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terapia-centrada-no-cliente-um-caminho-sem-voltapdf

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II
© Copyright Tambara, Newton© Copyright Tambara, Newton
Freire, ElizabethFreire, Elizabeth
IIaa edição: 1999 edição: 1999
1500 exemplares1500 exemplares
ATENÇÃO: evite fotocópias, em respeito aos direitos dos autoresATENÇÃO: evite fotocópias, em respeito aos direitos dos autores
Este livro pode ser encomendado:Este livro pode ser encomendado:
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Fone: (51) 222.5130 - Fax: 395.3739Fone: (51) 222.5130 - Fax: 395.3739
Editoração e diagramação:Editoração e diagramação:
Norberto Coronel Garcia - Fone: (51) 983.9748Norberto Coronel Garcia - Fone: (51) 983.9748
Newton TambaraNewton Tambara
Elizabeth FreireElizabeth Freire
Participação Especial:Participação Especial:
Jerold D. BozarthJerold D. Bozarth
TERAPIA CENTRADA NO CLIENTETERAPIA CENTRADA NO CLIENTE
Teoria e PráticaTeoria e Prática
UM CAMINHO SEM VOLTA...UM CAMINHO SEM VOLTA...
Edições:Edições:
DD E LE L P HP H O SO S
Porto Alegre - 1999Porto Alegre - 1999
AGRADECIMENTOSAGRADECIMENTOS
 A meu  A meu irmão irmão Ricardo, Ricardo, por tpor ter sempre er sempre acreditado acreditado em mim.em mim.
 A minha  A minha filha Ana filha Ana Cristina, Cristina, a Fernando a Fernando e Júlia, e Júlia, que iluminaque iluminam minham minha
vida com a sua presença.vida com a sua presença.
 Ao mestre e amigo Mau Ao mestre e amigo Mauro Amatuzzi ro Amatuzzi pelo incentivo, pelos questipelo incentivo, pelos questionaona
mentos e por me orientar no caminho do pensamento científico.mentos e por me orientar no caminho do pensamento científico.
 Elizabeth  Elizabeth FreireFreire
 A min A minha fha filha ilha Marina Marina Rolim Rolim Tambara e Tambara e a Sua Suzana Rolizana Rolim Tambara m Tambara comcom
quem aprendi um caminho sem volta...quem aprendi um caminho sem volta...
 Agradeço  Agradeço aos coaos colegas legas João João Carlos Carlos Karling, Karling, Lisandra Lisandra Oliveira, Oliveira, MarleneMarlene
de Ávila, Verena Augustin Hoch, Angela Machado, Cátia de Ávila, Verena Augustin Hoch, Angela Machado, Cátia Stumpf, RoseStumpf, Rose
 Bertolin,  Bertolin, Anísio Anísio Meinertz, Gilberto Meinertz, Gilberto Kronbauer, Kronbauer, Eva Eva Lúcia da Lúcia da Silva, Silva, TâniaTânia
 Reis, Jeferson  Reis, Jeferson Irazoqui, Irazoqui, Sérgio Sérgio Gobbi, Gobbi, Aldo Meneghetti, Aldo Meneghetti, Silvia Silvia Wudarcki,Wudarcki,
 Lúcio  Lúcio Schossler Schossler e a e a todos qtodos que cue compartilharam ompartilharam do do sonho de sonho de um Inum Institutostituto
 Humanista  Humanista que hque hoje é oje é realidade.realidade.
 Newton  Newton TambaraTambara
 A  A Jerold Jerold D. D. Bozarth, Bozarth, pelo pelo apoio apoio e e estímulo estímulo recebidos. recebidos. Por Por suasua
colaboração especial que a muito nos honra.colaboração especial que a muito nos honra.
 A João  A João Carlos Karling, Carlos Karling, pela cuidadpela cuidadosa e osa e zelosa revisão zelosa revisão dos odos originais.riginais.
 A Marcos  A Marcos Vinícius Vinícius Beccon pela Beccon pela tradução tradução do ado artigo rtigo de Bode Bozarth.zarth.
Os autoresOs autores
SUMÁRIO
Apresentação 13
Prefácio 15
1. As origens e o desenvolvimento da terapia centrada-no-cliente 33
2 .0 nascimento da terapia centrada-no-cliente 35
3. Uma relação essencialmente não-diretiva 38
4. A aceitação como a essência do processo terapêutico 39
5. O cliente não é um paciente 42
6. O desenvolvimento pioneiro de pesquisas em psicoterapia 44
7. A confiança na capacidade do cliente 46
8. A tendência direcional formativa 53
9. A atitude centrada-no-cliente 56
10. As objeções ao diagnóstico psicológico 62
10.1. O psicodiagnóstico é desnecessário para o sucesso da
psicoterapia 63.
10.2. O psicodiagnóstico é prejudicial para o indivíduo 64
11. A Teoria do Auto-conceito 66
12. A mudança terapêutica 75
13. As atitudes facilitadoras da mudança terapêutica 80
13.1. Consideração positiva incondicional 80
13.2. Compreensão empática 82
13.3. Congruência 86
13.4. Condições mais que necessárias: suficientes 87
13.5. As pesquisas sobre as atitudes facilitadoras 88
13. 6.0 conceito de experienciação 90
14. A abordagem centrada-na-pessoa 92
14.1. Grupos de Encontro 93
14.2. O ensino centrado no aluno 95
14.3. Workshops de comunidade 96
14.4. Relação entre a terapia centrada-no-cliente e a abordagem
centrada-na-pessoa 99
14.5.Umjeitodeser 102
14. 6.0 desenvolvimento de uma comunidade centrada-na-pessoa... 103
14.7. Publicações atuais 105
15. Mitos, incompreensões e distorções 108
Além da Teoria.  123
"Você me tirou da lata do lixo" 125
16. A comunicação entre terapeuta e cliente 127
16.1. A reiteração 128
16 .2 .0 reflexo de sentimentos 131
16.3. A elucidação 199
16 .4 .0 desvelamento 141
16.5. Diferença entre atitudes e técnicas terapêuticas 145
16.6. A estruturação da relação terapêutica 146
17. O desenvolvimento do terapeuta 150
17.1 . As dificuldades para centrar-se no cliente 153
17.2. As atitudes diretivas 156
17.3. As atitudes tutelares 162
17.4. A racionalização 165
17. 5.0 silêncio 166
17.6. As perguntas do cliente 169
17.7. Falsificando a experiência do cliente: "o contrabando" 172
17.8. As etapas no desenvolvimento do terapeuta 173
Na Introdução confessa: "Às vezes fico espantado com asNa Introdução confessa: "Às vezes fico espantado com as
mudanças ocorridas em minha vida e trabalho" (P. VII).mudanças ocorridas em minha vida e trabalho" (P. VII).
Após se referir ao livro escrito em 1941 (publicado em 42):Após se referir ao livro escrito em 1941 (publicado em 42):
"Psicoterapia e Consulta Psicológica"),"Psicoterapia e Consulta Psicológica"),  'deu-se conta de estar  'deu-se conta de estar
pensando e trabalhando com pessoas de modo diverso de outrospensando e trabalhando com pessoas de modo diverso de outros
profissionais'); em 1951 e 1961, confessa, o impacto causado porprofissionais'); em 1951 e 1961, confessa, o impacto causado por
Tornar-se PessoaTornar-se Pessoa "obrigou-me a abandonar a estreita perspectiva, "obrigou-me a abandonar a estreita perspectiva,
pensando interessar o que escrevia somente a terapeutas. pensando interessar o que escrevia somente a terapeutas. Essa reaçãoEssa reação
alargou os horizontes da minha vidalargou os horizontes da minha vida e pensamento. Creio a e pensamento. Creio o que haviao que havia
escrito até então era válido igualmente ao casal, à família, à escola, àescrito até então era válido igualmente ao casal, à família, à escola, à
administração ou relações entre cultura e paísadministração ou relações entre cultura e país es" (P. VIII).es" (P. VIII).
O leitor perceberá, agora, a razão da abertura do leque deO leitor perceberá, agora, a razão da abertura do leque de
interesses de Rogers a partir dos anos interesses de Rogers a partir dos anos sessenta, abertura retratada emsessenta, abertura retratada em
artigos e livros, como as publicações citadas acima de artigos e livros, como as publicações citadas acima de 1961969 e 9 e 19701970..
A expansão dos horizontes afetou, inclusive, a terminologia, espeA expansão dos horizontes afetou, inclusive, a terminologia, espe
lhando os pontos de vista atuais:lhando os pontos de vista atuais:
Assim, "o velho conceito anterior de 'terapia centrada noAssim, "o velho conceito anterior de 'terapia centrada no
cliente' cedeu lugar à 'abordagem centrada na pessoa'. Em outrascliente' cedeu lugar à 'abordagem centrada na pessoa'. Em outras
palavras, já não falo mais simplesmente em psicoterapia, mas empalavras, já não falo mais simplesmente em psicoterapia, mas em
ponto de vista, numa filosofia, enfoque de vida, umponto de vista, numa filosofia, enfoque de vida, um  jeito de ser, jeito de ser, com com
aplicação a qualquer situação na qualaplicação a qualquer situação na qual  crescimento crescimento — quer de uma — quer de uma
pessoa, de um grupo ou comunidade - fapessoa, de um grupo ou comunidade - faz parte do objetivo" z parte do objetivo"(P IX).(P IX).
Depositava Rogers inquebrantável confiança nas possibilidadesDepositava Rogers inquebrantável confiança nas possibilidades
e na bondade 'fundamental' da pessoa. Até o fim.e na bondade 'fundamental' da pessoa. Até o fim.  O jeito de ser  O jeito de ser  do do
interlocutor pode despertar tais potencialidades, avivar a bondadeinterlocutor pode despertar tais potencialidades, avivar a bondade
adormecida.adormecida.
Após sair para atuar Após sair para atuar em arena maiorem arena maior, tão solicitado era , tão solicitado era queque
somente podia aceitar uma de cada somente podia aceitar uma de cada vinte convites para conferências,vinte convites para conferências,
entrevistas, debates ou grupos de crescimento.entrevistas, debates ou grupos de crescimento.
