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Cap_01_psicoterapias_2008

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PARTE 1
Conceitos gerais
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
O presente capítulo apresenta um breve panorama das psicoterapias na atualidade, in-
cluindo a origem, a evolução, o conceito e os elementos que caracterizam esse importante
método de tratamento dos problemas emocionais e dos transtornos mentais. Serão descritos
os principais modelos, seus fundamentos teóricos e técnicas, bem como suas indicações e
contra-indicações.
Originalmente chamada de cura pela fala, a
psicoterapia tem suas origens na medicina an-
tiga, na religião, na cura pela fé e no hipnotis-
mo. Foi, entretanto, ao final do século XIX que
passou a ser utilizada no tratamento das assim
denominadas doenças nervosas e mentais, tor-
nando-se uma atividade médica inicialmente
restrita aos psiquiatras. No decorrer do século
XX, outros profissionais passaram a exercê-la:
médicos clínicos, psicólogos, enfermeiros, as-
sistentes sociais, entre outros, ultrapassando as
fronteiras do “modelo médico”. Houve uma
grande proliferação de modelos e métodos
apoiados em diferentes concepções sobre os sin-
tomas e o funcionamento mentais, muitas ve-
zes conflitantes e até antagônicas. Escolas sur-
giram, especialmente no pós-guerra, e socieda-
des científicas organizaram-se promovendo seus
congressos, cursos de formação e estabelecen-
do regras para a prática do modelo que preco-
nizavam, em uma convivência nem sempre
pacífica. Uma babel de linguagens e métodos
instalou-se na área, confundindo tanto os pro-
fissionais como as pessoas necessitadas de tra-
tamento. Conservaram-se, contudo, na maio-
ria das vezes, os termos relacionados com sua
origem médica: paciente, diagnóstico, doença,
etiologia, plano de tratamento, prognóstico,
indicações e contra-indicações (Wampold,
2001).
A proliferação de teorias nem sempre foi
acompanhada da correspondente preocupação
em comprová-las e em avaliar a efetividade dos
métodos propostos, seus alcances e limites. Essa
preocupação começou a surgir a partir da dé-
cada de 1950, em particular, a partir da propo-
1 As principais psicoterapias:
fundamentos teóricos,
técnicas, indicações e
contra-indicações
Aristides Volpato Cordioli
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
20 Cordioli e cols.
sição do psicólogo inglês Eysenck de que os
efeitos das psicoterapias eram devidos à sim-
ples passagem do tempo, e não decorrentes das
técnicas utilizadas, o que acabou representan-
do um desafio para os praticantes dos diversos
modelos. Na mesma época, Carl Rogers afir-
mava, ainda, que os efeitos da terapia não eram
devidos às técnicas específicas de cada mode-
lo, e sim decorrentes de fatores intrínsecos à
relação humana que se estabelecia em qualquer
terapia.
Esses e outros desafios, além da competi-
ção entre os diferentes modelos, representaram
um forte estímulo para a realização, a partir da
década de 1960, de pesquisas de grande porte,
como o Projeto Menninger e outros, com a fi-
nalidade de comprovar a efetividade das dife-
rentes modalidades de terapia. De qualquer
forma, existe, na atualidade, um relativo con-
senso de que as terapias são efetivas. Há uma
concordância, também, de que boa parte dos
seus efeitos devem-se a um conjunto de fatores
que envolvem as técnicas específicas utilizadas,
próprias de cada modelo, e, ainda, um com-
plexo conjunto de elementos que inclui, além
das referidas técnicas, os chamados fatores não
específicos, comuns a todas as psicoterapias.
Tais fatores abrangem o próprio contexto inter-
pessoal da terapia: a pessoa do terapeuta e, em
particular, algumas qualidades, como empatia,
calor humano e interesse genuíno; a qualidade
da relação terapêutica (a aliança terapêutica e
o vínculo); além de fatores pessoais do próprio
paciente, como a capacidade de vincular-se ao
terapeuta, seu nível educacional, sua cultura,
suas crenças, suas expectativas, sua motivação
para efetuar mudanças em sua vida, e a maior
ou menor flexibilidade para adaptar-se a cada
método específico. Parece complexo e, de fato,
é. O quanto cada um desses fatores influencia
os resultados é uma questão que gera muito
debate. E, apesar das inúmeras tentativas de
explicar o que leva o paciente a realizar mu-
danças em psicoterapia, e qual a verdadeira
natureza dessas mudanças, ainda são grandes
as controvérsias sobre essas questões.
De qualquer forma, os avanços foram notá-
veis. Novos modelos e técnicas têm sido pro-
postos; muitos deles com protocolos (manuais),
permitindo a padronização e, conseqüentemen-
te, a reprodução das pesquisas. Instrumentos
mais acurados foram desenvolvidos tanto para
o estabelecimento do diagnóstico como para a
avaliação da gravidade dos sintomas e a aferi-
ção dos resultados. Por outro lado, a maior
especificidade e confiabilidade dos diagnósti-
cos psiquiátricos permitiram reunir amostras
mais homogêneas de pacientes, diminuindo a
quantidade de fatores que podem influenciar
os resultados e criando um cenário promissor
para testar a efetividade de diferentes protoco-
los de psicoterapia, procurando responder à
pergunta: qual o melhor método de tratamen-
to para cada paciente? Esses avanços permiti-
ram ainda a comparação da eficácia relativa
entre as diferentes psicoterapias e em relação
aos psicofármacos. Como conseqüência, temos
métodos mais padronizados e um panorama
bem mais definido da eficácia, dos alcances e
dos limites das diversas modalidades de psi-
coterapia.
Na atualidade, existem mais de 250 modali-
dades distintas de psicoterapias, descritas de uma
ou de outra forma em mais de 10 mil livros e em
milhares de artigos científicos relatando pesqui-
sas realizadas com a finalidade de compreender
a natureza do processo psicoterápico e os meca-
nismos de mudança e de comprovar a sua efe-
tividade, especificando em que condições devem
ser usados e para quais pacientes. Apesar de todo
esse esforço, evidências convergentes são escas-
sas. A controvérsia ainda é grande, e o reconhe-
cimento da psicoterapia como ciência é tênue
(Wampold, 2001). Como é um campo perten-
cente a várias profissões, inexiste qualquer tipo
de fiscalização oficial ou de exigência mínima
para quem a pratica.
Psicoterapia
O que é a psicoterapia:
um conceito
Existe uma grande controvérsia sobre até
que ponto a psicoterapia se distingue de outras
relações humanas, nas quais uma pessoa ajuda
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
Psicoterapias 21
outra a resolver problemas pessoais. Apesar
disso, há um consenso de que a psicoterapia é
um método de tratamento mediante o qual um
profissional treinado, valendo-se de meios psi-
cológicos, especialmente a comunicação verbal
e a relação terapêutica, realiza, deliberadamen-
te, uma variedade de intervenções, com o in-
tuito de influenciar um cliente ou paciente, au-
xiliando-o a modificar problemas de natureza
emocional, cognitiva e comportamental, já que
ele o procurou com essa finalidade (Strupp,
1978). O termo “paciente” está relacionado ao
modelo médico e é o mais utilizado, particular-
mente em serviços de saúde. Levando-se em
conta essas características, poderíamos dizer que
a psicoterapia é um tratamento primariamente
interpessoal, baseado em princípios psicológi-
cos, que envolve um profissional treinado e um
paciente ou cliente portador de transtorno men-
tal, problema ou queixa, o qual solicita ajuda.
O tratamento é planejado pelo terapeuta com
o objetivo de modificar o transtorno, proble-
ma ou queixa e é adaptado a cada paciente ou
cliente em particular (Wampold, 2001).
A psicoterapia envolve, portanto, uma
interação face a face. Outras formas de ajuda,
como a biblioterapia, a exposição virtual, o uso
de computador, a conversa de amigos ou o
aconselhamento por telefone ou virtual, quan-
do utilizadas fora de um contexto interpessoal
e de uma relação profissional, não são conside-
radas psicoterapia no sentido estrito. Métodos
baseados em crenças religiosas (cura pela fé,
rituais mágicos, etc.) também são excluídos,
mesmo que provoquem alívio de sintomas.
Na verdade, a psicoterapia distingue-se de
outras modalidades de tratamento porser mui-
to mais uma atividade colaborativa entre o pa-
ciente e o terapeuta do que uma ação predomi-
nantemente unilateral, exercida por alguém so-
bre outra pessoa, como ocorre com outros trata-
mentos médicos (p. ex., cirurgia).
CARACTERÍSTICAS DA PSICOTERAPIA
• É um método de tratamento realizado por um
profissional treinado, com o objetivo de re-
duzir ou remover um problema, queixa ou
transtorno definido de um paciente ou clien-
te que deliberadamente busca ajuda
• O terapeuta utiliza meios psicológicos como
forma de influenciar o cliente ou paciente
• É realizada em um contexto primariamente
interpessoal (a relação terapêutica)
• Utiliza a comunicação verbal como principal
recurso
• É uma atividade eminentemente colaborati-
va entre paciente e terapeuta
As psicoterapias distinguem-se quanto aos
seus objetivos e fundamentos teóricos, bem
como quanto à freqüência das sessões, ao tem-
po de duração, ao treinamento exigido dos
terapeutas e às condições pessoais que cada
método exige de seus eventuais candidatos.
O termo abrange desde as psicoterapias bre-
ves de apoio ou intervenções em crise, destina-
das a auxiliar o paciente a superar dificuldades
momentâneas, até formas mais complexas,
como a psicanálise ou a terapia de orientação
analítica, que se propõem a modificar aspectos
mais ou menos amplos da personalidade. Em-
bora todas utilizem a comunicação verbal no
contexto de uma relação interpessoal, os dife-
rentes modelos divergem quanto ao racional
ou quanto à explicação que oferecem para as
mudanças que almejam obter com seus pacien-
tes. Para as terapias psicodinâmicas, o insight é
considerado o principal ingrediente terapêutico;
para as terapias comportamentais, são as no-
vas aprendizagens; para as terapias cognitivas,
é a correção de pensamentos ou as crenças dis-
funcionais; para as terapias familiares, é a mu-
dança de fatores ambientais ou sistêmicos; e,
para as terapias de grupo, é o uso de fatores
grupais, para mencionar alguns exemplos.
Elementos comuns
às psicoterapias
Embora exista toda essa pluralidade de
modelos e concepções, as psicoterapias têm al-
guns elementos em comum. De acordo com
Jerome Frank (1973), três componentes seriam
comuns a todas as psicoterapias.
