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INTRODUÇÃO O crescimento acelerado da comercialização de serviços ao redor do mundo vem impondo às empresas um desafio: explorar novas formas de lidar com esse transitório e complexo ambiente de negócios cujos contornos ainda estão sendo definidos. Se, antigamente, os bens tangíveis ditavam as estratégias comerciais das empresas, hoje os chamados bens intangíveis desempenham um papel primordial na criação dessas estratégias. Desse modo, para garantir a vantagem competitiva, os gestores devem estar preparados para gerenciar práticas inovadoras, aprimorando cada vez mais as suas habilidades – principalmente, a criatividade e a flexibilidade. Um gestor eficaz deve, portanto, desenvolver uma percepção sistêmica do processo de planejamento estratégico e desenhar a visão estratégica desse novo tipo de comércio. Considerando esse contexto, na apostila Gestão de serviços, analisaremos os processos e modelos trabalhados pelos gestores ao buscarem a efetividade na administração das mudanças nas organizações e o alcance dos objetivos no contexto do marketing de serviços. Para tanto, analisaremos alguns conceitos fundamentais das áreas de gestão de serviços e gestão de bens, identificaremos os principais desafios encontrados na gestão de serviços e veremos a importância do endomarketing como estratégia para essa área de gestão. Todo esse conteúdo foi estruturado em quatro módulos. No módulo I, veremos os conceitos relacionados ao marketing de serviços e apresentaremos as características-chave da sua gestão. Para tanto, trataremos das principais diferenças entre o comércio de bens e de serviços, trazendo à tona todas as novas dificuldades impostas pelo último. Destacaremos ainda os principais pontos relativos à gestão e mensuração da qualidade no âmbito dos serviços. SUMÁRIO FUNDAMENTOS DO MARKETING DE SERVIÇOS ................................................................................. 7 PRINCIPAIS DIFERENÇAS ENTRE BENS E SERVIÇOS ....................................................................... 7 CARACTERÍSTICAS DOS SERVIÇOS ................................................................................................. 10 Comercialização de serviços .................................................................................................. 11 Venda intangível ....................................................................................................................... 12 CARACTERÍSTICAS DO MARKETING DE SERVIÇOS ....................................................................... 13 O “momento da verdade” e a sua importância ................................................................... 15 Momento zero da verdade ................................................................................................ 16 Primeiro momento da verdade ........................................................................................ 19 Segundo momento da verdade ........................................................................................ 20 Terceiro momento da verdade ......................................................................................... 21 GESTÃO DA QUALIDADE EM SERVIÇOS ........................................................................................ 21 Importância da qualidade....................................................................................................... 21 Como atingir a qualidade em serviços .................................................................................. 24 Modelo ServQual ..................................................................................................................... 25 Mensuração da qualidade: modelo dos cinco hiatos ......................................................... 26 BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................................................... 32 PROFESSORES-AUTORES ..................................................................................................................... 35 Neste módulo, veremos os conceitos relacionados ao marketing de serviços e apresentaremos as características-chave da sua gestão. Para tanto, trataremos das principais diferenças entre o comércio de bens e de serviços, trazendo à tona todas as novas dificuldades impostas pelo último. Destacaremos ainda os principais pontos relativos à gestão e mensuração da qualidade no âmbito dos serviços. Principais diferenças entre bens e serviços A natureza dos serviços é debatida por pesquisadores há muito tempo. Entre o final do século XVIII e o início do século XIX, os serviços eram definidos, principalmente, pela natureza da propriedade e pela capacidade de criação de riqueza. No entanto, no decorrer da história, as definições de serviço passaram a ser apresentadas a partir das suas diferenças em relação ao produto. Para os