Queda, com fratura óssea e complicações ulteriores, nãoQueda, com fratura óssea e complicações ulteriores, não
somente o impediu de atender a segunda viagem agendada à Uniãosomente o impediu de atender a segunda viagem agendada à União
Sul-Africana, mas no-lo arrebatou do convívio em 1987, aos 85Sul-Africana, mas no-lo arrebatou do convívio em 1987, aos 85
frutuosíssimos anos de vida.frutuosíssimos anos de vida.66
6. A tradução brasileiro de "Um Jeito de Ser" 6. A tradução brasileiro de "Um Jeito de Ser" contém 8 dos 15 capítulos do original. Os demais já haviam sidocontém 8 dos 15 capítulos do original. Os demais já haviam sido
publicados em "A Pessoa como Centro" publicados em "A Pessoa como Centro" (Rogers/Rosemb(Rogers/Rosemberg, erg, 1977)1977). - A . - A tradução espanhola tampoucotradução espanhola tampouco
reproduz integralmente o livro.reproduz integralmente o livro.
Qual é esse "jeito de ser" rogeriano?Qual é esse "jeito de ser" rogeriano?
Fundamentalmente consiste emFundamentalmente consiste em certas atitudes certas atitudes que, por sua que, por sua
vez, emanam da adoção de certos valores, vez, emanam da adoção de certos valores, de certa visão da pessoa -de certa visão da pessoa -
isto é, da visão de si isto é, da visão de si e dos outros. Do eu-tu.e dos outros. Do eu-tu. 77
Em 1957, expôs Rogers asEm 1957, expôs Rogers as  condições necessárias e suficientes condições necessárias e suficientes
para a psicoterapia.para a psicoterapia.88 São três as indispensáveis (e bastantes) quanto São três as indispensáveis (e bastantes) quanto
ao terapeuta:ao terapeuta:
IIaa Consideração positiva incondicional do cliente, Consideração positiva incondicional do cliente,  atitude que atitude que
resulta em aceitação (não significa necessariamente aprovação)resulta em aceitação (não significa necessariamente aprovação)
incondicional do outro. Embora nincondicional do outro. Embora não 'ão ' aprove' aprove' a fratua fratura do paciente, ora do paciente, o
médico o recebe, 'amédico o recebe, 'a ceita' ceita' o acidentado como eo acidentado como este lhe aparece, pondoste lhe aparece, pondo
organismo em condições de reagir favoravelmente à situação. Oorganismo em condições de reagir favoravelmente à situação. O
psicoterapeuta não põe condições. Por ex., se psicoterapeuta não põe condições. Por ex., se for genfor gentil, agradecido,til, agradecido,
bem educado, se puder pagar integralmente os honorários... eu lhebem educado, se puder pagar integralmente os honorários... eu lhe
terei consideração positiva. O terei consideração positiva. O fato de o indivíduo ser a maravilha defato de o indivíduo ser a maravilha de
uma pessoa é que, naturalmente, o leva a essa valorização. O outrouma pessoa é que, naturalmente, o leva a essa valorização. O outro
possui, como eu, possui, como eu, as mesmas necessidades fundamentaias mesmas necessidades fundamentais (entre s (entre elas,elas,
a de ser valorizado), sentimentos idênticos, desejo de bem-estar ea de ser valorizado), sentimentos idênticos, desejo de bem-estar e
felicidade, de felicidade, de crescer comcrescer como pessoa, etc. Afinal, colegas de viago pessoa, etc. Afinal, colegas de viagemem
no trem (ou aeronave) da vida, sonhando ambos com bela e longano trem (ou aeronave) da vida, sonhando ambos com bela e longa
 jornada. M jornada. Minha presença poinha presença pode tornar o trajde tornar o trajeto mais agradável para oeto mais agradável para o
outro desfrutar toda a riqueza possível de experiências satisfatóriasoutro desfrutar toda a riqueza possível de experiências satisfatórias
desses 'dias', quer dizer, anos de existência.desses 'dias', quer dizer, anos de existência.
Peretti, um dos grandes seguidores de Rogers e um dos meusPeretti, um dos grandes seguidores de Rogers e um dos meus
significativos professores em Paris (1966-67), diz belamente: "Osignificativos professores em Paris (1966-67), diz belamente: "O
terapeuta (o facilitterapeuta (o facilitador), apoiado em si mesmo e ador), apoiado em si mesmo e 'centrado no cliente'centrado no cliente ',',
é é  preciso que se distancie suficientemente de si mesmo a fim de cuidar preciso que se distancie suficientemente de si mesmo a fim de cuidar
do outro".do outro".99
Rogers, por sua vez, Rogers, por sua vez, confessconfessa:a:
"Eu escuto tão cuidadosa e atentamente, com toda a"Eu escuto tão cuidadosa e atentamente, com toda a
sensibilidade de que sou capaz, cada pessoa que diz algo desensibilidade de que sou capaz, cada pessoa que diz algo de
si. Quer a mensagem seja superficial ou significativa, eu escuto.si. Quer a mensagem seja superficial ou significativa, eu escuto.
 I  I  Cl Buber. Eu-Tu, s.d.Cl Buber. Eu-Tu, s.d. , e , e Tu indivTu individual ou idual ou comunitário, 1987.comunitário, 1987.
8. O 8. O leitor encontra o artigo no livro de Woleitor encontra o artigo no livro de Wood, 1995, p. od, 1995, p. 157-17157-179.9.
'i Peetti, 1997, p. 210.'i Peetti, 1997, p. 210.
--
Para mim, a pessoa que fala é plena de valor (worthwhile),Para mim, a pessoa que fala é plena de valor (worthwhile),
digna de ser compreendida [...] Colegas dizem que, nestedigna de ser compreendida [...] Colegas dizem que, neste
sentido, sentido, 'valido' a 'valido' a pessoa." pessoa." ww
22aa  Empatia  Empatia  - É decorrência da atitude anterior, de valorização  - É decorrência da atitude anterior, de valorização
incondicional, aliás, já anunciada na citação de Rogers. As duasincondicional, aliás, já anunciada na citação de Rogers. As duas
atitudes se imbricam.atitudes se imbricam.
O mundo interior de cada pessoa é único, como é única suaO mundo interior de cada pessoa é único, como é única sua
fisionomia. Aliás, muito mais, pois as vivências são milhões.fisionomia. Aliás, muito mais, pois as vivências são milhões.
"Somente o indivíduo vive"Somente o indivíduo vive suas suas experiências. O centro desse mundo experiências. O centro desse mundo
é ela mesma. Esse mundo vivencial é 'realidade' é ela mesma. Esse mundo vivencial é 'realidade' para ela. A estímulospara ela. A estímulos
idênticos, as pessoas reagem de idênticos, as pessoas reagem de modo distinto. Percebem significadosmodo distinto. Percebem significados
diferentes, e sentem e agem, consequentemente, de forma diversa."diferentes, e sentem e agem, consequentemente, de forma diversa."
(Tausch)."(Tausch)."
O terapeuta se coloca na perspectiva da pessoa que escuta.O terapeuta se coloca na perspectiva da pessoa que escuta.
Põe-se na sua pele, segundo a expressão de Cogswell (1993). ProcuraPõe-se na sua pele, segundo a expressão de Cogswell (1993). Procura
entrar em seu horizonte de compreensão. Tenta apreender o signifientrar em seu horizonte de compreensão. Tenta apreender o signifi
cado, cado, a importância do conteúdo da comunicação para o interlocutor.a importância do conteúdo da comunicação para o interlocutor.
Diligencia por ser um pouco o outro, pois é impossível sê-loDiligencia por ser um pouco o outro, pois é impossível sê-lo
inteiramente.inteiramente.
Pesquisas revelam que o indivíduo percebe essa atitude dePesquisas revelam que o indivíduo percebe essa atitude de
escuta: empática: escuta: empática: "Ele (terapeuta) aprecia minhas exp"Ele (terapeuta) aprecia minhas experiênciascomoeriências como
eu as sinto." Capta igualmente a não-escuta: "Ele entende minhaseu as sinto." Capta igualmente a não-escuta: "Ele entende minhas
palavras, mas não o modo como eu sinto."palavras, mas não o modo como eu sinto."
Ao sentir-se valorizado e empaticamente compreendida, aAo sentir-se valorizado e empaticamente compreendida, a
pessoa terá acréscimo de confiança no terapeuta. Caem defesas.pessoa terá acréscimo de confiança no terapeuta. Caem defesas.
10. Rogers, 1970, p. 47. - Wood, (1995, p. 274), colega de pesquisa de Rogers e colaborador seu em Grupos,10. Rogers, 1970, p. 47. - Wood, (1995, p. 274), colega de pesquisa de Rogers e colaborador seu em Grupos,
(inclusive no de Arcozelo em 1976), durante mais de vinte anos, nos transmite o parecer (inclusive no de Arcozelo em 1976), durante mais de vinte anos, nos transmite o parecer do próprio Carldo próprio Carl
sobre questão importante: "Falar de uma 'Abordagem Centrada-no-Cliente' ou uma 'Abordagem Centrada-sobre questão importante: "Falar de uma 'Abordagem Centrada-no-Cliente' ou uma 'Abordagem Centrada-
na-Pessoa' como se fossem entidades opostas entre si é, na minha opinião, caminho certo para disputasna-Pessoa' como se fossem entidades opostas entre si é, na minha opinião, caminho certo para disputas
fúteis e para o caos.[...] Espero que me permitam ser uma pessoa inteira, quer seja chamado para ajudarfúteis e para o caos.[...] Espero que me permitam ser uma pessoa inteira, quer seja chamado para ajudar
num relacionamento destinado a ser centrado-no-cliente ou num que seja rotulado centrado-na-pessoa. Eunum relacionamento destinado a ser centrado-no-cliente ou num que seja rotulado centrado-na-pessoa. Eu
trabalho do mesmo modo nos dois." - Comenta Wood (p. 275): "Ele (Rogers) se aproximava de cadatrabalho do mesmo modo nos dois." - Comenta Wood (p. 275): "Ele (Rogers) se aproximava de cada
situação com o mesmo desejo de ouvir e compreender, as mesmas atitusituação com o mesmo desejo de ouvir e compreender, as mesmas atitu des, o mesmo bom humor, des, o mesmo bom humor, a mesmaa mesma
humildade, a mesma genuinidade e aceitação não-julgadora do indivíduo ou do grupo, a mesma curiosidadehumildade, a mesma genuinidade e aceitação não-julgadora do indivíduo ou do grupo, a mesma curiosidade
e abertura à descoberta, a mesma crença de que elee abertura à descoberta, a mesma crença de que ele poderia poderia ajudar e que isso era a coisa ajudar e que isso era a coisa mais mais  importante importante
do mundo a fazer naquele momento."do mundo a fazer naquele momento."
11. Tausch,11. Tausch, 1981, p. 187. 1981, p. 187.
Aumentará também a confiança em si mesma, pois descobrirá,Aumentará também a confiança em si mesma, pois descobrirá,
paulatinamente, o potencial de recursos armazenados e nãopaulatinamente, o potencial de recursos armazenados e não
reconhecidos, até então, ou só parcialmente percebidos e utilizados..reconhecidos, até então, ou só parcialmente percebidos e utilizados..
