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RADIOFARMÁCIA A resolução da ANVISA que trata da radiofarmácia é recente, criada em 2009. Até então, diversos radiofármacos eram produzidos seguindo as boas práticas de fabricação de produtos farmacêuticos, comum a todos os medicamentos, já que o radiofármaco pode ser considerado um medicamento injetável. Atualmente, para a produção de radiofármacos, deve-se também seguir o que é determinado na resolução que trata das boas práticas radiofarmacêuticas. A farmácia nuclear/radiofarmácia é o ramo da ciência que estuda os aspectos da química, farmacologia, bioquímica e fisiologia de compostos radioativos denominados radiofármacos, que são utilizados em medicina nuclear para fins de diagnóstico e tratamento de diversas doenças. A maior parte dos radiofármacos (cerca de 95%) é utilizada com finalidade diagnóstica, em cintilografia (imagens cintilográficas), e apenas 5% são utilizados para fins terapêuticos. Atualmente, tem-se desenvolvido muitas moléculas novas para serem aplicadas na radioterapia. A medicina nuclear é uma especialidade médica que se utiliza de métodos cintilográficos para o diagnóstico e tratamento de diversas doenças, sendo aplicada em todas as modalidades clínicas. Um paciente com suspeita de isquemia coronariana, por exemplo, que não faz parte do grupo de risco de desenvolvimento desse processo, ou seja, não é um paciente obeso, hipertenso, pode realizar a cintilografia cardíaca como uma forma de triagem antes de ser submetido ao cateterismo. Outro exemplo é a realização de cintilografia cerebral para o diagnóstico, em alguns casos de demência. Em pacientes hipertensos devido a um comprometimento renal, ou em pacientes com qualquer comprometimento renal por outras causas, pode-se realizar cintilografia renal. Pacientes diagnosticados com câncer normalmente são acompanhados para a verificação de ocorrência de metástase óssea a partir da cintilografia óssea, na qual se utiliza o MDP- 99m Tc como radiofármaco. Pacientes com carcinoma de tireoide, hipotireoidismo ou hipertireoidismo podem realizar tratamento ou serem diagnosticados a partir da utilização do isótopo de iodo radioativo, como 131 I. Em pacientes em estágio terminal de câncer que apresentam dor muito forte, em que a medicação não é mais eficaz, pode-se realizar tratamento com 153 Sm (samário-153) para alívio da dor. Dessa forma, observa-se que a medicina nuclear pode ser utilizada em diversos casos, possuindo ampla aplicação. A tomografia por emissão de pósitrons (PET) é o exame de imagem mais sensível que se tem atualmente. Esse exame é importante principalmente para determinar o estadiamento da doença, uma vez que o tratamento quimioterápico utilizado por um paciente dependerá do exame de imagem por PET. Pode ocorrer de o paciente estar utilizando uma dose mais alta do quimioterápico sem que isso seja necessário, o que pode ser deletério para o mesmo, já que o os medicamentos quimioterápicos são muito tóxicos para o organismo. Dessa forma, observando-se melhora do estado do paciente através do exame de imagem, pode-se diminuir a dose do quimioterápico, evitando os efeitos colaterais do mesmo no paciente. A medicina nuclear pode ser dividida em estudos estáticos (única imagem) e estudos dinâmicos (várias imagens em um período). Esses estudos permitem avaliar a anatomia, fisiologia funcional e bioquímica dos diferentes órgãos, sistemas e patologias. Para verificar se o rim de um paciente apresenta hidronefrose ou algum comprometimento do tipo, por exemplo, o paciente é colocado em um aparelho, administra-se um radiofármaco nesse paciente, e a cada minuto, durante 20 minutos, é feita uma imagem do paciente. Sendo assim, é possível acompanhar o trajeto do medicamento até o rim e sua depuração para a bexiga para ser eliminado, a partir da sobreposição das imagens obtidas. Logo, é possível determinar o perfil de excreção renal do paciente. Além disso, diversos parâmetros podem ser avaliados, já que diversos gráficos são produzidos por um software, o que permite verificar, por exemplo, que um dos rins é capaz de filtrar e excretar o medicamento, enquanto o rim comprometido é capaz apenas de filtrá-lo, mas não excretá-lo, sendo possível avaliar a função renal do paciente. A ação da maioria dos radiofármacos é derivada de dois componentes: um componente não radioativo (carregador ou ligante) e um componente radioativo (ou radionuclídeo). Os ligantes/carregadores direcionam o radionuclídeo a um órgão específico ou processo, onde o componente radionuclídeo pode ser detectado. Moléculas de um fármaco, células, como leucócitos e hemácias, ou outro tipo de ligante que apresente afinidade por um determinado órgão, podem ser marcados com um isótopo radioativo. Logo, essa preparação farmacêutica será capaz de interagir com o sítio de interação da molécula marcada. Sendo assim, é possível acompanhar esse traçador, verificando seu trajeto pelo organismo. Não existe um radiofármaco utilizado para diagnóstico precoce de Alzheimer. Atualmente, moléculas ligadas a 99m Tc não estão sendo mais estudadas, já que a técnica de PET é a mais utilizada, devido à escassez de 99m Tc que está próxima a ocorrer. Dessa forma, as moléculas de radiofármacos que estão sendo desenvolvidas e estudadas, são moléculas que podem ser utilizadas na técnica de PET, ou seja, moléculas marcadas com isótopos radioativos emissores de radiação β + , capazes de diagnosticar diversas patologias. Muitas moléculas são marcadas com 18 F, e apresentam ligação específica com as placas β-amiloides, presentes abundantemente em pacientes com Alzheimer. Os mecanismos que promovem a interação do radiofármaco com o sítio alvo podem ser diversos, envolvendo desde uma simples perfusão sanguínea do composto pelos órgãos de interesse, até a ligação a receptores celulares específicos ou participação em uma via metabólica ou processo bioquímico. Normalmente, um radiofármaco que interage através de perfusão, se perfunde de forma homogênea no órgão alvo. Se em determinada região a perfusão não é homogênea, indica a ocorrência de uma patologia nesse local. Dependendo do que se deseja avaliar, será produzido um radiofármaco que interage através de um determinado mecanismo. Para avaliar a função hepática de um paciente, por exemplo, pode-se injetar um coloide na circulação desse paciente, que será fagocitado pelas células de Kupffer presentes no fígado, permitindo, dessa forma, a avaliação da função hepática. A particularidade dos radiofármacos em permitir a avaliação fisiológica funcional distingue a técnica diagnóstica da medicina nuclear de outras técnicas, como a ressonância magnética ou a tomografia convencional, que se limitam, na maioria das vezes, a obter imagens da estrutura anatômica, sem uma correlação funcional. Para a detecção precoce de processos inflamatórios, por exemplo, leucócitos podem ser marcados com isótopos radioativos. Essa detecção não seria possível a partir de outros exames de imagem, como tomografia e ressonância, uma vez que para isso, é preciso que se tenha uma alteração anatômica. Muitas vezes, o que ocorre é a junção das duas técnicas, ou seja, obtém-se uma imagem a partir de RMN (ressonância magnética nuclear) ou CT (tomografia computadorizada) e outra a partir da medicina nuclear, e realiza-se a sobreposição das duas imagens. Por isso, atualmente, os equipamentos, como PET (tomografia por emissão de pósitrons), são acoplados ao equipamento de RMN (PET-RMN) ou de CT (PET-CT). Os radiofármacos são utilizados em quantidades traços (traçadores radioativos ou radiotraçadores), ou seja, em quantidades mínimas, com a finalidade de diagnosticar patologias e disfunções do organismo. Ao se realizar a marcação de um fármaco (como a marcação de MDP com 99m Tc, por exemplo), nem todas as moléculas são marcadas com o isótopo radioativo, apenas uma quantidade traço das moléculas do fármaco. As moléculas marcadas apresentarãoafinidade pelo órgão alvo, interagindo de acordo com os mecanismos já discutidos. A dose do radiofármaco é dada em relação à sua atividade e não à quantidade. A dose de 99m Tc-MDP, por exemplo, é normalmente de 20 mCi por paciente. A quantidade do radiofármaco, em massa, não é tão importante, considerando- se o controle de qualidade, mas sim a quantidade de moléculas marcadas, devendo-se assegurar que foi marcada uma quantidade suficiente de moléculas do fármaco para se realizar o exame, e que a quantidade de impurezas produzidas após a marcação não são capazes de afetar o resultado