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LEGISLAÇÃO E POLÍTICAS DE APOIO AO PSICOPEDAGOGO Belo Horizonte Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................ 05 1- LEGISLAÇÃO PARA EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA ................. 06 2- LEGISLAÇÃO DE APOIO PARA ATENDIMENTO DE CRIANÇAS COM DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM .......................................................... 29 REFERÊNCIAS CONSULTADAS E UTILIZADAS ......................................... 35 Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 INTRODUÇÃO Sejam bem-vindos ao curso de especialização, oferecido pelo Instituto Pedagógico de Minas Gerais – IPEMIG. Nos esforçamos para oferecer um material condizente com a graduação daqueles que se candidataram a esta especialização, procurando referências atualizadas, embora saibamos que os clássicos são indispensáveis ao curso. As ideias aqui expostas, como não poderiam deixar de ser, não são neutras, afinal, opiniões e bases intelectuais fundamentam o trabalho dos diversos institutos educacionais, mas deixamos claro que não há intenção de fazer apologia a esta ou aquela vertente, estamos cientes e primamos pelo conhecimento científico, testado e provado pelos pesquisadores. Não obstante, o curso tenha objetivos claros, positivos e específicos, nos colocamos abertos para críticas e para opiniões, pois temos consciência que nada está pronto e acabado e com certeza críticas e opiniões só irão acrescentar e melhorar nosso trabalho. Como os cursos baseados na Metodologia da Educação a Distância, vocês são livres para estudar da melhor forma que possam organizar-se, lembrando que: aprender sempre, refletir sobre a própria experiência se somam e que a educação é demasiado importante para nossa formação e, por conseguinte, para a formação dos nossos/ seus alunos. Nesta apostila veremos a legislação e discorreremos sobre algumas políticas voltadas para a inclusão e para educação especial. Trata-se de uma reunião do pensamento de vários autores que entendemos serem os mais importantes para a disciplina. Para maior interação com o aluno deixamos de lado algumas regras de redação científica, mas nem por isso o trabalho deixa de ser científico. Desejamos a todos uma boa leitura e caso surjam algumas lacunas, ao final da apostila encontrarão nas referências consultadas e utilizadas aporte para sanar dúvidas e aprofundar os conhecimentos. Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 1 A LEGISLAÇÃO E AS POLÍTICAS DA EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA Conforme Marcelos (2009) o Brasil demonstrou traços de uma política educacional inclusiva já na promulgação da Constituição Federal em 1988, no TÍTULO VIII, capítulo Da Ordem Social: Art. 208. O dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de: III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; IV - atendimento em creche e pré-escola às crianças de 0 a 6 anos de idade. Art. 227. II §- 1º criação de programas de prevenção e atendimento especializado para os portadores de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de preconceitos e obstáculos arquitetônicos. § 2.º A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência. Desde então nosso país vem reunindo esforços para assegurar o direito à educação de qualidade a todos os portadores de necessidades especiais preferencialmente em escolas regulares. Em 1989 a lei n. 7.853, de 24 de outubro de 1989 foi implantada e em linhas gerais dispõe sobre o apoio às pessoas com deficiências, sua integração social, assegurando o pleno exercício de seus direitos individuais e sociais. (MARCELOS, 2009). De acordo com Marcelos (2009) ao participar em 1990, em Jomtien, na Tailândia o Brasil optou pela construção de um sistema inclusivo concordando com a Declaração Mundial de Educação para todos. Também em 1990 a lei n. 8.069/90, Estatuto da Criança e do Adolescente de 13 de julho de 1990 estabelece entre outras determinações: Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 Art. 5. Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. Art. 11. § 1º. A criança e o adolescente portadores de deficiência receberão atendimento especializado. E o caminho aberto para a mudança na educação especial não para por aqui. o Brasil esteve em consonância com as propostas da conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais em Salamanca (Espanha, 1994). Propostas denominadas DECLARAÇÃO DE SALAMANCA que tiveram a participação de delegados de 88 governos e 25 organizações internacionais e o objetivo de estabelecer princípios, políticas e práticas na área das necessidades educativas especiais. O documento oficial foi adaptado à terminologia educacional brasileira onde foi alterado o termo “necessidades educativas especiais” por “necessidades educacionais especiais” e da mesma forma, a expressão “integrada” ou “integradora” foi também substituída por “inclusiva”. A expressão necessidades educacionais especiais é utilizada para referir-se a crianças e jovens cujas necessidades decorrem de sua elevada capacidade ou de suas dificuldades para aprender. Está associada, portanto, a dificuldades de aprendizagem, não necessariamente vinculada a deficiência (s). As Necessidades educacionais podem ser identificadas em diversas situações representativas de dificuldades de aprendizagem, como decorrência de condições individuais, econômicas ou socioculturais dos alunos: • Crianças com condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais e sensoriais diferenciadas; • Crianças com deficiência e bem-dotadas; • Crianças trabalhadoras ou que vivem nas ruas; • Crianças de populações distantes ou nômades; • Crianças de minorias linguísticas, étnicas ou culturais; Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 • Crianças de grupos desfavorecidos ou marginalizados. Nesta perspectiva, segundo Marcelos (2009) a atenção dada à diversidade cultural colabora para a melhoria da qualidade de ensino e aprendizagem para todos. A educação especial como modalidade da educação escolar ganha mais um dispositivo legal e político-filosófico a seu favor a lei n. 9.394 de 20 de dezembro de 1996. LDB, capítulo V. Da educação especial: Art. 58. Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais. §1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender as peculiaridades da clientela de educação especial. §2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular. §3º A oferta da educação especial, dever constitucional do Estado, tem início na faixa etária de zero a seis anos, durante a educaçãoinfantil. Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais: I - Currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específica, para atender às suas necessidades; II - Terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados; III - Professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns; IV - Educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora; V - Acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular. Art. 60. Os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabelecerão critérios de caracterização das instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação exclusiva em educação especial, para fins de apoio técnico e financeiro pelo Poder público. Parágrafo único. O poder Público adotará, como alternativa preferencial, a ampliação do atendimento aos educandos com necessidades especiais na própria rede pública regular de ensino, independentemente do apoio às instituições previstas neste artigo. Através do censo escolar podemos observar o crescimento de 640% das matrículas do ensino especial em escolas regulares/classes comuns de 1998 a 2006 resultados claros do sucesso da política inclusiva no Brasil. Com objetivo de organizar a modalidade de educação especial e aproximá-la cada vez mais dos pressupostos e da prática pedagógica social da educação inclusiva, em 20 de dezembro de 1999 o decreto n. 3.298 regulamenta a lei n. 7.853, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção e dá outras providências. (MARCELOS, 2009). A lei n. 10.172/01 aprova o Plano Nacional de Educação que estabelece vinte e oito objetivos e metas para a educação das pessoas com necessidades educacionais especiais que de forma sintética tratam: ampliação da oferta de atendimento desde a educação infantil até a qualificação profissional dos alunos partindo do desenvolvimento de programas educacionais em todos os municípios com parcerias nas áreas de saúde e assistência social; Atendimento preferencial na rede regular de ensino e atendimento extraordinário em classes e escolas especiais; Estabelecimento de ações preventivas e