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
22 Cordioli e cols.
ELEMENTOS COMUNS
A TODAS AS PSICOTERAPIAS
• A psicoterapia ocorre no contexto de uma re-
lação de confiança emocionalmente carrega-
da em relação ao terapeuta
• A psicoterapia ocorre em um contexto tera-
pêutico, no qual o paciente acredita que o
terapeuta irá ajudá-lo e confia que esse ob-
jetivo será alcançado
• Existe um racional, um esquema conceitual
ou um mito que provê uma explicação plausí-
vel para o desconforto (sintoma ou proble-
ma) e um procedimento ou um ritual para aju-
dar o paciente a resolvê-lo (Frank, 1973)
O que é um modelo de
psicoterapia consolidado?
Apesar das grandes dificuldades e da confu-
são preponderante, alguns modelos de terapia
vêm se consolidando, inicialmente, através da
prática clínica e, mais recentemente, pela com-
provação de sua efetividade mediante a realiza-
ção de pesquisas empíricas bem conduzidas.
CRITÉRIOS PARA QUE UM MODELO
PSICOTERÁPICO SEJA CONSIDERADO
CONSOLIDADO
• Deve estar embasado em uma teoria abran-
gente, que ofereça uma explicação coerente
(um racional) sobre a origem, a manutenção
dos sintomas e a forma de eliminá-los
• Os objetivos a que se propõe modificar de-
vem ser claramente especificados
• Devem existir evidências empíricas da efeti-
vidade da técnica proposta
• Deve haver comprovação de que as mudanças
observadas são decorrentes das técnicas utili-
zadas e não de outros fatores
• Os resultados devem ser mantidos a longo
prazo
• Deve apresentar uma relação custo/efetivi-
dade favorável na comparação com outros
modelos ou alternativas de tratamento (Marks,
2002; Wright; Beck; Thase, 2003)
As psicoterapias são efetivas?
A terapia é eficaz e custo-efetiva (Crits-
Christoph, 1992; Wampold, 2001; Lambert;
Archer, 2006). Smith e Glass (1977), em uma
das primeiras utilizações da metanálise como
recurso estatístico para aumentar o tamanho da
amostra, agruparam os dados de 375 estudos,
publicados e não-publicados, e encontraram um
tamanho de efeito de 0,68. Em uma segunda
metanálise, na qual foram incluídos 475 estu-
dos, Smith, Glass e Miller (1980) encontraram
um tamanho de efeito de 0,85. No tratamento
psicoterápico dos transtornos de personalida-
de, uma outra metanálise que incluiu 15 estu-
dos, dentre os quais três eram randomizados,
encontrou tamanhos de efeito que variaram de
1,11 a 1,29, calculando que a melhora obtida
com a psicoterapia era sete vezes maior do que
a obtida com a evolução natural da doença, na
ausência de tratamento (Perry; Banon; Ianni,
1999). Wampold (2001) afirma que as várias re-
visões de metanálises encontraram tamanhos
de efeito que, na maioria das vezes, variaram
entre 0,75 e 0,85, e que uma média razoável do
tamanho do efeito das psicoterapias seria de
0,80. Portanto, a afirmativa de Eysenck de que
os efeitos da psicoterapia não seriam maiores
do que os obtidos com a simples passagem do
tempo não se sustenta. Em mais de um século
de existência, a psicoterapia vem conquistan-
do cada vez mais a credibilidade da população
em geral, dos pacientes e dos profissionais em
particular.
A psicoterapia como arte
Como atividade humana, a psicoterapia é
também uma arte, na medida em que depen-
de das características pessoais do terapeuta, das
habilidades adquiridas em prolongados trei-
namentos e supervisões e do tipo de par pa-
ciente-terapeuta que se estabelece em cada
psicoterapia. Além do conhecimento do ins-
trumental próprio de cada modelo de terapia,
o bom senso e o timming são essenciais para o
uso otimizado de tais recursos. Utilizá-los é
uma arte.
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
Psicoterapias 23
A seguir, são descritos os fundamentos teóri-
cos, as técnicas, as indicações e as contra-indica-
ções das psicoterapias mais comuns.
Psicoterapias baseadas
na teoria psicanalítica:
psicanálise, psicoterapia
de orientação analítica
e psicoterapias de apoio
Várias modalidades de psicoterapia funda-
mentam-se na teoria psicanalítica: a psicanáli-
se, a psicoterapia de orientação analítica, a psi-
coterapia de apoio, a psicoterapia breve dinâ-
mica, além da terapia de grupo e de algumas
formas de terapia familiar. A psicoterapia psi-
codinâmica é freqüentemente referida como
psicoterapia expressiva-suportiva, dependendo
de cada situação específica ou de cada pacien-
te. É mais exploratória e expressiva quando seu
objetivo preferencial é a análise das defesas, da
transferência e a obtenção de insight sobre con-
flitos inconscientes; é mais suportiva (de apoio)
quando se propõe a fortalecer as defesas e a
suprimir os conflitos inconscientes. Em um ex-
tremo expressivo, situa-se a psicanálise, e, no
extremo oposto (suportivo), a terapia de apoio,
embora ambas tenham por base a mesma teo-
ria do desenvolvimento da personalidade e da
formação dos sintomas.
Psicanálise e psicoterapia
de orientação analítica
Fundamentos teóricos
O termo “psicanálise”, literalmente, signifi-
ca dividir a mente em seus elementos constituti-
vos e nos seus processos dinâmicos. Na práti-
ca, ele é utilizado com, pelo menos, três signifi-
cados diferentes:
• Um conjunto de teorias psicológicas so-
bre o funcionamento mental, sobre a for-
mação da personalidade e de aspectos
do caráter, tanto aqueles considerados
normais como os psicopatológicos (se-
xualidade infantil, inconsciente dinâmi-
co, conflito psíquico, mecanismos de
defesa e formação dos sintomas são al-
guns dos conceitos-chave);
• Um método ou procedimento de inves-
tigação dos conteúdos mentais, espe-
cialmente os inconscientes (livre asso-
ciação, análise dos sonhos, análise da
transferência);
• Um método psicoterápico que se propõe
a efetuar modificações no caráter (ou em
aspectos focais do caráter) por meio da
obtenção de insight mediante a análise
sistemática das defesas, na chamadaneu-
rose de transferência.
A psicanálise teve seu início nas experiên-
cias de Breuer e Freud que, ao tratar pacientes
com sintomas conversivos por meio de hipnose,
observaram o desaparecimento dos sintomas
durante o transe hipnótico. Eles propuseram,
como hipótese explicativa, que o afastamento
de impulsos inaceitáveis da consciência, por
meio da repressão, era o responsável pelo seu
caráter patogênico, e o fato de trazê-los à
consciência fazia com que perdessem tal carac-
terística e desaparecessem. Freud desenvolveu
outras formas de acessar os conteúdos mentais
inconscientes: a livre associação, também cha-
mada de regra fundamental da psicanálise, a in-
terpretação dos sonhos e a análise da transfe-
rência, até hoje utilizadas para tal fim.
No campo teórico, as idéias iniciais de Freud
tiveram inúmeros desdobramentos, destacando-se
a chamada psicologia do ego, liderada por Anna
Freud; a teoria das relações de objeto, liderada por
Melanie Klein; a psicologia do self, desenvolvida
por Heins Kohut; a teoria do apego, de Bowlby e
Bion; o processo de separação e individuação, de
Margareth Mahler, entre outras (Gabbard, 2005).
De acordo com a psicologia do ego, o mun-
do intrapsíquico é caracterizado por conflitos
entre três instâncias: o ego, o id e o superego.
O conflito se manifesta pela ansiedade que, por
sua vez, mobiliza os mecanismos de defesa do
ego. Os sintomas representam soluções de com-
promisso entre a expressão plena dos impulsos
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
24 Cordioli e cols.
(ou sentimentos) e sua repressão ou manejo
pelos mecanismos de defesa e moldam o cará-
ter da pessoa. A análise das defesas que sur-
gem como resistência ao tratamento é o foco
da psicoterapia à luz da psicologia do ego
(Gabbard, 2005).
A teoria das relações de objeto parte do prin-
cípio de que as relações são internalizadas muito
precocemente, a partir dos primeiros meses de
vida, e envolvem as representações do self, do
objeto e dos afetos que ligam essas representa-
ções. Dissociação e projeção são os mecanis-
mos de defesa mais utilizados nessa fase primi-
tiva do desenvolvimento (Gabbard, 2005).
Para Kohut (psicologia do self), os pacientes
narcisistas, em vez de conflitos, teriam déficits
de uma relação empática com a mãe, o que os
deixaria muito vulneráveis em questões de auto-
estima. Em sua formação, o self começaria sob
a forma de núcleos fragmentados que adquiri-
riam coesão como conseqüência de respostas
empáticas dos pais (Gabbard, 2005).
Além desses, outros teóricos fizeram impor-
tantes contribuições para a teoria psicanalítica,
como Bion, Winnicott, Margaret Mahler, en-
tre outros. Dependendo da orientação teórica
à qual é afiliado o analista, pode ser dada uma
ênfase maior ou menor a cada um desses
enfoques.
A técnica da psicanálise
Na psicanálise, o analista adota uma atitude
neutra, sentando-se às costas do paciente, não
havendo, portanto, um contato visual direto.
O paciente é orientado a expressar livremente
e sem censura seus pensamentos, sentimentos,
fantasias, sonhos, imagens, assim como as as-
sociações que lhe ocorrem, sem prejulgar sua
relevância ou significado (regra fundamental da
livre associação). O terapeuta senta atrás do
divã, mantendo uma atitude de curiosidade e
de ouvinte atento. De tempos em tempos, in-
terrompe as associações do paciente, fazendo-
o observar determinadas conexões entre fatos
de sua vida mental (interpretação), particular-
mente emoções ou fantasias relacionadas com
a pessoa do terapeuta (transferência), que pas-
sam despercebidas, e refletir sobre o seu signi-
ficado subjacente (inconsciente).
