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NÚCLEO DE PÓS GRADUAÇÃO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO Coordenação Pedagógica – IBRA APOSTILA DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS I 2 Índice INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 3 1 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS ................................................................ 4 1.1 Conceito .......................................................................................................................... 4 1.1.1 Direitos Fundamentais da 1.ª Dimensão ............................................................ 8 1.1.2 Direitos Fundamentais da 2.ª Dimensão ............................................................ 8 1.1.3 Direitos Fundamentais da 3.ª Dimensão ............................................................ 9 1.1.4 Direitos Fundamentais da 4.ª Dimensão ............................................................ 9 1.1.5 Direitos Fundamentais da 5.ª Dimensão ..........................................................10 1.2 Evolução Histórica .......................................................................................................10 1.3 Características .............................................................................................................25 1.3.1 Historicidade .........................................................................................................25 1.3.2 Inalienabilidade .....................................................................................................26 1.3.3 Imprescritibilidade ................................................................................................26 1.3.4 Irrenunciabilidade .................................................................................................26 1.3.5 Universalidade ......................................................................................................27 1.3.6 Limitabilidade ........................................................................................................27 1.4 Os Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988 ..............................28 2 DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS EM ESPÉCIE - (PARTE I) ................................. 30 2.1 Dos Direitos Individuais e Coletivos .........................................................................30 2.1.1 Direito à Vida ........................................................................................................30 2.1.2 Direito à Igualdade ...............................................................................................35 REFERÊNCIAS ...................................................................................................................... 46 3 INTRODUÇÃO Sejam bem-vindos ao curso de Especialização em DIREITO CONSTITUCIONAL oferecido pelo IBRA. Esforçamo-nos para oferecer um material condizente com a graduação daqueles que se candidataram a esta especialização, procuramos referências atualizadas, embora saibamos que os clássicos são indispensáveis ao curso. As ideias aqui expostas, como não poderiam deixar ser, não são neutras, afinal, opiniões e bases intelectuais fundamentam o trabalho dos diversos institutos educacionais, mas deixamos claro que não há intenção de fazer apologia a esta ou aquela vertente, estamos cientes e primamos pelo conhecimento científico, testado e provado pelos pesquisadores. Não obstante, que o curso tenha objetivos claros, positivos e específicos, colocamo-nos abertos para críticas e para opiniões, pois temos consciência que nada está pronto e acabado e com certeza críticas e opiniões só irão acrescentar e melhorar nosso trabalho. Como os cursos baseados na Metodologia da Educação a Distância, os alunos são livres para estudar da melhor forma para que possam se organizar, lembrando que: aprender e refletir sobre a própria experiência se somam e que a educação é demasiado importante para nossa formação e, por conseguinte, para a formação dos nossos alunos. Esta apostila contempla os seguintes conteúdos: Teoria dos Direitos e Garantias Fundamentais e os Direito Fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988. Trata-se de uma reunião do pensamento de vários autores que entendemos serem os mais importantes para a disciplina. Desejamos um bom estudo a todos e caso surjam algumas lacunas, ao final da apostila encontrarão nas referências consultadas e utilizadas aporte para sanar dúvidas e aprofundar os conhecimentos. 4 1 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS 1.1 Conceito Muito se debate na doutrina sobre a questão terminológica mais acertada para designar os direitos essenciais à existência da pessoa humana: “direitos humanos”, “direitos morais”, “direitos naturais”, “direitos públicos subjetivos”, “direitos dos povos”, “liberdades públicas” e “direitos fundamentais”. Neste sentido leciona SILVA (2002. p. 85): A ampliação e transformação dos direitos fundamentais do homem no evoluir histórico dificultam definir-lhes um conceito sintético e preciso. Aumenta essa dificuldade a circunstância de se empregarem várias expressões para designá-los, tais como: direitos naturais, direitos humanos, direitos do homem, direitos individuais, direitos públicos subjetivos, liberdades fundamentais, liberdades públicas e direitos fundamentais do homem. Antes de discorrer sobre a conceituação dos direitos e garantias fundamentais, cumpre-se a importante missão de buscar fazer a distinção entre Direitos e Garantias uma vez que estes institutos não são sinônimos. Os Direitos Fundamentais descritos na Constituição podem ser conceituados como normas de conteúdo declaratório (por exemplo, direito à honra, locomoção), de outro lado as Garantias Fundamentais, também previstas na Constituição, podem ser conceituadas como normas de conteúdo assecuratório, que tem o escopo de preservar o direito anteriormente declarado (por exemplo, indenização por dano à honra, habeas corpus para garantir a locomoção). Assim, podemos aferir que o direito se presta a declarar, já a garantia, existe para preservar aquele direito. Direitos fundamentais são os considerados indispensáveis à pessoa humana, necessários para assegurar a todos uma existência digna, livre e igual. Não basta ao Estado reconhecer direitos formalmente; deve buscar concretizá-los, incorporá-los no dia a dia dos cidadãos e de seus agentes (PINHO, 2011). Os Direitos e Garantias Fundamentais estão dispostos no Título II da Constituição Federal de 1988, divididos em 5 capítulos: 5 1) Capítulo I – Dos Deveres e Direitos Individuais e Coletivos; 2) Capítulo II – Dos Direitos Sociais 3) Capítulo III – Da Nacionalidade 4) Capítulo IV – Dos Direitos Políticos 5) Capítulo V – Dos Partidos Políticos Quando a CF/88 faz menção aos direitos e garantias fundamentais, ela apresenta um gênero que se subdivide em algumas espécies, conforme o Título II da Carta Magna. Conforme se verifica, os direitos e garantias fundamentais são classificados em: (a) Direitos Individuais e Coletivos, que estão dispostos ao longo do art. 5º, entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF) já estabeleceu que os direitos e garantias individuais não se restringem apenas ao art. 5º, podem ser encontrados em outros dispositivos constitucionais; (b) Direitos Sociais: encontram- se estabelecidos do artigo 6º ao 11; (c) Direitos de Nacionalidade: previstos no art. 12 e 13 da CF/88; (d) Direitos Políticos: previstos do artigo 14 ao 17 . Na visão ocidental de democracia, governo pelo povo e limitação de poder estão indissoluvelmente combinados. O povo escolhe seus representantes, que, agindo como mandatários, decidem os destinos da nação. O poder delegado pelo povo a seus representantes, porém, não é absoluto, conhecendo várias limitações,inclusive com a previsão de direitos e garantias individuais e coletivas, do cidadão relativamente aos demais cidadãos e ao próprio Estado (MORAES, 2003, p. 58). Como leciona Norberto Bobbio, (1992, p. 5): (...) os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas. (...) o que parece fundamental numa época histórica e numa determinada civilização não é fundamental em outras épocas e em outras cultuas . Neste sentido, (CANOTILHO, 1994), estabelece que a função de direitos de defesa dos cidadãos sob uma dupla perspectiva: 1) constituem, num plano jurídico- objectivo, normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências destes na esfera jurídica individual; 2) implicam, num plano jurídico-subjectivo, o poder de exercer positivamente direitos 6 fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes públicos, de forma a evitar agressões lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa). Sobre os Direitos Fundamentais leciona MARTINS (2012, p. 254): A ideia de direitos fundamentais refere-se intuitivamente àquilo que está na base e no fundamento de todos os demais direitos, dada a sua essencialidade para a existência do homem como ser pessoal e social. Algumas conclusões se podem tirar da simples denominação desses direitos: a) estando ligados diretamente à existência e sobrevivência da pessoa humana, não podem ser objeto de constituição, mas de declaração, como preexistentes ao Estado