economistas clássicos, por exemplo, a característica que diferencia, fundamentalmente, bens e serviços é a possibilidade de posse. Segundo tais economistas, os bens seriam objetos de valor sobre os quais os direitos de propriedade poderiam ser estabelecidos e trocados. Sendo assim, a propriedade do bem implicaria a posse de um objeto tangível. Essa posse poderia ocorrer por meio de compra, troca ou doação de um produtor ou de um proprietário anterior. De acordo com os economistas clássicos, bens e serviços se diferenciam pelo fato de a compra de um serviço não envolver a troca de propriedade. FUNDAMENTOS DO MARKETING DE SERVIÇOS 8 Ainda considerando os serviços como aquilo que “os produtos tangíveis não são”, Lovelock (1991) os definiu como um processo. Também de forma comparativa, Solomon et al. (1985) definiram o marketing de serviços como a comercialização de atividades e processos, e não de objetos. Existem, pelo menos, quatro características que fazem da comercialização de serviços uma atividade bem diferente da comercialização de produtos físicos. Serviços são intangíveis, e por isso, sua gestão fica ainda mais complexa, já que há uma subjetividade muito grande na sua prestação e na avaliação pelo cliente. Além disso, é impossível separar o prestador do serviço por ele oferecido, já que o seu trabalho faz parte do serviço. Por esse motivo, na maioria das vezes, as empresas não conseguem fornecer um serviço exatamente igual todas as vezes que ele for contratado. Uma outra característica dos serviços é que eles não podem ser estocados. Por exemplo, uma sala de cinema que não teve a venda de ingressos esgotada para uma determinada sessão, não vai poder realizar essa venda no dia seguinte. Essa característica traz desafios para os gestores de serviços diferentes dos desafios enfrentados pelos gestores de produtos físicos. Seguindo essa abordagem, apresentamos, no quadro a seguir, os principais pontos em que os serviços se diferem dos produtos físicos. 9 Quadro 1 – Bens e serviços tema característica exemplos serviços bens serviços bens tangibilidade intangível tangível Viajar em um assento de uma companhia aérea. O assento do avião em si. tempo entre produção e consumo simultâneo não simultâneo Cortar o cabelo em um salão de beleza. Produtos de beleza. reprodução e similaridade única reproduzível Ter investimentos e obter cuidados médicos. Joias e medicamentos. interação do cliente alta limitada Obter serviços de consultoria ou educação. Livros e apostilas (envolvimento limitado do cliente na produção). transferência de conhecimento alta limitada Obter serviços legais, educacionais, médicos e outros difíceis de automatizar. Celulares e tablets (produtos tangíveis viabilizam a automação). produção/ execução locais diversos instalaçõesfixas Obter assessoria jurídica em um escritório, em domicílio ou via internet. Carros e eletroeletrônicos. avaliação da qualidade mais difícil mais fácil Assistir a uma palestra (dificuldade de apontar os aspectos a serem avaliados). Livros e apostilas (muitos aspectos podem ser avaliados). revenda incomum comum Ir a uma consulta médica. Cosméticos (o produto tem, geralmente, um valor residual). Fonte: Adaptado de Heizer, J. (2016). 10 Apesar de reconhecerem essa tendência à comparação entre bens e serviços, muitos pesquisadores argumentam que bens e serviços não são mutuamente exclusivos, pois são subconjuntos de um domínio comum: uma produção (tangível ou intangível) ofertada. Características dos serviços Em meados do século XX, os pesquisadores começaram a reconhecer os serviços como uma categoria com características próprias, e não apenas como uma categoria que se explica por contraste à dos produtos físicos. Esse reconhecimento desencadeou uma mudança na forma como os serviços eram definidos. Nesse momento, os serviços começaram a ser vistos como uma ação, um processo ou uma performance que ocorre por meio de interações com uma pessoa ou uma máquina e que proporciona satisfação ao consumidor. Embora ainda não exista um consenso quanto à definição de serviço, Vargo e Lusch (2004) notaram que a grande maioria dos pesquisadores concorda em relação a dois importantes pontos: a) Os serviços são atividades econômicas ou processos intangíveis oferecidos por uma das partes: Isso significa realizar alguma atividade em benefício de alguém ou alguma entidade. Essas atividades são realizadas com recursos individuais ou organizacionais, com habilidades e competências pessoais. Sendo assim, a maioria dos pesquisadores concorda que o serviço é a aplicação de competências especializadas (habilidades e conhecimentos) por meio de ações, processos e desempenhos em benefício de outra entidade ou da própria entidade (VARGO, LUSCH 2004; GRONROOS 2000) e 11 b) A experiência do consumidor é o “coração” dos serviços: Por meio de um processo interativo, o prestador de serviços tem o potencial de criar