Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO - UFMA CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS, SAÚDE E TECNOLOGIA – CCSST CURSO DE DIREITO JOSÉ DOMINGOS MARTINS DA TRINDADE CRIMINLOGIA E APOLOGÉTICA: C.S. LEWIS COMO SÍNTESE ENTRE A ESCOLA CLÁSSICA E A ESCOLA POSITIVA NO CRISTIANISMO PURO E SIMPLES IMPERATRIZ - MA 2019 UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO - UFMA CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS, SAÚDE E TECNOLOGIA – CCSST CURSO DE DIREITO JOSÉ DOMINGOS MARTINS DA TRINDADE CRIMINOLOGIA E APOLOGÉTICA: C.S. LEWIS COMO SÍNTESE ENTRE A ESCOLA CLÁSSICA E A ESCOLA POSITIVA NO CRISTIANISMO PURO E SIMPLES Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão – Centro de Ciências Sociais, Saúde e Tecnologia de Imperatriz –, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito. Área de concentração: Criminologia; Direito Penal. Orientador: Profº.: Gabriel Araújo Leite IMPERATRIZ/MA 2019 FICHA BIBLIOGRÁFICA* JOSÉ DOMINGOS MARTINS DA TRINDADE CRIMINOLOGIA E APOLOGÉTICA: C.S. LEWIS COMO SÍNTESE ENTRE A ESCOLA CLÁSSICA E A ESCOLA POSITIVA NO CRISTIANISMO PURO E SIMPLES Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão – Centro de Ciências Sociais, Saúde e Tecnologia de Imperatriz –, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito. Aprovado em: ____/____/____. BANCA EXAMINADORA ______________________________________________ (Orientador) Universidade Federal do Maranhão ______________________________________________ 1ª Examinador ______________________________________________ 2º Examinador Este trabalho à minha família, pelo amor e carinho. À minha amada esposa, Ivone, pela dedicação e cumplicidade. Aos meus filhos, Isabella e Israel fonte de inspiração e motivação. AGRADECIMENTOS Aos meus pais, José Vieira e Luecí, pela paciência e dedicação que tiveram ao me ensinar o verdadeiro sentido de dignidade e amor. Aos meus irmãos, Rosane, Fábio, Fredson e Célia, que sempre me apoiaram nessa longa jornada, com incentivos e aspirações de sucesso. À minha amada e adorável esposa, Ivone, aos meus amados filhos Isabella e Israel, aos meus amigos e demais familiares por estarem sempre ao meu lado compartilhando meus anseios e conquistas. E acima de tudo, a Deus, por me ensinar a cada dia a ser grato por todas as coisas. A gratidão sempre será uma das mais belas virtudes do homem. RESUMO A Escola Clássica Criminológica e a Escola Positiva Criminológica divergiram em alguns temas que também são caros à Apologética. O presente trabalho tem por objetivo analisar o suposto processo de superação da Escola Clássica pela Escola Positiva, criando uma síntese entre as duas correntes se utilizando de outra ciência, a saber: a Teologia. Para tanto, busca identificar os principais argumentos das Escolas que giram em torno dos temas: Lei Natural, Livre Arbítrio e Método Científico, balizando com o pensamento do grande Apologista irlandês C.S.Lewis que também escreveu sobre os mesmos temas no seu mais famoso livro: Cristianismo Puro e Simples. Ao longo do Trabalho, a Escola Clássica é analisada em torno do seu principal expoente, o famoso iluminista italiano Marques de Beccaria, já a Escola Positiva é representada pelo sociólogo italiano Enrico Ferri que junto com os também italianos Cesare Lombroso e Raffaele Garofalo são considerados os fundadores desta Escola. Palavras-chaves: Escola Clássica, Escola Positiva, Direito Natural, Livre Arbítrio, C.S Lewis. ABSTRACT The Criminological Classical School and the Positive Criminological School have diverged on some issues that are also dear to apologetics. This paper aims to analyze the supposed process of overcoming the Classical School by the Positive School, creating a synthesis between the two currents using another science, namely: Theology. To this end, it seeks to identify the main arguments of the Schools that revolve around the themes: Natural Law, Free Will and Scientific Method, underlining the thinking of the great Irish Apologist C.S Lewis, who also wrote about the same themes in his most famous book: Christianity Pure and simple. Throughout the Work, the Classical School is analyzed around its main exponent, the famous Italian illuminist Marquess of Beccaria, while the Positive School is represented by the Italian sociologist Enrico Ferri who together with the Italians Cesare Lombroso and Raffaele Garofalo are considered the founders of this school. Keywords: Classical School, Positive School, Natural Law, Free Will, C.S Lewis. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ............................................................................................ 09 2. CRIMINOLOGIA ......................................................................................... 11 3. A ESCOLA CLÁSSICA CRIMINOLÓGICA ............................................... 13 3.1 Direito Natural........................................................................................... 15 3.2 O Contrato Social..................................................................................... 21 3.3 O Método Dedutivo................................................................................... 23 3.4 O Livre Arbítrio ......................................................................................... 25 4. ESCOLA POSITIVA CRIMINOLOGICA ..................................................... 28 4.1 - O Positivismo Filosófico........................................................................ 29 4.2 Positivismo Jurídico ................................................................................ 30 4.3 - Críticas de Ferri à Escola Clássica....................................................... 31 5 - C.S LEWIS COMO SÍNTESE ENTRE AS DUAS ESCOLAS..................... 38 5.1 C.S Lewis e a Lei Natural ........................................................................ 39 5.1.1 Algumas objeções à Lei Natural.......................................................... 43 5.2. C.S. Lewis e o Livre Arbítrio ................................................................. 45 5.3 C.S Lewis a Ciência e o Método Indutivo ............................................. 47 6. CONSIDERAÇÕE FINAIS.......................................................................... 50 REFERÊNCIAS.......................................................................................... 52 9 1. INTRODUÇÃO O Conflito entre a Escola Clássica Criminológica e a Escola Positiva Criminológica que é apresentado na Disciplina de Criminologia no Curso de Direito, inicia-se logicamente com o próprio surgimento da Escola Positiva. Aliás foi o principal representante da Escola Positiva, o Escritor Enrico Ferri, que cunhou o nome de Escola Clássica àquela tendência de pensamento evidenciada principalmente nos escritos do Marques de Beccaria. De forma geral, essas “disputas”, acontecem na história do Pensamento Humano, principalmente na Filosofia, e que foi tão bem observado por Hegel, no que é chamado de Dialética Hegeliana, que se resume em Tese, Antítese e Síntese. Neste Trabalho Monográfico, a Escola Clássica será a Tese, a Escola Positiva a Antítese e o pensamento de C.S. Lewis a Síntese. Diante do avanço do Positivismo de Augusto Conte no século XVIII, um forte grau de cientificismo e porque não dizer de ateísmo também, tomaram conta das Disciplinas Acadêmicas do Pensamento Ocidental, sendo essa cientificidade, a proposta principal do que é conhecido na Filosofia como Positivismo.No Direito, essa tendência cientificista evidenciou - se numa tentativa de superação do pensamento da Escola Clássica pelo pensamento da Escola Positiva. A grande questão que será enfrentada ao longo deste Trabalho Monográfico, será a de defender alguns conceitos utilizados pela Escola Clássica Criminológica, considerados ultrapassados pela Escola Positiva e reafirmar conceitos da própria Escola Positiva, gerando uma a síntese entre as duas Escolas. Como parâmetro ou balizamento para esta empreitada, utilizaremos um pensador mais atual, que apesar de não ser da área jurídica, escreveu sobre os mesmos temas que geraram desacordos entre as duas escolas abordadas já citadas, a saber: C.S.Lewis. Para chegarmos a uma Conclusão, será necessário, primeiramente, perquirir os principais temas que norteiam ou dão fundamentação para as duas Escolas Criminológicas, a saber: Lei natural, Livre arbítrio e Método Científico, como cada Escola trata dos referidos temas e como C.S Lewis em sua obra 10 Cristianismo Puro e Simples abordou os mesmos, trazendo fatos novos ou corroborando com o pensamento já posto pelas Escolas. C.S Lewis (já falecido) foi um escritor considerado Apologeta, ou seja, um defensor da fé cristã, a utilização do mesmo neste trabalho não pode ser considerada esdrúxula, pois a História do Direito e a própria História da Filosofia estão mescladas ou até mesmo entrelaçadas com a Religiosidade, maIs especificamente com o cristianismo no Ocidente, achamos então pertinente essa síntese, pois os três pensadores tratam dos mesmos temas. Esta Pesquisa pretende ainda aprofundar no estudo de um suposto processo de superação da Escola Clássica pela Escola Positiva Criminológica apresentando argumentação a favor de uma ou outra Escola nos principais temas que entraram em disputa, a saber novamente: Direito Natural, Livre Arbítrio e Método científico à Luz do apologista de C.S. Lewis. O tema escolhido nasceu da possibilidade de contribuição ao Meio Acadêmico e também aos futuros leitores da defesa do Direito Natural que muitas vezes parece um termo obsoleto no Direito, até mesmo que sofre pré- conceitos no ramo jurídico. Nesta empreitada escolhemos a disputa entre Escola Clássica x Escola Positiva na Criminologia que é onde podemos perceber na prática toda essa querela com a não chance de resposta da Escola Clássica e alguns resultados da supremacia científica que se mostrou inepta diante dos horrores das duas Grandes Guerras. Decorrente disso, ainda temos um CPP altamente influenciado pela Escola Positiva Criminológica. Com base nesse tema, e recorrendo a pesquisas bibliográficas, vimos a necessidade de levantar hipóteses, além de mostrar ao leitor que a Escola Clássica não estava errada em alguns de seus pressupostos, no entanto, não é objetivo nosso especular como seria um direito penal brasileiro totalmente influenciado pela Escola Clássica do Direito. 