Em virtude da neutralidade, da repetição
freqüente das sessões e do divã, se estabelece
uma regressão e uma relação transferencial por
parte do paciente, que passa a deslocar para a
pessoa do terapeuta pensamentos e sentimen-
tos voltados, originariamente, para pessoas im-
portantes do seu passado, repetindo padrões
primitivos de relacionamento. Dessa forma, o
passado se torna presente, na chamada neuro-
se de transferência. Por intermédio das inter-
pretações, centradas na análise e na resolução
da referida neurose transferencial, o paciente
poderá obter insight sobre tais padrões primiti-
vos e desadaptados de relações interpessoais,
compreender a origem de traços patológicos de
seu caráter, reviver emoções perturbadoras as-
sociadas a figuras do passado (pai, mãe, irmãos),
modificá-las e livrar-se dos sintomas. Um prin-
cípio básico da psicanálise é a elaboração. A
interpretação repetitiva, a observação, a con-
frontação e a verbalização permitirão ao pacien-
te elaborar seus conflitos, isto é, adquirir domí-
nio sobre conflitos internos e sobre emoções
avassaladoras a eles associadas.
O terapeuta é neutro na medida em que evi-
ta fazer julgamentos sobre os pensamentos, de-
sejos e sentimentos do paciente, procurando
compreendê-los. É abstinente na medida em
que evita gratificar os desejos transferenciais do
paciente, de que se comporte como pessoas do
seu passado. Não revela detalhes de sua vida
pessoal ou de sua família. A proposição tradicio-
nal de que o terapeuta deveria ser uma tela em
branco evolui para a proposição atual, segun-
do a qual ele deve ser natural e espontâneo,
facilitando a relação terapêutica, e não frio, dis-
tante e silencioso (Gabbard, 2005; Person;
Cooper; Gabbard, 2007).
A psicanálise utiliza habitualmente quatro
sessões por semana, podendo variar para três
ou até cinco sessões semanais, que duram de
45 a 50 minutos. As sessões ocorrem sempre
em horários preestabelecidos, podendo o tra-
tamento durar vários anos.
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
Psicoterapias 25
A técnica da psicoterapia
de orientação analítica
Na terapia de orientação analítica, as associa-
ções não são tão livres como na psicanálise, pois
habitualmente são dirigidas pelo terapeuta para
questões-chave da terapia, a qual, a princípio,
busca intervir em áreas circunscritas ou proble-
mas delimitados. Dentro da área selecionada
(foco), o paciente é estimulado a explorar seus
sentimentos, suas idéias e suas atitudes por meio
de suas relações com figuras importantes de sua
vida atual, do seu passado, e com o próprio tera-
peuta, com vistas ao insight. São interpretadas as
defesas, mas as interpretações transferenciais são
menos freqüentes. É feito um uso maior de es-
clarecimento, sugestão e, até mesmo, de técni-
cas comportamentais (sugestão e reforços), do
que na psicanálise. Sem a utilização do divã, com
o uso menor da associação livre e com sessões
menos freqüentes, a regressão é menor, e a trans-
ferência não se desenvolve com a mesma inten-
sidade, primitivismo e rapidez que a psicanálise
(Ursano; Silberman, 2003; Person; Cooper;
Gabbard, 2007).
A psicoterapia de orientação analítica utili-
za de uma a três sessões semanais, com o paci-
ente sentando-se em uma poltrona de frente
para o terapeuta, podendo o tratamento durar
vários meses ou até anos.
Como ocorrem as mudanças
na psicoterapia psicodinâmica?
As terapias psicodinâmicas buscam a mu-
dança essencialmente por meio do insight e da
relação terapêutica. O insight é obtido em con-
seqüência das interpretações, tornando consci-
entes impulsos, sentimentos, medos, fantasias
e desejos, especialmente quando se manifestam
na relação transferencial.
Além do insight, algumas mudanças podem
ser consideradas conseqüência da própria rela-
ção terapêutica. Em um tratamento prolonga-
do como a psicanálise, com vários encontros
semanais, é inevitável que o paciente internalize,
na relação com o terapeuta, aspectos reais de
sua pessoa, especialmente os aspectos idealiza-
dos e com os quais se identifica, e, como conse-
qüência, sejam modificadas representações (de
objeto e do self) das figuras parentais interna-
lizadas na infância.
Um outro efeito do tratamento é o aumento
da capacidade de refletir sobre si mesmo, de
identificar sentimentos ligados a pessoas do
passado e deslocados para pessoas da vida pre-
sente, adquirida com a ajuda do terapeuta
(internalização de uma capacidadedo terapeu-
ta), permitindo distinguir melhor os fatos do seu
mundo interno, as interpretações desses fatos e
a realidade externa.
É inevitável que, em uma relação prolonga-
da, atitudes como dar atenção a certos temas e
demonstrar satisfação em razão de progressos
obtidos acabem funcionando como reforçado-
res, assim como a correção de pensamentos e
de crenças distorcidas em razão do uso de con-
frontações e de clarificações. É inevitável, por-
tanto, a utilização de estratégias, mesmo que
de forma não deliberada, que na verdade são
típicas de outros modelos de terapia.
Objetivos e indicações
das terapias psicodinâmicas
As terapias psicodinâmicas destinam-se ao
tratamento de problemas de natureza crônica,
cuja origem situa-se em dificuldades ocorridas
na infância, em especial nas relações com os
pais. Podem ser úteis, em princípio, para pes-
soas com traços ou transtornos da personalida-
de que causam prejuízo a suas relações interpes-
soais, familiares ou profissionais, ou para tratar
problemas caracterológicos mais graves ou com
atrasos em tarefas evolutivas, como, por exem-
plo, aquisição e consolidação de identidade
própria, independência e autonomia. Seus ob-
jetivos, portanto, são a reorganização da estru-
tura do caráter ou a modificação de traços de
personalidade desadaptativos em pacientes com
transtornos leves ou moderados da personali-
dade.
Pacientes mais ambiciosos, com uma boa
motivação para efetuar mudanças mais profun-
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
26 Cordioli e cols.
das e mais amplas, com interesse e boa capaci-
dade para um trabalho introspectivo e para
pensar psicologicamente, além de disposição
de tempo, de recursos financeiros e um ego
razoavelmente preservado, são candidatos à
psicanálise.
Se o desejo é tratar problemas mais focais,
resolver conflitos delimitados ou circunstanci-
ais, ou se o paciente tem problemas mais gra-
ves, e, mesmo assim, mantém uma boa capaci-
dade para trabalhar introspectivamente, ou,
ainda, se não existe motivação para efetuar
mudanças mais profundas e não há disponibi-
lidade de tempo e de recursos financeiros ne-
cessários, a opção pode ser uma terapia de ori-
entação analítica ou, até mesmo, uma psicote-
rapia breve dinâmica. Esta última modalidade
pode ser indicada em situações de crises vitais
ou acidentais, transtornos de ajustamento nos
quais um foco de natureza psicodinâmica foi
facilmente identificado e o paciente apresenta
as condições necessárias para um trabalho
introspectivo e interpretativo.
Independentemente da modalidade de te-
rapia psicodinâmica adotada, o paciente deve
atender a alguns pré-requisitos. É indispensá-
vel que o paciente:
1. Seja capaz de comunicar-se de forma ho-
nesta com o terapeuta, predominante-
mente por meio de palavras, e não por
ações;
2. Experimente conflitos internos;
3. Tenha uma razoável capacidade de
introspecção e queira utilizá-la para au-
mentar a compreensão sobre si mesmo;
4. Consiga experimentar afetos intensos sem
externalizá-los na sua conduta;
5. Possa desenvolver um bom vínculo com
o terapeuta e uma aliança terapêutica;
6. Seja capaz de, junto com o terapeuta,
estabelecer algumas metas como, por
exemplo, um melhor controle de impul-
sos, um melhor controle de condutas
destrutivas, etc. (Ursano; Silberman,
2003, p. 1181).
Aparentemente, não existem mais contra-
indicações em razão da idade, embora, em prin-
cípio, a psicanálise não seja recomendada para
pacientes com mais de 50 anos.
Indicações da psicanálise e da
psicoterapia de orientação analítica
• Traços de personalidade ou problemas
caracterológicos desadaptativos
• Transtornos leves ou moderados de perso-
nalidade
• Atrasos ou lacunas em tarefas evolutivas
• Conflitos internos, predominantemente de
natureza edípica, que interferem nas rela-
ções interpessoais atuais
As terapias de orientação analítica,
em princípio, são contra-indicadas
• Quando há ausência de um ego razoavel-
mente integrado e cooperativo (psicóticos,
transtornos graves de personalidade, de-
pendentes químicos, transtornos mentais
orgânicos)
• Na presença de problemas de natureza agu-
da, que exigem solução urgente
• Em transtornos mentais para os quais exis-
tem outros tratamentos efetivos de menor
custo (transtornos de ansiedade, transtornos
do humor, transtornos alimentares, depres-
são, etc.)
• Para pacientes impulsivos que não toleram
níveis, mesmo que pequenos, de frustração,
como ocorre com pacientes borderline, al-
tamente narcisistas e centrados em si mes-
mos ou voluntariosos
• Para pacientes com transtornos da persona-
lidade que dificultam o estabelecimento de
um vínculo (esquizóides, esquizotípicos,
anti-sociais) e que dificilmente se enqua-
dram dentro da estrutura do tratamento ana-
lítico
• Para pacientes com problemas agudos (psi-
coses, transtornos do humor e de ansieda-
de, etc.)
• Para pacientes gravemente comprometidos e,
portanto, sem condições cognitivas para tra-
balhar na busca de insight
• Para pacientes comprometidos cogniti-
vamente (retardo mental, demência)
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
Psicoterapias 27
• Para pacientes com pouca capacidade para
introspecção (alexitimia) ou com pouca so-
fisticação psicológica
• Na ausência de motivação para uma terapia
de insight ou de interesse em um trabalho
introspectivo
Psicoterapias de apoio
A expressão “terapia de apoio” refere-se a
um tipo de terapia que é menos ambicioso,
menos intensivo e menos provocador de ansie-
dade do que as terapias designadas psicanalíti-
cas, orientadas ao insight, exploratórias ou ex-
pressivas. Entretanto, esse tipo de terapia fun-
damenta-se, também, nas teorias psicanalíticas
da personalidade. O apoio, na verdade, é visto
como elemento essencial em todas as formas
de psicoterapia, as quais diferem-se mais em
função do grau do que propriamente da pre-
sença ou ausência de técnicas de apoio. Essa
modalidade de terapia pode ser melhor enten-
dida se for vista como situada em um dos pólos
do continuum suportivo-expressivo que carac-
teriza as psicoterapias psicodinâmicas, com di-
ferenças relativas no que se refere aos objeti-
vos, às indicações, ao embasamento teórico, às
estratégias e às técnicas.