do mesmo, o que difere do controle de qualidade realizado para medicamentos convencionais. Radiofármacos não possuem ação farmacológica, principalmente pelo fato de a dose administrada ser muito pequena. Isso é questionado muitas vezes, quando, por exemplo, marca-se um antibiótico com um isótopo radioativo para se realizar o diagnóstico de uma infecção. Apesar de o antibiótico ser administrado, normalmente a dose do mesmo é 150 a 200 vezes menor que a dose terapêutica utilizada no tratamento, logo, não se trata a doença ao administrar o radiofármaco. O fundamento da marcação de um fármaco com um isótopo radioativo para a produção de um radiofármaco é uma reação química. Quando se trata da marcação com 99m Tc, para que essa reação ocorra de forma adequada é preciso que no frasco contendo a preparação farmacêutica a ser marcada (kit frio – medicamento não radioativo), que pode ser um fármaco, células, ou outra molécula que interage com o alvo desejado, esteja presente um agente redutor, que será responsável pela redução do 99m Tc +7 para níveis de oxidação mais baixos, para que o mesmo seja capaz de reagir com o fármaco a ser marcado. Além do agente redutor, podem estar presentes outros adjuvantes, como conservantes e agentes oxidantes. Na clínica de medicina nuclear haverá um responsável por adicionar o isótopo radioativo a essa preparação para que ocorra a marcação das moléculas, produzindo o radiofármaco. De acordo com a RDC n° 64, radiofármacos são preparações farmacêuticas com finalidade diagnóstica ou terapêutica que, quando prontas para o uso, contêm um ou mais radionuclídeos. Compreendem também os componentes não- radioativos para marcação e os radionuclídeos, incluindo os componentes extraídos dos geradores de radionuclídeos (eluatos). Percebe-se, portanto, que não se considera somente o fármaco marcado como radiofármaco, mas também os kits frios e os isótopos radioativos separadamente. PET e SPECT: O SPECT (tomografia computadorizada por emissão de fóton único) utiliza isótopos radioativos emissores de radiação gama (γ), como preparações marcadas com 99m Tc, enquanto a técnica de PET (tomografia por emissão de pósitrons) utiliza radiofármacos emissores de radiação β + . Normalmente, esses radiofármacos são aplicados no paciente através da via endovenosa (IV), que é a mais utilizada. A técnica de SPECT recebe esse nome pelo fato de o radiofármaco utilizado emitir radiação gama, que é emitida através de um único fóton, ou seja, o radiofármaco presente no órgão alvo emite radiação através de um único fóton, diferentemente do que ocorre na técnica de PET, em que são emitidos dois fótons, de mesmo ângulo, que atingem ao mesmo tempo o equipamento. Algumas vezes, é preciso fornecer algumas orientações ao paciente, para que não ocorram interferências no exame. Para realizar o exame de cintilografia do miocárdio, por exemplo, orienta-se que o paciente faça a ingestão de um copo de leite, logo após a administração do radiofármaco. Essa orientação é necessária visto que a eliminação do radiofármaco é hepato-biliar, logo, devido à gordura do leite, ocorre a estimulação da vesícula biliar e, consequentemente, a eliminação do excesso de radiofármaco, evitando-se que a radiação observada esteja muito forte no local, devido ao excesso de material, prejudicando a visualização do coração. Pelo fato de a eliminação ser hepato- biliar, consequentemente o radiofármaco será eliminado através do intestino. Portanto, não se deve esperar um longo tempo após a administração do radiofármaco no paciente para realizar o exame, uma vez que a alça intestinal pode interferir na visualização do órgão alvo, pois aparecerá acima do coração. Muitas vezes, têm-se alguns artifícios para contornar esse problema. Se não for possível realizar nenhum dos artifícios, o paciente é orientado a ingerir água gaseificada, pois isso fará com que a alça intestinal se dilate, separando-se do coração. Na técnica de SPECT, a partir de uma gama-câmara é possível gravar imagens a uma série de ângulos em torno do paciente. Essas imagens são, então, submetidas a uma forma de processamento de imagem digital chamada reconstrução de imagem, de modo a obter imagens de fatias (tomografia – tomos vêm do grego e significa fatia) através do paciente. No caso da cintilografia do miocárdio, por exemplo, as imagens obtidas são transferidas a um software, que delimita o coração e produz os cortes do órgão, que são fornecidos no laudo. Durante a realização do exame de SPECT, a fonte de radiação (paciente) emite fótons sobre o equipamento, em todas as direções. Como mostrado na figura, o primeiro dispositivo que esses fótons encontram é o colimador, que tem a função de colimar, ou seja, diminuir a quantidade de fótons e direcioná-los a incidir no detector. No exemplo, o detector do equipamento é um cristal, ou seja, um detector sólido. Normalmente, são utilizados detectores sólidos em medicina nuclear, que são cristais de iodeto de sódio, muitas vezes ativado com Ta, para facilitar a liberação de fótons pelo mesmo, fazendo com que ele “brilhe”, de onde vem o nome cintilografia. Além dos detectores sólidos, existem detectores líquidos e gasosos. O detector é o dispositivo de maior importância e de maior custo de um equipamento de cintilografia. Após o detector, os fótons interagem com a válvula fotomultiplicadora, onde serão multiplicados. Os fótons são, então, incididos na porção final do equipamento, que transfere a informação para um computador de aquisição e, posteriormente, essas imagens são transmitidas para um computador de processamento. O computador de aquisição é programado de acordo com os parâmetros desejados, incluindo o tipo de imagem desejada. A partir desse computador, é possível posicionar o paciente no equipamento, para obter uma imagem adequada e, muitas vezes, é possível obter a alteração apresentada pelo paciente imediatamente. As imagens produzidas pelo computador de aquisição são processadas no computador de processamento, para a produção do laudo médico. Normalmente, o computador de processamento encontra-se numa sala separada, denominada sala de controle. Outra função do computador de processamento é a quantificação de radiação presente em cada órgão, dependendo do tipo de exame realizado, logo, tem-se a obtenção de imagens não somente qualitativas, mas também quantitativas. Isso é importante, por exemplo, quando se deseja avaliar a função renal de um paciente, verificando quanto do radiofármaco o rim está excretando e quanto tempo é necessário para que essa excreção ocorra, ou quando se deseja avaliar a função cardíaca, a partir da quantificação da fração de ejeção do ventrículo esquerdo, como é feito principalmente em pacientes que realizam quimioterapia, para verificar se o órgão não está sendo comprometido pelo quimioterápico, que são normalmente cardiotóxicos. O principal exame realizado nesses pacientes é a quantificação de hemácias marcadas, onde são coletadas hemácias do paciente, que são marcadas e reinjetadas. Atualmente, a técnica de SPECT acoplada a CT (SPECT-CT) é muito utilizada. Enquanto a técnica de SPECT utiliza radiação γ, a técnica de CT utiliza raios X. A partir da sobreposição das imagens obtidas com as duas técnicas, é possível avaliar melhor os resultados.O acoplamento dessas técnicas, bem como o acoplamento de PET a CT (PET- CT) ou PET à ressonância magnética (PET-RMN), permite um aperfeiçoamento do resultado, já que possibilita avaliar o paciente anatômica e funcionalmente. Dessas técnicas, as que utilizam PET são as mais avançadas, sendo utilizadas principalmente na oncologia para diagnosticar e acompanhar os pacientes e o tratamento quimioterápico, verificando se o quimioterápico está sendo ou não eficaz para o tratamento do tumor. Além dessas aplicações, a técnica de PET também é muito utilizada para avaliar a viabilidade cardíaca. Na técnica de PET, o principal radiofármaco utilizado é o 18 F-FDG, e o foco em pesquisas é a descoberta de novas moléculas que possam ser utilizadas nas técnicas envolvendo PET. Uma das pesquisas com esse objetivo é a marcação de novas moléculas com gálio-68 ( 68 Ga), que é um isótopo radioativo emissor de pósitron, passível de ser utilizado em PET. O equipamento de PET é circular, devido ao mecanismo envolvido no processo: a aniquilação, onde o fóton β + encontra um elétron, no organismo do paciente, e se aniquilam, dando origem a dois fótons de radiação γ, de mesma energia (511 keV), que interagem com o detector ao mesmo tempo, gerando a imagem. O