11 2. CRIMINOLOGIA A Criminologia faz parte das denominadas “Ciências Criminais” junto com outras disciplinas como o Direito Penal, o Direito Processual Penal e a Política Criminal, dentre estas, a Criminologia parece ser a mais esquecida ou deixada de lado pela Literatura jurídica, pela Academia e pela Prática Forense, no entanto, assuntos que envolvem a Criminologia são discutidos diariamente pela população em geral, sem a noção que pertencem a esta matéria do Direito. O Conceito de Criminologia pode variar bastante dependendo da ótica e da influência filosófica de cada autor, e autores de viés Positivista são os que mais simplificam esse conceito, simplificação que segundo Nilo Batista é um equívoco, pois esses autores enxergam a Criminologia como um simples exame causal-explicativo do crime e do criminoso. Nilo Batista também lamenta que os Cursos de Direito apresentem o Conceito de Criminologia com o Viés Positivista, para o referido autor, o melhor conceito de Criminologia seria o de Lola Aniyar de Castro: É a atividade intelectual que estuda os processos de criação das normas penais e das normas sociais que estão relacionadas com o comportamento desviante; os processos de infração e de desvio destas normas; e a reação social, formalizada ou não, que aquelas infrações ou desvios tenham provocado: o seu processo de criação, a sua forma e conteúdo e os seus efeitos. (CASTRO, 1983, p. 52 apud BATISTA, 2011, p. 27). Dentro da Criminologia é que encontramos o estudo das Escolas Penais, no debate sobre essas Escolas é que procuramos entender e explicar muitos assuntos relacionados ao Direito Penal. O Conceito de Escola Penal nos dará melhor compreensão sobre a amplitude do debate, segundo ESTEFAM (2013, p. 56): “Escola Penal significa um conjunto de princípios e teorias que procuravam explicar o objetivo do Direito Penal, a finalidade da pena e compreender o autor da infração penal”. 12 De acordo com André Estefam, o embate na Criminologia, mais especificamente entre as Escolas Penais, está superado devido ao progresso da Ciência e da Sociedade que visam uma síntese do conhecimento e não mais um engessamento ortodoxo em uma ou outra Escola, para tanto utiliza o pensamento de Salgado Martins sobre o tema: Atualmente, com o progresso verificado nas ciências que estudam o homem e a sociedade e com a tendência predominante na inteligência moderna para a síntese do conhecimento, não seria sequer defensável uma posição ortodoxa ou rigidamente clássica ou positivista com relação aos problemas do Direito Penal. Não se compadece nem mesmo com a mentalidade contemporânea o sectarismo de princípios e o absolutismo de soluções apresentados por uma ou outra escola, naquilo que é essencial ou fundamental ao Direito repressivo: a noção do crime, do delinquente e da pena. (MARTINS, 1957, p. 83 apud ESTEFAM 2013, p. 61). Nilo Batista também enxerga uma evolução na Criminologia como um todo, no entanto, para este pensador, a superação que ocorreu foi a superação do próprio Positivismo que, segundo o autor, influenciou demasiadamente o Direito Penal brasileiro. A evolução que Nilo enxerga se dá com uma gama de tendências que ele prefere agrupar e denominar de Criminologia Crítica que seria contrária à Criminologia Tradicional de base Positivista. Para o autor, o erro jurídico do pensamento positivista se deu principalmente na tentativa de se isolar o ser e o dever-ser, fruto de uma corrente neokantista. O pensador também resume quais seriam outras falhas do positivismo: a) supor que na transcrição da objetividade cognoscível não se imprime a experiencia do sujeito cognoscente; b) reduzir a objetividade cognoscível ao que nele for empírica e sensível demonstrável; c) ter, portanto, na metodologia o centro e o limite inexorável de sua atividade científica; d) conceber de forma mecanicista os fatos sociais, produzindo explicações com base em relações causais (BATISTA, 2013, p.31). 13 A criminologia Crítica, como o próprio nome sugere, tenta questionar inclusive o próprio Código Penal, coisa que a Criminologia Tradicional não faz, indagações ônticas do “como”, “por quê” e “para quem” surgem na investigação da Elaboração do Código Penal. A tendência da Criminologia Crítica é a Investigação Social, verifiquemos o conceito e as explicações de Nilo Batista sobre o tema: A Criminologia Crítica, portanto, não se autodelimita pelas definições legais de crime (comportamentos delituosos), interessando-se igualmente por comportamentos que implicam forte desaprovação social(desviantes). A criminologia Critica procura verificar o desempenho prático do sistema penal, a missão que efetivamente lhe corresponde, em cotejo funcional e estrutural com outros instrumentos formais de controle social (hospícios, escolas, institutos de menores etc). A criminologia Crítica insere o sistema penal – e sua base normativa, o direitopenal – na disciplina de uma sociedade de classes historicamente determinada e trata de investigar, no discurso penal, as funções ideológicas de proclamar uma igualdade e neutralidade desmentidas pela prática. Como toda teoria crítica, cabe- lhe a tarefa de “fazer aparece o invisível” (BATISTA, 2013, p. 32). De acordo com o penalista André Estefan, as principais correntes ou escolas Penais ao longo da história foram: A Escola Clássica; a Escola Positiva; a Terceira Escola e outras menores, nosso trabalho trata da Escola Clássica e da Escola Positiva. Diante do que já foi exposto, a Terceira Escola e as outras menores se encaixariam na chamada Criminologia Crítica, esta Pesquisa aborda principalmente Escola Clássica e Escola Positiva na tentativa de construir uma síntese entre as duas Escolas como também pontuou Estefan ao tratar do assunto. 3. A ESCOLA CLÁSSICA CRIMINOLÓGICA Com inspiração no Iluminismo Italiano do século XVIII, a Escola Clássica se fundamenta. É válido lembrar que o Nome Escola Clássica foi dado por Enrico Ferri que foi principal nome da Escola Positiva, ou seja, um antagonista. 14 Antes, a Escola Clássica era vista como um movimento humanitário para suavizar o Direito de Punir Estatal da época. O maior expoente dessa Escola foi o Marques de Beccaria, através da sua principal obra intitulada “Dos Delitos e das Penas”, no qual fez diversas críticas ao Sistema Penal vigente. Os principais pensadores que influenciaram Beccaria foram Montesquieu, Hume e Rousseau, principalmente o Contratualismo de Rousseau. Rousseau terá um subtópico à parte neste Tópico quando tratarmos do Contrato Social, Hume entra na obra de Beccaria quando se trata de “Associação das ideias”, é o que nos preconiza Eduardo Gagliano: Quanto à ideia de associação, Beccaria baseou-se na teoria de “associação das ideias” do filosofo David Hume. Este dizia que fenômenos particulares e experiências se tornam ligadas no cérebro humano por que são rapidamente seguidas umas das outras. Consequentemente, o autor acreditava que a ideia de crime e pena só seriam associadas rapidamente na mente de todo o público se fossem necessariamente seguidas uma da outra. (YAR, M. 2010, p.5 apud GAGLIANO, 2012, p 5-6) Quanto à influência de Montesquieu na obra de Beccaria continuamos com Eduardo Gaggliano citando o próprio mestre Italiano: Toda pena que não deriva de absoluta necessidade – diz o grande Montesquieu – é tirânica. Proposição que pode tornar-se mais geral da seguinte forma: todo o acto de autoridade de um homem sobre outro homem que não derive de absoluta necessidade é tirânico. (BECCARIA 2003, p.64 apud GAGLIANO, 2012, p. 3-4). Muitos princípios norteiam a Escola Clássica, para o nosso intuito, interessam os princípios de que: O Ser humano é dotado de Livre arbítrio; O Direito Penal é emanado da Lei Moral Racional; 15 Foram esses dois princípios os que mais sofreram críticas por parte da Escola Positiva, a outra ferrenha crítica recai sobre o abuso do método dedutivo pela Escola Clássica. Somando-se os dois princípios elencados e o método utilizado, temos que a Escola Clássica preconiza : O agente que opta pelo conduta delituosa baseou-se em seu "livre arbítrio" para realização do fato típico, ou seja, a Escola Clássica inspirada pela doutrina do "Direito Natural" se afasta da ciência social, valendo-se da critério de dedução a Escola não procura investigar o "motivo" que levou o agente a descumprir a norma” (JÚNIOR, 2011, p. 2). 