O processo terapêutico fluirá mais fácil, rápido e frutuosamente.O processo terapêutico fluirá mais fácil, rápido e frutuosamente.
Tornar-se-á o cliente, dia a dia, mais pessoa. Pessoa mais desabroTornar-se-á o cliente, dia a dia, mais pessoa. Pessoa mais desabro
chada, mais autónoma.chada, mais autónoma.
Atitude empática supõe alto grau de flexibilidade, de resiliên-Atitude empática supõe alto grau de flexibilidade, de resiliên-
cia. Rogers "deplora a inautêntica, mecânica, rígida, dogmática terapiacia. Rogers "deplora a inautêntica, mecânica, rígida, dogmática terapia
centrada no cliente".centrada no cliente".1212 São atitudes opostas às que São atitudes opostas às que ele pleiteia. Comele pleiteia. Com
elas, haverá centração na pessoa do terapeuta, mas não do cliente.elas, haverá centração na pessoa do terapeuta, mas não do cliente.
3.3. Congruência ou genuinidade. Congruência ou genuinidade. "O terapeuta é profundamente "O terapeuta é profundamente
ele mesmo, com sua experiência, precisamente representada em suaele mesmo, com sua experiência, precisamente representada em sua
conscientização de si mesmo."conscientização de si mesmo." I3I3
Isto não implica - é pensamento de Rogers - que ele seja umIsto não implica - é pensamento de Rogers - que ele seja um
modelo de perfeição. O consulente deve sentir (e sente) se está emmodelo de perfeição. O consulente deve sentir (e sente) se está em
face de pessoa 'real', autêntica, ou de alguém cumprindo um 'papel',face de pessoa 'real', autêntica, ou de alguém cumprindo um 'papel',
com atitudes e gestos estudados. O terapeuta deve poder sercom atitudes e gestos estudados. O terapeuta deve poder ser
espontaneamente aquilo que é e não um 'artista' ensaiado.espontaneamente aquilo que é e não um 'artista' ensaiado.
"O que diz, seu mod"O que diz, seu modo de se haver, harmoniza com seu mundoo de se haver, harmoniza com seu mundo
interior, os sentimentos e ideias, seu self. Não se disfarça. Nãointerior, os sentimentos e ideias, seu self. Não se disfarça. Não
nega parte de si. Disposto a ser e a agir como realmente é,nega parte de si. Disposto a ser e a agir como realmente é,
sem máscaras, sem camuflagens, sem couraça, sem comportasem máscaras, sem camuflagens, sem couraça, sem comporta
mentos profissionais ensaiados." ' mentos profissionais ensaiados." ' 44
O leitor perceberá que esta atitude requer transparência, coerênciaO leitor perceberá que esta atitude requer transparência, coerência
entre pensar, sentir e agir; sintonia entre o processo interno e a palavra.entre pensar, sentir e agir; sintonia entre o processo interno e a palavra.
Terapeuta centrado na pessoa será autêntico. Esta forma de Terapeuta centrado na pessoa será autêntico. Esta forma de ser atuaráser atuará
direta ou subliminarmente no psiquismo do cliente. O direta ou subliminarmente no psiquismo do cliente. O mesmo se dará,mesmo se dará,
infelizmente, também no caso de incongruência.infelizmente, também no caso de incongruência.
A congruência não supõe, comunique o terapeuta ao cliente, oA congruência não supõe, comunique o terapeuta ao cliente, o
que se passa nele. Não. Quer dizer que deve ser, primeiramente,que se passa nele. Não. Quer dizer que deve ser, primeiramente,
transparente (tanto quanto possível) para si mesmo. Atento aostransparente (tanto quanto possível) para si mesmo. Atento aos
12. Rogers, 1987, p. 38.12. Rogers, 1987, p. 38.
13. Rogers, 1957, in Wood, p. 163.13. Rogers, 1957, in Wood, p. 163.
14. Tausch, 1990, p. 86).14. Tausch, 1990, p. 86).
próprios processos psicológicos, mas, sobretudo, mais atento àspróprios processos psicológicos, mas, sobretudo, mais atento às
comunicações do interlocutor. À medida em que avançar nacomunicações do interlocutor. À medida em que avançar na
experiência profissional também ele "se tornará mais pessoa".experiência profissional também ele "se tornará mais pessoa".
Chegará o dia em que, habitualmente, pequena réstia sobre si mesmoChegará o dia em que, habitualmente, pequena réstia sobre si mesmo
será suficiente, sendo progressivamente mais disponível ao será suficiente, sendo progressivamente mais disponível ao cliente.cliente.1515
4. É postulada uma quarta condição:4. É postulada uma quarta condição:   da parte do cliente,  da parte do cliente,
 percepção  percepção das das condições condições acima acima no no terapeuta,terapeuta,  ao menos no grau  ao menos no grau
mínimo (que pode ser elevado!) exigido pela situação do interlocutormínimo (que pode ser elevado!) exigido pela situação do interlocutor
à procura de solução de problema ou problemas: melhor - deà procura de solução de problema ou problemas: melhor - de
crescimento como pessoa. Caso as crescimento como pessoa. Caso as condições não fossem percebidascondições não fossem percebidas
é como se não existissem e, de fato, não existem para o consulente.é como se não existissem e, de fato, não existem para o consulente.
De um lado, as condições devem ser de nível suficiente para seremDe um lado, as condições devem ser de nível suficientepara serem
captadas pelo outro; e captadas pelo outro; e este não deve ser tão perturbado que este não deve ser tão perturbado que não consiganão consiga
apreendê-las. Remédio não ingerido apreendê-las. Remédio não ingerido não pode curar. Surdo não ouvenão pode curar. Surdo não ouve
vozes e ruídos.vozes e ruídos.
"Desde que as atitudes não podem ser diretamente percebi"Desde que as atitudes não podem ser diretamente percebi das,das,
seria mais correto estabelecer que os comportamentos doseria mais correto estabelecer que os comportamentos do
terapeuta e suas palavras são percebidas pelo cliente comoterapeuta e suas palavras são percebidas pelo cliente como
significando que, em algum grau, o terapeuta o aceita esignificando que, em algum grau, o terapeuta o aceita e
compreende." ' compreende." ' 66
Daí a hipótese: se essas condições estiverem presentes na relaçãoDaí a hipótese: se essas condições estiverem presentes na relação
terapêutica, ocorrerá alguma mudança na personalidade do cliente.terapêutica, ocorrerá alguma mudança na personalidade do cliente.
Se uma delas faltar, não acontecerá o efeito esperado, pois se trata deSe uma delas faltar, não acontecerá o efeito esperado, pois se trata de
condiçõescondições  necessárias  necessárias ee  suficientes.  suficientes.  Quanto maior o grau de sua  Quanto maior o grau de sua
presença, tanto mais será a possibilidade de mudança da personapresença, tanto mais será a possibilidade de mudança da persona
lidade, já que, neste clima, ela goza delidade, já que, neste clima, ela goza de  liberdade experiencial, liberdade experiencial, isto é, isto é,
sente que tudo o que exterioriza é levado em consideração, semsente que tudo o que exterioriza é levado em consideração, sem
 julgament julgamentos, sem avaliação. Nãos, sem avaliação. Não precisa, por o precisa, por isso, recorrer isso, recorrer a defesas.a defesas.
Deixa cair eventuais máscaras. Pode reconhecer e reelaborar suasDeixa cair eventuais máscaras. Pode reconhecer e reelaborar suas
vivêncivivênci as as sem sem negação ou negação ou deformdeform ação. O ação. O clima clima terapterap êuticoêutico
'permissivo' favorece essa elaboração.'permissivo' favorece essa elaboração.
15. C15. Cf. Kirschenbaum, 1979, p. 19f. Kirschenbaum, 1979, p. 19 7. - 7. - Rogers narra (1969a, p. 349 e ss) um caso com êxito limitado. Rogers narra (1969a, p. 349 e ss) um caso com êxito limitado. AA
causa? "A pessoa era incapaz de aceitar meus sentimentos para com ela por não poder acreditar neles."causa? "A pessoa era incapaz de aceitar meus sentimentos para com ela por não poder acreditar neles."
16. 16. Rogers, in Wood, 1995, Rogers, in Wood, 1995, p. 169.p. 169.
5. O terapeuta tem5. O terapeuta tem confiança nas possibilidades, nos recursos confiança nas possibilidades, nos recursos
do cliente.do cliente. Essa confiança ele a transmite através de  Essa confiança ele a transmite através de atitudes, palavrasatitudes, palavras
e mímica.e mímica.
Um cliente com problema sério, melhorara com inesperadaUm cliente com problema sério, melhorara com inesperada
rapidez, a ponto de ele mesmo se espantar, pois estivera consultandorapidez, a ponto de ele mesmo se espantar, pois estivera consultando
outros profissionais durante anos, e só piorando seu estado. Certooutros profissionais durante anos, e só piorando seu estado. Certo
dia, após meio ano de atendimento, perguntou ele:dia, após meio ano de atendimento, perguntou ele:
- Doutor, a que se deve esta melhora rápida?- Doutor, a que se deve esta melhora rápida?
- Voc- Você ê que acha?que acha?
- Sabe, quando, na primeira entrevista, após haver exposto- Sabe, quando, na primeira entrevista, após haver exposto
minha situação, perguntei: Meu estado tem cura? O senhorminha situação, perguntei: Meu estado tem cura? O senhor
respondeu com muita espontaneidade e convicção: Meu Derespondeu com muita espontaneidade e convicção: Meu De us,us,
por que não? - Esta sua reação reacendeu minha esperança.por que não? - Esta sua reação reacendeu minha esperança.
Ademais, disse-me: Você não está doente. Portanto, não precisaAdemais, disse-me: Você não está doente. Portanto, não precisa
de cura. O que tem é um problema, e todo problema temde cura. O que tem é um problema, e todo problema tem
solução. Juntos procuraremos essa solução.solução. Juntos procuraremos essa solução.
