inerentes ao criador sendo ele incorruptível, e desse modo, o mal só poderia surgir das criaturas. O que claramente pode ser visto em nossa sociedade de maioria cristã. 4 O xamanismo, vindo dos povos siberianos da Ásia Setentrional (portanto, muito antiga) é outra das características mais presentes em nossa sociedade. É uma filosofia de vida e visa o reencontro do homem com os ensinamentos e fluxos da natureza e com seu próprio mundo interior. Apesar de sermos um país multicultural, habitado praticamente desde a descoberta por povos vindos da África, pouco sabemos das religiões tribais que são de origem primitiva, nas quais suas tradições são transmitidas de maneira oral por meio de contos, mitos, rituais, festas e fábulas; todas contendo uma visão de mundo, linguagem e organização próprias. O que também pode de certa forma englobar quase que todas as outras religiões por estarem fundadas sobre o mesmo terreno. Enfim, são religiões que mantém certos princípios que norteiam muitas de nossas mais basilares leis como, por exemplo, o senso de comunidade e solidariedade, apreciação dos valores e critérios tradicionais, visão holística do mundo e das pessoas, inclusão de todos, harmonia entre tradição e progresso (DOMEZI, 2011). Ressaltamos em primeiro lugar que embora a escrita acadêmica tenha como premissa ser científica, baseada em normas e padrões da academia, fugiremos um pouco às regras para nos aproximarmos de vocês e para que os temas abordados cheguem de maneira clara e objetiva, mas não menos científicos. Em segundo lugar, deixamos claro que este módulo é uma compilação das ideias de vários autores, incluindo aqueles que consideramos clássicos, não se tratando, portanto, de uma redação original e tendo em vista o caráter didático da obra, não serão expressas opiniões pessoais. Ao final do módulo, além da lista de referências básicas, encontram-se outras que foram ora utilizadas, ora somente consultadas, mas que, de todo modo, podem servir para sanar lacunas que por ventura venham a surgir ao longo dos estudos. 5 UNIDADE 2 – RELIGIÃO 2.1 O que é e porque estudar religião Segundo Chiavenato (2002), foram os romanos os primeiros a usarem a palavra religião significando dever de fidelidade ao Estado ou religio, isto é, o cidadão romano devia comportar-se religiosamente – com lealdade ao Estado e às autoridades – e como no Império Romano, o Estado era religioso, a relação entre Estado e Religião aconteceu naturalmente. Cícero (106-46 a.C.) dizia que religião vem de relégere, voltar a ler, recordar. Para alguns teólogos, ele queria dizer que os homens diligentes “voltavam a ler” o que se referia ao culto aos deuses. Três séculos depois o escritor cristão Lactâncio (240-320) desenvolveu a ideia de religião como a identificação sentimental entre o homem e Deus, já pensando no Deus cristão, criador do mundo e de tudo que nele havia. Religio, como os romanos entenderam originariamente ou na interpretação de Lactâncio, passou a exprimir tanto a lealdade ao Estado – peloacatamento das leis, códigos morais, entre outros – como a identidade sentimental, a crença em um só Deus; nesse caso, cristão. Com mais frequência, afirma-se que a palavra religião vem do latim religare, que significa amarrar. Os cristãos geralmente preferem essa explicação. Lactâncio usou religare para afirmar que o homem “voltava a atar seus vínculos com Deus”. Mas é interessante observar que mesmo no contexto religioso, religare pode ter outro significado: “Religare religionibus bona alicujus”, pode ser traduzido como “Consagrar a alguma divindade os bens de outros” - o que é muito característico na luta entre o cristianismo e o paganismo a partir dos séculos III e IV. No entanto, Santo Agostinho (354-430) preferia como origem da palavra religião o reeligere, reeleger – os homens, depois da mensagem de Jesus Cristo, reelegeram o Deus cristão. Enfim, a palavra religio-religião sofreu variações de significado à medida que o Estado e a igreja cresciam e enfrentavam os acontecimentos históricos. Mas vamos tentar entender o que é religião? 6 Assim como a explicação para a origem da palavra religião muda de acordo com certos interesses, o conceito de religião também se modifica pelos tempos. A religião não pode ser entendida da mesma forma quando se trata das sociedades tribais, dos gregos, dos romanos, entre outros (CHIAVENATO, 2002). A pergunta o que é religião? tem de ser respondida levando-se em conta as características e as categorias religiosas de cada época. Esta pergunta não permite resposta genérica. Porque a religião não é a mesma em diferentes épocas e sociedades. Para os primeiros cristãos romanos, por exemplo, a religião era a fuga da vida real, o “ópio” que as livrava espiritualmente das coisas deste mundo. O cristianismo primitivo não continha em si nenhum componente filosófico, mas uma alienação específica, conformando o homem a sofrer resignadamente neste mundo, sem vontade política de modificá-lo. Na Idade Média, a religião adquiriu um conteúdo filosófico e teológico muito forte. Nesse período de quase mil anos, a religião ocupou o espaço político: a vida se fez em torno ou em relação aos conceitos religiosos. Os reis eram consagradas pela Igreja; os papas ditavam a moral e os costumes – quase sempre com exemplos nada dignificantes. A teologia condicionava a ciência, permitindo-lhe o progresso ou sufocando-a em dogmas e proibições absurdas. O cristianismo do Império Romano e o da Idade Média pouco tinham em comum. Se as características religiosas diferem em cada época, são diferentes também as suas formas de relação com o poder político e econômico. Se recuarmos à Palestina do tempo de Jesus, veremos que a religião representava as tendências políticas de cada classe, sem que isso implicasse participação ativa dentro do organismo do Estado. Nessas sociedades e nessas épocas, a religião é diferente em cada circunstância e em cada momento – e para cada classe. É preciso observar as diferenças para não incidir no erro de uma resposta genérica. Também é preciso cuidado para não tornar a crítica da religião um simples reducionismo. Destacar as condições socioeconômicas nas quais as religiões se desenvolveram – e o cristianismo em particular – não significa explicar o fenômeno religioso apenas 7 pela estrutura econômica. A religião não é só um meio que os grupos de poder usam para preservar sistemas políticos ou econômicos. Porém, a pergunta o que é religião?, apesar de complexa, pode ser respondida objetivamente em uma frase. Se cada momento exige uma interpretação e um entendimento específico, objetivamente, pode-se chegar a uma velha e tradicional resposta básica, que tem causado horror e satisfação há mais de cem anos: “religião é o ópio do povo”. Ao contrário do que parece, a afirmação de Marx não reduz a religião a nada: abre um leque espantoso de análise radical, em que a raiz é o próprio homem. Mas existem características radicalmente diversas de ser esse ópio do povo. 2.2 Vários olhares para a religião: da sociologia à Teologia, do psicológico ao antropológico Segundo Teixeira (2014), a peculiaridade do olhar sociológico sobre o fenômeno religioso consiste em trazer a questão para suas formas concretas de inserção no tempo. O fenômeno está aí, acontecendo em expressões efetivas. São representações e crenças, são ritos específicos que traduzem, como indica Emile Durkheim (sociólogo francês,1858-1917), um sistema de forças bem vivo. Esse sentimento não pode ser ilusório, pois esteve sempre acompanhando a dinâmica da humanidade: tem correspondência com algo no real. Trata-se de um sentimento demasiado geral e que traduz a presença no humano de uma força dinamogênica inusitada, que o ajuda a suportar as dificuldades da existência e também superá-las. Como pontua Durkheim, a religião tem como função ajudar a viver, suscitar um agir, tudo isso animado por um sentimento peculiar de poder que eleva o ser humano acima de suas potencialidades, auxiliando-o a fazer frente às provas do dia a dia. Ela é mais um sistema de forças que de ideias. Perceber e classificar as coisas como sagradas ou profanas faz com que as crenças religiosas sejam quase uma irmandade. Vejamos pela ótica de Durkheim: as coisas sagradas envolveriam um círculo de objetos de extensão infinitamente variável, tendo como peculiaridade uma percepção de dignidade 8 singular – e superioridade – com respeito às coisas profanas. O caráter sagrado, por sua vez, não é algo intrínseco a uma coisa reconhecida como sagrada, mas é um dado acrescentado. Quando se fala em força religiosa, o que está em jogo é um sentimento inspirado pela coletividade em seus membros e que vem projetado e objetivado. Resumindo: para Durkheim, a religião é parte essencial da vida social e como as representações religiosas são representações coletivas (Ritos) nesse sentido a religião é um produto do coletivo. Georg Simmel (sociólogo alemão, 1858-1918) também dá sua contribuição ao estudo, diferenciando de imediato em sua obra os conceitos de religiosidade e religião, postulando que se diferem pelo fato de que a Religião é criada pela Religiosidade e não o contrário. A