OBJETIVOS DAS PSICOTERAPIAS
DE APOIO
• Redução ou a eliminação dos sintomas
• Manutenção ou o restabelecimento do nível
de funcionamento anterior a uma crise
• Melhora da auto-estima
• Melhora da capacidade de lidar com os
estresses internos e externos, eventualmen-
te por meio do afastamento das pressões
ambientais ou da adoção de medidas que vi-
sam ao alívio dos sintomas
• Diminuição de déficits de funcionamento do
EGO por meio do reforço de defesas consi-
deradas adaptativas
• Desenvolvimento de capacidades de lidar
com déficits provocados por doenças físicas
ou suas seqüelas
As psicoterapias de apoio podem ser de lon-
go prazo ou breves, também chamadas de in-
tervenções em crise ou terapias breves de apoio.
As terapias de apoio de longo prazo destinam-
se a pacientes com déficits crônicos de ego, com
o funcionamento geral comprometido, enquan-
to as intervenções breves de apoio destinam-se
a pessoas psiquiatricamente saudáveis e bem
adaptadas que, momentaneamente, estão atra-
vessando situações de crise, trauma ou desas-
tre natural, e com uma resposta à crise abaixo
de sua capacidade, ou que não estão utilizando
os recursos de que dispõem. Seus objetivos são
o alívio dos sintomas, a manutenção ou a res-
tauração de uma função, o aumento da auto-
estima e a melhora da adaptação a estresses in-
ternos e externos (Ursano; Silberman, 2003).
Fundamentação teórica
As psicoterapias de apoio fundamentam-se
na teoria psicodinâmica do funcionamento
mental: nos conceitos de força de ego, nos me-
canismos de defesa (adaptativos e não adapta-
tivos), no terapeuta assumindo temporariamen-
te as funções de ego auxiliar e de holding, e nos
mecanismos de identificação introjetiva. No
caso específico das intervenções em crise, ba-
seiam-se ainda na teoria das crises de Caplan,
no princípio epigenético e no conceitode fases
e tarefas evolutivas ao longo do ciclo vital, de
Erickson. Além do embasamento na teoria psi-
codinâmica, a terapia de apoio utiliza os prin-
cípios da aprendizagem (reforço, aprendizagem
social) da teoria comportamental e a correção
de crenças e pensamentos disfuncionais, técni-
cas de solução de problemas da terapia cogni-
tiva. Leva ainda em conta os recursos e as pres-
sões do meio social em que o paciente vive e
com o qual interage e a necessidade de mobili-
zá-los ou afastá-los.
A estratégia básica da terapia de apoio é
mapear as principais áreas de dificuldade na
vida do paciente e melhorá-las da maneira que
for possível, em vez de tentar descobrir suas
causas, como seria a preocupação da terapia
de orientação analítica (Ursano; Silberman,
2003). Central a essa estratégia é ajudar o pa-
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
28 Cordioli e cols.
ciente a fortalecer as defesas adaptativas, dimi-
nuir o uso de defesas imaturas ou mal-adapta-
tivas e melhorar o equilíbrio entre impulsos e
defesas. Por exemplo, pode ser sugerido o afas-
tamento de situações demasiadamente estresso-
ras ou ser proposto o objetivo de reduzir a
autocrítica quando demasiadamente severa ou
melhorar o autocontrole sobre impulsos dema-
siadamente intensos ou destrutivos. O foco é
nos pensamentos e sentimentos conscientes –
e não no inconsciente, em fortalecer em vez de
diminuir as defesas e em conter em vez de mo-
bilizar afetos. O objetivo mais imediato é o alí-
vio dos sintomas e a restauração do nível de
funcionamento anterior à crise.
A relação com o terapeuta tem uma função
fundamental na terapia de apoio. Enquanto na
terapia de orientação analítica as interpretações
transferenciais são o principal recurso para cor-
rigir as projeções e distorções do paciente, na
terapia de apoio o terapeuta exerce uma função
de suporte, semelhante ao que ocorre em uma
boa relação mãe-filho. Nessas condições, a pre-
sença constante, o apoio empático, o interesse
autêntico, a ausência de crítica e o vínculo afetivo
reduzem a ansiedade e aumentam a auto-estima
do paciente, além de permitirem a internalização
de aspectos positivos e capacidades do terapeu-
ta por meio de mecanismos introjetivos. Usan-
do sua capacidade de avaliar a realidade, sua
capacidade de introspecção, sua percepção mais
realista das potencialidades e limites do pacien-
te (tanto atuais como futuros) e sua capacidade
de analisar os problemas e visualizar alternati-
vas, temporariamente (e, eventualmente, por lon-
gos períodos), o terapeuta assume as funções de
um ego auxiliar do paciente.
Nesse contexto, ocorrem ainda novas apren-
dizagens sob a forma de estímulos (reforços)
para comportamentos desejáveis ou adaptati-
vos, além da correção de pensamentos e cren-
ças distorcidas ou erradas que o paciente tem
sobre si mesmo. É inevitável que, em um con-
vívio de longa duração com uma pessoa esti-
mada e admirada, o paciente se identifique e
acabe internalizando muitos aspectos da per-
sonalidade do terapeuta ou simplesmente ten-
da a imitá-lo em outros tantos (aprendizagem
social por imitação).
Técnica
A prática da terapia de apoio pode ser, even-
tualmente, mais difícil do que a prática da tera-
pia voltada para o insight, pois ela envolve um
julgamento criterioso, por parte do terapeuta,
das potencialidades e das vulnerabilidades do
paciente. Há o risco de o terapeuta subestimar
as potencialidades do paciente e manter uma
relação de excessiva dependência, impedindo
ou retardando o processo de separação/indivi-
duação, o funcionamento autônomo e o desen-
volvimento de uma identidade própria por par-
te do paciente. Por outro lado, a superestimação
das potencialidades pode expô-lo a riscos de
desequilíbrios que podem resultar em regres-
sões ou retrocessos.
Como regra, o terapeuta adota uma postura
ativa e se apresenta de forma mais real e dispo-
nível do que na terapia de orientação analítica:
responde questões, faz aconselhamentos, dá su-
gestões, faz reasseguramentos e educa o pacien-
te. O estilo é mais conversacional, focado nos
problemas. São utilizadas diferentes interven-
ções: psicoeducação, sugestão, clarificação,
aconselhamento, técnicas de autocontrole e de
resolução de problemas, treino de habilidades,
além de técnicas cognitivas e comportamentais
como a exposição gradual, os reforços, a corre-
ção de pensamentos e crenças disfuncionais, o
estabelecimento de limites e o manejo ambiental.
O estabelecimento de um bom vínculo e uma
boa aliança de trabalho com o terapeuta, junta-
mente com a manutenção de uma transferência
positiva, são elementos cruciais na terapia de
apoio. A transferência raramente é interpretada,
a não ser que ela implique resistência e dificul-
dades para o prosseguimento da terapia. Even-
tualmente, são aceitas manifestações transfe-
renciais que envolvem algum grau de idealização
e dependência, sem procurar modificá-las pela
interpretação. Não é utilizada a livre associação.
A terapia é focal, centrada nos problemas, no
relato e na discussão das tarefas programadas
para os intervalos das sessões, assim como no
exame das eventuais dificuldades do paciente.
Os objetivos são o fortalecimento das defesas
(adaptativas), e não a sua remoção, e a regulação
dos afetos, procurando provocar o mínimo de
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
Psicoterapias 29
regressão. O foco é, portanto, no aqui e agora e
nos acontecimentos da vida atual.
A freqüência das sessões varia desde sessões
mensais e quinzenais até sessões diárias. O tem-
po de duração do tratamento varia de dias a
semanas, podendo, eventualmente, estender-se
por muitos anos. É comum o eventual envolvi-
mento de outros membros da família, particu-
larmente no caso de pacientes gravemente com-
prometidos. Também é muito comum a associa-
ção de medicamentos, especialmente em por-
tadores de transtornos psiquiátricos graves (psi-
coses, transtorno bipolar).
Psicoterapias de apoio de longa duração não
devem ser propostas para pacientes com boas
condições de ego, capazes de se beneficiar com
algumas das terapias dinâmicas de insight, mais
efetivas, e para os quais uma terapia de apoio
implicaria regressões desnecessárias.
Indicações da terapia de apoio
de longo prazo
• Déficits crônicos de ego e com o funciona-
mento comprometido
• Teste de realidade comprometido (psicoses,
transtorno bipolar, retardo mental)
• Controle dos impulsos deficiente (transtor-
nos de personalidade borderline, problemas
cerebrais orgânicos, TDAH)
• Relações interpessoais pobres
• Dificuldades para experimentar e controlar
os afetos (ansiedade, raiva)
• Dificuldades para sublimar
• Pouca capacidade para introspecção (retar-
do mental)
• Pouca capacidade de verbalizar pensamen-
tos e sentimentos
• Problemas físicos crônicos e incapacitantes
(Ursano; Silberman, 2003)
Indicações das intervenções em crise
ou psicoterapias breves de apoio
• Pacientes psiquiatricamente saudáveis, bem
adaptados, com bom suporte social e com
boas relações interpessoais
• Pacientes com predomínio de defesas mais
maduras e flexíveis, com teste de realidade
preservado e com boas expectativas em re-
lação ao futuro
• Pacientes capazes de utilizar os recursos de
que dispõem
• Pacientes momentaneamente atravessando si-
tuações de crise, trauma ou desastre natural
• Pacientes que, em resposta à crise, funcio-
nam abaixo de sua capacidade
Terapia interpessoal
A terapia interpessoal (TIP) é uma psicote-
rapia de tempo limitado desenvolvida por
Gerald Klerman e Myrna Weissmann, na dé-
cada de 1970, para o tratamento da depressão.
Esses autores tiveram sua atenção despertada
para o fato de que a maioria das depressões
ocorria em mulheres e que, além dos fatores de
ordem biológica, deveriam interferir os de or-
dem interpessoal, que complicavam o curso e
a recuperação. Suas origens situam-se no
enfoque interpessoal e psicossocial de Adolf
Meyer e Harry Stack Sullivan, que valorizavam
a relação do paciente com o grupo social e com
as pessoas mais próximas como determinantes
dos problemas mentais,contrastando com o
enfoque intrapsíquico e com a valorização de
experiências do passado da psicanálise. Fun-
damenta-se, ainda, na teoria do apego, de John
Bowlby (Klerman et al., 1984; Weissman et al.,
1994; Weissman; Markovitz; Klerman, 2000;
Blanco; Weissman, 2005).