detector utilizado é o mesmo cristal utilizado na técnica de SPECT. É importante conhecer as características do radiofármaco utilizado, como, por exemplo, como ocorre sua eliminação e os principais órgãos pelos quais ele apresenta afinidade, para que seja possível avaliar adequadamente as imagens obtidas, levando-se em consideração esses parâmetros. O FDG, por exemplo, apresenta grande afinidade pelo cérebro, logo, isso deve ser considerado no exame, já que as imagens mostram grande captação do radiofármaco nesse órgão. No Brasil existem diversas moléculas em estudo destinadas a serem utilizadas no diagnóstico precoce de Alzheimer. Todas essas moléculas devem ser capazes de atravessar a barreira hemato-encefálica, e são marcadas com 18 F ou carbono radioativo, ou seja, são moléculas utilizadas pela técnica de PET. Aplicações dos radiofármacos: A medicina nuclear apresenta ampla aplicação, permitindo seu emprego no diagnóstico e tratamento de diversas alterações e patologias, bem como no acompanhamento do estadiamento de diversos tipos de tumores, estando presente em todas as áreas médicas. Exemplos: 1) Cintilografia cerebral: Um exemplo de aplicação da medicina nuclear é a cintilografia cerebral para a detecção de AVC. Nesse caso, o radiofármaco utilizado se perfunde pelo cérebro, logo, deve ser capaz de atravessar a barreira hemato-encefálica. Ao se perfundir, se distribui de forma homogênea por todo o órgão. A cintilografia cerebral do paciente mostra regiões de hipocaptação, ou seja, regiões nas quais o radiofármaco não se perfundiu, indicando que existem alterações no órgão, as quais não são capazes de serem revertidas. 2) Cintilografia cardíaca: Na cintilografia cardíaca, obtêm-se imagens de diversos ângulos do coração, permitindo a avaliação de toda a extensão do órgão. Os médicos, então, avaliam o melhor corte que representa o resultado do exame, que será anexado no laudo. 3) Validação de radiofármacos: A medicina nuclear também pode ser utilizada na pesquisa de novos radiofármacos. Nesse caso, realiza-se a cintilografia de todo o organismo do indivíduo em estudo, verificando se há captação do radiofármaco no órgão alvo e, principalmente, a presença de impurezas radioquímicas, que poderiam ser captadas por alguns órgãos, como tireoide, fígado e estômago, interferindo no resultado do exame. 4) Cintilografia pulmonar: A cintilografia pulmonar pode ser utilizada, por exemplo, na detecção de embolia pulmonar em um paciente. Esse exame é importante principalmente em pacientes que realizam cirurgia de membros inferiores. Nesse caso, o exame é realizado em duas etapas. Na primeira etapa, o paciente inala o radiofármaco, e na segunda etapa, o radiofármaco é injetado no paciente. Quando o radiofármaco é inalado, observa-se a captação do mesmo pelo espaço brônquio- alveolar. Posteriormente, quando o radiofármaco é injetado no paciente, observa-se a presença de regiões frias na imagem cintilográfica. Isso indica que o paciente apresenta um êmbolo na artéria responsável por irrigar o pulmão, logo, o radiofármaco não circula no local, ou seja, não é capaz de se perfundir pelo pulmão, devido à obstrução. 5) Cintilografia óssea: Na cintilografia óssea, realiza-se um scanner do paciente, obtendo-se imagens anteriores e posteriores do mesmo, permitindo a avaliação de metástases ósseas, em caso de carcinoma de próstata, por exemplo. 6) Linfocintilografia: A linfocintilografia é utilizada para pesquisa de linfonodo sentinela, que é o primeiro linfonodo que recebe a drenagem do tumor de mama. Nesse caso, o radiofármaco é aplicado por via intradérmica em torno da lesão. A pesquisa do linfonodo sentinela é importante para avaliação da presença de células metastáticas. Se houver a presença de células metastáticas, isso indica que os outros linfonodos podem estar comprometidos, devendo-se realizar o esvaziamento axilar, onde ocorre a retirada de toda a cadeia linfática da paciente. Além da pesquisa do linfonodo sentinela, a linfocintilografia também é utilizada para avaliação da drenagem linfática de tumor. Nesse caso, o radiofármaco é aplicado entre os dedos do paciente. Classificação dos medicamentos radiofármacos: Os radiofármacos podem ser multidoses ou monodoses, e podem ser classificados em: radiofármacos prontos para o uso; componentes não-radioativos para marcação com um componente radioativo; radionuclídeos, incluindo eluatos de geradores de radionuclídeos. Um exemplo de radiofármaco pronto para o uso é o 18 F-FDG. Os componentes não- radioativos para marcação com um componente radioativo é o fármaco que será marcado com o componente radioativo, juntamente com o agente redutor, na forma de pó liofilizado, presente em uma ampola à vácuo ou em ambiente de nitrogênio. Não deve haver a presença de oxigênio no ambiente, devido justamente à presença do agente redutor, que seria oxidade na presença de oxigênio. Os radionuclídeos, incluindo eluatos de geradores de radionuclídeos, são os componentes radioativos, responsáveis pela marcação do fármaco (componente não-radioativo) ou até mesmo utilizados na radioterapia. Exemplos são: 99m Tc, que é um eluato proveniente de um gerador; iodo radioativo utilizado para tratar carcinoma de tireoide (radiofármaco). No processo de fabricação, tanto o radiofármaco pronto para o uso, como o 18 F-FDG, quanto os kits frios (componentes não-radioativos para marcação com um componente radioativo) são produzidos numa unidade de radiofarmácia industrial, sendo necessário um farmacêutico nesse processo. A unidade de radiofarmácia centralizada é muito utilizada em outros países, principalmente nos EUA. São centros de radiofarmácia que facilitam o trabalho do médico nuclear. Esses centros compram os kits frios e o gerador, realizam a marcação do radiofármaco e o controle de qualidade do mesmo, e distribuem as doses do radiofármaco marcado para os centros de medicina nuclear, evitando que os mesmos tenham que realizar todo esse procedimento, facilitando o serviço e diminuindo o custo e a mão de obra. Além das unidades de radiofarmácia industrial e radiofarmácia centralizada, existe a unidade de radiofarmácia hospitalar. Esta funciona como um setor de medicina nuclear presente em um hospital. A presença da unidade de radiofarmácia hospitalar em um hospital é vantajosa levando-se em consideração a internação de pacientes. Dessa forma, é possível realizar outros exames nesses pacientes, como marcação de leucócitos e hemácias, por exemplo, diversificando a medicina nuclear. Os kits frios (componentes não-radioativos para marcação com um componente radioativo) podem ser armazenadosna farmácia hospitalar (não radiofarmácia), em casos em que esse armazenamento é necessário, pois o radiofármaco ainda não está radioativo. A RDC 38 de 2008 rege a medicina nuclear, e, nesta Resolução, está descrito que o controle de qualidade de radiofármacos pode ser realizado por outro profissional que não possui nível superior, mas que seja treinado para sua função. A Vigilância Sanitária ainda não exige o controle de qualidade de radiofármacos e, por esse motivo, em muitos locais o controle de qualidade não é realizado, sendo o paciente o controle de qualidade do radiofármaco produzido. Os radiofármacos podem ser aplicados pela via intravenosa (IV), oral (como é o caso do iodo radioativo), intradérmica (identificação do linfonodo sentinela, por exemplo), ou através da inalação (cintilografia pulmonar, por exemplo), sendo a via IV a mais utilizada. Legislação: As legislações que devem ser seguidas para a produção de radiofármacos são: Boas Práticas de Fabricação de Medicamentos (Resolução RDC n° 17, de 16 de abril de 2010), já que radiofármacos são medicamentos, apesar de não ser possível seguir alguns tópicos tratados nessa Resolução, devido às particularidades dos radiofármacos; Resolução RDC n° 63, de 18 de dezembro de 2009, específica para radiofármacos, que dispõe sobre as Boas Práticas de Fabricação dos mesmos; Resolução RDC n° 64, de 18 de dezembro de 2009, também específica para radiofármacos, que possui o objetivo de estabelecer os requisitos mínimos para o registro de radiofármacos no país, visando garantir a qualidade, segurança e eficácia destes medicamentos; e a Resolução RDC n° 38, de 4 de julho de 2008, que é específica da medicina nuclear, e dispõe sobre a instalação e o funcionamento dos serviços de medicina nuclear “in vivo”. Além disso, a Farmacopeia Brasileira dispõe de um capítulo que trata especificamente do controle de qualidade de radiofármacos. Tecnécio-99m ( 99m Tc): Fundamento de um gerador de 99mTc: O principal gerador existente é o gerador de 99m Tc. Para montar o gerador, a empresa responsável deve, primeiramente, realizar o cálculo do decaimento do 99 Mo, levando-se em consideração o tempo que levará até que o gerador seja entregue ao solicitante, e a atividade desejada. A empresa adquire o 99 Mo, que é importado, e coloca-o na coluna. O 99 Mo se desintegra com o decorrer do tempo, formando átomos de 99m Tc e 99 Tc. O primeiro eluato proveniente de um gerador não deve ser utilizado, uma vez que o mesmo foi montado um tempo antes, logo, tanto o 99m Tc, que é o radionuclídeo desejado, emissor de radiação γ, que será utilizado para a marcação, quanto o 99 Tc, emissor β, formado a partir do decaimento do 99m Tc e também a partir do 99 Mo diretamente, estarão presentes neste primeiro eluato, e não é possível separá-los quimicamente. Logo, se o eluato for utilizado, o 99 Tc também sofrerá ação do agente redutor, produzindo impurezas, prejudicando a qualidade do radiofármaco. O 99 Tc é formado continuamente, logo, sempre estará presente no eluato, mas em muito baixa concentração. No entanto, com o passar do tempo, a proporção de 99 Tc com relação ao 99m Tc aumenta. O gerador deve ser estéril e livre de pirogênios, e apresenta uma coluna de vidro, contendo um material de adsorção (resina de troca iônica) onde o 99 Mo (radionuclídeo pai) estará adsorvido. Essa resina normalmente é de alumina (Al2O3), mas também pode ser de outros materiais, como sílica (Si2O3). Além da coluna, há uma porta de entrada do eluente e uma porta de saída do NaTcO4 (pertecnetato de sódio). Na porta de entrada do eluente, é conectado um frasco contendo solução salina estéril, e na porta de saída do NaTcO4 é conectado um frasco à vácuo onde será coletada a solução salina de 99m Tc. O 99 Mo apresenta afinidade pela coluna, diferentemente do 99m Tc. Dessa forma, ao eluir a coluna com solução salina, a mesma carrega as moléculas de 99m Tc. Apesar de o 99 Mo estar fortemente adsorvido na resina, um pouco se desprende da mesma. Também por esse motivo é importante o controle de qualidade do radiofármaco, já que o 99 Mo é emissor de radiação β - e γ de alta energia. Logo, a presença de uma maior quantidade de 99 Mo faz com que o paciente seja exposto a uma alta radiação. Geralmente, o gerador apresenta vida útil de 1 semana. Após o uso, o gerador deve ser devolvido à empresa. Existem diversos tipos de geradores. Porém, no Brasil, existe somente o gerador de 99m Tc e, mais recentemente, o de 68 Ga (emissor de pósitron), que, diferentemente do gerador de 99m Tc, tem maior duração (cerca de 1 ano). Controle de qualidade do eluato: O tempo de meia-vida do 99 Mo é de 66 horas. Parte do Mo emite radiação β - , de energias diversas, dando origem ao 99m Tc que, posteriormente, se desintegra, originando o 99 Tc. Além disso, o 99 Mo pode decair diretamente a 99 Tc. O 99 Tc, por sua vez, origina o 99 Ru, que é estável, ou seja, não é um isótopo radioativo. Apesar de ser capaz de emitir radiação β - de maior energia, dando origem ao 99 Tc, a maior parte dos átomos de 99 Mo (87%) origina o 99m Tc. Apenas 13% dos átomos de 99 Mo dão origem ao 99 Tc. Tanto o 99m Tc quanto o 99 Tc estarão sendo formados no gerador, já que o 99 Mo é capaz de originar ambas as espécies, e, além disso, o 99m Tc também é capaz de originar o 99 Tc. Porém, o 99m Tc estará presente em maior concentração do que o 99 Tc, devido ao fato de a maior parte da população de átomos de 99 Mo originar o 99m Tc. Com o passar do tempo, a concentração de 99 Tc aumenta no gerador, não estando dentro dos padrões apropriados, já que essa maior concentração de 99 Tc pode interferir na marcação. Por esse motivo, é preciso eluir o gerador 2 vezes ao dia, geralmente uma vez na parte da manhã (por volta de 7 horas) e outra vez na parte da tarde (por volta das 12 horas). O eluato obtido na parte da manhã não deve ser utilizado para marcar os radiofármacos utilizados na parte da tarde, uma vez que o 99m Tc se desintegra, originando o 99 Tc, tendo-se, portanto, uma menor concentração de 99m Tc no período da tarde, e uma maior concentração de 99 Tc. O primeiro eluato não deve ser utilizado para marcação, devendo ser desprezado, pelo mesmo motivo. À medida que o 99 Mo se desintegra, átomos de 99m Tc são formados. Após aproximadamente 48 horas, o número de átomos de 99 Mo se iguala ao número de átomos de 99m Tc. Ao ocorrer esse equilíbrio (denominado equilíbrio transiente), se for possível saber a atividade do 99 Mo nesse momento, é possível inferir sobre a atividade do 99m Tc, já que será a mesma do 99 Mo. Esse equilíbrio era importante antigamente na prática, para determinar a dose do eluato que contém a atividade desejada. Atualmente, a dose é ajustada com o auxílio de um calibrador, que informa a atividade do 99m Tc presente no eluato. Pelo fato de tanto o 99m Tc quanto o 99 Tc serem formados na coluna do gerador e, portanto, ambos os isótopos estarem presentes no eluato, quando em contato com o agente redutor (Sn +2 ), tanto o 99m Tc (t1/2 = 6 horas), que emite radiação γ, quanto o 99 Tc (t1/2 – 213 mil anos), que emite radiação β serão reduzidos. No kit frio está presente o fármaco que se deseja marcar, e o agente redutor, responsável pela redução do 99m Tc. A dose de eluato, onde está presente o 99m Tc, na forma de 99m TcO4 - , é adicionada à essa mistura. O 99m Tc presente no eluato apresenta estado de oxidação +7, não sendo reativo. Ao entrar em contato com o Sn +2 , o 99m Tc +7 é reduzido a estados oxidação mais baixos, normalmente 99m Tc +4 , que é reativo e, portanto, capaz de se ligar ao fármaco, formando o radiofármaco. O 99 TcO4 - também estará presente no eluato, e sofrerá redução pelo Sn 2+ , sendo capaz de também se ligar ao fármaco, jáque o 99 Tc compete pelos sítios de ligação do 99m Tc. Se a concentração de 99m Tc for maior, não haverá interferência, porém, se a concentração de 99 Tc estiver alta, haverá interferência. O kit frio apresenta uma determinada quantidade de Sn +2 , logo, diante de uma maior quantidade de 99 Tc, parte do Sn 2+ será consumido para reduzir o 99 Tc e não o 99m Tc. Dessa forma, haverá grande quantidade de 99m Tc não reduzido livre. O 99m Tc não reduzido livre ( 99m TcO4 - ) é uma impureza que sempre estará presente, porém em baixas concentrações, preconizadas pela Farmacopeia. O 99m TcO4 - apresenta afinidade pelo estômago e tireoide. Dessa forma, se um exame de cintilografia óssea, utilizando MDP marcado com 99m Tc, mostrar forte marcação no estômago e tireoide, indica que havia grande quantidade de 99m Tc não reduzido livre ( 99m TcO4 - ) no eluato utilizado para a marcação. A provável causa é de que o eluato permaneceu por muito tempo no gerador, acumulando-se 99 Tc. Por esse motivo é necessário realizar o controle de qualidade do eluato, verificando-se se o eluato está em condições adequadas para a marcação, sendo importante eluir o gerador 2 vezes ao dia, evitando-se grande concentração de 99 Tc no eluato. Além disso, a não eluição no final de semana é considerada uma situação crítica quando se utiliza o mesmo para marcação na segunda-feira, pelo mesmo motivo. Alguns fármacos possuem uma concentração mínima de íons de estanho (Sn +2 ), que atua como agente redutor do 99m Tc, o que torna a presença de uma maior quantidade de 99 Tc ainda mais crítica, reduzindo-se, dessa forma, a eficiência da marcação dos radiofármacos. Um exemplo são os radiofármacos destinados à cintilografia cerebral, como o ECD e o HMPAO, que apresentam uma mínima quantidade de Sn +2 , sendo recomendada a utilização do eluato proveniente de uma segunda eluição, como forma de garantir que haverá uma quantidade mínima de 99 Tc, sem que este interfira na marcação. O controle de qualidade é importante principalmente para evitar que o paciente seja exposto a uma dose excessiva de radiação. A presença de 99 Tc no radiofármaco que será injetado, por exemplo, faz com que o paciente seja exposto a uma alta radiação, já que o 99 Tc é um emissor β - de alta energia. Além disso, a presença dessa espécie leva à produção de uma imagem cintilográfica inadequada, que deverá ser repetida, logo, o paciente deverá ser novamente exposto à radiação, o que pode representar riscos, considerando os problemas provocados pela exposição à radiação. Nenhum parâmetro de marcação do radiofármaco deve ser alterado. Um deles é o volume máximo de marcação. Supondo-se que, inicialmente a atividade desejada para a marcação esteja presente