Religiosidade seria uma “disposição de ânimo interior”, e a religião uma fase mais avançada, uma objetivação da fé. Karl Rahner (1904-1984), citado por Teixeira (2014), foi um dos grandes teólogos do século XX, dedicando-se a compreender os traços dessa “experiência transcendental” que, a seu ver, opera em todos os seres humanos, tendo também um papel fundamental no incentivo à abertura da igreja católica-romana às diversas tradições religiosas. Para ele, não há como desvencilhar-se desse dinamismo que atua na consciência subjetiva, como traço necessário e insuprimível, mesmo que ocorra de forma anônima ou atemática. Cada consciência subjetiva estaria assim animada por esse “caráter ilimitado de abertura”. Enquanto ser de transcendência, o ser humano está sempre, e antes de qualquer ato de liberdade, situado e orientado na atmosfera de um “mistério santo e absolutamente real”. É esse mistério, simultaneamente transcendente e familiar, o que existe “de mais evidente”, colocado sempre à disposição do humano. Segundo Rahner, esta experiência transcendental do sujeito vem marcada por universalidade, podendo ocorrer de forma atemática e mesmo “arreligiosa”, independente de uma experiência religiosa explícita. É uma experiência original, ontologicamente fundada. Ela acontece de fato onde quer que o sujeito atue de forma livre e profunda a sua existência. É algo que se disponibiliza para todos, e que pode ocorrer “até mesmo em formas e 9 conceituação que aparentemente nada têm de religioso” (RAHNER, 1989, p. 164). Ocorre quando o sujeito se vê defrontado, no âmbito de suas atividades cotidianas, com o “abismo de sua existência”, com a profundidade que escapaao burburinho tranquilo das coisas familiares (TEIXEIRA, 2014). Em discussões sobre perspectivas psicológicas sobre religião, enfrentamento e cura, Paiva (2007) pontua que o comportamento religioso é variado em sua significação. Em outras palavras, como as formas religiosas são históricas, a psicologia só se aplicará com competência a uma modalidade religiosa se apreender seu sentido. Numa cultura, por exemplo, em que saúde e doença são consideradas holisticamente extensões da relação com a divindade, como na antiguidade organizada ao redor da religião (VERGOTE, 2001), a cura só pode ser religiosa, pela definição dos termos. Por outro lado, numa cultura moderna, em que se reconhece a autonomia dos diversos segmentos da vida individual e social, a saúde e a doença não têm de passar pela definição religiosa ou, se o fazem, é num sentido bastante peculiar. Se tomarmos o caso do cristianismo, encontraremos entendimentos diversos dessa relação na antiguidade e na modernidade. O interessante é que subsistem em geral nas pessoas dimensões antigas e modernas, de modo que idealmente às vezes nos comportamos como pré-modernos, vendo por exemplo na saúde a bênção de Deus e na doença sua punição, e às vezes como modernos, vendo na saúde o resultado de feliz disposição genética, de recursos econômicos e de conhecimento para cuidar da higiene e da alimentação (PAIVA, 2007). Num viés mais metodológico, diz Teixeira (2014) que a abordagem psicológica da religião busca uma aproximação do fenômeno tendo em conta suas tensões e polarizações constitutivas. O objetivo proposto é o de observar a conduta dos sujeitos e das instituições, com particular atenção aos aspectos subjetivos. Como indicou com acerto Edênio Valle (1998 apud TEIXEIRA, 2014), ainda que reconhecendo os inúmeros desacordos que dividem os praticantes dessa disciplina, a aproximação psicológica ao fenômeno religioso guarda alguns traços importantes: 10 As definições deixam claro que as religiões reais – com seu peso institucional e sócio-histórico – e a religiosidade, sua face subjetiva, acontecem no jogo das múltiplas relações que se estabelecem entre o sujeito religioso, o grupo religioso ao qual se afilia e o universo das crenças e valores vigentes naquela dada sociedade, grupo ou época, considerados, inclusive, seus respectivos modelos civilizatórios e respectivos estágios de desenvolvimento tecnológico-científico e político- organizativo. Neste contexto de extraordinária complexidade, o psicólogo tenta chegar à opção vivencial e à realidade psicológica e humana dos indivíduos, assim como essa aparece em seu comportamento religioso (VALLE, 1998, p. 260 apud TEIXEIRA, 2014). O olhar psicológico, aninhado num ramo específico das ciências da religião, busca examinar os fenômenos e manifestações religiosas tendo em vista a polifonia de suas dimensões comportamentais. É, porém, um olhar que se encontra ainda em estágio de construção, mesmo com uma história que já soma quase cento e cinquenta anos. Esse caminho veio recentemente traçado por Jacob Belzen, da Universidade de Amsterdã, que sintetiza de forma muito feliz os passos até agora percorridos pela Psicologia da Religião. A forma como se concebeu ou se exerceu esse campo temático foi muito diversificada: ora se firmou a serviço do religioso, ou então a serviço da crítica à religião ou do conhecimento científico. Perspectivas que se vinculam a um dos três caminhos são recorrentes. Mas uma outra perspectiva, sublinhada por Belzen, vem também se firmando, e é bem sugestiva. Trata-se do caminho nomeado como “Parecerista” (do alemão Rezensentin). Para usar uma metáfora do mundo da música, esta perspectiva tem como foco principal a atenção desperta para os que praticam a música, no caso, os executantes da religião. E o autor justifica esta posição: “Os psicólogos da religião que exercem sua profissão como Pareceristas sobre uma religião ou comportamento religioso não se sentem chamados a escrever sobre religião em geral, mas sim sobre um comportamento religioso concreto” (BELZEN, 2013, p. 326-7). Esse modo de procedimento é distinto de certa concepção exteriorista ou neutra, bem vigente neste campo, que destaca o pesquisador do objeto de seu estudo em vista de uma maior cientificidade. Ao contrário, os que seguem a nova orientação estão bem cientes da importância de uma maior aproximação da religiosidade particular para uma interpretação correta das manifestações 11 subjetivas do exercício da religiosidade. Esta nova ocular vem assim recuperar a dimensão hermenêutica da Psicologia da Religião, instrumentando-a com novos atributos para conhecer o sujeito religioso tanto a partir de fora como de dentro de sua prática religiosa (TEIXEIRA, 2014). Por fim, no viés antropológico, ao iniciar estudos sobre a Antropologia da Religião, Oliveira (2012) nos apresenta dois textos que revelam o quanto as religiões significam para a humanidade. Vejamos: 1) À primeira vista, pode-se pensar que todos saibam o que significa a palavra religião e religioso. Talvez tal pressuposição esteja certa enquanto se refere às manifestações mais ostensivas. Mas quando se trata de precisar a essência da religião logo surgem dificuldades sem fim. Quem poderá fixar os limites entre o verdadeiramente religioso e o puramente cultural, folclórico ou social? [...]. Se compararmos o fenômeno religioso com o fenômeno social ou similar, podemos dizer que designamos a estrutura especial do homem definida por sistema de relações com os outros homens [...]. No fundo de toda a situação verdadeiramente religiosa, encontra-se a referência aos fundamentos últimos do homem: quanto à origem, quanto ao fim e quanto à profundidade. O problema religioso toca o homem em sua raiz ontológica. Não se trata de fenômeno superficial, mas implica a pessoa como um todo. Pode caracterizar-se o religioso como zona do sentido da pessoa. Em outras palavras, a religião tem a ver com o sentido último da pessoa, da história e do mundo (ZILLES, 2004, p. 5-6). 2) Para entender a condição humana nos seus aspectos mais profundos e misteriosos, nós certamente devemos levar em conta a religião. Esta ajuda a formar estruturas imaginativas e elementares sobre como nos orientamos ou deveríamos nos orientar no cosmos. A religião dá forma e ensaia no ritual nossos mais importantes laços, uns com os outros e com a natureza, e provê a lógica tanto ao porque destes laços serem importantes como ao o que significa estar comprometido com eles (NEVILLE, 2005, p. 37). Sendo uma realidade que toca o ser humano na essência de seu ser e de sua existência, ela não pode deixar de ser analisada no âmbito acadêmico como veremos adiante. Além disso, a religião tem uma relação toda especial com o ser 12 humano, bem diferente de outros fenômenos antropológicos. Ela, por exemplo, está na raiz de muitas normas e valores da nossa sociedade; influi na compreensão que os seres humanos têm de si mesmos e na identidade de muitos povos e nações. Para um número muito grande de pessoas, a religião oferece motivação para viver, ajuda a resolver problemas humanos sérios e dá respostas para muitas questões (LEMOS, p. 129-142). Somente por essa condição já poderíamos encerrar nossas considerações acerca de suas relações com a Antropologia, mas vamos caminhar só um pouco mais. Concordamos com Silva Junior (2005) ao inferir que ter um olhar antropológico para as relações humanas – dentre elas a religião – é mergulhar nestas relações como elas se dão nas