os benefícios desejados e, posteriormente, reconhecidos pelo consumidor como uma experiência positiva. A construção de uma boa experiência para o consumidor faz com que o marketing de serviços seja tão importante a ponto de ser estudado à parte do marketing tradicional de produtos. Um serviço consiste, portanto, em qualquer atividade ou benefício que uma parte possa oferecer à outra, que não resulte em transferência de propriedade e cuja produção pode ou não estar vinculada a um produto físico. Comercialização de serviços A comercialização de um serviço é bastante diferente da comercialização de um produto físico e, consequentemente, o gerenciamento de serviços é tarefa diferente do gerenciamento de bens físicos. Sendo assim, é muito importante que compreendamos as características específicas dos serviços que podem impactar a forma de geri-los. Por exemplo, suponhamos que um turista esteja pensando em alugar uma bicicleta para fazer um passeio na cidade que está visitando. Quando da decisão do aluguel, ele poderá considerar elementos como: o atendimento dos funcionários, a localização da loja, os horários de funcionamento, a aparência das instalações ou a cobertura do seguro da bicicleta. Agora, suponhamos que esse mesmo indivíduo decida comprar uma bicicleta. Provavelmente, os fatores que acabamos de ver terão pouca relevância e darão lugar a outros, como tamanho, qualidade das peças e dos materiais, design e quantidade de marchas, todas características do produto em si. 12 Venda intangível Kotler e Armstrong (1993) destacam quatro características principais na esfera dos serviços, sejam eles públicos ou privados, com ou sem fins lucrativos: � intangibilidade; � inseparabilidade, também chamada de simultaneidade; � heterogeneidade ou variabilidade e � perecibilidade. Neste ponto do nosso estudo, vamo-nos ater à intangibilidade, conceito fundamental para o entendimento dos serviços. Diferentemente dos bens físicos, os serviços não são tangíveis ou palpáveis, mas correspondentes a ideias e conceitos – ou seja, são intangíveis. Essa característica traz desafios importantes para o marketing de serviços, pois apesar de deverem ser comercializados pelas empresas, os serviços não podem ser sentidos, vistos, provados, testados, tocados, embrulhados ou carregados. Justamente por esse motivo, geralmente, os clientes de serviços buscam formas alternativas de julgá-los, o que é feito, muitas vezes, de forma inconsciente. Desse modo, acabam focando fatores mais tangíveis e associando-os à prestação de serviços. Por exemplo, é comum um cliente utilizar a reputação da empresa ou as características do ambiente onde o serviço é prestado como variável de decisão. No exemplo em que comparamos o aluguel e a compra de uma bicicleta, vimos que a intangibilidade do serviço de aluguel fez com que a avaliação do seu valor e dos seus benefícios fosse realizada de forma muito mais subjetiva do que a avaliação realizada quando da compra do produto em si. 13 Características do marketing de serviços Quando um consumidor quer ter acesso a um serviço, geralmente, ele tem a expectativa de obter também acesso a um bem, a locais, a uma mão de obra especializada, a habilidades profissionais, mas não de apropriar-se de nenhum desses elementos físicos envolvidos. Dessa forma, no marketing de serviços, aspectos como a experiência do cliente e a execução do serviço na forma e no prazo acordados ganham especial relevância. Como vimos, a venda de um serviço é muito parecida com uma promessa, ou seja, o prestador do serviço promete cumprir o acordado exatamente da forma contratada e atendendo às expectativas do cliente. Pela natureza da comercialização dos serviços, podemos entender a dimensão da importância dos funcionários como representantes motivados da empresa. Os funcionários são, portanto, o capital humano essencial para a criação de uma relação com credibilidade e vínculos estreitos junto aos clientes. 14 Para cumprirem a função de ponto de contato direto da empresa com o consumidor, os funcionários devem ter um conjunto de atitudes (empatia, atenção, comunicabilidade, flexibilidade) e determinada postura (discrição, elegância, sinceridade, humildade). A empresa, por sua vez, precisa ser capaz de motivá-los para atuarem como verdadeiros embaixadores da marca. Ainda por conta de o serviço ser comparado a uma promessa, é imprescindível que a empresa só prometa entregar algo que realmente consiga realizar, ou seja, algo realista e compatível com a expectativa do cliente. Isso deve ser feito por meio de uma comunicação clara e de uma promoção de venda precisa. 