parcerias necessárias ao Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 pleno desenvolvimento do portador de necessidades educacionais especiais em escola inclusiva; Promoção da educação continuada de professores em exercício. Em 2006 os objetivos e metas traçados pelo Plano Nacional de Educação no que diz respeito à ampliação dos atendimentos da educação infantil até a qualificação profissional em escolas regulares já podem ser vistos através do censo escolar. Embora timidamente, os portadores de necessidades educacionais especiais, estão sendo matriculados em quase todas as etapas e se concentram em sua maioria no ensino fundamental. A habilitação dos profissionais em exercício de 2002 a 2006 cresceu 33,3% resultado da política de incentivo na formação continuada de professores do Plano Nacional de Educação. Enfim após a análise histórica da legislação brasileira podemos concluir que todas garantem o direito de qualquer aluno à educação regular e que esta política já vem dando resultados. O nosso papel neste momento é de reflexão sincera, sem resistência às mudanças e inovações, a fim de promover a reforma estrutural e organizacional das instituições de ensino e assegurar efetivamente a inclusão dos portadores de necessidades especiais. (MARCELOS, 2009). Já para Ross (s/d) é notícia comum nos debates teóricos sobre educação e seus determinantes sociais, econômicos, políticos e culturais a crise da educação especial. Com efeito, crise, vem do latim crisis, que significa quebra, transformação em curso “fase difícil na evolução das coisas, dos sentimentos, dos fatos; colapso; deficiência, penúria; ponto de transição entre uma época de prosperidade e outra de depressão, ou vice-versa. ” (FERREIRA, 1993, p. 154) A ideia de crise põe em xeque os paradigmas que interpretam os modelos de economia, de organização política de educação etc., mas qual é a crise da educação especial? Suas causas teriam relação com as transformações mais amplas que se processam em nossa sociedade? O fenômeno da globalização estaria produzindo efeitos sobre essa modalidade de educação? Sua situação de crise seria uma manifestação positiva de sua integração e intersubjetividade científica, atribuindo-lhe maior importância e significação social? O ponto de Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 partida para tais questionamentos pode ser tomado na insatisfação ou inconformidade que caracteriza as produções teóricas acerca desse campo. - A crise de educação especial e as possibilidades da produção do novo: a crise da educação especial seria o reflexo das teses que proclamam o fim da história, o fim da política e o fim da igualdade? Se essa for uma hipótese afirmativa pode-se inferir que a educação especial teria exercido papel de reabilitação das pessoas com deficiência visando sua plena integração na sociedade. Já com o fim do socialismo real e consequentemente das teses igualitaristas não haveria mais sentido manter a organização de um serviço especializado para o atendimento às pessoas com deficiência, tendo em vista a não realização do sonho de integração. Neste sentido, as teses inclusivistas, ao invés de serem as respostas possíveis de nosso tempo às crises paradigmáticas, passam a ser um acobertamento ideológico de algo que a sociedade não conseguiu realizar: a integração social de todos. A educação especial, uma vez não tendo atingido o suposto desenvolvimento ilimitado do ser humano, teria de fechar suas portas. Para Ross (s/d, s/p) a crise atual é uma crise radical, quer dizer, do sentido fundamental de nossa cultura. Em termos abstratos significa a crise do nosso paradigma. Em termos concretos, expressa a crise do sonho maior e da utopia que deu sentido ao mundo moderno nos últimos séculos. Qual era este sonho? O desenvolvimento ilimitado, a vontade de poder como dominação sobre os outros, sobre os povos e sobre a natureza. (BOFF, 1994, p. 66). É comum se encontrar escritos que produzam a crítica aos modelos clínicos, historicamente predominantes na educação especial. É certo, porém, que só se avança em determinado campo da ciência quando se produzem desequilíbrios. Com efeito, desequilíbrio é resultado da crítica, é a crise. (...) mas quem se sente de algum modo responsável pela qualidade de vida de portadores de deficiência? Essa é a crise da sociedade civil a que me refiro. Uma crise de falta de perguntas e de falta de respostas. Uma crise de desleixo coletivo, com doses variáveis de leviandade, resultado da „falta de formação‟ e do individualismo que nos norteia há quase dois mil anos de civilização Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 judaicocristã. Como a deficiência há que se tornar uma questão social se nem chegaa ser uma questão humana? (WERNECK, 1997, p. 186). O estado de barbárie atingido pela sociedade civil, segundo relato de Werneck, pode sofrer uma nova direção através da união dos cidadãos e de suas organizações. O que ela não explica é quais os determinantes que podem justificar as ações dos cidadãos voltadas para o altruísmo e não mais para o individualismo posto que estejam situados no modo de produção capitalista, fundado no princípio da propriedade privada. Primeiramente, é preciso ter claro que os encaminhamentos e respostas levadas a cabo para a solução da problemática da educação especial dependem necessariamente do modo como a interpretamos. Pode-se dizer, então, que, diferentes encaminhamentos e respostas são resultados de diferentes formas de interpretação da educação especial e de suas novas funções no contexto mais amplo da sociedade. Ao se optar por uma determinada ação e ao se comprometer com uma determinada concepção dessa modalidade de educação, necessariamente se põe em prática um tipo de concepção da própria deficiência e a função que a pessoa dessa condição deve exercer em nossa sociedade. Ao voltar à tona a necessidade de explicitar as funções da educação especial, questionam-se as razões que justificaram uma forma especial de educar esses sujeitos. Acredita-se que, ao desvelar essas razões, pode-se reconceitualizar o que é e o que não é a educação especial hoje. A educação teria sofrido o recorte e, nesse sentido, considerada especial em razão da restrição característica de seus sujeitos ou alunos? Se for aceita essa possibilidade, pode-se inferir que a educação especial tenha sido a resposta possível às características especiais de seu público alvo. Seus defensores argumentariam favoravelmente à permanência de suas tradicionais funções, tendo em vista a possibilidade de oferecer-lhes melhor qualidade, a partir da relação direta entre as características dos alunos e a especialização dos serviços prestados. Esta é uma interpretação considerada técnica. Suas implicações atingem tanto as instituições que a realizam, como as valorações éticas, política e profissional que se lhe atribui. Neste caso, as instituições educacionais especiais teriam ideologias distintas das demais escolas. Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 Contraditoriamente à sua condição de especial, não lhes seria exigido cumprir objetivos pré-fixados, tampouco prestar contas quanto à eficiência, à eficácia e à efetividade de seus serviços. Isso equivale dizer que não lhe caberia sofrer processos de avaliação quanto à qualidade, quer do trabalho prestado, quer do processo de aprendizagem dos alunos. Uma vez consideradas especiais, essas instituições teriam funções diferentes daquelas da educação geral. Outra implicação decorrente da versão mecanicista da educação especial é sua consideração como objeto científico menor, irrelevante e incompleto. Nessa perspectiva, são secundários, portanto menores em importância e significação social, tanto a instituição educacional como os sujeitos que apresentem necessidades especiais. Aos professores envolvidos nessa modalidade de educação, ainda que percebam gratificações para o exercício de sua atividade nesse campo, não lhes é exigido um processo de reciclagem pedagógica permanente, nem um compromisso político firmado com a apropriação dos saberes socialmente produzidos, e, por consequência, o exercício da cidadania dessas pessoas. Se se pode aceitar que toda ciência que nasce e se consolida a partir de uma necessidade social, a educação especial, na perspectiva tecnicista, não ofereceria razões suficientes para se empreender pesquisas e se fixar, por exemplo, como objeto científico, o processo de ensino-aprendizagem. Se aceitar que a pedagogia somente recebeu seus fundamentos científicos a partir do imperativo posto pela Idade Moderna da educação “para todos”, a educação especial, contrariamente, não sofreu, até poucos anos, implicações sociais, econômicas, políticas e culturais significativas para se pôr a necessidade e emergência de educar todos os sujeitos que apresentem características chamadas especiais. Enquanto a era da industrialização impôs a necessidade da educação da maioria dos trabalhadores, e, por consequência, justificou o investimento na realização de pesquisas educacionais, a educação especial surgiria com uma finalidade diametralmente oposta à educação geral. Firmavase a era da institucionalização das pessoas que apresentassem algum tipo de deficiência. (ROSS, s/d). Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 Trata-se de questionar também, segundo Ross (s/d) que razões justificaram a consideração de cegos, surdos, deficientes mentais e outros como sujeitos especiais e diferentes de outros segmentos sociais que poderiam ser, porém não foram considerados especiais, e tampouco submetidos a essa particular cosmovisão, ou seja, a organização e institucionalização da educação especial. A ideia de “educação”, apesar de sua adjetivação especial, teria sido elaborada com finalidades semelhantes à educação pensada e organizada para os demais trabalhadores, ou serviria para mascarar as implicações clínicas desse conceito? Se o critério para afirmar a singularidade educativa desses sujeitos é o de uma caracterização excludente a partir da deficiência que possuem, então não se está falando de educação, mas de uma intervenção; se se acredita que a deficiência, por si mesma, em si mesma, é o eixo que define e domina toda a vida pessoal e social dos sujeitos, então não se estará construindo um verdadeiro processo educativo, mas um vulgar processo clínico. (SKLIAR, 1997, p. 9, apud ROSS, s/d, s/p). Com efeito, tomar a deficiência como critério para se levar a cabo o processo de institucionalização, não atribui à modalidade de educação que vier a ser organizada para essas pessoas a caracterização de especial. Qual a razão para considerá-la especial? Por outro lado: em que sentido falar de uma instituição escolar especial? Se for porque contém fisicamente aqueles sujeitos especiais, então não se trata de uma escola, mas de um hospital. Se, por outro lado, se trata de que as instituições são especiais porque pretendem desenvolver uma didática especial para aqueles sujeitos deficientes, então pode ocorrer que, em vez de processos interativos de educação exista uma aplicação sistemática de recursos, exercitações e metodologias neutras e desideologizadas. (SKLIAR, 1997, p. 10, apud ROSS, s/d, s/p). Historicamente, conforme Ross (s/d, s/p) pode-se encontrar nas relações entre a presença da deficiência e o processo de institucionalização nos leprosários e, em seguida, em grandes hospitais europeus que abrigavam pessoas com diferentes rotulações e estas justificavam sua segregação para a preservação daquela ordem social. A ideia de organizar um tipo de educação e dotá-la de recursos, sistematização e metodologias poderia ter constituído Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 avanço histórico significativo frente às velhas concepções inatistas e deterministas sobre esses seres, como seres inadaptados e menos válidos. Contudo, tal finalidade nunca fora concretizada em prol do abandono real do processo de institucionalização, o que se justifica afirmar que se isso não ocorrera, não foram organizadas práticas pedagógicas coerentes com tais finalidades ou, então, essas finalidades nunca foram proclamadas anteriormente. Por último, se a caracterização de especial estiver vinculada à ideia de educação menor, incompleta e irrelevante, confirma-se a partir do discurso aparentemente desideologizado que se difunde na organização das políticas educacionais e na realização das práticas pedagógicas nesse campo. A aparenteneutralidade dos organizadores das políticas, dos dirigentes e, mesmo, dos professores vinculados a este campo da educação, transmite socialmente a mensagem de que as condições sociais de tais pessoas estejam atendidas e que, portanto, as relações sociais por elas produzidas estejam marcadas por condições de igualdade. Nesse sentido, a caracterização de especial à educação atribui aos seus agentes a função de protecionismo, assistencialismo e não a de fornecer elementos culturais essenciais rumo à emancipação desses sujeitos. O estigma da falta de inteligência, defeito, falha, ou déficit, impõe às pessoas com deficiência a condição de seres desacreditados socialmente, o que as reduz a uma espécie de destino pré-determinado. O mote, citado por Ceccim (apud Skliar, 1997, p. 47), confirma algo já constatado denunciado pelas pessoas com deficiência que tomaram consciência de que “qualquer atitude de uma pessoa com DM ser interpretada como originaria, essencialmente, da própria deficiência” Assim, para além da deficiência objetivamente detectável, há uma produção social da subjetividade de deficiente. Na cotidianidade, as pessoas são guiadas pelo imediato e pelas referências locais. A presença de uma deficiência suplanta qualquer concepção que se pretenda integral do ser humano. Toma-se, à parte, a deficiência como determinante para a formação de uma visão de todo o ser. É nesse sentido que as ações e as decisões dessas pessoas acabam por ser insignificantes diante da deficiência, à qual é isolada como determinante fundamental para uma concepção unilateral de homem. Socialmente, a Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 deficiência teria mais importância que as atitudes dos indivíduos, suas ações e decisões não produziriam transformações no real, porque são vistos como não capazes de produzir. O critério que é tomado para afastá-lo da normalidade obedece a uma visão histórica da realidade, desconsiderando-se inventos e instrumentos já produzidos pela cultura humana. A cultura não é apenas um código comum nem mesmo um repertório comum de respostas a problemas recorrentes. Ela constitui um conjunto comum de esquemas fundamentais, previamente assimilados, e a partir dos quais se articula, segundo uma „arte da invenção‟ análoga da escrita musical, uma infinidade de esquemas particulares diretamente aplicados a situações particulares. (...) Tais esquemas de invenção também podem ter a função de remediar a falta de invenção, no sentido comum do termo. (...) Os automatismos verbais e os hábitos de pensamento têm por função sustentar o pensamento, mas também podem, nos momentos de „baixa tensão‟ intelectual, dispensar de pensar. Embora devam auxiliar a dominar o real com poucos gastos, podem também encorajar aos que a eles recorrem para fazer economia da referência ao real. (BOURDIEU, 1974, p. 208, apud ROSS, s/d, s/p). Ainda de acordo com Ross (s/d, s/p) aos dirigentes, professores e outros profissionais, ao assumirem sua função, não se põem implícita ou explicitamente o compromisso de transformação das condições objetivas e sociais dessas pessoas. Consta de algumas entrevistas, realizadas para este trabalho de pesquisa, algo que já é conhecido publicamente. Muitos professores não atuam conscientemente em prol da emancipação social de seus alunos que apresentem necessidades educacionais especiais. Fazê-lo, equivale a pôr em risco sua própria função. Este é mais um dado que reforça a ideia clínica da educação, tendo em vista que só se poderia aceitar uma relação direta entre agente e paciente, na perspectiva do trabalho médico. O significado da educação especial está diretamente relacionado à concepção clínica da pessoa, na qual, a deficiência exerce o papel de determinante na relação entre o profissional e o sujeito. Porém, no momento em que a perspectiva clínica invade o campo educacional, perdem-se as especificidades de um e de outro. A manutenção da relação de dependência é o resultado possível quando os objetivos educacionais Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 e compromissos políticos firmados com a transformação social desses sujeitos não estão produzindo práticas pedagógicas emancipadoras. Por modelo clínico-terapêutico considero toda a opinião e toda prática que anteponha valor e determinações acerca do tipo e nível da deficiência acima da ideia da construção do sujeito como pessoa integral, apesar de e com sua deficiência específica. A obstinação do modelo clínico dentro da educação especial nos revela um clássico problema, ainda não explicado, dentro desse contexto: a necessidade de definir com clareza se esta perspectiva educativa é aliada da prática e do discurso da medicina ou se é aliada da pedagogia ou, como muitos outros supõem, se deve existir uma combinação, uma somatória das prováveis estratégias, tanto terapêuticas, como pedagógicas. (SKLIAR, 1997, p. 10). A predominância da abordagem clínica sobre a abordagem educacional cumpre