A confiança do terapeuta no cliente, este a percebe consciente ouA confiança do terapeuta no cliente, este a percebe consciente ou
subrepticiamente, crescendo a confiança em si mesmo, alavanca parasubrepticiamente, crescendo a confiança em si mesmo, alavanca para
a superação do problema. "Ousai, em primeiro lugar, ter fé em vósa superação do problema. "Ousai, em primeiro lugar, ter fé em vós
próprios."próprios." nn
Até prova em contrário, o Até prova em contrário, o terapeuta centrado no cliente apostaterapeuta centrado no cliente aposta
na solução dos conflitos através da mobilização dos recursos dana solução dos conflitos através da mobilização dos recursos da
pessoa, talvez menos preocupado na resolução de problemáticapessoa, talvez menos preocupado na resolução de problemática
pontual do pontual do que no crescimento gque no crescimento global lobal do 'odo 'o rganismrganism o'. Ele (terapeuta)o'. Ele (terapeuta)
é o catalisador, o facilitador do processo. Quem o dirige é o cliente.é o catalisador, o facilitador do processo. Quem o dirige é o cliente.
6.6. A essência da terapia centrada na  A essência da terapia centrada na pessoa,pessoa, escreve Bozarth, escreve Bozarth,
é o empenho do terapeuta em caminharé o empenho do terapeuta em caminhar
° ° com a com a direção do cliente,direção do cliente,
00 no ritmo no ritmo do clientedo cliente
•• ee nn a modala modalidade idade única única de ser de ser do cliente.do cliente. I8I8
17. Nistzsche, 1988, p. 137.17. Nistzsche, 1988, p. 137.
18. Bozarth, 1998, p. 8.18. Bozarth, 1998, p. 8.
Ouçamos o próprio Rogers:
"A hipótese central do enfoque pode ser apresentado
resumidamente (em 1959 encontra-se explanação mais
completa): os indivíduos possuem dentro de si vastos recursos
 para auto-compreensão e para mudar, modificar o auto-
conceito, atitudes básicas e formas de agir pessoais: esses
recursos podem ser ativados se determinado clima de atitudes
 psicológicas facilitadoras lhes for propiciado.  I9
No processo terapêutico centrado na pessoa,   não há diagnóstico
 prévio  realizado pelo terapeuta ou auxiliares, pois seria ferir o
princípio central desse enfoque: centrar-se no cliente. O diagnóstico
é efetivado, paulatinamente, ao longo de todo o processo. Por quem?
Pelo cliente. O terapeuta procura facilitar-lhe a tarefa. Esse auto-
diagnóstico culmina em mudança de percepção. Da mudança de
percepção decorre mudança de comportamento, de atitude. Por isso
escreve Brazier que o trabalho de Rogers centrou-se, principalmente,
em ajudar-nos a entender o quadro de referência do outro.20 Estamos
longe do modelo médico: 'profissional-paciente'. Encontramo-nos
em presença de 'profissional-cliente/pessoa', sendo a atividade
deste(a) o foco da nova orientação psicoterápica.
O leitor terá notado ser a orientação rogeriana  otimista  com
relação à pessoa. Por isso confia nela, embora com muitos problemas.
Alerta importante de Mearns: "Trabalhar com o cliente 't odo' ,
quer dizer oferecer-lhe as condições básicas a todas as suas facetas,
mesmo conflituadas entre elas e mutuamente excludentes."  2I
Imagem de pessoa
As condições e convicções mencionadas se baseiam sobre
específica visão da personalidade, diferente de outras correntes em
psicologia. Quais suas principais características?
19. Rogers, 1980, p. 115.
20. Brazier, 1997, p. 22.
21. Mearns, 1994, p. 16.
Tendência à atualização ou auto-realização
Lemos em Rogers dos últimos tempos de vida:
"Quero destacar duas tendências correlatas que têm adquirido,
gradativamente, maior importância em meu pensamento no
decorrer dos anos.
°  uma delas é a tendência à atualização, característica da
vida orgânica.
o outraé a tendência formativa no universo como um todo.
° Juntas constituem os blocos basilares do enfoque centrado
na pessoa."  2 2
Várias vezes cita ele em livros e palestras (inclusive na União
Soviética) o caso de batatas inglesas guardadas no chão curo do porão,
na fazenda paterna, brotando em direção à luz: a vida procurando
expandir-se, tanto quanto possível, apesar das condições adversas. A
observação de animais e plantas levou Carl Rogers à convicção de
que todo ser vivo tende a crescer,  em direção a tornar-se indivíduo
adulto realizado da espécie, caso as condições lhe forem
suficientemente favoráveis. Demos a palavra ao mestre:
"Todo organismo é animado por tendência inerente a
desenvolver todas as potencialidades, e a desenvolvê-las de
maneira afavorecer-lhe a conservação e enriquecimento. "  23
Em outra obra assegura: Este potencial será liberado quando o
terapeuta puder criar clima psicológico caracterizado pela genuini
dade, valorização incondicional e empatia. Então, "o cliente vai
reorganizar-se tanto em nível consciente como em níveis mais
profundos da personalidade". 24
Auto-imagem (self)
Com a facilitação do terapeuta, o cliente procura desobstruir
22. Rogers, 1080, p. 114.
23. Rogers, 1966, p. 172.
24. Rogers, 1969 a p. 04.
ou ampliar o fluxo da tendência à atualização. Repetimos: o papel do
terapeuta não consiste em guiar o cliente pelo caminho 'certo' (na
perspectiva do profissional), mas criar condições favoráveis ao
processo de auto-exploração e desenvolvimento. 25  Objetivo: fazer
desabrochar a pessoa no ser, como diz Levinas.26
Essa exploração, possibilitada graças ao clima formado pelas
atitudes do psicoterapeuta, provocarão mudanças na auto-imagem,
no 'self. E, por sua vez, essa mudança no self fará com que o cliente
perceba a si e a situação de modo diferente. Encontrará 'saídas'.
Rogers:
"Sucesso na terapia é a percepção, da parte do cliente, de que
o self tem a capacidade de reorganização. [...] Quando a
 pessoa consegue se ver como agente perceptivo, organizador,
então se dá a reorganização da percepção bem como a
consequente mudança nos padrões da reação. " 21
A partir de certo patamar da terapia, o cliente terá enveredado num
"caminho sem volta".  O self é outro; a percepção é outra; outra,
melhor e desabrolhadora é a vida. Unamuno diria que a pessoa "sente-
se viver em estado de criação contínua: cada momento oferece uma
visão nova .
A tendência à auto-realização  e à auto-imagem (self)  explicam
todo procedimento do indivíduo (atitudes, ações e reações). A tendên
cia ao crescimento é o elemento dinâmico do psiquismo; o self o
orienta na direção de valores, objetivos que lhe interessam ou que,
erroneamente ou não, lhe parecem vantajosos e alcançáveis. A auto-
imagem joga papel decisivo na vida. Conforme se julgar apta ou não,
a pessoa orientará a tendência para este ou aquele rumo, podendo
subestimar ou superestimar suas possibilidades. Mas decidirá
conforme se perceber. Por isso, a percepção que o indivíduo tiver de
si, dos outros, do estudo, emprego, etc , é que lhe pilotará a vida. Eis
a razão por que  o self constitui o centro do processo terapêutico.
Escreve Goldstein, a quem devemos o termo auto-realização:
25. Guioordani, 1997, p. 104.
26. Levinas, 1988, p. 115.
27. Rogers, in Wood, 1995, p. 49-50.
28. 1952, p. 52.
"Existe estreita relação entre os modos preferidos do indivíduo
e os motivos psicológicos de sua conduta, seu relacionamento
com os demais, seus gostos e repulsas e suas atitudes ante a
vida. " 29
Resumindo as principais conclusões sobre mudanças de personalidade
na psicoterapia, Rogers enfatiza a correlação auto-imagem e vida
mais congruente, mais realista do cliente para consigo mesmo e os
demais.30
Outra observação importantíssima: o   ambiente deve ser
suficientemente propício a fim de possibilitar a auto-realização da
pessoa, à semelhança de todo ser vivo: sem o mínimo de condições,
em vez de crescer, estiola e morre. Na terapia, as atitudes do
profissional, muito mais que sua cultura, fazem surgir esse ambiente
favorável. Quanto mais elevado o grau de existência dessas atitudes
no ambiente familiar e social - é bom repetir - tanto mais 'terapêutico'
será esse ambiente. Todo bom relacionamento é terapêutico, isto é,
favorece o crescimento, segundo Maslow. Há, contudo, pessoas que,
embora vivam em ambiente assim, necessitam temporariamente da
'estufa' do gabinete psicoterapêutico para retomar o impulso do
crescimento, quiçá dar-lhe outro rumo.
Rumo à plenificação da pessoa
Certa noite de fevereiro de 1977, durante as maravilhosas três
semanas passadas com Rogers e equipe de La Jolla (San Diego, USA)
em Arcozelo, RJ, John Wood entre eles, estávamos alguns sentados
no alpendre da antiga fazenda transformada em local, rústico e s ingelo,
de teatro, encontro de estudantes. Pois bem: o grande autor de "Tornar-
se Pessoa" estava discorrendo sobre a plenificação gradativa da
pessoa, quando surge, por entre o arvoredo, a lua cheia. Minutos
depois, brilhava ela, dourada e silenciosa, por cima da floresta,
prateando o panorama bucólico da suavemente ondulada serra carioca
de Pati do Alferes.
29. 1961, p. 164.
30. 1969a, p.413ess.
Vinculei o crescer da lua à auto-realização da pessoa. Quanto
mais esta crescer, mais 'cheia', mais plena se tornará, dispondo de
mais luz para si e irradiando-a mais abundantemente aos outros.
E convicção de Fromm de que "a existência identifica-se com
o desenvolvimento das potencialidades específicas de um organismo.
Todo organismo possui uma tendência inerente para a atualização
das suas potencialidades próprias." 31
Essa noção da tendência à auto-realização tomaram-na Rogers,
Fromm, Maslow e muitos outros, dos minuciosos experimentos e
cuidadosas observações de Kurt Goldstein.
A pessoa em via de crescimento notabilizar-se-á por algumas
características:32
Primeiramente é necessário observar não se tratar de 'es tado ',
mas de um 'processo'. Vida em fluxo de plenificação é processo, não
um estado de ser. Para Rogers, "vida em crescimento  (good life) é o
processo do movimento numa direção selecionada pelo indivíduo
quando interiormente livre de se mover para qualquer rumo".
Na opinião do autor, as características da seleção da direção
tomada por tais pessoas têm certo grau de universalidade. Quais seriam
os traços distintivos de tais indivíduos?
° Crescente abertura à experiência.
° Vida gradativamente mais existencial, isto é, de fluxo reno
vador.
° Organismo digno de confiança, graças à abertura à expe
riência.
° Vontade de ser processo.
° A pessoa é seu centro de avaliação.
O crescimento não termina, por mais rápido e organizado que seja.