15 Grönroos (1983, 1984, 1995) e Normann (1977, 1993) são os principais pesquisadores teóricos do marketing de serviços. Baseado nas pesquisas realizadas por eles, o marketing de serviços é hoje considerado uma função organizacional e um conjunto de processos utilizado para identificar ou criar, comunicar e entregar valor aos clientes, gerando um relacionamento que venha a beneficiar a organização e as partes interessadas. Essa definição é apresentada pela American Marketing Association e defendida pelos principais pesquisadores do tema, como Lovelock e Wirtz (2011). No plano empresarial, a difusão da importância do marketing de serviços foi mais fortemente influenciada por Carlzon (1990), autor que difundiu o conceito de “momento da verdade” de Normann. Veremos esse conceito a seguir. Gestores de marketing de serviços devem desenvolver uma estratégia cujo planejamento seja claro e determine como atingir as metas e os objetivosestabelecidos. A formulação dessa estratégia envolve a alocação apropriada de recursos para alcançar as metas. O “momento da verdade” e a sua importância Um fabricante de um produto tangível, tal como um ferro de passar roupas ou uma geladeira, consegue controlar a qualidade do produto final de modo mais preciso, garantindo que ele possa chegar em perfeitas condições e de forma planejada nas mãos dos consumidores. Isso não acontece com os serviços, já que, como vimos, eles são “produzidos” durante o ato de entrega. Por exemplo, um corte de cabelo, o conserto de um pneu ou a estadia em um hotel podem ser “produzidos e entregues” várias vezes ao longo de um mesmo dia, para vários clientes diferentes e, dificilmente, de forma exatamente igual. Isso significa que os métodos tradicionais de controle de qualidade – verificação efetuada ao longo do processo ou centralizada na inspeção final – não são adequados para serviços. É necessário, portanto, um conceito de qualidade mais amplo, que também leve em conta o processo humano de geração e entrega desse "produto". Nesse sentido, o funcionário de uma empresa tem importância central na qualidade do serviço, pois, na maioria das vezes, é ele quem está na linha de frente da empresa. Em outras palavras, o funcionário é o principal contato entre a empresa e o cliente, o que o leva, de certa forma, a trazer ares de tangibilidade para o serviço executado. Segundo Normann (1993), esse contato entre o fornecedor do serviço e o cliente é chamado de "momento da verdade", isto é, o momento em que o cliente entra em contato com algum aspecto da organização (pessoas, instalações ou equipamentos) e molda a sua impressão acerca da qualidade do serviço. 16 O momento da verdade se subdivide em: � momento zero da verdade; � primeiro momento da verdade; � segundo momento da verdade e � terceiro momento da verdade. Veremos cada um deles a seguir. Momento zero da verdade Geralmente, os clientes buscam informações antes de entrar no ponto de compra, o que evidencia a existência de um momento zero da verdade (zerot moment of truth – ZMOT). Esse momento é anterior à compra e define a primeira interação entre um comprador e um produto ou serviço. O momento zero da verdade surge da busca inicial por informação para resolver um problema. Ocorre, por exemplo, quando pegamos nosso dispositivo móvel (tablet, celular, notebook) e, intencionalmente ou não, obtemos informações a respeito de um produto ou serviço pelo qual possamos vir a ter algum interesse no futuro. A massificação da internet e, com ela, a grande popularização das redes sociais, das mídias eletrônicas e dos dispositivos móveis criaram momentos zero de verdade que não eram conhecidos no passado. O profissional de marketing deve, portanto, estar alerta a essa constante criação de novos tipos de momentos zero de verdade para o seu cliente potencial. 17 Atualmente, os consumidores conhecem um novo serviço ou produto por meio de vídeos on- line, programas patrocinados, sites especializados no tema, sites de busca, análises de personalidades influenciadoras, comentários de amigos em mídias sociais, etc. Isso pode ocorrer tanto no ponto de venda (na loja física ou on-line) quanto no caminho para casa, no trabalho ou durante a espera de uma consulta médica, por exemplo. As fontes de informação e motivação para uma compra estão crescendo fortemente. Essa tendência sugere a importância de maiores esforços de marketing para assegurar que uma marca ou oferta de uma empresa faça parte do escopo da pesquisa on-line do maior número possível de clientes. No quadro a seguir, veremos alguns exemplos de momentos zero da verdade. 