a exigência social de isolar as pessoas portadoras de uma condição biológica, física e sensorial distinta para evitar a perturbação da ordem. Já a denominação e a prática de educação especial, neste determinado momento histórico, confirma a função de não educar na perspectiva de conduzir as pessoas ao processo de emancipação social. Nesse sentido, a educação social cumpre a função ideológica de formar socialmente uma representação da reparação das fraquezas e limitações sociais e humanas. O “mal da humanidade” estaria sendo sanado com a instalação de programas ditos de educação especial, levados a cabo na perspectiva clínico terapêutica. A concepção do sujeito, a imagem de Homem, a construção social da pessoa, etc., desenvolve-se em linhas opostas ao contrastar a versão incompleta de sujeito que oferece o modelo clínico-terapêutico e a versão de diversidade que oferece - ou, melhor, que deveria oferecer - o modelo sócioantropológico da educação. Disso resultam, por outro lado, consequências futuras bem diferentes: uma questão seria a do completamento do sujeito e outra, contrária, seria a questão do aprofundamento dos aspectos comuns próprios da diversidade cultural. (SKLIAR, 1997, p. 11, apud ROSS, s/d, s/p). Na verdade, a abordagem clínica da educação especial se presta à função social de manter os supostamente inferiorizados, incapacitados, à Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 margem da produção e usufruto dos bens e serviços sociais. Fica claro que a pretensão de definir os sujeitos com alguma deficiência como pessoas incompletas faz parte de uma concepção etnocêntrica do homem e da humanidade. O etnocentrismo – junto a um de seus derivados mais perigosos na educação especial: o paternalismo – é um reflexo da intolerância e do racismo gerado por um modelo econômico-político concêntrico, que utiliza os meios de comunicação de massa – ou o contrário – para exercer sua teoria e sua práxis de globalização. Então, a homogeneidade humana é a notícia e a diversidade, incluída a população especial, aparece sob forma de um assassinato, sob o rosto de uma pobreza que se sugere voluntária, da violação, etc., fatos que se consomem pelo resto da população com uma certa curiosidade e voracidade antropofágica. (SKLIAR, 1997, p. 11, apud ROSS, s/d, s/p). O indivíduo só existe, de acordo com Ross (s/d, s/p) na perspectiva da comunicação de massa, na medida em que possa representar potencial de consumo dos produtos padronizados. A diversidade antropológica é objeto da curiosidade, e suas manifestações culturais são vistas como pitorescas, servindo para combater a tragédia do imaginário. É nesse sentido que o discurso da medicina se torna um aliado incomparável da concepção clínica dentroda educação especial: os esforços pedagógicos devem submeter-se previamente a uma potencial e quimérica cura da deficiência. O questionamento implícito desta concepção seria o seguinte: se se tira ou se reduz o tamanho da deficiência, se tiram ou se reduzem as consequências sociais. O Homem seria Homem se não fosse surdo, se não fosse cego, se não fosse retardado mental, se não fosse negro, se não fosse homossexual, se não fosse fanático religioso, se não fosse indígena, etc. Nada mais absurdo. (SKLIAR, 1997, p. 11). Nesta perspectiva, a cegueira, a surdez, a deficiência mental, seriam limitadores e impeditivos à conquista da condição humana. Essas condições não permitiriam a conquista da condição do ser universal, livre e consciente, própria do humano genérico. O cego, o surdo, o deficiente mental, não passariam além da condição de animal. Segundo Gagnebin: assim, Platão, que nos assegura nas Leis (808 d/e) que como as ovelhas não podem ficar sem pastor, senão se perdem, assim também que a vigie e controle em todos os seus movimentos, Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 pois a „criança de todos os animais o mais intratável („ho de pais pantôn theriôn estidusmetacheiristotaton‟ ), na medida de seu pensamento, ao mesmo tempo cheio de potencialidade e sem nenhuma orientação reta ainda, o torna ardiloso, o mais hábil e o mais atrevido de todos os bichos‟ („epiboulon kai drinu kai hybristotaton theriôn gignetai‟ ). (GHIRALDELLI, 1997, p. 85, apud ROSS, s/d, s/p) A pessoa com deficiência afastada da “normalidade da razão”, própria da idade adulta, e, ao mesmo tempo, considerada uma ameaça a uma pretensa ordem e harmonia sociais. “Essa criança ameaçadora na sua força animal bruta, essa criança deve ser domesticada e amestrada segundo normas e regras educacionais fundadas na ordem da razão (logos) e do bem tanto ético quanto político, em vista da construção da cidade justa. ” (GHIRALDELLI, 1997, p. 86, apud ROSS, s/d, s/p). A pessoa com deficiência teria toda sua produção, toda sua vida relacionada à condição física imediata. O animal produz unilateralmente, enquanto o homem produz universalmente; produz unicamente devido à necessidade física imediata, enquanto o homem produz inclusive livre da necessidade física e só produz realmente liberto dela; o animal produz só a si mesmo, enquanto o homem reproduz a natureza inteira; o produto do animal pertence imediatamente a seu corpo físico, enquanto o homem se enfrenta livremente com seu produto. O animal cria unicamente segundo a necessidade e à medida da espécie a que pertence, enquanto o homem sabe produzir segundo a medida de qualquer espécie e sabe sempre impor ao objeto à medida que lhe é inerente; por isso o homem cria também segundo as leis da beleza. (ENGUITA, 1993, p. 104, apud ROSS, s/d, s/p). Na perspectiva local, conforme Ross (s/d, s/p) alienada e imediata, a pessoa não produziria livre e universalmente; a pessoa com deficiência, ao invés de impor-se ao objeto, estaria submissa a ele, presa e limitada. Não há nenhuma relação entre a deficiência e seus supostos derivados sociais diretos, pois estes não são uma consequência direta daquela, mas sim das formas e dos mecanismos em que estão organizadas e de que dispõem as sociedades para não exercer restrições no acesso a papéis sociais e à cultura das pessoas, de Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 todas as pessoas. De fato, duas pessoas com idênticas deficiências, e que vivem em sociedades diferentes, possuem, obviamente, trajetórias de desenvolvimento diferentes. O papel que desempenha uma deficiência no começo da vida de um sujeito não é de ser o centro inevitável de seu desenvolvimento, mas, pelo contrário, a força motriz de seu desenvolvimento. (SKLIAR, 1997, p. 12) A deficiência exerce uma dupla função sobre o processo de desenvolvimento. A função limitadora conjuga-se com a função fortalecedora do indivíduo. Segundo Vygotsky (1989), aceitar a deficiência e tomar consciência de um certo sentimento de inferioridade atribui ao indivíduo um instrumento de força superior ao próprio sentimento. Segundo Adler, citado pelo autor: o sentimento de uma perturbação constitui o estímulo constante para o seu desenvolvimento do psiquismo. Sentimento de um órgão defeituoso constitui o estímulo constante para desenvolvimento psíquico do indivíduo. O defeito determina a orientação das formas psíquicas e, bem como as vias para o sucesso do processo de crescimento e de formação da personalidade. (VYGOTSKY, 1989, p. 6, apud ROSS, s/d, s/p). E o próprio Vygotsky (1986, p. 6) acrescenta: a posição social conscientemente avaliada constitui-se a força do desenvolvimento psíquico. Os mecanismos funcionais como a memória, a intuição, a atenção, a sensibilidade e o interesse frente às adversidades enfrentadas conduzem à constituição de uma super-resistência e à transformação de inferioridade em superioridade, a incapacidade em competência e talento. Este é o princípio antropológico segundo o qual as resistências naturais se convertem dialeticamente em transformações recíprocas, gerando, ao mesmo tempo técnicas em instrumentos objetivos, de um lado, e saberes, capacidades e competências subjetivas, de outro. Essa perspectiva dialética, - negação da negação, instaurada individual e socialmente - é possível a partir das leis da contradição, movimento e da relação. Já, do ponto de vista biológico, tal questão é esclarecida na seguinte afirmação de Skliar: o cérebro dos primeiros anos de vida é de tal flexibilidade e plasticidade que só uma profunda e errada abordagem clínica negaria todo o potencial de compensação que se reúne na direção contrária ao déficit. Em outras palavras, a criança não vive a partir de sua deficiência, mas a partir daquilo Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 que para ela resulta ser equivalente funcional. Tudo isto seria certo se, desde já, o modelo clínico-terapêutico não se obstinasse tanto