suas diferenças culturais, históricas, econômicas, políticas e psicológicas e o fundamentalismo, “enquanto atitude daquele que confere caráter absoluto ao seu ponto e vista” (BOFF, 2002) que vem crescendo sobremaneira desde meados do século XX, nos faz atentar para a necessidade de buscar explicações da realidade mais concretas e pluralistase fugir um pouco a esse sentimento de saber dominante, característico do fundamentalismo. Nesse sentido, a Antropologia da Religião nos ajuda a compreender como o ser humano foi e continua sendo visto por ele mesmo e por uma das suas mais significativas e originais manifestações, a religião. Não se trata de fazer uma análise de cada uma das religiões, mesmo aquelas mais conhecidas. Na Antropologia da Religião, faz-se uma análise científica do fenômeno religioso, enquanto experiência antropológica, isto é, do ser humano (OLIVEIRA, 2012). Na análise das diversas visões antropológicas advindas das diferentes culturas e religiões há um esforço para se perceber a riqueza de cada uma delas, desfazendo preconceitos, reconstruindo nosso pensar, mesmo sem renunciar à necessária crítica. Pode-se, então, dizer que a Antropologia da Religião é uma antropologia da transcendência, no sentido que produz significados para além daquilo que se 13 dá no cotidiano. Não é apenas um retorno às tradições religiosas, mas a interpretação dessas, visando a percepção de novas realidades que vão surgindo dentro delas, a partir do seu contato com a modernidade e a pós-modernidade. O que se quer com a Antropologia da Religião não é tanto conhecer as causas e dar explicações para o fenômeno religioso, mas estudar e conhecer o sentido que a experiência religiosa confere às ações e situações do cotidiano. 14 UNIDADE 3 – RELIGIÃO NO MUNDO ANTIGO Voltando à nossa história da Teologia, entre os pré-socráticos, já surgiu um distanciamento da teologia mitológico-religiosa, voltando-se para uma teologia racional-filosófica: Xenófanes (século VI, a.C.) critica, duramente, o antropomorfismo da concepção de Deus. Em grandes linhas, podemos dizer que os pré- socráticos substituem o deus mítico pelo “deus dos filósofos” que é eterno, imutável e rege o mundo transcendente na imanência, como ser racional e espiritual; Platão (428-347 a.C.) e Aristóteles (384-322 a.C.) distanciam-se dos mitos da religião grega e dos poetas para inaugurar um enfoque verdadeiramente racional na questão de Deus; para Platão, a teologia é o discurso filosófico, purificado dos elementos míticos, sobre Deus; Aristóteles cita a filosofia teológica como filosofia primeira, entre as três ciências teóricas, ao lado da matemática e da física. Segundo ele, trata da causa primeira, do motor imóvel que tudo move sem ser movido e dos primeiros princípios não empíricos do ser e do pensamento (ZILLES, 2013). Mas, essa concepção de teologia cedo também encontrou objeções críticas por parte do ceticismo, sobretudo contra as provas da existência de Deus (deuses) e de seus atributos. Os epicureus rejeitam a teologia por razões pragmáticas e morais, pois veem nela o perigo do medo diante dos deuses, o qual conduz a uma vida inquieta e insegura, dificultando a ataraxia e a autarquia. A origem grega da palavra teologia pesa sobre seu destino histórico até hoje. Tanto a palavra quanto o conceito são, pois, uma criação típica do gênio filosófico grego em sua reflexão sobre o princípio último (arché) de todas as coisas, através do logos. A sua associação com a mitologia pagã explica a reserva inicial do cristianismo de apropriar-se do termo. 15 O cristianismo, baseando-se em São Paulo e em São João, primeiro tende a rejeitar e depois desenvolve, com os meios da própria filosofia grega, uma apologética (século II). Orígenes, invocando o cânon dos livros sagrados, entretanto já fixado, coloca os fundamentos de uma teologia cristã autônoma, indicando, como base de legitimação, a Escritura, a doutrina da Igreja e a razão. Foi, pois, entre os padres gregos, com Orígenes e Eusébio de Cesareia, que a palavra teologia passou a designar o discurso sobre o Deus de Jesus Cristo. Para Eusébio, os profetas do Antigo Testamento e os apóstolos do Novo Testamento são os verdadeiros teólogos. Clemente e Orígenes, pensadores da Escola de Alexandria, referem-se aos “antigos teólogos dos gregos” e aos “teólogos dos persas”, mas reclamam o título de “verdadeira teologia” para o discurso cristão. Para Clemente, Orfeu é teólogo, mas Moisés também. Com o historiador Eusébio de Cesareia (263-339), surge a teologia eclesiástica, sem associação com a religiosidade pagã. A palavra adquire sua acepção clássica na obra de Dionísio Areopagita (século V-VI), que distingue entre teologia apofática (negativa), catafática (afirmativa) e mística. Santo Agostinho (354-431) ainda prefere falar de “doutrina cristã” para referir-se ao conjunto dos mistérios cristãos, pois o uso do termo teologia, no Ocidente, demorou mais para ser introduzido. Os latinos preferiam outros termos como doctrina sacra, sacra scriptura, sacra pagina, entre outros. A teologia nasce no interior da fé. Por sua própria natureza, a fé aspira a ver, a compreender. No período do século IV ao VII, os padres assumiram as ideias fundamentais de Platão, do neoplatonismo, do estoicismo e da gnose, enquanto não contradizem a revelação. Assim, desenvolveu-se a doutrina da graça (Agostinho), da Trindade e da Cristologia. Depois de um longo intervalo de silêncio, Anselmo de Cantuária (1033-1109), a Escola de São Victor e Pedro Abelardo (1079-1142) desenvolveram uma teologia crítica da Igreja e da fé. Pedro Lombardo (1100-1160) reuniu seus resultados no Comentário das Sentenças, que se tornou o manual de teologia dogmática até a alta escolástica. A teologia chega a um ponto alto com os franciscanos Boaventura (1217-1274) e J. Duns Scotus (1266-1308) e com o aristotelismo assumido pelos dominicanos Alberto Magno (1193-1280) e Tomás de Aquino (1224-1274). 16 Continuando com as sábias e explicativas palavras de Zilles, na patrística, a catequese em preparação à iniciação cristã exigia que se interpretassem e comentassem os textos canônicos (como testemunhos normativos) às pessoas ainda não iniciadas na fé cristã. Por isso, cedo surgiu a questão dos sentidos da Escritura. E quando pagãos atacam o cristianismo, os padres saem em sua defesa (apologética). Defendem sua moralidade e, a partir de Justino, teólogo leigo, também sua racionalidade passa a ocupar, cada vez mais, um lugar central, como já é o caso do Contra Celso, de Orígenes (185-253). À teologia atribui-se a função de defender a coerência e a credibilidade do cristianismo perante as razões religiosas e filosóficas do paganismo. Para isso, a fé cristã é traduzida para dentro da cultura e linguagem filosóficas do helenismo. A exegese e a catequese expressam-se em linguagem, elaborando conceitos, buscando as razões do cristianismo, como exigências internas da própria fé. Passa a distinguir-se entre fé e conhecimento (gnosis), entre sabedoria e conhecimento, para responder às exigências intelectuais do próprio crente. Assim, aos poucos, a teologia se organiza como esforço da inteligência especulativa. Dependendo das fontes escriturísticas, tratadas pela exegese, surge uma nova organização, uma nova armadura intelectual (a teologia), em busca de uma autocompreensão especulativa da fé, forjando uma linguagem oficial da Igreja. Desse modo, ao introduzir termos não bíblicos (consubstancial) na profissão de fé pública, o Concílio de Niceia (325) já provou que o trabalho teológico é importante na Igreja. Tornou-se clássica a formulação condensada de Santo Anselmo de Cantuária com a qual quis intitular a obra que, mais tarde, chamaria Proslogion: fides quaerens intellectum. Anselmo propõe-se a tarefa de “crer para compreender” e “compreender para amar”. Segundo essa definição, a teologia vive do esforço do crente por pensar e exprimir a própria fé, com todos os recursos da razão. Segundo Anselmo, é a fé que procura, é a fé que busca a inteligência. A fé é o ponto de partida da pesquisa filosófica na teologia. Para os medievais, a teologia é, pois, a interpretação racionalda revelação de Deus, aceita na fé. Quem crê, ou seja, aceita a revelação de Deus, é um ser racional e, por isso, a fé já implica atividade racional 17 e o crente naturalmente procura compreender e penetrar o significado da palavra divina. Esse intellectus fidei, na sua modalidade mais elaborada, é a teologia. A ligação da teologia à fé e à revelação divina distingue-a de qualquer filosofia e ciência da religião. Ela emerge do “mundo da fé”, embora este seja mais amplo e mais rico que o “mundo da teologia”. A teologia não dispensa nem supera a fé e, muito menos, elimina os mistérios. A ciência da religião reflete sobre o fenômeno cultural da religião em geral ou duma religião particular, sem ter, necessariamente, um compromisso com a fé. O ponto de partida da teologia cristã é a revelação que Deus fez de si mesmo, ao longo da história de Israel, história que culmina em Jesus Cristo, a palavra feita carne (Jo 1,14. São João diz: “E o Verbo se fez carne e armou tenda entre nós; vimos a sua glória, a