18 Quadro 2 – Exemplos de Momentos zero da verdade (ZMOT) Conversou com amigos/familiares sobre o produto. Procurou na Internet, usou mecanismos de busca. Fez comparações de produtos comprados na internet. Buscou informações sobre a marca de um produto/site do fabricante. Leu análises ou recomendações do produto na internet. Buscou informações de site de um varejista/loja. Leu comentários após um artigo/opinião na internet. Tornou-se amigo/seguidor/ “curtiu” uma marca. Assistiu a vídeos on-line sobre o produto. Leu/visitou um blog que discutia o produto. Pesquisou informações na internet com o celular antes de comprar. Conversou com um representante do atendimento ao cliente on-line. Pesquisou informações na internet com o celular na loja. Viu o produto mencionado em um site de rede social como o Facebook. Recebeu uma recomendação de um amigo on-line. Comentou sobre o produto mencionado em um site de rede social como o Facebook. Recebeu um cupom ou informação de preço de alguém em um site de rede social. Comentou em um blog que discutia o produto. Procurou um cupom com o celular antes da compra. Viu um anúncio/cupom enviado para o celular. Procurou cupons em um site de varejo/loja. Recebeu um texto de uma marca/fabricante pelo celular. 19 Procurou um cupom com o celular na loja. Procurou cupons em um site do fabricante/marca do produto. Participou de um bate-papo ou discussão on-line sobre o produto. Usou o celular para verificar códigos de barra 2D/código QR na loja. Fonte: Google Shopper Sciences (Abril, 2011). Primeiro momento da verdade O jornal americano The Wall Street Journal publicou, em 2005, uma reportagem que tratou da importância dos primeiros sete segundos após o primeiro contato do consumidor com um produto na prateleira de uma loja, que, possivelmente, está cheia de produtos similares de concorrentes. O termo "primeiro momento zero da verdade" (fist moment of truth – FMOT) foi então descrito como o momento em que o consumidor está diante da prateleira e precisa decidir qual produto vai levar. É quando o consumidor está olhando todas as opções de sucos de fruta, desodorantes, sabonetes e, ao mesmo tempo, está buscando informações que, para ele, são mais salientes ou relevantes. “As melhores marcas ganham consistentemente dois momentos da verdade. O primeiro momento ocorre na prateleira da loja quando um consumidor decide comprar uma marca ou outra. O segundo ocorre em casa, quando ele usa a marca — e fica encantado ou não.” (A. G. Lafley, ex-CEO da Procter & Gamble) O primeiro momento da verdade é considerado uma das oportunidades de marketing mais importantes para uma marca, pois representa o momento em que o cliente é confrontado com o produto e as opções a ele relacionadas. 20 Vejamos, no quadro a seguir, alguns exemplos. Quadro 3 – Exemplos de primeiro momento da verdade (FMOT) Falou com um vendedor ou funcionário da loja. Falou com um representante do serviço ao cliente pelo telefone. Analisou o pacote do produto na loja. Leu o livreto/panfleto sobre o produto na loja. Usou o cupom do produto que pegou na loja. Usou o computador na loja para procurar informações sobre o produto. Usou um cartão de comprador frequente/fidelidade. Resgatou um cartão de presentes/cartão de gratificação. Experimentou uma amostra ou o produto em uma loja. Fonte: Google Shopper Sciences (Abril, 2011). Segundo momento da verdade O segundo momento da verdade (second moment of truth – SMOT) refere-se ao momento em que o consumidor experimenta o produto ou o serviço após a decisão de compra. Isso determinará a percepção da marca por parte do consumidor e as suas futuras decisões de compra. Uma boa experiência de uso levará, provavelmente, o consumidor a escolher a mesma marca quando chegar a hora de tomar uma nova decisão de compra. Além disso, levará o consumidor a se pronunciar favoravelmente sobre o produto ou serviço em conversas ou comentários on-line. 21 Vejamos alguns exemplos no quadro a seguir. Quadro 4 – Exemplos de segundo momento da verdade (FMOT) Mencionou para um colega de trabalho.Participou de uma pesquisa. Escreveu uma análise do cliente em um site. Escreveu sobre ele em uma página do Facebook. Postou tweets sobre ele. Escreveu sobre ele em um blog. Mencionou para amigos/familiares. Fonte: Google Shopper Sciences (Abril, 2011). Terceiro momento da verdade O terceiro momento da verdade (third moment of truth – TMOT) acontece após o uso do produto ou serviço, quando o cliente passa a ser um verdadeiro fã, um propagador e divulgador de uma marca. Isso pode acontecer por meio de um boca a boca positivo e de boas avaliações. Alguns exemplos desse momento são os posts em redes sociais, como o Instagram e o Facebook, após a conclusão ou uso de um serviço e os comentários (reviews) feitos pelos clientes no site da empresa ou em sites especializados em comentários sobre serviços, como o Yelp. Para garantir que o terceiro momento da verdade funcione para a empresa, o gestor deve estar disposto a estimular os seus clientes a agirem como divulgadores da sua marca, encorajando-os a compartilhar a sua experiência e a manterem-se fiéis à empresa. Gestão da qualidade em serviços Importância da qualidade Três características bem documentadas dos serviços devem ser reconhecidas para uma compreensão completa da importância da qualidade em serviços: � intangibilidade; � heterogeneidade ou variabilidade e � inseparabilidade, também chamada de simultaneidade. 