em lutar contra a deficiência, o que implica em geral originar consequências sociais ainda maiores. Reeducação ou Compensação, essa é a questão. Obstinar-se contra o déficit, esse é o erro. (SKLIAR, 1997, p. 12). Neste caso, a deficiência é, ao mesmo tempo, um desvio da norma social e algo a ser naturalizado. Nesse sentido, o limite é natural; a existência de barreiras arquitetônicas e pedagógicas é natural; o isolamento e a não oportunidade de acesso à produção cultural são naturais. É evidente que o ser humano só se constitui progressivamente, no curso de um longo devenir que se inicia com o nascimento para só acabar na maturidade. Suponha-se, porém, que esse devenir nada mais faça que atualizar virtualidades, retirar reluzentes energias latentes que já existiam (...). O educador não teria, portanto, nada de essencial a acrescentar à obra da natureza. Não criaria nada novo. Seu papel limitar-se-ia a impedir que essas virtualidades existentes se atrofiassem devido à inação, ou se desviassem de seus cursos normais, ou se desenvolvessem com muita lentidão. (GHIRALDELLI, 1997, p. 75, apud ROSS, s/d, s/p) A organização de práticas e a teorização dessas práticas, caracterizada pelas baixas expectativas dos professores em relação aos alunos que apresentem necessidades especiais, também são consideradas naturais. Para muitos, o fracasso educativo massivo se traduz na verdadeira obrigação de pensar que são as próprias limitações dos sujeitos educativos o que origina esse fracasso. Entretanto, existe uma interpretação alternativa contra esse fácil silogismo. Se a escola especial parte do pressuposto de que os sujeitos estão naturalmente limitados, toda a orientação educativa está obrigada a orientar-se naturalmente emdireção a essa ideia e os resultados, finalmente, concorrem com essa percepção. Através dessa particular perspectiva, o círculo das baixas expectativas se fecha com uma notável facilidade: os magros resultados são um produto direto da inconsistência dos próprios alunos e não da natureza do projeto educativo. Não há que se ruborizar se se afirma que, na realidade, o fracasso é resultado de uma pressão metafísica que se exerce sobre os sujeitos especiais: eles estão presos por uma falsa concepção ideológico- Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 pedagógica, estão condicionados a respirar através de falsas representações sociais, regulados por meios de normas e hábitos medievais, não podem comunicar-se, pois têm que aprender como superar a deficiência e ser iguais aos demais - onde estão e quais são os demais? - em vez de jogar, repetem, em vez de mover-se, exercitam-se. Para Ross (s/d, s/p) há uma certa hipocrisia quando se atribui toda a responsabilidade do fracasso da educação especial, justamente, aos alunos especiais. O fracasso é o resultado de um complexo mecanismo que reúne fatores sociais, políticos, linguísticos, históricos e culturais, e que provém daqueles profissionais que, dando-se conta ou não, voluntariamente ou não, representam e reproduzem a ideia de um mundo homogêneo, compacto, sem variações, sem fissura. (SKLIAR, 1997, p. 12-13). Na verdade, os fracassos não são tomados como tais. São tidos como naturais. São os resultados da inconsciência dos alunos. O processo pedagógico em curso é apenas um ritual para confirmar a cotidianidade imutável dessas pessoas. A concepção de educação que toma o desenvolvimento humano como sucessão de etapas progressivas de um possível curso natural da vida e das coisas, reforça a manutenção da condição a priori limitada e limitadora dos sujeitos com necessidades especiais. Nesta perspectiva, espera-se que as capacidades de cada um se potencializem naturalmente. A proclamada desigualdade natural entre estes sujeitos seria justificada pelas diferenças intrínsecas e não pelas diferenças e mediações culturais e sociais existentes nas relações entre os sujeitos. Esses sujeitos estão condicionados a pensar e agir segundo representações daqueles que, em não apresentando uma deficiência aparente, se defendem contra os que a apresentem para não revelar suas próprias deficiências, aquelas não aparentes. Da pretensão à normalidade surge o individualismo. Cada uma por si. Deus por todos. Esta é a frase-tema do individualismo. Torna-se convincente e simpática quando justifica o argumento de que, se uma família tem filhos perfeitos, seu compromisso social e humano se resume a cuidar bem deles. Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 Evitar que se tornem um peso para a comunidade. Prepará-los para produzir. E para gerar novos descendentes, igualmente saudáveis, que férteis se reproduzirão, perpetuando como educadores a mesma linha individualista na condução da prole. Por esse caminho chegaremos à sociedade inclusiva? Não. Cuidar apenas da educação dos nossos próprios descendentes não deve mais nos satisfazer. Os problemas de uns têm de ser os problemas de todos. Social e politicamente, o reflexo mais óbvio da cultura do individualismo é a exclusão das minorias. Minorias no sentido dos desfavorecidos pela legislação de seu país ou pelas posturas e decisões de sua comunidade. Cada um de nós é perito na arte de disfarçar nosso desejo de excluir. Ou de achar que as soluções para a não violação de direitos virão como mágica. (WERNECK, 1997, p. 162-164, apud ROSS, s/d, s/p). Ao tomar o processo de exclusão como algo que se tornou habitual por estar incorporado à cultura individualista, atribui aos sujeitos humanos uma condição mecânica e linear, segundo a qual, a naturalização do modo de pensar e agir próprio do senso comum determina, em última análise, a exclusão das pessoas com deficiência. Ao situar no indivíduo tanto a responsabilidade pela exclusão social como o dever de superá-la por conta da adoção de comportamentos de solidariedade e cooperação, processa-se o desvinculamento entre o problema da exclusão social, sua superação e o modo como se organiza estrutural e politicamente a sociedade. Analogamente, podese afirmar que a simples convivência entre brancos e negros, por exemplo, possa determinar a crise na sociedade individualista e, por consequência, a crise dos preconceitos, ou seja, sua superação. Há apenas governos mais ou menos preocupados em seguir a linha do politicamente correto. Com a crescente autonomia dos jovens adultos com Síndrome de Down no Brasil e no mundo a cultura do individualismo está em crise. Mesmo poucos, estão em número suficiente para desestabilizar a rotina de relações pessoais e sociais entre nós e eles, entre eles e seus governos, rotina inspirada na cultura da tolerância. Tolerar é permitir, com ressalvas. Quem permite não pode ser incomodado com grandes reformulações de pensamentos e de atitudes. Inclusão e individualismo são posturas incompatíveis. Para Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 combater o individualismo a humanidade deve perceber que a deficiência é uma questão humana. Tão humana quanto o sentimento de individualismo que nos faz esquecer-se disso. (WERNECK, 1997, p. 165). Valendo-se de uma visão individualista de sociedade, Werneck se sensibiliza com o esforço percebido por ela nas pessoas com deficiência para garantirem sua existência, apontando a necessidade de que os “normais” ou os “dominantes” também se esforcem para estabelecer elos de comunicação e intercâmbio com os “dominados”. Ela assume a perspectiva de que as relações de poder se reproduzem nas diferentes relações sociais em cuja corrente encontram-se as pessoas com deficiência na condição de dominados. Os “dominantes” passam a ser referência para os “dominados”. Werneck contundente ao afirmar a necessidade dessas pessoas estabelecerem canais sólidos de comunicação, liberdade de pensamento e expressão, serem ouvidas e partícipes da direção dos processos sociais. Tal consideração, a seguir, tem particular importância em razão de se tratar de um profissional sem os clássicos vínculos de atendimento às pessoas com deficiência, que consegue perceber, contudo, as diferentes formas de opressão e de morte de suas individualidades. Começa, assim, o resgate antropológico desses sujeitos, sem que isto venha a se chamar sociedade inclusiva. Merece destaque a riqueza e a sensibilidade de seu pensamento: “(...) para mim, está relacionado a algo além do que apenas abrirmos e oficializarmos espaços para que pessoas com comprometimento intelectual se expressem”. “O grande salto aprender a ouvi-las. Quanto mais legítimo for esse processo, mais iremos descaracterizá-las como seres passivos (...)”