glória de Unigênito do Pai, cheio de graça e verdade”.). A revelação judaico-cristã tem a caraterística específica de ser, ao mesmo tempo e de maneira inseparável, palavra e história. Deus não se limita a escrever um livro, pois também se manifesta nos acontecimentos da história. Por isso, equivocam-se aqueles que consideram a revelação um simples “corpo de verdades doutrinais”, pois ela é, antes de tudo, a “automanifestação” de Deus, na história da salvação, que se consuma em Jesus Cristo. Ora, a revelação, enquanto Palavra de Deus na palavra humana, é inseparável de um testemunho humano e, portanto, não há revelação sem teologia. A linguagem da revelação já é um meio interpretativo, baseado no diálogo vivo de Deus com o homem. Por outro lado, a teologia não é apenas uma exigência da revelação, mas já se encontra, potencialmente, na fé de todo o crente. A fé, como resposta à Palavra de Deus, é também conhecimento, de acordo com as exigências próprias de um espírito humano, historicamente condicionado. A fé busca uma compreensão sempre mais completa da Palavra de Deus. Todo crente que reflete sobre sua fé, em função da cultura de uma época, já é um teólogo, ao menos em sentido amplo. A teologia, certamente, não é ciência no sentido moderno. Entretanto, não se lhe pode negar certa categoria científica, sobretudo, quando se trata de disciplinas como exegese, história das doutrinas e das instituições, história eclesiástica, entre outras. Também a teologia especulativa, que pretende mostrar 18 a lógica interna da fé e proporcionar uma compreensão mais perfeita dos mistérios cristãos, utiliza todos os recursos da razão filosófica. Quando Tomás de Aquino e muitos outros medievais afirmam o caráter científico da teologia, este tem um significado histórico mais restrito, resultante da aplicação do conceito aristotélico de ciência, o que encerra o risco, evitado pelo Aquinate mas não por muitos de seus seguidores, de reduzir a teologia a uma teologia de conclusões. A teologia é elaborada pela razão do crente – credo ut intelligam, pois o teólogo é um crente que reflete, criticamente, sobre sua fé. Enfim, a teologia é o esforço humano por compreender melhor a Revelação, que é histórica e é transmitida pela Igreja em atos históricos. Ela se realiza em sucessão histórica, implicando sempre, e essencialmente, um momento transcendental. Ela compromete o testemunho de seu autor enquanto se apresenta como apelo e tarefa, e não simplesmente como doutrina a conhecer (ZILLES, 2013). 3.1 O cristianismo na antiguidade De maneira geral, por cristianismo antigo entende-se o cristianismo dos quatro primeiros séculos da Era Cristã, cujo período vai desde o nascimento da Igreja, no evento Pentecostes (cf. At 2), em que os discípulos de Jesus Cristo receberam o Espírito Santo para anunciar o seu Evangelho (c. 30 d.C.) até a queda do Império Romano do Ocidente (476 d.C.). Esse período de quatro séculos e meio é dividido, por sua vez, em duas grandes etapas: da pregação apostólica (c. 30 d.C.) à “guinada constantiniana” (313 d.C.) ou até o Concílio de Niceia (325) e daí até a queda de Roma (476 d.C.) (OSA, 2014). A maioria dos discípulos e discípulas de Jesus era constituída de judeus. A primeira expansão do cristianismo deu-se nesse ambiente, a língua, costumes, tradições, práticas judaicas foram reinterpretadas à luz da mensagem de Jesus. Desde o século II a.C., os judeus encontravam-se espalhados pelo mundo helenizado (diáspora). Em Antioquia, capital da província da Síria, os seguidores de Cristo foram, pela primeira vez, chamados “cristãos” (cf. At 11, 26). A partir das sinagogas e comunidades judaicas helenizadas, expandiu-se o cristianismo fora do contexto judaico tradicional. Por fim, o cristianismo expandiu-se até Roma, 19 alcançando as fronteiras do Império Romano, no contexto do mundo gentio ou pagão. O mundo no qual o cristianismo antigo se expandiu, apesar de sinais de decadência, era um mundo vigoroso. No século I da era cristã, a civilização romana, herdeira da civilização helenística, tinha alcançado sua plena expansão. É o período do império de Augusto (30 a.C.) e Tibério (14-37d.C.). Roma estende seu domínio civilizador, com a pax augusta, uma paz militarizada, aos confins do Oriente. No século II, com os imperadores Antoninos, ainda temos a ordem, o direito e uma administração eficaz, dentro de um Estado relativamente liberal. Mesmo com a grande crise do século III, sob Diocleciano (284-305), sua história ganha um novo impulso: em seu governo instaura-se uma monarquia absoluta, apoiada em um poderoso aparelho administrativo (OSA, 2014). Muitas culturas, muitos povos, muitos deuses. O Império romano tinha grande tolerância pela religião dos povos dominados. Tinham até em Roma um “panteão”, um templo para todas as divindades do Império. Os romanos exigiam apenas que se observasse o culto imperial, de caráter cívico, com suas cerimônias públicas, das quais todos os cidadãos do Império deveriam participar, para oferecer sacrifícios e rezar pelo Imperador: dominus ac divus (senhor e deus). A religião oficial era a base da unidade imperial. Atentar contra ela era crime. Os cristãos, ao afirmarem que seu único Senhor era o Cristo, passaram a ser considerados suspeitos, estranhos e inimigos do Estado. Num mundo marcado por muitas inseguranças, miséria, opressão e escravidão, proliferavam muitas religiões vindas do Oriente e que se tornaram muito populares. Eram os cultos de Hórus, Ísis e Osíris (Egito); Mitra (Pérsia); Asclépio e Esculápio estavam entre os deuses “salvadores” mais populares. Essas religiões tinham um caráter iniciático: exigiam conversão ou uma passagem, um novo nascimento, um período de iniciação nos “mistérios” e uma cerimônia de iniciação. Os “iniciados” ingressavam na “fraternidade”, tornavam-se irmãos, associados à divindade, sua vida ganhava um novo sentido, era-lhes prometida a eternidade. O Império tratava-as como superstitio, religio nova, e considerava-as ilícitas. O cristianismo foi classificado como uma dessas religiões. 20 Os filósofos consideravam o politeísmo uma “alegoria” das realidades superiores, que eles tinham superado através do exercício da ascese e da razão, em busca da verdadeira doutrina ou filosofia. Muitos sistemas filosóficos procuravam responder às grandes questões das origens e finalidade do universo, de todas as coisas, dos problemas ligados ao homem e suas relações na polis e com o mundo divino, do significado da justiça, da felicidade, da imortalidade. Normalmente postulavam a existência de um Deus, princípio ou causa transcendente, com um mundo superior, imaterial. Não poucas pessoas vindas desse universo cultural buscarão a “verdadeira filosofia”, que encontrarão no cristianismo. Nesse universo plural, despertou no século I um movimentode caráter sincrético, que amalgamou elementos de muitas tradições culturais, religiosas e filosóficas. Era o gnosticismo: através da gnose, um conhecimento superior, revelado aos capazes desse conhecimento, os gnósticos, o homem podia conhecer os mistérios do mundo divino e salvar-se. No século II e III há uma explosão de seitas e grupos gnósticos, existentes tanto entre os pagãos, como entre os judeus e cristãos. Jesus anunciou e inaugurou a Boa Nova do Reino num contexto plural. Sua mensagem difundiu-se num mundo plural. Sua mensagem e sua pessoa, sua vida foram transmitidas, primeiramente, numa mentalidade semítica, tendo depois de buscar uma linguagem helenizada para se fazer compreender e daí, sucessivamente, germânica, céltica, entre outras. É natural que houvesse diferentes interpretações de sua pessoa e sua obra. Já no Novo Testamento encontramos várias “teologias” e advertências contra os anticristos, falsos profetas. Dentre as primeiras “escolhas” parciais (“heresias”), que não davam conta de compreender corretamente Jesus Cristo e sua mensagem ou que extrapolavam seu conteúdo, encontramos os docetas (Jesus tinha “aparência” de homem, negavam portanto sua “humanidade”) e os ebionitas (era o Messias, um homem vindo de Deus, mas não o Filho de Deus, negavam sua “divindade”). Em torno dessas duas verdades proclamadas e da maneira de viver e praticar a mensagem de Jesus, surgiram, nos três primeiros séculos, muitas heresias e dissensões ou cismas: gnosticismo (vários ramos), montanismo, milenarismo, 21 subordinacionismo, adocionismo, modalismo, maniqueísmo, entre tantas outras (OSA, 2014). Para enfrentar esses desafios, já no final do século II e durante todo o século III, as Igrejas realizam reuniões com seus dirigentes para buscar resolver os problemas e encontrar a unidade nas coisas essenciais. São os sínodos ou concílios. Nesse sentido, o encontro ocorrido em Jerusalém, por volta do ano 49 d.C., é considerado, simbolicamente, o primeiro concílio do cristianismo. Esses concílios tratavam de questões doutrinais e questões da vida prática. No final, davam determinações sobre os aspectos tratados, através dos cânones dogmáticos e disciplinares, com uma “carta sinodal” a ser enviada às Igrejas irmãs. Baseado nessa feliz experiência, o Imperador Constantino convocou, em 325, o 1º Concílio Ecumênico, para