22 A intangibilidade, por exemplo, faz com que a qualidade da prestação de um serviço seja especialmente importante. Essa importância se deve a três motivos principais. O primeiro deles, como já vimos, refere- se ao fato de a venda de um serviço ser, na verdade, a venda de uma promessa. Isso, muitas vezes, dificulta a experiência prévia do consumidor com o serviço a ser prestado, não permitindo que ele o avalie antes do consumo. Em outras palavras, o consumidor confia na promessa de venda baseando-se na observação de um serviço similar ou no fato de conhecidos e influenciadores terem realizado uma indicação. O segundo motivo diz respeito ao fato de, por ser intangível, a maioria dos serviços não poder ser contada, medida, inventariada, testada ou verificada antes da venda, o que dificulta a da qualidade. 23 O terceiro e último motivo tem relação com a dificuldade de padronização. Especificações de fabricação precisas sobre a qualidade uniforme de um serviço raramente podem ser definidas. Além disso, a produção e o consumo de serviços, como já vimos, são inseparáveis, o que também dificulta a padronização da produção como em uma linha de montagem. Há ainda o impacto humano na interação comprador-vendedor. Por esse motivo, os serviços com elevada interação ou relacionamento comprador-vendedor são ainda mais heterogêneos, ou seja, o seu desempenho varia ainda mais de prestador para prestador, de cliente para cliente e de dia para dia. De fato, a consistência do comportamento dos funcionários é difícil de garantir, e o que a empresa pretende entregar pode ser inteiramente diferente do que o consumidor recebe. O comportamento dos clientes durante a prestação do serviço também não pode ser padronizado. Nos serviços em que a participação do consumidor é intensa, como na construção de uma casa ou de um salão beleza, a qualidade daquilo que é executado pode até ser prejudicada, devido ao menor controle gerencial por parte do prestador do serviço. Em resumo, a qualidade de um serviço não pode ser comparada à de um bem que é projetado na fábrica, antes de ser entregue ao consumidor, pois a situação em que um serviço é prestado pode variar muito. Dessa forma, prover um serviço com qualidade contínua, considerando a heterogeneidade da equipe, dos clientes e do momento, consiste em um enorme desafio para as empresas de serviços. No entanto, os esforços empreendidos para prover um serviço com qualidade parecem recompensar a maioria das empresas. Uma grande quantidade de estudos empíricos realizados na literatura de marketing de serviços mostra que a melhoria na qualidade do serviço aumenta, significativamente, a rentabilidade e a competitividade econômica da empresa no longo prazo. Em outras palavras, um negócio cujo serviço é de alta qualidade tende a permanecer economicamente competitivo enquanto atender ou exceder as expectativas dos clientes. 24 Como atingir a qualidade em serviços Melhorias na qualidade do serviço podem ser alcançadas por meio da eficiência dos processos operacionais, o que inclui: � identificação de problemas de forma rápida e sistemática; � estabelecimento de medidas de desempenho de serviço válidas e confiáveis, e � medição da satisfação do cliente e de outros resultados de desempenho. Uma cultura organizacional com foco na qualidade, que orienta toda a empresa para a oferta de um bom serviço, consegue mostrar aos funcionários como eles devem responder a possíveis situações imprevistas. Estudos empíricos têm mostrado que esse posicionamento tem forte impacto na forma de atuação dos funcionários como representantes da empresa e também no modo como o serviço é prestado. Além disso, pesquisadores e gerentes de empresas de serviços concordam que a percepção da qualidade envolve uma comparação entre as expectativas do cliente e o desempenho do serviço, ou seja, um serviço de qualidade deve estar em conformidade com as expectativas dos clientes de forma consistente. Empresas prestadoras de serviços devem adicionar benefícios que não só satisfaçam o cliente mas também o surpreendam, excedendo as suas expectativas. 25 Modelo ServQual Berry e Parasuraman (1992) indicam cinco dimensões da percepção da qualidade de um serviço que devem ser priorizadas para influenciar a percepção do cliente positivamente. São elas: � confiabilidade; � garantia; � tangibilidade; � empatia e � capacidade de resposta. Essas são as cinco dimensões do chamado ServQual e representam os componentes da qualidade do serviço em vários setores de atividade comercial. O ServQual, abreviação de service quality (qualidade do serviço), é a tentativa mais completa de conceituar e medir a qualidade do serviço de uma empresa. O modelo tem sido utilizado por muitos pesquisadores em uma ampla gama de indústrias e contextos: serviços bancários, financeiros, de entretenimento, de beleza, administrativos, educacionais, etc. Geralmente, as empresas usam um questionário baseado no ServQual para medir