em 1 mL do eluato, com o passar do tempo, será necessário um volume maior do eluato para se ter a mesma atividade. Porém, muitas vezes, o volume excede o volume máximo permitido, descrito na bula do radiofármaco. Esse excesso de volume também reduz a reficiência da marcação. Além do volume máximo, o tempo de contato do 99m Tc com o fármaco, para que ocorra a marcação adequada, bem como a temperatura em que deve-se realizar a marcação, e pH do meio de reação, devem ser respeitados para que se tenha uma marcação eficiente. Outro controle de qualidade realizado para o eluato, além da presença de alta concentração de 99 Tc (que é feito eluindo-se o gerador 2 vezes ao dia), é a pureza radionuclídica, utilizado para quantificar o 99 Mo no eluato. O 99 Mo (“pai” do 99m Tc) está ligado fortemente à coluna do gerador, porém, é normal que uma uma pequena quantidade se desprenda, estando presente no eluato. O 99 Mo emite radiação β – e radiação γ, de alta energia (740 keV e 780 keV, respectivamente), em comparação ao 99m Tc (energia = 140 keV). O desprendimento de uma maior quantidade de 99 Mo pode ocorrer caso se tenha alguma alteração na coluna, que impede a forte ligação do 99 Mo. Dessa forma, o paciente estará exposto a essas radiações de alta energia, sendo muito importante a realização do controle de qualidade adequadamente. O controle da pureza radionuclídica é simples, sendo a contaminação por 99 Mo medida por detecção dos fótons de 99 Mo em um calibrador de dose. Para isso, o frasco contendo o eluato deve ser blindado com chumbo, de 6 mm de espessura, que é capaz de barrar os fótons de 140 keV do 99m Tc, mas não é capaz de blindar os fótons de 740 keV e 780 keV emitidos pelo 99 Mo, permitindo a medida da radiação γ do 99 Mo. O limite permitido de atividade do 99 Mo presente no eluato é de 0,15 μCi 99 Mo/mCi de 99m Tc administrado, preconizado pela Farmacopeia Americana. O teste para a verificação da presença de 99 Mo também pode ser colorimétrico, onde adiciona-se uma substância capaz de se complexar com o 99 Mo, gerando coloração. Esse teste também permite a quantificação de 99 Mo. Outro teste que faz parte do controle de qualidade do eluato é a determinação semi-quantitativa da presença de alumina (Al2O3), que é o material constituinte da coluna. Trata-se de um método colorimétrico no qual se utiliza um kit que contém fitas contendo agente complexante metilorange, que atua como indicador da presença de alumina, e um padrão de 10 µg de Al. Em uma das fitas aplica-se o eluato, e em outra é aplicado o padrão, comparando-se a intensidade de cor das fitas. A coloração da fita na qual o eluato foi aplicado deve ser menos intensa que a coloração da fita contendo o padrão, já que o limite preconizado pela Farmacopeia Americana é de 10 µg Al/mL 99m Tc. Se houver desprendimento de alumina da coluna, o eluato apresentará coloração esbranquiçada. Dessa forma, é importante conferir a aparência do eluato, que deve ser límpido. A presença de alumina também interfere na marcação do radiofármaco, principalmente com relação à marcação de hemácias com 99m Tc, uma vez que a alumina leva à aglutinação de hemácias, impedindo a utilização das mesmas para o exame. Além disso, alguns radiofármacos tem sua constituição alterada na presença de alumina, não sendo possível marca-los com 99m Tc. Marcação com 99m Tc: A grande maioria dos radiofármacos (cerca de 85%) são marcados com 99m Tc, devido à alta disponibilidade, já que existe um gerador do radionuclídeo; apresentar tempo de meia-vida ótimo (6 horas); baixa energia do fóton (140 keV), logo, a exposição do paciente à radiação é menor; e por ser um metal deficiente em elétrons, capaz de reagir com vários grupos doadores de elétrons, apresentando facilidade em formar complexos com diversas moléculas. Os estados de oxidação do 99m Tc variam de 99m Tc -1 a 99m Tc +7 . O 99m Tc livre ( 99m TcO4 - ) apresenta estado de oxidação de +7, e o 99m TcO2 apresenta estado de oxidação +4. Ambas são impurezas estáveis, e, portanto, capazes de serem quantificadas por cromatografia. O 99m TcO4 - está presente no eluato normalmente, porém, quando não é reduzido adequadamente pelo Sn +2 , não se torna reativo ( 99m Tc +7 O4 - ) e, portanto, é considerado uma impureza. Em contrapartida, diante de um excesso de águá, o 99m Tc reduzido ( 99m Tc +4 ) pode se ligar a moléculas de água, ao invés de se ligar a moléculas do fármaco, formando o 99m TcO2, que é um coloide. Por esse motivo, a quantidade de água no meio deve ser controlada, já que o excesso de moléculas de água disponíveis pode se ligar ao 99m Tc reduzido. Caso um radiofármaco contendo altas concentrações de 99m TcO2 seja injetado no paciente, a imagem mostrará forte marcação no fígado e no baço, que são órgãos capazes de fagocitar coloides. Dessa forma, deve-se utilizar o menor volume possível de eluato, evitando-se alta disponibilidade de moléculas de água, que possibilitariam a formação do 99m TcO2. Em contrapartida, a presença de grande quantidade de 99m TcO4 - leva à produção de uma imagem comforte marcação na tireoide, devido ao raio atômico dessa espécie química ser semelhante ao raio atômico do iodo. Porém, é aceitável que se tenha 10% de impurezas no radiofármaco a ser injetado no paciente, pois essa quantidade não interfere na marcação. Pode ocorrer uma reação de hidrólise do Sn 2+ , em meio aquoso, na presença de Cl2, formando um precipitado (Sn(OH)Cl), que reage com OH - presente no meio, formando outro precipitado (Sn(OH)2). Além da reação de hidrólise, pode ocorrer reação de oxi-redução, na presença de oxigênio. Ao reagir com oxigênio, o Sn 2+ é oxidado, formando o SnO2, que também se precipita. Dessa forma, se no momento da marcação não houver o correto manuseamento, sendo injetado oxigênio no interior do frasco, o mesmo oxida o Sn 2+ , que perde sua capacidade de reduzir o 99m Tc, logo, ocorre um aumento da quantidade de 99m TcO4 - livre (impureza), não reduzido. Para evitar que ocorra a oxidação do Sn 2+ , normalmente utiliza-se atmosfera de nitrogênio durante a produção dos kits frios, evitando- se a presença de oxigênio no mesmo, e o interior do frasco também contém atmosfera de nitrogênio ou vácuo. O 99m Tc reduzido é quimicamente reativo, sendo capaz de reagir com uma grande variedade de aguentes quelantes e grupos químicos, tais como: -COO - ; -OH - ; -NH2; -SH, que são grupos doadores de elétrons. Alguns exemplos de radiofármacos marcados com 99m Tc são: HMPAO, ECD, MDP, Sestamibi (Cardiolite), e Tetrofosmin (Myoview), nos quais o 99m Tc é coordenado a várias moléculas do fármaco, pelo grupo doador de elétrons presente nos mesmo, uma vez que o 99m Tc é deficiente de elétrons. Existe uma variedade de radiofármacos disponíveis. Apesar de os radiofármacos marcados com 99m Tc serem os principais utilizados em medicina nuclear, além do 99m Tc, outros isótopos radioativos são também muito utilizados para marcação de radiofármacos, ou na forma de sal, aplicados na terapia ou com finalidade diagnóstica. O citrato de gálio, por exemplo, é um radiofármaco utilizado na localização de tumores em tecidos moles e lesões inflamatórias. Outros exemplos são: 131 I, que pode ser utilizado na forma de cápsula ou solução para a terapia de câncer de tireoide e hipotireoidismo; 18 F, utilizado em cintilografia óssea, principalmente para verificação da ocorrência de metástases; 153 Sm, utilizado na terapia da dor; DTPA- 111 In, utilizado especificamente para estudo de tumores neuro-endócrinos. Controle de qualidade: Já foi discutido anteriormente a respeito da importância de se marcar adequadamente o radiofármaco, levando-se em consideração principalmente a exposição do paciente à radiação, que deve ser exposto somente à dose de radiação necessária para a realização do exame, considerada segura. Nesse contexto, o controle de qualidade mostra-se essencialmente importante. Para a produção dos radiofármacos, as Boas Práticas de Fabricação de medicamentos devem ser seguidas, agregadas às Normas de Proteção Radiológica (principalmente para radiofármacos prontos para uso, como o 18 F-FDG). Os principais controles de qualidade realizados para os radiofármacos são: controles físico químicos; controles biológicos; e controles radioquímicos. Controles físico-químicos: 1) Inspeção visual; No processo de inspeção visual, verifica-se a coloração da preparação, e a presença de partículas macroscópicas. É importante principalmente com relação à oxidação do Sn 2+ , a qual, normalmente, promove coloração amarelada à preparação. A avaliação é realizada com o auxílio de uma lâmpada de tungstênio, em fundo claro e em fundo escuro, semelhante ao que é realizado para ampolas. Sendo encontrada alguma não conformidade, a preparação é descartada. 