enfrentar o problema do Arianismo. Na busca de compreender o Cristo e sua mensagem, a salvação, o significado da Igreja, dando respostas às heresias e dissensões, aprofundando a fé cristã, desenvolve-se a teologia cristã. Nesse sentido, o processo de elaboração da doutrina cristã usou dos recursos culturais da civilização greco- romana: a língua grega e latina, a retórica, a filosofia, o direito, práticas, costumes, instituições. A esse apropriar-se da cultura, utilizando o que ela tem de melhor para expressar a mensagem de Cristo, desde dentro, comumente chama- se inculturação. Esse fenômeno foi uma característica constante da expansão cristã. A próxima etapa dar-se-á no mundo germânico. Durante os três primeiros séculos da era cristã, o cristianismo foi perseguido, primeiro pelos judeus e depois pelos romanos. Até o incêndio de Roma, sob o governo de Nero (c. 64), os cristãos praticamente passaram despercebidos, confundidos com uma seita do judaísmo, que gozava de certa liberdade e alguns privilégios. Possivelmente tenham sido os judeus a denunciarem a Nero os cristãos como causadores do incêndio. Somaram-se a isso os preconceitos populares, que viam os cristãos como gente que odiava o gênero humano, ateus, ímpios, sacrílegos e acusados de praticarem abominações e infâmias. Na verdade, os cristãos não eram “separatistas”, mas não seguiam os costumes idolátricos e pagãos, como certas 22 festas públicas, a frequência ao teatro, não aprovavam a luta de gladiadores, a prostituição, adoração de estátuas ou a divinização do imperador. Corriam no meio do povo boatos de que, em suas reuniões secretas, os cristãos adorariam a cabeça de um asno, com sacrifício de crianças, seguido de canibalismo, com uniões incestuosas e orgias (todos se chamavam “irmãos” e praticavam o “ósculo da paz”!) (OSA, 2014). Os intelectuais e as autoridades classificavam a religião dos cristãos como superstitio, sendo posteriormente condenada pelo Estado como associatioillicita, religio nova ereligioillicita, por atentar contra a unidade e a sacralidade do Império. A legislação evoluiu, no primeiro século, de certa tolerância com o fato de ser cristão até a condenação pelo simples fato de ser cristão. Ser cristão acabava sendo um crime de lesa majestade. As perseguições dos dois primeiros séculos foram esporádicas, locais ou regionais, intermitentes, motivadas por denúncias ou ações pontuais. Já as perseguições do terceiro século e início do quarto foram desencadeadas pela autoridade imperial, através de decretos, de caráter geral, com o objetivo de exterminar o cristianismo. Na primeira fase aconteciam por incitamento popular, submetidas posteriormente à apreciação dos magistrados. As autoridades visavam controlar a fúria popular e as desordens públicas. No entanto, o cristianismo já era considerado ilegal. Mas ainda são de caráter intermitente, seguindo-se longos períodos de tolerância e de paz. Com Sétimo Severo, em 202, inicia-se uma nova prática: em certas ocasiões, a própria autoridade promove as perseguições. Neste momento, o alvo são os catecúmenos (os que se preparavam para o batismo), os neófitos (os recém-batizados) e os catequistas (que os preparavam). O objetivo era impedir que alguém se tornasse cristão (OSA, 2014). Em meados do século III, iniciam-se as perseguições sistemáticas, com o objetivo de exterminar efetivamente o cristianismo. Décio foi o primeiro a decretar uma perseguição geral (250-251). Apesar de curta, atingiu tal intensidade e extensão nunca dantes vistas. O objetivo, mais do que fazer mártires, era fazer 23 apóstatas. De fato, muitos sucumbiram e traíram sua fé ou comunidade (os lapsi), abrindo-se um problema no interior da Igreja. Em 257, Valeriano desencadeou nova perseguição: visava principalmente o clero e as propriedades da Igreja, mas também afetava o povo, com uma série de interdições que colocavam em risco sua segurança, confisco de bens, exílio, prisões. A última perseguição violenta foi a de Diocleciano (303-313). Calcula-se que o número de mártires variasse entre cem e duzentos mil. De toda forma, ao longo de todo este período, os cristãos viveram em permanente insegurança e sofreram hostilidades por parte do povo. Em 313, os imperadores Licínio e Constantino assinaram conjuntamente um documento, o Edito de Milão, que concedeu liberdade de culto aos cristãos e a outras religiões. Chegava ao fim a era da perseguição aos cristãos. Iniciava-se uma nova etapa, denominada por alguns historiadores como a guinada ou virada constantiniana (MATOS, 1997; PIERINI, 1998; MONDONI, 2014). Constantino concedeu aos cristãos, além da liberdade de culto, uma série de isenções e privilégios, dando terras, propriedades, prestígio e poder à Igreja Católica. Em 380, o imperador Teodósio transforma o cristianismo em religião oficial do Império Romano: é a fase da “Igreja Imperial” ou “Era de Ouro da Patrística”. Nessa nova etapa, reformula-se o catecumenato; desenvolve-se a liturgia e a disciplina eclesiástica; a teologia patrística chega ao seu ápice; é também o período de grandes cismas e heresias; os dogmas cristológicos e trinitários alcançam sua formulação mais plena; aprimora-se a organização da Igreja no território do Império, com as dioceses, paróquias e patriarcados; surge a vida religiosa, com o monacato; há um novo surto missionário em direção aos povos “bárbaros”. É a época dos concílios ecumênicos: Niceia (325), Constantinopla I (381); Éfeso (431) e Calcedônia(451) (OSA, 2014). 3.2 Culturas pagãs – a pluralidade desde o tempo antigo Mesmo que em poucas linhas, precisamos falar das culturas pagãs, afinal de contas, como poderemos concluir ao final do tópico, desde os tempos antigos, 24 a pluralidade já se fazia presente e, digamos, coerente e aceita por aqueles povos. Quem nos conta essa parte da história são os doutores Packer, Tenney e White Jr (2002), cujo livro intitulado “O mundo do Antigo Testamento” encontra-se disponível para download em site que colocamos nas referências. Os israelitas dos tempos do Antigo Testamento entraram em contato com cananeus, egípcios, babilônios e outros povos que adoravam deuses falsos. Deus advertiu o seu povo a que não imitasse seus vizinhos pagãos, mas os israelitas lhe desobedeceram. Repetidas vezes descambaram para o paganismo. Estudar as culturas pagãs nos leva a compreender que houve um tempo em que o homem tentou responder às perguntas supremas da vida antes de encontrar a luz da verdade divina. Também, chegamos a entender o mundo em que Israel vivia — um mundo do qual a nação foi chamada para ser radicalmente diferente, tanto no terreno étnico como no ideológico. Os autores advertem algumas precações ao proceder a esta leitura e estudo por alguns motivos como estarmos a mais de dois mil anos daquela cultura e ainda não termos evidências suficientes para comprovar cientificamente e totalmente a sua história. Outro motivo é o reconhecimento de que vivemos, cada dia mais, numa sociedade pluralista na qual cada pessoa é livre para crer ou descrer, conforme preferir. No entanto, os povos antigos achavam necessário ter algum tipo de religião. Um agnóstico ou “livre-pensador” teria passado por maus momentos entre os egípcios, os gregos e os romanos. A religião estava por toda a parte. Era o âmago da sociedade antiga. O indivíduo adorava as divindades de seu vilarejo, cidade ou civilização. Se ele se mudava para uma nova casa ou viajava por um país estrangeiro, o dever obrigava-o a mostrar respeito pelas divindades do lugar. Alguns aspectos eram comuns entre as religiões pagãs, como, por exemplo, todas elas participavam da mesma visão do mundo, que se centrava na localidade e seu prestígio. As diferenças entre as religiões dos sumérios e dos assírio-babilônios ou entre as religiões dos gregos e dos romanos eram muito pequenas. 