. (WERNECK, 1997, p. 168-169, apud ROSS, s/d, s/p). As pessoas que apresentem tais necessidades especiais não podem pensar o que pensam, nem expressar os saberes extraídos de suas experiências, mas pensar e expressar apenas o conteúdo daqueles que os conduzem. Como não são conduzidos rumo ao desvelar do real e à apropriação dos princípios e fundamentos das ciências, da comunicação e da natureza, esses indivíduos devem permanecer na “mesmice”, o território local de suas individualidades físicas, semelhante condição dos animais. A diferença colocada por Marx entre o animal que se reproduz a si mesmo e o homem que reproduz a Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 natureza inteira só pode ser compreendida atentando-se para o aspecto consciente que distingue a produção humana da do animal; efetivamente, o homem, no seu trabalho produtivo, propõe-sea conservar ou modificar a natureza, coisa que não se pode dizer do animal. É neste sentido que se pode afirmar que o produto do animal se incorpora imediatamente a este, enquanto o homem se enfrenta com seu produto como algo distinto, objetivado, ou que o animal produz unilateralmente – segundo sua própria medida – e o homem universalmente – sem limites, ou sem outros limites que os da própria natureza em si. (ENGUITA, 1993, p. 104, apud ROSS, s/d, s/p). Gagnebin de acordo com Ross (s/d, s/p) encontra na república de Platão, depois da famosa “Alegoria da Caverna”, a afirmação enfática da capacidade de aprender humana, faculdade inata e universal em todos, mesmo que não sempre na mesma proporção. Esse idealismo responde à preconcepção das características intrínsecas das pessoas como pré-requisito para sua educação. As rotulações e classificações das pessoas seriam consequência natural das diferenças. Assim diz Platão: A educação (Paidéia) é, portanto, a arte que se propõe este fim, a conversão (periagoge) da alma, e que procura os meios mais fáceis e mais eficazes de operá-la; ela não consiste em dar a vista ao órgão da alma, pois que este já a possui; mas como ele está maldisposto e não olha para onde deveria, a educação se esforça por levá-lo à boa direção. (GHIRALDELLI, 1997, p. 86, apud ROSS, s/d, s/p). Segundo Ross (s/d, s/p) uma das razões para a perpetuação da concepção clínica na educação especial é a ausência da reflexão de caráter educativo sobre os princípios e finalidades que regem este campo científico. Trata-se do exercício da autorreflexão, na qual são analisados e questionados os procedimentos e conteúdos do tipo do trabalho historicamente levado a termo junto às pessoas com necessidades especiais. A análise e o questionamento quanto à natureza técnica e política das escolhas realizadas, as estruturas arquitetônicas e pedagógicas e de serviços organizados, o grau de participação dos pais, comunidade e pessoas com necessidades especiais nos processos decisórios, quer no planejamento, quer no acontecimento desse tipo de educação, necessitam constar das pesquisas e dos debates de todo o sistema Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 educacional, em todos os seus níveis. Discutir suas especificidades e os pressupostos que governam a educação das pessoas que apresentem necessidades educativas especiais é uma urgência, um dever e um direito do Estado, família e sociedade, no mesmo grau de interesse, respeitabilidade e valoração ética que o problema da educação das crianças de rua, dos filhos dos sem-terra, dos próprios sem-terra e da educação de outras minorias. Se, de um lado, esses segmentos sociais possuem especificidades metodológicas, de outro, possuem um traço comum. São minorias que sofrem o processo de exclusão social que se expressa nas oportunidades educacionais, nas relações de trabalho e no acesso aos bens e serviços culturais. A fronteira entre educação e educação especial constitui desse ponto de vista, uma primeira discriminação: a de impedir que a pedagogia especial discuta afazeres educativos; a de ter que, como consequência, refugiar-se e envergonhar-se como se se tratasse de um tema sem importância. O fato de que a educação especial está virtualmente excluída do debate educativo é a primeira e mais importante discriminação sobre a qual, depois, se projetam sutilmente todas as demais discriminações - por exemplo, as civis, legais, laborais, culturais, etc., entretanto, não estou falando simplesmente do direito à educação que também assiste aos surdos; não é que as crianças especiais têm que ir, como todos os demais, à escola, à instituição escolar entendida como um ente físico, material. Estou afirmando que esse direito deve ser analisado, avaliado e planificado conjuntamente a partir do conceito de uma educação plena, significativa, justa, participativa; sem as restrições impostas pela beneficência e a caridade; sem a obsessão curativa da medicina; evitando toda generalização que pretenda discutir educação só a partir e para as míticas crianças normais. (SKLIAR, 1997, p. 14, apud ROSS, s/d, s/p). Impor a educação especial à ditadura do modelo médico-clínico significa a lei do silêncio, da subserviência e a anulação de seu caráter político, científico e profissional. Trata-se do exercício de uma função que discrimina e segrega tanto seus agentes como seus alunos. Contra a lei do silêncio e da subserviência, não se pode erguer nenhuma voz, não se pode reivindicar nenhum direito; contra a ausência do caráter profissional da educação, não se pode requerer a Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 apropriação dos saberes acumulados, tampouco organizar as situações educativas para criá-los ou produzi-los; diante da aparente neutralidade política, as desigualdades não podem ser questionadas, pois são todas elas mascaradas, negadas e proclamadas na forma da igualdade entre todos. O cidadão-pela- metade será um profissional despreparado. Violará pequenos e grandes direitos das pessoas com deficiência e talvez morra sem perceber isso. (...) Quando o adulto nega a seus filhos o direito de receberem informações sobre o que ele considera serem anormalidades, pratica uma das formas mais sutis de discriminação. Ao optar por só falar do bom, do bonito e do belo, o adulto vira um deturpador da realidade. Passa a sonegar dados sobre um mundo real (nele estão incluídas as doenças e as deficiências) que as crianças percebem como sendo parte do mundo delas, mas que nós insistimos em ignorar ou esconder. Aprender sobre artrite, diabetes, hemofilia, paralisia cerebral, lábio leporino, gagueira, dislexia, ostomia, dislalia, doença renal, epilepsia, paraplegia, cegueira, surdez, alergias alimentares, câncer, prevenção de deficiência é útil para a formação de um cidadão? Defendo que sim. Essas informações fazem parte da construção da cidadania. (...) As crianças de hoje são muito espertas. Nós ainda não somos. Por isso, quando a garotada nos interroga sobre temas relacionados à deficiência raramente associamos tal interesse à inteligência e à precocidade intelectual. Eu sei, nada é tão simples. Mas é também por não termos sido educados para entender a diversidade como situação natural da vida que hoje lutamos em seguir regras que deem ao indivíduo com deficiência, direitos assegurados na Constituição Brasileira. Por isso acredito na força de um lar transformador. Nele, quando questionados sobre temas que lhe incomodam, os adultos abrem seus dicionários e. seus corações. (WERNECK, 1997, p. 140-141, apud ROSS, s/d, s/p). Discutir coletivamente o direito à educação e à participação é mais do que incluir as pessoas, em suas diversidades, no mesmo ambiente escolar. Discutir o direito à educação plena é questionar modelos protecionistas, a natureza e as implicações da beneficência, do autoritarismo, das relações arcaicas do poder e Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 das formas de exclusão. Incluir a pesquisa e o debate sobre o direito à educação plena dessas pessoas ditas especiais, sob condição de que estes participem ativamente, trata-se de pôr em marcha a estratégia social mais transformadora e agregadora de direitos. Na medida em que o homem submete sua ação produtiva a um projeto consciente, deixa de ter uma existência limitada ao fenomênico e se manifesta como ser livre. “O homem um ser genérico não só porque na teoria e na prática toma como seu objeto o gênero, tanto o seu próprio como o das demais coisas, mas também, e isto não é mais que outra expressão para a mesma coisa, porque se relaciona consigo mesmo como gênero atual, vivente, porque se relaciona consigo mesmo como um ser universal e por isso livre.” (ENGUITA, 1992, p. 105, apud ROSS, s/d, s/p). Tal como o homem se produz como um ser livre, o faz como um ser político. Ser cidadão significa compartilhar dos bens sociais, o que supõe participação (...) na esfera da existência política. O tecido social é atravessado pelas relações