2) Tamanho e número de partículas; A avaliação do tamanho e do número de partículas é importante principalmente para radiofármacos particulados. Um exemplo é a cintilografia pulmonar para a verificação de embolia pulmonar. Nesse exame, deve-se provocar uma microembolia no paciente, injetando-se no mesmo um radiofármaco particulado, que apresenta partículas de determinado tamanho e número. Dessa forma, não havendo um controle rigoroso do tamanho e do número dessas partículas, o paciente pode vir à óbito durante a realização do exame. 3) Pureza química; 4) pH O controle do pH é importante tanto na produção do radiofármaco quanto na marcação do mesmo. A faixa de pH aceitável é de 4,0 – 7,0, de acordo com a Farmacopeia Americana, e 4,0 – 8,0 de acordo com a Farmacopeia Europeia, logo, um valor médio de 6,0. Controles biológicos: 1) Esterilidade; A maior parte dos radiofármacos são administrados por via IV, logo, devem ser estéreis. Verifica-se a presença de bactérias aeróbicas e anaeróbicas, em meio tioglicolato, incubado a 30 - 35°C, e a presença de bactérias aeróbicas, fungos e leveduras em meio de cultura de soja caseína, a 20 - 25°C. 2) Apirogenicidade; Por ser um mediamento injetável, as preparações de radiofármacos devem ser apirogênicas. Para avaliar a apirogenicidade, pode-se utilizar o teste do coelho (pouco empregado), teste do lisado de amebócitos do Limulus (LAL), que é um teste semi-quantitativo, ou o TPS (mais utilizado). 3) Toxicidade: Para radiofármacos, avalia-se a toxicidade aguda dos mesmos, não sendo realizados testes de toxicidade crônica. 4) Biodisponibilidade. Controles radioquímicos: O laudo médico é produzido baseado na imagem cintilográfica observada. Logo, é importante que se tenha uma boa qualidade de imagem, para que erros de diagnóstico sejam evitados. Para isso, é preciso que a marcação do radiofármaco seja adequada. O Cardiolite (Sestamibi) é um radiofármaco muito utilizado em cintolografia cardíaca, cuja marcação com 99m Tc é realizada em água fervente. Ao injetar o 99m Tc no frasco contendo o fármaco que será marcado e o agente redutor (Sn 2+ ), o 99m Tc +7 é imediatamente reduzido pelo Sn 2+ (que passa de Sn 2+ a Sn 4+ ) tornando-se reativo, ligando-se ao citrato e à cisteína, que são compostos presentes no frasco, que se ligam fortemente ao 99m Tc. À medida que ocorre a reação química na presença de água fervente, ocorre uma reação denominada reação de transquelação, na qual o 99m Tc inicialmente ligado aos intermediários, se liga às molécula do fármaco, que estavam, inicialmente, ligadas ao Cu, formando um complexo onde 6 moléculas do fármaco estão coordenadas ao 99m Tc. Por se tratar de uma reação química, não podem ser alteradas quaisquer variáveis, tais como tempo e temperatura de reação, pois, caso algum parâmetro seja alterado, pode ocorrer a formação de outra molécula no meio, devido à uma reação ou à própria degradação do complexo, capaz de também se ligar ao 99m Tc, interferindo na qualidade da imagem do exame, já que o complexo do MIBI com o 99m Tc não estará sendo formado, e esse complexo que é o responsável pela ligação às mitocôndrias presentes nas células do miocárdio. 1) Pureza radionuclídica; A pureza radionuclídica é importante por avaliar a presença de outros nuclídeos no eluato, mais especificamente o molibdênio-99 ( 99 Mo), que é um isótopo radioativo que decai, originando o 99m Tc, e é emissor de radiação β - e γ de alta energia. Caso o controle de qualidade não fosse realizado, e houvesse uma quantidade de 99 Mo acima dos limites aceitáveis na preparação a ser administrada, o paciente estaria exposto a uma alta radiação. 2) Pureza radioquímica. As principais impurezas que podem ser encontradas em preparações de radiofármacos são 99m TcO4 - e 99m TcO2, que são estáveis, logo, não reativos. Essas impurezas são formadas pela decomposição dos radiofármacos, devido à ação do solvente, temperatura e pH inadequados, presença de luz, presença de agentes oxidantes ou redutores, e radiólise. A radiólise é a degradação do radiofármaco pela própria radiação. Para evitar que esseprocesso ocorra, é necessário realizar o estudo da estabilidade da marcação, ou seja, analisar por quanto tempo a molécula continua viável para ser utilizada, uma vez que com o passar do tempo, a própria radiação do 99m Tc pode provocar a lise da molécula do radiofármaco. O controle da pureza radioquímica pode ser realizado por cromatografia em camada delgada (CCD). Para isso, aplica-se a amostra em duas plcas de CCD, que pode ser de papel ou sílica, inserindo-as em uma cuba, onde ocorre a eluição de cada placa com um solvente adequado (solução salina e acetona, ou outro solvente orgânico, como metanol), que promove a separação das impurezas presentes no medicamento, caso estejam presentes. Após a eluição, retira-se a placa, e observa-se a presença ou não de impurezas, e se as mesmas se encontram na parte superior ou na parte inferior da placa. A pureza radioquímica será dada em porcentagem. Utilizando-se o solvente orgânico como solvente para a eluição da placa, ocorre a migração do 99m TcO4 - , que estará presente, portanto, na parte superior da placa. Em contrapartida, utilizando-se salina como solvente, o 99m TcO2 permanece no ponto de aplicação (parte inferior). Quantificam-se, então, as partes inferior e superior de cada placa, separadamente, através do curiômetro, do Wizard ou de um radiocromatógrafo (nesse caso, não é necessária a separação das partes inferior e superior da placa, que é aplicada inteiramente no equipamento). Quando uma substância será marcada pela primeira vez, o primeiro teste que se deve realizar é a determinação do comportamento cromatográfico da substância. Posteriormente, o mesmo teste é realizado com o 99m TcO2 e 99m TcO4 - sozinhos, para determinar o comportamento dessas impurezas nos mesmos solventes utilizados para o teste com a substância a ser marcada. Somente após a realização dessa padronização, é que se pode realizar a marcação da molécula. Para algumas substâncias não é possível realizar a CCD e, então, é feita a centrifugação da preparação, quantificando as impurezas no sobrenadante e no sedimento. Além do método cromatográfico, a pureza radioquímica também pode ser avaliada através da extração por solventes. Para isso, deve-se conhecer a natureza lipofílica ou hidrofílica do radiofármaco. Nesse método, adiciona-se, em um tubo de ensaio, 3 mL de solução fisiológica e 3 mL de um solvente específico para o radiofármaco que se deseja avaliar. Em seguida, adiciona-se 0,1 mL do radiofármaco. Posteriormente, a mistura é agitada no agitador vortex, e, então, os tubos são colocados em repouso, para que ocorra a separação dos líquidos. Ocorrendo a separação, transfere- se o sobrenadante para outro tubo de ensaio, com o auxílio de uma pipeta Pasteur, obtendo-se, assim, um tubo contendo solução fisiológica e o outro contendo solvente. Em seguida, quantifica-se as impurezas no curiômetro. As impurezas estarão presentes na solução fisiológica, enquanto o radiofarmaco estará presente no solvente pelo qual ele apresenta afinidade. Por este método, a quantificação das impurezas é feita de forma mais rápida que pelos outros métodos. Outro método utilizado para a avaliação da pureza radioquímica é a distribuição biológica, realizado em animais de laboratório. Esse método se baseia em administrar o radiofármaco nos animais e, posteriormente, realizar a eutanásia dos mesmos, retirando-se sangue e os órgãos de interesse, que serão submetidos à análise. Esse método permite avaliar a cinética do radiofármaco, por se tratar de um método quantitativo, onde se determina a porcentagem da dose do radiofármaco presente em cada órgão, ou seja, avalia-se a afinidade do radiofármaco pelos órgãos alvos. Esse teste é realizado pelo produtor do radiofármaco, e nem todas as Farmacopeias exigem a realização do mesmo. É importante realizar a controle radioquímico das impurezas 99m TcO4 - e 99m TcO2, uma vez que as mesmas irão interferir na marcação. Havendo alta concentração de 99m TcO4 - , a imagem cintilográfica mostrará forte marcação na tireoide e no estômago, e havendo alta concentração de 99m TcO2, por ser um coloide, a imagem cintilográfica mostrará forte marcação no fígado e no baço. Em alguns casos de cintilogradia óssea, a