Nunca atingirá o brilho de lua cheia.. Não deixa de ser constante lua
'crescente'. Escreve Paulo Freire: "Totalizando-se além de si mesma
(a consciência humana) nunca chega a totalizar-se inteiramente, pois
sempre se transcende a si mesma." 33 Pessoa em processo de auto-
31. Fromm, s.d., p. 38.
32. Rogers, 1961, cap. 9. [Cap. 7 da edição brasileira.]
33. Freire, 1987, p. 16.
realização não estaciona: encontra-se
° a caminho de sempre mais plena auto-direção;
° a caminho de ser um processo mais rico e dinâmico;
° a caminho da complexidade;
° a caminho de maior abertura à experiência;
° de maior aceitação dos outros;
° de relacionamento mais profundo com os demais;
° de crescente confiança em si mesma;
° de progresso em congruência, em autenticidade.
Como fecho dessas considerações, dois pensamentos que mostram a
penetração de princípios da psicologia humanista na alta cúpula da
Igreja Católica:
"O homem não é verdadeiramente homem a não ser na medida
em que, senhor de suas ações e juízos de valor, é autor do seu
 progresso, de acordo com a natureza que lhe deu o Criador,
de que assume livremente as possibilidades e exigências."  34
O Papa atual não é menos enfático:
"Somos, de certo modo, os nossos próprios pais ao criarmo-
nos como queremos e, pela nossa escolha, dotarmo-nos da
 forma que queremos. "35
Se as orientações da psicologiarogeriana atingissem as altas esferas
dos poderes políticos, em poucos anos, a terra adquiriria fisionomia
bem mais humana...
34. Paulo VI, 1967,. n. 16.
35. João Paulo II, 1993, p. 92.
6. O desenvolvimento pioneiro de
pesquisas em psicoterapia
Em 1945, Rogers foi convidado a lecionar na Universidade de
Chicago e a estabelecer, nesta universidade, um centro de aconselha
mento baseado nos princípios da abordagem não-diretiva. Em Chi
cago, junto com uma grande equipe de colaboradores, na maior par
te, seus alunos, Rogers desenvolveu um trabalho pioneiro para a sua
época: a pesquisa científica em psicoterapia. Rogers já inovara em
Ohio ao ser o primeiro psicoterapeuta a registrar através de grava
ções sonoras as sessões de terapia e a torná-las disponíveis para a
comunidade profissional, contribuindo, desta maneira, para a "desmis
tificação"9 da psicoterapia. Nat Raskin, um dos seus colaboradores
mais próximos em Chicago afirmou que Rogers atravessou completa
mente o labirinto de mistério que rodeava o trabalho dos psicotera-
 peutas em geral.w
Entretanto, a busca deste conhecimento científico e objetivo
sobre a psicoterapia representava, para Rogers, um grande conflito,
pois a sua experiência como terapeuta possuía uma qualidade essen
cialmente subjetiva que ele sabia que não poderia ser adequadamente
traduzida ou simbolizada através da conceituação fria e rigorosa da
ciência. Rogers sentia-se dividido entre o mundo da sua experiência
subjetiva, "quase mística", de terapeuta e o mundo objetivo do seu
trabalho como cientista." Assim, no prefácio do livro Terapia Centra
da no Cliente, Rogers tenta esclarecer o significado que tinha, para
ele e para sua equipe, a busca deste conhecimento científico:
"Mas é também um livro sobre mim e os meus colegas, que
empreendemos a análise científica desta experiência viva,
9. Bozarth (1998) afirma que "Rogers foi a principal figura na desmistificação da psicoterapia, principalmente
através do uso de gravações sonoras e filmes. Rogers e seus colegas foram o primeiro grupo a usar
gravações para examinar as sessões de terapia e torná-las disponíveis à comunidade profissional. De
fato, eles começaram com o uso de gravadores de "rolo" e discos de vidro, que eram incómodos e
desajeitados para o uso. Na verdade, Rogers foi um dos primeiros indivíduos a tornar suas próprias
sessões de terapia disponíveis para averiguação pública em gravações sonoras e filmes." p . 14
10. Raskin, (1948).
11. Rogers escreveu um artigo "Pessoa ou Ciência:? Uma Questão Filosófica", onde descreve precisamente
este seu conflito. Este artigo encontra-se publicad o no livro de John Wood, Abordagem Centrada na
emocional. É sobre os nossos conflitos neste aspecto - a per
cepção vigorosa de que o processo terapêutico é rico em
nuances, complexidades e sutilezas, e a nossa crença, igual
mente vigorosa, de que a descoberta científica, a generali
 zação, é fria, sem vida, destituída da plenitude da experiên
cia. Mas o livro também expressa, confio eu, a nossa crescen
te convicção de que, embora não possa formar terapeutas, a
ciência pode auxiliar a terapia; de que, embora seja fria e
abstraía, a descoberta científica pode nos assistir na libera
ção de forças que são quentes, pessoais, complexas; e de que
embora seja lenta e hesitante, a ciência representa o melhor
caminho conhecido para a verdade, mesmo numa área tão
delicadamente intricada como a das relações humanas. " n
A concepção de ciência que Rogers tinha nesta época era estritamen
te positivista. No meio cultural e académico em que vivia, esta era a
única concepção de ciência aceita e reconhecida. Assim, as pesqui
sas que Rogers e sua equipe desenvolveram na Universidade de Chi
cago consistiam basicamente em "testes" ou "verificações" de hipó
teses, seguindo um modelo rigorosamente experimental e estatístico.
Contudo, estas hipóteses, que eram descritas de forma operacional e
testadas com métodos estritamente quantitativos se originaram,
primariamente, da sua experiência pessoal e subjetiva como terapeuta.
Ou seja, Rogers utilizava inteiramente a sua subjetividade, na sua
experiência pessoal com os clientes, como fonte e origem de suas
hipóteses sobre a psicoterapia. No entanto, ele considerava que este
conhecimento, obtido através da sua experiência subjetiva, não teria
valor se não fosse "comprovado" ou verificado pelos métodos da
ciência.
No campo da pesquisa em psicoterapia, Rogers foi tremenda
mente inovador. Até então, as hipóteses sobre a psicoterapia jamais
haviam sido "postas à prova" por nenhuma outra abordagem. Rogers
e sua equipe foram também extremamente criativos ao inventarem
novos procedimentos para verificação de hipóteses, como a técnica
<213  de Stephenson e o Relationship Inventory  de Barret-Lennard.
12. Rogers, 1992, p. 4
13. No livro Terapia Centrada no Cliente, numa nota de rodapé à página 163, (na edição de 1992) Rogers
descreve sucintamente a aplicação da técnica Q à pesquisa sobre a alteração da percepção do eu na
Estas pesquisas eram realizadas no   Centro de Aconselhamento da
Universidade de Chicago, dirigido por Rogers, que atendia uma mé
dia de 800 a mil pessoas por ano.
Esta brilhante atividade de Rogers como pesquisador lhe pro
piciou um enorme prestígio junto à comunidade científica e profis
sional americana, tornando-se editor de duas prestigiadas revistas
científicas de psicologia - o  "Journal of Counsulting Psychology"  e
o  "Aplied Psychology Monographs -  e sendo eleito presidente da
Associação Americana de Psicologia   (American Psychological
 Association),  em 1943.
7. A confiança na capacidade do cliente
Desde a conferência proferida em Minnesota, em 1940, Rogers
 já con sid erava que uma das caracterí sti cas essenciais des sa nov a
abordagem em psicoterapia era a confiança na tendência do indiví
duo para o crescimento e para a maturidade. Com o passar dos anos,
esta confiança foi se fortalecendo ainda mais. Rogers percebeu que
quanto mais ele confiava na capacidade do seu cliente para superar
autonomamen te suas dificuldades, mais o cli ente correspondia a essa
confiança, liberando as forças internas de crescimento que até então
tinham permanecido bloqueadas.
Assim, num artigo publicado em 1946, chamado   "Aspectos
significativos da terapia centrada no cliente" 14 ,  Rogers dedicou uma
especial atenção ao que ele denominou de "  a descoberta da capaci
dade do cliente":
"Basicamente, a razão para a previsibilidade do processo
terapêutico está na descoberta - e uso esta palavra intencional
mente - de que no interior do cliente residem forças construti
vas cujo poder e uniformidade não têm sido reconhecidos
inteiramente, como também têm sido bastante subestimados.
14. Rogers, C. R. (1946). Significam Aspecls of Client-Centered Therapy. The American Psycholoeist, 10,
415-422.
É a nítida e disciplinada confiança do terapeuta nessas forças
internas do cliente que parece explicar a ordenação do
 processo terapêutico, bem como sua consistência de um cliente
 para outro. " i5
Neste pequeno trecho aparecem duas ideias muito importantes que
foram progressivamente sendo desenvolvidas por Rogers e seus co
laboradores tanto através de pesquisas como através de novas e mais
completas elaborações teóricas. A primeira ideia é a  descoberta de
que existem, em todos os indivíduos, forças construtivas de cresci
mento que até então não haviam sido reconhecidas por nenhuma
abordagem psicoterapêutica. A segunda ideia presente aqui é a de
que a confiança  do terapeuta nestas forças internas do cliente, uma
confiança  nítida e disciplinada,  é o que propicia o processo
terapêutico.
A descoberta da existência de poderosas forças internas de
crescimento e a firme confiança do terapeuta nestas forças, represen
tam, hoje, o aspecto mais revolucionário da terapia centrada no cli
ente. Lendo o que Rogers escreveu em 1946 em referência aos mo
delos psicoterapêuticos vigentes naquela época, podemos constatar
que Rogers continua sendo tão revolucionário em relação aospa
drões atuais do pensamento psicológico quanto fora há cinquenta
anos atrás. Depois de analisar diversos estudos de caso publicados
por psiquiatras e psicanalistas, Rogers concluiu que a confiança que
estes terapeutas tinham em seus clientes era uma confiança   muito
limitada:
"É uma confiança de que o cliente pode assumir responsa
bilidade, se for guiado pelo especialista; uma confiança de
que o cliente pode assimilar insight, se este lhe for propiciado
 primeiro pelo especialista; de que pode fazer escolhas, se nos
 pontos cruciais lhe for dada uma direção. E, em suma, o mes
mo tipo de atitude que uma mãe tem para com seu filho
adolescente, que ela acredita ser capaz de tomar decisões pró
 prias e guiar seu próprio caminho, contanto que ele tome a
direção por ela aprovada. " w
15. Rogers, 1995a, p. 24
16. Roges, 1995a, p. 26.
Esta confiança do terapeuta nas forças internas de crescimento do
cliente tornou-se posteriormente o postulado fundamental da terapia
centrada no cliente e a principal característica que a diferenciaria de
todas as outras abordagens em psicoterapia. Em 1951, no livro   "Te
rapia Centrada no Cliente",  Rogers formulou de uma maneira mais
precisa o significado destas  "forças de crescimento"'.  A partir dos
estudos de Snygg, Combs, Angyal, Goldstein e outros, Rogers consta
tou que existe, em toda vida orgânica,  uma. força direcional básica
que se manifesta como uma tendência do organismo para preservar-
se e para mover-se na direção da maturação e da auto-realização de
suas potencialidades. Esta força direcional também se expressa como
uma tendência do organismo para mover-se na direção de uma maior
independência, autonomia e auto-regulação como também na direção
de uma maior socialização. Esta tendência direcional está presente
na vida de todo organismo individual   "desde a concepção até a
maturação, em qualquer nível de complexidade orgânica" 11.