3.1 Direito Natural O Jusnaturalismo é visto dentro da Filosofia do Direito como uma gama de pensamentos que reúne pontos em comum em volta do Direito Natural. O Jusnaturalismo não se apresenta uniforme ao longo da História, mas o que une essa corrente de pensamento é a visão que além dos Códigos Escritos, há uma ordem de Direito Superior que é a expressão de um Direito ideal, ou seja, perfeito e justo. Para Paulo Nader a diferença no conceito de Direito Natural principalmente através dos tempos está na origem desse Direito: Para o estoicismo helênico, localizava-se na natureza cósmica. No pensamento teológico medieval, o Direito Natural seria a expressão da vontade divina. Para outros, se fundamenta apenas na razão. O pensamento predominante na atualidade é de que o Direito Natural se fundamenta na natureza humana (NADER, 2013, p. 374). Perquirindo as várias fontes sobre o tema, percebemos que o conceito jurídico/filosófico de Direito Natural não é tão simplório ou diminuto como à 16 primeira vista parece ser, seguindo com Nader conseguimos extrair e montar um conceito: O raciocínio que nos conduz à ideia do Direito Natural parte do pressuposto de que todo ser é dotado é dotado de uma natureza e de um fim. A natureza, ou seja, as propriedades que compõem o ser, define o fim a que este tende a realizar. (...) O adjetivo natural, agregado à palavra direito, indica que a ordem de princípios não é criada pelo homem e que se expressa algo espontâneo, revelado pela própria natureza. (NADER, 2013, p. 375) Já como um movimento rumo à Laicização característica da Cultura Moderna é que se insere o que é conhecido como Direito Natural, marcado pela ideia de que todo Universo segue uma razão baseada na Matemática e na Geometria inclusive as ações humanas. Hugo Grócio é tido como o principal fomentador do Direito Natural de cunho racional que elege a Reta razão como guia das ações humanas e não mais um Ser Sagrado. Ainda assim, mesmo dentro da Escola Clássica do Direito Natural, os diferentes autores não concordavam entre si quanto à fonte última do Direito Natural, autores como Leibniz e Wolf pregavam ainda que Deus seria a fonte última do Direito Natural, o que obviamente contrastava com Grócio, Pufendorf e Lock que elegeram a Reta razão. No entanto, como já mencionado, antes de Hugo Grócio, do qual voltaremos a tratar à parte, encontramos características do que é conhecido como Direito Natural ou Lei Natural em diversas culturas antigas e medievais, desde o Antigo Egito e Babilônia, passando por Grécia, Roma Clássica e os filósofos teólogos Medievais. Na Antiguidade, sobre o Egito Antigo, extraímos o que nos preconiza o Dicionário Jurídico Acquaviva: no Egito Antigo pg 318: Quanto à evolução histórica do Direito Natural, observa Bernadino Montejano que no antigo Egito, mais precisamente no Antigo Império (2895 a 2540 a.C), a deusa Maat se indentificava com a própria ordem estabelecida, autocrática; mais tarde, todavia, durante o Império tebano (1580 a 1100 a.C) a noção de um julgamento dos 17 mortos por Deus, se torna a última esperança dos justos oprimidos (ACQUAVIVA, 2013, p. 320) Sobre a Lei Natural na Babilônia, seguimos com Acquaviva (2013, p. 320): Na antiga Mesopotâmia, região onde se acha o atual Iraque, e assim denominada por se localizar entre dois rios (mesos + pótamos), quais sejam, o Tigre e o Eufrates, floresceram notáveis civilizações, como a assíria e a babilônica. Entre os anos 1728 a 1688 a.C,, a Babilônia foi governada por um rei, Hamurabi, que se tornaria célebre por ter consolidado a Legislação de seu país, gravando-a numa pedra de diorito negro, com 2,25 m de altura, a qual se encontra, hoje no Museu do Louvre. (...) Como se vê, Hamurabi se propõe não apenas regulamentar a vida civil, mas também realizar a Justiça ideal, numa ordem estabelecida pelos deuses, reflexo da harmonia de um mundo superior. Outra Civilização antiga importante no trato com o que chamamos de Direito Natural foi a Civilização Hebraica que sempre procurou se distanciar da Cultura politeísta das outras civilizações vizinhas. Independentemente se os fenômenos que aconteceram naquelas terras do Oriente Médio foram sobrenaturais ou não, o registro bíblico nos revela como a Civilização Hebreia deu um salto de qualidade nas questõesmorais que nas outras Civilizações não eram tão evidentes. O próprio Código de Hamurabi, já citado anteriormente, fica aquém da Lei Mosaica com relação à preceitos morais e mesmo que muitos escritores digam que a Lei Mosaica é um plágio do Código de Hamurabi, é observável a superioridade da Lei Hebreia com relação a Lei de Hamurabi, até por isso o Direito Hebreu é marco inicial quando se trata da História dos Direitos Humanos. Aqcuaviva (2013, p. 320) também nos destaca alguns preceitos da Lei Judaica: Em referência ao Direito hebraico, inúmeros preceitos revelam a intuição da existência de um Direito Natural, haja vista o que diz o 18 texto bíblico, mais precisamente o Exodo (23:7), quanto ao direito à vida: “ Não mates o inocente e o justo, porque não abolsvirei o culpado”. O dever moral de veracidade ainda no Exodo (23: 6 e 7) aparece, cristalino: “Não violes o direito do pobre em seu processo. Afasta-te de causas mentirosas”. O texto sugere notável semelhança com esta passagem do Livro dos Provérbios, do rei Salomão: Não armes demanda a homem algum sem causa, e quando te não fez algum mal” (Capitulo III, 27) Na Idade Média, tomando por base os escritos de Santo Agostinho e São Tomás de Aquino, que são dois dos maiores representantes do pensamento medieval, o primeiro relacionado à Patrística e o segundo à Escolástica, temos que a Lei superior ou divina emana de uma força sobrenatural que obviamente para eles é Deus. É o que nos explica Bittar e Almeida (2012, p. 282): Essa concepção surge, de modo cristalino, nas concepções de Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino. A Cidade de Deus é o lugar regido pela lei divina que contrasta com a cidade dos homens, regida pela lei humana. A tarefa de incorporar a lei divina no âmbito da lei humana é o que deve ser realizado pelo Direito. Ressalta-se que se trata de uma tarefa dificílima. Na concepção tomista há uma lei eterna, uma lei natural e uma lei humana. A lei eterna regula toda a ordem cósmica (céu, estrelas, constelações etc) e a lei natural é decorrente desta lei eterna. Fica claro nas duas concepções, sinteticamente resenhadas anteriormente, que a lei superior (a divina, para Santo Agostinho, e a eterna, para Santo Tomás de Aquino) emana de uma força sobre-humana, qual seja: Deus. Com Hugo Grócio no século XVII, notamos uma mudança pontual no conceito de Lei Natural que agora passa a ser chamado de Direito natural, elegendo a reta razão como balizadora das ações humanas, essa mudança de prumo na Esfera do Direito é também comparada à Revolução Copernicana, pois indica um novo rumo a ser seguido pela Ciência jurídica de então. Grócio foi um jurista nascido na Holanda, filho de pai protestante e mãe católica, escreveu sobre Filologia, História, Teologia e também fez poesia, sua 19 principal obra, na qual expõe sua concepção do Direito Natural é De Jure Bellic ac Pacis de 1625. A Holanda em que Hugo Grócio nasceu e se formou, possuía uma característica marcante na época, que era a de ser altamente urbanizada mesmo ainda em um período de Feudalismo. Delft sua cidade natal era uma cidade fortemente comercial, esse ambiente influenciou grandemente seu pensamento é o que escreve Bittar e Almeida (2012, p. 284): (...) A cidade é um elemento não feudal na estrutura social da época, e os mercadores e comerciantes, seus principais habitantes, constituíram um sistema administrativo e judiciário autônomo dos senhores feudais. As cidades holandesas se transformaram-se em communitas – uma comunidade estruturada em forma corporativa – e podiam fazer alianças, estabelecer relações comerciais e militares com outras cidades. Algumas vezes, a cidade colocava-se, expressamente, sob a proteção de um príncipe, declarando-lhe lealdade. Esta experiência de autonomia desenvolveu-se e se transformou no moderno conceito de soberania. Foi nesse ambiente que nasceu e se formou Hugo Grócio. Sua doutrina do Direito Natural reflete esse desejo de autonomia, que se manifesta, de modo inicial, em relação à Teocracia. Não é mais Deus ou a ordem divina o substrato do Direito, mas a natureza humana e a natureza das coisas. Não há possibilidade de uma sanção religiosa. O Direito Natural não mudaria seus ditames na hipótese da inexistência de Deus, nem poderia ser modificado por ele. Os diferentes autores da Escola Clássica do Direito Natural (Não confundir com a Escola Clássica Criminológica objeto de nossa Pesquisa) não tiveram unanimidade de pensamento, muitos ainda continuaram afirmando que Deus seria a fonte última do Direito Natural e é essa linha que Beccaria vai seguir já no século XVIII, mesmo com toda influência iluminista revolucionária, no entanto, Beccaria defendeu o que ficou conhecido na história como os “Déspotas Esclarecidos”. Sobre isso nos diz Reale e Antiseri (2005, p. 673): 20 O ideal jusnaturalista de um direito em conformidade com a razão precisa-se de modo sempre mais radical no século XVIII, inspirando projetos de reformas. Tais reformas muitas vezes são operacionalizadas pelos próprios soberanos, muitos dos quais gostam de ser chamados “iluminados”, embora permanecendo absolutistas, mas outras vezes também são propugnadas e realizadas contra eles.” Beccaria segue uma linha parecida com Pufendorf o jus filósofo alemão, discípulo de Grócio que diz: É muito evidente que os homens derivam o conhecimento de seu dever, e do que é adequado fazer, ou do que deve ser evitado nesta vida, por assim dizer, de três fontes, ou nascentes: da luz da natureza; das leis e constituições dos países; e da especial revelação de Deus Todo-Poderoso” (PUFENDORF, 2007, p 41). Pufendorf além de ter sido influenciado por Grócio, também recebeu fortes influencias de Hobbes e Descartes que ajudaram a formar a sua visão de Direito Natural. O Jurisconsulto alemão vivenciou a Guerra dos Trinta anos na Europa e viu nascer a Paz de Westfália, todos esses acontecimentos influenciaram a sua obra que é vista como sincrética por muitos pensadores famosos do