Fundamentos teóricos
A idéia subjacente à TIP é muito simples:
os transtornos psiquiátricos, embora multideter-
minados em suas causas, sempre surgem em
um contexto social ou interpessoal: mudanças
em alguma relação interpessoal importante (di-
vórcio, separação, início de um novo relacio-
namento), mudanças em papéis sociais (novo
cargo, casamento, nascimento de um filho), per-
da de uma pessoa muito próxima por morte
(luto), isolamento social. De fato, há evidências
muito fortes de que as pessoas ficam deprimi-
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
30 Cordioli e cols.
das quando passam por situações de luto com-
plicado, situações de conflitos interpessoais ou
mudanças de vida. Os sintomas podem ocor-
rer particularmente quando há mudanças de
papéis, na ausência de apoio social.
Técnica
O objetivo da TIP é obter alívio dos sinto-
mas, abordando os problemas interpessoais que
possam estar contribuindo para a origem ou
manutenção destes. A TIP tenta intervir na in-
fluência dos sintomas no ajustamento social e
nas relações interpessoais, focando os proble-
mas atuais conscientes e pré-conscientes. Tipi-
camente, esses problemas envolvem conflitos
com pessoas significativas do presente ou com
familiares, frustrações, ansiedades ou desejos ex-
perimentados nas relações interpessoais. A ên-
fase é conseguir que o paciente faça mudanças
e não apenas compreenda e aceite as suas atu-
ais condições de vida. Embora a TIP reconhe-
ça a importância do inconsciente, ele não é
abordado na terapia. A influência de experiên-
cias passadas, particularmente daquelas ocor-
ridas na infância, é reconhecida, mas o enfoque
é no aqui e agora, não sendo feitas tentativas
de ligar as experiências atuais com as do passa-
do. A depressão é vista como uma doença mé-
dica, com os fatores etiológicos sendo levados
em conta, inclusive os de natureza biológica, e
a ênfase é no tratamento dos sintomas e na
melhoria das condições sociais (Blanco; Weiss-
man, 2005). Muitas vezes, a terapia é realizada
em associação com psicofármacos.
FOCO DA TERAPIA INTERPESSOAL
• Perdas complicadas (luto)
• Transições de papéis ou mudanças de vida
(p. ex., casamento, formatura, aposentadoria,
diagnóstico de uma doença médica incapa-
citante, perda de status)
• Disputas por papéis ou conflitos interpes-
soais (conflitos conjugais)
• Déficits interpessoais (isolamento, falta de
apoio social)
Na avaliação do paciente, é feito um levan-
tamento dos sintomas e é estabelecido o diag-
nóstico do transtorno. Na depressão, por exem-
plo, são identificados problemas interpessoais
e sua possível relação com o quadro depressivo.
A seguir, são explicados o enfoque interpessoal
e os procedimentos da terapia (foco nos pro-
blemas interpessoais como forma de vencer a
depressão). É feito o contrato psicoterápico en-
volvendo a estrutura e a duração do tratamen-
to. Na fase final, são consolidados os ganhos,
estimulada a independência e abordados os ris-
cos de recaídas. Uma terapia de manutenção é
proposta, se necessária (Blanco; Weissman,
2005; Markowitz, 2003).
A TIP é uma terapia breve focal, de tempo
limitado, de 12 a 20 sessões, sendo o paciente
estimulado a identificar as emoções (raiva, frus-
tração) sentidas em suas relações e a expressá-
las no contexto social. São também trabalha-
das as dificuldades de comunicação (p. ex.,
entre o casal). São abordadas as dificuldades
nas relações interpessoais atuais, e não as
intrapsíquicas ou do passado. Embora o tera-
peuta dê atenção a pensamentos distorcidos,
isso não é feito de uma forma sistemática, como
na terapia cognitiva.
O terapeuta é ativo e, às vezes, diretivo.
Utiliza um conjunto de técnicas cognitivas,
comportamentais, psicoeducacionais, de apoio
e psicodinâmicas. Usa a clarificação, o role-
playing, estimula a expressão de emoções, acon-
selha, sugere e levanta alternativas para as in-
terpretações do paciente sobre o que acontece
nas interações sociais. O objetivo é mudar pa-
drões de relações interpessoais e dar menor
ênfase à mudança de cognições. Não são utili-
zadas interpretações transferenciais, e o objeti-
vo maior é o alívio dos sintomas.
As sessões são semanais, e o foco é no pre-
sente, nas dificuldades atuais que aparecem no
contexto social e nas disfunções sociais decor-
rentes da depressão. Se o problema é um luto
complicado, o terapeuta estimula o paciente a
enfrentar o luto e a reassumir suas atividades.
Se o problema são disputas de papéis (com o
cônjuge ou com outras pessoas significativas),
o terapeuta procura explorar a natureza do con-
flito e auxilia na busca de alternativas. Em ques-
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
Psicoterapias 31
tões que envolvem transições de papéis, como
início ou fim de carreira, promoção, aposenta-
doria, término de uma relação ou diagnóstico
de uma doença grave, o paciente é auxiliado a
enfrentar as mudanças e a perceber seus aspec-
tos positivos e negativos. Quando os proble-
mas são déficits em habilidades sociais, podem
ser utilizadas técnicas comportamentais e de
apoio (treino de assertividade, role-playing) ou
sugestão de busca de recursos existentes na
comunidade (Weissman; Markovitz, 1994).
Evidências de eficácia
e indicações
A eficácia da TIP foi bem estabelecida no
tratamento da depressão maior (Di Mascio et
al., 1979; Weissman et al., 1979). Um estudo
posterior verificou que a TIP era tão efetiva
quanto medicamentos em casos de depressão
leve, mas não de depressão grave (Klein; Ross,
1993). Também foi observado um efeito mo-
desto na prevenção de recaídas, menor do que
o da imipramina (Frank et al., 1990). A terapia
interpessoal está sendo testada em adolescen-
tes e pacientes geriátricos com depressão, em
HIV-positivos com depressão, na distimia e
como coadjuvante no tratamento do transtor-
no bipolar, sendo, neste caso, chamada de te-
rapia interpessoal e de ritmo social. Adaptações
da TIP estão sendo feitas, ainda, para tratamen-
to de pacientes com ansiedade social, estresse
pós-traumático, bulimia e fobia social, mas seu
papel nesses transtornos não está bem estabe-
lecido (Markowitz, 2003).
Indicações da terapia interpessoal
Evidências consistentes
• Depressão maior
• Profilaxia de depressão maior recorrente
• Depressão em pacientes geriátricos e ado-
lescentes
• Depressão em pacientes HIV-positivos
• Terapia conjunta (de casal) em mulheres
depressivas
• Depressão pré e pós-parto
(Markowitz, 2003)
Evidências incompletas
• Como coadjuvante no tratamento do trans-
torno bipolar
• Bulimia
• Fobia social, pânico e estresse pós-traumá-
tico
• Distimia (Markowitz, 2003)
É necessário que os pacientes tenham uma
boa capacidade de introspecção, algum grau de
sofisticação psicológica e motivação para exa-
minar padrões de relacionamento, bem como
que consigam estabelecer um bom vínculo com
o terapeuta. A TIP não é recomendada em pa-
cientes com depressão psicótica ou quando não
são identificados padrões disfuncionais de re-
lações interpessoais.
Terapia comportamental
Fundamentos teóricos
A terapia comportamental (TC) baseia-se nas
teorias e nos princípios da aprendizagem para
explicar o surgimento, a manutenção e a elimi-
nação dos sintomas. Dentre esses princípios,
destacam-se o condicionamento clássico
(Pavlov), o condicionamento operante (Skinner),
a aprendizagem social (Bandura) e a habituação.
De acordo com o condicionamento clássi-
co, estímulos neutros (uma sineta) repetitiva-
mente pareados com um estímulo incondicio-
nado (comida) acabam provocando a mesma
resposta obtida pelo estímulo incondicionado:
a sineta passa a produzir salivação, tornando-
se um estímulo condicionado, e a salivação, ao
toque da sineta, uma resposta condicionada.
Acredita-se que esse fenômeno possa explicar
o surgimento de sintomas como as reaçõesde
medo a estímulos neutros nas fobias específi-
cas, a agorafobia em pacientes com pânico, par-
ticularmente, as revivescências, os sintomas
fóbicos e sua generalização no estresse pós-trau-
mático, a “fissura” em drogaditos, entre outros.
No condicionamento operante, os efeitos de
um comportamento podem determinar o au-
mento ou a diminuição de sua freqüência.
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
32 Cordioli e cols.
Como exemplo, a esquiva fóbica alivia sinto-
mas de ansiedade, e acredita-se que, por esse
motivo, seja adotada sistematicamente. Even-
tualmente, os sintomas de ansiedade podem ter
seu início por um condicionamento clássico (fo-
bias, estresse pós-traumático), sendo posterior-
mente mantidos por um condicionamento
operante (esquiva fóbica). Essa é a teoria dos
dois estágios, dos irmãos Mowrer, proposta
como uma teoria mais geral para a ansiedade.
Na aprendizagem social, o comportamento
pode ser adquirido pela simples observação de
outros indivíduos (uso de drogas, perder certos
medos). A habituação é um fenômeno natural
que ocorre em praticamente todos os seres vi-
vos (insetos, moluscos, animais, homem) em
razão do qual as reações de ansiedade ou des-
conforto diminuem com o passar do tempo se
o indivíduo permanece em contato com o estí-
mulo (não nocivo) que as provoca. A neurofisio-
logia da habituação foi bem estabelecida por
Kandel em seus estudos com o molusco Aplysia
califórnica. A exposição é a principal estratégia
psicoterápica utilizada pela terapia comporta-
mental e a sua principal contribuição para o
tratamento dos transtornos mentais. O fenôme-
no da habituação, bem como a extinção, cons-
tituem a base teórica e empírica para explicar
o desaparecimento dos sintomas.
Os primeiros comportamentalistas eram
partidários do chamado behaviorismo radical.