politicamente organizado (como ocorre com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, formulada na Revolução Francesa de 1789, e com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, formulada pela ONU em 1948; b) gozam de um status jurídico diferenciado em relação aos demais direitos, merecendo especial proteção e garantia (uma delas a sua inalterabilidade, conforme se infere do art. 60, § 4º, IV, da Constituição Federal, que coloca os direitos e garantias individuais como cláusulas pétreas, infensos à abolição por reforma constitucional); c) estruturam-se observando-se uma hierarquia de valores , segundo a qual há direitos mais fundamentais do que outros, na medida em que são pressuposto da existência dos demais (nemtodos os 137 direitos elencados em nossa Carta Magna possuem o mesmo valor fundamental). É inegável que o grau de democracia em um país mede-se precisamente pela expansão dos direitos fundamentais e por sua afirmação em juízo. Desse modo, pode-se dizer que os direitos humanos fundamentais servem de parâmetro de aferição do grau de democracia de uma sociedade (BRANCO, 200, p. 104). Em sua obra, NOVELINO (2012, p. 397) leciona que a classificação doutrinaria dos direitos fundamentais podem ser sintetizadas em três grupos: 1) classificação unitária, segundo a qual a profunda semelhança entre todos direitos fundamentais impede sua classificação em categorias estruturalmente distintas; 2) classificação dualista, na qual os direitos fundamentais são divididos em direitos de defesa (liberdades negativas1, no qual incluem os direitos políticos) e direitos prestacionais (liberdades positivas2); 1 Liberdades Negativas - é entendida como a não-interferência do poder do Estado sobre as ações individuais: o indivíduo é o mais livre quanto mais o Estado deixar de regular a sua vida. A falta de restrições é, portanto, diretamente proporcional ao exercício da liberdade negativa. 7 3) classificação trialista, na qual os direitos fundamentais são divididos em direitos de defesa3, direitos a prestações4 e direitos de participação5. Preliminarmente, é preciso esclarecer que os direitos fundamentais não passam de direitos humanos positivados nas Constituições estatais. Nessa perspectiva, há forte tendência doutrinária, à qual aderimos, em reservar a expressão “direitos fundamentais” para designar os direitos humanos positivados em nível interno, enquanto a concernente a “direitos humanos” no plano das declarações e convenções internacionais. De conseguinte, os direitos fundamentais são direitos assentes na ordem jurídica. São direito que, embora radiquem no direito natural, não se esgotam nele e não se reduzem a direitos impostos pelo direito natural, pois há direitos naturais conferidos a instituições, grupos ou pessoas coletivas (direitos das famílias, das associações, dos sindicatos, dos partidos, das empresas, etc.) e muitos deles são direitos pura e simplesmente criados pelo legislador positivo, de harmonia com as suas legítimas opções e com os condicionamentos do respectivo Estado (CUNHA, 2011). A sedimentação dos direitos fundamentais como normas obrigatórias é resultado de maturação histórica, o que também permite compreender que os direitos fundamentais não sejam sempre os mesmos em todas as épocas, não 2 Liberdade positiva - é definida como ter o poder e os recursos para cumprir suas próprias potencialidades e para controlar e determinar suas próprias ações e destino. É a noção de liberdade como auto-realização, em oposição a liberdade negativa, que é a liberdade de contenção externa. O conceito de liberdade positiva também pode incluir a liberdade de constrangimentos internos.Os conceitos de estrutura são fundamentais para o conceito de liberdade positiva, porque, para ser livre, uma pessoa deve ser livre de inibições da estrutura social na realização do seu livre arbítrio. Estruturalmente falando classismo, sexismo e racismo podem inibir a liberdade de uma pessoa. Liberdade positiva é reforçada pela capacidade dos cidadãos de participar de seu governo e ter seus interesses e preocupações reconhecidos como válidos e postos em prática. 3 Direitos de defesa - caracterizam-se por exigir do Estado, preponderantemente, um dever de abstenção, impedindo sua ingerência na autonomia dos indivíduos. São direitos que limitam o poder estatal com o intuito de preservar as liberdades individuais (status negativo ou status tibertatis), impondo ao Estado o dever de não interferir, não se intrometer, não reprimir e não censurar. 4 Direitos a prestações - Os direitos a prestações impõem um dever de agir ao Estado. Objetivam a realização de condutas ativas por parte dos poderes públicos (status positivo ou status civitatis), seja para a proteção de certos bens jurídicos contra terceiros, seja para a promoção ou garantia das condições de fruição desses bens. 5 Direito de Participação - Os direitos de participação possuem um caráter negativo/positivo e tem por função garantir a participação individual na formação da vontade política da comunidade (status ativo ou status da cidadania ativa). https://pt.wikipedia.org/wiki/Liberdades_negativas https://pt.wikipedia.org/wiki/Livre_arb%C3%ADtrio https://pt.wikipedia.org/wiki/Sexismo https://pt.wikipedia.org/wiki/Racismo 8 correspondendo, além disso, invariavelmente, na sua formulação, a imperativos de coerência lógica (MENDES e BRANCO, 2012, p. 120). Conforme leciona PEDRO LENZA (2012) a doutrina costuma classificar os direitos fundamentais em gerações de direitos. Em um primeiro momento, partindo dos lemas da Revolução Francesa — liberdade, igualdade e fraternidade, anunciavam-se os direitos de 1.ª, 2.ª e 3.ª dimensão e que iriam evoluir segundo a doutrina para uma 4.ª e 5.ª dimensão: 1.1.1 Direitos Fundamentais da 1.ª Dimensão Marcam a passagem de um Estado autoritário para um Estado de Direito e, nesse contexto, o respeito às liberdades individuais, em uma verdadeira perspectiva de absenteísmo estatal, podem ser caracterizados como frutos do pensamento liberal -burguês do século XVIII. Dizem respeito às liberdadespúblicas e aos direitos políticos, ou seja, direitos civis e políticos a traduzir o valor liberdade (LENZA, 2012). Nesse sentido leciona NOVELINO (2012, p. 438): Nas revoluções liberais (francesa e norte-americana) ocorridas no final do Século XVIII, a principal reivindicação da burguesia era a limitação dos poderes do Estado em prol do respeito às liberdades individuais. (...) A burguesia partia do pressuposto de que a sociedade só poderia se regulamentar se seus membros estivessem face a face de forma igualitária e livre, razão pela qual o direito era necessário apenas como garantia de igual liberdade individual. Nesse período surgiram as primeiras Constituições escritas, consagrando direitos fundamentais ligados ao valor liberdade, os chamados direitos civis e políticos. Os direitos de primeira dimensão têm como titular o individuo e são oponíveis, sobretudo, ao Estado, impondo-lhe diretamente um dever de abstenção (caráter negativo). 1.1.2 Direitos Fundamentais da 2.ª Dimensão Tem como marco histórico a Revolução Industrial européia, a partir do século XIX. Surgiu a partir das péssimas situações e condições de trabalho e na busca de reivindicações trabalhistas e normas de assistência social. Neste sentido reflete a eclosão dos direitos sociais, culturais e econômicos, bem como dos direitos coletivos. (LENZA, 2012). 9 Ligados a igualdade material, pertencem a segunda dimensão os direitos sociais, econômicos e culturais. Os direitos sociais, apesar de já serem encontrados em alguns textos dos séculos XVII e XIX, passaram a ser amplamente garantidos a partir das primeiras décadas do século XX (DIMOULIS e MARTINS, p. 68). Sobre a segunda geração leciona PINHO (2011, p. 99): A segunda geração corresponde aos direitos de igualdade, abrangendo os direitos sociais e econômicos. São direitos de conteúdo econômico e social que visam melhorar as condições de vida e de trabalho da população. Significam uma prestação positiva, um fazer do Estado em prol dos menos favorecidos pela ordem social e econômica. Esses direitos nasceram em razão de lutas de uma nova classe social, os trabalhadores. Surgiram em um segundo momento do capitalismo, com o aprofundamento das relações entre capital e trabalho. As primeiras Constituições a estabelecer a proteção de direitos sociais foram a mexicana de 1917 e a alemã de Weimar, em 1919. Exemplos de direitos sociais: salário mínimo, aposentadoria, previdência social, décimo terceiro salário e férias remuneradas. 1.1.3 Direitos Fundamentais da 3.ª Dimensão São marcados pela alteração da sociedade por profundas mudanças na comunidade, galgado em amparar solucionar os novos problemas e preocupações mundiais: o preservacionismo ambiental; proteção dos consumidores; direito de propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade e direito de comunicação. (LENZA, 2012). Dentre os direitos integrantes desta dimensão destacam-se os relacionados ao desenvolvimento (ou progresso), ao meio ambiente, a autodeterminação dos povos, bem como o direito de propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade e o direito de comunicação. Trata-se de um rol apenas exemplificativo, por não excluir outros direitos decorrentes do dever de solidariedade (BONAVIDES, 1996). 