Direito contemporâneo como Norberto Bobbio. À semelhança com o conceito de Direito Natural de Pufendorf, encontramos no Delito e das Penas: Os preceitos de moral e de política que têm aceitação entre os homens derivam, quase sempre, de três fontes: a revelação, a lei natural e as convenções sociais. Entre a primeira e as duas últimas não há comparação possível, considerados os seus fins principais, completam-se, contudo, quando tendem, de modo igual, a tornar os homens felizes na terra (BECCARIA, 2003, p. 8). No entanto, não podemos deixar de notar uma diferença entre os pensamentos de Grocio e Putendorf com relação ao pensamento de Beccaria, essa diferença fica na adesão ao método indutivo tanto por parte do Pensador 21 Holandês, quanto por parte do pensador Alemão, sobre o método indutivo na obra de Putendorf e Hugo Grócio, voltamos com Bittar e Almeida (2012, p. 286): Ao explicar seu método de reflexão, Pufendorf evidencia sua adesão ao método das ciências matemáticas e ao raciocínio indutivo, o que o aproxima de Hugo Grocio (...) Conforme aponta Pufendorf, usa-se o método dos matemáticos para a descoberta de um princípio imutável. Essa ideia, cara à Escola Clássica do Direito Natural, faz dele um Direito imutável, perene às transformações históricas e não suscetível aos diversos costumes e tradições dos diferentes povos. Já fizemos a Ressalva para não se confundir a Escola Clássica do Direito Natural com a própria Escola Clássica Criminológica, por isso, algumas diferenças entre os pensamentos de autores Clássicos que influenciaram Beccaria com o do mesmo, quanto à questão dos métodos matemáticos, são tópicos fundamentais no objetivo deste trabalho que é de mostrar a diferença entre as duas escolas e serão tratados em capítulos próprios. 3.2 O ContratoSocial Às Vésperas da Revolução Francesa se desenvolve o pensamento de Jean – Jacques Rousseau (1712-1778), seu pensamento portanto é fruto da efervescência de um tempo de mudanças na estrutura do Medievalismo. A própria Revolução Francesa é vista como o desembocar prático da Teoria do filosofo Frances. No entanto, apesar daquele momento de extremado racionalismo, de desabrochar do individualismo, a Teoria de Rousseau nos traz um punhado de Nostalgia do passado, de bucolismo, da solitude evidenciados no bom Selvagem, sendo isso tudo, características do Romantismo do século XVIII. Para entendermos melhor a Tensão entre o pensamento de Rousseu e o Racionalismo da época acompanhamos Bittar e Almeida (2012, p. 294-295): 22 Se a bondade é intrínseca à natureza humana, o estado cívico só pode corresponder a um estado degenerado da convivência humana, em que o desgoverno, o destempero, a corrupção, a beligerância medram. Abdicarem os homens de suas liberdades individuais e naturais para imergirem no seio do convencionalismo contratual somente sob a condição de que o contrato social garanta a continuidade do estado de natureza, ou seja, do estado de liberdade; é isto que cumpre analisar por meio dessa investigação.” Rousseau foi um filósofo de grande influência no pensamento de Beccaria. Diferentemente de Hobbes, Rousseu preconiza que o homem tem uma natureza boa ou que é bom por natureza. Sem a organização política os homens exerciam livremente o direito natural, onde não havia corrupção nem a propriedade provida. A desarmonia nas relações entre os homens teria surgido quando alguns destes, usando a força, estabeleceram o domínio. É o que nos diz França e Rocha (2010, p. 182): A sociedade civil teria sido fundada por um individuo que, cercando um terreno, declarou: “Isto me pertence!”. Se naquele momento alguém houvesse gritado: “Guardai-vos de escutar este impostor!”, teria poupado à humanidade: crimes, guerras e assassinatos No seu livro o Contrato Social de 1762, que é uma obra complementar ao Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdades entre os Homens, o filósofo faz uma análise da gênese do Estado, defende hipoteticamente que houve um pacto entre os homens, que ao se unirem, saíram do Estado de natureza formando assim o Estado organizado. Os homens teriam adquiridos direitos civis ao darem seus direitos naturais ao Estado. O objetivo das leis seria a promoção da liberdade e da igualdade entre os homens. O contrato seria uma união de forças particulares em prol de um bem maior, sobre o tema, evocamos novamente Bittar e Almeida (2012, p. 297): 23 O contrato aparece como forma de proteção e de garantia de liberdade, e não o contrário. A união de forças destina-se à realização de uma utilidade geral, que não se confunde com a utilidade deste ou daquele membro. Que se busca é a concretização do que não seria possível ou acessível ao homem em seu estado de natureza, quando as forças particulares agiam desagregadamente.” A influência do Contrato Social de Rousseau sobre Beccaria, começa a aparecer mais nitidamente no Livro Dos Delitos e das Penas, a partir do Capitulo II, que tem como título Origem das Penas e do Direito de Punir. Nessa parte do livro, o autor Italiano prega que qualquer lei deve estar pautada em sentimentos do coração do homem e com isso a lei se legitima como punitiva. A partir daí, Beccaria discorre sobre suas ideias contratualistas: (...) os primeiros homens, até então em estado selvagem, foram forçados a se agrupar. Constituídas algumas sociedades, de pronto se formaram outras, pela necessidade surgida de se resistir às primeiras, e assim viveram esses bandos, com haviam feito indivíduos, em permanente estado de beligerância entre si. As leis foram as condições que agruparam os homens, no inicio independentes e isolados, à superfície da terra (BECCARIA, 2003, p. 17-18). Prosseguindo com o Mestre Italiano e o Contrato: Assim sendo, somente a necessidade obriga os homens a ceder uma parcela de sua liberdade; disso advém que cada qual apenas concorda em pôr no depósito comum a menor porção possível dela, quer dizer, exatamente o necessário para empenhar os outros em mantê-lo na posse do restante. A reunião de todas essas pequenas parcelas de liberdade constitui o fundamento do direito de punir (BECCARIA, 2003, p. 19). 3.3 O Método Dedutivo 24 O raciocínio de Beccaria focado na dedução tem origem na Lógica Aristotélica, como a matemática é certa, o Direito Natural também é, ou seja, não existe arbitrariedade nele, é assim que pensavam muitos jus naturalistas, que também se utilizaram do método indutivo mais aceito pela ciência e pelos próprios positivistas. Sobre isso seguimos com Bittar e Almeida (2012, p. 284): O método dedutivo, influência do raciocínio matemático e geométrico, é o que possibilita à reta razão alcançar as regras invariáveis da natureza humana . É essa ideia que está na raiz das modernas Declarações de Direitos Humanos. Declara-se não o que é oculto e imperceptível, mas o que é de fácil acesso à razão humana. A Dedução é um método de raciocínio que vai do Universal para o particular, o contrário do método indutivo que vai do particular para o Universal. O Silogismo clássico para mostrar como funciona a Dedução é o seguinte: Primeira premissa: Todo homem é mortal Segunda premissa: Sócrates é um homem Conclusão: Portanto, Sócrates é mortal. Sobre o silogismo acima, nos explica Sproul (2002, p. 83): “A primeira premissa é uma declaração afirmativa universal: todos os que fazem parte de uma classe (o homem ) têm o atributo ou predicado da mortalidade. A segunda premissa é uma afirmação particular: um individuo específico (Sócrates) faz parte da classe dos homens. A conclusão (uma afirmação particular) de que Sócrates é mortal é alcançada pela certeza. Pela lei da inferência imediata, se todos os membros de uma classe têm certo atributo, todo membro específico dessa classe também têm de ter esse atributo”. Explanando sobre a interpretação das leis, Beccaria diz que o Soberano é que é o legitimo interprete da Lei, e que o juiz tem apenas o dever de 25 examiná-la para saber se uma pessoa cometeu ou não algum delito. Nesse raciocínio entra a defesa do método dedutivo pelo criminologista italiano: O juiz deve fazer um silogismo perfeito. A maior deve ser a lei geral; a menor, a ação conforme ou não à lei; a consequência, a liberdade ou a pena. Se o juiz for obrigado a elaborar um raciocino a mais, ou se o fizer por sua conta, tudo se torna incerto e obscuro (BECCARIA, 2003, p. 22). Segundo o renomado penalista André Stefam, o método dedutivo seria a principal característica da Escola Clássica, que adotou princípios absolutos que sobrepunham às leis em vigor, segundo esse autor o método aflorou para o combate de uma tendência da época em que: “Predominavam leis draconianas, excessivamente rigorosas, de penas desproporcionais de tipos penais vagos, enfim, de uma “situação de violência, opressão e iniqüidade” (ESTEFAM, 2013, p. 57). Para referendar seu ponto de vista, Estefam cita o seguinte trecho do prefácio da Obra de Beccária: [...] essas leis examinadas [referindo-se às normas vigentes na Europa], produto dos séculos bárbaros, sã examinadas neste livro no que diz interesse ao sistema criminal; e ousa-se expor-lhes as desordens aos responsáveis pela felicidade pública, por meio de um estilo que afasta o vulgo ilustrado e impaciente. E, mais adiante, arremata: “Seria, pois, um erro atribuir princípios contrários à lei natural [...] (BECCARIA 2001, p. 11 apud ESTEFAM, 2013, p. 57). 