Watson, Skinner e Wolpe foram alguns dos seus
representantes. A eles interessava apenas o
comportamento observável, incluindo nesse
conceito a atividade muscular voluntária, a ati-
vidade verbal e as alterações fisiológicas. Mais
recentemente, a escola comportamental passou
a se interessar pelos processos cognitivos, acei-
tando que eles possam influenciar o compor-
tamento. Bandura foi um autor importante nes-
sa transição, ao propor que crenças de auto-
eficácia eram cruciais para o indivíduo iniciar
ou não um comportamento. A tendência atual
é a de integrar a terapia comportamental com
a cognitiva, e o termo “terapia cognitivo-
comportamental” vem sendo cada vez mais em-
pregado para designar uma modalidade de te-
rapia que utiliza esses dois tipos de abordagens.
Por razões didáticas, vamos apresentar separa-
damente os dois enfoques.
Técnica
A terapia comportamental preocupa-se ini-
cialmente em realizar uma avaliação detalhada
dos problemas do paciente: quais os sintomas,
as condições que determinam o seu aparecimen-
to, seus antecedentes e suas conseqüências, bem
como eventuais desencadeantes. São avaliadas,
ainda, as situações nas quais se manifestam os
fatores que auxiliam a mantê-los (atitudes re-
forçadoras do ambiente familiar), as cognições
(pensamentos automáticos) que os acompanham
e os mecanismos desenvolvidos pelo paciente
para diminuir a ansiedade (p. ex., esquiva fóbica
e realização de rituais). É a chamada análise
comportamental. A partir da identificação dos
sintomas, é proposto o tratamento, que é enten-
dido como uma nova aprendizagem.
A terapia comportamental utiliza uma varie-
dade de técnicas:
• Exposição: também chamada de práti-
ca programada, pode ser in vivo ou na
imaginação. Pode ser gradual ou instan-
tânea (inundação), assistida pelo terapeu-
ta ou em grupo. Tem sido utilizada a ex-
posição virtual quando a exposição in
vivo é difícil ou impossível
• Prevenção de respostas: abster-se de re-
alizar rituais (verificações, lavação das
mãos)
• Modelação: demonstração de um com-
portamento desejável pelo terapeuta
• Reforço positivo: tornar um evento agra-
dável contingente a um comportamento
desejável (dar atenção, elogiar, premiar,
etc.)
• Reforço negativo: remoção de algo de-
sagradável como forma de estimular o
comportamento desejável (p. ex., remo-
ção da sonda nasogástrica em anoréxicas
ou imobilização em pacientes agitados)
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
Psicoterapias 33
• Extinção: a remoção de reforços positi-
vos pode levar ao enfraquecimento e de-
saparecimento de um comportamento
• Terapia aversiva: pareamento de um es-
tímulo aversivo com um comportamen-
to indesejável (dissulfiram e álcool)
• Relaxamento muscular e treino da res-
piração
• Biofeedback
• Reversão de hábitos
• Treino de habilidades sociais
A TC exige do paciente alta motivação para
aderir ao tratamento, boa capacidade de tole-
rar o aumento da ansiedade e o desconforto
inerentes ao fato de se expor a situações provo-
cadoras de ansiedade e boa aliança de traba-
lho para levar adiante as tarefas estabelecidas
em comum acordo com o terapeuta.
Evidências de eficácia
e indicações
A eficácia da terapia comportamental está
bem estabelecida no tratamento de:
• Fobias específicas
• Agorafobia com ou sem pânico
• Ansiedade ou fobia social
• Transtorno obsessivo-compulsivo (espe-
cialmente os rituais)
• Transtornos alimentares e compulsão ali-
mentar periódica
• Disfunções sexuais: em especial ejacula-
ção precoce e vaginismo
• Dependência de drogas (alcoolismo, taba-
gismo e demais drogas de abuso)
(Berkowitz, 2003)
A terapia comportamental é utilizada como
coadjuvante no tratamento de:
• Depressão maior, particularmente na fase
inicial de pacientes gravemente deprimidos
• Transtorno de déficit de atenção e hiperati-
vidade
• Estresse pós-traumático
• Transtornos de impulsos (tricotilomania, com-
prar compulsivo, jogo patológico)
• Déficits em habilidades sociais (transtornos
da personalidade, esquizofrenia, deficiência
mental, autismo)
• Deficiências de controle esfincteriano
• Obesidade, hipertensão, insônia, asma, dor
crônica, cefaléia, câncer, insônia primária, etc.
Contra-indicações da terapia
comportamental
• Níveis de ansiedade muito elevados ou in-
capacidade de tolerar aumento dos níveis de
ansiedade (transtornos da personalidade
bordeline, histriônica)
• Problemas caracterológicos graves, incapa-
cidade de estabelecer um vínculo com o te-
rapeuta (personalidade esquizóide ou es-
quizotípica)
• Incapacidade de estabelecer um relaciona-
mento honesto com o terapeuta (personali-
dade anti-social)
• Ausência de motivação
Terapia cognitiva
A terapia cognitiva foi proposta inicialmen-
te por Aaron T. Beck, no início da década de
1960, para tratamento da depressão. Beck teve
sua atenção despertada pela visão negativa que
os pacientes deprimidos tinham de si mesmos,
do mundo à sua volta e do seu futuro (tríade de
Beck). Ele sugeriu que essa visão negativa era
responsável pelos sintomas depressivos e pro-
pôs o uso de estratégias para corrigir tais distor-
ções que se revelaram efetivas no tratamento
dos quadros depressivos. Posteriormente, a te-
rapia cognitiva foi estendida, com as devidas
adaptações, para o tratamento de transtornos
de ansiedade, transtornos alimentares, transtor-
nos da personalidade, dependência química,
entre outros. Seu foco de atenção é a atividade
mental consciente ou pré-consciente (pensa-
mentos automáticos, crenças subjacentes e suas
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34 Cordioli e cols.
conseqüências: emoções, comportamentos ou
reações físicas).
Teoria
A terapia cognitiva tem fortes ligações com
várias escolas filosóficas, como o estoicismo
grego, o racionalismo, o empirismo e a fenome-
nologia, e com as escolas orientais de pensa-
mento, como o budismo e o taoísmo. Sua pre-
missa básica é a de que a maneira como as pes-
soas interpretam suas experiências determina
como elas se sentem e se comportam. A afir-
mativa do filósofo estóico Epictetus (60-117
d.C.), de que “os homens se perturbam não
pelas coisas, mas pela visão que têm delas”,
expressa a idéia central do modelo cognitivo.
Fundamenta-se nas teorias do processamentopatológico das informações. De acordo com o
modelo, existem erros (de lógica) no processa-
mento da informação sob a forma de pensamen-
tos disfuncionais e distorções cognitivas típicas: na
depressão, nos transtornos de ansiedade, nos
transtornos de personalidade, nos transtornos
alimentares, entre outros. Na depressão, há uma
visão negativa de si mesmo, da realidade à sua
volta e do seu futuro (tríade de Beck); na ma-
nia, uma visão exageradamente otimista de si
mesmo, da realidade e do futuro; no pânico e
nas fobias, antecipações e interpretações catas-
tróficas; no transtorno obsessivo-compulsivo,
avaliação irreal do risco e da responsabilidade.
Há ainda esquemas disfuncionais nos transtornos
de personalidade, nas relações conjugais e fa-
miliares. Essas distorções cognitivas, associadas
a erros de lógica, como avaliações e interpreta-
ções distorcidas, provocam alterações no hu-
mor, reações físicas e comportamento desa-
daptativo, que acabam criando e perpetuando
um círculo vicioso.
O modelo não sugere que a patologia
cognitiva seja a única causa de síndromes espe-
cíficas, assumindo que, na maioria das vezes,
fatores como predisposição genética, alterações
bioquímicas ou conflitos interpessoais estão
envolvidos e que a patologia cognitiva contri-
bui para agravar ou perpetuar um determina-
do transtorno. Por exemplo, no transtorno do
pânico, um transtorno para o qual concorrem
fatores biológicos, as interpretações distorcidas
ou erradas dos sintomas físicos contribuem para
o agravamento do quadro e podem até desen-
cadear novos ataques (Wright; Beck; Thase,
2003).
Dentre as distorções cognitivas, destacam-se a
inferência arbitrária (concluir o contrário do que
apontam as evidências ou sem o necessário su-
porte de evidências), a abstração seletiva ou fil-
tro mental (concluir baseando-se apenas em
uma pequena parte dos dados), a magnificação
e a minimização (avaliar distorcidamente a im-
portância relativa dos eventos, de um atributo
pessoal ou de uma possibilidade futura), a
personalização (relacionar eventos externos à
própria pessoa quando não há base suficiente
para tanto), o pensamento dicotômico ou ab-
solutista (classificar as pessoas ou a si mesmo
em categorias rígidas e estanques: bom ou mau,
tudo ou nada, preto ou branco) e o pensamen-
to catastrófico (prever o pior desfecho possí-
vel, ignorando as alternativas).
Dentre os autores responsáveis pelo seu de-
senvolvimento destacam-se Beck, Ellis, Maho-
ney, Lazarus, Freeman, entre outros.
Técnica
A terapia cognitiva geralmente é breve, com
duração entre 10 e 20 sessões. Em algumas si-
tuações, como no tratamento de transtornos de
personalidade, pode ser estendida por mais
tempo. A terapia é uma descoberta guiada por
um trabalho colaborativo entre paciente e te-
rapeuta (empiricismo colaborativo). A função
do terapeuta é auxiliar o paciente a usar seus
próprios recursos para identificar erros de lógi-
ca, pensamentos e crenças distorcidos e poste-
riormente corrigi-los por meio do exame das
evidências e da geração de pensamentos alter-
nativos.
No início da terapia, o paciente é treinado
para identificar e registrar seus pensamentos
automáticos e suas crenças subjacentes para, em
um segundo momento, utilizar diversas inter-
venções destinadas a corrigi-los mediante o exa-
me de evidências feito por técnicas como o
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Psicoterapias 35
questionamento socrático, a “descatrastrofiza-
ção”, o exame das vantagens e desvantagens, a
reatribuição ou ressignificação, a geração de
pensamentos alternativos, entre outras. A tera-
pia cognitiva também utiliza técnicas tipicamen-
te comportamentais, como exposição, preven-
ção de rituais, modelação, role-playing, treino
de assertividade, técnicas de relaxamento mus-
cular e controle respiratório, planilhas de ativi-
dades e ensaio de comportamentos. Por esse
motivo, a tendência atual é denominá-la tera-
pia cognitivo-comportamental (TCC).