1.1.4 Direitos Fundamentais da 4.ª Dimensão Decorre dos avanços no campo da engenharia genética, ao colocarem em risco a própria existência humana, por meio da manipulação do patrimônio genético. (LENZA, 2012). 10 A quarta dimensão compreende os direitos a democracia, informação e pluralismo, introduzidos no âmbito jurídico em razão da globalização política. Esses direitos compendiam o futuro da cidadania e correspondem a derradeira fase da institucionalização do Estado social, sendo imprescindíveis para a realização e legitimidade da globalização política (NOVELINO, 2012, p. 405). 1.1.5 Direitos Fundamentais da 5.ª Dimensão O direito à paz, supremo direito da humanidade (LENZA, 2012). 1.2 Evolução Histórica Desde os primórdios, a humanidade atravessou diversos períodos, cada qual com suas especificidades, trazendo elementos negativos e positivos, neste diapasão, é crível estabelecer que, embora de forma lenta e gradual, houve significativa evolução no campo científico, tecnológico, político, econômico, social e jurídico. Este é o mesmo caminho percorrido pelos direitos inerentes à pessoa humana. Evoluem paulatinamente na mesma velocidade da evolução social. São percebidos, reconhecidos e construídos concomitantemente à experiência da vida do homem em sociedade. Sobre a história dos direitos fundamentais leciona DIRLEY CUNHA, (2011, p. 584): Os direitos fundamentais foram identificados, historicamente, como os valores mais importantes da convivência humana, ou seja, aqueles sem os quais as sociedades acabam perecendo, fatalmente por um processo irreversível de desagregação. Desse modo, mostra-se indispensável o recurso à História, a fim de que, à vista da gênese e do desenvolvimento dos direitos fundamentais, cada um deles se torne melhor compreendido. A compreensão histórica dos direitos fundamentais, portanto, exerce um papel extraordinariamente importante, pois permite verificar a variedade de condições de realização dos direitos do homem, dentro da unidade do gênero humano, as experiências em confronto, ora de sedimentação, ora de crise e a descoberta de novos percursos e novos avanços. Mas não basta observar passivamente a história. É necessário refletir sobre ela e vinculá-la 11 ao destino do ser humano em concreto, à consciência que tenha de si mesmo, à consciência que tenha dos seus direitos ou da necessidade de os adquirir e alargar em todos os domínios da vida social e política. Daí a importância do estudo sobre os antecedentes históricos e a evolução dos direitos fundamentais. No transcorrer do tempo o homem em sociedade sentiu a necessidade de estabelecer métodos de colocar sob a proteção de algum tipo de contrato social (as leis) os direitos inerentes ao ser humano. Percebeu a necessidade de proteger tais direitos para a consecutiva construção de uma sociedade justa. Percebeu, ainda, que deveria, sobretudo, colocar sobre a proteção coercitiva do Estado – sob o império das leis – o bem jurídico mais importante dentre tantos outros, que este deveria servir de norte a todos os demais direitos estabelecidos pelo ordenamento jurídico, e neste sentido identificou-o como o bem da vida. Mas não apenas, e simplesmente, á vida orgânica, mas a vida digna. A partir deste momento a dignidade da pessoa humana passou a ter contornos especiais e grande relevo, em consonância com as transformações sociais, fruto das exigências de uma sociedade que clamava por esta proteção. Assim, temos que o reconhecimento de direitos humanos, assim como a positivação dos direitos fundamentais apenas foi possível através da evolução histórica, ou seja, tais direitos não surgiram todos de uma vez, mas foram sendo descobertos, declarados conforme as próprias transformações da civilização humana, sendo a luta pela limitação do poder político um dos principais fatores para o acolhimento destes direitos (COMPARATO, 2003, p. 40). A doutrina estabelece como marco nascedouro da limitação do poder político o episódio histórico ocorrido século X a.C. no qual se instituiu o reino de Israel, cujo Rei Davi, que se auto intitulava delegado de Deus, ungido a aplicar da lei de Deus, que não mais o fazia como faziam os monarcas de sua época, proclamando-se ora como o próprio Deus ora como um legislador que poderia dizer o que é justo e o que é injusto. A Grécia Antiga foi marco importante para o reconhecimento dos direitos humanos, havendo colaborado no sentido de estabelecer a pessoa humana como centro da questão filosófica, uma vez que passou a desconsiderara explicação 12 mitológica6 da realidade para focar-se na explicação antropocentrista7 (MARTINS, 2003), o que possibilitou a reflexão sobre a vida humana. Foi também na Grécia que começou a germinar a idéia do direito natural8 em patamar superior ao direito positivo9, tendo em vista a diferença entre lei particular que cada povo elabora para sua realidade social mesmo e a lei comum que consiste na possibilidade de estabelecer diferença entre o que é justo e o que é injusto, utilizando-se, para tanto, os parâmetros norteadores da natureza humana, essa distinção feita por Aristóteles tem como exemplo a peça Antígona onde se invoca leis imutáveis contra a lei particular que impedia o enterro de seu irmão (LAFER, 1998). Sobre a evolução do Direito Natural na Grécia antiga, leciona MARTINS, (2012, p. 261): Os mais antigos jusnaturalistas foram os sofistas, filósofos gregos que, paradoxalmente,desenvolveram visão diametralmente oposta ao genuíno jusnaturalismo. Conhecidos através dos diálogos de Platão (427-347 a.C.), os jusnaturalistas sofistas preocupam-se com o fundamento da ordem social, que seria distinto das leis humanas. Não chegam a captar a essência racional da lei natural, por confundi-la com o elemento instintivo no ser humano (“cupiditas naturalis”),tornando o dever-ser equivalente ao ser. (...) Tão antigo quanto o jusnaturalismo sofista, temos o jusnaturalismo teológico, que congrega antigos e modernos pensadores cujo denominador 6 Mitológico – Que provem da mitologia. O termo mitologia pode referir-se tanto ao estudo de mitos ou a um conjunto de mitos. Por exemplo, mitologia comparada é o estudo das conexões entre os mitos de diferentes culturas, ao passo que mitologia grega é o conjunto de mitos originários da Grécia Antiga. O termo "mito" é frequentemente utilizado coloquialmente para se referir a uma história falsa, mas o uso acadêmico do termo não denota geralmente um julgamento quanto à verdade ou falsidade. 7 Antropocentrismo - (do grego anthropos, "humano"; e, kentron, "centro") é uma concepção que considera que a humanidade deve permanecer no centro do entendimento dos humanos, isto é, o universo deve ser avaliado de acordo com a sua relação com o Homem, sendo que as demais espécies, bem como tudo mais, existem para servi-los. O antropocentrismo coloca o homem no centro do universo, postulando que tudo o que existe foi concebido e desenvolvido para a satisfação humana. 8 Direito Natural - O direito natural é o núcleo de juridicidade que é próprio da dignidade da pessoa humana, isto é, o núcleo jurídico da ordem do dever-ser que é inerente ao estatuto ontológico ou dignidade do homem. Dado, então, que o direito natural é a expressão jurídica da dignidade da pessoa humana – de seu estatuto ontológico -, pode-se dizer que a pessoa é o fundamento do direito natural, enquanto inere a ela e é expressão de sua ordem do dever-ser. 9 Direito Positivo - Direito positivo é o conjunto de princípios e regras que regem a vida social de determinado povo em determinada época. Diretamente ligado ao conceito de vigência, o direito positivo, em vigor para um povo determinado, abrange toda a disciplina da conduta humana e inclui as leis votadas pelo poder competente, os regulamentos e as demais disposições normativas, qualquer que seja a sua espécie. Por definir-se em torno de um lugar e de um tempo, é variável, por oposição ao que os jusnaturalistas entendem ser o direito natural. https://pt.wikipedia.org/wiki/Mitologia_grega https://pt.wikipedia.org/wiki/Gr%C3%A9cia_Antiga https://pt.wikipedia.org/wiki/Coloquialismo https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_grega https://pt.wikipedia.org/wiki/Homem https://pt.wikipedia.org/wiki/Sociedade https://pt.wikipedia.org/wiki/Povo https://pt.wikipedia.org/wiki/Vig%C3%AAncia https://pt.wikipedia.org/wiki/Lei https://pt.wikipedia.org/wiki/Separa%C3%A7%C3%A3o_dos_poderes https://pt.wikipedia.org/wiki/Separa%C3%A7%C3%A3o_dos_poderes https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_natural https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_natural 13 comum é fundamentar o Direito Natural na Vontade de Deus, como Supremo Legislador da Natureza, já que seu Criador. (...) Parece-nos que o melhor dos esteios para o Direito Natural o encontramos em Aristóteles (384- 322 a.C.), que teve o mérito de condensar e sistematizar toda a filosofia grega antiga, num corpo de escritos de uma abrangência temática impressionante, que se preservou e chegou até nós, acompanhada por seus comentadores gregos, árabes e latinos. Quer em seus escritos ligados às hoje denominadas Ciências Exatas, quer em relação às Ciências Sociais, o Estagirita parte da premissa fática, de captação empírica, de que a Natureza