possíveis problemas de qualidade no serviço e para ajudar a diagnosticar as possíveis causas desses problemas. No quaro a seguir, apresentamos a definição de cada uma das dimensões do ServQual. Quadro 5 – Descrição das dimensões do ServQual dimensão definição confiança Capacidade de realizar o serviço prometido de forma confiável e com precisão. garantia Treinamento e conhecimento dos funcionários, e a sua capacidade de transmitir confiança com simpatia. tangibilidade Aparência das instalações físicas, dos equipamentos, da equipe de funcionários e dos materiais de comunicação. empatia Prestação de um serviço cuidadoso e individualizado, com dedicação ao cliente. capacidade de resposta Disposição para ajudar os clientes e fornecer um serviço rápido. O modelo ServQual se baseia no paradigma da expectativa de confirmação, o que sugere que os consumidores analisam a qualidade em termos da percepção de como a entrega de determinado serviço atendeu às expectativas que tinham em relação a essa entrega. Bebko (2000) analisou até que ponto o grau de intangibilidade de um serviço influencia a criação de expectativas e a percepção da qualidade, independentemente do local, do segmento de mercado ou do momento de consumo. Os resultados da sua pesquisa acabaram confirmando o que Berry e Parasuraman (1992) já haviam apresentado em relação às cinco dimensões da percepção da qualidade.Vejamos: 26 � credibilidade – capacidade de prestar o serviço prometido de modo confiável e com precisão, buscando o "erro zero" (esse é o mais importante critério pelo qual os clientes julgam a qualidade de um serviço); � tangibilidade – aparência física das instalações, do pessoal, dos equipamentos e do material de comunicação; � prestatividade/proatividade – funcionários e empresa com disposição para ajudar o cliente e com presteza na execução do serviço; � segurança – cortesia, competência e capacidade de confiança e credibilidade, e � empatia – atenção ao cliente, procurando assumir o ponto de vista dele. Mensuração da qualidade: modelo dos cinco hiatos A expectativa de um cliente em relação a determinado serviço é determinada por fatores diversos, como recomendações, necessidades pessoais e experiências passadas. Por conta disso, é muito importante que a empresa esteja sempre interessada em conhecer melhor o seu cliente e a sua percepção em relação ao serviço prestado, evitando assim que ele deixe a sua base de consumidores. O gestor de uma empresa de serviços pode usar as seguintes principais fontes de informação a respeito do cliente: � pesquisas próprias para entender a satisfação dos clientes, tendo o cliente atual como respondente; � pesquisas próprias para entender a satisfação dos clientes, tendo os funcionários que têm contato com o cliente como respondentes; � pesquisas de terceiros, da concorrência ou de dados secundários do mercado; � bancos de dados com histórico de contatos com os clientes; � bancos de dados com reclamações apresentadas pelos clientes; � canais de comunicação direta com os funcionários (ex.: "pontos de escuta") que permitam que estes contatem a administração, sem a necessidade de uma pesquisa, para passar informações sobre o dia a dia da prestação do serviço, com as principais falhas ou pontos positivos que verificam, ou os pontos negativos ou positivos apontados informalmente pelos clientes; � comentários dos próprios clientes, que, muitas vezes, manifestam-se sem o intuito de reclamar, apontando possíveis melhorias ou apenas fazendo elogios e � auditorias de qualidade para investigar ou simular a prestação dos serviços feitos por pessoas contratadas para fazer o papel de um cliente (“cliente misterioso”). Os gestores de empresas prestadoras de serviço devem atentar para as dificuldades inerentes à prestação de um serviço de qualidade, analisando possíveis falhas e tendo como foco a adoção de medidas preventivas. 27 Mesmo que a empresa tenha conhecimento a respeito do seu cliente, o serviço esperado e o serviço percebido podem não ser iguais, deixando assim uma lacuna a ser preenchida. Para medir essa lacuna entre a expectativa e a experiência do cliente, foi desenvolvido um modelo de qualidade de serviço chamado modelo dos cinco hiatos. Desenvolvido em 1985, esse modelo destaca os principais requisitos para oferecer alta qualidade em um serviço por meio da identificação de cinco possíveis hiatos ou lacunas que possam causar a entrega malsucedida e fazer com que os clientes tenham uma percepção de baixa qualidade do serviço. São eles: � gap 1 – hiato/lacuna entre as expectativas dos usuários e as percepções dos gerentes; � gap 2 – hiato/lacuna entre a percepção dos gestores sobre as expectativas dos usuários e a especificação de qualidade nos serviços; � gap 3 – hiato/lacuna entre a especificação da qualidade dos serviços e o que é ofertado; � gap 4 – hiato/lacuna entre o que é informado ao usuário e a real qualidade do serviço e � gap 5 – hiato/lacuna entre o que o usuário espera receber e a percepção que ele tem dos serviços oferecidos. 