As sessões da terapia cognitiva são estrutura-
das e seguem quase invariavelmente uma mes-
ma seqüência: revisão do humor ou dos sinto-
mas no início da sessão, ponte para a sessão
anterior, agenda, discussão dos tópicos da agen-
da, revisão dos temas para casa, pequenas
sumarizações sobre cada tópico da agenda, nas
quais o terapeuta sublinha os aspectos mais im-
portantes, pequenos resumos da sessão quan-
do um tópico se estende, tarefas para casa e, no
final, avaliação da sessão por parte do pacien-
te. São comuns o uso de registros de pensamen-
tos disfuncionais e a avaliação constante do
curso da terapia mediante a aplicação de esca-
las ou folhas de automonitoramento. A TCC
utiliza ainda a psicoeducação, com explanações
sobre os mecanismos que perpetuam a doen-
ça, e estimula a leitura e a busca do conheci-
mento sobre o transtorno do qual o paciente é
portador. Comenta-se que o terapeuta cogniti-
vo substituiu o divã do psicanalista pelo qua-
dro negro do professor. É comum, na sessão, o
uso de caneta e papel, desenhos, figuras e es-
quemas como forma de ilustrar o modelo cog-
nitivo e a inter-relação entre os diferentes ele-
mentos cognitivos e comportamentais: situação
ativadora, pensamentos disfuncionais e conse-
qüências (humor, comportamento, reações fí-
sicas – modelo ABC).
É indispensável uma boa relação terapêuti-
ca, na qual o terapeuta seja ativo e o paciente
seja um colaborador. Mais do que formular ex-
plicações, o terapeuta permanentemente esti-
mula o paciente a questionar-se pelas evidências
nas quais apóia seus pensamentos e crenças
distorcidas, auxiliando-o a mudar sua forma de
pensar. As reações transferenciais não são o foco
da terapia. São abordadas apenas para identifi-
car esquemas disfuncionais e é comum que
ocorram quando a terapia se estende por mais
tempo, como no tratamento dos transtornos de
personalidade.
A experiência clínica sugere que pacientes
que não tenham problemas caracterológicos
graves (personalidade anti-social ou borderline),
que, no passado, tenham tido vínculos afetivos
fortes e de confiança com pessoas significati-
vas, que são curiosos e inquisitivos sobre si
mesmos, com uma boa capacidade de intros-
pecção (boa capacidade de identificar pensa-
mentos disfuncionais e comunicá-los), com
disfunções cognitivas claramente identificadas,
são os pacientes ideais para a terapia cognitiva.
Também é de grande ajuda ter uma inteligên-
cia média ou acima da média. Em pacientes
que não apresentam essas características, a te-
rapia cognitiva pode ser flexibilizada, adaptan-
do-se ao nível social e cultural e à linguagem
do paciente.
Evidências de eficácia
e indicações
A eficácia da terapia cognitiva está sendo
testada no tratamento de vários transtornos,
geralmente em conjunto com outras estratégi-
as de tratamento, e está bem estabelecida nos
seguintes transtornos:
• Depressão unipolar de intensidade leve
ou moderada, não-psicótica
• Transtornos de ansiedade (associados à
terapia comportamental e a drogas)
• Transtornos alimentares
• Transtornos somatoformes (hipocondria,
transtorno dismórfico corporal)
Indicações da terapia cognitiva
como tratamento coadjuvante
• Abuso de substâncias e de álcool
• Transtornos de personalidade
• Transtornos psicóticos (esquizofrenia, trans-
torno delirante)
• Transtorno bipolar
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36 Cordioli e cols.
• Transtorno de déficit de atenção com hipera-
tividade
• Dor crônica
A terapia cognitiva, em princípio,
é contra-indicada para pacientes com:
• Doença mental orgânica, que implique com-
prometimento cognitivo (demência)
• Retardo mental
• Pouca capacidade para trabalhar introspec-
tivamente (identificar pensamentos, emo-
ções, crenças, e expressá-los em palavras)
• Psicose aguda
• Patologia grave do caráter borderline ou
anti-social
• Ausência de motivação
Terapia familiar e de casal
Fundamentos teóricos
A terapia familiar originou-se da insatisfa-
ção de muitos clínicos com a evolução muito
lenta de pacientes quando tratados individual-
mente ou frustrados com o fato de que,muitas
vezes, tais progressos eram neutralizados por
outros membros da família. A partir dessas
constatações, passaram a considerar não ape-
nas o indivíduo, mas a família, como o foco
para compreender o surgimento e a manuten-
ção da psicopatologia. Nesse novo marco
conceitual, a atenção é voltada para o contexto
familiar no qual um problema individual ocor-
re, para as conseqüências desse problema so-
bre os demais indivíduos, e para a maneira pela
qual cada membro influencia os demais e é por
eles influenciado. Os problemas psicopatológi-
cos individuais devem ser entendidos no con-
texto familiar, que pode reforçá-los, criando ver-
dadeiros círculos viciosos, ou pelo fato de o
referido contexto ter um papel importante na
sua solução.
O terapeuta de família dá atenção à estrutu-
ra familiar (como ela se constitui, se organiza e
se mantém) e aos seus processos (como ela se
adapta e evolui ao longo do tempo) simultane-
amente. É um sistema vivo em evolução, orga-
nizado de forma complexa e durável, cujo todo
é mais do que a simples soma de suas partes.
A terapia de família tem seus fundamentos
na teoria geral dos sistemas, do biólogo alemão
Bertallanffy, na teoria da comunicação, dos
pequenos grupos, na teoria psicodinâmica (re-
lações de objeto) e na teoria cognitivo-compor-
tamental, entre outras. Bowen introduziu con-
ceitos da teoria dos sistemas em seu trabalho
com famílias. Por sistema compreende-se um
conjunto de elementos, direta ou indiretamen-
te relacionados, que funcionam como uma uni-
dade em um determinado ambiente. Dentro
desse enfoque, uma família pode ser conside-
rada um sistema parcialmente aberto que
interage com seus ambientes biológico e
sociocultural (Bloch; Harari, 2005).
Diversos enfoques teóricos embasam a te-
rapia de família. Ackerman foi quem cunhou
o termo terapia familiar, na década de 1950, e
introduziu a idéia de trabalhar com a família
nuclear, utilizando métodos psicodinâmicos.
O enfoque desse autor era predominantemente
psicodinâmico, com ênfase nos mecanismos de
defesa grupais (projeção, identificação proje-
tiva, dissociação) e nos conceitos da teoria das
relações de objeto. O objetivo era a obtenção
de insight, ou a abordagem dos conflitos trans-
generacionais (Bowen): diferenciação, trian-
gulação, rupturas; ou experiencial (Satir,
Whitaker), com a proposição de envolver duas
ou mais gerações na terapia. Ao longo do tem-
po, diversos outros enfoques foram sendo pro-
postos: estrutural/sistêmico (Minuchin), a partir
do estudo de jovens delinqüentes provenien-
tes de famílias hierarquicamente desorganiza-
das e com problemas de limites generacionais
entre os vários subsistemas; estratégico (Haley,
Ackerman), para os problemas decorrentes de
arranjos hierárquicos e papéis, bem como as
reações em suas mudanças; comportamental
(Patterson, Margolin), para problemas que po-
dem ser mantidos ou estimulados pelas atitu-
des da família, em padrões de relações simé-
tricas ou complementares e nas disfunções de
comunicação (Bateson); psicoeducacional (Ander-
son, Goldstein), informativo, envolvendo o
manejo de doenças crônicas, redução do es-
tresse e manejo de crises. Mais recentemente,
Cordioli Cap-01.p65 24/9/2007, 15:01
Psicoterapias 37
ce, vaginismo, dispareunia, disfunção or-
gástica feminina, perda do interesse sexual)
• Dificuldades na intimidade, envolvendo co-
municação de afetos e sentimentos, compa-
nheirismo, planejamento da vida em comum,
troca de papéis
Contra-indicações da
terapia familiar e de casal
• A família nega que estejam ocorrendo pro-
blemas familiares
• Um dos membros da família é muito paranói-
de, psicótico, agressivo ou agitado
• Em situações nas quais membros importan-
tes da família não poderão estar presentes
(doença física ou mental, falta de motivação,
etc.)
• Tendência irreversível à ruptura familiar (di-
vórcio, separação)
• Crenças religiosas ou culturais muito fortes
impedem intervenções externas na família
• A intervenção familiar não teria qualquer
efeito no atual problema
• O equilíbrio familiar é tão precário que a tera-
pia familiar pode provocar a descompensação
de um ou mais membros (confrontar um adul-
to que abusou sexualmente de uma criança
com sua vítima)
• Os problemas conjugais são egossintônicos
• Quando a individuação de um ou mais mem-
bros ficaria comprometida caso a terapia
fosse levada adiante, ou exige tratamento se-
parado
• Existem problemas individuais que necessi-
tam, previamente, de outros tratamentos
(desintoxicação)
• Quando a terapia familiar é usada para en-
cobrir responsabilidades individuais
• Em situações nas quais um ou ambos os côn-
juges não podem ser honestos, mentem, têm
segredos (infidelidade, homossexualidade,
desonestidade nos negócios) que, se reve-
lados, determinariam imediata ruptura da
família
• Quando um dos cônjuges tem transtorno gra-
ve de caráter, especialmente em caso de con-
duta anti-social ou desvio sexual (Fields;
Morrison; Beels, 2003)
tem sido, ainda, proposta a terapia familiar
com enfoque cognitivo-comportamental (Bloch;
Harari, 2005).
As sessões são semanais, com todos ou com
parte dos membros presentes, podendo, poste-
riormente, passarem a ser quinzenais ou até
mensais (subsistema). Têm por objetivos gerais
melhorar a comunicação entre os membros da
família, desenvolver a autonomia e a individua-
lização dos diferentes indivíduos, descentrali-
zar e tornar mais flexíveis os padrões de lide-
rança e de tomada de decisões, reduzir os con-
flitos interpessoais e os sintomas, além de me-
lhorar o desempenho individual.
Da mesma forma que a terapia familiar, a
terapia de casal considera que existem possibi-
lidades e vantagens de se resolver os conflitos
que surgem na vida de um casal na abordagem
conjunta de forma mais rápida do que na abor-
dagem individual. Baseia-se na teoria psicodi-
nâmica (relações de objeto), na teoria da co-
municação e na teoria dos contratos conjugais.
Indicações da terapia familiar
• Quando é solicitada terapia de casal ou fa-
miliar
• Doença física ou mental grave em adultos,
gerando um alto grau de disfunção familiar
(esquizofrenia, transtorno bipolar, TOC,
transtorno do pânico com agorafobia, de-
pendência a drogas ou ao álcool, transtornos
alimentares, etc.)