age finalisticamente, o que se aplica também ao homem, que age sempre com vista a um fim, que é a busca de um bem13. A lei natural em Aristóteles é decorrência direta da razão humana e, desse modo, exclusiva do homem, que a experimenta autonomamente dentro de si. Não tem, portanto, fundamento teológico, tampouco nas leis criadas pelos homens14, que variam no tempo e no espaço, mas sim na própria natureza do homem, que é invariável e universal, passível de captação pela experiência. Na Roma clássica também existiu o ius gentium10 que atribuía alguns direitos aos estrangeiros embora em quantidade inferior aos dos romanos (MIRANDA, 2000, p. 16) e a própria possibilidade de participação do povo nos assuntos da cidade serviram de limitação para o exercício do poder político (COMPARATO, 2003, p. 43). O cristianismo contribuiu filosoficamente para o estabelecimento dos direitos humanos ao limitar o poder político. Neste sentido pode-se observar a distinção realizada pelo Evangelho de São Marco, capítulo 12, versículo 17, entre o que é de “César” e o que é de “Deus”, bem como, na Epístola ao Gálatas, capítulo 3, versículo 26, no fato da salvação através de Jesus Cristo ser possível a todas as pessoas de todos os povos. Neste mesmo sentido, ainda encontramos respaldo nas lições de MARTINS (2012, p. 263): S. Tomás de Aquino (1224-1274), sem dúvida a grande cabeça da Idade Média, ao lado de S. Agostinho, teve como um dos méritos, não menores, o de apoiar sua construção teórica na filosofia aristotélica (como o Bispo de Hipona o fez com o pensamento platônico). Nesse sentido, pode-se falar em síntese aristotélico-tomista para o fundamento que desenvolve para o Direito Natural, de caráter racional e empírico, cuja solidez e harmonia de princípios recomenda uma explanação mais ampla, já que, a nosso ver, não chegou a ser superada por nenhuma outra posterior (mas apenas incompreendida por uns ou aperfeiçoada em seus desdobramentos por outros). Daí chamarmos de jusnaturalismo clássico aquele oriundo da fusão do pensamento de Aristóteles e Tomás de Aquino, revisitado e prestigiado 10 Ius gentium ou jus gentium - ("direito das gentes" ou "direito dos povos", em latim) compunha-se das normas de direito romano que eram aplicáveis aos estrangeiros. 14 modernamente por mestres tanto de tradição romano-germânica quanto anglo-americana. (...) S. Tomás de Aquino discute o tema do Direito Natural em duas partes da Suma Teológica: quando trata das questões relativas à lei (I-II, q. 90- 108) e quando aborda as questões relativas à justiça (II-II, q. 57-80). Para se entender o que é a lei natural, deve-se analisar o gênero “lei” e a espécie “natural”, distinguindo-a das demais que estão sob o denominador comum de lei. Eis a definição que S. Tomás dá de lei: “A lei é certa regra e medida dos atos, segundo a qual alguém é levado a agir ou a apartar-se da ação. Diz-se, com efeito, lei do que deve ser ligado, pois obriga a agir” (I-II, q. 90, art. 1, resp). A lei natural se distingue da lei positiva pelo fato da primeira decorrer da natureza das coisas e a outra ser editada pelo homem.É com o cristianismo que todos os seres humanos, só por o serem e sem acepção de condições, são considerados pessoas dotadas de um eminente valor. Criados a imagem e semelhança de Deus, todos os homens e mulheres são chamados à salvação através de Jesus, que, por eles, verteu o seu sangue. Criados à imagem e semelhança de Deus, todos têm uma liberdade irrenunciável que nenhuma sujeição política ou social pode destruir (MIRANDA, 2000, p. 17). Na idade média a sociedade era caracterizada pela descentralização política com a existência de diversos centros de poder, isso por influência do catolicismo e pelo feudalismo, decorrente da dificuldade de praticar a atividade comercial. Nesta época reconheciam-se apenas duas castas as quais eram detentoras de direitos: o Clero e a Nobreza. A partir da segunda metade da Idade Média começa-se a difundir documentos escritos reconhecendo direitos a determinados estamentos, a determinadas comunidades, nunca a todas as pessoas, principalmente através de forais ou cartas de franquia (FERREIRA FILHO, 1998). Dentre estes documentos, merece destaque a Magna Carta, outorgada por João Sem-Terra no século XII devido a pressões exercidas pelos barões decorrentes do aumento de exações fiscais para financiar campanhas bélicas e pressões da igreja para o Rei submeter-se a autoridade papal. Tal documento reconheceu vários direitos, tais como a liberdade eclesial, a não existência de impostos, sem anuências dos contribuintes, a propriedade privada, a liberdade de ir e vir e a desvinculação da lei e da jurisdição da pessoa do monarca (COMPARATO, 2003). No campo teórico foi de fundamental importância os escritos de São Tomás de Aquino ressaltando a dignidade e igualdade do ser humano por ter sido criado a imagem e semelhança de Deus e distinguindo quatro classes de lei, a lei eterna, a 15 lei natural, a lei divina e a lei humana, esta última, fruto da vontade do soberano, entretanto devendo estar de acordo com a razão e limitada pela vontade de Deus (MAGALHÃES, 2000). DALLARI (2000, p. 54) leciona que: No final da Idade Média, no século XIII, aparece a grande figura de Santo Tomás de Aquino, que, tomando a vontade de Deus como fundamento dos direitos humanos, condenou as violências e discriminações, dizendo que o ser humano tem direitos naturais que devem ser sempre respeitados, chegando a afirmar o direito de rebelião dos que forem submetidos a condições indignas. A prática jurídica, entretanto demonstrou uma prevalência do grupo sobre o indivíduo, não existindo direitos humanos universais, ou seja, reconhecidos para toda e qualquer pessoa, mas sim direitos dirigidos a determinados estamentos aliados a uma limitação territorial (RUBIO, 1998, p. 72). Quando a feudalismo entrou em colapso, acompanhado pela descentralização política e pelo predomínio do magistério da Igreja Católica11, iniciou-se um processo de mudanças em diversos matizes sociais. Nesse sentido leciona (MARTINÉZ, 1999): Essa mudança comportamental é decorrente de vários fatores tais como o desenvolvimento do comercio que criou uma nova classe, a burguesia, que não participava da sociedade feudal; a aparição do Estado Moderno, ocorrendo a centralização do poder político, ou seja, o direito passa a ser o mesmo para todos dentro do reino, sem as inúmeras fontes de comando que caracterizavam o medievo; uma mudança de mentalidade, os fenômenos passam a ser explicados cientificamente, através da razão e não apenas através de uma visão religiosa, ocorrendo portanto uma mundialização da cultura. Com o Estado Moderno que surge galgado em uma nova classe, a burguesa, e diante da necessidade de mitigar o poder do Estado para desenvolver sua atividade com segurança, o indivíduo começará a ter preferência sobre o grupo. O reconhecimento formal dos direitos do homem à liberdade e à igualdade foi produto direto do pensamento liberal-burguês do século XVIII, fortemente 11 Magistério da Igreja Católica (em latim: Magisterium) - refere-se à função de ensinar que é própria da autoridade da Igreja e que, por isso, deve ser obedecido e seguido pelos demais católicos. 16 marcado pela doutrina individualista e pela crescente noção de que o Estado não mais podia intervir na esfera de autonomia individual de cada um. (MARTINS, 2012). Outro ponto importante para o reconhecimento de direitos inerentes a pessoa humana foi a Reforma Protestante que contestou a uniformidade da Igreja Católica, dando importância a interpretação pessoal das Sagradas Escrituras, através da razão (LALAGUNA, 1993, p. 15). Ressalta-se o Edito de Nantes onde o Rei Enrique IV da França proclamou a liberdade religiosa, num claro reconhecimento do direito que cada pessoal tem de participar, de acreditar em uma religião, ou também de não acreditar ou não participar de nenhuma. Embora seja reconhecido o avanço de tal documento, este direito era uma mera concessão real, tanto que foi revogado por Luis XIV (RUBIO, 1998, p. 73). Não se pode negar a importância das Revoluções inglesa, americana e francesa para o reconhecimento de direitos inerentes a pessoa humana, cada uma é claro contribuindo da sua maneira, sendo as duas; últimas as que influenciaram as constituições do século XIX (RUBIO, 1998, p. 82). A Revolução Gloriosa, esta vinculada a própria evolução histórica de reconhecimento de direitos aos ingleses e de limitação do poder real que ocorria, desde a Carta Magna sendo, portanto, uma evolução pragmática, uma continuação de conquistas anteriores e não uma ruptura com o Antigo Regime como a Revolução Francesa (MARTÍNEZ, 1999, p. 148). Nesse sentido leciona SILVA (2011, p. 150): Na Inglaterra, elaboraram-se cartas e estatutos assecuratórios de direitos fundamentais, como a Magna Carta 12 (1215 – 1225), a Petition of Rights 13 12 Magna Carta - Carta das liberdades, ou concórdia entre o rei João e os barões para a outorga das liberdades da Igreja e do rei Inglês, é um documento de 1215 que limitou o poder dos monarcas da Inglaterra, especialmente o do rei João, que o assinou, impedindo assim o exercício do poder absoluto. Resultou de desentendimentos entre João, o Papa e os barões ingleses acerca das prerrogativas do soberano. Segundo os termos da Magna Carta, João deveria renunciar a certos direitos e respeitar determinados procedimentos legais, bem como reconhecer que a vontade do rei estaria sujeita à lei. Considera-se a Magna Carta o primeiro capítulo de um longo processo histórico que levaria ao surgimento do constitucionalismo. 