de poder, ou seja, os homens não se relacionam automaticamente entre si por relações de igualdade; ao contrário, perpassam, entre eles, relações de poder que se transmutam muito facilmente em relações de dominação, de opressão, de exploração. (SEVERINO et al, 1992, p. 11, apud ROSS, s/d, s/p). Ao se afastar da educação geral e ao eliminar a perspectiva auto reflexiva, a educação especial tende a fixar-se sobre os problemas imediatos que são, obviamente, aqueles relacionados à condição biológico-físicosensorial de seus alunos. A ênfase no trabalho coletivo é centrada em atividades que se prestam à manutenção das pessoas em sua localidade imediata. O problema que lhes é imediato e aparente é uma suposta incompletude dos alunos, porque justifica a existência de um trabalho para corrigir a aparente não integração dos sujeitos. A necessidade de adotar uma concepção corretiva desse modelo de educação obriga os profissionais a se dedicarem na busca tão somente de recursos, metodologias e técnicas as quais deverão ser aplicadas, desvinculadas de um compromisso político, quer dos profissionais, quer dos sujeitos que apresentem Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 as necessidades educacionais especiais. A neutralidade deve ser o princípio orientador do trabalho. Reflexão para quê? Refletir, debater, rever objetivos, princípios e finalidades poderiam pôr em xeque as velhas formas de organização do trabalho educacional, quer o especial, quer o geral. Uma demonstração da falta de crítica e reflexão no trabalho pedagógico é o modo como se encaminha a questão da linguagem na educação de surdos e a educação dos cegos. Questões de tamanha relevância se restringem, na maioria das vezes, às discussões exclusivas entre ouvintes e videntes, sendo excluídos os principais interessados. Esse processo de exclusão de surdos e cegos sobre questões educativas que lhes dizem respeito é uma demonstração tanto do atraso científico neste campo quanto do autoritarismo e poderio débil que caracteriza relações sociais estruturadas sob formas arcaicas, resultados de relações pedagógicas que excluem os verdadeiros sujeitos do processo educativo, como surdos, cegos e outros, aparecem na forma do fracasso escolar, da evasão e da não conquista da cidadania por esses sujeitos. Essa é uma patética amostra da incapacidade dos ouvintes e videntes de ouvir e aprender com as experiências acumuladas por séculos e séculos de surdez, cegueira e de outras deficiências ou necessidades especiais. Estas são experiências individuais e coletivas, locais e universais que não podem jamais ser subestimadas ou substituídas tão somente pela visão técnica. Aquilo que aparece como neutralidade do currículo na educação especial é, na verdade, uma organização intencional para manter os sujeitos marginalizados da informação e destituídos de identidade cultural e social. É preciso que se assuma uma neutralidade científica e cultural para que os sujeitos que apresentem necessidades especiais dimensionem suas reais necessidades que são políticas, de conhecimento, de trabalho e de cidadania. Portanto, são necessidades que vão além daquelas vinculadas ao seu equipamento biológico-físico-sensorial. (ROSS, s/d, s/p). Para Ross (s/d, s/p) a consideração ampliada de tais necessidades vem sendo interpretada como necessidade de integração física de tais pessoas no sistema geral de educação. Contudo, é certo que as políticas inclusivas de tais Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 pessoas resultam de constatações de sérios problemas na educação especial. Seus resultados têm sido limitados, assim como são poucas as pessoas que se emancipam das práticas assistencialistas e caritativas alcançando condição de cidadania real e plena. A integração física dessas crianças em escolas comuns seria um avanço, mas, ao mesmo tempo, a perda de especificidades metodológicas já construídas historicamente. A desconsideração de um conjunto de experiências profissionais já acumuladas, ainda que marcadas pelo viés tecnicista e clínico da educação especial, pode trazer aos novos profissionais responsáveis pela educação dessas crianças funções para as quais podem alegar não terem sido preparados. A justificativa centrada no processo de formação profissional pode ser o ponto de apoio para a adoção de novas práticas consideradas neutras, acríticas e marcadas por novas formas de assistencialismo. O descompromisso político poderá ser encoberto com aumentos e fatos convincentes no plano do discurso ideológico, ou seja, as crianças estão, agora, incluídas no mesmo ambiente escolar de todos. Vygotsky (1989, p. 8) afirma que os estigmas resultantes do processo de institucionalização da pessoa com deficiência, provoca o enfraquecimento de sua posição social sendo esse um estímulo para se forjar um ser único, ou seja, integrado social e culturalmente. É, pois, no processo da vida social coletiva que se edifica, que se desenvolvem todas as formas superiores de atividade intelectual características do homem. O processo histórico instrumental de educação e mediação entre as gerações e as culturas obedece ao princípio histórico de transformação, contrário às leis do desenvolvimento biológico à hereditariedade, que obedecem ao inatismo. Este é o princípio antropológico segundo o qual as resistências naturais se convertem dialeticamente em transformações recíprocas gerando, ao mesmo tempo, técnicas em instrumentos objetivos, de um lado, os saberes, capacidades e competências subjetivas, de outro. Qual é a condição para chegar aos objetivos? A existência de obstáculos. As pessoas com deficiência necessitam se liberar dos quadros restritivos que supostamente a natureza lhes fixou. Neste sentido, é essencial que a educação seja organizada com vistas à formação das pessoas plenamente valorizadas do ponto de vista social. O ponto de partida é livrá-las da condenação Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 à inferioridade. Em última análise, o grau das expectativas e exigências sobre a pessoa com deficiência determina a qualidade de sua educação e o estágio de seu desenvolvimento. Os imperativos sociais materializam a transformação da condição de desvantagem, desigualdade ou inferioridade em impulso e força. (ROSS, s/d, s/p). 2 LEGISLAÇÃO DE APOIO PARA ATENDIMENTO DE CRIANÇAS COM DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM Desde a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996, (Lei n. 9394 de 20 de dezembro de 1996) temos algum apoio considerável para os cidadãos que apresentam dificuldades de aprendizagem. Vamos a alguns detalhes dessas leis. LDB 9.394/96 Art. 12 - Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de: I - Elaborar e executar sua Proposta Pedagógica. V - Prover meios para a recuperação dos alunos de menor rendimento. Art. 23 - A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar. Art. 24 - V, a) avaliação contínua e cumulativa; prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período. Instituto Pedagógico de Minas Geraishttp://www.ipemig.com (31) 3270 4500 Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente) Art. 53, incisos I, II e III [...] A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes I – Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II – Direito de ser respeitado pelos seus educadores; III – Direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares superiores. Deliberação CEE nº 11/96 Artigo 1º - “o resultado final da avaliação feita pela Escola, de acordo com seu regimento, deve refletir o desempenho global do aluno durante o período letivo, no conjunto dos componentes curriculares cursados, com preponderância dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados obtidos durante o período letivo sobre os da prova final, caso esta seja exigida, considerando as características individuais do aluno e indicando sua possibilidade de prosseguimento nos estudos. ” Indicação CEE nº 5/98, de 15/4/98 D.O.E. em 23/9/98 [...] educação escolar consiste na formação integral e funcional dos educandos, ou seja, na aquisição de capacidades de todo tipo: cognitivas, motoras, afetivas, de autonomia, de equilíbrio pessoal, de inter-relação pessoal e de inserção social. [...] os conteúdos escolares não podem se limitar aos conceitos e sim devem incluir procedimentos, habilidades, estratégias, valores, normas e Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 atitudes. E tudo deve ser assimilado de tal maneira que possa ser utilizado para resolver problemas nos vários contextos. [...] os alunos não aprendem da mesma maneira e nem no mesmo ritmo. O que eles podem aprender em uma determinada fase depende de seu nível de amadurecimento, de