• O problema atual envolve dois ou mais
membros da família
• A família enfrenta uma crise de transição
que pode levá-la à ruptura (mudanças de
papéis)
• Uma criança ou adolescente é o problema
presente (autismo, TDAH, abuso de drogas,
transtorno alimentar, obesidade, transtor-
nos de impulsos, depressão)
• Ruptura da harmonia familiar em razão de con-
flitos interpessoais (Fields; Morrison; Beels,
2003)
Indicações da terapia de casal
• Insatisfação sexual ou um problema sexual
presente (disfunção erétil, ejaculação preco-
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38 Cordioli e cols.
Psicoterapia de grupo
As psicoterapias de grupo surgiram a partir
da necessidade de se estender a um número
maior de pessoas as possibilidades de atendi-
mento psicoterápico. Os primeiros grupos de
que se têm notícias foram os organizados por
Pratt, por volta de 1922, em que ele reunia de
20 a 30 pacientes portadores de turberculose
para os quais fazia palestras uma ou duas vezes
por semana. Entre outros, Addler, Bion, Foulkes
e Moreno se destacaram no estudo dos grupos.
Mas foi particularmente durante a Segunda
Grande Guerra, quando os problemas psiquiá-
tricos eram avassaladores e as equipes hospita-
lares eram limitadas, que o tratamento em gru-
po teve um grande desenvolvimento. Além das
vantagens de uma relação custo/benefício mais
favorável, a terapia em grupo faz uso de ingre-
dientes terapêuticos próprios, que inexistem na
terapia individual, os chamados fatores grupais
(Vinogradov; Cox; Yalom, 2003).
Fatores terapêuticos
na terapia de grupo
Yalom propôs um conjunto de 11 fatores,
que seriam os fatores terapêuticos na terapia
de grupo (Vinogradov; Cox; Yalom, 2003).
• Instilação da esperança. Ter esperan-
ça de melhorar é crucial para qualquer
terapia.Perceber a melhora de outras
pessoas que têm os mesmos problemas
faz com que os pacientes acreditem que
também são capazes de vencer suas difi-
culdades.
• A universalidade do problema. Per-
ceber outras pessoas com o mesmo pro-
blema diminui o isolamento, a vergonha
e o estigma associados aos sintomas de
muitos transtornos mentais.
• Compartilhamento de informações.
Ocorre sempre que o terapeuta dá in-
formações, ou quando há troca de infor-
mações entre os membros, em grupos de
problemas específicos (obesidade, trau-
ma, tabagistas, drogaditos, pacientes com
problemas médicos em comum).
• Altruísmo. O grupo estimula a possibi-
lidade de ajudar os outros, um desejo
inerente ao ser humano.
• Socialização. Desenvolvimento de ha-
bilidades sociais em decorrência do pró-
prio convívio em grupo (contato visual,
apertar as mãos, ouvir os outros).
• Comportamento imitativo. Pela sim-
ples observação do comportamento sau-
dável das outras pessoas.
• Catarse. Possibilidade de obtenção de alí-
vio pela ventilação de emoções. Está liga-
da à universalidade e à coesão.
• Recapitulação corretiva. Possibilida-
de de reviver e recapitular no grupo
padrões de comportamento semelhantes
aos que apresenta em seu grupo familiar
primário, ao interagir com os demais
membros do grupo, havendo a oportu-
nidade de corrigi-los (submissão, com-
petição, dependência).
• Fatores existenciais. A abordagem dos
grandes temas ou problemas existenciais
(doença, morte, luto, isolamento) auxilia
as pessoas a lidar com essas questões.
• Coesão grupal. O sentido de pertencer
a um grupo e ter afinidade com seus
membros facilita a aceitação dos demais
e dos aspectos inaceitáveis de si próprio,
além de possibilitar o estabelecimento de
relacionamentos mais profundos com os
outros.
• Aprendizagem interpessoal. Em gru-
pos de longa duração, o ambiente grupal
permite o surgimento da psicopatologia
individual, que, na interação com os de-
mais, pode ser identificada e corrigida.
Técnica
Os grupos podem distinguir-se quanto ao
setting: podem ser de pacientes internos ou ex-
ternos a uma clínica; podem, também, ter uma
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Psicoterapias 39
duração limitada ou serem abertos e permanen-
tes. Distinguem-se quanto aos objetivos, que po-
dem ser ambiciosos, como a modificação de as-
pectos do caráter, ou mais limitados, como o
treino de habilidades sociais, a manutenção do
funcionamento psicossocial ou a informação
sobre o uso de medicamentos (grupo de bipo-
lares). Podem ser especializados em doenças
médicas (diabéticos, colostomizados, paraplé-
gicos, vigilantes do peso, drogaditos, alcoólicos
anônimos) ou, ainda, ter um objetivo de curto
prazo, como parar de fumar. Os grupos variam
também quanto à orientação teórica. Na orien-
tação psicodinâmica, o objetivo é melhorar o
funcionamento do ego dos pacientes, sendo que
o terapeuta focaliza suas intervenções na análi-
se dos fenômenos transferenciais e na interpre-
tação das defesas e da resistência, que podem
ser grupais. Já os grupos de orientação cogniti-
vo-comportamental se voltam para o tratamen-
to de problemas ou transtornos definidos: fo-
bia social, transtorno do pânico, dor, transtor-
no obsessivo-compulsivo, fobias específicas, en-
tre outros.
A técnica utilizada nos grupos é muito vari-
ada e depende do setting, dos objetivos, da du-
ração, da forma como é feito o agrupamento,
de o grupo ser aberto ou fechado e da orienta-
ção teórica que é seguida. Os grupos de orien-
tação psicanalítica podem seguir distintos
enfoques: psicanálise no grupo, na qual o psi-
canalista trabalha de forma muito semelhante
à da psicanálise individual; psicanálise do gru-
po, na qual o grupo é visto como um todo e são
trabalhados os chamados supostos básicos de
Bion (dependência, luta, fuga e acasalamento);
psicanálise por meio do grupo, que enfoca as
comunicações inconscientes ou conscientes,
verbais ou não-verbais dos participantes; ou,
eventualmente, ter um enfoque mais eclético.
Como regra, o terapeuta utiliza-se de interpre-
tações destinadas a assinalar diferentes fenôme-
nos grupais: mecanismos de defesa individuais
ou grupais (identificações, projeções, dissocia-
ções, racionalizações, fantasias inconscientes,
manifestações transferenciais) e a forma como
são manejados impulsos amorosos ou agressi-
vos, com a finalidade de obtenção do insight
sobre os aspectos inconscientes como fator de
mudança. Ele procura também auxiliar os par-
ticipantes a compreender suas interações no
grupo, como repetições de padrões primitivos
de relacionamento familiar, e a mudar tais pa-
drões.
Grupos com enfoque cognitivo-comporta-
mental têm objetivos claros e são estruturados
à semelhança das sessões da terapia individual,
voltados para o tratamento de determinados
problemas ou sintomas ou para o manejo de
determinadas situações médicas. Em tais gru-
pos costuma haver a verificação inicial do hu-
mor ou dos sintomas, a revisão das tarefas de
casa, o uso da psicoeducação, de exercícios, de
tarefas para casa e do estímulo ao registro e ao
automonitoramento, além da aprendizagem so-
cial por meio da troca de experiências e de de-
poimentos. As sessões podem ser semanais,
quinzenais ou até mensais. No quadro a seguir,
há um sumário das indicações das terapias de
grupo.
Os grupos de auto-ajuda têm por objetivo
prestar ajuda psicológica a pacientes ou aos
familiares de pacientes que têm um problema
ou situação em comum e oferecer apoio mú-
tuo para superar sentimentos de angústia, de-
pressão e desadaptações provocadas pela do-
ença. O objetivo é a difusão de informações
sobre cuidados gerais e alternativas para lidar
com limitações ou complicações decorrentes
da doença ou situação, divulgando os recur-
sos existentes na comunidade. Utilizam psicoe-
ducação, técnicas comportamentais, cogni-
tivas, aconselhamento, sugestão, catarse, de-
poimento de outros pacientes ou familiares e,
sobretudo, os chamados fatores grupais.
Os candidatos à terapia de grupo devem ter
um bom nível de motivação para participar e
envolver-se emocionalmente, capacidade de se
revelar (ter uma história anterior de serem ca-
pazes de se envolver em grupos de forma posi-
tiva), capacidade de se solidarizar e empatizar
com os problemas de outras pessoas e capaci-
dade de se comprometer em comparecer regu-
larmente às sessões.
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40 Cordioli e cols.
Indicações das psicoterapias de grupo
Psicoterapias de grupo de orientação dinâmica
• Padrões de relacionamento interpessoal con-
siderados desadaptativos
• Aspectos do caráter desadaptativos
Psicoterapias cognitivo-comportamentais
• Ansiedade ou fobia social
• Transtorno obsessivo-compulsivo
• Ansiedade generalizada
• Insônia
• Transtorno do pânico, como terapia comple-
mentar
• Fobias específicas
• Estresse pós-traumático
• Dor crônica
• Síndrome do intestino irritável
Grupos de auto-ajuda
• Pacientes agudos internados em hospitais
psiquiátricos: na preparação da alta, no uso
de medicações psiquiátricas (manejo dos
efeitos colaterais, doses), no acompanha-
mento de egressos
• Em situações de crise ou estresse agudo (ví-
timas de desastres naturais) ou em eventos
vitais (luto, divórcio, aposentadoria, etc.)
• Manejo de condições médicas: diabete, obe-
sidade, hipertensão, tabagismo, transplante,
preparação para cirurgia cardíaca, pós-
infarto, colostomia, mastectomia, próteses,
uso de aparelhos médicos de reabilitação ou
outras amputações, transtornos alimentares,
etc.
• Condições psiquiátricas: controle do peso e
reeducação alimentar nos transtornos ali-
mentares, auxílio para cessar o tabagismo,
prevenção de recaídas em drogaditos, etc.
Contra-indicações da terapia de grupo
• Incompatibilidades com as normas do grupo
• Pacientes que não toleram o setting grupal
(fóbicos sociais)
• Incompatibilidade grave com um ou mais
membros do grupo
• Tendência a assumir um papel desviante dos
demais membros do grupo
• Ausência de controle de impulsos agressivos,
fortes tendências destrutivas e de expressar

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