13 Petition of Rights - O direito de petição nasceu na Inglaterra, durante a Idade Moderna, fruto dasRevoluções inglesas, especialmente a de 1628. Compreendido na Carta Magna de 1215, o right of petition somente se consolidou na Declaração de Direitos de 1689, consistindo no simples direito de o Grande Conselho, e depois de o Parlamento, pedir ao rei que sancionasse leis. https://pt.wikipedia.org/wiki/1215 https://pt.wikipedia.org/wiki/Inglaterra https://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_de_Inglaterra https://pt.wikipedia.org/wiki/Absolutismo https://pt.wikipedia.org/wiki/Papa https://pt.wikipedia.org/wiki/Rei https://pt.wikipedia.org/wiki/Lei https://pt.wikipedia.org/wiki/Constitucionalismo https://pt.wikipedia.org/wiki/Inglaterra https://pt.wikipedia.org/wiki/Idade_Moderna https://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A7%C3%A3o_inglesa https://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A7%C3%A3o_inglesa https://pt.wikipedia.org/wiki/1628 https://pt.wikipedia.org/wiki/Bill_of_Rights https://pt.wikipedia.org/wiki/1689 17 (1628), o Habeas Corpus Amendment Act 14 (1679) e o Bill of Rights 15 (1688). Não são, porém, declarações de direitos no sentido moderno, que só apareceram no século XVIII com as revoluções: americana e francesa. Tais textos limitados e àvezes estamentais, no entanto, condicionaram a formação de regras consuetudinárias de mais ampla proteção dos direitos humanos fundamentais. Realmente a estabilidade e o sempre firme desenvolvimento das instituições inglesas bastaram para tornar ociosa uma lista maior das liberdades públicas. A constante afirmação do Parlamento inglês e dos precedentes judiciais, formando a common law 16 , fora suficientes com aqueles documentos históricos, para assentar o mais firme respeito pelos direitos fundamentais do homem. O Bill of Rights de 1689, reconheceu alguns direitos ao indivíduo o direito de liberdade, o direito a segurança e o direito a propriedade privada, direitos estes que já haviam sido consagrados em outros documentos, entretanto como eram constantemente violados pelo poder real foram recordados na esperança de que desta fez fossem respeitados (ARAGÃO, 2001, p. 32). Também impôs limites ao poder real, pois deslocou para o Parlamento as competências de legislar e de criar tributos, e institucionalizou a separação de poderes, eliminando o Absolutismo pela primeira vez desde o Início da Idade Moderna sendo esta sua principal contribuição (COMPARATO, 2003, p. 90). COMPARATO (2003, p. 92) leciona: A Revolução Inglesa apresenta, assim, um caráter contraditório no tocante as liberdades públicas. Se, de um lado, foi estabelecida pela primeira vez no Estado moderno a separação de poderes como garantia das liberdades civis, por outro lado essa fórmula de organização estatal, no Bill of Rights, constituiu o instrumento político de imposição, a todos os súditos do rei da Inglaterra, de uma religião oficial. Muitos ingleses, temerosos pela perseguição contra aqueles que não comungavam da religião oficial acabaram fugindo para a colônia americana 14 Habeas Corpus Amendment Act - Outro acontecimento ocorrido na Inglaterra e também de grande importância para o desenvolvimento dos direitos humanos foi o surgimento do Habeas Corpus Act em 1679, que foi uma lei do Parlamento da Inglaterra criada durante o reinado do Rei Charles II que buscava definir e reforçar o antigo e já existente instituto do habeas corpus, como garantia da liberdade individual contra a prisão ilegal, abusiva ou arbitrária. O Habeas Corpus Act muitas vezes é erradamente descrito como a origem do recurso dehabeas corpus. Entretanto, o habeas corpus já existia na Inglaterra há pelo menos três séculos antes. 15 Bill of Rights - A Declaração de direito de 1689 (em inglês Bill of Rights of 1689) é um documento feito na Inglaterra pelo Parlamento que determinou, entre outras coisas, a liberdade, a vida e a propriedade privada, assegurando o poder do Parlamento na Inglaterra. 16 Common Law - é um termo utilizado nas ciências jurídicas para se referir a um sistema de Direito cuja aplicação de normas e regras não estão escritas mas sancionadas pelo costume ou pela jurisprudência. 18 buscando ali um novo estilo de vida baseado na liberdade e na tolerância, carregando consigo a idéia de que existem alguns direitos inerentes à pessoa humana que o poder político deve respeitar (RUBIO, 1998, p. 82). Em 1765 os colonos americanos, devido a várias imposições fiscais impostas pela metrópole, reuniram-se tentando impugna-las, com nítida influência da no taxation without representation17, reivindicando o mesmo direito que os súditos da matriz possuíam, procurando criar uma confederação, encabeçada pelo Monarca e com uma assembléia representativa para cada unidade federada, portanto inicialmente os colonos queriam continuar sob a proteção inglesa, entretanto esta solução não foi possível dificultando cada vez mais a relação entre a Inglaterra e a América (FIORAVANTI, 2003, p. 80 e 81). Em 1773, na cidade de Boston, um grupo de 300 pessoas lançou ao mar caixas contendo chá devido em protesto pelos impostos instituídos pela Coroa britânica sobre produtos nativos. Em 1774 criou-se um exército comum entre as colônias demonstrando que o respeito a Metrópole estava cada vez mais frágil abrindo caminho para a Independência (RUBIO, 1998, p. 83). Em 1776 é elaborada a Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia afirmando que todos os seres humanos são livres e independentes, possuindo direitos inatos, tais como a vida, a liberdade, a propriedade, a felicidade e a segurança, registrando o início do nascimento dos direitos humanos na história (COMPARATO, 2003, p. 49). Sobre a declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia leciona CUNHA (2011): Cuida-se da primeira Declaração de Direitos em sentido moderno. Esta declaração marca a transição dos direitos de liberdade do povo inglês para os direitos fundamentais constitucionais. A Declaração da Virgínia formulada pelos representantes do bom povo de Virgínia (uma das treze colônias Inglesas na América do Norte), em 16 de junho de 1776, ou seja, antes mesmo da declaração de independência das treze colônias inglesas, preocupou-se, essencialmente, com a fundação de um governo democrático e organização de um sistema de limitação de poderes, inspirada na crença da existência de direitos naturais imprescritíveis do homem. Para termos uma ideia dessa afirmação, basta observarmos o que dispunham os dois primeiros parágrafos da declaração em comento, que expressam com clareza os fundamentos do regime democrático: o reconhecimento de direitos inatos de toda pessoa humana e o princípio de que todo poder 17 Taxation without representation - A frase que marcou a identidade independentista americana foi a célebre "no taxation without representation": nenhuma tributação sem representação responsável dos governantes. 19 emana do povo. Firma também os princípios da igualdade de todos perante a lei (rejeitando os privilégios e a hereditariedade dos cargos públicos) e da liberdade. A Declaração de Independência dos Estados Unidos é elaborada em quatro de julho de 1776 e como ponto central afirma que todos os homens são iguais perante Deus e que este lhes deu direitos inalienáveis acima de qualquer poder político, citando a vida, a liberdade, a busca pela felicidade e relacionando uma série de abusos cometidos pelo Rei da Inglaterra, explicando os motivos da separação política. Após tal separação o povo norte-americano passa a ser livre para seguir seu próprio destino, elaborando em 1787 a Constituição Federal dos Estados Unidos da América que estruturou o Estado Federal e distribuiu competências, entretanto não fez qualquer menção a direitos humanos, estes apenas tornar-se-iam constitucionais em 1791 através de dez emendas, consagrado a liberdade, a inviolabilidade do domicílio, a segurança, o devido processo legal, a proporcionalidade da pena, constitucionalizando assim os direitos inerentes a pessoa humana (RUBIO, 1998, p. 85). Em 1789 a humanidade assistiu ao surgimento da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, que iria influenciar todo o constitucionalismo que se seguiu. Antes dela, porém, em solo norte-americano, tem-se a Declaração de Direitos da Virgínia, de 1776 (TAVARES, 2012, p. 488). Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão (1789). Os representantes do povo francês, reunidos em Assembléia Nacional, tendo em vista que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos do homem são as únicas causas dos males públicos e da corrupção dos Governos, resolveram declarar solenemente os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem, a fim de que esta declaração, sempre presente em todos os membros do corpo social, lhes lembre permanentemente seus direitos e seus deveres; a fim de que os atos do Poder Legislativo e do Poder Executivo, podendo ser a qualquer momento comparados com a finalidade de toda a instituição política, sejam por isso mais respeitados; a fim de que as reivindicações dos cidadãos, doravante fundadas em princípiossimples e incontestáveis, se dirijam sempre à conservação da Constituição e à felicidade geral. Em razão disto, a Assembléia Nacional reconhece e declara, na presença e sob a égide do Ser Supremo, os seguintes direitos do homem e do cidadão: Art.1º. Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem fundamentar-se na utilidade comum. 20 Art. 2º. A finalidade de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem. Esses direitos são a liberdade, a propriedade a segurança e a resistência à opressão. Art. 3º. O princípio de toda a soberania reside, essencialmente, na nação. Nenhuma operação, nenhum indivíduo pode exercer autoridade que dela não emane expressamente. Art. 4º. A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o próximo. Assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela lei. Art. 5º. A lei não proíbe senão as ações nocivas à sociedade. Tudo que não é vedado pela lei não pode ser obstado e ninguém pode ser constrangido a fazer o que ela não ordene. Art. 6º. A lei é a expressão da vontade geral. Todos os cidadãos têm o direito de concorrer, pessoalmente ou através de mandatários, para a sua formação. Ela deve ser a mesma para todos, seja para proteger, seja para punir. Todos os cidadãos são iguais a seus olhos e igualmente admissíveis a todas as dignidades, lugares e empregos públicos, segundo a sua capacidade e sem outra distinção que não seja a das suas virtudes e dos seus talentos. Art. 7º. Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos determinados pela lei e de acordo com as formas por esta prescritas. Os que solicitam, expedem, executam ou mandam executar ordens arbitrárias devem ser punidos; mas qualquer cidadão convocado ou detido em virtude da lei deve obedecer imediatamente, caso contrário torna-se culpado de resistência. Art. 8º. A lei apenas deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias e ninguém pode ser punido senão por força de uma lei estabelecida e promulgada antes do delito e legalmente aplicada. Art. 9º. Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei. Art. 10º. Ninguém pode ser molestado por suas opiniões, incluindo opiniões religiosas, desde que sua manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida pela lei. Art. 11º. A livre comunicação das idéias e das opiniões é um dos mais preciosos direitos do homem. Todo cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir livremente, respondendo, todavia, pelos abusos desta liberdade nos termos previstos na lei. Art. 12º. A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública. Esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para utilidade particular daqueles a quem é confiada. Art. 13º. Para a manutenção da força pública e para as despesas de administração é indispensável uma contribuição comum que deve ser dividida entre os cidadãos de acordo com suas possibilidades. Art. 14º. Todos os cidadãos têm direito de verificar, por si ou pelos seus representantes, da necessidade da contribuição pública, de consenti-la livremente, de observar o seu emprego e de lhe fixar a repartição, a coleta, a cobrança e a duração. Art. 15º. A sociedade tem o direito de pedir contas a todo agente público pela sua administração. Art. 16.º A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição. Art. 17.º Como a propriedade é um direito inviolável e sagrado, ninguém dela pode ser privado, a não ser quando a necessidade pública legalmente comprovada o exigir e sob condição de justa e prévia indenização. 21 Já no século XX verifica-se uma proliferação de convenções de caráter universal ou regional, consagrando diversos direitos. Assim, tem-se a Declaração Universal de Direitos do Homem, adotada em 1948 pela Assembléia Geral da ONU, e a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, só para citar duas delas. (TAVARES, 2012, p. 488). CARTA INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS Declaração Universal dos Direitos Humanos Assembléia Geral da ONU, 10 de dezembro de 1978 Preâmbulo - Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo; Considerando que o desconhecimento e o desprezo dos direitos do Homem conduziram a actos de barbárie que revoltam a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os seres humanos sejam livres de falar e de crer, libertos do terror e da miséria, foi proclamado como a mais alta inspiração do Homem; Considerando que é essencial a proteção dos direitos do Homem através de um regime de direito, para que o Homem não seja compelido, em supremo recurso, à revolta contra a tirania e a opressão; Considerando que é essencial encorajar o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações; Considerando que, na Carta, os povos das Nações Unidas proclamam, de novo, a sua fé nos direitos fundamentais do Homem, na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres e se declaram resolvidos a favorecer o progresso social e a instaurar melhores condições de vida dentro de uma liberdade mais ampla; Considerando que os Estados membros se comprometeram a promover, em cooperação com a Organização das Nações Unidas, o respeito universal e efectivo dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais; Considerando que uma concepção comum destes direitos e liberdades é da mais alta importância para dar plena satisfação a tal compromisso: A Assembléia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os orgãos da sociedade, tendo-a constantemente no espírito, se esforcem, pelo ensino e pela educação, por desenvolver o respeito desses direitos e liberdades e por promover, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação universais e efectivos tanto entre as populações dos próprios Estados membros como entre as dos territórios colocados sob a sua jurisdição. Artigo 1° Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. Artigo 2° Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autônomo ou sujeito a alguma limitação de soberania. 22 Artigo 3° Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Artigo 4° Ninguém será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o trato dos escravos, sob todas as formas, são proibidos. Artigo 5° Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. Artigo 6° Todos os indivíduos têm direito ao reconhecimento, em todos os lugares, da sua personalidade jurídica. Artigo 7° Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual protecção da lei. Todos têm direito a protecção igual contra qualquerdiscriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação. Artigo 8° Toda a pessoa tem direito a recurso efectivo para as jurisdições nacionais competentes contra os actos que violem os direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição ou pela lei. Artigo 9° Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado. Artigo 10° Toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja equitativa e publicamente julgada por um tribunal independente e imparcial que decida dos seus direitos e obrigações ou das razões de qualquer acusação em matéria penal que contra ela seja deduzida. Artigo 11° 1.Toda a pessoa acusada de um acto delituoso presume-se inocente até que a sua culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas. 2.Ninguém será condenado por acções ou omissões que, no momento da sua prática, não constituíam acto delituoso à face do direito interno ou internacional. Do mesmo modo, não será infligida pena mais grave do que a que era aplicável no momento em que o acto delituoso foi cometido. Artigo 12° Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a protecção da lei. Artigo 13° 1.Toda a pessoa tem o direito de livremente circular e escolher a sua residência no interior de um Estado. 2.Toda a pessoa tem o direito de abandonar o país em que se encontra, incluindo o seu, e o direito de regressar ao seu país. Artigo 14° 1.Toda a pessoa sujeita a perseguição tem o direito de procurar e de beneficiar de asilo em outros países. 2.Este direito não pode, porém, ser invocado no caso de processo realmente existente por crime de direito comum ou por actividades contrárias aos fins e aos princípios das Nações Unidas. Artigo 15° 1.Todo o indivíduo tem direito a ter uma nacionalidade. 2.Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua nacionalidade nem do direito de mudar de nacionalidade. Artigo 16° 1.A partir da idade núbil, o homem e a mulher têm o direito de casar e de constituir família, sem restrição alguma de raça, nacionalidade ou religião. Durante o casamento e na altura da sua dissolução, ambos têm direitos iguais. 2.O casamento não pode ser celebrado sem o livre e pleno consentimento dos futuros esposos. 3.A família é o elemento natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção desta e do Estado. Artigo 17° 1.Toda a pessoa, individual ou colectiva, tem direito à propriedade. 2.Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua propriedade. Artigo 18° Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos. 23 Artigo 19° Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e idéias por qualquer meio de expressão. Artigo 20° 1.Toda a pessoa tem direito à liberdade de reunião e de associação pacíficas. 2.Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação. Artigo 21° 1.Toda a pessoa tem o direito de tomar parte na direcção dos negócios, públicos do seu país, quer directamente, quer por intermédio de representantes livremente escolhidos. 2.Toda a pessoa tem direito de acesso, em condições de igualdade, às funções públicas do seu país. 3.A vontade do povo é o fundamento da autoridade dos poderes públicos: e deve exprimir-se através de eleições honestas a realizar periodicamente por sufrágio universal e igual, com voto secreto ou segundo processo equivalente que salvaguarde a liberdade de voto. Artigo 22° Toda a pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social; e pode legitimamente exigir a satisfação dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis, graças ao esforço nacional e à cooperação internacional, de harmonia com a organização e os recursos de cada país. Artigo 23° 1.Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à protecção contra o desemprego. 2.Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual. 3.Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de protecção social. 4.Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se filiar em sindicatos para defesa dos seus interesses. Artigo 24° Toda a pessoa tem direito ao repouso e aos lazeres, especialmente, a uma limitação razoável da duração do trabalho e as férias periódicas pagas. Artigo 25° 1.Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade. 2.A maternidade e a infância têm direito a ajuda e a assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozam da mesma protecção social. Artigo 26° 1.Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional dever ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito. 2.A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, bem como o desenvolvimento das actividades das Nações Unidas para a manutenção da paz. 3.Aos pais pertence a prioridade do direito de escholher o género de educação a dar aos filhos. Artigo 27° 1.Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico e nos benefícios que deste resultam. 2.Todos têm direito à protecção dos interesses morais e materiais ligados a qualquer produção científica, literária ou artística da sua autoria. 24 Artigo 28° Toda a pessoa tem direito a que reine, no plano social e no plano internacional, uma ordem capaz de tornar plenamente efectivos os direitos e as liberdades enunciadas na presente Declaração. Artigo 29° 1.O indivíduo tem deveres para com a comunidade, fora da qual não é possível o livre e pleno desenvolvimento da sua personalidade. 2.No exercício deste direito e no gozo destas liberdades ninguém está sujeito senão às limitações estabelecidas pela lei com vista exclusivamente a promover o reconhecimento e o respeito dos direitos e liberdades dos outros e a fim de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar numa sociedade democrática. 3.Em caso algum estes direitos e liberdades poderão ser exercidos contrariamente e aos fins e aos princípios das Nações Unidas. Artigo 30° Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada de maneira a envolver para qualquer Estado, agrupamento ou indivíduo o direito de se entregar a alguma actividade ou de praticar algum acto destinado a destruir os direitos e liberdades aqui enunciados.A partir da Declaração Universal dos Direitos do Homem, datada de 10 de dezembro de 1948, os direitos fundamentais, passaram a ter conotação mais relevante perante a comunidade internacional, como também no ordenamento jurídico interno de cada Estado. Pode-se considerar, portanto direitos humanos como aqueles direitos que buscam a proteção da pessoa humana tanto em seu aspecto individual como em seu convívio social, em caráter universal (ANTUNES, 2005, p. 340), sem o reconhecimento de fronteiras políticas todas decorrentes de conquistas históricas e independentes de positivação em uma ordem específica. Já os direitos fundamentais, estes somente nascem para a sociedade quando positivados por um ordenamento jurídico específico, geralmente quando previstos nas normas constitucionais de um Estado. Nesse sentido leciona Wolfgang Sarlet (2005, p. 35 e 36): (...) o termo direitos fundamentais se aplica para aqueles direitos do ser humano reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo de determinado Estado, ao passo que a expressão direitos humanos guardaria relação com os documentos de direito internacional, por referir-se àquelas posições jurídicas que se reconhecem ao ser humano como tal, independentemente de sua vinculação com determinada ordem constitucional, e que, portanto aspiram à validade universal, para todos os povos e tempos, de tal sorte que revelam um inequívoca caráter supranacional. 25 Portanto a expressão direitos humanos é utilizada para designar o momento em que surgem ou são estabelecidos pela humanidade, já a expressão direitos fundamentais é utilizada quando estes direitos são positivados no ordenamento jurídico de determinado Estado. 1.3 Características Os direitos fundamentais - como categoria jurídica fundamental reconhecida em razão da dignidade da pessoa humana e essencial num Estado Constitucional Democrático de Direito - possuem características comuns que os identificam entre si e os distinguem das outras categorias jurídicas (CUNHA, 2011): Nesse sentido são apontadas pela loutrina as seguintes características: 1.3.1 Historicidade Para os autores que não aceitam uma concepção jusnaturalista, de direitos inerentes à condição humana, decorrentes de uma ordem superior, os direitos fundamentais são produtos da evolução histórica. Surgem das contradições existentes no seio de uma determinada sociedade (PINHO, 2011, p. 98). Nesse sentido lecionam MENDES e BRANCO (2012, p. 126): Se os direitos fundamentais não são, em princípio, absolutos, não podem pretender valia unívoca de conteúdo a todo tempo e em todo lugar. Por isso, afirma-se que os direitos fundamentais são um conjunto de faculdades e instituições que somente faz sentido num determinado contexto histórico. O recurso à História mostra-se indispensável para que, à vista da gênese e do desenvolvimento dos direitos fundamentais, cada um deles se torne mais bem compreendido. O caráter da historicidade, ainda, explica que os direitos possam ser proclamados em certa época, desaparecendo em outras, ou que se modifiquem no tempo. Revela-se, desse modo, a índole evolutiva dos direitos fundamentais. Essa evolução é impulsionada pelas lutas em defesa de novas liberdades em face de poderes antigos — já que os direitos fundamentais costumam ir-se afirmando gradualmente — e em face das novas feições assumidas pelo poder. MENDES e BRANCO (2012, p. 242) afirmam que “a ilustração de interesse prático acerca do aspecto da historicidade dos direitos fundamentais é dada pela evolução que se observa no direito a não receber pena de caráter perpétuo. Tanto a 26 Constituição atual quanto a anterior estabeleceu vedação à pena de caráter perpétuo. Esse direito, que antes de 1988 se circunscrevia à esfera das reprimendas penais, passou a ser também aplicável a outras espécies de sanções. Em fins de 1988, o STF, confirmando acórdão do STJ, estendeu a garantia ao âmbito das sanções administrativas. A confirmar o caráter histórico-evolutivo – e, portanto, não necessariamente uniforme – da proteção aos direitos fundamentais, nota-se, às vezes, descompasso na compreensão de um mesmo direito diante de casos concretos diversos. Assim, não obstante o entendimento do STF acima mencionado, a Corte durante bom tempo continuou a admitir a extradição para o cumprimento de penas de caráter perpétuo, jurisprudência somente revista em 2004.” 1.3.2 Inalienabilidade Esses direitos são intransferíveis e inegociáveis (PINHO, 2011, p. 98). Os direitos fundamentais são intransferíveis e inegociáveis, já que não se encontram à disposição de seu titular. Assim, seu titular não pode despojar-se de seus direitos fundamentais. Ademais são desprovidos de conteúdo econômico- patrimonial (SILVA, 1998, p. 185). 1.3.3 Imprescritibilidade Não deixam de ser exigíveis em razão da falta de uso (PINHO, 2011, p. 98). Prescrição é um instituto jurídico que somente atinge, coarctando, a exigibilidade dos direitos de caráter patrimonial, não a exigibilidade dos direitos personalíssimos, ainda que não individualistas, como é o caso. Se são sempre exercíveis e exercidos, não há intercorrência temporal de não exercício que fundamente a perda da exigibilidade pela prescrição (SILVA, 1998). 