seus conhecimentos anteriores, de seu tipo de inteligência, mais verbal, mais lógica ou mais espacial. No cotidiano da sala de aula, convivem pelo menos três tipos de alunos que têm “aproveitamento insuficiente”: os imaturos, que precisam de mais tempo para aprender; os que têm dificuldade específica em uma área do conhecimento; e os que, por razões diversas, não se aplicam, não estudam, embora tenham condições. [...] recuperar significa voltar, tentar de novo, adquirir o que perdeu, e não pode ser entendido como um processo unilateral. Se o aluno não aprendeu, o ensino não produziu seus efeitos, não havendo aqui qualquer utilidade em atribuir-se culpa ou responsabilidade a uma das partes envolvidas. Para recobrar algo perdido, é preciso sair à sua procura e o quanto antes melhor: inventar estratégias de busca, refletir sobre as causas, sobre o momento ou circunstâncias em que se deu a perda, pedir ajuda, usar uma lanterna para iluminar melhor. Se a busca se restringir a dar voltas no mesmo lugar, provavelmente não será bem-sucedida. [...] O compromisso da Escola não é somente com o ensino, mas principalmente com a aprendizagem. O trabalho só termina quando todos os recursos forem usados para que todos os alunos aprendam. A recuperação deve ser entendida como uma das partes de todo o processo ensino aprendizagem de uma escola que respeite a diversidade de características e de necessidades de todos os alunos. [...] Dentro de um projeto pedagógico consistente, a recuperação deve ser organizada para atender aos problemas específicos de aprendizagem que alguns alunos apresentam, e isso não ocorre em igual quantidade em todas as matérias nem em épocas pré-determinadas no ano letivo. A recuperação da aprendizagem precisa: - ser imediata, assim que for constatada a perda, e contínua; ser dirigida às dificuldades específicas do aluno; abranger não só os conceitos, mas também as habilidades, procedimentos e atitudes. Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 [...] A recuperação paralela deve ser preferencialmente feita pelo próprio professor que viveu com o aluno aquele momento único de construção do conhecimento. Se bem planejada e baseada no conhecimento da dificuldade do aluno, é um recurso útil. Parecer CEE nº 451/98 - 30/7/98 D.O.E. de 01/08/98, páginas 18 e 19, seção I "a expressão '...rendimento escolar...', que se encontra no inciso V do artigo 24 da Lei 9.394/96, não se refere exclusivamente a aprendizagem cognitiva. A legislação sobre avaliação/verificação do rendimento escolar, sobretudo o referido artigo, não restringe a expressão “rendimento escolar” exclusivamente aprendizagem cognitiva. A lei 9.394/96, ao tratar da educação básica, situou-a no quadro de abertura que permitiu, aos que dela fossem cuidar, em seus diferentes níveis e modalidades, a pensasse como um todo e a explicitasse, nos limites do seu texto, em sua proposta pedagógica e em seu regimento. Na elaboração dessa proposta e desse regimento, consubstanciado certamente numa visão de homem, de sociedade e, por consequência, numa concepção de educação e de avaliação, cuidados especiais deverão ser tomados para que estejam contidos, nesses instrumentos, procedimentos referentes ao processo ensino aprendizagem, e em particular ao de verificação do rendimento escolar. O legislador deixou sob a responsabilidade da escola e de toda sua equipe a definição do projeto de educação, de metodologia e de avaliação a serem desenvolvidas. Abandonou detalhes para agarrar-se ao amplo, ao abrangente. Aponta, por isso, para uma educação para o progresso, onde estudo e avaliação devem caminhar juntos, esta última como instrumento indispensável para permitir em que medida os objetivos pretendidos foram alcançados. Educação vista como um processo de permanente crescimento do educando, visando seu pleno desenvolvimento, onde conceitos, menções e notas devem ser vistos como meros registros, prontos a serem alterados com a mudança de situação. E, nessa busca do pleno desenvolvimento e do processo do educando, estão presentes Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 outros objetivos que não só os de dimensão cognitiva, mas os de natureza sócioafetiva e psicomotora, que igualmente precisam ser trabalhados e avaliados. O cuidado deve estar é no uso que se pode fazer desta avaliação, não a dissociando da ideia do pleno desenvolvimento do indivíduo. Lei nº 10.172 de 9 de janeiro de 2001 - Plano Nacional de Educação Capítulo 8 - Da Educação Especial 8.2 - Diretrizes A educação especial se destina a pessoas com necessidades especiais no campo da aprendizagem, originadas quer de deficiência física, sensorial, mental ou múltipla, quer de características como de altas habilidades, superdotação ou talentos. [...] A integração dessas pessoas no sistema de ensino regular é uma diretriz constitucional (art. 208, III), fazendo parte da política governamental há pelo menos uma década. Mas, apesar desse relativamente longo período, tal diretriz ainda não produziu a mudança necessária na realidade escolar, de sorte que todas as crianças, jovens e adultos com necessidades especiais sejam atendidos em escolas regulares, sempre que for recomendado pela avaliação de suas condições pessoais. Uma política explícita e vigorosa de acesso à educação, de responsabilidade da União, dos Estados e Distrito Federal e dos Municípios, é uma condição para que às pessoas especiais sejam assegurados seus direitos à educação. Tal política abrange: o âmbito social, do reconhecimento das crianças, jovens e adultos especiais como cidadãos e de seu direito de estarem integrados na sociedade o mais plenamente possível; e o âmbito educacional, tanto nos aspectos administrativos (adequação do espaço escolar, de seus equipamentos e materiais pedagógicos),quanto na qualificação dos professores e demais profissionais envolvidos. O ambiente escolar como um todo deve ser sensibilizado para uma perfeita integração. Propõe-se uma escola integradora, inclusiva, aberta à diversidade dos alunos, no que a participação da comunidade é fator essencial. Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 Quanto às escolas especiais, a política de inclusão as reorienta para prestarem apoio aos programas de integração. [...] Requer-se um esforço determinado das autoridades educacionais para valorizar a permanência dos alunos nas classes regulares, eliminando a nociva prática de encaminhamento para classes especiais daqueles que apresentam dificuldades comuns de aprendizagem, problemas de dispersão de atenção ou de disciplina. A esses deve ser dado maior apoio pedagógico nas suas próprias classes, e não separá-los como se precisassem de atendimento especial. Parecer CNE/CEB nº 17/2001 Resolução CNE/CEB nº 2, de 11 de setembro de 2001. O quadro das dificuldades de aprendizagem absorve uma diversidade de necessidades educacionais, destacadamente aquelas associadas a: dificuldades específicas de aprendizagem como a dislexia e disfunções correlatas; problemas de atenção, perceptivos, emocionais, de memória, cognitivos, psicolinguísticos, psicomotores, motores, de comportamento; e ainda há fatores ecológicos e socioeconômicos, como as privações de caráter sociocultural e nutricional. (SAMPAIO, 2006). Instituto Pedagógico de Minas Gerais http://www.ipemig.com (31) 3270 4500 REFERÊNCIAS CONSULTADAS E UTILIZADAS BRASIL, Decreto nº 3.298 de 20/12/1999. Regulamenta a lei n. 7.853. Dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção e dá outras providências. 1999. BRASIL. Congresso Nacional. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - n. 9394, de 20/12/1996. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de educação especial. Política Nacional de Educação Especial. Brasília, Secretaria de Educação Especial, 1994. BRASIL. Secretaria da Educação Básica. Parâmetros Curriculares Nacionais: adaptações Curriculares. Estratégias para a Educação de Alunos com Necessidades Educacionais Especiais. Brasília: SEF: SEESP, 1998. BRASIL. Constituição de 1988. MARCELOS, Viviane Avelino. Legislação que regulamenta a Educação especial no Brasil. Disponível em <http://www.artigonal.com/educacaoartigos/legislacao-que-regulamenta-a- educacao-especial-no-brasil737561.html> Acesso em: 03 fev. 2011. ROSS, Paulo Ricardo. A crise da Educação especial: uma reflexão política e antropológica. Disponível em <http://www.educaremrevista.ufpr.br/arquivos_15/ross.pdf> Acesso em: 03 fev. 2011. SAMPAIO, Simaia. Legislação de apoio para atendimento de crianças com dificuldades de aprendizagem. Disponível em: <http://www.psicopedagogiabrasil.com.br/artigos_simaia.htm> Acesso em: 03 fev. 2011.
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