Rogers considerou, então, que a tendência para o crescimento,
para a maturidade e para a autonomia que ele observara em todos os
seus clientes quando era oferecida, na relação terapêutica, uma atmos
fera de  aceitação e  liberdade,  era, na realidade, a expressão desta
força direcional básica originada no próprio funcionamento orgâni
co (ou  organísmico)  do indivíduo:
"Na terapia centrada no cliente, a pessoa é livre para esco
lher qualquer direção, mas, na realidade, ela seleciona cami
nhos positivos e construtivos. Eu só posso explicar isto em
termos de uma tendência direcional inerente ao organismo
humano -  uma tendência para crescer, se desenvolver e reali
 zar plenamente seu potencial"\ 1S
E a confiança do terapeuta nesta tendência do indivíduo para a auto-
preservação, crescimento, maturação, independência e socialização
que caracteriza a relação terapêutica centrada no cliente:
"O terapeuta torna-se muito consciente de que a tendência de
17. Rogers, 1992, p. 555
18. Rogers. 1986, p. 127.
movimento para frente do organismo humano é a base na qual
ele se apoia de maneira mais firme e fundamental. "  I9
No livro  "Terapia Centrada no Cliente",  Rogers apresentou a pri
meira formulação da sua teoria da personalidade e do comp ortamen
to, na forma de dezenove proposições. Na IV Proposição ele afirma
que todo organ ismo possui uma tendênc ia básica à auto-realização,
auto-manutenção e  aperfeiçoamento.  Posteriormente, em 1959,
Rogers publicou a versão final da sua teoria da terapia e da persona
lidade entitulada  "Uma teoria da terapia, personalidade e relacio
namentos interpessoais desenvolvida segundo a perspectiva centrada-
no-cliente" 20 Nesta formulação de 1959, Rogers denomino u esta ten
dência direcional de  "actualizing tendency",  que foi traduzida para o
português como tendência atualizante.
A  tendência atualizante  está presente em  todas  as ações do
indivíduo pois ela representa o fluxo natural da vida. Ela é o movi
mento, o processo direcional que caracteriza a própria natureza da
vida. Isto é, a presença da tendência atualizante  é o que nos permite
distinguir um organismo vivo de um morto. Isto significa que a   ten
dência atualizante  pode ser frustrada, impedida ou desvirtuada,   mas
não pode ser destruída sem que se destrua também o organismo21.
Em 1977, no livro  "Sobre o Poder Pessoal" 22  Rogers utilizou
uma imagem originada de suas lembranças da infância, a imagem de
uma caixa de batatas que brotaram mesmo na escuridão gelada do
porão de sua casa, como uma metáfora da maneira como a  tendência
atualizante  se manifesta mesmo sob as condições mais desfavorá
veis. Esta metáfora tornou-se bastante conhecida devido à beleza,
profundidade e sensibilidade como foi apresentada por Rogers:
"Lembro-me de que, na minha infância, a lata na qual arma-
19. Rogers, 1992, p.556.
20. A theory of therapy, personality, and interpersonal relationships as developed in the client-centered framework.
Publicado em S. Koch (ed) Psychology: A study of science: Vol. 3 Formulation of the person and the
social context: New York: McGraw Hill. (este trabalho foi publicado no Brasil em 1977 no livro
"Psicoterapia e Relações Humanas" - escrito em conjunto com Marian Kinget)
21. Rogers, 1983, p. 40.
22. Título original em inglês: Cari Rogers on Personal Power
simboliza estas experiências. Ou seja, a negação e a distorção são as
defesas utilizadas pelo indivíduo para preservar o seu eu da  ameaça
representada pela experiência da incongruência.
Mas como uma pessoa pode reconhecer uma experiência como
ameaçadora sem ainda ter tido consciência dela? Rogers e seus cola
boradores ficaram intrigados com esta questão, que parecia envolver
um processo de 'conhecer sem conhecer'  ou de 'perceber sem per
ceber'.  Após realizarem algumas pesquisas sobre a relação entre
percepção e consciência, eles puderam concluir que, de fato, um in
divíduo é capaz de discriminar um estímulo como ameaçador e rea
gir a ele mesmo sem ter reconhecido conscientemente o estímulo a
que está reagindo62.
Neste sentido, McCleary e Lazarus63 deram uma contribuição
fundamental à teoria ao criarem o conceito de  "subcepção"  para se
referir a este processo de "pré-percepção" no qual o indivíduo reage
a um estímulo antes que este seja reconhecido na consciência. A
subcepção é, assim, uma reação organísmica fisiológica avaliatória
e discriminatória à experiência, que pode preceder a percepção cons
ciente dessa experiência. O processo da  subcepção explica, portan
to, como um indivíduo pode  negar experiências à consciência sem
 jamais ter estado consciente delas64.
É importante salientar que as experiências que são negadas à
consciência ou distorcidas na sua simbolização são aquelas   incoe
rentes  com o auto-conceito, e que estas não são necessariamente
experiências negativas ou depreciativas para o individuo. Assim, até
mesmo as experiências valorizadoras e positivas podem ser excluí
das do campo perceptual do indivíduo, se forem contraditórias com
o seu auto-conceito.
Entretanto, esta incongruência ou discrepância entre aquilo que
o indivíduo experencia em nível sensorial e visceral e aquilo que ele
simboliza na sua consciência gera uma tensão psicológica que pode
ser experimentada como:
62. Rogers, 1992, p. 575.
63. McCleary, R. & Lazarus, R. (1949). Autonomic discrimination without awareness. Journal of Personality
Change, 18, 171-179. Este estudo foi citado nas capítulo 11 do livro Terapia Centrada no Cliente.
64. Rogers, 1992, p. 576
° angústia ou ansiedade;
° sentimento de insegurança;
° sentimento de não estar integrado (ou sentimento de dissociação);
° ausência de controle sobre o próprio comportamento.
A falta de controle consciente sobre o comportamento ocorre porque
o organismo da pessoa reage às experiências e luta para satisfazer as
suas necessidades mesmo que elas não tenham sido admitidas na
consciência. Neste caso, o indivíduo faz afirmações como65:
o "Não sei por que faço isso. Eu não quero fazer, no entanto
eu faço"
o "Eu simplesmente não sou eu mesmo quando faço essas
coisas "
o "Eunão sabia o que estava fazendo "
° "Não tenho controle sobre essas reações"
A incongruência entre o auto-conceito e a experiência organísmica
(a experiência sensorial e visceral) também pode ser experimentada
pelo indivíduo como um sentimento de não ter um eu ou de que o
seu eu consiste apenas em  procurar fazer o que os outros acreditam
que ele deve fazer.  Isto ocorre quando o indivíduo constrói o seu
auto-conceito quase que inteiramente a partir das avaliações de ex
periência emprestadas de outras pessoas, com um mínimo de apreci
ação organísmica direta.
O processo terapêutico:
Como vimos nos capítulos 3 e 4 06, a relação terapêutica centrada
no cliente caracteriza-se pela total liberdade oferecida ao cliente para
explorar o mundo da sua experiência no ritmo e na direção que esco
lher e na total aceitação do terapeuta em relação a tudo o que é ex-
65. Rogers, 1992, p. 579.
66. "Uma relação essencialmente não-diretiva" e "A aceitação como a essência do processo terapêutico"
presso pelo cliente. Como consequência desta atitude do terapeuta
de aceitação e acolhimento e diante da total liberdade de expressão,
o cliente sente o seu eu livre de ameaças, sendo capaz, portanto, de
considerar as percepções até então rejeitadas (por serem incoerentes
com o seu auto-conceito) e modificar o seu auto-conceito a fim de
incluir e integrar estas percepções. Rogers descreve este processo da
seguinte maneira:
"Aos poucos, o cliente experimenta uma sensação decidida
mente nova de estar livre de ameaças. É a percepção de que
cada aspecto que ele expõe do seu eu é igualmente aceito,
igualmente valorizado. A afirmação quase beligerante de suas
virtudes é tão aceita, porém não mais, quanto o desestimulante
quadro de suas qualidades negativas. Sua certeza sobre al
guns aspectos de si mesmo é aceita e valorizada, da mesma
 forma que sua incertezas, suas dúvidas, sua vaga percepção
de contradições internas. Nessa atmosfera de segurança, pro-
teção e aceitação os limites rígidos do autoconceito relaxam.
(...) O cliente começa a explorar seu campo perceptivo cada
vez mais completamente. (...) Descobre experiências das quais
nunca fora consciente, experiências que contradizem profun
damente a percepção que tem de si mesmo - e isto é de fato
ameaçador. Ele se recolhe temporariamente para a confortá
vel gestalt anterior, mas depois, lenta e cautelosamente, sai
do refúgio e assimila a experiência contraditória num padrão
novo e revisado. "  A7
Rogers68 apresenta um exemplo de uma cliente que odiava a sua mãe
e que tinha a justificat iva para esse ódio rigidame nte estruturada no
seu auto-conceito. Ao longo do processo terapêutico, contudo, ela
pôde reconhecer a existência de outros sentimentos e comport amen
tos além do ódio -  "Insisto em limpar minha casa quando ela vem
me visitar, como se quisesse mostrar a ela como sou boa, como se
tentasse obter as graças dela"  -, conseg uindo, a seguir, admitir
certas experiências diretamente contraditórias com o seu auto-con
ceito -  "Sinto um carinho real por ela, uma espécie saudável de
67. Rogers, 1992, p.222
68. Este exemplo encontra-se no livro Terapia Centrada no Cliente, à página 588 da edição de 1992.
afeição" -  que conduziram, finalmente, a uma modificação e ampli
ação do seu auto-conceito: -   "Eu me dou bem com ela. É uma coisa
incrível a maneira como tirei a mamãe de meu sistema. Posso recebê-
la ou despedir-me dela sem tanta tensão".