25 Eram muitos os deuses! Em sua maioria, essas religiões eram politeístas, o que significa que reconheciam muitos deuses e demônios. Uma vez admitido ao panteão (coleção de divindades de uma cultura), o deus não poderia ser dele eliminado. Ele havia ganho “estatura divina”. Cada cultura herdava ideias religiosas de seus predecessores ou as adquiria na guerra. Por exemplo, o que Nanna (deus da Lua) era para os sumérios, Sin era para os babilônios. O que Inanna (deusa da fertilidade e rainha do céu) era para os sumérios, Ishtar era para os babilônios. Os romanos simplesmente assumiram os deuses gregos e lhes deram nomes romanos. Assim, para os romanos, Júpiter era igual a Zeus, deus do firmamento; Minerva equivalia à Atena como deusa da sabedoria: Netuno correspondia a Posêidon como deus do mar; e assim por diante. Em outras palavras, a ideia que se tinha do deus era a mesma; apenas o invólucro cultural era diferente. Assim, uma cultura antiga podia absorver a religião de outra sem mudar a marcha nem interromper o passo. Cada cultura não só reivindicava os deuses de uma civilização anterior, reclamava como seus os mitos da outra, introduzindo apenas mudanças insignificantes. Os principais deuses, muitas vezes estavam associados a algum fenômeno natural. Assim. Utu/Shamash é a um tempo o Sol e o deus do Sol; Enki/Ea é tanto o mar como o deus do mar; Nanna/Sin é a Lua e também o deus da Lua. As culturas pagãs não faziam distinção alguma entre um elemento da natureza e a força por trás desse elemento. O homem antigo lutava contra as forças naturais que ele não podia controlar, forças que poderiam ser ou benéficas ou malévolas. Chuva em quantidade suficiente garantia uma safra abundante, mas chuva em demasia destruiria essa colheita. A vida era de todo imprevisível, especialmente levando-se em conta que os deuses eram considerados como caprichosos e excêntricos, capazes de fazer o bem ou o mal. Os seres humanos e os deuses participavam do mesmo tipo de vida; os deuses tinham a mesma sorte de problemas e frustrações que os seres humanos. Este conceito chama-se marasmo. Desse modo, quando o Salmo 19:1 diz: “Os céus proclamam a glória de Deus e o armamento anuncia as obras das suas mãos”, ele zomba das crenças 26 dos egípcios e dos babilônios. Esses povos pagãos não podiam imaginar que o Universo cumprisse um plano divino total. Os egípcios também associavam seus deuses a fenômenos da natureza: Shu (ar), Rê/Hórus (Sol), Khonsu (Lua), Nut (firmamento), e assim por diante. A mesma tendência aparece na adoração hitita de Wurusemu (deusa do Sol), Taru (tempestade), Telipinu (vegetação), e diversos deuses de montanha. Entre os cananeus, El era o sumo deus do céu, Baal era o deus da tempestade, Yam era o deus do mar, e Shemesh e Yareah eram os deuses do Sol e da Lua respectivamente. Por causa dessa desnorteante linha de divindades da natureza, o pagão jamais poderia falar de um “universo”. Ele não fazia ideia de uma força central que a tudo une, e pela qual todas as coisas existem. O pagão acreditava viver num “multiverso”. Outro traço comum da religião pagã era a iconografia religiosa ou adoração de imagens (fabricação de imagens ou totens para adoração). Todas essas religiões adoravam ídolos: só Israel era oficialmente anicônica (isto é, não tinha imagens, não tinha nenhuma representação pictórica de Deus). O segundo mandamento proibia imagens de Jeová, como os bezerros de Arão e de Jeroboão (Êxodo 32: 1 Reis 12:26ss.). Mas religião anicônica nem sempre era a história toda. Os israelitas adoraram ídolos pagãos enquanto na escravidão do Egito (Josué 24:14), e muito embora Deus banisse seus ídolos (Êxodo 20:1-5), os moabitas induziram-nos de novo à idolatria (Números 25:1-2). Idolatria foi a mina dos diligentes de Israel em diferentes períodos de sua história, e Deus finalmente permitiu que a nação fosse denotada “por causa dos seus sacrifícios” a ídolos pagãos (Oséias 4:19). A maioria das religiões pagãs retratava seus deuses de maneira antropomórfica (isto é, como seres humanos). Na verdade, só um perito pode olhar para um retrato de deuses e de mortais babilônios e dizer quem é quem. Os altistas egípcios comumente representavam seus deuses como homens ou mulheres com cabeças de animais. Horus era um homem com cabeça de falcão: Sekhmet era uma mulher com cabeça de leoa; Anúbis era um chacal. Hator uma vaca e assim por diante. Os deuses hititas podem ser reconhecidos por algum outro objeto distintivo, como um capacete com um par de chifres. Os deuses 27 gregos também eram retratados como humanos, mas sem as berrantes características das divindades semíticas. Outra característica desses povos pagãos passava pelo sentimento de autossalvação. E a explicação da importância da representação dos deuses como seres humanos vem de Gênesis. Os capítulos iniciais do Gênesis dizem que Deus criou o homem à sua imagem (Gênesis 1:27), mas os pagãos tentaram fazer deuses à sua própria imagem. Quer dizer, os deuses pagãos eram meramente seres humanos ampliados. Os mitos do mundo antigo diziam que os deuses tinham as mesmas necessidades que os seres humanos, as mesmas fraquezas e as mesmas imperfeições. Se houvesse diferença entre os deuses pagãos e os homens, era só de grau. Os deuses eram seres humanos feitos “maiores do que a vida”. Com frequência eram projeções da cidade ou da comuna. Por fim, a característica do sacrifício! A maioria das religiões pagãs sacrificava animaispara acalmar seus deuses, e algumas até sacrificavam seres humanos. Visto como os adoradores pagãos criam que seus deuses possuíam desejos humanos, eles também ofereciam aos deuses ofertas de alimento e de bebida (cf. Isaías 57:5-6: Jeremias 7:18). Os cananeus acreditavam que os sacrifícios possuíam poderes mágicos que levavam o adorador a cair nas graças e no ritmo do mundo físico. Contudo, os deuses eram caprichosos, e por isso os adoradores às vezes ofereciam sacrifícios para garantir vitória sobre os inimigos (cf. 2 Reis 3:26-27). Talvez seja por isso que os reis decadentes de Israel e de Judá consentiam nos sacrifícios pagãos (cf. 1 Reis 21:25-26; 2 Reis 16:13). Desejavam obter ajuda mágica no combate aos babilônios e aos assírios — de preferência a ajuda dos mesmos deuses que haviam dado vitória aos seus inimigos. As religiões politeístas antigas operavam em dois níveis: a religião oficial do estado religioso arcaico e a religião popular, pouco mais que superstição. Vale saber que cada sistema religioso antigo tinha um deus principal, mais poderoso do que os restantes. Para os egípcios, este podia ser Rê (ou Rá), Horus ou Osíris; para os sumários e acadianos, podia ser Enlil, Enki/Ea, ou 28 Marduque; para os cananeus, seria El; para os gregos, Zeus. Na maioria dos casos, os pagãos edificavam templos e elaboravam liturgias que eram recitadas em honra desses sumos deuses. Em geral, o rei presidia a essa adoração, atuando como representante do deus numa refeição ritual, num casamento ou num combate. Essa era a religião oficial. Os deuses da religião oficial estavam por demais afastados do homem local para que tivessem algum valor prático. O Egito antigo dividia-se em distritos chamados nomes. Nos primeiros tempos do Egito havia 22 destes no Alto Egito (a região Sul) e vinte na área do delta ao Norte. Cada nome tinha uma cidade-chave ou capital e um deus local que era cultuado nesse território. Igualmente na Mesopotâmia, cada cidade era consagrada a um deus ou deusa. No Oriente Próximo antigo, a religião oficial era orientada para o estado, enquanto a religião popular era orientada para a localidade geográfica. O homem antigo não via incompatibilidade entre crer em deuses “lá do alto” e “cá de baixo” — todos competindo por sua atenção e sujeição ou prestação de serviços. Este era o reconhecimento parcial do problema último da imanência e da transcendência. Eis que os antigos começaram a afastar-se da superstição pura e deificaram vários ideais abstratos sob os nomes de deuses antigos. Na Mesopotâmia, “Justiça” e “Retidão” aparecem como divindades menores no cortejo de Utu/Shamash, o deus do Sol; eram chamadas Nig-gina e Nig-sisa, respectivamente. O “chefe” delas era Shamash, o deus mesopotâmio da lei. Os pensadores antigos imaginavam essas ideias abstratas como deuses, de preferência a tratar com as próprias ideias. Os egípcios, mais do que ninguém, fizeram isso. Alguns dos principais deuses egípcios enquadram-se nesta categoria, como por exemplo Atum, que expressa o conceito de universalidade. O nome Amon significa “escondido” — os egípcios pensavam que ele era um deus sem forma, invisível, que podia estar em qualquer parte e qualquer pessoa podia adorá-lo. Por esse motivo, mais tarde eles enxertaram a ideia de Amon em Rê, e o deus passou a ser Amen-Rê, “o rei 29 da eternidade e guarda dos mortos”. Os templos mais maciços da história egípcia foram construídos em honra de Amen-Rê em Camaque. A deusa Maat era outra ideia que se tornou deus entre os egípcios. Supunha-se que ela personificava a verdade e a justiça e era a força cósmica da harmonia e da estabilidade. Os cananeus representavam a verdade e a justiça mediante os deuses Sedeque e Mishor, que deviam estar sob as ordens do deus She-mesh. Todavia, muito embora os pensadores pagãos pudessem lidar mais facilmente desse modo com essas ideias, poucos dos deuses estiveram à altura dos ideais dos pensadores, segundo a lenda. A religião dos cananeus deu continuação ao antigo desejo de harmonia sexual com a natureza, o que estimulava especialmente os rituais obscenos. A verdade é que na antiguidade, as religiões pagãs da Mesopotâmia nunca saíram de seu molde politeísta. W. W. Hallo (1971 apud PACKER, TENNEY e WHITE Jr, 2002), estudioso das religiões antigas, fala da “antipatia intransponível com relação a um monoteísmo exclusivo” da parte dos mesopotâmios. A mesma coisa pode se dizer de outros povos da antiguidade: persas, cananeus, gregos e romanos. O Egito, também politeísta, foi exceção em sua décima oitava dinastia. O faraó Amenotepe (Amenófis) IV (1387-1366 a.C.) proscreveu a adoração de todos os deuses, exceto Aton (o “disco solar”), e depois mudou seu próprio nome para Akhnaton. Antes de Akhinaton, as divindades egípcias muitas vezes se haviam fundido ou ligado com um único deus-conceito (geralmente Rê): isto, porém, não é monoteísmo. Mas os egípcios chamavam o deus Aton de “único deus, que não tem outro igual”. Isso tinha efeitos políticos de longo alcance e não poderia ter sido realizado sem o apoio do exército e dos sacerdotes. Mas a religião de Akhinaton estava longe de dizer: “Ouve. Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor” (Deuteronômio 6:4). A “reforma” de Aklinaton foi, contudo, de curta duração, e seus sucessores purgaram o Egito dessa “heresia”. O antigo sacerdócio político voltou ao poder e deu apoio ao seu próprio faraó. No mundo antigo, só Israel era totalmente monoteísta. Mas asseguremo- nos de entender o que isso significa. Monoteísmo não é simplesmente uma questão de número. Talvez a declaração mais sucinta seja a de W. F. Albright, 30 que diz que o monoteísmo é “a crença na existência de um único Deus, que é o Criador do mundo e o doador de toda vida... [é] tão superior a todos os seres criados... que permanece absolutamente único”. Isso fazia que Israel fosse radicalmente diferente de seus vizinhos pagãos (PACKER; TENNEY; WHITE JR., 2002). Guarde... É chamada de politeísmo, a crença na existência de diversos deuses, comum no Egito, Grécia e Roma Antigas e outras civilizações. As principais divindades são geralmente ligadas às forças da natureza, são antropomórficas e imortais. O politeísmo foi deixado de lado com o avanço do cristianismo, religião monoteísta (crença em um único deus), e atualmente é encontrado em religiões ou cultos de origem africana. No entanto, existe uma discussão em relação ao monoteísmo do cristianismo. Para alguns estudiosos, o cristianismo é politeísta, pois prega a crença na Santíssima Trindade (Pai, Filho e Espírito Santo) (PACIEVITCH, 2015). 31 UNIDADE 4 – RELIGIÕES COM BERÇO NO ORIENTE EXTREMO 4.1 Budismo O Budismo originou-se na Índia, mas ao longo os séculos rapidamente migrou e se expandiu por grande parte do oriente extremo, sendo uma das mais antigas e maiores religiões do mundo. Nasceu de ensinamentos dados há aproximadamente 2.500 anos atrás por Gautama Buda, “O Despertado” ao norte da Índia. Um dos fundamentos principais do Budismo foi definido pelo Buda como as Quatro Verdades Nobres. Isto é, a vida é sofrimento. O sofrimento é causado por afeições e aversões, embora haja uma maneira de escaparmos deste sofrimento. O fim do sofrimento é a Iluminação que pode ser alcançada através da prática do Budismo (AMCBR, 2015; SILVA, 1999). Desde o tempo de Buda, esta religião cresceu e se desenvolveu em três ramos principais. Os ramos Mahayana e Hinayana dão enfoque ao Budismo como religião e código moral da mesma maneira que o Cristianismo é adotado no ocidente. O terceiro ramo principal do Budismo é o Vajrayana, bastante parecido com o Budismo Zen Japonês, conhecido como o “caminho curto”. Em Zen e Vajrayana, o Budismo não é visto como religião per se, mas como um estilo de vida. As práticas gêmeas de meditação e consciência plenasão utilizadas para o alcance da Iluminação com extrema rapidez. O praticante usa todos os aspectos de sua vida diária como instrumentos para progredir no caminho da Iluminação. A Iluminação é um estado através do qual o ciclo de nascimento e morte é quebrado, por onde se obtém completa compreensão da vida. Na prática Vajrayana e Zen, reconhece-se que a Iluminação pode ser alcançada nesta vida atual! (AMCBR, 2015). 4.2 Hinduísmo O hinduísmo é a mais antiga de todas as maiores religiões do mundo. Algumas tradições do hinduísmo remontam a mais de 3 mil anos. Ao longo dos 32 séculos, no entanto, seus seguidores – chamados hinduístas – vêm aceitando muitas ideias novas e acrescentando-as às antigas. Mais de 800 milhões de pessoas praticam o hinduísmo em todo o mundo. A maioria delas vive na Índia, onde essa religião começou. Segundo a Enciclopédia Escolar Britannica (2015), o hinduísmo não teve um fundador e não possui uma organização central. Ninguém criou uma relação de crenças que todos os hinduístas devam seguir. Mas todos os hinduístas respeitam os Vedas, um conjunto antigo de textos sagrados. Os hinduístas acreditam num poder espiritual chamado brāman. Brāman é a fonte de toda existência e está presente em tudo e em todos os lugares. A alma humana, chamada atman, faz parte do brāman universal. Em geral, os hinduístas acreditam que quando alguém morre, a atman renasce em outro corpo. Para eles, uma alma pode voltar muitas vezes na forma humana, animal ou até vegetal. Essa ideia é conhecida como reencarnação. O ciclo de renascimento continua até que se aceite que a atman e o brāman são a mesma coisa. A maioria dos hinduístas acha que libertar-se desse ciclo é o objetivo mais elevado da pessoa. Os hinduístas devem agir de acordo com o princípio da ahimsa, que quer dizer “não violência”. Isso significa que nunca se deve desejar causar dano a alguém ou a alguma coisa. Eles acham que muitos animais são sagrados, em especial a vaca. Os hinduístas piedosos são vegetarianos. Os hinduístas adoram muitos deuses. O deus Vishnu é considerado protetor e preservador da vida. O deus Shiva representa as forças que a criam e também a destroem. A deusa suprema é chamada mais comumente de Shakti. Como Shiva, ela pode ser bondosa ou feroz, dependendo da sua forma. Os três principais ramos do hinduísmo moderno distinguem-se pela devoção a Vishnu, Shiva e Shakti. (ENCICLOPÉDIA ESCOLAR BRITANNICA, 2015). 4.3 Taoísmo Tao é, ao mesmo tempo, o caminho, o caminhante e o ato de caminhar. Filosoficamente, pode ser interpretado como o Absoluto. 33 O Taoísmo é uma tradição espiritual que propõe o retorno do homem a um estado de consciência e vida plena, ao Tao. Os meios para o retorno ao Tao englobam as artes (Su), a lei (Fa) e o caminho (Tao). As artes procuram restaurar o equilíbrio das energias da pessoa através de conhecimentos de saúde, de oráculos, de destino, de leitura da natureza ou do homem. O Fa é o conjunto de métodos místicos que restauram a ordem, a organização, a lei interior e exterior através da força espiritual. E o Tao, como meio, tem na meditação o caminho espiritual por excelência. O Taoísmo é uma tradição espiritual milenar de origem chinesa. O ensinamento filosófico e a prática espiritual (meditação, alquimia e rituais), são praticados na Sociedade Taoísta do Brasil, oficialmente ligada e reconhecida pela Sociedade Taoísta da China. Fundada em 1990 pelo sacerdote Wu Jyh Cherng, que trouxe o puro conhecimento da tradição, adquirido com os mais representativos mestres iluminados vivos. 4.4 Xintoísmo Segundo apontamentos de Machado (2015), Xintoísmo é a única religião que pode ser considerada genuinamente japonesa, tendo origens mesclando-se com a do próprio povo japonês. Há dois milênios percebe-se sua predominância no misticismo do país. A denominação adaptada do chinês xin-tao, que significa “via dos deuses”, só foi aceita por volta do século XI, embora muitos utilizem o termo kami-no-michi, com a mesma significação. Ao contrário do Budismo, de origem indiana e influência chinesa, o Xintoísmo é dominante apenas no Japão, embora sua prática não exija o abandono ou recusa de outras formas de manifestação de crença religiosa. Não se trata de uma crença exclusivista, pois convive pacificamente e até complementa-se com outras religiões. Muitos estudiosos nem consideram o Xintoísmo uma religião, devido ao fato de não terem sido criados códigos de leis explícitas, filosofia escrita e definida, profetas ou um livro sagrado, que contivesse os dogmas para quem a segue. Entretanto, a forma ostensiva com que o xintoísmo comanda a vida de 34 seus praticantes, é perceptível não só em seus rituais, mas nos demais aspectos da vida, o que garante a posição de uma das grandes religiões do mundo. Xinto, ou Kami-no-michi, pode ser traduzido como o Caminho para os Deuses, mas o significado é bem mais amplo. Seria o estudo filosófico do espírito, da essência e da divindade. No caso, divindade pode ter uma forma humana, animal ou qualquer elemento da natureza, como montanhas, rios, trovões, vento, ondas, árvores e pedras. Pode-se dizer que o xintoísmo está bastante ligado à natureza, no sentido de que se propaga a proteção ao meio ambiente, através do culto aos elementos da natureza (TEMPLO XINTOÍSTA DO BRASIL). Os textos mais antigos que falam do Japão estão nos livros “Kojiki” e “Nihon Shoki”, escritos nos séculos VII e VIII. Ambos falam do xintoísmo e de seus deuses, explicando a origem do Japão, misturando folclore, lendas e história. Muitas festividades tradicionais japonesas são do xintoísmo. Por exemplo. Tanabata Matsuri, Hanami, Seijin Shiki e Shichi-go-san. Calcula-se que haja 119 milhões de praticantes do xintoísmo no Japão. O número é elevado porque os japoneses praticam alguns rituais do budismo em algumas ocasiões (culto aos antepassados, por exemplo), e também praticam determininados rituais do xintoísmo no seu dia-a-dia (HANDA, 2015). 4.5 Confucionismo O princípio básico do confucionismo é conhecido pelos chineses como junchaio (ensinamentos dos sábios) e define a busca de um caminho superior (Tao) como forma de viver bem e em equilíbrio entre as vontades da terra e as do céu. Confúcio é mais um filósofo do que um pregador religioso. Suas ideias sobre como as pessoas devem comportar-se e conduzir sua espiritualidade se fundem aos cultos religiosos mais antigos da China, que incluem centenas de imortais, considerados deuses, criando um sincretismo religioso. O Confucionismo foi a doutrina oficial na China durante quase 2 mil anos, do século II até o início do século XX. Fora da China, a maioria dos confucionistas está na Ásia, principalmente no Japão, na Coréia do Sul e em Cingapura (SILVA, 1999). 