1.3.4 Irrenunciabilidade 27 Nenhum ser humano pode abrir mão de possuir direitos fundamentais. Pode até não usá-los adequadamente, mas não pode renunciar à possibilidade de exercê- los (PINHO, 2011, p. 98). Outra importante característica e a irrenunciabilidade. Não se deve admitir a renuncia ao núcleo substancial de um direito fundamental, ainda que a limitação voluntária seja valida sob certas condições, sendo necessário verificar na analise da validade do ato a finalidade da renuncia, o direito fundamental concreto a ser preservado e a posição jurídica do titular (livre e autodeterminada). A autolimitação voluntária esta sujeita, a qualquer tempo, a revogacao. O não exercício ou o uso negativo de um direito (não participar de uma manifestação, não se filiar a um partido político, não interpor um recurso...) não significa uma renuncia por parte de seu titular. (CANOTILHO, 2000, p. 453) 1.3.5 Universalidade Todos os seres humanos têm direitos fundamentais que devem ser devidamente respeitados. Não há como excluir uma parcela da população do absoluto respeito à condição de ser humano (PINHO, 2011, p. 98). Sobre a Universalidade leciona ROTHENBURG (2001, p. 56): Os direitos fundamentais, por serem imprescindíveis convivência e existência digna, livre e igual da pessoa humana, destinam-se a todos os serem humanos, Ora, seria uma contradição imperdoável falar de direitos do homem que não fossem universais, É da essência dos direitos fundamentais a sua generalidade, vale dizer, a sua universalidade, Convém esclarecer, contudo, que essa universalidade deve ser compreendida em termos, uma vez que, conquanto existam direitos de todos os seres humanos (como o direito à vida e à liberdade), há direitos que só interessam a alguns (como o direito dos trabalhadores) ou só pertencem a poucos (como os direitos políticos), Ademais, a fixação do conteúdo dos direitos fundamentais fica a cargo da consciência geral e do consenso desenvolvido por determinada comunidade em cada momento histórico e cada lugar, de modo que a universalidade não deve ignorar o diferente significado que um "mesmo" direito fundamental assume em contextos distintos, o que impõe uma consideração constitucional das diferentes realidades, como a dos Estados "periféricos" ou "subdesenvolvidos". 1.3.6 Limitabilidade 28 Os direitos fundamentais não são absolutos (relatividade), havendo, muitas vezes, no caso concreto, confronto, conflito de interesses. A solução ou vem discriminada na própria Constituição(ex.: direito de propriedade versus desapropriação), ou caberá ao intérprete, ou magistrado, no caso concreto, decidir qual direito deverá prevalecer, levando em consideração a regra da máxima observância dos direitos fundamentais envolvidos, conjugando –a com a sua mínima restrição (LENZA, 2012, p. 962). Os direitos fundamentais não são absolutos. Podem ser limitados, sempre que houver uma hipótese de colisão de direitos fundamentais (PINHO, 2011, p. 98). 1.4 Os Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988 A Constituição brasileira de 1988 colocou no seu centro os direitos fundamentais. A própria localização topográfica do catálogo dos direitos fundamentais, no início do texto constitucional (Título II), demonstra a intenção do constituinte em lhe dar grande importância. Além disso, já no preâmbulo e depois no Título I, é possível constatar o acento forte dado aos direitos fundamentais. Podemos dizer que, além de os direitos fundamentais constituírem os princípios fundamentais da Constituição, eles se encontram presentes de uma forma direta ou indireta em todo o corpo da Constituição (GROFF, 2008, p. 21). A Constituição de 1988 inaugura, pelo menos teoricamente, uma etapa de amplo respeito pelos direitos fundamentais e reconhecida efetividade. Ao lançar um primeiro e breve olhar para a nossa Lei Fundamental, percebe-se imediatamente uma reveladora inovação, de cunho topográfico. Distinguindo- se das Cartas anteriores, a Constituição em vigor positivou os referidos direitos logo no início de suas disposições (título lI), após o que tratou da organização do Estado (título III), dando cristalinas amostras de que se preocupou prevalentemente com o ser humano, enaltecendo-o como o "fim" do Estado, este considerado "instrumento" de realização da felicidade daquele. Em outras palavras, com a novel posição topográfica dos direitos fundamentais, é nítida a opção da Constituição atual pelo 29 Estado como o instrumento, e pelo homem como o fim, e isso é um importante subsídio hermenêutico (CUNHA, 2011, p. 327). Nesse sentido leciona GROFF (2008): A Constituição contempla as três gerações ou dimensões de direitos apontadas pela doutrina moderna: direitos de primeira, segunda e terceira geração. Essa classificação realizada pela doutrina baseia-se na ordem cronológica em que esses direitos foram recepcionados em nível constitucional, e são cumulativos. Os direitos fundamentais de primeira geração são os direitos e garantias individuais, civis e políticos, que surgiram no fim do século XVIII. Os direitos de segunda geração são os direitos econômicos, sociais e culturais, que surgiram na primeira metade do século XX. E os direitos de terceira geração são os direitos de solidariedade ou de fraternidade, que surgiram na segunda metade do século XX. As Constituições brasileiras de 1824 e 1891 apenas traziam direitos de primeira geração. As Constituições de 1934, 1937, 1946, 1967 e 1969 trouxeram direitos de primeira e segunda geração. Portanto, inova a Constituição de 1988 com os direitos de terceira geração, embora não trate de forma sistemática desses direitos, que estão dispersos na Constituição. No Título II, a Constituição Federal de 1988, consignou os Direitos e Garantias Fundamentais, subdivididos em cinco capítulos: I - Direitos individuais e coletivos: são os direitos ligados ao conceito de pessoa humana e à sua personalidade, tais como à vida, à igualdade, à dignidade, à segurança, à honra, à liberdade e à propriedade. Encontram-se previstos no artigo 5º. II - Direitos sociais: São os direitos relativos à educação, saúde, trabalho, previdência social, lazer, segurança, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados. Encontram-se dispostos a partir do artigo 6º. III - Direitos de nacionalidade: que pode ser conceituado como o vínculo jurídico político que liga um indivíduo a um certo e determinado Estado, fazendo com que este indivíduo se torne um componente do povo, capacitando-o a exigir sua proteção e em contra partida, o Estado sujeita-o a cumprir deveres impostos a todos. IV- Direitos políticos: que cuidam da cidadania e da participação ativa na vida política do Estado. 30 2 DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS EM ESPÉCIE - (PARTE I) 2.1 Dos Direitos Individuais e Coletivos A Constituição dispõe no art. 5º dos direitos individuais e coletivos. Por direitos individuais deve-se entender todos aqueles que visam a defesa de uma autonomia pessoal no âmbito da qual o indivíduo possa desenvolver as suas potencialidades e gozar de sua liberdade sem interferência indevida do Estado e do particular. Já os direitos coletivos destinam-se, não à tutela da autonomia da pessoa em si, mas à proteção de um grupo ou coletividade, onde a defesa de seus membros é apenas reflexa ou indireta. O art. 5º compõe-se de 78 incisos. Contempla uma das maiores declarações de direitos do mundo, o que reflete a preocupação da Constituição com a proteção dos direitos humanos (CUNHA, 2011). No Capitulo I do Titulo II, a Constituição consagra os “direitos e deveres individuais e coletivos”, assegurando a inviolabilidade do direito a vida, a liberdade, a igualdade, a segurança e a propriedade (CF, art. 5.°). Os direitos e garantias individuais, sem embargo de estarem contemplados sistematicamente no art. 5.° da Constituição, não se restringem a ele, sendo possível identificá-los ao longo de todo o texto constitucional. Os direitos coletivos, por sua vez, podem ser encontrados em maior numero entre os diretos sociais do que propriamente no Capitulo expressamente dedicado a eles (NOVELINO, 2012, p. 483). 2.1.1 Direito à Vida A vida é o principal e mais básico dos direitos humanos fundamentais e condição de existência de todos os demais. Se hoje o direito a um meio ambiente saudável tornou-se direito humano fundamental de 3a geração (direitos de solidariedade), e o direito ao trabalho já se buscava garantir no início do século XX como direito humano fundamental de 2a geração (direitos positivos – prestação estatal), é porque o descuido nessa matéria compromete a vida humana, direito 31 humano fundamental de 1a geração (direitos negativos – vedação à supressão) e sustentáculo de todos os demais. Sem garantia à vida, tudo o mais é perfumaria. Constituição Federal de 1988 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: O direito à vida, previsto de forma genérica no art. 5.º, caput, abrange tanto o direito de não ser morto, privado da vida, portanto, o direito de continuar vivo, como também o direito de ter uma vida digna. Em decorrência do seu primeiro desdobramento (direito de não se ver privado da vida de modo artificial), encontramos a proibição da pena de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX. Assim, mesmo por emenda constitucional é vedada a instituição da pena de morte no Brasil, sob pena de se ferir a cláusula pétrea 18do art. 60, § 4.º, IV, lembrando, ainda, a doutrina moderna que impede, ainda, a evolução reacionária ou o retrocesso social, e, nesse sentido, não admitiria a previsão da pena de morte, nem mesmo diante da manifestação do poder constituinte originário. O segundo desdobramento, ou seja, o direito a uma vida digna, garantindo -se as necessidades vitais básicas do ser humano e proibindo qualquer tratamento indigno, como a tortura, penas de caráter perpétuo, trabalhos forçados, cruéis etc. (LENZA, 2012, p. 970). O direito à vida é, portanto, um direito que transpassa todo o mundo moderno. Além disso, este direito está tão arraigado em nosso cotidiano que
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