A experiência que o cliente tem de ser aceito exatamente como
ele é, e de que cada novo aspecto do seu ser que é descoberto e reve
lado na terapia é igualmente aceito pelo terapeuta, leva ao reconheci
mento de experiências profundamente negadas ou distorcidas por
serem ameaçador as ao eu. Quando estas experiências se tornam cons
cientes, o cliente, então, modifica o seu auto-conceito a fim de poder
inclui-las  como partes de um todo coerente.   O processo terapêutico
é, portanto, essencialmente, um processo de desorganização e reor
ganização do eu, assim descrito por Rogers:
"À medida que o processo avança, uma configuração nova ou
revisada do eu está sendo construída, contendo percepções
anteriormente negadas; envolvendo uma simbolização mais
exata de uma gama muito mais ampla de experiências senso
riais e viscerais; envolvendo uma reorganização de valores
em que a experiência pessoal do organismo é claramente re
conhecida como a fonte que proporciona as evidências para
as valorações. Lentamente, começa a emergir um novo eu,
muito mais próximo do verdadeiro, porque se baseia muito
mais na experiência global do cliente, percebida sem
distorção. " 69
O novo eu que surge a partir da desorganização do antigo auto-con
ceito é muito mais congruente com a totalidade da experiência. Con
sequentemente, as experiências tornam-se menos ameaçadoras e o
indivíduo, sem precisar mais de tantas defesas, torna-se mais aberto
à sua experiência direta, sensorial e visceral. Nesse novo eu há, por
tanto, muito menos ansiedade e mais segurança. Rogers salienta que
é devido à presença da tendência atualizante que o indivíduo em
terapia, ao invés de seguir para uma desintegração, move-se na dire
ção de uma reorganização promotora do crescimento e de uma reali
zação mais completa das suas potencialidades.
69. Rogers, 1992, p.222
Como vimos anteriormente, o comportamento de um indiví
duo se mantém sempre coerente com o auto-conceito70. Assim, quan
do o cliente, ao longo do processo terapêutico, modifica o seu auto-
conceito, o seu comportamento se modifica espontaneamente, acom
panhando as mudanças no auto-conceito. Por este motivo, as mudan
ças de comportamento são mais fáceis e menos dolorosas que as
mudanças no auto-conceito.
O aprimoramento das relações interpessoais
Uma aluna de Rogers, Elizabeth Sheerer, em sua tese de dou
torado defendida na Universidade de Chicago em 1949 71, compro
vou cientificamente um fato que já havia sido largamente constatado
por Rogers e sua equipe na prática clínica: que   um indivíduo, ao
aceitar a si próprio, aprimora suas relações interpessoais com os
outros.  Rogers considerou este fato como uma das mais surpreen
dentes descobertas da terapia centrada no cliente, formulando-a na
proposição XVIII da sua teoria da personalidade:
"Quando o indivíduo percebe e aceita, num único sistema coe
rente e integrado, todas as suas experiências sensoriais e
viscerais, ele adquire necessariamente uma compreensão e uma
aceitação maior dos outros como indivíduos diferenciados ".
Quanto menos atitudes defensivas a pessoa utiliza para preservar o
seu auto-conceito, mais realista ela se torna não somente em relação
a si mesma como também em relação aos outros. A pessoa que vive
de maneira integrada, congruente com a sua experiência sensorial e
visceral, consegue perceber o outro como ele realmente é, com todas
as suas diferenças, sem que estas diferenças sejam percebidas como
ameaças. Desta forma, a auto-aceitação acaba promovendo também
70. Pag. 30: "O indivíduo sempre procura agir de uma maneira coerente com as suas percepções e valores. (...)
à medida que o auto-conceiío muda, o comportamento também muda a fim de tornar-se coerente com
esta nova organização do campo perceptual".
71. "An analysis of the relationship between acceptance of and respect for self and acceptance of and respect for
others in seven couseling cases"
uma maior aceitação do outro. No exemplo anterior, da mulher que
odiava a sua mãe, vimos que quando ela conseguiu aceitar todos os
seus sentimentos de afeto e de ódio, ela pôde perceber a mãe de uma
maneira muito mais realista, compreendendo-a e aceitando-a pelo
que de fato era, e construindo com ela um relacionamento real, ao
invés de defensivo.
Outra cliente de Rogers expressou esta experiência de aprimo
ramento das suas relações interpessoais com as seguintes palavras:
"Eu sou eu mesma e sou diferente dos outros. Estou me sen
tindo mais feliz em ser eu mesma e percebo que, cada vez mais,
estou deixando que as outras pessoas assumam a responsabi
lidade por seremelas mesmas "7 2
12. A mudança terapêutica
A teoria do auto-conceito, publicada em 1951 no livro  Terapia
Centrada no Cliente, já esboçara algumas considerações a respeito
dos resultados de uma terapia bem-sucedida. Como vimos no capítulo
anterior, o processo terapêutico conduziria o indivíduo a uma
reorganização do seu auto-conceito promovendo uma maior
integração entre o eu e a experiência organísmica. Como consequên
cia desta reorganização do campo perceptual, o cliente viveria com
menor tensão psicológica ou ansiedade, aprimoraria seus relaciona
mentos interpessoais e desenvolveria seu próprio sistema de valores,
baseado diretamente na sua experiência. Após a publicação de  Tera
 pia Centrada no Cliente, Rogers prosseguiu suas investigações a res
peito da natureza da mudança terapêutica e das suas condições facilita
doras e, em 1952, escreveu um artigo entitulado "A  pessoa em funci
onamento pleno"  onde procurou responder precisamente a esta ques
tão: "Se fossemos tão bem sucedidos como terapeutas, que espécie
de pessoa teria se desenvolvido em nossa terapia ? Qual o hipotético
 ponto final, o ponto máximo do processo terapêutico?".  Entretanto,
72. In Rogers, 1992, p. 591
voltar voltar para aquela minha enfermaria e realmente viver, para aquela minha enfermaria e realmente viver, realreal
mente ser amente ser alguém. lguém. Eu só... Saiu tudo de repente da minha caEu só... Saiu tudo de repente da minha ca
beça. beça. Eu Eu imaginava se poderia voltar pimaginava se poderia voltar para lá ara lá e e fazer isso,fazer isso,
realmente ser realmente ser alguém lá. alguém lá. (Breve (Breve pausa). pausa). Fico imaginando, Fico imaginando, ficofico
 pensando  pensando nisso, nisso, e e se se um um dia dia eu eu serei... serei... apenas apenas voltar voltar diretodireto
 para  para alguma alguma coisa coisa e fazer e fazer algo algo e e ser ser alguém alguém lá. lá. (Breve (Breve paupau
sa). sa). Provavelmente me ajudaria a continuar Provavelmente me ajudaria a continuar sendo diferente,sendo diferente,
um homem diferente, um homem diferente, uma uma pessoa diferente lá. Aqui neste conpessoa diferente lá. Aqui neste con
sultório eu sultório eu geralmente saio geralmente saio com alguns pensamentos que com alguns pensamentos que fafa
 zem  zem sentido sentido e e ideias, ideias, algo algo com com sensações sensações reais, reais, uma uma mentemente
real, pensamento real. real, pensamento real. Ontem quando cheguei Ontem quando cheguei aqui estava viaqui estava vi
vendo e... vou vendo e... vou estar estar hoje. hoje. Tenho certeza disso. Eu posso ser...Tenho certeza disso. Eu posso ser...
eu não posseu não posso aguentar mo aguentar mais do que isso aqui, ais do que isso aqui, então eu., então eu., éé
demais para mim.demais para mim. ""stfstf
Um psicólogo que tentasse avaliá-lo ou diagnosticá-lo, pensaria Um psicólogo que tentasse avaliá-lo ou diagnosticá-lo, pensaria algoalgo
como:como:
"Seu pensamento é confuso e as expressões inarticuladas."Seu pensamento é confuso e as expressões inarticuladas.
Parece haver senParece haver sentimentos de irrealidade. timentos de irrealidade. Possivelmente éPossivelmente é
esquizofrénico. esquizofrénico. Seu self Seu self consciente está lutando para consciente está lutando para recuperecupe
rar uma sensação de controle sobre o organismo. Ele reagerar uma sensação de controle sobre o organismo. Ele reage
com algum pânico à ideia de viver e ser uma pessoa. "com algum pânico à ideia de viver e ser uma pessoa. "
Ao passo que uma pessoa que tentasse compreendê-lo empaticamenteAo passo que uma pessoa que tentasse compreendê-lo empaticamente
pensaria algo como:pensaria algo como:
"Parece que "Parece que sentimentos e sentimentos e pensamentos pensamentos bloqueiam você bloqueiam você ..
Existe uma dúvida quanto à possibilidade de ser Existe uma dúvida quanto à possibilidade de ser alguém. alguém. VocêVocê
 fica  fica imaginando imaginando se se poderia poderia ser ser uma uma pessoa pessoa ao ao voltar voltar à à enferenfer
maria. maria. Você sente que algumas Você sente que algumas de suas reações são reais ede suas reações são reais e
sensatas e tem a impressão de que ali, na hora da terapia, estásensatas e tem a impressão de que ali, na hora da terapia, está
realmente vivo. Mas este pensamento é forte demais para vocêrealmente vivo. Mas este pensamento é forte demais para você
- é mais do que você pode encarar."- é mais do que você pode encarar."
86. Rogers, 1992, p. 5586. Rogers, 1992, p. 55
Como vimos no capítulo 10, Rogers percebeu que a compreensãoComo vimos no capítulo 10, Rogers percebeu que a compreensão
diagnostica, no contexto da psicoterapia, é não somente desnecessádiagnostica, no contexto da psicoterapia, é não somente desnecessá
ria como inclusive é prejudicial ao processo terapêutico. Já a comria como inclusive é prejudicial ao processo terapêutico. Já a com
preensão empática, pelo contrário, é promotora das preensão empática, pelo contrário, é promotora das forçaforças de crescis de cresci
mento do cliente. O caráter não avaliador e aceitador do climamento do cliente. O caráter não avaliador e aceitador do clima
empático possibilita à pessoa assumir uma atitude de estima e inteempático possibilita à pessoa assumir uma atitude de estima e inte
resse por si mesma. Sentindo-se compreendida, ela se torna capaz deresse por si mesma. Sentindo-se compreendida, ela se torna capaz de
ouvir a si mesma de modo mais correto, com maior empatia em relaouvir a si mesma de modo mais correto, com maior empatia em rela
ção às suas experiências organísmicas e aos seus significados queção às suas experiências organísmicas e aos seus significados que
percebe apenas vagamente. A maior auto-compreensão e auto-esti-percebe apenas vagamente. A maior auto-compreensão e auto-esti-
ma proporcionadas, dessa forma, pela atitude empática possibilita àma proporcionadas, dessa forma, pela atitude empática possibilita à
pessoa integrar estes aspectos da experiência agora reconhecidos numpessoa integrar estes aspectos da experiência agora reconhecidos num
novo conceitnovo conceit o de o de eu, mais congruenteu, mais congruent e com e com a totalidade da a totalidade da sua expesua expe
riência.riência.