imagem pode mostrar forte marcação no fígado. Nesse caso, essa forte marcação não necessariamente indica a presença de 99m TcO2 como impureza radioquímica na preparação, mas pode ocorrer por interação do radiofármaco com outro medicamento, como antiácidos. Também por esse motivo é importante a realização do controle radioquímico, provando que o radiofármaco apresenta pureza adequada, e que a baixa qualidade da imagem é devido a outro motivo. APLICAÇÕES DOS RADIOFÁRMACOS 1) Cintilografia cerebral: Os principais radiofármacos utilizados para cintilografia cerebral são HMPAO (hexametilpropileno amino oxima) e ECD (etilenodicisteína dietil éster), ambos marcados com 99m Tc (HMPAO- 99m Tc e ECD- 99m Tc). Para que esses radiofármacos sejam capazes de interagir com o cérebro, eles devem possuir uma característica em comum: alta lipofilicidade, sendo, portanto, capazes de atravessar a barreira hemato-encefálica, atingindo o órgão alvo. Cada um desses radiofármacos apresentam uma especificidade. O HPMPAO, por exemplo, por ser lipossolúvel, atravessa a barreira hematoencefálica (BHE), e, no cérebro, é conjugado à glutationa, formando um composto hidrossolúvel, e, portanto, incapaz de ultrapassar a BHE novamente, permanecendo retido no cérebro, possibilitando, dessa forma, a realização de um estudo da perfusão cerebral. Devido à sua característica de lipossolubilidade, o HMPAO é um radiofármaco que também pode ser utilizado para marcação de leucócitos. Nesse caso, o HMPAO é incubado na presença de leucócitos, permeando para o interior dessas células. Porém, não há glutationa no interior dos leucócitos, logo, não há formação de um composto hidrossolúvel e, portanto, com o passar do tempo, o HMPAO se difunde para o exterior dessas células, sendo excretado. Por esse motivo, esse tipo de exame, muito realizado para avaliação de doenças inflamatórias intestinais (principalmente retocolite ulcerativa e doença de Crohn), tem-se um prazo limite para ser realizado, já que se o exame for realizado após esse prazo, a marcação observada no intestino pode ser referente à excreção do radiofármaco, e não devido à doença que se deseja avaliar. Assim como HMPAO, o ECD também é um radiofármaco lipossolúvel e, portanto, capaz de atravessar a BHE. Porém, diferentemente do HMPAO, ao atingir o cérebro este radiofármaco sofre ação de algumas enzimas, que o hidrolisa, tornando-o hidrossolúvel, não conseguindo retornar pela BHE, permitindo o estudo da perfusão cerebral e, consequentemente, a avaliação de diversas doenças e alterações. A principal indicação da cintilografia cerebral é para obtenção de imagens de fluxo sanguíneo regional cerebral em pacientes com anomalias do SNC, tais como epilepsia, demência, Alzheimer, doença de Parkinson, acidente vascular cerebral (AVC) e traumas. Na avaliação de epilepsia, induz-se o paciente a uma crise epiléptica e, por esse motivo, é necessário se ter um cuidado maior na marcação do radiofármaco, para que tal seja feita corretamente, uma vez que o mesmo será injetado durante a crise epiléptica induzida no paciente. Exemplo 1: Doença de Alzheimer A imagem ao lado mostra a comparação entre o Spect cerebral de um paciente normal, e o Spect cerebral de um paciente que apresenta doença de Alzheimer. Observa-se na imagem cintilográfica do Spect cerebral alterado a ocorrência de hipocaptação do radiofármaco na região do vértex. Isso é possível observar somente quando a doença já se apresenta em estágio mais avançado, não sendo possível o diagnóstico precoce da doença. O diagnóstico precoce de Alzheimer é um dos objetivos da medicina nuclear atual. Apesar de aindaserem utilizados fármacos marcados com 99m Tc para avaliação de Alzheimer, atualmente a medicina nuclear está voltada para a marcação de novas moléculas que tenham afinidade pelas placas amiloides ou outras substâncias, que apresentam papel muito importante na doença de Alzheimer, para tomografia por emissão de pósitrons (PET). Essas moléculas são marcadas principalmente com 68 Ga e não com 18 F, devido à captação fisiológica do 18 F no cérebro, já que se trata de glicose, diferentemente do 68 Ga. Geralmente, utilizam-se as moléculas que já se conhecem a afinidade por alguma substância importante na doença, adiciona um agente quelante à mesma, como DTPA, e marca-se a molécula com o 68 Ga. Exemplo 2: Acidente vascular cerebral (AVC) A imagem ao lado mostra a comparação entre o Spect cerebral de um paciente normal e o Spect cerebral de um paciente que sofreu AVC. Avalia-se a perfusão do radiofármaco no cérebro. Observa-se, portanto, a presença de regiões de hipocaptação na imagem cintilográfica do cérebro de um paciente que sofreu AVC, indicando que o radiofármaco não foi perfundido para essas regiões, devido a alterações decorrentes do processo sofrido pelo paciente. Em casos de demência também são observadas regiões de hipocaptação em cintilografia cerebral. 2) Cintilografia miocárdica: Os principais radiofármacos empregados em cintilogradia miocárdica, principalmente para diagnóstico de isquemia e infarto do miocárdio são o Sestamibi (Cardiolite) e o Tetrofosmin (Myoview), ambos marcados com 99m Tc. O Tetrofosmin não é comercializado no Brasil, apenas o Sestamibi. O Sestamibi é um cátion lipofílico monovalente, injetado no paciente por via IV. Ao ser injetado, esse radiofármaco presente na corrente sanguínea é difundido para as células cardíacas por difusão passiva, e se liga às proteínas das mitocôndrias dessas células. Esse mecanismo de captação é importante, levando-se em consideração que as células cardíacas são ricas em mitocôndrias. Pequena porção do radiofármaco se distribui para o fígado e para o pulmão, e sua excreção é realizada pelos rins e pelo sistema hepato-biliar. Por esse motivo, pode ser que a imagem cintilográfica apresente marcação no rim, devido ao próprio perfil de eliminação do radiofármaco. O sal presente no frasco de Sestamibi é chamado tetrafluorato de cobre. Além da molécula do fármaco que será marcada, outras substâncias estão presentes, tais como o Sn +2 (agente redutor), citrato de sódio, manitol e cisteína. Essas outras substâncias são importantes principalmente para aumentar a estabilidade do liófilo, como o manitol presente na preparação. O citrato de sódio e a cisteína, nesse caso, são importantes para que a reação de marcação ocorra adequadamente. O 99m Tc apresenta alta afinidade por essas substâncias, logo, ao ser reduzido pelo Sn +2 , se liga a elas, fazendo com que não se tenha moléculas de 99m Tc livres. Com o decorrer do processo, ocorre uma reação denominada transquelação, na qual o 99m Tc se liga a 6 moléculas do fármaco. Por se tratar de uma reação química, nenhum parâmetro deve ser alterado, como temperatura e volume. A cintilografia cardíaca é realizada em duas etapas: repouso e estresse físico. Na etapa de repouso, injeta-se o radiofármaco no paciente em repouso, aguarda-se por 90 minutos, e realiza-se a imagem. Na etapa de estresse físico, o paciente deve correr em uma esteira, acompanhado de um médico cardiologista, que deverá monitorá-lo. Esse especialista deve saber o limite do paciente, para que o mesmo atinja a pressão máxima cardíaca sem que apresente qualquer alteração. Atingida a pressão máxima cardíaca, injeta-se o radiofármaco no paciente e aguarda-se cerca de 90 minutos para realizar a imagem na gama câmara. Esse exame pode ser realizado em um protocolo de 1 dia ou de 2 dias. No protocolo de 1 dia, todas as etapas são realizadas em um único dia. No protocolo de 2 dias, cada etapa em realizada separadamente. Normalmente utiliza-se o protocolo de 1 dia. Caso o paciente apresente alguma alteração que o impeça de correr na esteira, produz-se o estresse farmacológico no mesmo. Nesse caso administra-se um fármaco chamado dipiridamol (Persantine), que ativa a enzima adenosina desaminase, responsável por metabolizar a adenosina. Dessa forma, há um aumento na concentração de adenosina e, consequentemente, aumento da frequência cardíaca do paciente. Porém, esse fármaco apresenta diversos efeitos indesejáveis, entre eles vasodilatação generalizada. Para reverter o quadro de vasodilatação generalizada, administra- se um antídoto: aminofilina, que compete com a adenosina pelos sítios de ligação, diminuindo os efeitos da mesma. A cintilografia cardíaca é o exame mais realizado na medicina nuclear. Trata-se de um exame de triagem, realizado em pacientes que não apresentam histórico familiar de doenças cardíacas, e não são diabéticos ou hipertensos, ou seja, que não