3.4 O Livre Arbítrio O livre arbítrio é outro conceito que permeia todo o pensamento de Beccária, conceito esse que assim como a Lei Natural é extraído do tempo em que a Filosofia se mesclavacom a Teologia, assim como o próprio Direito, portanto interligados até o presente. Os chamados “Pais da Igreja” trataram 26 sobre o tema do Livre arbítrio, uns para defenderem, outros para atacarem, entre os que defendiam podemos citar Tertuliano e entre os que atacavam o conceito podemos citar Orígenes. Foi com Agostinho que o tema do Livre arbítrio se impôs decisivamente na reflexão filosófica, Gilson apud (REALE e ANTISERI, 2012, p. 457) resume o pensamento agostiniano sobre o Livre Arbítrio: Duas condições são (...) exigidas para fazer o bem: um dom de Deus, que é a graça, e o livre-arbítrio. Sem o livre-arbítrio, não haveria problemas; sem a graça, o livre-arbítrio (depois do pecado original) não iria querer o bem ou, se o quisesse, não poderia realizá-lo. A graça, portanto, não tem o efeito de suprimir a vontade, mas sim de torná-la boa, pois que se havia transformado e má. Esse poder de usar o livre-arbítrio é precisamente a liberdade. Para Agostinho o homem pode atuar tanto contra quanto a favor da Lei Divina e o responsável por essas opções é o Livre Arbítrio e por isso mesmo as más ações podem ser punidas, pois são praticadas pela vontade humana. Para o filósofo só a razão pode frear os instintos e impulsos que corrompem a alma, a razão seria o ponto de equilíbrio para o bem viver, retornamos com Bittar e Almeida (2012, p. 225) A vontade governa o homem, e pode faze-lo contra ou a favor do próprio homem. Deve-se, portanto, orientar no sentido de governabilidade da alma pela alma, onde a razão deve ser o princípio motor do comportamento, evitando-se que a alma sucumba sob os instintos ou impulsos dos quais não está isenta (concupiscência, ódio, homicídio, luxúria, lascívia etc). Há aqui um certo apelo a ideia de equilíbrio, de prudentia na atuação prática da vida’. O livre arbítrio continuou gerando debates após a Reforma protestante, Calvino é considerado o grande opositor da doutrina do Livre Arbítrio, e o grande defensor foi o teólogo Jacob Armínio, do qual o próprio Hugo Grocio foi seguidor, sendo ambos holandeses. Grócio chegou inclusive a ser preso por 27 estar ligado ao Arminianismo, tudo porque a disputa entre livre arbítrio e Calvinismo extrapolou a Filosofia e a Teologia mesclando-se na política da Holanda. A respeito do Livre Arbítrio, Jacobus Armínius escreveu: “A respeito da graça e do livre-arbítrio, ensino conforme as Escrituras e o consentimento ortodoxo: o livre arbítrio não tem a capacidade de fazer ou aperfeiçoar qualquer bem genuíno espiritual sem a graça. Para que não se diga que eu, assim como Pelágio cometo uma falácia em relação à palavra “graça”, esclareço que com ela me refiro à graça de Cristo que pertence à regeneração: afirmo, que a graça é simples e absolutamente necessária para a iluminação da mente, para o devido controle das emoções e para a inclinação da vontade ao que é bom. (ARMÍNIUS apud FERREIRA e MYATT, 2007, p. 436) Na obra de Beccaria Dos Delito e das Penas, observamos o conceito de Livre Arbítrio intricado ao conceito de Contrato Social, ou seja, a necessidade que os homens tiveram de ceder um pedaço de suas liberdades em prol do bem comum o que gerou o direito de punir, vejamos o que diz o mestre italiano: Assim sendo, somente a necessidade obriga os homens a ceder uma parcela de sua liberdade; disso advém que cada qual apenas concorda e pôr no depósito comum a menor porção possível dela, quer dizer, exatamente o necessário para empenhar os outros em mantê-lo na posse do restante. A Reunião de todas essas pequenas parcelas de liberdade constitui o fundamento do direito de punir. Todo exercício do poder que desse fundamento se afaste constitui abuso e não justiça; é um poder de fato e não de direito; constitui usurpação e jamais um poder legitimo. As penas que vão além da necessidade de manter o depósito da salvação pública são injustas por sua natureza; e tanto mais justas serão quão mais sagrada e inviolável for a segurança e maior a liberdade que o soberano propiciar aos súditos. (BECCARIA, 2003, p.19) 28 4. ESCOLA POSITIVA CRIMINOLOGICA É também na Itália que surge uma renovação do Direito Penal, os principais expoentes desse Movimento que ficou conhecido como Escola Positiva são: Lombroso (antropólogo), Ferri (Sociólogo) e Garofalo (jurista). Renovação motivada pelo aumento da criminalidade, mesmo com todos os esforços e teorização da Escola Clássica. Apesar de Garofolo ser o jurista dos citados, focaremos a nossa pesquisa em Ferri, o sociólogo que foi o principal crítico da Escola Clássica, como já referido neste trabalho monográfico. Além da criminalidade crescente, e do próprio positivismo de Augusto Conte, outros aspectos também contribuíram para o incremento da Escola Positiva nos fins do século XIX, como o avanço das ciências humanas e biológicas, é o que nos diz André Stefan: O avanço das ciências humanas e biológicas operado no final do século XIX marcou a decadência da Escola Clássica. Além disso, cumpre lembrar que os anseios em face do Direito Penal eram outros. Já não se via mais o antigo absolutismo do Estado ou o antigo arbítrio, violência e injustiça penal da época da Idade Média. A maior preocupação na segunda metade do século XIX era a crescente criminalidade (ESTEFAM, 2013, p. 58) As principais diferenças entre as duas escolas giram em torno do que foi pontuado do pensamento de Beccaria neste trabalho, a saber: o Método, e as questões sobre livre arbítrio e determinismo, que desembocam no próprio antagonismo entre Direito Natural e Direito Positivo. Seguimos com Estefan (2013, p. 59): Com referência ao fundamento da pena, a Escola Clássica positivista discordava seriamente da Clássica. A questão do livre-arbítrio, defendida pelos clássicos, era completamente rejeitada em no de um verdadeiro determinismo. 29 Ou o homem nasce livre e deve ser punido conforme suas escolhas voluntárias ou, desde o nascimento, já está determinado a ser um criminoso, em função de sua raça, sua psicologia, sua fisionomia e demais fatores biológicos e sociais. 4.1 - O Positivismo Filosófico A Escola Positiva Criminológica surge num momento em que a Filosofia positivista de Augusto Comte toma a primazia no pensamento ocidental. Dentro do pensamento de Comte já está incluído o cientificismo e o darwinismo que também influenciaram esta escola. Francesco Carnelutti diz que o Positivismo jurídico é projeção do positivismo filosófico no setor do Direito. O positivismo filosófico intensificou-se no século XIX, influenciado pelo método experimental empregado nas ciências da natureza. O positivismo pretendeu, assim, empregar o método no campo das ciências sociais. Segundo Paulo Nader (2013, p. 383): O trabalho científico deveria ter por base a observação dos fatos capazes de serem comprovados. A mera dedução, o raciocínio abstrato, a especulação, não possuíam dignidade científica, devendo pois, ficar fora de cogitação. Augusto Comte (1798-1857), já mencionado, é considerado o fundador do positivismo filosófico, Comte foi influenciado pelo filósofo francês Saint- Simon, do qual foi discípulo em Paris, a sua obra Curso de Filosofia Positiva é considerada como o marco do pensamento positivista. No entanto, o Positivismo não é um termo unívoco, podendo significar tanto a doutrina fundamentada por Comte quanto outras que se ligam ou se assemelham à mesma. Na Inglaterra Jonh Stuart Mill se destacou no Positivismo ligado ao Empirismo. No Brasil o Positivismo teve grande influência entre os primeiros líderes Republicanos como Luis Pereira Barreto, Miguel 30 Lemos, Benjamim Constant e outros. O Tema da Brasileira “Ordem e Progresso” é de inspiração Positivista. Já no século XX o Positivismo sofreu uma espécie de evolução ou adaptação e se tornou o Positivismo Lógico trabalhadoprincipalmente por pensadores do chamado Círculo de Viena. 4.2 Positivismo Jurídico. Inspirado no Positivismo Filosófico, o Positivismo Jurídico nega todos os princípios abstratos do Direito, a iniciar pelo conceito de Direito Natural. O Positivismo jurídico preocupa-se com o estudo da norma vigente, nessa tarefa segundo Nader (2013, p. 385): “... O investigador deverá utilizar apenas juízos de constatação ou de realidade, não considerando os juízos de valor”. O método de pesquisa utilizado pelo Positivismo, que é o mesmo utilizado por Ferri e que será um tópico a parte neste trabalho monográfico é o método indutivo, que se norteia na experiência factual, diferente do método dedutivo utilizado pelos clássicos. Atualmente, o Positivismo Jurídico é uma teoria em decadência, principalmente pelo fato de abordar o homem apenas materialmente, como um produto da física, reduziu-se toda a complexidade humana ao princípio da causalidade. Ao igualar o direito à lei, o positivismo acabou sendo um caminho fértil para regimes totalitários como o comunista, fascista ou nazista. Na opinião de Nader (2013, p. 385): O Direito não se compõe exclusivamente de normas, como pretende essa corrente. As regras jurídicas têm sempre um significado, um sentido, um valor a realizar. Os positivistas não se sensibilizaram pelas diretrizes do Direito. Apegaram-se tão somente ao concreto ao materializado.” 