Numa palestra proferida em 1964, Rogers descreveu, Numa palestra proferida em 1964, Rogers descreveu, para umpara um
público leigo em psicologia, como a compreensão empática podepúblico leigo em psicologia, como a compreensão empática pode
ajudar uma pessoa a despertar suas forças internas de crescimento,ajudar uma pessoa a despertar suas forças internas de crescimento,
relatando a sua própria experiência pessoal de ser escutado dessarelatando a sua própria experiência pessoal de ser escutado dessa
forma empática:forma empática:
"Várias vezes em minha vida me senti explodindo diante de"Várias vezes em minha vida me senti explodindo diante de
 problemas  problemas insolúveis insolúveis ou ou andando andando em em círculos círculos atormentadaatormentada
mente, mente, ou ainda, ou ainda, em certos em certos períodos, períodos, subjugado subjugado por por sentimensentimen
tos de desvalorização e desespero. Acho que tive mais sortetos de desvalorização e desespero. Acho que tive mais sorte
do que a maioria, por ter encontrado, do que a maioria, por ter encontrado, nesses momentos, pesnesses momentos, pes
soas que soas que foram capazes de foram capazes de me ouvir e assim me ouvir e assim resgatar-me doresgatar-me do
caos de meus sentimentos. Pessoas que foram capazes de percaos de meus sentimentos. Pessoas que foram capazes de per
ceber o significado do que eu dizia um pouco além do que euceber o significado do que eu dizia um pouco além do que eu
era capaz de dizer. era capaz de dizer. Estas peEstas pessoas me ouviram sem julgar, dissoas me ouviram sem julgar, di
agnosticar, apreciar, avaliar. Apenas me ouviram, esclarece-agnosticar, apreciar, avaliar. Apenas me ouviram, esclarece-
ram-me, ram-me, responderam-me em todos os responderam-meem todos os níveis em que eu meníveis em que eu me
comunicava. Posso testemunhar o fato de que quando estamoscomunicava. Posso testemunhar o fato de que quando estamos
numa situação psicologicamente dolorosa e alguém nos ouvenuma situação psicologicamente dolorosa e alguém nos ouve
sem nos sem nos julgar, julgar, sem sem tentar assumir tentar assumir a a responsabilidade por nós,responsabilidade por nós,
sem tentar nos moldar, sem tentar nos moldar, sentimo-nos incrivelmente bem! Nessentimo-nos incrivelmente bem! Nes
ses momentos, ses momentos, esta atitude relaxou minha tensão e me permiesta atitude relaxou minha tensão e me permi
tiu pôr tiu pôr para para fora os fora os sentimentos que me sentimentos que me atemorizavam, atemorizavam, asas
culpas, culpas, a angústia, a angústia, as confusões que tinham as confusões que tinham feito parte defeito parte de
minha experiência. ... minha experiência. ... Quando sou ouviQuando sou ouvido, torno-me capaz dedo, torno-me capaz de
rever meu mundo e continuar. É incrível como alguns aspecrever meu mundo e continuar. É incrível como alguns aspec
tos tos que antes pareciam insolúveique antes pareciam insolúveis tornam-se passíveis de sos tornam-se passíveis de so
lução quando alguém nos ouve. É incrível como as confusõeslução quando alguém nos ouve. É incrível como as confusões
que pareciam irremediáveis transformam-se em correntes queque pareciam irremediáveis transformam-se em correntes que
 fluem com relativa facilidade quando somos ouvi fluem com relativa facilidade quando somos ouvidos. " dos. " S7S7
13.3. Congruência:13.3. Congruência:
Desde o início da Desde o início da abordageabordagem centrada no cliente, m centrada no cliente, Rogers perRogers per
cebera que a aceitação do terapeuta em relação ao cebera que a aceitação do terapeuta em relação ao cliente deveria sercliente deveria ser
autêntica, genuína e não simplesmente uma "fachada". Não autêntica, genuína e não simplesmente uma "fachada". Não adiantaadianta
ria ao terapeuta "fingir" que confiava nas forças de crescimento doria ao terapeuta "fingir" que confiava nas forças de crescimento do
cliente, cliente, pois esta confiançpois esta confiança precisaria ser "real", a precisaria ser "real", ser verdadeirser verdadeira, paraa, para
ser eficaz terapeuticamente. Isto é, uma aceitação e uma confiançaser eficaz terapeuticamente. Isto é, uma aceitação e uma confiança
apenas aparente, apenas aparente, ou inautêntica, não promoveria a mudança terapêuou inautêntica, não promoveria a mudança terapêu
tica. Por este motivo, a genuinidadetica. Por este motivo, a genuinidade  (genuineness) (genuineness) ou autenticidade ou autenticidade
foi considerada por Rogers como uma atitude essencial para umfoi considerada por Rogers como uma atitude essencial para um
terapeuta centrado no cliente.terapeuta centrado no cliente.
Entretanto, esta ideia de autenticidade, inadvertidamente, acaEntretanto, esta ideia de autenticidade, inadvertidamente, aca
bou gerando uma grave distorção na prática da terapia centrada nobou gerando uma grave distorção na prática da terapia centrada no
cliente. Muitos terapeutas entenderam que ser autêntico significavacliente. Muitos terapeutas entenderam que ser autêntico significava
dizer ao cliente tudo o que estivesse pensando ou sentindo no modizer ao cliente tudo o que estivesse pensando ou sentindo no mo
mento. Assim, terapeutas começaram a "despejar" os seus própriosmento. Assim, terapeutas começaram a "despejar" os seus próprios
sentimentos sobre o cliente, justificando esta atitude como uma exsentimentos sobre o cliente, justificando esta atitude como uma ex
pressão de "autentipressão de "autenti cidade". A cidade". A fim de evitar efim de evitar este mal-entendido e torste mal-entendido e tor
nar mais claro o sentido da genuinidade enquanto atitude terapêutinar mais claro o sentido da genuinidade enquanto atitude terapêuti
ca, Rogers passou a utilizar o conceito mais específico deca, Rogers passou a utilizar o conceito mais específico de
"congruência"."congruência".
Como vimos no capítulo 11, aComo vimos no capítulo 11, a  congruência congruência é um estado de é um estado de
acordo entre o auto-conceito de um indivíduo e as suas experiênciasacordo entre o auto-conceito de um indivíduo e as suas experiências
organísmicas. Uma pessoa está congruente quando as organísmicas. Uma pessoa está congruente quando as suas experiên-suas experiên-
87. Rogers, 1983,pp. 7-887. Rogers, 1983,pp. 7-8
8686
cias podem ser acuradamente simbolizadas na consciência semcias podem ser acuradamente simbolizadas na consciência sem
distorções ou negações, ou seja, a pessoa congruente é uma pessoadistorções ou negações, ou seja, a pessoa congruente é uma pessoa
sem defesas, aberta à totalidade da sua experiência. Rogers percesem defesas, aberta à totalidade da sua experiência. Rogers perce
beu, então, que para o processo terapêutico ser bem-sucedido é nebeu, então, que para o processo terapêutico ser bem-sucedido é ne
cessário não apenas que o terapeuta seja genuíno e autêntico. Maiscessário não apenas que o terapeuta seja genuíno e autêntico. Mais
do que isso, é necessário que ele estejado que isso, é necessário que ele esteja  congruente congruente na relação com o na relação com o
cliente. cliente. Se o terapeuta não estiver aberto à experiência de si mesmo,Se o terapeuta não estiver aberto à experiência de si mesmo,
isto é, se ele estiver defensivo, se sentindo ameaçado, a suaisto é, se ele estiver defensivo, se sentindo ameaçado, a sua
genuinidade não será terapêutica. Se genuinidade não será terapêutica. Se o terapeuta estiver incongrueno terapeuta estiver incongruen
te e tentar ser autêntico, ele só vai conseguir expressar ao cliente ate e tentar ser autêntico, ele só vai conseguir expressar ao cliente a
percepção de sua experiência distorcida por suas defesaspercepção de sua experiência distorcida por suas defesas 8888. Dessa. Dessa
forma, Rogers percebeu que aforma, Rogers percebeu que a  congruência congruência do terapeuta é um ele do terapeuta é um ele
mento essencial para a promoção da mudança terapêutica no cliente.mento essencial para a promoção da mudança terapêutica no cliente.
13.413.4. Condiçõe. Condiçõe s mais que necessárias: s mais que necessárias: suficientessuficientes
Devido ao seu incansável espírito Devido ao seu incansável espírito científico, Rogers procuroucientífico, Rogers procurou
defindefinir, de forma mais precisa possível, as ir, de forma mais precisa possível, as condições que seriam necondições que seriam ne
cessárias e suficientes para a promoção das mudanças construtivascessárias e suficientes para a promoção das mudanças construtivas
da personalidade na relação terapêutica. A partir da sua experiênciada personalidade na relação terapêutica. A partir da sua experiência
clínica com as atitudes facilitadoras, e baseado nas pesquisas realiclínica com as atitudes facilitadoras, e baseado nas pesquisas reali
zadas por sua equipe na Universidade de Chicago, Rogerszadas por sua equipe na Universidade de Chicago, Rogers 8989 formu formu
lou a seguinte hipótese acerca da mudança terapêutica:lou a seguinte hipótese acerca da mudança terapêutica:
"Para que "Para que uma mudança construtiva de personalidade ocoruma mudança construtiva de personalidade ocor
ra, ra, é necessário que as seguintes condições existam e persistam poré necessário que as seguintes condições existam e persistam por
um período de tempo:um período de tempo:
1. Que duas 1. Que duas pessoas estejam em contato psicológico;pessoas estejam em contato psicológico;
2. Que a primeira, a quem chamaremos cliente, esteja num2. Que a primeira, a quem chamaremos cliente, esteja num
estado de incongruência, estando vulnerável ou ansiosa;estado de incongruência, estando vulnerável ou ansiosa;
88. Sobre esta distorção no entendimento da genuinidade no contexto terapêutico, sugerimos a leitura do artigo88. Sobre esta distorção no entendimento da genuinidade no contexto

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