28 Quadro 6 – Cinco hiatos do marketing de serviços descrição possíveis causas gap 1 de conhecimento Diferença entre o serviço esperado do mercado alvo e as percepções da administração sobre o serviço esperado do mercado-alvo. pesquisa de marketing insuficiente comunicações ascendentes inadequadas muitas camadas de gerenciamento gap 2 de padrões Diferença entre as percepções da administração sobre as expectativas dos clientes e a tradução para os procedimentos e especificações do serviço. falta de compromisso de gerenciamento com a qualidade do serviço percepções dos funcionários sobre a infeasibilidade configuração de metas inadequadas padronização da tarefa inadequada gap 3 de entrega Diferença entre as especificações de qualidade do serviço e o serviço realmente entregue. falhas técnicas ou avarias conflito de função / ambiguidade falta de controle percebido empregado-trabalho fora de forma pobre tecnologia pobre supervisão ou treinamento 29 descrição possíveis causas gap 4 de comunicação Diferença entre intenções de entrega de serviços e o que é comunicado ao cliente. falta de comunicações horizontais pobre comunicação com a agência de publicidade comunicações inadequadas entre vendas e operações diferenças nas políticas e procedimentos entre agências ou divisões de uma entidade propensão de superar gap 5 de satisfação Diferença entre a percepção do que pode garantir a satisfação do cliente e o que, de fato, constrói essa satisfação. pesquisa de marketing insuficiente gestão por meio de conceitos preestabelecidos Nesse modelo, o gap 5 é o intervalo de qualidade do serviço e é o único que pode ser medido diretamente. Já os gaps de 1 a 4 não podem ser medidos, mas têm valor para o diagnóstico. O modelo de lacunas ou hiatos de qualidade evoluiu para a conhecida escala ServQual, um instrumento de medida da qualidade percebida de serviços (Parasuraman, Zeithaml e Berry, 1988). O instrumento ServQual é a soma dos gaps 1, 2, 3 e 4, e foi projetado especificamente para capturar o gap 5. Várias replicações foram realizadas em diversos países e subsetores de serviços, adaptando e testando a escala ServQual (ASUBONTENG; MCCLEARY; SWAN, 1996). 30 Figura 1 – Modelo de falha na qualidade dos serviços Fonte: Zeithaml, Parasuraman, Berry (1990). Quando as expectativas dos clientes são maiores que as suas percepções de entrega recebida, a qualidade do serviço é considerada baixa. Quando as percepções excedem as expectativas, a qualidade do serviço é considerada como alta. A figura abaixo mostra a relação entre o modelo de hiatos e o instrumento SERVQUAL. Ela mostra como as dimensões do ServQual atuam para reduzir impactos negativos entre a expectativa do consumidor e a percepção do serviço prestado. 31 Figura 2 – Relação entre os cinco hiatos e o ServQual Fonte: Zeithaml, Parasuraman, Berry (1990). 32 BIBLIOGRAFIA ACHABAL, Dale; HEINEKE, John; MCINTYRE, Shelby H. Issues and perspectives on retail productivity. Journal of Retailing, v. 60, n. 3, 1984. ASUBONTENG, Patrick; MCCLEARY, Karl J.; SWAN, John E. ServQual revisited: a critical review of service quality. Journal of Services marketing, v. 10, n. 6, p. 62-81, 1996. BEBKO, P. Service intangibility and its impact on consumer expectations of service quality. Journal of Services Marketing, v. 14, n. 1, p. 9-26, 2000. BERRY, Wendell. Recollected essays, 1965-1980. Nova Iorque: North Point Press, 1981. BERRY, Leonard L.; PARASURAMAN, A. Prescriptions for a service quality revolution in America. Organizational Dynamics, v. 20, n. 4, p. 5-15, 1992. BLOIS, Keith J. 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Jorge Rodrigues Jacob Filho é doutor em Administração e mestre em Administração pública pela Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (Ebape-FGV), pesquisador do laboratório de relações entre grupos da Columbia University (EUA, Nova Iorque), MBA em Marketing, com ênfase em operações comerciais, pela FGV, além de graduado em Comunicação social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e em Comércio exterior pela Universidade Estácio de Sá. Atua como pesquisador do Centro de Pesquisas Comportamentais da Ebape-FGV desde junho de 2014 e como professor de Marketing (comportamento do consumidor). Considerando a sua experiência como pesquisador visitante do Laboratory of Intergroup Relations and Social Mind (LIRSM) da Columbia University, participou da implementação da base de respondentes das pesquisas comportamentais da FGV (FGV Pool) bem como da fundação do laboratório experimental da FGV no complexo de favelas da Maré. Atuou também como consultor de marketing em grandes empresas, como a Telefônica/Vivo do Brasil e do Peru, onde geriu equipes e desenvolveu novos produtos.
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