31 4.3 - Críticas de Ferri à Escola Clássica Escolhemos Ferri e Beccária como os principais representantes de suas Escolas, e consequentemente como principais opositores nas suas linhas de pensamento, balizaremos às críticas de Ferri à Escola Clássica no livro Delinquente e Responsabilidade Penal, de sua autoria. Na página 16 do referido livro de Ferri, notamos a oposição de métodos entre uma escola e outra, a saber o método dedutivo da Escola Clássica x método indutivo do Positivismo, sobre o método dedutivo já nos referimos em tópico no capítulo relacionado à Escola Natural, quanto ao método indutivo teremos tópico à parte para também explicarmos sobre o referido método, por hora, vamos às críticas de Ferri que tratando da oposição entre os métodos, acabam também deixando expostas a oposição de como se deve balizar as sanções aos crimes nas duas Escolas. No tocante ao individualismo da Pena, Ferri (2006, p. 15) preceitua: “Resulta, desse modo, que a vida e a ciência impõem à justiça penal a missão de ver e regular o crime, não somente como relação jurídica de infração de uma norma penal com suas correspondentes consequências jurídicas, mas também, e sobretudo, como expressão da personalidade do delinquente. A análise da personalidade do delinquente e a conseguinte aplicação da pena e medidas socioeducativas é a principal inovação que a Escola Positiva se gaba em relação á Escola Clássica”. Seguindo com Ferri sobre a sanção ao crime e sua aplicação: Dizemos que a sanção deve, mais que ser aplicada, ser adaptada, não ao crime, ainda que este seja a expressão sintomática de uma personalidade, mas ao delinquente, em razão do crime que cometeu... o crime não pode ser o ponto central da lei e da sentença, mas deve ser tão somente a condição preliminar do procedimento (referindo-se à punibilidade), e um dos elementos, o mais característico, para a individualizar a periculosidade do criminoso, 32 assim como a vida pregressa, a conduta ao ato, etc... (FERRI, 2006, p. 16). Continuando com Ferri, agora pontuando sobre a inovação que a Escola Positiva trouxe: Nisso consiste a profunda inovação metodológica e funcional que a Escola Positiva Penal levou, e levará cada vez mais, à justiça punitiva, teórica e prática, realizando, desta forma, condições mais favoráveis para uma defesa eficaz da sociedade contra a criminalidade e para uma reeducação social do criminoso (FERRI, 2006, p. 17). Avolumando cada vez mais suas críticas à Escola Clássica, Ferri muda o foco para se voltar ao livre arbítrio, conceito tão caro à Escola Clássica e que também já foi tópico nesse mesmo trabalho. Criticando o Livre arbítrio em favor do naturalismo, Ferri irá dizer que todo criminoso é um sujeito anormal, o que para a Escola Clássica nem sempre é verídico, já que uma pessoa normal usando de seu livre-arbítrio poderia cometer crimes. Vejamos o que o autor em comento diz sobre livre arbítrio e personalidade anormal: Admitindo-se o livre arbítrio, segundo o qual a ação do indivíduo não é mais que el fiat de uma vontade incondicionada, é possível afirmar logicamente que o delinquente pode ser um sujeito normal. Mas, negando-se o livre arbítrio ( determinismo), ou apenas o admitindo (como todos fazem agora) em sentido limitado e restrito, sob a influência das condições físico-psíquicas do individuo e das circunstâncias do ambiente, não é possível ignorar que o fato de reagir por meio de um crime indica que neste indivíduo há uma anormalidade psíquica (FERRI, 2006, p. 17-18). Continuando com suas críticas em relação à Escola Clássica no livro já citado, Ferri aborda uma questão que não é tema central deste trabalho, mas que é de importância para o Direito Penal, que é a questão da Associação Criminosa, que para o autor assume três formas ou graus de complexidade e que segundo ele, a Escola Clássica aborda apenas uma delas, sendo que as 33 outras formas são destacadas originalmente pela Escola Positiva. Vejamos sua abordagem sobre esses fatos: tema: No campo da criminalidade, o homem opera sozinho ou acompanhado de outros indivíduos. Neste caso, a associação criminosa assume três formas ou graus de complexidade crescentes: o casal criminoso, a associação para delinquir e a multidão criminosa. A Escola Clássica estudou apenas a segunda dessas formas: a primeira e a terceira foram destacadas pela primeira vez na justiça penal pela Escola Positiva e apresentam traços especiais e característicos em relação à periculosidade. O casal criminoso – não necessariamente formado por indivíduos de sexos diferentes – é integrado por um individuo de vontade forte (íncubo) que domina outro de vontade débil (súcubo); constitui o caso mais simples do crime coletivo e discorreremos dele a propósito das normas relativas à participação de várias pessoas no delito. A multidão delinquente assumiu na vida moderna grande importância por ser ocasião propícia ou causa de crimes coletivos (FERRI, 2006, p. 21). Voltando ao tema do Livre arbítrio e a crítica da Escola Positiva ao mesmo, Ferri irá citar alguns códigos penais do então século XIX, que começam a tomar posturas intermediárias com relação à punibilidade, mas ainda tratam apenas da simples voluntariedade como condição básica da punibilidade, são os Códigos penais Italianos de 1890 e o Espanhol de 1870. Na época dos referidos códigos já não bastava descumprir a lei para a punição, era preciso que esse descumprimento estivesse acompanhado pela vontade de violar a lei. Seguindo com as análises de Ferri sobre o Livre arbítrio e as críticas da Escola Positiva: Como consequência das críticas da Escola Positiva, que revelou que a existência do livre arbítrio não pode ser demonstrada cientificamente e foi negada por insignes teológicos e filosóficos, que de modo algum pode a justiça penal estar condicionada à crença da 34 liberdade de querer do criminoso, as legislações penais mais modernas, a começar pelo Código Penal italiano de 1890, reduziram aquela distinção à voluntariedade do fato (FERRI, 2006, p. 32). Sobre o princípio da voluntariedade e teorias intermediárias o autor em comento discorre: Este principio da voluntariedade foi eleito então entre as diversas “teorias intermediárias” que examinei e critiquei (liberdade de inteligência, normalidade, a capacidade de intimidação, identidade pessoal, etc), também porque já estava estabelecido noCódigo da Hungria (parágrafo 75), citado no Relatório Ministerial sobre o Projeto (I-XLVIII), e antes ainda, no Projeto de Código Penal para o Reino da Itália (1804-1808), para o qual colaborou Romagnosi. O artigo 13 deste Projeto dizia: “ Para que a violação da lei penal seja imputável ao sujeito, é preciso que esteja acompanhada pela vontade de violar a lei”; e o artigo 4º acrescentava: “ A vontade concorre diretamente (dolo) ou indiretamente (culpa)” (FERRI, 2006, p. 33). Entretanto, as teorias intermediárias, como o próprio nome supõe, acabaram por não abarcar acertadamente ou totalmente a ideia de crime culposo, pois os mesmos poderiam de forma precipitada ou errônea serem acolhidos pelo critério legal da voluntariedade já discorrido anteriormente. Sobre essa lacuna, Ferri (2006, p. 33) pontua: Mas foi fácil demonstrar que os crimes culposos, conhecidos popularmente como “involuntários”, poderiam, de modo equivocado, ser acolhidos pelo critério legal da voluntariedade. Existem, certamente, delinquentes culposos que, ainda que não desejem o resultado danoso, desejam o ato que a ele deu origem”. Ferri para exemplificar que existe um certo tipo de voluntariedade, mesmo nos crimes culposos, vai nos citar vários exemplos clássicos que constantemente são citados por autores atuais como o exemplo do caçador que dispara sua arma voluntariamente para matar um animal na floresta e acaba acertando e matando um homem que estava perto e não foi visto por 35 ele, mas que o caçador poderia ter previsto a possibilidade de que houvesse alguém ali. Outro exemplo que também já se tornou clássico que Ferri nos dá e que já está adaptado ao nosso tempo é do condutor de uma carruagem que voluntariamente coloca uma velocidade excessiva na mesma e sem querer acaba atropelando alguém. Há também o exemplo do indivíduo que solta fogos de artifícios, e sem querer, coloca fogo em um paiol. Com esses exemplos citados, Ferri nos mostra que a simetria formal de voluntariedade e crime não está correta, pois além da voluntariedade é preciso que o indivíduo deseje o resultado alcançado pela conduta imprudente, por isso mesmo a qualificação desse tipo de crime como culposo e não doloso. Ferri vai ainda mais longe em sua análise e diz que há certos tipos de crimes que o delinquente culposo não deseja sequer o ato inicial ilícito, ocorrendo esse tipo de crime principalmente na omissão de quem o pratica, como exemplos desse tipo de crime, escreve Ferri (2006, p. 34) Por exemplo o empregado do sistema ferroviário que, na cabine de comando, não move a alavanca para dar passagem ao trem que se anuncia, mas não porque intencionalmente tenha decidido não verificar a troca, nem tampouco, porque tenha de propósito, a fim de não cumprir o ato que seu dever lhe impõe, se embriagado por completo (caso em que seria um criminoso doloso, conforme artigo 312 do Código Penal), nem porque se equivoque ao mover voluntariamente a alavanca (caso em que será um delinquente culposo segundo artigo 314 do Código Penal), mas porque,, em virtude do sono, do cansaço, das preocupações com as mazelas familiares, etc, não imagina sequer que o trem passará em algum momento, por isso, nem prensa em mover a alavanca, não tem vontade, nem intenção, nem realiza ato algum; mas de sua omissão involuntária (inobservância dos regulamentos) deriva o desastre.” Ferri conclui seu pensamento sobre a ação psíquica de um delinquente dizendo que é preciso a integração do trinômio: vontade, intenção e 36 consequência ou fim, e para explanar sua formula, o autor desenvolve gradativamente o seguinte caso: pg 36 Um homem tem a ideia de disparar uma arma; a ideia se transforma em vontade; a vontade determina a ação do disparo. Mas qual a intenção que acompanha a vontade e guia esta ação? Se o sujeito ativo teve somente a intenção de realizar uma demonstração de júbilo, disparando para cima sem causar dano de nenhuma espécie, e o faz e pleno campo, o ato é juridicamente indiferente; se