fazem parte do grupo de risco para o desenvolvimento dessas doenças. Realizando-se a triagem, evita-se que o paciente seja direcionado diretamente para o cateterismo, que é um processo altamente invasivo, onde se insere um cateter na região da artéria femural, até atingir o coração, onde o iodo é injetado, observando-se qual artéria coronária se encontra obstruída. Nesse processo, o paciente pode apresentar choque, devido à injeção de iodo. Na ponta do cateter há um balão que, ao atingir a região obstruída, é inflado, desobstruindo-a. Então, coloca-se um stent para impedir que ocorra novamente o colabamento. Quando se tem o aumento do trabalho cardíaco, eleva-se a demanda de oxigênio para o miocárdio. Em um paciente normal, ocorre dilatação da artéria coronária diante desse processo, porém, em um paciente com estenose da artéria coronária, ocorre um processo fisiológico de dilatação dessa artéria, devido à diminuição do fluxo sanguíneo e, então, a mesma não é capaz de se dilatar mais. Por esse motivo, no estado de repouso, o paciente não sente dor, que ocorre ao realizar qualquer esforço físico. Assim, diante de esforço físico, a artéria coronária de um paciente com estenose não é capaz de se dilatar, porém, as outras artérias se dilatam, como forma de recompensar. Esse processo é observado na cintilografia, comparando-se com a imagem obtida no estado de repouso e a imagem obtida após o estresse físico. Observa-se uma região de hipocaptação, devido à isquemia ocorrida em decorrência da estenose da artéria coronária. Na cintilografia miocárdica são produzidas imagens de 3 cortes do coração na etapa de repouso e na etapa do estresse físico, para que seja possível realizar o diagnóstico de isquemia ou infarto no paciente, a partir da comparação entre as imagens. Quando a imagem mostra região de hipocaptação na etapa de esforço físico, mas não na etapa de repouso, trata-se de uma isquemia. Quando a região de hipocaptação está presente nas imagens produzidas em ambas as etapas, caracteriza o infarto. Observando-se alterações no ventrículo esquerdo, a situação se torna ainda mais crítica, já que o mesmo é responsável por bombear o sangue para os órgãos. São também avaliados parâmetros quantitativos, tais como a fração de ejeção. 3) Cintilografia óssea: O segundo exame mais realizado em medicina nuclear é a cintilografia óssea. Os radiofármacos mais utilizados na cintilografia óssea são o MDP- 99m Tc e o HDP- 99m Tc, que apresentam em comum a presença de um grupamento fosfato em sua estrutura. O osso é formado por matriz orgânica (35%) e, em sua maior parte, por sais minerais. O grupamento fosfato é essencial nesses radiofármacos, uma vez que o radiofármaco, ao ser captado pelos osteoblastos (células responsáveis por sintetizar a matriz óssea), tem seu grupamento fosfato complexado aos íons Ca 2+ presentes nos ossos, formando cristais de hidroxiapatita, incorporando-se aos ossos. Assim,onde houver grande atividade destes osteoblastos, haverá maior captação de grupos fosfato (inclusive os originados dos radiofármacos), sendo possível a obtenção da imagem (cintilografia). Quando se tem um aumento do fluxo sanguíneo na região óssea, seja devido a um processo inflamatório ou um tumor, o radiofármaco será bastante captado, e a imagem mostrará forte marcação nessa região. O tempo para realização do exame é um tanto quanto demorado devido ao tempo necessário para a absorção do material radioativo pelos osteoblastos e complexação do fósforo com cálcio. A principal indicação do exame de cintilografia óssea é a avaliação de metástases de câncer de mama, próstata e pulmão. Sendo assim, a presença de regiões de hipercaptação indica a ocorrência de metástase. Além da avaliação de metástases, a cintilografia óssea é indicada em processos inflamatórios e infecciosos (osteomielite), avaliação de próteses ortopédicas, avaliação de doenças osteometabólicas (hiperparatireoidismo, doença de Paget, osteoporose, etc) e tumores ósseos primários (principalmente osteossarcoma). O MDP- 99m Tc pode ser utilizado em exames de cintilografia óssea para avaliação de processos inflamatórios e infecciosos, porém, não é possível distinguir entre os dois processos, já que em ambos ocorre o aumento do metabolismo no local, logo, aumento da atividade dos osteoblastos. Para que seja possível distinguir os dois processos, pode-se, posteriormente, realizar o exame de PET com 67 Ga. A cintilografia óssea é um exame altamente sensível. Dessa forma, qualquer alteração óssea no local fará com que haja marcação e, por esse motivo, é preciso que o analista saiba informações a respeito do paciente, como sofrimento de fraturas ou torções pelo mesmo. As imagens acima representam a cintilografia óssea em pacientes normais (primeira imagem) e em pacientes que apresentam metástases ósseas (segunda imagem). É feito um scanner do esqueleto do paciente, desde o crânio até a ponta dos dedos. As regiões de hipercaptação observadas na cintilografia em pacientes normais representam regiões onde há crescimento ósseo, fisiológico, logo, o metabolismo nessas regiões estará acelerado. Em casos de metástase, observa-se que não é possível a detecção clara de membros superiores e inferiores, uma vez que as metástases se concentram no esqueleto axial, e que não há uma simetria. 4) Linfocintilografia: A linfocintilografia é aplicada principalmente na pesquisa de linfonodo sentinela em casos de câncer de mama, mas também pode ser aplicado para outros tipos de câncer. Outro tipo de linfocintilografia é a linfocintilografia de membros inferiores, na qual o radiofármaco é injetado entre os dedos dos pés, para avaliação da drenagem linfática. O sistema linfático é a principal rota de metástase para tumores de grande incidência, tais como carcinomas de mama, cólon, próstata e melanoma. Os linfonodos sentinelas são aqueles que recebem a drenagem linfática inicial do sítio primário do tumor. Dessa forma, se células tumorais se desprenderem do tumor, há um grande risco de as mesmas se espalharem pelo organismo, atingindo outros locais, provocando metástase. Assim, identificando-se o linfonodo sentinela, o mesmo é retirado, realiza-se uma análise anátomo patológica, e verifica-se a presença de células tumorais. A presença de células tumorais no linfonodo sentinela, indica que também podem haver células em outros linfonodos, logo, deve-se retirar toda a cadeia linfática do paciente. O termo sentinela se deve por sua função de vigia, sinalizando possíveis migrações de células cancerígenas até outros nodos dentro da cadeia linfática ou o espalhamento regional do tumor. Em casos de pacientes com câncer de mama, nas quais foi observada a presença de células tumorais no linfonodo sentinela, deve-se retirar a cadeia linfática responsável pela drenagem da região (linfonodectomia axilar). Esse processo está associado a algumas sequelas e complicações, tais como linfangiossarcoma, neuropatias, restrições na mobilização do braço, além de ser porta de entrada para infecções. Pode ocorrer linfedema de braço, devido ao acúmulo de líquido intersticial, o que leva ao constrangimento nas atividades diárias da mulher, reduz a auto-estima pela distorção da imagem corporal, e interfere no relacionamento pessoal e no convívio social, pois deixa evidente a presença da doença. O isótopo mais utilizado para a realização de exames de cintilografia é o 99m Tc. No Brasil, os radiofármacos coloidais 99m Tc-Dextran-500 e 99m Tc-Ácido fítico são os mais utilizados. Internacionalmente, o 99m Tc-Ácido fítico não é muito utilizado. O radiofármaco é administrado por via subcutânea ou intradérmica em torno da lesão ou no sítio cirúrgico. São administradas de 4 a 6 injeções, em seringas de insulina, de 100 μCi cada uma. As imagens são realizadas em série a cada 5 minutos até que o linfonodo sentinela seja detectado. Não é necessária uma preparação prévia ou jejum da paciente para se realizar a linfocintilografia. A detecção do linfonodo sentinela pode ser feita por linfocintilografia pré-cirúrgica, onde a localização do mesmo é marcada na pele da paciente antes da cirurgia da remoção do tumor, ou por cintilografia intra-operatória, na qual a localização é feita com o gamma probe (detector portátil de radiação gama) durante a cirurgia. Ao ser injetado no paciente, ocorre absorção dos radiofármacos pelos vasos linfáticos e, então, transporte dos mesmos até os linfonodos. Aproximadamente 60% do coloide é transportado pelo sistema linfático.
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