35 Na doutrina do Confucionismo não existe um deus criador do mundo, nem uma igreja organizada ou sacerdotes. O alicerce místico de sua doutrina é a busca do Tao, conceito herdado de pensadores religiosos anteriores a Confúcio. O Tao é a fonte de toda a vida, a harmonia do mundo. No confucionismo, a base da felicidade dos seres humanos é a família e uma sociedade harmônica. A família e a sociedade devem ser regidas pelos mesmos princípios: os governantes precisam ter amor e autoridade como os pais; os súditos devem cultivar a reverência, a humildade e a obediência de filhos. Confúcio, nascido em meados do século VI a.C. ensina que o ser humano deve cultuar seus antepassados mortos, de forma a perpetuar o mesmo respeito e amor que tem por seus pais vivos. De acordo com a doutrina, o ser humano é composto de quatro dimensões: o eu, a comunidade, a natureza e o céu – fonte da autorrealização definitiva. As cinco virtudes essenciais do ser humano são amar o próximo, ser justo, comportar-se adequadamente, conscientizar-se da vontade do céu, cultivar a sabedoria ea sinceridade desinteressadas. Somente aquele que respeita o próximo é capaz de desempenhar seus deveres sociais. O único sacrilégio é desobedecer à regra da piedade (SILVA, 1999). 36 UNIDADE 5 – RELIGIÕES COM BERÇO NO ORIENTE MÉDIO O Oriente Médio é o berço das três religiões monoteístas: Judaísmo, Cristianismo e Islamismo. Em qualquer documento, artigo, pesquisa que seja, iremos encontrar exatamente essa informação. Evidentemente que cada uma destas religiões reivindica para si a certeza, a maneira correta de praticar, adorar e respeitar a Deus e seus mandamentos. Como diz Santos (2002), praticamente as regras de convivência propostas por Deus são as mesmas nas três religiões, porém sabemos que até o presente momento tem sido muito difícil a situação dessa convivência no Oriente Médio. 5.1 A região O Oriente Médio é a região conhecida por ser o berço das três maiores religiões monoteístas, o judaísmo, o cristianismo e o islamismo (predominante por lá nos dias atuais) e também região de intensos conflitos religiosos, políticos e militares. 5.2 O Judaismo O Judaísmo, historicamente a mais antiga das religiões, está relacionado, em sua origem e segundo a Bíblia, com a revelação de Deus a Moisés e a passagem, para suas mãos, do Decálogo ou Tábuas da Lei, documento normativo de costumes e das relações do Homem com Deus e com seus semelhantes. A entrega teria sido no Monte Sinai, na península do mesmo nome. O local da entrega logo tornou-se sagrado. Foi sob essa legislação que os hebreus edificaram seus costumes e organizaram administrativamente o território que Deus lhes concedera – a Terra Santa (1850 a.C). Esta versão se reporta ao tempo em que os hebreus deixaram o Egito, depois de séculos de escravidão. Depois da segunda destruição do Templo de Jerusalém pelos romanos (70 d.C), construíram-se as Sinagogas e um novo código de comportamento é criado para os judeus: o TALMUD. Esse Iivro-código de comportamento é constituído pelo Documento-Base (representado pelas Tábuas da Lei) e pelo 37 acréscimo de novas normas elaboradas pelo rabino lehudah MANASSI (200 d.C.) e que consistem na compilação das leis orais vigentes no grupo e, ainda, as “leis ou ensinamentos” (“Torah”), contidos nos cinco primeiros livros da Bíblia: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. 5.3 O Cristianismo O segundo monoteísmo do ponto de vista cronológico, o Cristianismo – surge com o anúncio e confirmação da vinda do enviado de Deus, o Messias que, para os Cristãos, é Jesus. Entretanto, para os judeus, este enviado de Deus ainda não chegou; e para os muçulmanos, quem foi trazido à terra para falar a verdade divina (a quem se denominaria MESSIAS), não foi Jesus, mas Maomé. O Cristianismo difundiu-se a partir do Oriente Médio, estendendo-se pela Europa, Américas, África e Ásia, acompanhando todas as epopeias de conquistas ocorridas na Antiguidade, Idades Média, Moderna e Contemporânea. Nos primeiros tempos, passou uma imagem de desconfiança, ao fazer concorrência aos direitos do Imperador de Roma, quando separou poderes: “... a César, o que é de César; a Deus o que é de Deus.” Depois de cerca de três séculos de perseguições, os cristãos têm reconhecida a sua fé, oficialmente, cm 313 d.C, pelo Édito de Milão. Concomitantemente à conversão do imperador Constantino ao Cristianismo, segue-se uma era de afirmação filosófica, territorial, econômica e política. Vejamos: Agostinho, Jerônimo, Tomás de Aquino afirmam-se pela Idade Média, balizando a doutrina; os invasores vindos do Leste são convertidos; crescem os espaços reservados à entidade social Igreja; aliam-se forças para combater os mouros e retomar o Santo Sepulcro; impõem-se pactos entre o Estado e a Igreja; combatem-se os adversários da Igreja como os do Estado, usando-se como suporte a Inquisição; 38 conquistam-se territórios coloniais, com a espada dos reis e a cruz de Cristo; e, concedem-se indulgências, a troco de aumento do poder e do prestígio e do espaço territorial da Igreja. Até hoje, a influência política do Cristianismo pode ser encontrada na introdução de algumas Constituições de países republicanos ocidentais. Muito embora correspondendo a poderes separados, Igreja e Estado ainda guardam grandes vínculos e respeito entre si. Nos planos internacional e supranacional, o Papa ainda assume uma figura de grande mediador e conselheiro de decisões sociais e políticas que envolvem sociedades de diversos países (SANTOS, 2002). Discordâncias histórico-religiosas marcam também divergências no comportamento da sociedade, segundo os ensinamentos e as proposições de vida ditadas pelos livros sagrados para os seguidores de cada uma das três religiões. As diferenças partem do próprio contexto do Velho e do Novo Testamentos. A primeira grande divergência é entre judeus e cristãos. O texto do Velho Testamento, em grande parte reconhecido também pelos muçulmanos, está muito presente nos cultos e nas tradições judaicas. A proposta comportamental básica passa pelo binômio crime-castigo, preconizado pelo Código de Hamurabi (“Fez, paga”; “olho por olho, dente por dente”; ao ladrão, corta-se-lhe a mão”, entre outros). Opondo-se a essa proposta, o Novo Testamento revela as “Boas Novas” trazidas por Jesus e seus Apóstolos (novidades boas, notícias boas, nova visão da vida, da existência e das relações do homem com seu semelhante e com Deus). Entre estas boas novidades está a substituição do castigo – uma constante no Velho Testamento – pelo arrependimento e pelo perdão – a tônica do Novo. Em relação, ainda, ao Velho Testamento, os muçulmanos consideram que Moisés é o “Pai dos Profetas” e admitem que Jesus é mais um dos antigos profetas, tanto quanto Isaías, Jeremias e Ezequiel, chamados “Grandes Profetas”. Mas não o Messias, aquele que seria o enviado de Deus e que traria a verdadeira vontade do Todo-Poderoso (SANTOS, 2002). 39 5.4 O Islamismo A religião dos Muçulmanos tem início com Maomé, um pastor da tribo Koreichita que, segundo se conta, recebeu em sonho ou em transe, o Arcanjo Gabriel que, de 610 (quando Maomé tinha 40 anos), até 22 anos mais adiante, repassou a Maomé a palavra de Deus. Esta ocorrência tem certa semelhança com a entrega das Tábuas da Lei a Moisés. Os intérpretes dos preceitos religiosos muçulmanos enfatizam que, na verdade: Deus havia revelado sua vontade aos Judeus e aos Cristãos pela voz de seus Mensageiros. Mas eles desobedeceram às ordens de Deus e dividiram-se em seitas cismáticas. O Alcorão acusa os Judeus de terem corrompido as Escrituras, e os Cristãos, de adorarem Jesus como o filho de Deus, quando Deus nunca teve filho e quer ser adorado com absoluta exclusividade. Tendo assim desencaminhado, judeus e cristãos devem ser chamados de novo para a senda da retidão, a religião verídica fundada por Abraão e que Maomé, o último dos profetas, veio pregar (CHALITA, s.d). A origem da proposta de “evangelização” muçulmana, montada sobre uma fácies agressiva e celebrada na frase “a fé, a ferro e fogo”, tem seus fundamentos nos dogmas da religião de Maomé, em particular os de número 3 e 5. São os seguintes: 1. Deus é único e onipotente. 2. Outros elementos da religião muçulmana são a ressurreição dos mortos, o juízo final (sic), a Geena (Inferno) e o Paraíso. 3. Maomé é o mensageiro de Deus encarregado de transmitir Sua palavra aos homens. “[...] Crentes são aqueles que creem em Deus e em Seu Mensageiro” (Alcorão, 24:62).1 “[...] Para aqueles que não creem em Deus e em Seu Mensageiro, preparamos um fogo flamejante'' (Alcorão, 48:13). 1 O Alcorão divide-se em 114 suras ou capítulos, divididos em versículos, no total de 6.236. 40 4. O Alcorão não classifica os homens conforme sua raça, cor, nacionalidade, cultura, posses
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