dispara “ em lugar habitado ou em suas proximidades”, a ausência de intenção ofensiva indica que aquele homem não é um criminoso, ainda que possa ser – em virtude daquele ato – autor de uma contravenção (artigo 467 do Código Penal). Mas se o disparo causou morte ou lesão a alguém, a falta de atenção do sujeito ativo faz dele – além de ser autor de uma contravenção – um criminoso “involuntário” ou culposo ( artigos 375 e 371 do Código Penal). Mas se o sujeito atira contra um homem com a intenção de mata-lo, intervém o fim – meta final e concreta da propulsão volitiva e da direção intencional - , no objeto de decidir se é um homicida criminoso ou não. Será criminoso se quis o resultado e atirou com a intenção de matar o sujeito passivo com a finalidade (motivo determinante) de apoderar-se do que levava,, de se vingar, de cumprir uma ordem criminosa, etc. Não será criminoso se, querendo atirar e disparando de fato com a intenção de matar aquela pessoa, queria se defender de uma agressão injusta (FERRI, 2006, p. 36-37). Seguindo com suas críticas aos Escritores Clássicos e Neo Clássicos, e de acordo com alguns exemplos já narrados neste trabalho, Ferri adentra ao campo da avaliação psíquica dos delinquentes, e cita quatro tipos psicológicos de criminosos, a saber: Voluntários ou dolosos (vontade anormal); involuntários ou culposos (falha de atenção e previsão); conscientes, mas com vontade imatura (menoridade) ou enferma (loucura ou psicopatia lúcida, loucura moral, etc); inconscientes (crianças, idiotismo, automatismo psíquico, delírio etc). 37 A reprovação destes estados de ânimo e tipos psicológicos aumenta para os dolosos, cai nos culposos, quase desaparece nos de vontade imatura e não existe para os inconscientes. Ferri afirma que a Escola Clássica levou essa graduação ética até a justiça punitiva com o fim de realizar a avalição jurídica, o que é visto nos Códigos Penais de sua época com exceção dos projetos do Código Penal Russo de 1927 e no Cubano de 1926, mas que pela força da experiência, os criminalistas clássicos e neoclássicos acabaram cedendo e admitindo medidas de segurança para os tipos psicológicos de vontade doente ou inconsciente. Vejamos o que preceitua Ferri sobre este tema pg 46: A escola Penal Clássica, responsável pela continuação das tradições medievais, levou esta graduação ética até a justiça punitiva com o fim de realizar a avaliação jurídica. Por isso, diz-se e repete-se, também nos Códigos Penais (exceto em nosso Projeto, no novo Código Penal russo de 1927 e no Projeto cubano de 1926), que apenas os delinquentes voluntários, e excepcionalmente os involuntários, estão submetidos às normas penais, enquanto os conscientes de vontade enferma estão em parte submetidos e os inconscientes estão totalmente fora. No que diz respeito aos últimos tipos, afirmou-se primeiro, que não pertenciam à justiça penal, por ser absurdo e contraditório falar de loucos criminosos; mas, depois, cedendo à força da experiência, os criminalistas clássicos e neoclássicos, de acordo com os Códigos Penais mais recentes, admitiram que a autoridade judicial, e incluindo apenas a autoridade administrativa, possa se ocupar deles com medidas de segurança, já que de acordo com a lei inglesa em tais casos, o acusado é “culpado” (de fato), “mas louco” (guilty but insane) (FERRI, 2006, p. 46-47). Escola Positiva prega que o indivíduo sofrerá as consequências de suas condutas perante a lei qualquer que seja sua condição psíquica no instante do cometimento de um crime, que uma pretensa medição de culpa moral dos indivíduos, pertence aos campos da religião ou filosofia, mas não ao Direito. Seguindo com Ferri sobre moral, Religião e condição psíquica: 38 Por outro lado, a Escola Positiva sustenta que, não podendo a justiça humana, poisnão possui a onisciência de Deus, medir a culpa moral dos indivíduos ( que é problema que corresponde à religião e à filosofia, mas não ao Direito), devendo, ao revés, prover a defesa social contra todos os autores de crimes, estes serão submetidos às normas de tal defesa, sofrendo as consequências de suas condutas e respondendo ante a sociedade sobre seu modo de proceder, qualquer que seja a condição psíquica de sua pessoa no momento da realização do crime (FERRI, 2006, p. 47). Criticando novamente a doutrina do Livre arbítrio, Ferri segue tentando mostrar uma certa incoerência destra doutrina dentro do próprio campo teológico e para isso vai utilizar a doutrina da predestinação que rivaliza historicamente com a doutrina do Livre arbítrio na exegese bíblica. Para este fim, Ferri usará até mesmo Santo Agostinho que oscilou entre as duas doutrinas e que já foi citado neste mesmo trabalho monográfico. Seguindo com Ferri e a temática do Livre arbítrio: Até o ponto que, para os fiéis, não é possível no terreno lógico (ainda que seja no emocional e místico) conciliar esta livre-vontade e os dogmas de predestinação e da onisciência e onipotência divinas. Porque, segundo este, “não se move uma folha sem que seja vontade de Deus”, Deus sabe e permite que o filho que hoje premedita matar seu pai por afã de lucro, amanhã cumpra o nefando propósito... Assim, pelo menos, pensava Santo Agostinho que resistiu em reconhecer o livre-arbítrio por causa da degradação moral em que caíram e seguiram caindo os homens em função do pecado original. O fiel sincero praticamente resolve o problema, porque a teologia com profunda sapiência psicológica, ensina que a fé consiste em crer também no absurdo, no ilógico (FERRI, 2006, p. 50). 5 - C.S LEWIS COMO SÍNTESE ENTRE AS DUAS ESCOLAS Os Códigos penais atuais dos países estão fundamentados na Teoria positivista, no entanto, já foi tratado neste Trabalho Monográfico que o próprio Positivismo Jurídico encontra-se em decadência. Esses Códigos já não são tão 39 novos assim, o Brasileiro é de 1930 e é evidente que a tendência de reforma nos códigos é por uma linha plural e minimalista do Direito Penal, sendo que a tendência é de não retornar ao embasamento filosófico da Escola Clássica, pelo menos em algumas bases, noutras sim, como é o caso do livre arbítrio que é aceito na sociedade pós-moderna. Mas como relacionar filosoficamente o livre-arbítrio com um novo modelo penal? Levando em consideração que o positivismo minimizou o livre-arbítrio da Teoria Criminológica?. Entretanto, encontramos na própria Teologia, já no século XX, um autor que partiu do livre arbítrio para se falar do homem delituoso, trata-se do autor cristão C.S Lewis. C.S LEWIS foi um escritor, professor e crítico literário britânico. Ficou conhecido por seu trabalho sobre literatura medieval, por suas palestras e escritos cristãos, como também pela série de sete livros de ficção e fantasia intitulada “As Crônicas de Nárnia”. C.S.Lewis é louvado na Teologia contemporânea como um dois maiores apologistas do cristianismo. Suas principais publicações foram: “O Problema do Sofrimento” (1940), “Cartas de Um Diabo ao Seu Aprendiz” (1942), “Milagre” (1947), “Cristianismo Puro e Simples” (1952) e “As Crônicas de Nárnia”, uma série de sete romances de ficção e fantasia: “O Leão, a Feiticeira e o Guarda Roupa” (1950), “Príncipe Caspian” (1951), “A Viagem do Peregrino da Alvorada” (1952), “A Cadeira de Prata” (1953), “O Cavalo e Seu Menino” (1954), “O Sobrinho do Mago” (1955) e “A Última Batalha” (1956). 5.1 C.S Lewis e a Lei Natural Já defendemos neste trabalho monográfico que o Conceito de Direito Natural ou Lei Natural é a base que fundamenta a Escola Clássica do Direito, por conseguinte, a Escola Positiva não deu muito destaque a esse conceito. Para balizarmos o que C.S Lewis tem a falar sobre o referido conceito, utilizaremos o livro Cristianismo Puro e Simples de sua autoria. O livro Cristianismo Puro e Simples surgiu de uma série de palestras que o referido 40 autor proferiu em programas de Rádio na Inglaterra impressas com poucos acréscimos do que foi falado ao microfone, segundo o próprio autor. O Contexto dessas palestras se insere na II Guerra Mundial, como nos informa o Prefácio- Introdução do próprio livro : Ainda rapaz, C. S. Lewis serviu nas pavorosas trincheiras da Primeira Guerra Mundial e, em 1940, quando as bombas começaram a cair sobre a Inglaterra, se alistou como oficial da vigilância antiaérea e passou a dar palestras para os soldados da Royal Air Force, homens que sabiam, com quase toda a certeza, que seriam dados como mortos ou desaparecidos depois de apenas treze missões de bombardeio. A situação deles incitou Lewis a falar sobre os problemas do sofrimento, da dor e do mal. Estes trabalhos resultaram no convite da BBC para que ele fizesse uma série de programas de rádio sobre a fé crista. Ministradas de 1942 a 1944, estas conferências radiofónicas foram mais tarde reunidas no livro que conhecemos hoje como Cristianismo puro e simples (LEWIS, 2005, p. 8) O Capitulo I do livro tem como título: “ A Lei da Natureza Humana”, em que o Autor discorre sobre a Lei Natural, a mesma da História do Direito e da Filosofia já abordadas neste trabalho. Lewis afirma que a Lei Natural, na verdade é a Lei da Natureza Humana, ou Lei do Certo e Errado, como afirmavam os pensadores do passado, e não as Leis naturais modernas como as leis da gravitação ou da biologia. Segundo Lewis: Hoje em dia, quando falamos das "leis naturais", quase sempre nos referimos a coisas como a gravitação, a hereditariedade ou as leis da química. Porém, quando os pensadores do passado chamavam a lei do certo e do errado de "Lei Natural", estava implícito que se tratava da Lei da Natureza Humana. A ideia era a seguinte: assim como os corpos são regidos pela lei da gravitação, e os organismos, pelas leis da biologia, assim também a criatura chamada "homem" possui uma lei própria - com a grande diferença de que os corpos não são livres para escolher se vão obedecer à lei da gravitação ou não, ao passo 41 que o homem pode escolher entre obedecer ou desobedecer à Lei da Natureza Humana (LEWIS, 2005, p. 10) De acordo com Lewis, sendo a Lei Natural a mesma Lei do Certo e do Errado, era uma Lei conhecida implicitamente por todas as pessoas, sendo que não se precisava o aprendizado da mesma, nas Palavras de Lewis (2005, p. 10): Essa lei era chamada de Lei Natural porque as pessoas pensavam que todos a conheciam naturalmente e não precisavam que outros a ensinassem. Isso, evidentemente, não significava que não se pudesse encontrar, aqui e ali, um indivíduo que a ignorasse, assim como existem indivíduos daltônicos ou desafinados. Considerando a raça humana em geral, no entanto, as pessoas pensavam que a ideia humana de comportamento digno ou decente era óbvia para todos. Lewis, também não se furta de pautar às críticas ao seu pensamento, observamos isto durante toda essa obra, por isso, neste trabalho, citaremos também as objeções que o próprio autor levanta sobre o seu pensamento, começando pela crítica que diz que a Lei Natural não é intrínseca ao ser humano: Sei que certas pessoas afirmam que a ideia de uma Lei Natural ou lei de dignidade de comportamento, conhecida de todos os homens, não tem fundamento, porque as diversas civilizações e os povos das diversas épocas tiveram doutrinas morais muito diferentes Mas isso não é verdade. E certo que existem diferenças entre as doutrinas morais dos diversos povos, mas elas nunca chegaram a constituir algo que se assemelhasse a uma diferença total. Se alguém se der ao trabalho de comparar os ensinamentos morais dos antigos egípcios, dos babilónios, dos hindus, dos chineses, dos gregos e dos romanos, ficará surpreso, isto sim, com oimenso grau de semelhança que eles têm entre si e também com nossos próprios ensinamentos morais (...) Os povos discordaram a respeito de quem são as pessoas com quem você deve ser altruísta - sua família, seus compatriotas ou todo o género humano; mas sempre concordaram em que você não deve colocar a simesmo em primeiro lugar. O egoísmo nunca foi 42 admirado. Os homens divergiram quanto ao número de esposas que podiam ter, se uma ou quatro; mas sempre concordaram em que você não pode simplesmente ter qualquer mulher que lhe apetecer (LEWIS, 2005, p. 10) C.S Lewis prossegue com mais exemplos para mostrar que todos os humanos seguem a Lei Natural do Certo e do Errado, pois todos, algum dia falarão que algo não é justo, até mesmo os governos reconhecem que certos tratados não são justos, só que na verdade, nenhum ser humano segue à risca a Lei do Certo e do Errado, ou seja mais cedo ou mais tarde, todos acabam descumprindo a velha máxima moral de ‘não se fazer aos outros, aquilo que você não queria que os outros fizessem a você”, e quando isso acontece, as desculpas são muitas, é o que nos aponta Lewis (2005, p.11): Espero que vocês não se irritem com o que vou dizer. Não estou fazendo uma pregação, e Deus sabe que não pretendo ser melhor do que ninguém. Só estou tentando chamar a atenção para um fato: o de que, neste ano, neste mês ou, com maior probabilidade, hoje mesmo, todos nós deixamos de praticar a conduta que gostaríamos que os outros tivessem em relação a nós. Podemos apresentar mil e uma desculpas por termos agido assim. Você se impacientou com as crianças porque estava cansado; não foi muito correto naquela questão de dinheiro - questão que já quase fugiu da memória -porque estava com problemas financeiros; e aquilo que prometeu parafulano ou sicrano, ah!, nunca teria prometido se soubesse como estaria ocupado nos últimos dias. Quanto a seu modo de tratar a esposa (ou o marido), a irmã (ou o irmão) — se eu soubesse o quanto eles são irritantes, não me surpreenderia; e, afinal de contas, quem sou eu para me intrometer? Não sou diferente. C.S.Lews dirá que o próprio ato de buscarmos desculpas para uma conduta que consideramos errada, já são uma prova na profunda crença na Lei Natural do Certo e do Errado intrínseca no ser humano. Lewis também faz uma excelente observação de que são só para as más condutas que buscamos explicações ou justificativas, para as boas condutas ou qualidades assumimos os méritos, sobre isso, nos alerta: 43 A verdade é que acreditamos a tal ponto na decência e na dignidade, e sentimos com tanta força a pressão da Soberania da Lei, que não temos coragem de encarar o fato de que a transgredimos. Logo, tentamos transferir para os outros a responsabilidade pela transgressão. Perceba que é só para o mau comportamento que nos damos ao trabalho de encontrar tantas explicações. São somente as fraquezas que procuramos justificar pelo cansaço, pela preocupação ou pela fome. Nossas boas qualidades, atribuímo-las a nós mesmos (LEWIS, 2005, p. 11) C.S.LEWIS ainda na página 11 do referido livro, faz uma síntese do que quis transmitir sobre a Lei Natural, que em todo o mundo, as pessoas possuem a noção de um padrão de comportamento e que não conseguem se livrar desse padrão, por mais que tentem, por outro lado, ninguém consegue seguir esse padrão de comportamento fielmente, ou seja, todos transgridam a chamada “Lei Natural”, e que esses fatos são a base de todo o pensamento claro sobre nós mesmos e do universo em que habitamos. 5.1.1 Algumas objeções à Lei Natural Lewis em sua obra referida, não se furta em levantar objeções ao Conceito de Lei Natural, para na verdade, responde-las e embasar ainda mais o conceito. Obviamente essas objeções são fedebacks de pessoas para com o Escritor, pessoas essas que não acreditam no conceito de Lei Natural intrínseca ao ser humano como leciona Lewis. A primeira objeção narrada por Lewis em sua obra é o questionamento de que a Lei Natural seria apenas o nosso instinto Gregário desenvolvido naturalmente como os outros nossos instintos. Vejamos o que escreve Lewis sobre essa dúvida e a sua própria resposta: (...) ‘Isso que você chama de Lei Moral não é simplesmente o nosso instinto gregário? Será que ele não se desenvolveu como todos os nossos outros instintos?" Não vou negar que possuímos esse instinto, 44 mas não é a ele que me refiro quando falo em Lei Moral. Todos nós sabemos o que é ser movido pelo instinto — pelo amor materno, o instinto sexual ou o instinto da alimentação: sentimos o forte desejo ou impulso de agir de determinada maneira. E é claro que, às vezes, sentimos o desejo intenso de ajudar outra pessoa. Isso se deve, sem dúvida, ao instinto gregário. No entanto, sentir o desejo intenso de ajudar é bem diferente de sentir a obrigação imperiosa de ajudar, quer o queiramos, quer não. Suponhamos que você ouça o grito de socorro de um homem em perigo. Provavelmente sentirá dois desejos: o de prestar socorro (que se deve ao instinto gregário) e o de fugir do perigo (que se deve ao instinto de auto-preservação). Mas você encontrará dentro de si, além desses dois impulsos, um terceiro elemento, que lhe mandará seguir o impulso da ajuda e suprimir o impulso da fuga. Esse elemento, que põe na balança os dois instintos e decide qual deles deve ser seguido, não pode ser nenhum dos dois (LEWIS, 2005, p. 12) Saindo da dúvida no campo biológico, as dúvidas sobre a existência da lei Natural também aparecem no campo sociológico, ou seja, seria a Lei Moral não apenas uma convenção social? Algo posto pela nossa cultura e educação? Seguimos com a resposta de C.S.Lewis a esse questionamento: pg 13: (...) quando você considera as diferenças morais entre um povo e outro, não pensa que a moral de um dos dois é sempre melhor ou pior que a do outro? Será que as mudanças que se constatam entre elas não foram mudanças para melhor? Caso a resposta seja negativa, então está claro que nunca houve um progresso moral. O progresso não significa apenas uma mudança, mas uma mudança para melhor. Se um conjunto de ideias morais não fosse melhor do que outro, não haveria sentido em preferir a moral civilizada à moral bárbara, ou a moral cristã à moral nazista. E ponto pacífico que a moralidade de alguns povos é melhor que a de outros. Acreditamos também que certas pessoas que tentaram mudar os conceitos morais de sua época foram o que chamaríamos de Reformadores ou Pioneiros - pessoas que entenderam melhor a moral do que seus contemporâneos (LEWIS, 2005, p. 13) 45 5.2. C.S. Lewis e o Livre Arbítrio Na dialética deste Trabalho Monográfico, outro termo ou conceito comparativo importante entre as duas escolas analisadas é o de Livre Arbítrio, já trouxemos o que ambas escolas criminológicas, a Clássica e a Positiva pensam sobre o mesmo, observamos que é o conceito que mais separa as duas escolas. Neste trabalho que visa uma síntese entre as duas escolas criminológicas abordadas, vislumbramos através da leitura de C.S. Lewis que o mesmo corrobora com a visão da Escola Clássica sobre o Livre Arbítrio, ou seja, defende o escritor que o ser humano é dotado de tal atributo. Continuando o proposto nesse tópico do Trabalho, de analisar os conceitos já citados, na obra de LEWIS, denominada Cristianismo Puro e Simples, seguimos nosso intento encontrando na página 23 do referido livro, as primeiras abordagens de Lewis sobre o Livre Arbítrio. Para LEWIS, Livre Arbítrio é uma decorrência lógica, ou mesmo a causa dos seres humanos conseguirem agir muitas vezes em desacordo com a Lei Natural. Para o escritor, Deus dotou o ser humano com o livre arbítrio e por isso o ser humano pode fazer tanto o bem quanto o mal e vai ainda mais longe nesse pensamento, para o Escritor a própria existência do mal é decorrência
Compartilhar